Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00723/11.9BEBRG |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 11/23/2017 |
Tribunal: | TAF de Braga |
Relator: | Paula Moura Teixeira |
Descritores: | AEROGERADORES INSCRIÇÃO DE PRÉDIO NA MATRIZ IMPROPRIEDADE DO MEIO JUDICIAL |
Sumário: | A inscrição oficiosa na matriz de uma determinada realidade física, por ter sido qualificada como prédio, reconduz-se a acto imediatamente lesivo dado que provoca uma alteração significativa na esfera jurídica da recorrente, conferindo-lhe a qualidade de sujeito passivo de IMI e nessa qualidade o sujeitando a várias obrigações tributárias, nomeadamente declarativas e acessórias, incluindo a obrigação de imposto; relativamente a tal acto pode, portanto, em princípio, ser formulado pedido de anulação no âmbito de acção administrativa especial.* * Sumário elaborado pelo Relator. |
Recorrente: | Eólica..., S.A. |
Recorrido 1: | Direção Geral dos Impostos |
Decisão: | Concedido provimento ao recurso |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO “(…)1 Nos termos supra expostos, a ora Recorrente conclui as suas alegações pugnando pela revogação da decisão aqui recorrida, nos termos peticionados e aqui justificados com os seguintes fundamentos: a) Resulta do pedido formulado pela Recorrente, que os efeitos jurídicos que esta pretende alcançar prendem-se com a eliminação dos actos de inscrição na matriz e avaliação e atribuição do valor patrimonial tributário de supostos «prédios» e não com a anulação de uma qualquer liquidação de IMI, ou mesmo somente com a evitação da efectivação de uma tal liquidação. b) Estamos perante uma acção que não se destina simplesmente à efectivação ou declaração de um direito patrimonial, visando, ao invés, a tutela de interesses imateriais; o que implica que o seu valor seja, necessariamente, € 30.000,01 segundo o artigo 34.º do CPTA e não € 23.630,40 como foi estabelecido na decisão recorrida. c) Mal andou o Tribunal a quo ao afirmar, recorrendo ao n.º 3 do artigo 134.º do CPPT, que o meio próprio para a impugnação do acto de inscrição na matriz é a impugnação judicial. d) A Recorrente visa pôr em causa a própria inscrição dos prédios na matriz e não reagir contra uma qualquer incorrecção matricial dos valores patrimoniais. e) O artigo 134.º, n.º 3 do CPPT invocado pelo Tribunal a quo estabelece apenas que as «incorrecções matriciais dos valores patrimoniais podem ser objecto de impugnação judicial» (cit.). f) O artigo 134.º do CPPT foi criado com vista somente à impugnação dos actos de fixação do valor patrimonial tributário, aplicando-se também, quanto muito, aos actos que incluam na matriz de forma incorrecta o mencionado valor patrimonial. g) De facto, deste artigo não se pode – de todo em todo – retirar a respectiva aplicação aos actos que precedam à primeira inscrição na matriz dos «prédios». h) A Recorrente não pretende questionar valores ou métodos de avaliação; na realidade, a Recorrente pretende pôr em causa uma premissa de base, i.e., a própria legitimidade da inscrição na matriz de supostos «prédios», fim este que vai para além dos interesses tutelados pelo artigo 134.º do CPPT. i) Não cabendo no caso em apreço o recurso ao artigo 134.º, n.º 3 do CPPT, por não estarem reunidos os respectivos pressupostos de aplicação, o meio próprio para a impugnação do acto de inscrição na matriz dos alegados prédios em crise somente poderia ser concretizada mediante a apresentação de acção administrativa especial. j) A conclusão imediatamente anterior, não só da leitura conjugada dos mencionados artigos 97.º, n.º 2 do CPPT e 191.º do CPTA, mas também, desde logo, do artigo 129.º do Código do IMI, o qual determina que os sujeitos passivos de imposto podem socorrer-se dos meios de garantia previstos na LGT e no CPPT, os quais, como vimos prevêem a possibilidade de impugnação de actos administrativos em matéria tributária, nos termos do CPTA. k) Sendo o artigo 134.º do CPPT inaplicável in casu, mostra-se inócua a previsão do respectivo n.º 7 que obriga ao esgotamento prévio dos supostos meios graciosos. l) Nada no artigo 130.º do Código do IMI permite concluir pela necessidade de previamente do recurso à via judicial tenha o contribuinte de apresentar reclamação da matriz. m) O contencioso tributário pretende-se hoje de plena jurisdição, como corolário do princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 96.º n.º 1 do CPPT e no artigo 20.º da CRP, o qual não se coaduna com restrições injustificadas ao mesmo. n) Ao abrigo do princípio da tutela jurisdicional efectiva e do artigo 129.º do Código do IMI – o qual permite, nos termos já plasmados, que o contribuinte faça uso dos meios de garantia previstos na LGT e no CPPT – o exame judicial dos actos de inscrição na matriz de supostos «prédios», mediante a apresentação de acção administrativa especial, não depende do anterior esgotamento de hipotéticos meios graciosos. o) Não pode subsistir a decisão do Tribunal a quo, devendo a mesma ser revogada e substituída por outra que declare improcedente a excepção dilatória invocada pela Administração fiscal e ora sub judice. p) Quanto ao acto de avaliação e fixação do valor patrimonial tributário dos «prédios» a acção administrativa especial é, in casu, o meio próprio para a respectiva contestação. q) No caso em apreço a Recorrente não questiona valores ou métodos de avaliação; ao invés, a Recorrente põe em causa a própria legitimidade da inscrição na matriz, avaliação e fixação do valor patrimonial tributário de supostos «prédios», fim este que não é tutelado pelos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI ou pelo artigo 134.º do CPPT. r) A condução de uma segunda avaliação e a subsequente impugnação do resultado da mesma em nada acautelarão os direitos e interesses da Recorrente ou são, sequer, adequadas para aferir da incidência de IMI e, como tal, da legitimidade da referida avaliação. s) A pretensão da Recorrente diz respeito à contestação da própria incidência de IMI e, como tal, também de IMT ou Imposto do Selo, como pressuposto prévio à emissão quer dos actos de inscrição, quer dos actos de avaliação dos supostos «prédios». t) O pedido de anulação dos actos de avaliação e fixação do valor patrimonial dos «prédios», não deve ser visto de forma isolada, mas sim, como uma parte de um todo, formada também pelo o pedido de anulação dos actos de inscrição na matriz dos mesmos «prédios». (1) u) In casu, apesar de não se proceder à impugnação de um acto específico que ordena a concretização da avaliação, discute-se, a própria decisão de avaliar os supostos «prédios», posto que não se questionam, nesta fase, os valores patrimoniais fixados, mas antes, a legitimidade e possibilidade legal das mencionadas avaliações. v) Não existe qualquer outro meio próprio que permita alcançar os efeitos pretendidos mediante a acção administrativa especial apresentada e em apreço, devendo, em consequência a decisão recorrida ser revogada nesta parte e substituída por outra que considere improcedente a excepção invocada pela Administração fiscal, relativa à impropriedade da acção administrativa especial. w) Demonstrada à saciedade que a acção administrativa especial é o meio próprio quer para a impugnação dos actos de inscrição na matriz, quer para a impugnação dos actos de avaliação e fixação do valor patrimonial tributário, a averiguação pelo Tribunal a quo da possibilidade de convolação da presente acção mostra-se desprovida de sentido e inútil. x) Assim sendo, deve a decisão recorrida ser anulada na parte em que absolve o réu da instância por considerar nulo todo o processo, pela alegada verificação de erro na forma do processo que não poderia ser sanado por convolação, por padecer de erro de julgamento. y) O Tribunal a quo não decidiu do mérito da causa. Ao invés, o Tribunal a quo considerou procedentes as excepções dilatórias invocadas e absolveu a Administração fiscal da instância. z) Devendo a decisão recorrida ser revogada e substituída por decisão que considere as excepções dilatórias invocadas improcedentes, nos termos explanados, nada obsta a que este douto Tribunal ad quem, com os poderes que lhe são conferidos pelo artigo 149.º, n.º 4 do CPTA e pelo artigo 712.º do CPC, aplicável ex vi artigo 140.º do CPTA, aprecie o pedido deduzido pela Recorrente na p.i., conhecendo, deste modo, do mérito da causa. aa) Para além dos factos provados constantes na decisão recorrida, resultam provados pelos documentos juntos ao processo e pela actuação das partes outros factos, os quais globalmente bastam à apreciação do pedido, devendo, em consequência, este douto Tribunal, de acordo com o artigo 149.º, n.º 4 do CPTA e o artigo 712.º do CPC, aplicável ex vi artigo 140.º do CPTA, proceder à fixação dos seguintes factos provados adicionais: 1. Os aerogeradores que constituem o parque de exploração de energia eléctrica explorado pela Recorrente no Município de Arcos de Valdevez podem desmontar-se e montar-se noutro local, se tal se mostrar útil para a actividade da Recorrente e sem prejuízo para o respectivo funcionamento, revestindo, para efeitos civis, carácter de bens móveis – facto não contestado pela Administração fiscal; 2. A Recorrente não é proprietária, superficiária ou usufrutuária, ou sequer titular de algum direito real, relativamente a qualquer prédio no Município de Arcos de Valdevez, sendo o seu vínculo aos terrenos baldios onde, por hora, instalou os aerogeradores, apenas resultante dos três «Contratos de Cessão de Exploração de Terrenos Baldios» que celebrou – cfr. cópias destes documentos juntos como doc. n.º 5 em anexo à p.i. 3. Resulta da informação elaborado pela Divisão de Inspecção Tributária de Viana do Castelo – cfr. doc. n.º 7 em anexo a p.i. – que a Administração fiscal procedeu à inscrição na matriz dos próprios terrenos baldios em que a Recorrente instalou os equipamentos do parque eólico de produção de energia eólica que explora, considerando a Recorrente como superficiária dos mesmos 4. A Recorrente recebeu, em 9 de Fevereiro de 2011, uma nova notificação do resultado da primeira avaliação, relativamente ao «prédio» inscrito sob o artigo P 372 da freguesia de Extremo, em que a Administração corrigiu lapso na indicação do valor patrimonial do alegado «prédio», passando a constar o valor de € 152.000 e não € 1.520.000 – cfr. doc. n.º 2 em anexo à p.i. bb) Assentes os factos, estará o Tribunal ad quem, ao abrigo do mencionado n.º 4 do artigo 149.º do CPTA, em condições de conhecer do pedido da Recorrente, não existindo quaisquer constrangimentos que o impeçam. cc) Caso assim não se entenda, considerando-se necessária uma complexa indagação dos factos que não foram tidos como assentes na decisão recorrida, deve este Venerando Tribunal suster a apreciação do mérito da causa e ordenar a baixa do processo, para que seja reformulado o despacho saneador, na sequência da revogação da decisão de absolvição da instância ora recorrida, e produzida a prova necessária, nomeadamente, mediante a inquirição das testemunhas arroladas. dd) Aferir da possibilidade e validade dos actos em crise implica analisar a inclusão do caso concreto no âmbito do IMI, posto que, uma vez chegando à – inevitável – conclusão da sua não verificação, perderão os actos em crise qualquer fundamentação legal, caindo por terra quaisquer pretensas liquidações quer de IMI, quer de IMT. ee) O artigo 8.º do Código do IMI ao proceder à definição dos sujeitos passivos do IMI, refere-se expressamente aos sujeitos proprietários, usufrutuários e superficiários, excluindo, portanto, da enumeração qualquer menção a outros direitos (ainda que reais) que possam ser constituídos sobre os «prédios», tais como os de direitos de uso e habitação e as servidões. ff) Não tendo o legislador incluído nem mesmo outros direitos reais na norma constante do artigo 8.º do Código do IMI, pretendeu constituir uma previsão, ao nível da incidência subjectiva, de carácter taxativo. gg) No caso em apreço a Recorrente somente utiliza os terrenos baldios nos quais colocou os aerogeradores que constituem o parque de produção de energia eólica por esta entidade explorado, não estando nestes termos sujeita à incidência do imposto em crise. hh) São nulos «[o]s actos ou negócios jurídicos de apropriação ou apossamento, tendo por objecto terrenos baldios, bem como da sua posterior transmissão […] excepto nos casos expressamente previstos na presente lei» – cfr. artigo 4.º da Lei dos Baldios (cit.). ii) É apenas permitido que os baldios possam ser objecto, no todo ou em parte, de cessão de exploração; esta cessão deve efectivar-se, tanto quanto possível, sem prejuízo da tradicional utilização do baldio pelos compartes, e tendo em conta o seu previsível impacte ambiental – cfr. artigo 10.º da Lei dos Baldios. jj) Nos termos do artigo 202.º, n.º 2 do Código Civil, uma vez que «não podem ser objecto de direitos privados» (cit.), os baldios são coisas fora do comércio. kk) O direito de superfície é um direito privado, previsto no Código Civil, que, tendo como objecto um bem imóvel determinado, implica o respectivo apossamento. ll) Tendo em conta que os terrenos baldios se encontram fora do comércio e não são susceptíveis de ser objecto de direitos privados a Recorrente não pode – em caso algum – ser deles superficiária, não sendo, em consequência, sujeito passivo de IMI! mm) O direito de superfície alegadamente constituído nem sequer poderia produzir quaisquer efeitos e, como tal, não poderia dar lugar às inscrições na matriz em crise, posto que, os contratos celebrados pela Recorrente, que no entendimento da Administração fiscal dariam lugar à constituição deste direito, seriam nulos de acordo com a Lei dos Baldios. nn) É sobejamente aceite que a operação de parques de produção de energia eólica é um dos fins típicos dos contratos de cessão de exploração de terrenos baldios. oo) Este tipo de contratos, ao contrário do que acontece com os contratos que implicam um apossamento e uma utilização exclusivos dos imóveis, permitem a exploração dos baldios sem que se ponha em causa a utilização ou fruição dos mesmos baldios, segundo os usos e costumes – cfr. Jaime Gralheiro (Coimbra, 2002) Comentário à Nova Lei dos Baldios, p. 133. pp) Não sendo a Recorrente, nem podendo ser, titular de qualquer direito de superfície sobre os ditos terrenos baldios, não pode, de acordo com as regras de interpretação das normas jurídicas tributárias, reconduzir-se o conceito de superficiário inserto no n.º 2 do artigo 8.º do Código do IMI ao conceito de cessionário de um direito de exploração. (2) qq) Quando o n.º 2 do artigo 8.º do Código do IMI refere a qualidade de superficiário, enquanto titular de um direito de superfície, este deve, segundo o artigo 11.º, n.º 2 da LGT, ser entendido com o sentido que tem no Direito Civil, a saber, como um direito real sobre um bem imóvel, de natureza privada e que envolve o respectivo apossamento, pelo que é diferente do direito que liga a Recorrente aos terrenos baldios sub judice. rr) A necessidade de verificação dos pressupostos de incidência subjectiva do imposto constitui elemento essencial à actuação e poderes da Administração no âmbito deste imposto, dela dependendo a possibilidade de o fazer incidir sobre os contribuintes. Ora, onde não há lei habilitadora, não há poder. ss) A verificação da incidência subjectiva, precisamente, enquanto elemento necessário e habilitador da actuação da Administração fiscal não pode deixar de ser um elemento essencial dos actos em crise, implicando a sua falta a respectiva nulidade nos termos do artigo 133.º, n.º 1 do CPA. tt) A averiguação da incidência subjectiva determina a diferença entre um imposto liquidado e cobrado legal e constitucionalmente e um imposto, que sem qualquer disposição legal que permita a sua liquidação e cobrança, constituirá uma situação inadmissível, que viola o direito constitucionalmente consagrado da propriedade privada – cfr. artigo 62.º da CRP –, podendo mesmo equiparar a uma situação de confisco. uu) Os actos em crise, situando-se no âmbito de procedimento para a cobrança de um imposto sem qualquer base legal, implicam uma limitação inadmissível ao conteúdo essencial de um direito fundamental, e, nestes termos, devem ser igualmente declarados nulos nos termos do artigo 133.º, n.º 2, alínea d) do CPA. vv) Ainda que se viesse a entender que os elementos supra expostos não conduziriam à nulidade dos actos em crise – o que se admite por mera hipótese de raciocínio, sem conceder – sempre diríamos que, quer os actos que procederam à inscrição dos alegados «prédios» na matriz, quer os actos que fixaram os respectivos valores patrimoniais tributários, efectuados com base no IMI – cujos pressupostos de incidência não se encontram preenchidos – devem ser anulados por padecerem do vicio de violação de lei, mediante a violação do artigo 8.º do Código do IMI. ww) No âmbito da verificação da incidência objectiva, verte de forma algo imprecisa do artigo 2.º do Código do IMI o conceito de prédio para efeitos fiscais, estabelece-se que «prédio é toda fracção de território […] desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico» (cit.). xx) Os baldios são bens excluídos do comércio jurídico, posto que não podem ser objecto de direitos privados, por isso, estes bens não têm valor de troca actual e não são avaliáveis em dinheiro, não podendo, em consequência, nos ensinamentos da doutrina versada sobre esta matéria, ser objecto de tributação de qualquer natureza.(3) yy) Os baldios não pertencem ao património de uma pessoa colectiva – de direito público ou privado como se diz no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRC –; as comunidades locais que nos termos da Lei dos Baldios têm o uso e fruição dos Baldios são, quanto muito, pessoas colectivas de direito social – cfr. Jaime Gralheiro (Coimbra, 2002) Comentário à Nova Lei dos Baldios, p. 141. zz) Os baldios não constituem, de facto, um património, no sentido de que os seus titulares podem deste dispor com mais ou manos facilidade, como acontece nas coisas públicas ou privadas. aaa) Tudo visto resulta evidente que os baldios não são prédios para os efeitos do artigo 2.º do Código do IMI e, nessa medida, não podem ser inscritos na matriz predial, não encontrando os actos do Chefe de Finanças de Arcos de Valdevez qualquer base legal. bbb) O actos em crise devem ser declarados nulos, não só por se dever considerar, tendo em conta o tipo de acto em causa, que a incidência objectiva de IMI constitui um elemento essencial dos mesmos, nos termos do artigo 133.º, n.º 1 do CPA, como também por ser notório que estes implicam uma limitação inadmissível ao conteúdo essencial de um direito fundamental, direito de propriedade privada – cfr. artigo 133.º, n.º 2, alínea d) do CPA –, de forma em tudo semelhante ao que foi já anteriormente referido aquando da análise da não verificação da incidência subjectiva. ccc) Não obstante, ainda que se viesse a defender que os elementos supra expostos não implicariam a nulidade dos actos em crise – o que se admite por mera hipótese de raciocínio, sem conceder – sempre seria de considerar que, quer os actos que procederam à inscrição oficiosa dos «prédios» em crise na matriz predial, quer os consequentes actos de avaliação dos mesmos, efectuados com base no Código do IMI e partindo necessariamente do pressuposto errado da incidência deste imposto, devem ser anulados por padecerem do vício de violação de lei, mediante a violação do artigo 2.º do Código do IMI. ddd) Sem prescindir, ainda que se viesse a defender que a Administração fiscal procedeu à inscrição na matriz como «prédios» não dos próprios terrenos baldios, mas os equipamentos que compõem o parque de produção de energia eólica explorado pela Recorrente – o que se admite por mera hipótese académica, sem conceder –, sempre continuariam os actos em causa fadados à ilegalidade. eee) Face à imprecisão do conceito ínsito no artigo 2.º do Código do IMI, este deve ser complementado pelo disposto noutros artigos do mesmo compêndio legal, em particular nos artigos 3.º, 4.º e 6.º, assim, no âmbito da incidência objectiva de IMI, é determinante apurar se um certo «prédio» para além de poder ser enquadrado no artigo 2.º do Código do IMI, pode ser qualificável como prédio rústico ou urbano (ou misto), posto que o IMI incide, nos termos do artigo 1.º do respectivo Código, «sobre o valor patrimonial tributário dos prédios rústicos e urbanos situados no território português» (cit.). fff) A Administração fiscal caracteriza nove dos alegados «prédios» por si oficiosamente inscritos na matriz como parte da categoria de «outros», categoria esta que constitui uma sub divisão da categoria de prédio urbano e que parecem corresponder aos aerogeradores, ao passo que o décimo «prédio» foi incluído na categoria de prédio urbano e dirá respeito à subestação, todos pertencentes a um parque de produção de energia eólica. ggg) Os prédios urbanos tout court e aqueles que se incluam na subcategoria «outros» terão de constituir prédios servidos por infra-estruturas urbanas que alterem e condicionem o seu valor. hhh) Os «prédios» em crise não tem qualquer vocação urbana, não estando quer a sua existência, quer o seu valor económico condicionados à prestação de serviços urbanísticos; com efeito o seu valor económico relaciona-se apenas como a rentabilidade da actividade aí desenvolvida, i.e., a produção de energia. iii) Não vislumbramos nos artigos 3.º, 4.º e 6.º do Código do IMI elementos suficientes que nos permitam concluir, de forma peremptória, que, in casu, os aerogeradores se subsumem com ao conceito de prédio e, nessa medida, encontram-se sujeitos a tributação. jjj) Saliente-se que a Lei Fiscal não indica expressamente que os aerogeradores, ou estruturas análogas, como as «bombas de gasolina» ou as «antenas de telecomunicações», estão sujeitos, por um lado, a inscrição matricial e, por outro, a imposto. kkk) No caso das «bombas de gasolina» ou as «antenas de telecomunicações» não temos conhecimento que alguma vez a Administração fiscal tenha obrigado à sua inscrição matricial ou alegado uma possível incidência de IMI. Cabendo ainda realçar que a jurisprudência superior que conhecemos sobre esta matéria se resume a casos relativos a taxas, em particular de licenciamento, mesmo nas situações em que as antenas são implantadas em terrenos particulares. lll) Pois bem, considerando as semelhanças circunstanciais entre os aerogeradores instalados em terrenos que sejam propriedade privada e as referidas «antenas de telecomunicações», parece-nos que o seu modo de tributação não poderá ser díspar, sob pena de violação do princípio da igualdade plasmado no artigo 13.º da CRP. mmm) Os aerogeradores não constituem um edifício – não integrando qualquer qualificação de edifício que possamos identificar – ou sequer uma construção. nnn) Perspectiva diversa da ora defendida implicaria reconhecer que a discricionariedade da Administração fiscal se estende às regras sobre incidência de imposto, posição que, a nosso ver, não pode nem deve ser acolhida. ooo) A norma de incidência resultante da conjugação dos artigos 2.º e 6.º do Código do IMI não apresenta, efectivamente, suficiente densificação, ou, noutra formulação, suficiente determinabilidade. ppp) A esta luz, face à ausência de definição legal, não pode ser deixado à Administração fiscal a decisão sobre o que deve ser considerado ou incluído na descrição e definição de «prédio», posto que tal seria permitir à mesma interferir numa área que se encontra abrangida, nos termos do artigo 103.º, n.º 2 da CRP, pela reserva de lei, i.e., a incidência do imposto. qqq) De acordo com o que já foi acima explanado, os actos devem ser declarados nulos, posto que a incidência objectiva de IMI constitui um elemento essencial dos mesmos, nos termos do artigo 133.º, n.º 1 do CPA. rrr) Contudo, ainda que se viesse a entender que os elementos acima referidos não determinariam a nulidade dos actos em crise – o que se admite por mera hipótese académica, sem conceder – sempre seria de anular os actos impugnados por padecerem do vício de violação de lei, mediante a violação dos artigos 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do Código do IMI. sss) A Administração fiscal não deveria desconhecer que existe já uma forma de tributação específica, aplicável a parques de produção de energia eólica – cfr. n.º 27 do anexo II ao Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de Maio na sua redacção actual – pelo que verificamos uma verdadeira e efectiva situação de ilegal dupla tributação, violadora do princípio da tributação pelo lucro real e, novamente, do principio da igualdade. ttt) Por outro lado, os actos de inscrição oficiosa na matriz dos prédios em crise, a favor da Recorrente, deveriam ter sido notificados à Recorrente, contendo tal notificação todos os elementos legalmente exigidos, nomeadamente a fundamentação completa do mesmo, mas não o foram. uuu) A necessidade de notificação aos contribuintes dos actos praticados pela Administração fiscal, como condição para a sua eficácia, visa, como é sabido, erguer mais uma forma de tutelar os referidos contribuintes perante o poder tributário – cfr. artigo 268.º, n.º 3 da CRP, artigo 77.º, n.º 6 da LGT e artigo 36.º do CPPT. vvv) A falta de notificação determina a total ineficácia face à Recorrente destes actos e a impossibilidade da sua execução, com as necessárias consequências legais; nomeadamente, e em rigor, os actos de avaliação tendo sido praticados com base em actos ineficazes, não podem deixar de ser considerados inválidos e de se encontrarem eles próprios impedido de produzir efeitos, devendo, nestes termos, serem anulados. www) Sem prescindir, é necessário salientar que mesmo as notificações dos actos de avaliação e fixação do valor patrimonial tributário dos «prédios» em crise, juntas como doc. n.º 1 em anexo à p.i., são claramente insuficientes, carecendo não só de qualquer fundamentação, como também da indicação completa dos elementos determinantes para a avaliação, o que não veio a ser corrigido pela certidão solicitada pela Recorrente e que lhe foi posteriormente notificada. xxx) Da certidão recebida pela Recorrente permanece impossível perceber como é que a Administração procedeu ao cálculo das áreas dos alegados «prédios» e muito menos os limites dos mesmos. yyy) Consta das notificações, já juntas como doc. n.º 1 e 2 em anexo à p.i., que o valor patrimonial tributário apurado resulta, quanto a nove dos «prédios» inscritos, da aplicação do artigo 46.º, n.º 2 do Código do IMI, que estabelece que deverá realizar-se uma avaliação pelo custo adicionado do valor do terreno quando não seja possível recorrer às regras do artigo 38.º do mesmo Código. zzz) Este critério não é adequado a avaliar realidades económicas cujo valor é determinado na perspectiva do rendimento criado, de facto, o seu valor não depende do valor de mercado dos elementos que o compõem e muito menos do custo da sua instalação ou construção, mas, ao invés, do rendimento que seja criado pelos mesmos. aaaa) O mesmo se pode dizer ao analisar critério aplicado ao décimo alegado «prédio», o qual terá sido avaliado segundo os artigos 38.º e seguintes do Código do IMI. bbbb) Os elementos do parque de produção de energia eólica, e que se encontram instalados nos terrenos baldios em crise, retiram o seu valor do seu funcionamento conjunto, i.e., da energia que são capazes de produzir como um todo, posto que individualmente considerados não têm utilidade. cccc) As disposições do Código do IMI não visam, nem estão adaptadas, à tributação de realidades como os elementos que compõem os parques de produção de energia eólica ou como os próprios parques, não estando prevista quer normas de incidência, quer normas de determinação de matéria colectável que os abranjam. dddd) Devem os actos em crise ser declarados nulos e caso não seja assim entendido sempre deverão os mesmos actos ser, pelo menos, anulados por padecerem do vício de violação de lei, mediante a violação dos artigos 38.º e 46.º do Código do IMI. eeee) Não resulta claro das notificações dos actos em crise, ou da certidão posteriormente recebida, em que é que consistem os alegados «prédios» inscritos na matriz e avaliados pela Administração fiscal. ffff) Mais precisamente, não é evidente se a dita Administração inscreveu na matriz os próprios terrenos baldios, figurando a Recorrente como superficiária dos mesmos, ou se qualificou cada um dos equipamentos que constituem o parque de produção de energia eólica como «prédios»; ora, sendo incerta a posição adoptada pela Administração fiscal, resulta altamente prejudicado o direito de defesa da Recorrente. gggg) Da notificação supra mencionada não consta qualquer referência ao fundamento desta avaliação, i.e., à base que permitiu à Administração proceder à avaliação deste prédio, e que seria necessariamente a sua inscrição oficiosa na matriz, o que se torna ainda mais grave quando nos apercebemos que a Recorrente não procedeu à inscrição de qualquer prédio na matriz ou foi sequer notificada da respectiva inscrição oficiosa. hhhh) Ante o exposto, por falta de fundamentação clara, suficiente e congruente, de facto e de direito, o acto de avaliação do «prédio» em crise deve ser anulado por vício de forma, violando o artigo 268.º n.º 3 CRP e o artigo 77.º n.º 1 da LGT.
VIII. DO PEDIDO Termos em que, a decisão a quo merece inteira censura, pelo que se requer muito respeitosamente a V. Exas: a) que concedam provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando a decisão recorrida e substituindo-a por decisão que mantenha o valor da causa inscrito pela Recorrente e considere as excepções dilatórias invocadas improcedentes; b) que conheçam e julguem procedente, por provado, o pedido deduzido pela Recorrente na acção administrativa especial em apreço, declarando nulos ou, caso assim não se entenda, anulando os actos de inscrição na matriz e avaliação e fixação do valor patrimonial tributário dos «prédios» em crise, praticados pelo Chefe de Finanças de Arcos de Valdevez, tudo com as devidas consequências legais; ou c) que, subsidiariamente, sendo considerada essencial uma complexa indagação dos factos que não foram tidos como assentes na decisão recorrida, se sustenha a apreciação do mérito da causa e se ordene a baixa do processo, para que seja reformulado o despacho saneador, na sequência da revogação da decisão de absolvição da instância ora recorrida, e produzida a prova necessária, nomeadamente, mediante a inquirição das testemunhas arroladas. Só nestes termos será respeitado o DIREITO e feita JUSTIÇA.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR 3.1 Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
Nesta conformidade, este tribunal não dispõe dos elementos necessários para decidir em substituição, pelo que se impõe a baixa dos autos à 1ª instância para que o tribunal profira nova decisão, salvo se outro fundamento, diverso do ora decidido, a tal não obstar. Porto, 23 de novembro de 2017 (2) Vide neste preciso sentido, embora sobre os bens incluídos no domínio público, o Acórdão do STA, de 2 de Junho de 2010, proferido no processo n.º 027/10. (3) Vide neste preciso sentido Nuno Sá Gomes (Coimbra, 2005) Tributação do Património, p. 24 |