Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 02555/22.0BEPRT |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 04/21/2023 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Paulo Ferreira de Magalhães |
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Descritores: | PEDIDO DE PROTECÇÃO INTERNACIONAL; ASILO; RETOMA A CARGO; |
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Sumário: | 1 - Nos termos do artigo 18.º do Regulamento n.º 604/2013 do Conselho de 26 de Junho, o pedido de protecção internacional é apreciado e decidido por um único Estado Membro. 2 – Tendo sido apurado no âmbito da instrução do procedimento iniciado pelo Autor ora Recorrente, que antes de ter apresentado pedido de proteção internacional em Portugal, o mesmo tinha já apresentado anterior pedido junto de outro Estado Membro, nos termos dos artigos 3.º, n.ºs 1 e 2, e 18.º, n.º 1, alínea d), do Regulamento n.º 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, impõe-se a retoma do requerente a cargo desse outro Estado Membro. 3 - Tendo as autoridades Alemãs aceitado o pedido de retoma a cargo do Recorrente, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 18.º do Regulamento n.º 604/2013 do Conselho de 26 de Junho, é a este Estado que compete a instrução do procedimento de protecção internacional.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Impugnação Urgente - Intimação Protecção Direitos, Liberdades e Garantias (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO «AA», Autor na acção administrativa de impugnação da decisão de inadmissibilidade do pedido de protecção internacional, que intentou contra o Ministério da Administração Interna [ambos devidamente identificados nos autos], onde formulou pedido visando a anulação do acto administrativo contido na decisão final proferida pelo Director Nacional do SEF, datado de 14 de novembro de 2022, inconformado com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto pela qual, a final e em suma, a acção foi julgada totalmente improcedente, veio interpor recurso jurisdicional de Apelação. No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “[…] CONCLUSÕES: I. O Tribunal de primeira instância considerou que não existiam quaisquer fundamentos que determinassem a anulação da Decisão do Serviço de Estrangeiros e Fronteiros, tomada em 14 de novembro de 2022, que considerou inadmissível o pedido de proteção internacional do aqui Recorrente. II. Entendeu igualmente o Tribunal de Primeira Instância que a Alemanha é, efetivamente, o Estado responsável pela apreciação do pedido de proteção apresentado pelo ora Recorrente. III. Entende o Recorrente que à data da apresentação do pedido de proteção internacional, a Alemanha já não tinha qualquer responsabilidade pelo Requerente, ora Recorrente. IV. Portugal era, à data da apresentação do pedido subsequente, e é atualmente, o Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional do ora Recorrente. V. Ignorou, pois, o Tribunal a quo a relevância desta significativa alteração de responsabilidades entre Estados. VI. O receio de que seja feita uma análise precária do seu pedido, é também o motivo pelo qual o Recorrente não se pode conformar com a posição da entidade recorrida e agora reafirmada pelo Tribunal de Primeira Instância. VII. A sentença recorrida, ao caucionar o ato impugnado, sem ordenar a realização de qualquer diligência instrutória adicional, viola também o disposto na alínea z) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, na sua atual redação, e, por essa via, o disposto no n.º 8 do artigo 33.º da Constituição. TERMOS EM QUE, Deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e, em conformidade, ser revogada a decisão recorrida, devendo ser substituída por outra que determine a admissão do pedido e a realização, pelo SEF, das diligências adicionais requeridas pelo Recorrente.” ** O Réu Ministério da Administração Interna não apresentou Contra alegações. * O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos. ** O Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, no sentido de ser negado provimento ao recurso jurisdicional, mantendo-se na íntegra a Sentença recorrida. *** Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir. *** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], e que se reconduzem, a final, em saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento em matéria de direito por ter julgado não padecer o acto impugnado de qualquer das invalidades apontadas na Petição inicial [designadamente da não realização de qualquer diligência instrutória adicional], assim como da violação do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea z) da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho e por essa via, violado também o disposto no artigo 33.º, n.º 8 da CRP. ** III - FUNDAMENTOS IIIi - DE FACTO No âmbito da factualidade considerada pela Sentença recorrida, dela consta o que por facilidade para aqui se extrai como segue: “[…] Com relevância para a decisão da causa julgo provados os seguintes factos: 1. O autor é natural do Paquistão (cfr. informação a fls. 1 do processo administrativo incorporado a fls. 23-222, doravante PA); 2. Em data não concretamente apurada, o autor foi detido em território nacional por permanência irregular, sendo, por decisão de 14/10/2022 do Juiz ... do Juízo Local de Pequena Criminalidade de Lisboa, entre o mais, determinada a sua: “colocação em centro de instalação temporária, pelo período máximo de 60 dias, conforme artº 146º, nº 3 da Lei 3/2007 de 04/07” (cfr. certidão judicial a fls. 11- do PA); 3. Em 15/10/2022, o autor apresentou um pedido de protecção internacional, no Gabinete de Asilos e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, autuado sob o nº 1640/22 (cfr. fls. 1 e 17-22 do PA); 4. Em 23/10/2022, o autor prestou declarações no Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, no âmbito do processo nº ...2, das quais consta, designadamente, o seguinte (cfr. entrevista/transcrição a fls. 31-40 do PA): “(...) O requerente foi questionado sobre se tem perguntas quanto ao procedimento descrito: Não, compreendi tudo. Percebeu o procedimento que lhe foi descrito? Sim. Autoriza que seja comunicada ao Conselho Português para os Refugiados, de acordo com o previsto no nº 5, do artigo 20º, da Lei nº 27/08 de 30.06, com as alterações introduzidas pela Lei nº 26/14 de 05.05, as decisões que vierem a ser proferidas no seu processo? Sim. Está em condições para realizar a entrevista? Sim. (...) VI. Registos Eurodac De acordo com os registos constantes da base de dados de impressões digitais Eurodac verifica-se que passou em vários países europeus. Queira indicar a duração da estadia em cada um desses países onde foi alvo de registo: País/Referência: Data: Duração da estada: ... – Grécia 28/06/2017 Até 20/12/2017 DE1200911NUR00322 – Alemanha 11/09/2020 Cerca de 8 meses (até +/- Março 2021) (...) VII. Entrada e/ou estadia Data de saída do país de nacionalidade/origem? Sai do Paquistão em 2016. Saiu sozinho ou acompanhado? Sai com o meu irmão e um amigo. O nosso objectivo era vir para Portugal. Documentos com que viajou. Quando sai não trouxe documentos nenhuns. Qual o percurso efectuado desde o país de origem até chegar a Portugal? Saí do Paquistão e fui para o Irão, Turquia. Depois fui para a Grécia de barco. O barco tinha muitas pessoas. Era pequeno e nós éramos 12. O meu irmão morreu afogado nessa travessia porque caiu à água e não sabia nadar. O corpo nunca foi encontrado. Cheguei à Grécia em Fevereiro de 2017. Foram as autoridades gregas que nos receberam. Fiquei 4 meses num centro de instalação para refugiados. Durante esse tempo pedi asilo, tiraram-me as impressões digitais e deram-me um documento comprovativo de pedido de asilo, válido por 6 meses. Depois deste tempo as autoridades gregas não mo renovaram. A decisão do meu pedido de asilo foi negativa. Disseram que tinha 10 dias para abandonar o país. Depois vim embora da Grécia, passei pela Macedónica, passei a fronteira a pé, depois Sérvia. Na Sérvia fiquei durante 2 anos num campo de refugiados. Tinha alojamento, tinha comida e davam-me ajuda monetária, cerca de 3000 dinares. Depois deste tempo passei pela Croácia, Eslovénia. Na Eslovénia fui apanhado pela polícia e fiquei lá durante 2 semanas. Depois viajei para a Itália, França e Alemanha. Fiz este percurso todo com algumas boleias que fui apanhando. Atravessei as fronteiras sempre a pé para não ser detectado. Na Alemanha cheguei em Setembro de 2020. Fui detido pela polícia e pedi asilo. Tiraram-me as impressões digitais. Não cheguei a fazer entrevista, mas diziam-me sempre que não aceitavam o meu pedido de asilo e que voltar à Grécia. Fiquei num campo de refugiados durante 8 meses. Recorri mas não sei a resposta. Tinha um documento que era renovado todos os meses. Depois em Março de 2021 decidi vir embora e voltei à França. Fiquei em casa de um amigo cerca de 8 meses e trabalhei na construção civil. Depois decidi sair da França e fui para Espanha. Fiquei lá 4 meses, trabalhei na restauração. Depois vim para Portugal. Em que data chegou a Portugal? Cheguei a Portugal há cerca de 4 meses, não me recordo bem da data. Com que documentos entrou em Portugal? Sem documentos. Regressou ao seu país de origem? Não. Nunca mais. É titular de um título de residência na União Europeia? Não. Onde permaneceu nos últimos 5 meses anteriores ao pedido de protecção? Estive em Espanha. Pode apresentar provas documentais sobre a estadia/percurso que refere? Os únicos documentos que tenho são os documentos comprovativos dos pedidos de asilo na Grécia e na Alemanha. VIII. Pedidos de protecção internacional anteriores Alguma vez pediu protecção internacional num país da União Europeia (e Islândia, Suíça, Noruega ou Liechtenstein) ou facultou as suas impressões digitais para registo? Em caso afirmativo, onde? Sim: X Não: Pedi asilo na Grécia e na Alemanha e Registaram as minhas impressões digitais O seu pedido encontra-se em análise? Grécia Sim: Não: X Desconhece Alemanha Sim: Não: X Desconhece O seu pedido foi recusado? Grécia Sim: X Não: Desconhece Alemanha Sim: X Não: Desconhece (...) O seu pedido foi registado na Alemanha? Sim, Que diligências foram feitas no âmbito desse pedido? Na Alemanha tiraram as minhas impressões digitais e deram-me um documento comprovativo do pedido de asilo. Durante a instrução desse pedido, de que tipo de apoios beneficiou? (alojamento, alimentação, apoio pecuniário, acesso à saúde)? Na Alemanha tive alojamento, comida e tinha um subsídio mensal de cerca de 400 €. Qual a razão de ter saído da Alemanha? Sai da Alemanha porque disseram-me que a decisão era negativa. Qual o motivo de vir para Portugal? Porque quando sai do Paquistão sempre tive essa intenção. Portugal é um país bonito e os portugueses são boa Pessoas. Os portugueses respeitam os valores humanos. Podia trabalhar na Alemanha? Não, não podia. Que oportunidades lhe foram dadas? Mais nada. Teve algum problema com as autoridades quando esteve na Alemanha? Não. Como obteve meios financeiros para viajar para Portugal? Juntei dinheiro do trabalho em Espanha e França. (...) II. Porque motivo solicita protecção internacional? Pedi protecção internacional porque não quero regressar ao Paquistão. Tenho problemas com os militares no Paquistão e com a polícia secreta do Paquistão, que é a polícia que controla o país. III. Pretende acrescentar alguma informação? Quero viver em Portugal para ter uma oportunidade de salvar a minha vida. Quem tem problemas, no Paquistão com a polícia secreta, é recrutado e treinado para ir combater com os militares. RELATÓRIO De acordo com as declarações prestadas pelo requerente identificado no ponto I e de acordo com as informações recolhidas, conclui-se que o mesmo: (...) X Apresentou pedido de protecção noutro país da União Europeia Alemanha (REGULAMENTO (UE) Nº 604/2013 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 26 de Junho de 2013 que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de protecção internacional apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida - Artigo 18º, nº 1) Face aos elementos acima enunciados e de acordo com os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de protecção internacional estabelecidos pelo Regulamento de Dublin, a Alemanha é o Estado-Membro responsável pela análise do pedido de protecção internacional do cidadão «AA» nacional da Paquistão, nascido aos .../.../....... Nestes termos, notifica-se que o sentido provável da proposta de Decisão a ser proferida será de inadmissibilidade do pedido de protecção internacional apresentado ao Estado português, de acordo com o previsto no artigo 19-A, nº 1, alínea a), da Lei 27/2008, de 30.06, na sua actual redacção, e consequente transferência para Alemanha. Mais se notifica que, nos termos e para os efeitos do artigo 121º do Código do Procedimento Administrativo, dispõe do prazo de 5 dias úteis, a contar da presente notificação, para se pronunciar por escrito, em alegações a apresentar no Gabinete de Asilo e Refugiados (...). E mais não disse, nem lhe foi perguntado, pelo que, lidas as declarações e relatório em língua urdu que compreende e na qual se expressa, as achou conforme, ratifica e vai assinar juntamente com todos os intervenientes, pelas 11:15, hora a que findou este acto, sendo-lhe entregue cópia autenticada do presente Auto de Declarações e Relatório. (...)”; 5. Em 31/10/2022, o Gabinete de Asilo e Refugiados do Ministério da Administração Interna apresentou um pedido de retoma a cargo do autor dirigido às autoridades alemãs ao abrigo do artigo 18º, nº 1, alínea d) do Regulamento nº 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho de 26/06/2013 (cfr. fls. 43-47 do PA); 6. Em 02/11/2022, os serviços de imigração do Ministério da Justiça da Alemanha comunicaram ao Ministério da Administração Interna – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras que aceitam o pedido descrito na alínea antecedente ao abrigo da alínea d) do nº 1 do artigo 18º do Regulamento nº 604/2013 (cfr. fls. 48-50 do PA); 7. Com data de 08/11/2022, o Gabinete de Asilo e Refugiados do Ministério da Administração Interna elaborou a informação nº ...22, no processo nº ...15..., com o seguinte conteúdo (cfr. fls. 59-63 do PA): “(...) 1. O requerente apresentou pedido de protecção internacional a 15/10/2022 no Gabinete de Asilo e Refugiados, que foi registado sob o número de processo 1640/22. 2. Nos termos previstos no Regulamento (EU) nº 603/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Junho (Regulamento Eurodac), relativo à criação do sistema “Eurodac” foram recolhidas as impressões digitais de todos os dedos. 3. Após registo e consulta à base de dados Eurodac, foram recepcionados dois acertos com os “...”, inserido pela Grécia, “...”, inserido pela Alemanha. (...) 8. Aos 31/10/2022, o GAR apresentou um pedido de retoma a cargo às autoridades alemãs ao abrigo do artigo 18 nº1 d) do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de Junho (Regulamento Dublin). 9. Aos 02/11/2022, as autoridades alemãs aceitaram o pedido de retoma a cargo do (a) cidadão (ã), ao abrigo do preceito legal referido no número anterior. 10. Aceite a responsabilidade pelo Estado responsável deve o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras proferir uma decisão de inadmissibilidade do pedido. (...) Pelo exposto, e tendo em consideração que os pedidos são analisados por um único Estado, que será aquele que os critérios enunciados no Capítulo III do Regulamento (CE) Nº 604/2013 do Conselho de 26 de Junho designarem como responsável, propõe-se que a Alemanha seja considerada o Estado responsável pela retoma a cargo, ao abrigo do artigo artº 18 nº 1 d) do Regulamento (CE) Nº 604/2013 do Conselho de 26 de Junho. (...)”; 8. Por despacho de 08/11/2022, proferido no processo nº ...15... o Director Nacional do SEF emitiu a seguinte decisão (cfr. fls. 64 do PA): “(...) De acordo com o disposto na alínea a) do nº 1, do artigo 19º-A, e no nº 2 do artigo 37º, ambos da Lei nº 27/08, de 30 de Junho, alterada pela Lei nº 26/14 de 05 de Maio, com base na informação nº ...22 do Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, considero o pedido de protecção internacional apresentado pelo cidadão que se identificou como «AA», nacional do Paquistão, inadmissível. Proceda-se à notificação do cidadão nos termos do artigo 37º, nº 3, da Lei nº 27 /08 de 30 de Junho, com as alterações introduzidas pela Lei 26/14 de 5 de Maio, e à sua transferência, nos termos do artigo 38º do mesmo diploma, para a Alemanha, Estado Membro responsável pela análise do pedido de protecção internacional nos termos do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de Junho. (...)”. 9. Em 09/11/2022, o autor tomou conhecimento da decisão descrita na alínea antecedente (cfr. cópia da certidão de notificação a fls. 75 do PA); 10. Em 11/11/2022 foram remetidas ao Gabinete de Asilo e Refugiados do Ministério da Administração Interna, as alegações apresentadas pelo autor em 28/10/2022, ao abrigo do artigo 121º do CPA, nas quais alega o seguinte (cfr. fls. 79-84 do PA); “(...) a) Na resposta à questão colocada sobre a existência de membros de família que sejam requerentes de protecção internacional em algum membro da União Europeia (página 4 do Auto), o requerente esclarece que tem um primo em segundo grau, o senhor «BB», que solicitou protecção internacional na Alemanha, continuando o seu procedimento em curso. Mais afirma que este primo é, afectivamente, como se fosse seu irmão, dado que tiveram convivência próxima na sequência da morte dos pais do seu primo. b) Na resposta à questão Saiu sozinho ou acompanhado? (pág. 5 do Auto), o requerente esclarece que o amigo a que refere é o seu primo «BB», supramencionado. c) Na resposta à questão Qual o percurso efectuado desde o pais de origem até chegar a Portugal? (pág. 5 do Auto), o requerente esclarece que, na Grécia, foi notificado de decisão negativa, da qual constava que devia abandonar o país no período de 10 dias. Contudo, o requerente impugnou a decisão. No entanto, o requerente saiu da Grécia dentro do prazo de 10 dias, antes de ser notificado de qualquer sentença. Mais acrescenta que também solicitou protecção internacional na Eslovénia. Relativamente ao pedido de protecção internacional que apresentou na Alemanha, o requerente refere que nunca foi entrevistado nesse país. Mas afirma que foi notificado para comparecer a entrevista, todavia em data anterior à data agendada para a sua entrevista foi notificado da decisão de transferência para a Grécia, sem que tido a oportunidade de prestar quaisquer declarações. d) Na questão Porque motivo solicitou protecção internacional? (pág. 7 do Auto), o requerente acrescenta que quem o perseguiu no Paquistão foi a polícia secreta, chamada ISI, que é controlada pelo Exército. A polícia secreta executa desaparecimentos forçados, raptando pessoas dos seus locais de trabalho, das suas escolas, e as mantendo-as em paradeiro desconhecido, sem que as suas famílias tenham quaisquer noticias suas. O requerente afirma que, em data que não pode precisar, ele mesmo foi raptado pela ISI e levado para um local secreto na região de Waziristan onde estavam várias pessoas presas, do qual conseguiu fugir após 14 meses. Durante este tempo o requerente foi torturado e mantido em condições desumanas e incomunicado. O próprio acto de ser raptado sem saber o que se estava a passar, porque se estava a passar e quando iria terminar causou um forte impacto psicológico no requerente. e) O requerente refere que não concorda com o sentido provável da proposta de decisão de inadmissibilidade do pedido de protecção internacional e consequente transferência para a Alemanha, não querendo ser transferido para este país, porque: · O requerente solicita, respeitosamente, que se considerem os esclarecimentos supramencionados no presente Requerimento sobre o decurso do procedimento de asilo do requerente, sem que tenha tido os seus direitos respeitados no decurso do mesmo; · O requerente refere que teve um problema com um outro cidadão paquistanês quando estava na Alemanha. O requerente, este senhor e mais dois cidadãos envolveram-se numa discussão na via pública que se tornou agressiva, sem que, contudo, tenham resultado feridos graves. O requerente afirma que ele próprio teve ferimentos ligeiros, na sequência destas agressões mútuas. 0 requerente refere que, embora as agressões tenham sido mútuas, não tendo havido feridos graves de nenhum lado, a única pessoa que apresentou queixa-crime foi o senhor supramencionado, que acusou o requerente de ser o agressor; · O requerente teme o refoulement, dado que a sua vida continuaria em perigo se regressasse ao Paquistão, pelos motivos melhor explicados supra no presente Requerimento. Face aos problemas que enfrentou durante a instrução do seu procedimento de asilo na Alemanha, o requerente não crê poder confiar que os seus motivos sejam devidamente analisados no âmbito de um pedido de protecção internacional. Por tudo o que antecede, «AA» vem requerer V. Exa. se digne, nos termos e para os efeitos do artigo 121º do CPA, considerar as presentes clarificações e correcções aos factos essenciais do seu pedido de protecção internacional.”; 11. Com data de 14/11/2022, o Gabinete de Asilo e Refugiados do Ministério da Administração Interna elaborou a informação nº ...22, no processo nº ...15..., com o seguinte conteúdo (cfr. fls. 86-96 do PA): “(...) 1. O requerente apresentou pedido de protecção internacional a 15/10/2022 no Gabinete de Asilo e Refugiados, que foi registado sob o número de processo 1640/22. 2. Nos termos previstos no Regulamento (EU) nº 603/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Junho (Regulamento Eurodac), relativo à criação do sistema “Eurodac” foram recolhidas as impressões digitais de todos os dedos. 3. Após registo e consulta à base de dados Eurodac, foram recepcionados dois acertos com os “...”, inserido pela Grécia, “...”, inserido pela Alemanha. (...) 7. Aos 28/10/2022, requerente apresentou alegações que fazem parte integrante dos autos. 8. O requerente alega nos seguintes termos: (...) 9. Analisadas as alegações (cf. folhas 79 a 81), verifica-se que o requerente não apresenta matéria de facto relevante para pôr em causa a aplicação no caso em apreço dos critérios enunciados no Capítulo III do Regulamento (UE) Nº 604/2013 do PE e do Conselho de 26 de Junho e consequente transferência para a Alemanha. Senão vejamos, 10. As alegações apresentadas pelo requerente incidem sobre alguns esclarecimentos relativamente às declarações prestadas, nomeadamente sobre: existência de membros da família que sejam requerentes de protecção internacional em algum membro da União Europeia; se saiu sozinho ou acompanhado; percurso efectuado desde o país de origem até chegar a Portugal; motivos pelos quais solicita protecção internacional; refere ainda que tenham em conta os esclarecimentos no seu requerimento sobre o decurso do procedimento, pois considera que os seus direitos não foram respeitados; refere ainda que teve problemas na Alemanha com outro cidadão paquistanês; por fim, refere que teme o refoulement, devido aos problemas durante a instrução do seu pedido na Alemanha, não confiando que os seus motivos sejam devidamente analisados. 11. A circunstância de o seu processo ter chegado a uma conclusão definitiva na Alemanha, não invalida o facto de que o pedido de protecção internacional do requerente ter sido apresentado perante as autoridades daquele país, devendo, portanto, ser a Alemanha a analisar o mérito do mesmo. Aliás, 12. O critério que determina a decisão de inadmissibilidade do seu pedido e consequente transferência para a Alemanha é precisamente o constante do artigo 18º, nº 1, d) do Regulamento (UE) Nº 604/2013 do PE e do Conselho de 26 de Junho, relevando apenas o facto de o requerente ter apresentado outro pedido de protecção internacional junto da Alemanha e de este ter sido indeferido por aquele país. 13. Pelo que a análise de mérito do pedido deverá ser concluída na Alemanha, determinando os critérios enunciados no Capítulo III do Regulamento (UE) Nº 604/2013 do PE e do Conselho de 26 de Junho que este é o país responsável pela mesma. 14. Atendendo a que a Alemanha se rege pelos mesmos princípios internacionais orientadores e normas europeias que Portugal, e que é à Alemanha que cabe a análise de mérito do presente caso, devemos considerar a situação em apreço devidamente analisada à luz do princípio do non refoulement. 15. Em resposta às perguntas “Que diligencias foram feitas no âmbito desse pedido?” o requerente declarou o seguinte: “Na Alemanha tiraram as minhas impressões digitais e deram-me um documento comprovativo do pedido de asilo”; “Qual a razão de ter saído da Alemanha?”, declarou o seguinte: “Saí da Alemanha porque disseram-me que a decisão era negativa”. 16. O requerente durante as declarações prestadas nunca fez menção à situação agora descrita em sede alegações relativamente ao decurso do seu pedido de protecção internacional na Alemanha. 17. Nas alegações apresentadas, o requerente menciona que possui um familiar na Alemanha, nomeadamente um primo, que solicitou protecção internacional neste país, o que se poderá revelar benéfico para o requerente pois terá suporte familiar neste Estado-Membro. 18. Acresce ainda que a Alemanha garante a protecção de pessoas vulneráveis, de acordo com a Directiva 2013/33/UE do PE e do Conselho de 26 de Junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de protecção internacional nos seus artigos 17º, nº 2 e 21º e ss., encontrando-se devidamente transposta para a ordem interna, pelo que o apoio médico necessário se encontra garantido naquele país. 19. Sendo ainda certo que, antes da efectivação da transferência, caso se verifiquem questões de saúde e vulnerabilidades relevantes que deverão ser do conhecimento das autoridades receptoras na Alemanha, estas informações serão atempadamente incluídas no formulário tipo para o efeito, designado anexo IX, e enviadas às autoridades em questão, para que se efectue a devida preparação de meios adequados à recepção do requerente. Assim, 20. Verifica-se que os elementos apresentados pelo requerente não obstam à aplicação dos critérios enunciados no Capítulo III do Regulamento (UE) Nº 604/2013 do PE e do Conselho de 26 de Junho e consequente transferência para a Alemanha, nem consubstanciam uma probabilidade séria do mesmo, face à sua situação concreta, sofrer um risco de tratamento desumano ou degradante, na acepção do artigo 4º da CDFUE, caso seja transferido para a Alemanha, nem que ocorram quaisquer circunstâncias pessoais especiais, que o tornem especialmente vulnerável, na acepção que tem vindo a ser concretizada pela jurisprudência do TJUE, a qual tem sido particularmente exigente na aplicação do §2 do nº 2 do artigo 3º do Regulamento Dublin III. 21. Aos 31/10/2022, o GAR apresentou um pedido de retoma a cargo às autoridades alemãs ao abrigo do artigo 18 nº 1 d) do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de Junho (Regulamento Dublin). 22. Aos 02/11/2022, as autoridades alemãs aceitaram o pedido de retoma a cargo o (a) cidadão (ã), ao abrigo do preceito legal referido no número anterior. 23. Aceite a responsabilidade peio Estado responsável deve o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras proferir uma decisão de inadmissibilidade do pedido. (...) Pelo exposto, e tendo em consideração que os pedidos são analisados por um único Estado, que será aquele que os critérios enunciados no Capítulo III do Regulamento (CE) Nº 604/2013 do Conselho de 26 de Junho designarem como responsável, propõe-se que a Alemanha seja considerada o Estado responsável pela retoma a cargo, ao abrigo do artigo artº 18 nº 1 d) do Regulamento (CE) Nº 604/2013 do Conselho de 26 de Junho.”; 12. Por despacho de 14/11/2022, proferido no processo nº ...15... o Director Nacional do SEF emitiu a seguinte decisão (cfr. fls. 96 do PA): “(...) De acordo com o disposto na alínea a) do nº 1, do artigo 19º-A, e no nº 2 do artigo 37º, ambos da Lei nº 27/08, de 30 de Junho, alterada pela Lei nº 26/14 de 05 de Maio, com base na informação nº ...22 do Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, considero o pedido de protecção internacional apresentado pelo cidadão que se identificou como «AA», nacional do Paquistão, inadmissível. Proceda-se à notificação do cidadão nos termos do artigo 37º, nº 3, da Lei nº 27 /08 de 30 de Junho, com as alterações introduzidas pela Lei 26/14 de 5 de Maio, e à sua transferência, nos termos do artigo 38º do mesmo diploma, para a Alemanha, Estado Membro responsável pela análise do pedido de protecção internacional nos termos do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de Junho. (...)”. 13. Em 15/11/2022, o autor tomou conhecimento da decisão descrita na alínea antecedente (cfr. cópia da certidão de notificação a fls. 111 do PA). * FACTOS NÃO PROVADOS Inexistem factos que cumpra julgar não provados com interesse para a decisão da causa. * MOTIVAÇÃO A convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, referidos em cada um dos números do probatório, concretamente, os documentos constantes do processo administrativo e os documentos juntos pelas partes, conjugados com a sua vontade concordante, nos termos expressamente referidos no final de cada facto.” ** IIIii – DE DIREITO Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 23 de janeiro de 2023, que com referência ao pedido formulado pelo Autor a final da Petição inicial, julgou pela sua total improcedência. Os recursos jurisdicionais constituem os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, razão pela qual é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso, os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu. Cumpre apreciar e decidir. Conforme assim deflui das conclusões das Alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente, o cerne da sua pretensão recursiva encerra-se na sua discordância face ao decidido pelo Tribunal a quo em torno de que “… à data da apresentação do pedido de proteção internacional, a Alemanha já não tinha qualquer responsabilidade pelo Requerente, ora Recorrente.”, e que nessa data “… Portugal era, à data da apresentação do pedido subsequente, e é atualmente, o Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional do ora Recorrente.”, facto este atinente à “alteração de responsabilidades entre Estados.”, que foi ignorado pelo Tribunal a quo, e que dessa forma, ao ter caucionado “… o ato impugnado, sem ordenar a realização de qualquer diligência instrutória adicional, viola também [o Tribunal a quo] o disposto na alínea z) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, na sua atual redação, e, por essa via, o disposto no n.º 8 do artigo 33.º da Constituição.” Coloca-se assim a este Tribunal de recurso a questão de saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento em matéria de direito por ter julgado não padecer o acto impugnado de qualquer das invalidades apontadas na Petição inicial, assim como da violação do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea z) da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho e por essa via, violado também o disposto no artigo 33.º, n.º 8 da CRP. Atentemos pois no teor da essencialidade da fundamentação da decisão proferida pelo Tribunal a quo, nos termos que para aqui extractamos como segue: Início da transcrição “[…] Do quadro normativo convocado, nomeadamente, do disposto nos artigos 19º-A, nº 1, alínea a), 36º e 39º da Lei do Asilo, resulta que, nas situações em que, por aplicação dos critérios previstos no Regulamento Dublin, se considere que a responsabilidade pela análise do pedido de protecção internacional pertence a outro Estado Membro, incumbe ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) dar início ao procedimento especial, regulado nos artigos 37º a 39º da Lei do Asilo, podendo requerer a esse Estado Membro a retoma a cargo do requerente de protecção internacional, o que sucedeu no caso em apreciação. Na hipótese de aceitação da retoma a cargo pelo Estado Membro requerido, cabe ao Director Nacional do SEF, proferir a decisão a que aludem os artigos 26º, nº 1 deste Regulamento e 37º, nº 2 da Lei do Asilo, considerando inadmissível o pedido de protecção internacional, nos termos dos artigos 19º-A, nº 1, alínea a), e 20º da Lei do Asilo, e determinando a transferência do requerente para o Estado Membro responsável, a executar nos termos do artigo 38º do mesmo diploma, caso em que, nos termos do artigo 19º-A, nº 2 da Lei do Asilo, se prescinde da análise relativa ao mérito do pedido, ou seja, “das condições a preencher para beneficiar do estatuto de protecção internacional”. O regime consagrado neste Regulamento de Dublin, concretamente a solução preconizada no seu artigo 3º, nº 1 e nº 2, §1, pretende assegurar, nomeadamente, que a protecção internacional de um nacional de um país terceiro ou de um apátrida, dentro do espaço da União Europeia, é analisada de forma efectiva e célere, impedindo que vários Estados Membros se ocupem da mesma questão em simultâneo ou que possam mesmo proferir decisões contraditórias. Para tanto, procede à hierarquização de critérios de determinação do Estado Membro responsável pela análise do pedido de protecção internacional. Acresce que, no quadro do sistema europeu comum de asilo, que assenta no princípio da confiança mútua entre os Estados Membros, deve presumir-se que o tratamento dado por um Estado Membro aos requerentes de protecção internacional está em conformidade com as exigências da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, da Convenção de Genebra de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados, bem como, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, sem prejuízo dos casos em que este sistema se depare, na prática, com grandes dificuldades de funcionamento, em termos que permitam perspectivar a ocorrência de um sério risco de sujeição dos requerentes a condições incompatíveis com a proibição absoluta de tratamento desumano ou degradante (cfr., neste sentido, entre outros, os Acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia de 21/12/2011, proferido no âmbito dos processos apensos nº C-411/10 e C-493/10, e de 19/03/2019, proferido no âmbito do processo nº C-163/17, disponíveis para consulta em www.curia.europa.eu). Na situação sub judice, resultou provado que, no dia 15/10/2022, o autor requereu protecção internacional junto do Gabinete de Asilo e Refugiados (GAR) do SEF e que, por consulta à base de dados do sistema Eurodac, foi verificado o registo das impressões digitais do autor na Grécia e na Alemanha (cfr. pontos 3 e 7 do probatório). Provou-se também que, na entrevista realizada em 23/10/2022, o autor declarou que saiu do Paquistão em 2016, de seguida foi para o Irão, a Turquia e entrou no espaço da UE pela Grécia, em Fevereiro de 2017, onde ficou 4 meses num centro de instalação de refugiados e pediu asilo. Após decisão negativa do seu pedido de asilo, passou pela Macedónia e Sérvia, onde ficou mais dois anos num campo de refugiados. De seguida, passou pela Croácia, Eslovénia e depois para a Itália, França e Alemanha, onde chegou em Setembro de 2020 e apresentou novo pedido de asilo. Na Alemanha foi informado de que o seu pedido de asilo não seria aceite e que retornaria à Grécia, decisão da qual recorreu, mas cujo desfecho desconhece, pois em Março de 2021 regressou a França. Por último, esteve em Espanha cerca de quatro meses e veio para Portugal, aproximadamente, em Julho de 2022. Declarou, ainda, que na Alemanha lhe foi providenciado alojamento, comida e um subsídio mensal de cerca de 400 €. […] Com efeito, compulsado o probatório, constata-se que, anteriormente a ter solicitado protecção internacional ao Estado Português, o autor também requereu protecção internacional na Alemanha, e que no dia 31/10/2022, os serviços do GAR remeteram às autoridades alemãs um pedido de retoma a cargo do autor, o qual foi expressamente aceite, pelas autoridades alemãs, no dia 02/11/2022, ao abrigo do artigo 18º, nº 1, alínea d) do Regulamento Dublin (cfr. pontos 4 a 6 do probatório). Alega o autor que existe um deficit de instrução no que concerne aos factos inerentes à decisão de inadmissibilidade do pedido de protecção internacional formulado, e consequente decisão de transferência para Alemanha. Porém, desde já, se adianta que não lhe assiste razão. Vejamos. Na entrevista, e também em sede de requerimento para prestação de “clarificações e correcções” às suas declarações, o autor afirmou que, durante o período em que permaneceu na Alemanha, foi entrevistado no âmbito do procedimento de protecção internacional, deram-lhe um documento comprovativo do pedido de asilo, beneficiou de apoio monetário, de alojamento e alimentação. Mais referiu que saiu desse Estado Membro porque foi informado de que a decisão do seu pedido de protecção internacional era negativa, e que pediu protecção internacional ao Estado português porque “Quero viver Portugal para ter uma oportunidade de salvar a minha vida. Quem tem problemas, no Paquistão com a polícia secreta, é recrutado e treinado para ir combater com os militares.” As circunstâncias - algo contraditórias, de só em requerimento formulado pelo autor para prestação de “clarificações e correcções” às suas declarações (o que ocorreu após ter tido conhecimento de que o sentido provável da decisão seria o de inadmissibilidade do pedido de protecção internacional apresentado ao Estado Português e consequente transferência para a Alemanha), e na petição inicial, vir alegar que nunca foi entrevistado na Alemanha e que, durante a sua permanência na Alemanha “teve um problema com um outro cidadão paquistanês” e que “Face aos problemas que enfrentou durante a instrução do seu procedimento de asilo na Alemanha, o requerente não crê poder confiar que os seus motivos sejam devidamente analisados no âmbito de um pedido de protecção internacional.”, não são suficientemente concretizadas, não sendo sequer acompanhadas de relatos relevantes ou outros contextos pessoais especiais (designadamente, idade, sexo, pertença a um grupo social especialmente vulnerável, percurso do autor) que tenham ocorrido durante o período em que esteve na Alemanha, que tornem a transferência um risco de colocação numa situação desumana ou degradante, na acepção que lhe vem sendo dada pela jurisprudência, em concretização do artigo 4º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Ao invés, frise-se que, conforme relatado pelo autor, no período em que residiu na Alemanha, recebeu apoio a vários níveis, designadamente, apoio monetário, alojamento e alimentação, o que evidencia à saciedade que, em resultado da tomada a cargo, o Estado Alemão não o vai tratar de forma desumana ou degradante. Esse limiar de gravidade particularmente elevado é alcançado quando a indiferença das autoridades de um Estado-Membro tiver por consequência que uma pessoa completamente dependente do apoio público se encontre, independentemente da sua vontade e das suas escolhas pessoais, numa situação de privação material extrema, que não lhe permita fazer face às suas necessidades mais básicas, como, nomeadamente, alimentar-se, lavar-se e ter alojamento, e que atente contra a sua saúde física ou mental ou a coloque num estado de degradação incompatível com a dignidade humana (cfr., neste sentido, TEDH, 21/01/2011, M.S.S. c. Bélgica e Grécia, CE:ECHR:2011:0121JUD003069609, §§ 252 a 263). Como tal, o referido limiar não pode abranger situações que se caracterizem por uma grande precariedade ou uma forte degradação das condições de vida da pessoa em causa, quando estas não impliquem uma privação material extrema que coloque a pessoa numa situação de gravidade tal que possa ser equiparada a um trato desumano ou degradante. No caso dos autos, o autor refere apenas, de forma genérica e sem qualquer concretização, “problemas que enfrentou durante a instrução do seu procedimento de asilo na Alemanha” e, na petição inicial, alude à falta de aferição, pela entidade demandada, de saber se “tendo em conta a actual conjuntura que se vive na Europa, fruto do número de refugiados resultantes da guerra na Ucrânia, a Alemanha está em condições de garantir toda a dignidade humana e todos os Direitos ao Autor”, remetendo para notícia jornalística que alude ao elevado número de refugiados esperados na Alemanha, sem que de tal número decorra, ou possa decorrer, a presunção de que os mesmos irão ser sujeitos a trato humano ou degradante. Pelo contrário, parece ser de reconhecer o esforço que tal País, como outros, na União Europeia e no Mundo, têm levado a cabo para acolher esses refugiados. Por outro lado, não existe notícia, nem é público e notório, que existam na Alemanha falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento por este Estado. Assim sendo, não se impunha à entidade demandada um qualquer dever acrescido de instrução, não resultando dos autos que a transferência do autor para a Alemanha comporte um risco real e comprovado de ser sujeito a um tratamento desumano ou degradante. * No que se refere à invocada aplicação do regime do artigo 13º, nº 2 do Regulamento de Dublin, há que dizer que o mesmo também carece de aplicação ao caso dos autos. Determina a citada norma legal que: “Quando um Estado-Membro não possa ser ou já não possa ser tido como responsável nos termos do nº 1 do presente artigo e caso se comprove, com base nos elementos de prova ou indícios descritos nas duas listas referidas no artigo 22º, nº 3, que o requerente - que entrou nos territórios dos Estados-Membros ilegalmente ou em circunstâncias que não é possível comprovar - permaneceu num Estado-Membro durante um período ininterrupto de pelo menos cinco meses antes de apresentar o seu pedido de protecção internacional, esse Estado-Membro é responsável pela análise do pedido de protecção internacional.” (destaque meu). Decorre do preceito que, a primeira condição da sua aplicabilidade é que, tendo o requerente de protecção internacional passado por diversos países da UE, em nenhum deles tenha solicitado protecção internacional, ou tenham corrido trâmites legais e formais, o que não sucede no caso dos autos, já que o ora autor apresentou pedido de protecção internacional na Alemanha e as autoridades alemãs aceitaram o pedido de retoma a cargo formulado pelas autoridades portuguesas. E, assim sendo, preenchidos os pressupostos do artigo 18º, nº 1, alínea d) do Regulamento de Dublin, cumpre concluir que o Director Nacional do SEF, de acordo com o bloco normativo supra referido, de nenhuma outra solução dispunha que não a de determinar a transferência do autor para a Alemanha, tal como decorre do supra citado artigo 37º, nº 2 da Lei do Asilo. […]” Fim da transcrição Ou seja, depois de ter fixado a matéria de facto que segundo a sua livre apreciação era fundamental para a formação da sua convicção em torno de uma solução de direito, assim como de decidir pela inexistência de outra factualidade relevante para a apreciação do mérito dos autos, o Tribunal a quo convocou e apreciou o direito aplicável na situação em apreço, tendo vindo a julgar que por estarem preenchidos os pressupostos a que se reporta o artigo 18.º, n.º 1, alínea d) do Regulamento de Dublin [Regulamento (EU) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho], e que em face do bloco de juridicidade em apreço, o Director Nacional do SEF não dispunha de nenhuma outra solução que não fosse a de determinar a transferência do Autor para a Alemanha, na decorrência do disposto no artigo 37.º, n.º 2 da Lei do Asilo [Lei n.º 27/2008, de 30 de junho]. E este julgamento assim prosseguido pelo Tribunal recorrido não é merecedor de nenhuma censura jurídica, devendo assim ser mantida a Sentença recorrida. Desde logo, atentemos que o julgamento em torno da matéria de facto, tirado pelo Tribunal a quo não foi objecto de recurso, pelo que, como assim julgamos, com o assim apreciado e decidido se conformou o ora Recorrente. Tendo o julgamento prosseguido em matéria de direito assentado nessa factualidade constante do probatório, e na concreta medida em que o Tribunal a quo julgou que a decisão do Director Nacional do SEF, em face do que resultou da instrução do procedimento administrativo, se traduz num acto estritamente vinculado, atentas as conclusões das Alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente, delas não se retira qual deva/deveria ser, a final e na sua perspectiva, o sentido decisório que devia ser tomado em face dos termos e pressupostos congregados pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e sobre que recaiu o despacho do seu Director Nacional datado de 14 de novembro de 2022. Com referência a essa decisão do Director Nacional do SEF, o Tribunal a quo julgou que a mesma não padece de nenhuma invalidade, cujos termos e pressupostos foram explicitados, e que assentam, em suma, em que (i) o pedido de protecção internacional apresentado pelo Autor ora Recorrente foi considerado inadmissível, e que (ii) foi determinada a sua transferência para a Alemanha, que é o Estado Membro responsável pela análise do pedido de protecção internacional nos termos do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de Junho. A Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho (Lei do asilo), com as alterações introduzidas pela Lei n.º 26/2014, de 05 de maio - que a republicou -, e pela Lei n.º 18/2022, de 25 de agosto, veio estabelecer as condições e procedimentos de concessão de asilo ou proteção subsidiária, assim como os estatutos de requerente de asilo, de refugiado e de proteção subsidiária, transpondo assim para esse efeito as Diretivas n.ºs 2004/83/CE, do Conselho, de 29 de abril, 2005/85/CE, do Conselho, de 01 de dezembro, 2011/95/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro, 2013/32/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, e 2013/33/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho. Por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui se extrai parte da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho [actual redacção], como segue: “Artigo 3.º Concessão do direito de asilo “1 - É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência de atividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana. 2 - Têm ainda direito à concessão de asilo os estrangeiros e os apátridas que, receando com fundamento ser perseguidos em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em por esse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual. 3 - O asilo só pode ser concedido ao estrangeiro que tiver mais de uma nacionalidade quando os motivos de perseguição referidos nos números anteriores se verifiquem relativamente a todos os Estados de que seja nacional. 4 - Para efeitos do n.º 2, é irrelevante que o requerente possua efectivamente a característica associada à raça, religião, nacionalidade, grupo social ou político que induz a perseguição, desde que tal característica lhe seja atribuída pelo agente da perseguição.”. [...] Artigo 13º Apresentação do pedido 1 - O estrangeiro ou apátrida que entre em território nacional a fim de obter proteção internacional deve apresentar sem demora o seu pedido ao SEF ou a qualquer outra autoridade policial, podendo fazê-lo por escrito ou oralmente, sendo neste caso lavrado auto. 2 - Qualquer autoridade policial que receba o pedido referido no n.º 1 remete-o ao SEF no prazo de quarenta e oito horas. 3 - O SEF informa imediatamente o representante do ACNUR e o Conselho Português para os Refugiados (CPR) enquanto organização não governamental que atue em seu nome da apresentação do pedido de proteção internacional, podendo estes contactar o requerente logo após a receção de tal comunicação com o objetivo de o informar sobre o respetivo procedimento, bem como sobre a sua possível intervenção no mesmo, a qual depende de consentimento do requerente. 4 - O requerente pode solicitar, até à decisão do pedido de proteção internacional, a sua extensão aos membros da família que o acompanhem, quer sejam menores ou maiores, devendo, neste caso, o pedido ser precedido de consentimento prévio expresso das pessoas a cargo, sob pena de inadmissibilidade. 5 - Antes de ser solicitado o consentimento prévio a que se refere o número anterior, os membros da família devem ser informados, em privado, das consequências processuais relevantes da apresentação de um pedido em seu nome e do direito que lhes assiste de apresentar um pedido de proteção internacional separado. 6 - O requerente menor pode apresentar um pedido em seu nome. 7 - O SEF procede ao registo do pedido de proteção internacional no prazo de três dias úteis após a apresentação do mesmo. [...] Artigo 15.º Deveres dos requerentes de protecção internacional 1 - O requerente deve apresentar todos os elementos necessários para justificar o pedido de asilo, nomeadamente: a) Identificação do requerente e dos membros da sua família; b) Indicação da sua nacionalidade, país ou países e local ou locais de residência anteriores; c) Indicação de pedidos de proteção internacional anteriores; d) Relato das circunstâncias ou factos que fundamentam a necessidade de proteção internacional. e) Permitir a recolha das impressões digitais de todos os dedos, desde que tenha, pelo menos, 14 anos de idade, nos termos previstos no Regulamento (UE) n.º 603/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, relativo à criação do sistema “Eurodac” de comparação de impressões digitais; f) Manter o SEF informado sobre a sua residência, devendo imediatamente comunicar a este serviço qualquer alteração de morada; g) Comparecer perante o SEF quando para esse efeito for solicitado, relativamente a qualquer circunstância do seu pedido. 2 - Para efeitos do disposto no número anterior, deve ainda o requerente, juntamente com o pedido de asilo, apresentar os documentos de identificação e de viagem de que disponha, bem como elementos de prova, podendo apresentar testemunhas em número não superior a 10.”. […] Artigo 19.º-A Pedidos inadmissíveis 1 - O pedido é considerado inadmissível, quando se verifique que: a) Está sujeito ao procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional, previsto no capítulo IV; [sublinhado nosso] b) Beneficia do estatuto de proteção internacional noutro Estado membro; c) Um país que não um Estado membro é considerado primeiro país de asilo; d) Um país que não um Estado membro é considerado país terceiro seguro; e) Foi apresentado um pedido subsequente em que não surgiram nem foram apresentados novos elementos ou dados relacionados com a análise do cumprimento das condições para beneficiar de proteção internacional; f) Foi apresentado um pedido por uma pessoa a cargo do requerente, depois de ter consentido que um anterior pedido fosse apresentado em seu nome e não existam elementos que justifiquem um pedido separado. 2 - Nos casos previstos no número anterior, prescinde-se da análise das condições a preencher para beneficiar do estatuto de proteção internacional.“ [sublinhado nosso]. Ora, dispõe o artigo 36.º da Lei do asilo [Lei n.º 27/2008], que quando haja lugar à determinação do Estado responsável pela análise de um pedido de proteção internacional, é organizado um procedimento especial, sendo que, este procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de asilo encontra-se regulado no seu Capítulo IV [compreendendo os seus artigos 36.º a 40.º.], sendo que, por seu turno, dispõe o artigo 37.º do mesmo diploma, sobre qual o Estado territorialmente competente para efeitos de apreciação do pedido de asilo. Por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui se extrai o referido artigo 37.º, sob a epígrafe “Pedido de protecção internacional apresentado em Portugal”, como segue: “1 - Quando se considere que a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional pertence a outro Estado membro, de acordo com o previsto no Regulamento (UE) n.º 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, o SEF solicita às respetivas autoridades a sua tomada ou retoma a cargo. [sublinhado nosso] 2 - Aceite a responsabilidade pelo Estado requerido, o diretor nacional do SEF profere, no prazo de cinco dias, decisão nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 19.º- A e do artigo 20.º, que é notificada ao requerente, numa língua que compreenda ou seja razoável presumir que compreenda, e é comunicada ao representante do ACNUR e ao CPR enquanto organização não governamental que atue em seu nome, mediante pedido apresentado, acompanhado do consentimento do requerente. [sublinhado nosso] 3 - A notificação prevista no número anterior é acompanhada da entrega ao requerente de um salvo-conduto, a emitir pelo SEF segundo modelo a aprovar por portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna. 4 - A decisão proferida pelo diretor nacional do SEF é suscetível de impugnação jurisdicional perante os tribunais administrativos no prazo de cinco dias, com efeito suspensivo. 5 - À impugnação jurisdicional referida no número anterior são aplicáveis a tramitação e os prazos previstos no artigo 110.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, com exceção do disposto no respetivo n.º 3. 6 - O recurso jurisdicional das decisões respeitantes à impugnação jurisdicional referida no n.º 4 tem efeito suspensivo. 7 - Em caso de resposta negativa do Estado requerido ao pedido formulado pelo SEF, nos termos do n.º 1, observar-se-á o disposto no capítulo III.”. Com interesse para a decisão a proferir, também para aqui se extraem normativos do referido Regulamento (UE) n.º 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, como segue: “[...] Artigo 3.º Acesso ao procedimento de análise de um pedido de proteção internacional 1. Os Estados-Membros analisam todos os pedidos de proteção internacional apresentados por nacionais de países terceiros ou por apátridas no território de qualquer Estado-Membro, inclusive na fronteira ou nas zonas de trânsito. Os pedidos são analisados por um único Estado-Membro, que será aquele que os critérios enunciados no Capítulo III designarem como responsável. [sublinhado nosso]. 2. Caso o Estado-Membro responsável não possa ser designado com base nos critérios enunciados no presente regulamento, é responsável pela análise do pedido de proteção internacional o primeiro Estado-Membro em que o pedido tenha sido apresentado. Caso seja impossível transferir um requerente para o Estado-Membro inicialmente designado responsável por existirem motivos válidos para crer que há falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos requerentes nesse Estado-Membro, que impliquem o risco de tratamento desumano ou degradante na aceção do artigo 4.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o Estado-Membro que procede à determinação do Estado-Membro responsável prossegue a análise dos critérios estabelecidos no Capítulo III a fim de decidir se algum desses critérios permite que outro Estado-Membro seja designado responsável. Caso não possa efetuar-se uma transferência ao abrigo do presente número para um Estado-Membro designado com base nos critérios estabelecidos no Capítulo III ou para o primeiro Estado-Membro onde foi apresentado o pedido, o Estado-Membro que procede à determinação do Estado-Membro responsável passa a ser o Estado-Membro responsável. 3. Os Estados-Membros mantêm a faculdade de enviar um requerente para um país terceiro seguro, sem prejuízo das regras e garantias previstas na Diretiva 2013/32/UE.”. [...] Artigo 7.º Hierarquia dos critérios 1. Os critérios de determinação do Estado-Membro responsável aplicam-se pela ordem em que são enunciados no presente capítulo. A determinação do Estado-Membro responsável em aplicação dos critérios enunciados no presente capítulo é efetuada com base na situação existente no momento em que o requerente tiver apresentado pela primeira vez o seu pedido de proteção internacional junto de um Estado-Membro. [sublinhado nosso]. 2. Para a aplicação dos critérios referidos nos artigos 8.º 10.º, e 16.º, os Estados-Membros devem ter em consideração todos os elementos de prova disponíveis que digam respeito à presença, no território de um Estado-Membro, de membros da família, de familiares ou de outros parentes do requerente, na condição de tais elementos de prova serem apresentados antes de outro Estado-Membro ter aceitado o pedido de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa, nos termos dos artigos 22.º e 25.º, respetivamente, e de os anteriores pedidos de protecção internacional do requerente não terem sido ainda objecto de uma primeira decisão quanto ao mérito.”. [...] Artigo 12.º Emissão de documentos de residência ou vistos 1. Se o requerente for titular de um título de residência válido, o Estado- Membro que o tiver emitido é responsável pela análise do pedido de proteção internacional. 2. Se o requerente for titular de um visto válido, o Estado-Membro que o tiver emitido é responsável pela análise do pedido de proteção internacional, salvo se o visto tiver sido emitido em nome de outro Estado-Membro ao abrigo de um acordo de representação conforme previsto no artigo 8.º do Regulamento (CE) n.º 810/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece o Código Comunitário de Vistos (1). Nesse caso, é o Estado-Membro representado o responsável pela análise do pedido de proteção internacional. [sublinhado nosso]. 3. Se o requerente for titular de vários títulos de residência ou de vários vistos válidos, emitidos por diferentes Estados-Membros, o Estado-Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional é, pela seguinte ordem: a) O Estado-Membro que tiver emitido o título de residência que confira o direito de residência mais longo ou, caso os títulos tenham períodos de validade idênticos, o Estado-Membro que tiver emitido o título de residência cuja validade cesse mais tarde; b) O Estado-Membro que tiver emitido o visto cuja validade cesse mais tarde, quando os vistos forem da mesma natureza; c) Em caso de vistos de natureza diferente, o Estado-Membro que tiver emitido o visto com um período de validade mais longo ou, caso os períodos de validade sejam idênticos, o Estado-Membro que tiver emitido o visto cuja validade cesse mais tarde. 4. Se o requerente apenas for titular de um ou mais títulos de residência caducados há menos de dois anos, ou de um ou mais vistos caducados há menos de seis meses, que lhe tenham efetivamente permitido a entrada no território de um Estado- Membro, são aplicáveis os n.ºs 1, 2 e 3 enquanto o requerente não abandonar o território dos Estados-Membros. Se o requerente for titular de um ou mais títulos de residência caducados há mais de dois anos, ou de um ou mais vistos caducados há mais de seis meses, que lhe tenham efetivamente permitido a entrada no território de um Estado-Membro, e se não tiver abandonado o território dos Estados-Membros, é responsável o Estado-Membro em que o pedido de proteção internacional for apresentado. 5. A circunstância de o título de residência ou o visto ter sido emitido com base numa identidade fictícia ou usurpada ou mediante a apresentação de documentos falsos, falsificados ou não válidos, não obsta à atribuição da responsabilidade ao Estado-Membro que o tiver emitido. Todavia, o Estado-Membro que tiver emitido o título de residência ou o visto não é responsável, se puder provar que a fraude ocorreu posteriormente a essa emissão. Artigo 13.º Entrada e/ou estadia 1. Caso se comprove, com base nos elementos de prova ou nos indícios descritos nas duas listas referidas no artigo 22.º , n.º 3, do presente regulamento, incluindo os dados referidos no Regulamento (UE) n.º 603/2013, que o requerente de asilo atravessou ilegalmente a fronteira de um Estado-Membro por via terrestre, marítima ou aérea e que entrou nesse Estado-Membro a partir de um país terceiro, esse Estado-Membro é responsável pela análise do pedido de proteção internacional. Essa responsabilidade cessa 12 meses após a data em que teve lugar a passagem ilegal da fronteira. 2. Quando um Estado-Membro não possa ser ou já não possa ser tido como responsável nos termos do n.º 1 do presente artigo e caso se comprove, com base nos elementos de prova ou indícios descritos nas duas listas referidas no artigo 22.º , n.º 3, que o requerente – que entrou nos territórios dos Estados-Membros ilegalmente ou em circunstâncias que não é possível comprovar – permaneceu num Estado-Membro durante um período ininterrupto de pelo menos cinco meses antes de apresentar o seu pedido de proteção internacional, esse Estado-Membro é responsável pela análise do pedido de proteção internacional. Se o requerente tiver permanecido durante períodos de pelo menos cinco meses em vários Estados-Membros, o Estado-Membro em que tal ocorreu mais recentemente é responsável pela análise do pedido de proteção internacional.“ [...] Artigo 18.º Obrigações do Estado-Membro responsável 1. O Estado-Membro responsável por força do presente regulamento é obrigado a: [sublinhado nosso]. a) Tomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 21.º, 22.º e 29.º, o requerente que tenha apresentado um pedido noutro Estado-Membro; b) Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.º , 24.º , 25.º e 29.º, o requerente cujo pedido esteja a ser analisado e que tenha apresentado um pedido noutro Estado-Membro, ou que se encontre no território de outro Estado-Membro sem possuir um título de residência; c) Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.º , 24.º , 25.º e 29.º, o nacional de um país terceiro ou o apátrida que tenha retirado o seu pedido durante o processo de análise e que tenha formulado um pedido noutro Estado-Membro, ou que se encontre no território de outro Estado-Membro sem possuir um título de residência; d) Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.º , 24.º , 25.º e 29.º, o nacional de um país terceiro ou o apátrida cujo pedido tenha sido indeferido e que tenha apresentado um pedido noutro Estado-Membro, ou que se encontre no território de outro Estado-Membro sem possuir um título de residência. [sublinhado nosso]. [...] Nos casos abrangidos pelo n.º 1, alínea d), se o pedido tiver sido indeferido apenas na primeira instância, o Estado-Membro responsável assegura que a pessoa em causa tenha, ou tenha tido, a oportunidade de se valer de recurso efetivo nos termos do artigo 46.º da Diretiva 2013/32/UE.“ Ora, o Requerente, sendo cidadão do Paquistão, encontrava-se em situação de permanência irregular em território nacional na data em que foi detido, sendo que, nessa sequência e precedendo decisão judicial datada de 14 de outubro de 2022, foi colocado em centro de instalação temporária, tendo em 15 de outubro de 2022 vindo a apresentar pedido de proteção internacional junto do SEF, no Gabinete de Asilo e Refugiados, onde veio a prestar declarações e das quais se retira, em suma, que saíu do seu país no ano de 2016, tendo passado por vários países, e entre o mais, que já tinha apresentado pedido de protecção internacional na Alemanha. Tendo presente o quadro normativo aplicável, acima enunciado, é incontornável que nos termos das disposições conjugadas dos artigos 3.º e 18.º do Regulamento (UE) 604/2013, os pedidos de proteção internacional devem ser analisados e decididos por um único Estado-Membro responsável, o qual é determinado segundo os critérios enunciados no seu Capítulo III. Como assim resulta do probatório, o Autor ora Recorrente já tinha apresentado pedido de proteção internacional na Alemanha, tendo referido no GAR do SEF que a decisão foi negativa, e que veio a viajar para Portugal, onde apresentou outro pedido de proteção internacional. [Cfr. ponto 4 do probatório], sendo assim manifesta a inaplicabilidade do disposto no artigo 13.º, n.º 2 do Regulamento (UE) 604/2013. Resultou também provado que no dia 30 de outubro de 2022 o GAR apresentou pedido de retoma do Recorrente a cargo das autoridades Alemãs, o que foi por elas aceite no dia 02 de novembro de 2022 [Cfr. pontos 5 e 6 do probatório]. Neste patamar. Tendo presente o disposto no Regulamento n.º 604/2013, apenas um Estado Membro é responsável pela análise de um pedido de protecção internacional, o qual será o primeiro Estado-membro onde o mesmo tenha sido apresentado, tendo aplicação o disposto no artigo 18.º, n.º 1, alínea d), do referido Regulamento, que impõe a retoma do requerente a cargo do Estado Membro onde foi proferida a decisão de recusa de proteção internacional. Ora, tendo as autoridades Alemâs aceitado retomar a cargo o Autor ora Recorrente, não estão reunidos os pressupostos para efeitos da apreciação em Portugal do pedido de asilo por ele formulado em território nacional, no GAR do SEF, pois que a responsabilidade pela análise do mesmo é daquelas autoridades, que de resto a aceitaram. Efcetivamente, tendo o Requerente respondido às questões que lhe foram colocadas no GAR, por forma a averiguar os termos da sua chegada a território português e que estão na base do pedido de asilo, e não sendo detentor de quaisquer documentos, foi com base nas suas declarações e nos demais elementos de prova constantes das bases de dados [EURODAC], que o SEF pôde analisar, investigar e aprofundar o pressuposto da decisão a tomar, sendo que, em face do conhecimento de que foi a Alemanha 1.º país onde entrou e que aceitou a sua retoma, logo a partir daí se conclui que nada mais pode ser prosseguido por parte do Estado Português, sendo assim manifesto que a pretensão do Autor ora Recorrente não podia proceder, e nenhuma outra instrução adicional se mostrava como de prossecução necessária, mesmo que perspectivada sob os auspícios do princípio do inquisitório [Cfr. artigo 19.º-A, n.º 2 da Lei de Asilo]. Com efeito, sendo a Alemanha o Estado responsável, e que até aceitou a tomada a cargo, julgamos que a decisão sob impugnação não padece de censura jurídica, pois que, por um lado, não cabe ao Estado Português, in casu, ao SEF, a obrigação de analisar da existência de factos que preencham os requisitos de protecção internacional [quer os previstos no artigo 3.º do Regulamento (EU) n.º 604/2013, quer da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho], e por outro lado, quando em 31 de outubro de 2022 foi iniciado o procedimento especial de determinação do Estado responsável, nessa data, em que apenas se perfaziam 15 dias seguidos sobre o pedido apresentado pelo Requerente, o prazo a que se reporta o artigo 20.º, n.º 1 da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, suspendeu-se, até ao dia 14 de novembro de 2022, data em que foi tomada a decisão impugnada. O pedido de protecção internacional formulado pelo Requerente é assim inadmissível, como decidiu o Diretor Nacional do SEF [Cfr. artigo 19.º-A, n.º 1 da Lei de Asilo], porquanto o Estado Membro competente para a sua apreciação, é somente o Estado Alemão, sendo que, em torno da invocada violação da alínea z) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, e por arrasto, do disposto no artigo 33.º, n.º 8 da CRP, tal não ocorre, e de forma manifesta, pois que cabe à Alemanha apreciar os termos e os pressupostos para ser garantido asilo ao Autor ora Recorrente, como assim bem apreciou e fundamentou o Tribunal a quo na Sentença recorrida, pois que preenchidos que estavam os pressupostos do artigo 18.º, nº 1, alínea d) do Regulamento de Dublin, a decisão a proferir pelo Director Nacional do SEF era de sentido único, como assim decorre do artigo 37.º, n.ºs 1 e 2 da Lei de Asilo, em termos de ser determinada a transferência do Autor ora Recorrente para a Alemanha. Em suma, a posição sustentada pela Recorrente no âmbito das conclusões das suas Alegações, não tem qualquer suporte legal, seja na letra da lei, seja no domínio princípios, pelo que, forçoso é, pois, concluir que a Sentença recorrida não padece dos erros de julgamento que lhe são imputados pelo Recorrente, improcedendo assim a totalidade das conclusões das suas Alegações recursivas. * E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO: Descritores: Pedido de protecção internacional; Asilo; Retoma a cargo. 1 - Nos termos do artigo 18.º do Regulamento n.º 604/2013 do Conselho de 26 de Junho, o pedido de protecção internacional é apreciado e decidido por um único Estado Membro. 2 – Tendo sido apurado no âmbito da instrução do procedimento iniciado pelo Autor ora Recorrente, que antes de ter apresentado pedido de proteção internacional em Portugal, o mesmo tinha já apresentado anterior pedido junto de outro Estado Membro, nos termos dos artigos 3.º, n.ºs 1 e 2, e 18.º, n.º 1, alínea d), do Regulamento n.º 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, impõe-se a retoma do requerente a cargo desse outro Estado Membro. 3 - Tendo as autoridades Alemãs aceitado o pedido de retoma a cargo do Recorrente, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 18.º do Regulamento n.º 604/2013 do Conselho de 26 de Junho, é a este Estado que compete a instrução do procedimento de protecção internacional. *** IV – DECISÃO Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Recorrente «AA», e consequentemente, em manter a Sentença recorrida. * Sem custas, atento o disposto no artigo 84.º da Lei do Asilo. ** Notifique. * Porto, 21 de abril de 2023. Paulo Ferreira de Magalhães, relator Antero Salvador Helena Ribeiro |