Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00679/09.8BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/29/2016
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:ANULAÇÃO DE VENDA
CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO
REJEIÇÃO DE 1.ª P.I.
PRAZO
Sumário:I - No que respeita ao cômputo do prazo de caducidade para efectuar o pedido de anulação de venda, uma vez que o erro sobre o objecto transmitido e sobre as suas qualidades por falta de conformidade com o que foi anunciado constitui o fundamento do presente pedido de anulação da venda, o termo inicial do prazo de 90 dias referido no artigo 257.º, n.º 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) conta-se da data da venda ou da que o requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação.
II - O prazo para requerer a anulação da venda com fundamento na existência de contrato de arrendamento conta-se a partir da data em que o adquirente toma conhecimento desse contrato e de que o mesmo é oponível à execução, quando estes factos forem posteriores à venda – cfr. artigo 257.º, n.º 2, do CPPT.
III - Tendo por base o disposto neste artigo 257.º, n.º 2 do CPPT, cabia aos ora Recorrentes alegar no requerimento respectivo e demonstrar que só tomaram conhecimento do facto que constitui o fundamento da anulação há menos de 90 dias.
IV - Sendo alegado que esse conhecimento foi obtido nos 90 dias que antecederam o pedido de anulação da venda, impõe-se a prova da data invocada, sob pena de contagem daquele prazo a partir da data da venda – cfr. o mesmo normativo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:B... e M...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

B…, contribuinte fiscal n.º2…e M…, contribuinte fiscal n.º2…, residentes na Rua…, Rebordosa, Concelho de Paredes, interpuseram recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 22/03/2016, que julgou verificada a excepção de caducidade do direito de deduzir a acção de anulação de venda, com a consequente absolvição da Fazenda Pública do pedido.

Os Recorrentes terminaram as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“I – Os recorrentes adquiriram um prédio no Serviço de Finanças de Paredes no âmbito de uma execução fiscal que, além de onerado com o ónus de arrendamento, possui uma área muito inferior à anunciada para venda. Além de que,
II – Como bem refere o Ex.mo Procurador do Ministério Público, não existe sequer uma certeza e segurança mínimas de que o prédio vendido seja, de facto, o inscrito na matriz urbana sob o art. 426, de que, aliás, os requerentes não têm nem nunca tiveram sequer a posse, por não lhes ter sido transmitida.
III – Razão pela qual o Serviço de Finanças emitiu um parecer em que diz “…dado haver elementos surgidos a posterior que indiciam que provavelmente terá sido vendido um prédio com característica diferentes daquele que foi publicitado para a venda…deverá ser de remeter o processo para os fins convenientes ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel”.
IV – Como se pode constatar do depoimento da mãe da recorrente, D. A…, gravado em sistema digital dos 14:49 segundos até aos 33:11 segundos, o Serviço de Finanças manteve durante vários meses que o prédio estava livre para que pudesse ser habitado por eles.
V – Tanto mais que está dado como provado no Ponto 15.º da sentença que “Em 23.06.2009, o Serviço de Finanças notificou o Sr. F…, NIF 1…, para apresentar o contrato de arrendamento do imóvel em causa”. E do Ponto 16.º que “Em 07.07.2009, o mesmo apresentou uma cópia do contrato de trespasse e aclaração, que inclui o contrato de arrendamento do prédio em causa…”.
VI – O conhecimento dos recorrentes do ónus do direito de arrendamento que incide sobre o imóvel ocorreu a partir de 07/07/2009, data a partir da qual o contrato de arrendamento foi junto aos autos (Pontos 15.º, 16.º, 17.º, 18.º e 22.º dos factos provados).
VII – Até então, como também frisou a testemunha supra referida os recorrentes continuavam a ser informados pelo Serviço de Finanças de que a venda tinha sido efetuada livre qualquer ónus, estando estes convencidos disso mesmo. Pois,
VIII – Só a partir de 07/07/2009 é que o Serviço de Finanças de Paredes e os recorrentes tiveram acesso ao contrato de arrendamento até então completamente desconhecido de todos.
IX – A M.ma Juíza a quo, ao não considerar a data de 07/07/2009 para o início da contagem do prazo, desconsiderou factos importantes para a boa decisão da causa.
X – Baseando a sua decisão em suspeitas e, na sua própria convicção, completamente desprovida de suporte fáctico.
XI – Em consequência, a sentença de que se recorre traduz uma visão simplista do caso sub iudice, com consequências muito danosas para os recorrentes, um jovem casal em início de vida que se endividou para comprar uma casa de habitação confiando no Serviço de Finanças respetivo que, por sua vez, nunca teve nem parece que possa vir a ter condições para lhes entregar a tão desejada chave do imóvel.
XII – Em suma, o prazo para a anulação da venda com fundamento na existência do contrato de arrendamento conta-se a partir da data em que o adquirente tem conhecimento desse contrato e de que o mesmo é oponível à execução, quando estes factos forem posteriores à venda – ut art. 257.º, n.º 2 do CPPT. Ora,
XIII – No caso dos autos, outro entendimento não deverá haver, salvo sempre o devido respeito, senão que tal prazo se deve contar a partir do dia 7/07/2009.
XIV – Em 13/10/2009 (data da entrada do pedido de anulação da venda nestes autos) ainda não tinham decorrido os 90 dias, contados nos termos do art. 114.º do CPC (à data), por força do art. 20.º, n.º 2 do CPPT, pois teremos de considerar a suspensão no período de férias judiciais.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, com a total procedência do pedido de anulação da venda, como acto de melhor JUSTIÇA!”

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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir verificar-se a caducidade do direito de requerer a anulação da venda.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Factos provados com relevância para a decisão da presente acção:
1.º-Pelo Serviço de Finanças de Paredes foi instaurado o processo de execução fiscal (PEF) n.º 1848200401058746 e ap., por dívida de Contribuição Autárquica dos anos de 2001 e 2002, no valor de €2.388,31, a que acrescem juros de mora e as respetivas custas, sendo executada a sociedade “Construções…, Ld.ª”, NIPC: 5….
2.º - Em 29.08.2007 foi efetuada pelo órgão de execução fiscal (OEF) a penhora de um prédio urbano inscrito na matriz predial de Mouriz sob o artigo 4… com 54 m2 de superfície coberta e quintal com 2137 m2, conforme alteração desta área e das respetivas confrontações por modelo 129 de 12.02.2001, apresentado pela antiga proprietária (M…), com a assinatura do único confinante, o Sr. F… - cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 17 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
3.º - A referida penhora foi registada na Conservatória do Registo Predial de Paredes, em 09.10.2007.
4.º - O prédio está descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes sob o n.º 3… de Mouriz.
5.º - Por não ter sido paga a dívida foi requerida a avaliação do prédio nos termos da alínea a) do n.º1 do art. 250.º do CPPT, em 29.11.2007- cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 17 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
6.º - O prédio foi avaliado conforme ficha de avaliação n.º 1996925, de 20.12.2007, passando a ser de € 47 810.00, o seu valor patrimonial - cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 17 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
7.º - Por despacho de 29.07.2008, foi designada a venda do bem penhorado, o artigo 4… da freguesia de Mouriz, Paredes.
8.º - A identificação do bem constante dos anúncios foi feita com a seguinte descrição:
“Moradia unifamiliar de dois pisos, destinada a habitação, área total do terreno: 2191 m2, área bruta de construção: 108 m2, área bruta privativa. 54 m2, área bruta dependente: 54 m2, sito no luga…, freguesia de Mouriz, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º 4… da freguesia de Mouriz e descrita na Conservatória do Registo Predial de Paredes sob o n.º0… da mesma freguesia, com o valor patrimonial de 47 810,00 euros. ”
9.º - A venda do imóvel foi marcada para o dia 21.10.2008 no Serviço de Finanças de Paredes por proposta em carta fechada.
10.º - O bem foi adjudicado ao proponente, ora Requerente, que de entre outros apresentou a proposta de maior valor.
11.º - O mesmo depositou o preço e pagou o imposto de selo devido.
12.º - Na sequência do que foi levantada a penhora do imóvel e cancelados todos os ónus e encargos que sobre ele impendiam na Conservatória do Registo Predial de Paredes - cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 17 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
13.º - Em 15.11.2008 o ora Requerente solicitou ao referido Serviço de Finanças a entrega da chave da habitação e informou-o de que o imóvel se encontrava ocupado.
14.º - Em 02.06.2009 foi apresentado no Serviço de Finanças de Paredes pelos ora Requerentes, um pedido de anulação de venda, informando-o de que o prédio não existe com a descrição que foi publicitada e pedindo a restituição do preço depositado e demais despesas - cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 17 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
15.º - Em 23.06.2009, o Serviço de Finanças notificou o Sr. F…, NIF 1…, para apresentar o contrato de arrendamento do imóvel em causa.
16.º - Em 07.07.2009, o mesmo apresentou uma cópia do contrato de trespasse e aclaração, que inclui o contrato de arrendamento do prédio em causa - cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 17 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
17.º - O contrato de trespasse e arrendamento foi celebrado entre F… e Be… em 03.04.1990.
18.º - Não consta da base de dados do Serviço de Finanças de Paredes qualquer contrato de arrendamento declarado, nem quaisquer rendas declaradas para efeitos de IRS/IRC - cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 18 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
19.º - Na sequência da apresentação da petição de anulação de venda por parte dos ora Requerentes, o Serviço de Finanças de Paredes passou uma ordem de serviço à perita avaliadora, cumprida em 01/07/2009, na qual informa a existência de uma habitação construída no terreno, de rés do chão e 1º andar, tendo confirmado junto dos vizinhos as confrontações - cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls. 18 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
20.º - Em 15.09.2009 o Serviço de Finanças de Paredes apresentou uma participação criminal junto do Ministério Público contra Construções…, Ld.ª, F… e M….
21.º - Em 02.06.2009 os Requerentes apresentaram no Serviço de Finanças de Paredes um pedido de anulação da venda, através do qual informam o órgão de execução fiscal (OEF) que o prédio em causa se encontra ocupado por arrendatários - cf. doc. de fls.93 a 95 do Processo de Execução Fiscal (PEF), apenso a este processo.
22.º - Por requerimento entrado no Serviço de Finanças de Paredes a 15.06.2009, o Sr. F… informou ser arrendatário do prédio objeto de venda (h)à mais de vinte anos - cf. doc. de fls.103 e 104 do PEF, apenso a este processo.
23.º - Na sequência do que foi notificado para apresentar no Serviço de Finanças cópia do contrato de arrendamento respeitante ao prédio urbano n.º426 da freguesia de Mouriz - cf. doc. de fls.108 do PEF, apenso a este processo.
24.º - Em 07.07.2009, veio apresentar a cópia do contrato de arrendamento do prédio em referência - cf. doc. de fls.135 a 146 do PEF, apenso a este processo, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
25.º - Em 07.09.2009 este Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel recebeu o requerimento (petição inicial) de anulação de venda remetido pelo competente Serviço de Finanças, apresentado pelos Requerentes em 02.06.2009 nesse Serviço de Finanças - cf. doc. de fls.149 do PEF apenso a este processo.
26.º - O qual foi rejeitado, por não obedecer aos requisitos do art.467.º do CPC (à data) - cf. doc. de fls.149 do PEF apenso a este processo.
27.º - Na sequência do que foi apresentada a petição de anulação de venda no competente Serviço de Finanças em 13.10.2009 - cf. teor de fls.3 do processo físico.
28.º - Os ora Requerentes solicitaram a um topógrafo a verificação das áreas do terreno que adquiriram - cf. depoimento das testemunhas J… e A… e doc. de fls. 99 do PEF apenso aos autos.
29.º - Do levantamento topográfico resultou que o terreno tinha a área total de 1.625m2 - cf. depoimento da testemunha J… (que o efetuou) e doc. de fls. 99 do PEF apenso aos autos.
30.º - O referido levantamento topográfico foi concluído em Fevereiro de 2009 e dado conhecimento do seu teor aos ora Requerentes um dia depois - cf. prova testemunhal.
31.º - O pagamento pelo serviço prestado ao topógrafo foi efetuado após a conclusão e entrega do mesmo, no dia 21.02.2009 - cf. depoimento de J… doc. de fls. 13 dos autos.
32.º - Os ora Requerentes ao comprarem o prédio em causa, pretendiam ir para lá morar - cf. depoimento de A….
33.º - A casa encontrava-se habitada - cf. depoimento de A….
34.º - O Serviço de Finanças nunca entregou a chave da casa aos Requerentes - cf. depoimento de A….
35.º - Os ora Requerentes, depois de adquirirem o prédio, dirigiram-se ao Serviço de Finanças a solicitar as chaves - cf. depoimento de A….
36.º - Os ora Requerentes deslocaram-se ao prédio, já depois de o terem adquirido, tendo constatado que a casa se encontrava habitada - cf. depoimento de A….
Não existem outros factos com relevância para a apreciação dos autos.
Factos não provados.
1.º - Não ficou provada à data em que os Requerentes tiveram acesso ao contrato de arrendamento respeitante ao prédio por si adquirido.
Fundamentação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise conjugada e crítica dos documentos juntos aos autos que não foram impugnados e, bem assim, dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), estão corroborados pelos documentos juntos aos autos e ao PEF a ele apenso (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)), bem como do depoimento das testemunhas inquiridas, em especial, no que respeita à real dimensão e enquadramento do prédio em causa, tendo em conta o depoimento da testemunha J…, responsável pelo levantamento topográfico que lhe foi solicitado pelos Requerentes e, quanto ao facto de o imóvel se encontrar habitado e ter sido adquirido para habitação dos Requerentes, relevou o depoimento de A ….
Os depoimentos das referidas testemunhas revelaram-se credíveis, tanto mais, que, as mesmas, apresentaram um conhecimento direto do que transmitiram a este Tribunal.
*
2. O Direito

Impõe-se, de novo, apreciar a questão de saber se o prazo de caducidade do direito de requerer a anulação da venda já tinha decorrido.
O tribunal recorrido entendeu que sim, passando-se a transcrever parcialmente a respectiva decisão:
“(…) A mera constatação de que o imóvel adquirido se encontra habitado não equivale ao conhecimento da existência e do conteúdo do contrato de arrendamento e de que o mesmo é oponível à execução.
Ora, para apreciação desta questão, o Tribunal apenas conseguiu apurar com base nos elementos de prova documental e testemunhal que os Requerentes tomaram conhecimento de que a casa se encontrava habitada poucos dias depois da venda e de que existia um contrato de arrendamento. Tal entendimento deste Tribunal resulta do depoimento da testemunha A … que afirmou que os Requerentes quando tentaram ocupar a casa e foram confrontados com a sua ocupação, foram informados por quem ocupava a casa que eram arrendatários da mesma (h)à muito tempo.
E, com efeito, ficou também provado que já no dia 2008.11.15, o Requerente marido informou o Serviço de Finanças de que o imóvel se encontrava ocupado.
Do facto do imóvel estar ocupado não decorre a constatação de algum ónus real que não tenha sido tomado em consideração na aquisição do mesmo [sendo que para efeitos do disposto no artigo 257.º, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o conceito de ónus real abrange o direito ao arrendamento constituído antes da penhora – neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA, «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», IV volume, Áreas Editora 2011, pág. 178; na jurisprudência, ver o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2010/01/13, Processo n.º 0802/09, disponível in www.dgsi.pt], tal só poderia decorrer do título de ocupação e do facto de esse título ser oponível aos adquirentes.
O Tribunal ficou convencido que os Requerentes, pese embora desconheça com exatidão a data em que os mesmos tiveram acesso ao contrato de arrendamento, sabia desde o primeiro contato com vista a ocupar a casa que compraram, que, tal contrato de arrendamento existia. Ou seja, tinham conhecimento da existência desse ónus. Contrato esse de arrendamento que justificava a ocupação do imóvel que adquiriram, por conversa com quem o habitava.
Desconhece o Tribunal, no entanto, se o contrato de arrendamento lhes foi mostrado por quem habitava o imóvel, hipótese que não parece de excluir, atendendo a que os Requerentes se dirigiram no dia 15.11.2008 ao competente Serviço de Finanças a informar da existência de inquilinos, cf. teor da Informação do Serviço de Finanças de Paredes a fls.122 do PEF apenso a este processo.
Podendo, caso não tivessem conhecimento da existência do contrato, simplesmente informado o órgão de execução fiscal de que o prédio se encontrava ocupado.
Tal informação prestada pelos Requerentes, levou o Serviço de Finanças a solicitar a quem ocupava o prédio (F…) o comprovativo do contrato de arrendamento, cf. resulta da matéria de facto provada.
Pelo que, no entender deste Tribunal e, não tendo os Requerentes feito prova com exatidão da data em que tomaram conhecimento da existência do contrato de arrendamento, como lhes competia, atendendo às regras da experiência e ao bom senso, também quanto a este argumento, já se encontrava ultrapassado o prazo para apresentação de requerimento de anulação de venda por parte dos Requerentes quando o fizeram.
De salientar que, de acordo com os elementos de prova documental existentes nos autos e, da matéria de facto provada, o pedido de anulação da venda apresentado pelos Requerentes em 13.10.2009 foi na sequência da recusa do requerimento de 02.06.2009 pela secretaria deste TAFP, como resulta de fls. 149 do PEF apenso.
Assim, o requerimento/petição de anulação de venda corrigido não foi apresentado no prazo de 10 (dez) dias subsequentes à recusa de recebimento da mesma por parte deste Tribunal.
Logo, não poderá à presente ação de anulação de venda, considerar-se proposta na data em que a primeira petição foi apresentada em juízo, cf. art.476.º do CPC (à data), atual art.560.º, do referido diploma legal, mas, tão só no dia 13.10.2009.
Em suma, desde o conhecimento do primeiro facto que legitima aos Requerentes a apresentação de requerimento/petição de anulação da venda, até à sua apresentação decorreram mais de 90 (noventa) dias.
Assim, já se encontrava caducado o direito de requerer a anulação da venda executiva em apreço. (…)”
Ora, nos termos do disposto no artigo 257.º, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a anulação da venda só pode ser requerida dentro do prazo de 90 dias, no caso de a anulação se fundar na existência de algum ónus real que não tenha sido tomado em consideração e não haja caducado ou em erro sobre o objecto transmitido ou sobre as qualidades por falta de conformidade com o que foi anunciado.
E, nos termos do disposto no n.º 2 do mesmo dispositivo legal, o prazo contar-se-á da data da venda ou da que o requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação, competindo-lhe provar a data desse conhecimento.
Como já ficou expresso no acórdão proferido nestes autos por este tribunal, em 29/05/2014, a venda em causa foi efectuada em 21/10/2008 (cfr. ponto 9.º dos factos provados). Pelo que, em 02/06/2009, data em que foi apresentado no Serviço de Finanças de Paredes o pedido de anulação da venda, já tinha decorrido o prazo de 90 dias para o requerer com tal fundamento, contando aquele prazo a partir da data da venda.
Tendo por base o disposto no artigo 257.º, n.º 2 do CPPT, cabia aos ora Recorrentes alegar no requerimento respectivo e demonstrar que só tomaram conhecimento do facto que constitui o fundamento da anulação há menos de 90 dias.
No referido acórdão do TCAN, de 29/05/2014, decidiu-se que, em 02/06/2009, data em que foi apresentado o pedido de anulação da venda a que alude o ponto 14.º dos factos provados, já tinha decorrido o prazo de 90 dias respectivo, contado nos termos do artigo 144.º do Código de Processo Civil (por força do artigo 20.º, n.º 2, do CPPT), para requerer a anulação da venda com fundamento na falta de conformidade com o que foi anunciado, dado que tinha sido anunciado que o prédio tinha a área de 2191 m², quando afinal tinha a área de 1625 m², (mesmo considerando a suspensão no período de férias judiciais entre o dia 5 de Abril e o dia 13 do mesmo mês, por força do artigo 12.º da Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto).
Efectivamente, no requerimento que os ora Recorrentes apresentaram no Serviço de Finanças, em 02/06/2009, tinha sido invocado o erro sobre as qualidades do objecto transmitido, o que incluía, também, a existência de ónus que não tinha sido tomado em consideração: o facto de o prédio estar arrendado – cfr. o ponto 6 do requerimento.
Sobre este facto, os Recorrentes também tinham alegado que só em meados de Março de 2009 (ou meados de Abril desse ano, segundo a versão das alegações escritas ínsitas a fls. 112 e seguintes do processo físico), tomaram conhecimento de que o prédio estava onerado com contrato de arrendamento e que só nessa data tiveram acesso ao referido contrato, tendo tal conhecimento advindo da afixação de um edital no imóvel, em que anunciava a sua venda num outro processo, correndo termos na 3.ª Vara Cível do Porto, 3.ª Secção, com o n.º 127/2001, tendo sido nos autos desse processo que, pela primeira vez, tiveram acesso ao contrato de arrendamento – cfr. pontos 6 a 8 da resposta à matéria de excepção, a fls. 48 a 52 do processo físico.
A relevância deste facto foi destacada por este TCAN, no citado acórdão de 29/05/2014, na medida em que só nessa data estariam, em princípio, em condições de saber se o título de ocupação era oponível à execução e se, por conseguinte, existia ou não um ónus que não tivesse sido tomado em consideração.
Uma vez que da primeira sentença proferida pelo tribunal recorrido, em 19/03/2012, não resultava que a Meritíssima Juíza “a quo” tivesse indagado sobre a data em que os Recorrentes tiveram acesso ao referido contrato de arrendamento, visto que não foi ali dado como provado nem como não provado o facto respectivo, este TCAN decidiu anular a decisão proferida em primeira instância para ampliação da matéria de facto.
Foram efectuadas várias diligências instrutórias, conforme determinado por este tribunal superior, inclusive a notificação para junção aos autos de todos os elementos de prova relevantes para dilucidar esta questão; Contudo, os aqui Recorrentes limitaram-se a alterar a factualidade alegada, explicitando que em 02/06/2009 ainda não tinham conhecimento integral do contrato de arrendamento e que a plenitude do teor deste contrato só chegou ao seu conhecimento com a junção do mesmo ao processo de execução fiscal apenso em 07/07/2009.
Saliente-se que quando os ora Recorrentes carrearam factualidade para os autos, com a sua resposta à matéria de excepção, nunca se referiram a qualquer falta de conhecimento integral do contrato de arrendamento, aí afirmando que tiveram acesso ao contrato de arredamento nos autos do dito processo n.º 127/2001, em meados de Março de 2009.
Não podemos deixar de acentuar que está em causa um facto pessoal dos aqui Recorrentes: o seu próprio conhecimento do teor de um documento – o contrato de arrendamento mencionado. É incompreensível que tenham invocado o seu conhecimento em Março/Abril de 2009 e depois venham efectuar um “ajustamento” da factualidade, só justificável pela necessidade de tornar a presente acção tempestiva.
De todo o modo, a sentença recorrida considerou não provada a data em que os Requerentes tiveram acesso ao contrato de arrendamento respeitante ao prédio por si adquirido.
Percorrendo as conclusões das alegações, verifica-se que os Recorrentes não colocam em causa a factualidade não provada, estando implícito que não efectuaram a prova que lhes competia – a data em que tiveram conhecimento do facto que sustenta o pedido de anulação de venda.
Deturpando o facto invocado na resposta à matéria de excepção, os Recorrentes pretendem, agora, retirar ilações dos factos provados que lhes são convenientes para efeitos de tempestividade do presente incidente da execução fiscal.
No entanto, estando, efectivamente, assente que o referenciado contrato de arrendamento foi junto ao processo executivo apenso em 07/07/2009, tal não significa, tout court, que apenas em tal data os Recorrentes tenham tido acesso ao mesmo. Principalmente porque os próprios Recorrentes invocaram, em sede de resposta à matéria de excepção, terem tido conhecimento do teor do contrato de arrendamento antes, em Março/Abril de 2009.
Concluindo, tendo por base o disposto no artigo 257.º, n.º 2 do CPPT, cabia aos ora Recorrentes alegar no requerimento respectivo e demonstrar que só tomaram conhecimento do facto que constitui o fundamento da anulação há menos de 90 dias. Conforme resulta da factualidade apurada, os aqui Recorrentes não comprovaram nos autos a data em que tomaram conhecimento do teor do contrato de arrendamento.
Logo, qualquer que seja a data que se possa considerar que foi apresentado no Serviço de Finanças de Paredes o pedido de anulação da venda, em 02/06/2009 ou em 13/10/2009, já tinha decorrido o prazo de 90 dias para o requerer com tal fundamento, contando aquele prazo a partir da data da venda - em 21/10/2008 – dado não ter sido apurada a data de conhecimento por parte dos Recorrentes do invocado fundamento de anulação da venda – cfr. artigo 257.º, n.º 2 do CPPT.
Nesta conformidade, mostra-se irrelevante que os autos já esclareçam que o pedido de anulação da venda apresentado em 13/10/2009 o foi na sequência da recusa do requerimento de 02/06/2009 pela secretaria do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel.
De todo o modo, considerando a factualidade apurada, que não esclarece a data em que foram os Recorrentes notificados da decisão de recusa dessa petição inicial, continuaria a não ser possível verificar se o requerimento corrigido foi apresentado no prazo a que alude o artigo 476.º do Código de Processo Civil.
Ainda assim, apesar de os fundamentos divergirem, em grande parte, da motivação constante da sentença recorrida, impõe-se negar provimento ao recurso, por os Recorrentes não terem demonstrado que o conhecimento do facto que constitui o fundamento da anulação foi obtido nos 90 dias que antecederam o pedido de anulação da venda, seja o apresentado em 02/06/2009, quer seja o de 13/10/2009 (datas dos requerimentos de anulação de venda).

Conclusões/Sumário

I - No que respeita ao cômputo do prazo de caducidade para efectuar o pedido de anulação de venda, uma vez que o erro sobre o objecto transmitido e sobre as suas qualidades por falta de conformidade com o que foi anunciado constitui o fundamento do presente pedido de anulação da venda, o termo inicial do prazo de 90 dias referido no artigo 257.º, n.º 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) conta-se da data da venda ou da que o requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação.
II - O prazo para requerer a anulação da venda com fundamento na existência de contrato de arrendamento conta-se a partir da data em que o adquirente toma conhecimento desse contrato e de que o mesmo é oponível à execução, quando estes factos forem posteriores à venda – cfr. artigo 257.º, n.º 2, do CPPT.
III - Tendo por base o disposto neste artigo 257.º, n.º 2 do CPPT, cabia aos ora Recorrentes alegar no requerimento respectivo e demonstrar que só tomaram conhecimento do facto que constitui o fundamento da anulação há menos de 90 dias.
IV - Sendo alegado que esse conhecimento foi obtido nos 90 dias que antecederam o pedido de anulação da venda, impõe-se a prova da data invocada, sob pena de contagem daquele prazo a partir da data da venda – cfr. o mesmo normativo.

IV. Decisão
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo dos recorrentes, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 29 de Setembro de 2016.
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Mário Rebelo