Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00335/20.6BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/19/2021
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL- MODELO DE AVALIAÇÃO DAS PROPOSTAS- ALVARÁ.
Sumário:1-É obrigação da entidade adjudicante prever o modelo de avaliação em sede de programa de concurso, não podendo o mesmo ser alterado, seja por via administrativa, seja pelos concorrentes.

2- O júri do procedimento apenas poderá avaliar os atributos das propostas com base nos fatores ou subfatores elementares que densificam o critério de adjudicação.

3- Tendo-se previsto a atribuição ao fator “Preço da Proposta” ( K4) de 100, 50 e 25 pontos, para as propostas cujo preço apresentassem um desvio em relação ao preço base de, respetivamente, mais de 90%, entre 80% a 90% e menos de 80%, pretendeu-se valorar com mais pontos as propostas que comportassem um desvio mais acentuado em relação ao preço base e com menos pontos as que apresentassem um valor mais aproximado do preço base.

4- É uma estipulação arbitrária e violadora do princípio da concorrência, a exigência de um Alvará de empreiteiro de obras públicas de classe correspondente ao valor global de um contrato relativo à prestação de serviços florestais quando a natureza dos trabalhos de construção civil a realizar no âmbito desse contrato, se enquadram num valor a que corresponde uma classe de Alvará distinta da relativa ao valor total do contrato.
(Sumário elaborado pela relatora – art.º 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Recorrente:A., Lda
Recorrido 1:ASSOCIAÇÃO FLORESTAL DO LIMA
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I – RELATÓRIO

1.1. A., LDA com sede no Centro Tecnológico e Empresarial de Arganil, na Rua (…), moveu a presente ação de contencioso pré-contratual (de impugnação do ato administrativo relativo à formação do contrato de empreitada), contra a ASSOCIAÇÃO FLORESTAL DO LIMA, pedindo a (i) declaração de ilegalidade da deliberação da Associação Florestal Vale de Lima, de 3 de junho de 2016, notificada a 26 de junho de 2020, por violação do Programa do Concurso e, bem assim, a (ii) declaração de nulidade ou anulação da decisão do júri, e a (ii) condenação do réu a elaborar novo relatório final com nova graduação dos concorrentes do Lote 2, colocando o autor em primeiro lugar, com a consequente adjudicação a si.

Alega, para tanto, em síntese que, a Associação Florestal do Lima, por deliberação da Direção, lançou Concurso Público Internacional n.º 2/2019 – Aquisição de Serviços de Estabilidade de Emergência Pós-Incêndio na Zona de Intervenção Florestal Serra de Santa Luzia e zona de Intervenção Florestal Lima Vez – Anúncios publicados em DR de 2 de março de 2020 e JOUE, de 3 de março de 2020;
A esse concurso podiam apresentar-se concorrentes nacionais ou estrangeiros do espaço europeu, desde que preenchessem os requisitos do artigo 55.º do CCP;
O referido concurso público desdobrava-se em 2 lotes independentes, o Lote 1, referente à intervenção da “Zona Florestal de Santa Luzia”, cujo preço-base era de € 225.534,73 e o Lote 2 respeitante à “Zona de Intervenção Florestal Lima Vez”, cujo preço base era de € 561.433,67;
No dia 15 de maio de 2020, o relatório elaborado pelo Júri foi sujeito a audiência prévia e nele propunha-se a adjudicação do Lote 2 à empresa S. SA, tendo a autora apresentado reclamação, por discordar da avaliação que lhe foi atribuída no fator K 4, em consequência do modo como o Júri determinou o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta, calculado através da seguinte fórmula constante no programa do concurso: Desv=[(preço base – preço total da proposta) preço base] * 100%;
Entende que de acordo com o Programa do Concurso, deveria ter uma pontuação de 100 no fator “valor da Proposta”, porquanto em função do cálculo determinado pela fórmula ali consagrada, chegou-se a um desvio de 9.993 entre o preço base e o preço total da proposta, enquanto a empresa “S.” obteve um desvio de 10,406, logo o desvio de 9.993 é superior a 90% do preço-base, ou seja, 90,007% e o desvio da empresa concorrente graduada em primeiro lugar é de 10.406, situando-se entre os 80% e os 90% do preço-base [89.594%], devendo obter, antes, uma pontuação de 50 pontos;
Conclui que não foi respeitado o Programa de Concurso, por errada avaliação do 4.º fator, ocorrendo violação das peças do procedimento e violação de lei;
Imputa ainda à deliberação impugnada vício decorrente da falta de fundamentação.
Por fim, sustenta que ocorreu uma errada qualificação profissional do adjudicatário, já que para o Lote 2, o preço-base dos serviços postos a concurso era de € 561,433,00 e a proposta do adjudicatário tem o valor de € 503,013,17, e o mesmo não possui o alvará com Classe 3, indispensável para ser admitida ao concurso, mas antes alvará que corresponde a obras de valor de € 75.000,00, subcategoria 13.º da 5.ª categoria;
Assim, foram violados os princípios da transparência, concorrência, boa-fé e igualdade de tratamento, assim como foi violada a imposição de exigência de habilitações mínimas.

1.2. Citada, entidade demandada contestou, alegando, em síntese, que o objeto da ação é a impugnação do ato de adjudicação respeitante ao Lote 2 referente à aquisição de serviços de estabilização de emergência pós-incêndios na zona de intervenção florestal Lima Vez, tomada pela Associação Florestal de Lima, a 3 de junho de 2020;
Entende que não há violação do Programa do Concurso e das regras da contratação, na medida em que foi respeitado o Programa do Concurso, tendo-se sido aplicado o modelo de avaliação previsto na cláusula 21.ª do mesmo;
Sustenta que da aplicação da fórmula prevista no Programa do Procedimento à proposta da autora para o Lote 2, apurou-se um desvio entre o preço-base e o preço da daquela de 9,993%, ou seja, um desvio = (561.433,67 - € 505.329,27/561.433,67 x 100% = (56.104,40/561 433,67) = 0,9993 x 100 = 9.993;
Da aplicação da mesma fórmula ao preço total da proposta da concorrente S., SA, o desvio entre a mesma e o preço-base é de 10,406;
Assim, ambas as propostas apresentam um desvio em relação ao preço-base inferior a 80%, pelo que, de acordo com a avaliação estabelecida para o 4.º fator – valor da proposta – a avaliação em causa para a proposta do autor e para a concorrente graduada em primeiro lugar foi de 25 pontos cada, ao contrário do que a autora entende;
De acordo com a autora o desvio da sua proposta é superior a 90%, na medida em que entende que esse apuramento se faz subtraindo aos 100% o valor do desvio de 9,993%, raciocínio que está errado e que viola a cláusula 21.º do Programa do Procedimento;
Mais alega não ter ocorrido a violação de nenhuns dos princípios apontados pela autora;
Quanto à adjudicação do contrato relativo à prestação de serviços do Lote 2, a uma empresa que não possui alvará com classe 3, sustenta que o mesmo era bastante para a sua habilitação, uma vez que, atendendo aos preços unitários para o Lote 2 do Programa do Procedimento e Anexo II das especificações técnicas, constata-se que o objeto do concurso consistia essencialmente na realização de trabalhos florestais e apenas as obras de correção torrencial reclamam a realização de pequenas obras de trabalhos de construção civil, cujo valor ascende a € 41.200, representando 0,733% do valor previsto para o Lote face ao total de € 561.433,67;
Desse modo, por se tratarem essencialmente de trabalhos florestais, na alínea c) do ponto 1 da cláusula 28.º do programa do concurso, apenas exigiu documento comprovativo da titularidade do CAE para aquela prestação de serviços e o alvará emitido pelo IMPIC, IP com as habilitações: 13.ª subcategoria – caminhos agrícolas e florestais – da 5.ª categoria;
Observa que poderia nem sequer ter feito a referida exigência, uma vez que ao abrigo do artigo 3.º/1 da Portaria 372/2017, de 14 de dezembro, só tratando-se de um contrato de empreitada isso seria necessário;
Conclui que a S. , SA é detentora de Alvará da classe 2, 5.ª categoria e 13.ª subcategoria [caminhos agrícolas e florestais] com o valor da classe de € 332.000, logo muito superior ao exigido no programa do procedimento [€ 75.000].

1.3.Citada, a contrainteressada S., contestou, defendendo-se por impugnação, sustentando a improcedência da ação, alegando, em suma, que foi respeitado o modelo de avaliação das propostas previsto na cláusula 21.ª do Programa do Procedimento e que é titular do alvará exigido no n.º 1 da cláusula 28.º do programa do procedimento, apresentando uma versão dos factos em tudo análoga à exposta pela Ré na sua contestação.

1.4. O TAF de Coimbra proferiu sentença sendo o seu dispositivo do seguinte teor:
«Tudo visto e ponderado, e com base nos fundamentos expostos, julga-se improcedente a presente ação.
Custas a cargo da autora.
Notifique e registe».

1.5. Inconformada com a decisão do TAF de Coimbra que julgou a ação improcedente a Autora interpôs recurso jurisdicional formulando as seguintes conclusões:

«1. A matéria de facto dada como provada assentou exclusivamente nos elementos constantes dos autos e do respetivo processo administrativo, procedendo a uma interpretação que não está em sintonia com a realidade que emerge desses elementos e documentos, sendo visíveis as contradições e equívocos.
2. O Tribunal “a quo”, deu como provado em 2. dos factos provados que o artigo 21 do Programa de Procedimento Concursal determina, que o critério de adjudicação será aplicado a cada lote, e no que nos interessa, ao lote 2, de acordo com o critério da melhor relação preço/qualidade, conforme modelo de Avaliação de propostas constantes no Anexo IV.
3. Nessa sequência, deu como provado, no mesmo ponto 2., que quanto ao modelo de avaliação de propostas constantes do Anexo IV, a fórmula aplicada foi de “AP =k1*0,4 + k2*0,4 + k3*0,15 + k4*0,05”, na medida em que os fatores de avaliação foram para k1 de 40%, para k2 de 40%, para k3 de 15% e para k4 de 5% (facto provado 2.).
4. O Tribunal, de cuja decisão se recorre, considerou na mesma, que a discórdia entre as partes se centra na determinação do 4º fator – k4 – valor da proposta.
5. E a esse propósito conclui (pág. 36) que “está provado que o valor da proposta se aferirá considerando que serão atribuídos 100 pontos se o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta for superior a 100%...” (o Tribunal escreveu 100%, por manifesto lapso, porque a percentagem constante do Programa de Concurso é superior a 90%; isso mesmo foi escrito na pag. 34 da sentença), “... serão dados 50 pontos se o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta se situar entre os 80% e os 90% e terá apenas 25 pontos se houver um desvio entre o preço-base e o preço total da proposta inferior a 80% (facto provado 2.)”.
6. E mais adiante, na pág. 40 refere a sentença que “está provado que a fórmula aprovada pelo júri para determinar o desvio referente ao 4º fator do critério de adjudicação foi a seguinte: Desv = [(preço base – preço total da proposta /preço base)*100% (facto provado sob o nº 6).
7. E continua a Sra. Juíza que subscreveu a Sentença que “feitas as contas para a proposta da Autora verificamos que o desvio dá um valor de 0,099930, que multiplicado por 100% dá um desvio de 9,993%. Por outro lado, quanto à proposta da contrainteressada S., adjudicatária, o desvio encontrado foi de 0,1040%, ou seja de 10,40%.
8. Concluindo que o desvio da Autora, é maior, porque nos dá uma diferença de 90,007% para a proposta da Autora e de 89,6% para a adjudicatária. “Ora, está provado que quando o desvio face ao preço base for superior a 90%, como sucede no caso da Autora, a pontuação a atribuir é de 25 pontos (facto provado em 2) e quando o desvio se localiza entre os 80% e 90% a pontuação deve ser de 50 pontos (facto provado em 2)”.
9. Nesta atribuição de 25 pontos em vez de 100 à proposta da Autora, ora recorrida, é que reside o grande equívoco, confusão e contradição da Sentença, violando de forma flagrante o Programa de Concurso, designadamente o que se estabelece quanto à avaliação do 4º fator, que está bem explicito no Anexo IV.
10. Ali se consigna expressamente que “as propostas serão hierarquizadas em função da pontuação final, calculada nos termos da fórmula anteriormente apresentada (AP=k1*0,4 + k2*0,4 + k3*0,15 + k4 0,05, ou seja 40% para k1, 40% para k2, 15% para o k3 e 5% para k4).
11. Só após a atribuição da pontuação final a cada proposta, de acordo com os 4 fatores, se sabe quem atinge o valor mais elevado, só funcionando os critérios de desempate, em caso de igualdade, que não é o caso, porque a Autora recorrente teria uma pontuação superior à da adjudicatária após a aplicação do 4º fator de avaliação.
12. Por isso, o modelo da avaliação das propostas, constante do Anexo IV, não podia deixar de ser cumprido, independentemente do critério lato da “melhor relação preço – qualidade”, que não é aqui violado, nem beliscado minimamente.
13. Em primeiro lugar, porque neste procedimento concursal, dos quatro fatores constantes do Caderno de Encargos, como determinantes para estabelecer essa relação, o fator preço, para o dono da obra, era de reduzidíssima relevância, representando apenas um vigésimo (5%) do valor da avaliação das propostas.
14. E a diferença de preços entre a proposta da Autora, ora recorrente, e da adjudicatária, contrainteressada interveniente, é de apenas 2.200,00€, não se revestindo, da menor importância, tendo em consideração, que o dono da obra considerou como preço adequado (preço base) o valor de 561,433,67€, havendo um diferencial para menos na proposta da Recorrente de 56,104,40€ e da adjudicatária um diferencial de 58.420,50€, ou seja, uma diferença de 2.316,23€ entre as duas propostas, valor esse, praticamente insignificante, tendo em consideração o valor global do preço base estabelecido pelo dono da obra.
15. O Tribunal ao derivar para o postulado do preço mais baixo não se apercebeu que, ao enveredar por essa via, estava a violar de forma flagrante o preceituado no 4º fator k4 – valor da proposta, do Anexo IV do Programa do Procedimento Concursal.
16. Aliás, a Exma. Juíza que proferiu a Sentença posta em causa neste recurso, não teve dúvidas de que o desvio de 9,993 é superior a 90% do preço base, mais concretamente 90,007%.
17. E que o desvio da empresa adjudicatária é de 10,406, situando-se já entre os 80% e 90% - concretamente 89,594%, determinando uma pontuação de 50 pontos.
18. Não se percebe porque não atribuiu a pontuação de 100 pontos à ora recorrente, uma vez que o desvio que o Tribunal reconheceu era superior a 90% e, como tal, determinava uma classificação de 100 pontos.
19. E, consequentemente, a Autora teria que ser graduada em 1º lugar, até porque as outras concorrentes que tinham propostas de valor mais próximo da proposta da Autora, e superiores à dela, teriam que ser contempladas com a mesma pontuação, funcionando então para desempate o critério do preço mais baixo (o da Autora), tudo em conformidade com o Programa de Concurso.
20. É óbvio, que destas regras, resulta com total clarividência, que o objetivo era que o desvio entre o preço base e o preço total da proposta não se desviasse dos 90% do preço base.
21. E daí a atribuição de uma maior pontuação ao valor das propostas em que o desvio entre o preço base e o preço total da proposta fosse superior a 90% do preço base, o que se compreende, pela reduzida relevância que foi dada ao preço, atribuindo-se ao fator valor das propostas uma percentagem reduzidíssima (5%);
22. A deliberação da proposta de adjudicação à empresa concorrente S., , S.A não está minimamente fundamentada, adjudicando-se arbitrariamente à proposta cujo desvio em relação ao preço base é mais elevado.
23. A seguir-se a interpretação da recorrida e da empresa adjudicatária, de transformar o desvio em percentagem, isto é, que todas as propostas terem um desvio de 9,993% a 20,029% e, por isso, serem inferiores a 80%, chegaríamos à aberração de uma proposta de um valor de 55.423,57€, com um desvio de 90,128% relativamente ao preço base, ser classificada e graduada em 1º lugar.
24. Uma proposta, por exemplo, de 80.423,57€, provocava um desvio de 83,894%, segundo a absurda interpretação dos recorridos.
25. Por outro lado, nesta situação, em que o preço base dos serviços postos a concurso era para o lote dois, de 561.433,00€ (quinhentos e sessenta e um mil quatrocentos e trinta e três euros), não pode deixar de constituir uma surpresa ter sido adjudicada a uma empresa na base de uma proposta de 503.013,17€, que só possuía um alvará com classe 1.
26. Também é muito estranho ter-se apenas exigido, nas habilitações, num Concurso Internacional, o alvará da classe 1, correspondente a 75.000,00€ e a 13ª sub categoria da 5ª categoria.
27. É questionável, neste quadro de total incoerência e promiscuidade, qual a razão, que leva o dono da obra, num Concurso Internacional, de preço base superior a 560.000,00€, exigir apenas a 13º sub categoria da categoria 5ª, e da classe correspondente a 7/8 vezes menos do que a do preço base (561.433,00€).
28. O valor exigido de 75.000,00€ nem sequer cobre a lista de preços unitários indicados pela Associação, ou seja, 76,189,80€ e pela empresa concorrente, e pior ainda se a esse valor acrescerem as obras de correção torrencial (41.200,000€).
29. No mínimo, esta situação tinha que ser motivo bastante para haver desvalorização num dos três ou mesmo em todos esses critérios. Que garantias de boa execução dos serviços dá uma empresa sem curriculum, sem experiência e com o alvará mínimo, ainda por cima num Concurso Internacional?
30. Ao celebrar-se o contrato, nestas condições, com a empresa S., comete-se uma violação grosseira dos princípios principais subjacentes à contratação pública, como sejam os princípios da transparência, concorrência, da boa-fé e da igualdade de tratamento e de oportunidades, da legalidade e da imparcialidade.
31. Até porque, na análise da proposta, há uma total omissão às razões determinantes da atribuição de pontuação igual, nos três primeiros critérios, a outras empresas muito mais credenciadas.
32. Por outro lado, o Programa de Concurso e o Caderno de Encargos, ao preconizarem que qualquer concorrente o podia fazer com um Alvará de classe 1, para serviços de classe 3, cometeram uma violação grosseira da contratação pública ao não exigir que os concorrentes, num Concurso Internacional, fossem titulares de habilitações mínimas.
33. Violou, assim, a decisão recorrida, os princípios da contratação pública supra enunciados, o Programa do Procedimento Concursal, ou seja, não cumpriu, entre outros, com o disposto no artigo 1º- A do Código dos Contratos Públicos.
TERMOS em que deve o presente recurso ser provido, revogando-se a sentença ora recorrida.»

1.6. O Réu contra-alegou, formulando as seguintes conclusões de recurso:

«1- A Recorrente, veio interpor o presente recurso da douta Sentença que decidiu julgar improcedente o pedido por si formulado na acção de contencioso pré-contratual aqui em causa.
2- A Recorrente discorda da douta Sentença recorrida, por entender que a matéria de facto dada como provada assentou exclusivamente nos elementos constantes dos autos e do respectivo processo administrativo, tendo o Tribunal a quo procedido a uma interpretação que não está em sintonia com a realidade que emerge desses elementos e documentos, sendo visíveis as contradições e equívocos;
3- Por entender que o Tribunal a quo, considerou na mesma, que a discórdia entre as partes se centra na determinação do 4.11 factor – K4 – valor da proposta;
4- Por entender que a atribuição de 25 pontos em vez de 100 pontos à proposta da Autora, no Factor K4 – Valor da Proposta é que reside o grande equívoco, confusão e contradição da Sentença, violando de forma flagrante o Programa de Concurso, designadamente o que se estabelece quanto à avaliação do 4.11 Factor, que está bem explicito no Anexo IV.
5- Por entender que a sua proposta teria de ser graduada em 1.º lugar, uma vez que o desvio que o Tribunal reconheceu era superior a 90% e, como tal, determinava uma classificação de 100 pontos, funcionando, em caso de empate, com as propostas de valor mais próximo da sua proposta, e superiores à dela, que teriam de ser contempladas com a mesma pontuação, o critério do preço mais baixo, que é o dela;
6- Por entender ser muito estranho ter-se apenas exigido, nas habilitações, num Concurso Internacional, o alvará da Classe I, correspondente a 75.00,00€ e a 13.ª subcategoria da 5.ª categoria.
7- Por entender questionar, neste quadro de total incoerência e promiscuidade, qual a razão, que leva o dono da obra, num Concurso Internacional, de preço base superior a 560.000,00 €, exigir apenas a 13.ª subcategoria da categoria 5:ª, e da classe correspondente a 7/8 vezes menos do que a do preço base (561.433,00€).
8- Por entender que celebrar-se o contrato, nestas condições, com a empresa S., comete-se uma violação grosseira dos princípios principais subjacentes à contratação pública, como sejam os princípios da transparência, concorrência, da boa-fé e da igualdade de tratamento e de oportunidade, da legalidade e da imparcialidade.
9- Porém, na realidade, o Tribunal a quo procedeu a uma interpretação em correcta sintonia com a realidade que emerge desses elementos e documentos, não se vislumbrando quaisquer contradições e equívocos.
10- Na verdade, o Tribunal a quo, deu como provado que o artigo 21.º do programa de procedimento determina que o critério de adjudicação será aplicado para cada lote individualmente, de acordo com o critério da “melhor relação preço-qualidade”, conforme modelo de avaliação de propostas constantes no Anexo IV (Facto Provado 2).
11- Deu como provado que quanto ao modelo de avaliação de propostas, a fórmula aplicada foi de “AP=K1 *0,4+K2*0,4+K3*0,15+K4*0,05”, na medida em que os factores de avaliação foram para K1 de 40%, para K2 de 40%, para K3 de 15% e para K4 de 5% (Facto provado 2).
12- Deu como provado que o “valor da proposta” se aferirá considerando que serão atribuídos 100 pontos se o desvio entre o preço e o preço total da proposta for superior a 100%; serão dados 50 pontos se o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta se situar entre os 80% e os 90% e terá apenas 25 pontos se houver um desvio entre o preço-base e o preço total da proposta inferior a 80% (Facto Provado 2).
13- Deu como provado que todas as regras respeitantes aos critérios de adjudicação, de ponderação relativa atribuída a cada critério, de atributos da proposta, da ponderação “melhor relação qualidade/preço” e pontuação global que corresponderá ao resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada factor e subfactor, multiplicadas pelos valores dos respectivos coeficientes de ponderação, foram respeitadas pela entidade adjudicante, a aqui Recorrida (Factos Provados 2.,5).
14- Deu como provado que a proposta da Recorrente/Autora para o Lote 2 foi de € 505.329,27 e a proposta apresentada pela contrainteressada S. foi de € 503.013,17 (Facto Provado 6).
15- Deu como provado que o preço base foi de € 561.433,67 (Factos Provados 3,5,6 e 7).
16- Deu como provado que a fórmula aprovada pelo júri para determinar o desvio referente ao 4.º factor do critério de adjudicação foi o seguinte: - Desv=((preço base – preço total da proposta / preço base))*100% (Facto Provado 6).
17- Deu como provado que quando o desvio face ao preço-base for superior a 90%, a pontuação a atribuir é de 25 pontos (Facto Provado 2) e quando o desvio se localiza entre os 80% e os 90% a pontuação deve ser de 50 pontos (Facto provado 2).
18- Deu como provado que a proposta economicamente mais vantajosa deverá resultar da consideração do preço ou do custo, mediante a utilização de uma abordagem de custo-eficácia, como será o caso dos custos do ciclo de vida, e pode incluir a melhor relação qualidade/preço, a qual será avaliada com base em critérios que incluam aspectos qualitativos, ambientais e/ou sociais, ligados ao objecto do contrato público em causa, o que foi respeitado, (Facto provado 2).
19- Deu como provado que o programa do procedimento e caderno de encargos não padecem dos vícios e ilegalidades suscitadas pela Recorrente/Autora (Factos Provados 4, 5, 6).
20- Deu como provado que pela apreciação dos preços unitários referentes ao Lote 2 adjudicado ao contrainteressado, na verdade, nem todos os trabalhos exigem a posse de qualquer Alvará de construção civil, desde logo, por se tratar de trabalhos agrícolas (Facto Provado 3).
21- Deu como provado que a adjudicatária é titular da classe, categoria e subcategoria correspondente ao Alvará referido no artigo 28.º do programa do procedimento (Facto Provado 2).
22- Resulta, pois, da douta Sentença no que concerne à análise do Factor K4 – Valor da Proposta, que não se verifica qualquer pressuposto errado e que a interpretação feita pela Recorrente é inaceitável.
23- A Sentença refere uma “diferença de 90,007% e de 89,6%” e não, que o desvio apurado nos termos do cálculo previsto no Anexo IV do Programa do Procedimento é de 90,007% para a proposta da Recorrente e de 89,6% para a proposta da S., como a Recorrente pretende evidenciar.
24- Quer o Programa do Procedimento quer o Caderno de Encargos, em lado algum, estabeleceu que o desvio entre o preço base e o preço total da proposta se aferirá pela diferença do resultado obtido após o cálculo da fórmula e os 100%, ou seja, subtraindo aos 100% o resultado obtido.
25- A fórmula: Desv=((preço base – preço total da proposta / preço base))*100% - é a única fórmula estabelecida no Programa do Procedimento e, feitos os cálculos, ficou provado: que a proposta da Recorrente apresenta um desvio de 9,9993% e que a proposta da S. apresenta um desvio de 10,406%.
26- Não há outros cálculos a fazer ou operações a fazer, que não seja pontuar ambas as propostas com 25 pontos no Factor K4, porque ambas obtiveram um desvio/ desfasamento entre o preço base e o preço total da proposta inferior a 80%.
27- Aliás, foi o que aconteceu com todas as propostas que apresentaram um valor superior a € 505.290,31. – Cfr. pág. 30 da Sentença.
28- A interpretação do Programa do Procedimento no que concerne ao 4.º Factor – valor da proposta – não é, pois, o que a Recorrente pretende atribuir-lhe, pois, se assim fosse, todas as propostas apresentadas no Concurso aqui em causa com um valor superior a € 505.290,31 teriam de ter sido classificadas com 100 pontos.
29- Quanto à questão do Alvará levantada pela Recorrente está provado que pela apreciação dos preços unitários referentes ao Lote 2 adjudicado à contra interessada, nem todos os trabalhos exigem a posse de qualquer Alvará de construção civil, desde logo por se tratar de trabalhos agrícolas (facto provado 3) – cfr. Pág. 43 da Sentença.
30- A única espécie de trabalho enquadrável no Alvará exigido pelo Programa do Procedimento é a referente aos serviços de beneficiação de caminhos florestais, para cuja execução a adjudicatária S. apresentou proposta de valor inferior aos € 75.000,00 do Alvará exigido no Programa de Procedimento.
31- Exigência, que a ora Recorrida face ao disposto no n.º 1 do art.º 2.º da Portaria n.º 372/2017 de 14 de Dezembro, por se tratar de uma aquisição de serviços, poderia não ter considerado aquando da elaboração do Programa do Procedimento.
32- A ora Recorrida exigiu a todos os concorrentes a titularidade de Alvará emitido pelo Instituto dos Mercados Públicos do Imobiliário e da Construção, com Mesmo assim, a ora Recorrida exigiu a todos os concorrentes a titularidade de Alvará emitido pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, com as habilitações consideradas necessárias à prestação de serviços objecto do procedimento aqui em causa, enquadráveis na 13.ª subcategoria da 5.ª categoria e da classe correspondente a € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros).
33- Porém, no caso concreto, como supra se referiu, a única espécie de trabalho enquadrável no Alvará exigido pelo Programa do Procedimento é o referente aos serviços de beneficiação de caminhos florestais, como, aliás, ficou provado na Sentença.
34- Não há, pois, qualquer incoerência e promiscuidade, como alega a Recorrente, em exigir-se no Programa do Procedimento e Caderno de Encargos o Alvará da Classe 1 para este tipo de trabalhos.
35- Aliás, no procedimento em causa, foi estritamente observada e garantida a oportunidade entre candidatos, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 1.º-A do CCP, uma vez que os critérios e exigências para acesso ao mesmo foram fixados antes de conhecidos os concorrentes, permitindo a todos os potenciais uma candidatura em igualdade de circunstâncias,
36- A adjudicatária que é titular da classe, categoria e subcategoria correspondente ao Alvará referido no artigo 28.º do Programa do Procedimento, como resulta provado na Sentença, face ao disposto no artigo 8.º da Lei n.º 45/2015, de 03 de Junho, no caso concreto, sempre poderia recorrer à subcontratação, aproveitando, nesse caso, as habilitações detidas pelas empresas subcontratadas.
37- Ao contrário do alegado pela Recorrente, não se vislumbra na celebração do contrato, qualquer violação, muito menos grosseira, dos princípios principais subjacentes à contratação pública, como sejam os princípios da transparência, concorrência, da boa-fé e da igualdade de tratamento e de oportunidades.
38- Nem qualquer nulidade, não merecendo a douta Sentença Recorrida qualquer reparo, pelo que se deve manter inalterada.
TERMOS EM QUE deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA.»

1.7. A Contrainteressada contra-alegou, formulando as seguintes conclusões de recurso:

«1. Veio a Autora/Recorrente interpor o presente recurso da douta sentença que decidiu julgar improcedente o pedido por si formulado na ação de contencioso pré-contratual aqui em causa.
2. De acordo com as respetivas conclusões de recurso, a Recorrente discorda da douta sentença recorrida por entender que a mesma parte de um pressuposto errado relativamente à análise do Fator k4 – Valor da Proposta, previsto no Anexo IV do Programa do Procedimento; e por entender ainda estranho que, num Concurso Internacional tenha sido exigido, nos documentos de habilitação, o alvará de classe 1, correspondente a € 75.000,00 e a 13.ª subcategoria da 5.º categoria.
3. Porém, na realidade, não se verifica qualquer pressuposto errado na análise do referido Fator k4 – Valor da Proposta, na medida em que a sentença dá como provado que a fórmula prevista no Anexo IV do Programa do Procedimento para aferir o desvio entre o preço base e o preço total das propostas é o seguinte: Desv = [(Preço base – Preço total da proposta) / Preço base] * 100 %.
4. Baseando-se esse cálculo numa fórmula matemática, o resultado aí obtido é objetivo não permitindo quaisquer interpretações.
5. O preço base estabelecido para o Lote 2 do procedimento aqui em causa foi de € 561.433,67 (quinhentos e sessenta e um mil, quatrocentos e trinta e três euros e sessenta e sete cêntimos).
6. O preço da proposta da Recorrente foi de € 505.329,27 (quinhentos e cinco mil, trezentos e vinte e nove euros e vinte e sete cêntimos).
7. O preço da proposta apresentado pela Recorrida “S.” foi de € 503.013,17 (quinhentos e três mil, treze euros e dezassete cêntimos).
8. A sentença deu como provado que, aplicada a fórmula prevista no Anexo IV do Programa do Procedimento para cálculo do desvio entre o preço base e o preço total da proposta, a proposta da Recorrente apresenta um desvio de 9,993% face ao preço base e a proposta da Recorrida S. apresenta um desvio de 10,40% face ao preço base.
9. A sentença dimensionou a diferença de 90,007% para a proposta da Recorrente e de 89,6% para a proposta da Recorrida S., ou seja, deduziu a 100%, o desvio entre o preço base e o preço total da proposta da Recorrente e da Recorrida, apurados com base na fórmula prevista no Anexo IV do Programa do Procedimento.
10. Com efeito, a sentença refere uma “diferença de 90,007%” e de “89,6%”, e não, que o desvio apurado nos termos do cálculo previsto no Anexo IV do Programa do Procedimento é de 90,007 para a proposta da Recorrente e de 89,6% para a proposta da Recorrida, como a Recorrente pretende evidenciar.
11. A Sentença deu como provado que o Programa do Procedimento ou o Caderno de Encargos não estabelecem em lado algum que o desvio entre o preço base e o preço total da proposta se aferirá pela diferença do resultado obtido após o cálculo da fórmula e os 100%, isto é, subtraindo aos 100%, o resultado obtido.
12. Essa seria, aliás, uma nova fórmula de cálculo, manifestamente não condizente com a que se encontra definida no Programa do Procedimento.
13. E que, a sentença recorrida não defende ou sequer prevê.
14. Após confronto entre a pontuação obtida pela Recorrente e pela Recorrida no 4.º Fator – Valor da Proposta (K4), constata-se que ambas obtiveram um desvio/afastamento entre o preço base e o preço total da proposta inferior a 80%: 9,993% e 10,40% são inferiores a 80%.
15. A interpretação do Programa de Procedimento, designadamente do 4.º Fator – Valor da Proposta não é, pois, a que a Recorrente pretende evidenciar, pois, se assim fosse, todas as propostas apresentadas no Concurso aqui em causa com um valor superior a € 505.290,31 teriam sido classificadas com 100 pontos, o que não se verificou.
16. De qualquer modo, não obstante o acima alegado, mas sem prescindir do mesmo, a Sentença refere ainda, e bem, que quando se fala em avaliação de propostas, somos necessariamente remetidos ao conceito de “critério de adjudicação”.
17. No caso concreto, o critério de adjudicação utilizado foi o da melhor relação qualidade-preço, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º do CCP, procedendo-se à avaliação dos diversos fatores identificados no Anexo IV ao Programa do Procedimento.
18. No âmbito do presente procedimento, para além do preço, estavam também submetidos à Concorrência, a adequação dos meios humanos, a adequação dos meios materiais e o nível de qualidade ambiental da(s) proposta(s).
19. A Entidade Adjudicante teve, assim, em consideração, critérios objetivos, transparentes e não discriminatórios com o objetivo de alcançar as finalidades que definiu no âmbito da própria execução dos serviços.
20. Como estabelece o n.º 2 do art. 67.º da Diretiva 2014/24/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014 “(...) no contexto da melhor relação qualidade/preço, a proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da autoridade adjudicante deve ser identificada com base no preço ou custo, com a abordagem de custo-eficácia (...)”.
21. Ou seja, um preço mais baixo compreende uma relação económica custo/benefício mais vantajosa do que um preço mais alto.
22. Como refere a sentença, seria estranho a entidade adjudicante pontuar com um valor mais alto a proposta que apresentar um valor mais elevado.
23. Alegou a Recorrente que a diferença de preços entre a proposta por si apresentada e a da adjudicatária é de apenas € 2.200,00, o que, na perspetiva da própria não tem a menor importância, tendo em consideração que o dono da obra considerou como preço adequado (preço base) o valor de 561,433,67”.
24. Todavia, a diferença de preço até poderia ser de 0,01 €, na medida em que tal valor seria suficiente para avaliar e distinguir os preços das respetivas propostas.
25. Ao contrário do que alega a Recorrente o Tribunal a quo não derivou para o postulado do preço mais baixo. O Tribunal analisou e decidiu em conformidade com o estabelecido nas disposições previstas nos documentos do Concurso, no CCP e na citada Diretiva 2014/24/EU.
26. Relativamente ao Alvará necessário à prestação dos serviços objeto do procedimento aqui em causa, alega a Recorrente que “(...) não pode deixar de constituir uma surpresa ter sido adjudicada a uma empresa na base de uma proposta de 503.013,17 €, que só possuía um alvará com classe 1 (...)”.
27. Para enquadramento da questão ter-se-á de recorrer ao disposto na referida Cláusula 28.11 do Programa do Procedimento, particularmente, o seu n.º 1, de acordo com o qual, o Concorrente selecionado deve entregar, por correio eletrónico, no prazo de 5 (cinco) dias a contar da notificação da adjudicação, os documentos aí descritos, nos termos do art. 81.º do CCP, designadamente, o “Alvará emitido pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, IP., contendo as seguintes habilitações: 13ª subcategoria da 5ª categoria e da classe correspondente a 75.000,00 € (setenta e cinco mil euros) ”.
28. A Entidade Adjudicante exigiu a todos os concorrentes a titularidade de Alvará emitido pelo IMPIC (Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção) com as habilitações consideradas necessárias à prestação de serviços objeto do procedimento aqui em causa, enquadráveis na 13.ª subcategoria da 5.ª categoria e da classe correspondente a 75.000,00 € (setenta e cinco mil euros).
29. Os serviços objeto do procedimento aqui em causa estão especificados no Anexo III do Caderno de Encargos.
30. Esses serviços subdividem-se em 3 (três) categorias ou tipologias de atividade, assim classificadas: serviços florestais, obras de correção torrencial e beneficiação de caminhos florestais.
31. O preço base do Procedimento encontra-se distribuído pelas citadas tipologias de atividade: serviços florestais (valor base de € 471.043,87); obras de correção torrencial (valor base de € 14.200,00) e beneficiação de caminhos florestais (valor base de € 76.189,80).
32. No caso concreto, a única espécie de trabalho enquadrável no Alvará exigido pelo Programa do Procedimento é a referente aos serviços de beneficiação de caminhos florestais.
33. A Recorrida S. é titular da classe, categoria e subcategoria correspondente ao Alvará exigido pela Cláusula 28.ª do Programa do Procedimento.
34. Como determina a Sentença “(...) está provado que pela apreciação dos preços unitários referentes ao Lote 2 adjudicado ao contrainteressado, na verdade, nem todos os trabalhos exigem a posse de qualquer Alvará de construção civil, desde logo por se tratarem de trabalhos agrícolas (...)”.
35. De qualquer modo, como assinala a Sentença, o art. 8.º da citada Lei n.º 45/2015, de 03 de junho prescreve que “(...) sem prejuízo do disposto nos artigos 19.º e 20.º, nos procedimentos de formação de contratos de empreitadas de obras públicas, a empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela, respeitante aos trabalhos mais expressivos da mesma (...)”.
36. Pelo que, no caso concreto, a Recorrida S. sempre poderia recorrer à subcontratação, aproveitando, nesse caso, as habilitações detidas pelas empresas subcontratadas, nos termos do previsto nos números 2 e 3 do art. 20.º da Lei n.º 45/2015, de 03 de junho.
37. No procedimento em causa foi estritamente observada e garantida a oportunidade entre candidatos, nos termos previstos no n.º 1, do art. 1.º -A do CCP, uma vez que, os critérios e exigências para acesso ao mesmo foram fixados antes de conhecidos os concorrentes, permitindo a todos os potenciais interessados uma candidatura em igualdade de circunstâncias.
38. O que se retira das alegações da Recorrente é uma mera discordância face à douta sentença prolatada pelo Tribunal a quo, não logrando aquela demonstrar a ocorrência de um qualquer erro manifesto na aplicação do direito e na subsunção dos factos destes autos ao quadro normativo em vigor, nomeadamente em matéria de concorrência.
39. Face a todo o exposto, é inequívoco que a decisão Recorrida não merece qualquer censura, pelo que se deve manter inalterada.
TERMOS EM QUE deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida, assim se fazendo a devida JUSTIÇA.»

1.8. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público, não emitiu parecer.

1.9. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.

2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.

Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

2.2. Assentes nas enunciadas premissas, a questão que se encontra submetida à apreciação do tribunal ad quem e que importa resolver, passa por saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de direito:
a- por ter considerado que a Ré observou o modelo de avaliação das propostas constante do Anexo IV do PC, no que tange ao Fator-K4-“Valor da Proposta”;
b- por ter considerado, ao nível das habilitações exigíveis, válida a exigência, num Concurso Internacional, de preço base superior a 560.000,00€, o alvará da classe 1, correspondente a 75.000,00€ e a 13ª subcategoria da 5ª categoria.
**

III – FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO

3.1. A 1.ª Instância deu como provados, com interesse para a decisão da causa, os seguintes factos:

“1. A 29 de novembro de 2013 consta de documento timbrado de Associação dos Industriais de Construção Civil e Obras Públicas – AICCOPN – em especial:
(imagem no original)
(Facto Provado por documento a fls 255 e ss dos autos – paginação eletrónica)
2. A 11 de setembro de 2019 é subscrito eletronicamente documento timbrado de “PORTUGAL 2020”, o programa do procedimento “PDR 2014-2020 8.1.4 – Restabelecimento da floresta afetada por agentes bióticos e abióticos ou acontecimentos catastróficos - AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS – ESTABILIZAÇÃO DE EMERGÊNCIA PÓS-INCÊNDIO ZIF SERRA DE SANTA LUZIA / ZIF LIMA VEZ, onde consta:
(imagem no original)
(Facto Provado por documento a fls 1 e ss dos autos – paginação eletrónica)
3. A 11 de setembro de 2019 é subscrito eletronicamente documento timbrado de “PORTUGAL 2020”, Caderno de Encargos - PDR 2014-2020 - 8.1.4 – Restabelecimento da floresta afetada por agentes bióticos e abióticos ou acontecimentos catastróficos - AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS – ESTABILIZAÇÃO DE EMERGÊNCIA PÓS-INCÊNDIO ZIF SERRA DE SANTA LUZIA / ZIF LIMA VEZ, onde consta:
(imagem no original)
(Facto Provado por documento a fls 1 e ss dos autos – paginação eletrónica)
4. A 2 de março de 2020 a Associação Florestal do Lima publica em DR o Anúncio do procedimento n.º 2369/2020, onde consta:
“... 2 - OBJETO DO CONTRATO
Designação do contrato: Aquisição de serviços de estabilização de emergência pós-incêndio na Zona de Intervenção Florestal Serra de Santa Luzia e na Zona de Intervenção Florestal Lima Vez
Descrição sucinta do objeto do contrato: Aquisição de serviços de estabilização de emergência pós-incêndio na Zona de Intervenção Florestal Serra de Santa Luzia e na Zona de Intervenção Florestal Lima Vez
Tipo de Contrato: Aquisição de Serviços
Preço base do procedimento: Sim
Valor do preço base do procedimento: 786958.40 EUR
3 - INDICAÇÕES ADICIONAIS
Referência interna: CPI 2/2019
O contrato envolve aquisição conjunta (com várias entidades)? Não
Contratação por lotes: Sim
O contrato é adjudicado por uma central de compras: Não
O concurso destina-se à celebração de um acordo quadro: Não
É utilizado um leilão eletrónico: Não
É adotada uma fase de negociação: Não
[...]
7 - DOCUMENTOS DE HABILITAÇÃO
7.1 - Habilitação para o exercício da atividade profissional: Sim
Tipo: Alvará de Empreiteiro de Obras Públicas
Descrição: Conforme peças do procedimento
11 - CRITÉRIO DE ADJUDICAÇÃO
Melhor relação qualidade-preço: Sim
Critério relativo à qualidade
Nome: Qualidade Técnica
Ponderação: 95 %
Critério relativo ao custo
Nome: Preço
Ponderação: 5 % ...”.
(Facto Provado por documento a fls 146 e ss dos autos – paginação eletrónica)
5. A 3 de março de 2020 é publicado no JOUE o Anúncio n.º 2020/S 044-104214, onde consta, em especial:
“... Secção II: Objeto
II.1) Quantidade ou âmbito do concurso
II.1.1) Título: Aquisição de serviços de estabilização de emergência pós-incêndio na zona de intervenção florestal serra de Santa Luzia e na zona de intervenção florestal Lima Vez
II.1.2) Código CPV principal - 77230000
II.1.3) Tipo de contrato: Serviços
II.1.4) Descrição resumida: Aquisição de serviços de estabilização de emergência pós-incêndio na zona de intervenção florestal Serra de Santa Luzia e na zona de intervenção florestal Lima Vez.
II.1.5) Valor total estimado: Valor sem IVA: 786 958.40 EUR
II.1.6) Informação sobre os lotes
Contrato dividido em lotes: sim
Podem ser apresentadas propostas para todos os lotes
[...]
II.2.5) Critérios de adjudicação
Critérios a seguir enunciados
Critério relativo à qualidade - Nome: Qualidade técnica / Ponderação: Percentagem 95
Preço - Ponderação: Percentagem 5
II.2.6) Valor estimado: Valor sem IVA: 225 524.73 EUR
[...]
II.2.4) Descrição do concurso:
Aquisição de serviços de estabilização de emergência pós-incêndio na zona de intervenção florestal Lima Vez.
II.2.5) Critérios de adjudicação
Critérios a seguir enunciados
Critério relativo à qualidade - Nome: Qualidade técnica / Ponderação: Percentagem 95
Preço - Ponderação: Percentagem 5
II.2.6) Valor estimado - Valor sem IVA: 561 433.67 EUR
...”
(Facto Provado por documento a fls 146 e ss dos autos – paginação eletrónica)
6. A 27 de maio de 2020 é subscrito documento timbrado de “Associação Florestal Vale do Lima”, denominado de “Relatório Final de Análise de Propostas”, onde consta em especial:
(imagem no original)
(Facto Provado por documento a fls 133 e ss dos autos – paginação eletrónica)
7. A 6 de agosto de 2020 a entidade adjudicante adjudicou à “S. , SA” o lote 2 pelo valor de € 503.013,17, constando da respetiva ATA da reunião da direção:
(imagem no original)
(Facto Provado por documento a fls 133 e 146 e ss dos autos – paginação eletrónica)

2.2. MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
Inexistem factos não provados com relevância para a decisão.»
**
III.B.DE DIREITO
b.1.Do erro de julgamento de direito decorrente da consideração como observado pela Ré o modelo de avaliação das propostas constantes do Anexo IV do PC, quanto ao Fator-K4- “Valor da Proposta”.

3.2.O presente recurso jurisdicional vem interposto pela Autora, ora Apelante, da decisão do TAF de Coimbra que confirmou a validade do ato de adjudicação à Contrainteressada do Lote 2, referente à aquisição de serviços de estabilidade de emergência pós-incêndio na zona de intervenção florestal Serra de Santa Luzia e zona de intervenção Florestal Lima Vez, julgando improcedentes os vícios assacados a essa decisão que foram invocados pela autora na ação intentada.
A autora, ora Apelante, e para o releva à economia do presente recurso, invocou na ação que intentou que o Júri do concurso em apreço não observou o programa do procedimento quanto ao modelo de avaliação das propostas, especificamente, quanto à pontuação a atribuir na avaliação do Fator K4 “Valor da Proposta” e, bem assim, que a Contrainteressada não era titular do alvará necessário à prestação dos serviços em causa no concurso.
Deste modo, na presente apelação, está em causa aferir do acerto dos fundamentos invocados pela sentença recorrida para julgar improcedentes os referidos vícios assacados à deliberação impugnada.

b.1. Do erro de julgamento quanto ao modelo de avaliação.
Começando pelo erro de julgamento atribuído ao modo como foi aplicado o modelo de avaliação, a autora sustentou em sede de ação que no Anexo IV do Programa do Procedimento, estabeleceu que a avaliação do Fator- K4 “Valor da Proposta”, seria efetuado através da atribuição da seguinte classificação:
“K4=100, quando o desvio entre o preço base e o preço total da proposta seja superior a 90%;
K4= 50, quando o desvio entre o preço base e o preço total da proposta se situe entre os 80 e 90%;
K4= 25, quando o desvio entre o preço base e o preço total da proposta seja inferior a 80%.
E que o desvio entre o preço base e o preço total da proposta seria calculado através da seguinte fórmula:
“ Desv.=(( Preço base – Preço total da proposta)/Preço base)*100%.
Sucede que no Fator K4 “Valor da Proposta”, a autora apenas obteve 25 pontos, os mesmos que foram atribuídos à proposta da Contrainteressada, quando a seu ver, a sua proposta devia ter sido pontuada com 100 pontos nesse fator e a proposta da última, com 50 pontos nesse fator.
Assim, considera que o desvio obtido como resultado da aplicação da fórmula “Desv.=[ (Preço base- Preço total da Proposta)/100%)] no valor da sua proposta, que foi de 9,993% é superior a 90% do preço base, uma vez que, subtraído essa percentagem de 9,993% a 100%, dá um valor de 90,007%, razão pela qual não se conforma com a não ordenação da sua proposta em 1.º lugar.
Quanto a esta questão, o Tribunal a quo negou-lhe razão, considerando que a entidade adjudicante observou o modelo de avaliação relativo ao valor da proposta, previsto no ponto 21.º do Programa de Concurso, tendo aplicado corretamente a fórmula matemática prevista para a determinação do desvio entre o preço base e o valor da proposta apresentada pela Apelante, e que, por conseguinte, lhe atribuiu apenas 25 pontos, conforme se impunha.
A Apelante discorda deste entendimento professado na sentença recorrida que acolheu a posição adotada pela Entidade Adjudicante e pela Contrainteressada, ora apeladas, e que, em consequência, julgou improcedente os pedidos por si formulados na ação.
Nas conclusões de recurso que apresenta sob os pontos 1.º a 25.º das suas alegações, reafirma os argumentos que já tinha invocado na ação quanto ao modo como devia ser interpretado e aplicado o modelo de avaliação que o Tribunal a quo deu como provado no ponto 2 do elenco dos factos assentes em sede de fundamentação de facto, na sentença recorrida.
A Apelante, embora não ponha em causa a matéria de facto que o Tribunal a quo deu como assente no elenco dos factos provados, coloca em crise a interpretação que o mesmo fez do modelo de avaliação das propostas previsto no artigo 21.º do Anexo IV do Programa de Concurso, que deu como provado no ponto 2 do elenco dos factos provados, assacando-lhe erro de interpretação, precisando que o grande equivoco da sentença está em ter considerado que à luz do modelo de avaliação previsto no Programa do Procedimento, a atribuição de 25 pontos à sua proposta em vez dos 100 pontos que reclama como de direito, estão em conformidade com aquele modelo de avaliação, quando assim não é, violando, por isso, de forma flagrante o Programa de Concurso quanto à avaliação do 4.º fator.
Nesse desiderato, observa que o cumprimento do modelo de avaliação das propostas constante do Anexo IV, não podia deixar de ser cumprido, independentemente do critério lato da “melhor relação preço-qualidade” e adianta que dos 4 fatores constantes do Caderno de Encargos como determinantes para estabelecer essa relação, o fator preço, para o dono da obra, era de reduzidíssima relevância, representando apenas um vigésimo (5%) do valor da avaliação das propostas.
Entende que das regras estabelecidas, resulta com clareza que o objetivo era que o desvio entre o preço base e o preço total da proposta não se desviasse dos 90% do preço base e daí a atribuição de uma maior pontuação ao valor das propostas em que o desvio entre preço base e o preço total da proposta fosse superior a 90% do preço base, o que se compreende, pela reduzida relevância que foi dada ao preço, atribuindo-se ao fator valor das propostas uma percentagem de apenas 5%.
Exemplifica que, a seguir-se a interpretação da apelada e da contrainteressada, de transformar o desvio em percentagem, chegar-se-ia à aberração de uma proposta com um valor de 55.423,57€, com um desvio de 90,128% relativamente ao preço base, ser classificada e graduada em 1.º lugar.
Vejamos.
Conforme resulta do ponto 2 do elenco dos factos provados na sentença, o critério de adjudicação será aplicado para cada lote individualmente, em concordância com o critério da “melhor relação preço-qualidade”, conforme modelo de avaliação de propostas constantes no Anexo IV.
O Anexo IV do programa do procedimento estabelece que a avaliação das propostas é realizada tendo por base a fórmula: AP = k1 x 0,4 + k2 + k3 x 0,15 + k4 x 0,005, sendo considerados os fatores de avaliação indicados na seguinte tabela:
a) K1 – adequação de meios materiais – 40%;
b) K2 – adequação de meios humanos – 40%;
c) K3 – nível da qualidade ambiental – 15%;
d) K4 – valor da proposta – 5%.
A densificação de cada um dos fatores indicados consta no Anexo IV e as propostas serão hierarquizadas em função da pontuação final, calculada em conformidade com a fórmula já referida.
A melhor classificação será para a proposta que apresentar um valor mais elevado, sendo que a autora obteve a seguinte classificação: a) 1.º fator – adequação dos meios materiais K1 – 100 pontos; 2.º fator de adequação de meios humanos k2 – 100 pontos; 3.º fator quanto ao nível da qualidade ambiental K3 com 100 pontos e 4.º fator referente ao valor da proposta K4 com 25 pontos.
E quanto ao fator K4, o Anexo IV do programa do procedimento estabeleceu que a “avaliação do fator do valor da proposta” será efetuada através da atribuição da seguinte classificação:
“K4=100, quando o desvio entre o preço base e o preço total da proposta seja superior a 90%;
K4= 50, quando o desvio entre o preço base e o preço total da proposta se situe entre os 80 e 90%;
K4= 25, quando o desvio entre o preço base e o preço total da proposta seja inferior a 80%”.
Sendo que o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta seria calculado pela fórmula:
“ Desv.=(( Preço base – Preço total da proposta)/Preço base)*100%.
Uma primeira observação a efetuar é a de que modelo de avaliação tem de ser cumprido.
Nos termos do artigo 41.º do CCP, “O programa do procedimento é o regulamento que define os termos a que obedece a fase de formação do contrato até à sua celebração”, e do mesmo, além de outras especificações previstas no art.º 132.º do CCP, deve constar “O modelo de avaliação das propostas, nos termos do artigo 139.º”( cfr. alínea n), n.º1 desse preceito)
O artigo 139.º do CCP, sob a epígrafe “Modelo de avaliação das propostas” dispõe o seguinte:
«1 - Caso a determinação da proposta economicamente mais vantajosa se faça pela relação qualidade-preço, ou a avaliação do preço ou custo se decomponha em mais do que um fator de avaliação, o modelo de avaliação das propostas tem de observar o disposto nos números seguintes.
2 - A pontuação global de cada proposta, expressa numericamente, corresponde ao resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada fator ou subfator elementar, multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação.

3 - Para cada fator ou subfator elementar deve ser definida uma escala de pontuação através de uma expressão matemática ou em função de um conjunto ordenado de diferentes atributos suscetíveis de serem propostos para o aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos respeitante a esse fator ou subfator.
4 - Na elaboração do modelo de avaliação das propostas não podem ser utilizados quaisquer dados que dependam, direta ou indiretamente, dos atributos das propostas a apresentar, com exceção dos da proposta a avaliar.
5 - As pontuações parciais de cada proposta são atribuídas pelo júri através da aplicação da expressão matemática referida no n.º 3 ou, quando esta não existir, através de um juízo de comparação do respetivo atributo com o conjunto ordenado referido no mesmo número
Nos termos do artigo 56.º, n.º2 do CCP a “ identificação dos atributos sujeitos à concorrência implica que a entidade adjudicante deverá identificar nos atributos os aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência, isto é, levados ao mercado pelo caderno de encargos, bem como explicitar de forma clara no modelo de avaliação os descritores respetivos, isto é, explicitar que o atributo será aferido (mensurado) em função dos fatores desdobrados (ou não) em subfatores elementares a que a concorrência é chamada – logo, refletidos no critério da proposta economicamente mais vantajosa (artº 74º nº 1 a) CCP/2008, hoje critério multifatorial, artº 74º nº 1 a) CCP/2017) - e deve associar a cada fator ou subfator elementar a devida correspondência na escala de pontuação.” Cfr. Ac. do TCAS, de 26/07/2019, proc. N.º 190/18.6BESNT; Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina /2011, págs. 962 e 584; Luís Valadares Tavares, O guia da boa contratação pública - As directivas de 2014 e o DL 111-B/2017, págs.108-110.
A obrigação de previsão do modelo de avaliação em sede de programa de concurso, tem como consequência a impossibilidade do seu conteúdo poder ser alterado, de tal modo que, a doutrina fala a este respeito no “congelamento do modelo de avaliação”.
Tomando de empréstimo as palavras de Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira Cfr. Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, in ob. cit., pág. 974. “(..) A regra da inalterabilidade dos modelos de avaliação e seus elementos resulta de, a não ser assim, ficar totalmente destituída de sentido a exigência de eles serem estabelecidos prévia e ponderadamente, pois sempre seria possível à entidade adjudicante “voltar atrás”, incluir novos critérios, fatores e subfatores, ou afastar outros e reordená-los (valorizando e desvalorizando) o peso de cada um, conforme lhe aprouvesse – o que seria intolerável em termos de concorrência.
A única exceção à regra do congelamento dos modelos de avaliação do programa decorre de o n.º3 do art.º 50.º do CCP permitir ao órgão adjudicante que, até ao termo do segundo terço do prazo fixado para apresentação de propostas, proceda à retificação de erros e omissões das peças do procedimento (...)”.
Deste modo, o júri do procedimento apenas poderá avaliar os atributos das propostas com base nos fatores ou subfatores elementares que densificam o critério de adjudicação.
São esses fatores ou subfatores elementares que, concomitantemente, revelam a composição do modelo de avaliação da proposta economicamente mais vantajosa (artº 139º CCP) e que constituem os aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência, regime que resulta da conjugação dos artºs. 75º nº 2 e 132º nº 1 n) CCP donde deriva a regra da inalterabilidade do modelo de avaliação e seus elementos, cumprindo à entidade adjudicante “(..) não só publicitar o critério de adjudicação e os seus elementos, mas publicitar antecipadamente aquilo que os concorrentes têm de fazer para ter as pontuações pretendidas. (..)”. Cfr. Miguel Assis Raimundo, A formação dos contratos públicos, aafdl/2013, pág. 833; Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos …, págs. 963, 969/971, 974/975.Marcelo Rebelo de Sousa, Lições de Direito Administrativo, Vol. I, Lex, 1999, págs. 107-108.
Conforme bem se sintetiza em Acórdão do TCAS “O comando legal é no sentido da obrigatoriedade de definição a priori nas peças do procedimento, maxime no programa do concurso, dos critérios que presidem à avaliação e escolha da melhor proposta – v.g. os critérios que presidem ao exercício da competência do júri concursal -, obrigatoriedade que tem como corolário a regra da inalterabilidade nos termos conjugados dos artºs. 75º nº 2 e 132º nº 1 n) CCP, conforme já exposto.
Não é, pois, de admitir uma intervenção, seja administrativa seja pelos concorrentes, contrária ao princípio da inalterabilidade do modelo de avaliação e dos seus elementos constitutivos em ordem a, mediante a elaboração de um juízo interpretativo não consentido por desconformidade com o bloco normativo aplicável, suprir a omissão de explicitação clara dos fatores ou subfatores elementares e a devida correspondência na escala de pontuação no modelo de avaliação levado ao procedimento.” Cfr. Ac. do TCAS, já citado, de 26/07/2019.
No caso, as partes concordam que é em função do modelo de avaliação das propostas previsto no programa de concurso que as mesmas têm de ser avaliadas, não podendo o mesmo deixar de ser observado. A discordância está no modo como entendem que o mesmo deve ser observado.
E quanto a essa questão, afigura-se-nos não assistir razão à Apelante, cuja tese não se perfilha.
Na verdade, consideramos que a entidade adjudicante ao estabelecer que em relação ao fator preço de cada proposta, atribuiria 100 pontos às propostas que apresentassem um desvio em relação ao preço base superior a 90%, quis com isso significar que teria a máxima pontuação a proposta que apresentasse um preço inferior ao preço base em mais de 90%.
Ou seja, era intenção da entidade adjudicante atribuir a pontuação mais elevada, às propostas que apresentassem um preço contratual em que o desvio para menos em relação ao preço base fosse superior a 90% e não como advoga a Apelante, calcular percentagens das propostas apresentadas em face do preço-base, enquadrando o valor obtido nos intervalos identificados no modelo de avaliação propostos.
A entidade adjudicante quando estabeleceu a atribuição ao fator K4 de 100, 50 e 25 pontos, para as propostas cujo preço apresentassem um desvio em relação ao preço base de, respetivamente, mais de 90%, entre 80% a 90% e menos de 80%, pretendeu valorar com mais pontos as propostas que comportassem um desvio mais acentuado em relação ao preço base e menos pontos às que apresentassem um valor mais aproximado do preço base.
Dir-se-á, grosso modo, resultar do modelo de avaliação estabelecido para o Fator K4 ter sido intenção da entidade adjudicante atribuir mais pontos quanto mais baixo fosse o preço da proposta apresentada em relação ao preço base, ou seja, quanto maior fosse o respetivo desvio ( quanto maior for o desvio do preço da proposta em relação ao preço base, mais baixo é o valor da proposta em relação ao preço base).
Note-se que, nos termos do artigo 47.º n.º1 do CCP, “ O preço base, que deve ser definido pela entidade adjudicante no caderno de encargos, é o montante máximo que esta entidade se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato, incluindo eventuais renovações do contrato”.
Logo, o conceito de preço base em sede de CCP reporta-se ao preço máximo que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato, e, como tal, o preço contratual, isto é, o preço que consta da proposta e que assume esta natureza com a adjudicação, tem de se conter nos limites do preço base, sob pena de exclusão da proposta – cfr. artºs 70º nº 2 d) e 97º nº 1 CCP. Cfr.Jorge Andrade da Silva, Dicionário dos contratos públicos, Almedina/2010, págs. 341/342
Deste modo, reafirma-se, o sentido operativo que se extrai do referido modelo de avaliação, quanto ao fator preço, é o de que, as propostas apresentadas serão mais pontuadas conforme o diferencial para menos em relação ao preço base for maior, ou seja, se esse diferencial/ desvio para menos da proposta apresentada atingir mais de 90% do valor base, serão atribuídos 100 potos, se atingir entre 80 e 90%, serão atribuídos 50 pontos e se essa diferença for inferior a 80% do preço base, serão atribuídos apenas 25 pontos.
No caso, quer a proposta do Autor, quer a proposta da Contrainteressada, apresentaram um desvio ao preço base inferior a 80%, pelo que lhes foi atribuído 25 pontos no referido fator K4.
Por conseguinte, o sentido a extrair do modelo de avaliação fixado no Programa de Concurso nos moldes supra referenciados, não pode, a nosso ver, ser outro que não o exposto, que foi também o entendimento do júri do concurso.


É esse o resultado objetivo que resulta da leitura da fórmula matemática que foi preconizada e fixada pela entidade adjudicante no programa do procedimento para o cálculo da percentagem do desvio, em que o desvio é igual à diferença entre o preço base subtraído do valor total da proposta sob o preço base e a multiplicar por cem por cento: Desv.= (( Preço base – Preço total da proposta)/preço base)*100%.
Decorre da aplicação da referida fórmula que a percentagem do desvio da proposta em relação ao preço base é obtido diretamente pela aplicação da mesma.
Não assim, na tese professada pela Apelante, que entende ser necessária ainda uma outra operação: a de subtrair aos 100%, o valor do desvio obtido pela aplicação daquela fórmula. Ou seja, no seu caso, subtrair aos 100% o valor do desvio obtido de 9.993% da sua proposta em relação ao preço base.
Ora, este entendimento é que parte de um pressuposto errado. Na verdade, em parte nenhuma do Programa do Procedimento se estabeleceu quanto ao fator K4, outra fórmula em que após encontrado o desvio, para se saber a avaliação do fator K4 da proposta, se tivesse que subtrair o desvio encontrado a 100%.
Nesse caso a fórmula prevista no Programa do Procedimento teria de ser outra, como por exemplo: Desv.= 100% - [( Preço base – Preço total da Proposta)/preço base)*100%)].
Na sentença recorrida, o Tribunal a quo secundou o entendimento perfilhado pelas apeladas, importando, porém notar que o mesmo, depois de sublinhar que todas as regras legais relativas ao modo como deve ser elaborado o modelo de avaliação foram respeitadas pela entidade adjudicante, assentado o critério de adjudicação na “relação qualidade-preço”, imposto pelo artigo 139.º do CCP, que contém regras sobre a pontuação global, a qual terá de corresponder ao resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada fator e subfator, multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação, discorreu que: “Dir-se-á que a proposta economicamente mais vantajosa deverá resultar da consideração do preço ou do custo, mediante a utilização de uma abordagem de custo-eficácia, como será o caso dos custos do ciclo de vida, e pode incluir a melhor relação qualidade/preço, a qual será avaliada com base em critérios que incluam aspetos qualitativos, ambientais e/ou sociais, ligados ao objeto do contrato público em causa (Facto Provado 2.).»
E depois de afirmar estar provado que « a fórmula aprovada pelo júri para determinar o desvio referente ao 4.º fator do critério de adjudicação foi a seguinte: Desv=[(preço base – preço total da proposta/ preço base)] * 100% (Facto Provado 6.)» e que « Feitas as contas para a proposta da autora, verificamos que o desvio dá um valor de 0,099930 que multiplicado por 100% dá um desvio de 9,993%. Por outro lado, quanto à proposta da contrainteressada S., adjudicatária, o desvio encontrado foi de 0,1040%, ou seja, de 10,40%”, conclui que : « Significa isto que o desvio da autora é maior porquanto nos dá uma diferença de 90,007% para a proposta da autora e de 89,6% para a adjudicatária. Ora, está provado que quando o desvio face ao preço-base for superior a 90%, como sucede no caso da autora, a pontuação a atribuir é de 25 pontos (Facto Provado 2.) e quando o desvio se localiza entre os 80% e os 90% a pontuação deve ser de 50 pontos (Facto Provado 2.).
Aliás, seria estranho a entidade adjudicante no fator “valor da proposta” valorizar mais o preço mais elevado. Recordamos que sem prejuízo do princípio geral de se assegurar o direito de todos os operadores económicos ao mercado dos contratos públicos em condições de igualdade, resulta da citada norma, que o procedimento de Contratação Pública visa escolher um cocontratante e uma proposta que satisfaçam as necessidades públicas em condições económicas e financeiras adequadas para a entidade adjudicante.
Para identificar a proposta economicamente mais vantajosa, a decisão de adjudicação do contrato não deverá assentar apenas em critérios diferentes dos custos.
Os critérios qualitativos devem ser acompanhados de um critério de custos que poderá ser à escolha da entidade adjudicante, o preço ou uma abordagem custo-eficácia como o cálculo dos custos do ciclo de vida.
No ponto 92 do preâmbulo da mesma Diretiva, as autoridades adjudicantes ao avaliarem a relação qualidade/preço, deverão determinar os critérios económicos e qualitativos, ligados ao objeto do contrato. Esses critérios deverão permitir uma avaliação comparativa do nível de desempenho de cada proposta à luz do objeto do contrato, tal como definido nas especificações técnicas.
No contexto da melhor relação qualidade/preço, a proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da autoridade adjudicante deve ser identificada com base no preço ou custo, com a utilização de uma abordagem de custo-eficácia, conforme emana a Diretiva 2014/24/UE, ou seja, a proposta economicamente mais vantajosa deverá resultar da consideração do preço ou do custo, mediante a utilização de uma abordagem de custo-eficácia, como será o caso dos custos do ciclo de vida, e pode incluir a melhor relação qualidade/preço, a qual será avaliada com base em critérios que incluam aspetos qualitativos, ambientais e/ou sociais, ligados ao objeto do contrato público em causa, o que foi respeitado, como consta do probatório no facto provado 2.
Mas no fator k4 – valor da proposta, com um peso ponderativo de 5%, não pode a entidade adjudicante pontuar mais a proposta a mais cara, como resultaria da interpretação da autora.
Quanto à violação dos princípios da transparência, concorrência, boa-fé e igualdade de tratamento, não substanciou devidamente em que medida pode ter ocorrido tal violação, sendo certo que não procedendo o vício assacado de violação do programa do procedimento e caderno de encargos, nenhuma fragilidade encontrou o Tribunal quanto à concorrência, já que o concurso teve publicação internacional e as peças do procedimento, na parte impugnada não padecem dos vícios e ilegalidades suscitadas (Facto Provado 4., 5. 6.).»
A Apelante afirma não perceber porque razão o Tribunal a quo não considerou ser-lhe devida a atribuição de 100 pontos no fator K4, uma vez que reconheceu, na sentença que proferiu, que o desvio da sua proposta em relação ao preço base era superior a 90%, donde, consequentemente teria de ser graduada em 1.º lugar.
Conforme resulta da sentença recorrida, no trecho que se transcreveu, a dado passo afirma-se que: “ significa isto que o desvio da autora é maior porquanto nos dá uma diferença de 90,007% para a proposta da autora e de 89,6% para a adjudicatária. Ora, está provado que quando o desvio face ao preço-base for superior a 90%, como sucede no caso da autora, a pontuação a atribuir é de 25 pontos (Facto Provado 2.) e quando o desvio se localiza entre os 80% e os 90% a pontuação deve ser de 50 pontos (Facto Provado 2.).”
Pese embora o modo como o Tribunal a quo se expressou neste segmento da decisão recorrida não tenha sido exemplar, prestando-se a equívocos perante uma leitura menos atenta, sobretudo se despegada do contexto e das demais considerações produzidas na sentença, a verdade é que aquilo que resulta desse trecho não é que o tribunal tenha considerado que o desvio apresentado pela proposta da Apelante se situou acima dos 90% em relação ao preço base, que expressamente refere ter sido de 9,993% em função da aplicação da fórmula matemática prevista no Programa do Procedimento, mas antes que a diferença da proposta da Apelante em relação ao preço base é menor que a diferença da proposta apresentada pela Contrainteressada, uma vez que, a proposta da Apelante está mais próxima do preço base, correspondendo a 90,007% desse preço ( 90,007% x € 561.433,67= € 505.329,27), ao passo que a proposta da Contrainteressada está mais distante do preço base, correspondendo a 89,6% do mesmo ( 89,6% x € 561.433,67= 503.013,17€).
Posto isto, dir-se-á ainda que, embora se concorde com o Apelante quando observa que a interpretação que a entidade adjudicante e a Contrainteressada fazem do modelo de avaliação, e que foi acolhida pelo Tribunal a quo tem como consequência que só poderiam ser atribuídos 100 pontos no fator “Preço da Proposta” quando se estivesse perante uma proposta cujo preço fosse inferior ao preço base em mais de 90% do seu valor, o que parece não estar em sintonia com a reduzida relevância que foi dada ao preço que tem apenas um peso de 5% do valor da avaliação das propostas, estando correta quando exemplifica que no caso, uma proposta cujo valor fosse de € 80.423, 57, provocava um desvio de 83,894%, daí não resulta, como pretende, que o modelo de avaliação previsto na Cláusula 21.ª do Anexo IV do Programa do Concurso não possa e não deva ser interpretado conforme o sentido que dele extraíram a entidade adjudicante, a contrainteressada e que o Tribunal a quo validou.
Se é estranho que a entidade adjudicante atribuísse mais pontos a uma proposta de preço mais elevado do que a uma proposta de preço mais baixo, conforme observa o Tribunal a quo, também não deixa de ser bizarro que o preço de uma proposta possa apresentar um desvio de mais de 90% em relação ao preço base estipulado pela entidade adjudicante, e que, uma tal proposta com um desvio tão gigantesco, viesse a ser, no final, a mais pontuada. É consabido que a melhor satisfação do interesse público pode não passar pela proposta que, no fator preço, apresente o valor mais baixo, uma vez que, a boa execução do contrato depende, também, e muito relevantemente, do co-contratante auferir como contrapartida dos serviços prestados um valor justo, compatível com os custos do serviço a prestar e com uma margem de lucro expectável.
No caso, não é despiciendo enfatizar que esse perigo não existe no modelo de avaliação que foi fixado, posto que, o modelo de avaliação é multifatorial, e ao fator K4 apenas foi atribuído um peso de 5%, no conjunto, dos demais fatores, o que evidencia o pouco relevo que a entidade adjudicante atribuiu ao Fator K4 “ Preço da proposta”, provavelmente, por estar segura de que o preço base que apresentou se mostra calculado de forma rigorosa ante o objeto dos serviços a contratar, não esperando surpresas ao nível do preço. Daí, a atribuição de um peso reduzido ao fator preço da proposta, sem contudo, deixar de valorizar, na avaliação do fator preço, as propostas que nesse fator apresentem um maior desvio em relação ao preço base, dentro dos patamares estabelecidos.
Mas ainda que assim não fosse, nem por apelo à ideia de preço anormalmente baixo se poderia questionar o modelo de avaliação fixado neste procedimento. Note-se que no novo quadro legal da contratação pública não está prevista a obrigatoriedade de a entidade adjudicante excluir uma proposta com fundamento na apresentação de “um preço anormalmente baixo”.
Como refere a Juiz Ana Sofia Alves Cfr. E-book do CEJ, Contratação Publica, abril de 2018, Ana Sofia Alves “ Alterações ao regime do preço anormalmente baixo”, pág. 61, no atual quadro legal da contratação pública “ o legislador limita-se a conferir à entidade adjudicante a habilitação legal para se auto vincular com a fixação de um critério de determinação da anomalia, fixando-o desde logo nas peças procedimentais, ou para, na pendência do procedimento de formação de contrato e depois de apresentadas as propostas, casuisticamente qualificar uma proposta de preço como anómala. Dito de outro modo: o legislador não define qualquer critério supletivo de determinação da anomalia de um preço. Sendo certo que, em determinadas circunstâncias − face a certos objetos contratuais ou em determinados segmentos de negócio −, as entidades adjudicantes encontrarão razões que justificam a necessidade e/ou a conveniência de pré-fixação de um critério de anomalia, parece possível adivinhar que, face aos ónus de fundamentação que acompanham o exercício de auto vinculação pela entidade adjudicante, a maioria das entidades adjudicantes não seguirá essa opção”.
E quanto ao conceito de preço anormalmente baixo, observa que « Na literatura sobre o tema, emergem duas conceções distintas sobre o que é uma proposta de preço anormalmente baixo: uma primeira que qualifica como anormalmente baixas (apenas) as propostas de preço que apresentem um risco de incumprimento (aqui também designada por “perspetiva do risco de incumprimento”); e uma segunda que considera anormalmente baixas todas as propostas de preço situado abaixo do preço de custo e, ou, sem adequada margem de lucro (a “perspetiva da cobertura de custos e lucro”)» Idem, pág. 65;, sendo que a nível nacional, “por via da introdução do artigo 71.º, n.º 4, alínea g), do CCP, ocorre no ordenamento jurídico português uma alteração dos dados do debate. Já que, não sendo absolutamente líquida a adesão a uma conceção de preço anormalmente baixo alinhada com a posição da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu(46) − que apelidamos de “perspetiva da cobertura de custos e lucro” − parece incontestável que o instituto do preço anormalmente baixo visa, pelo menos, tutelar o risco de incumprimento não apenas do contrato, mas também da legislação laboral, social e ambiental relevante”. Idem, pág. 74;
À luz do atual CCP, o legislador deixou de prever, como sucedia antes das alterações aprovadas pelo Decreto-lei n.º 111-B/2017, de 31.08, critérios supletivos ao abrigo dos quais se considerava que o preço resultante de uma proposta era anormalmente baixo ( cfr. art.º 71.º do CCP, revogado) e onde, não obstante, ainda assim, a exclusão não era automática ( n.º3 do art.º 71.º do CCP revogado).
Tudo para concluirmos que, não é de todo impossível a possibilidade de serem apresentadas propostas de valor significativamente inferior ao preço base, e de as mesmas serem admitidas e valoradas em conformidade com a relevância que resultar do modelo de avaliação das propostas.
Assim, resulta do que se vem dizendo que a sentença recorrida neste conspecto não padece do erro de direito que a Apelante lhe imputa, improcedendo este fundamento de recurso.
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b.2. Da falta de alvará adequado por parte da Contrainteressada

3.3. Por fim, nas conclusões que formula sob os pontos 25.º a 33.º das alegações de recurso, a Apelante assaca erro de julgamento à sentença recorrida por nela se ter julgado que o alvará detido pelo Contrainteressada era adequado ao contrato a celebrar quando, ao nível das habilitações exigíveis, num Concurso Internacional, de preço base superior a 560.000,00€, o alvará da classe 1, correspondente a 75.000,00€ e a 13ª subcategoria da 5ª categoria não podia ser considerado adequado, cometendo-se uma violação grosseira da contratação pública ao não exigir que os concorrentes, num Concurso Internacional, fossem titulares de habilitações mínimas, assim se violando princípios da contratação pública, incumprindo-se, entre outros, com o disposto no artigo 1º- A do Código dos Contratos Públicos.
Mas sem razão.
A este respeito o Tribunal a quo discorreu do seguinte modo, na sentença sob recurso:
« (…)Determina o artigo 3.º, alínea e) do Lei n.º 41/2015 de 3 de junho que Classe corresponde ao escalão de valores das obras e respetivos trabalhos especializados que as empresas de construção estão habilitadas a executar, sem prejuízo da aplicação de regimes especiais para a execução de certos trabalhos especializados. Já o artigo 3.º, alínea e) do Lei n.º 41/2015 de 3 de junho define como Categorias os diversos tipos de obra e trabalhos especializados compreendidos nas habilitações dos empreiteiros de obras públicas.
Por outro lado, o artigo 3.º, alínea b) do Lei n.º 41/2015 de 3 de junho define Atividade da Construção como sendo a atividade que tem por objeto a realização de obras, englobando todo o conjunto de atos que sejam necessários à sua concretização e Categorias, como sendo os diversos tipos de obra e trabalhos especializados compreendidos nas habilitações dos empreiteiros de obras públicas.
Ora, está provado que pela apreciação dos preços unitários referentes ao Lote 2 adjudicado ao contrainteressado, na verdade, nem todos os trabalhos exigem a posse de qualquer Alvará de construção civil, desde logo por se tratarem de trabalhos agrícolas (Facto Provado 3.). Por outro lado, a adjudicatária é titular da classe, categoria e subcategoria correspondente ao Alvará referido no artigo 28.º do programa do procedimento (Facto Provado 2.).
Por outro lado, a correspondência entre as classes de habilitações (categorias/subcategorias) contidas nos alvarás das empresas de construção e os valores máximos de obra que cada uma delas permite realizar, foi publicada pela Portaria n.º 119/2012, de 3 de abril, oportunamente retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2012, de 23 de maio e pela Declaração de Retificação n.º 27/2012, de 30 de maio. A referida declaração de retificação 27/2012, publicada no dia 30 de maio, estabeleceu a correspondência entre as classes de alvará e o valor das obras a que os seus titulares ficam autorizados a executar.
Assim, apesar das classes permitirem perceber quais os escalões de valores das obras e respetivos trabalhos especializados que as empresas de construção estão habilitadas a executar, nos termos seguintes
Classe 1 - Até € 166.000
Classe 2 - Até € 332.000
Classe 3 - Até € 664.000
Classe 4 - Até € 1.328.000
Classe 5 - Até € 2.656.000
Classe 6 - Até € 5.312.000
Classe 7 - Até € 10.624.000
Classe 8 - Até € 16.600.000
Classe 9 - Acima de € 16.600.000
releva, todavia, compreender, também, que sobre as habilitações técnicas adequadas e exigíveis, o artigo 8.º da Lei n.º 41/2015, de 3 de junho, dispõe o seguinte: “... sem prejuízo do disposto nos artigos 19.º e 20.º, nos procedimentos de formação de contratos de empreitadas de obras públicas, a empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela, respeitante aos trabalhos mais expressivos da mesma, sem prejuízo da exigência de habilitação noutras classes e subcategorias relativas às restantes obras e trabalhos a executar...”. Mas, por sua vez, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 20.º do mesmo diploma legal, uma empresa de construção à qual tenha sido adjudicada uma obra pode, salvo disposição contratual em contrário, recorrer à subcontratação, aproveitando a empresa subcontratante das habilitações detidas pelas empresas subcontratadas.
Resulta das citadas normas que:
a) Deve ser exigida a subcategoria respeitante ao tipo de trabalhos mais expressivos;
b) A subcategoria respeitante ao tipo de trabalhos mais expressivos terá de ser de classe que cubra o valor global da obra;
c) Deve ser exigida habilitação noutras classes e subcategorias relativas às restantes obras e trabalhos a executar;
d) Recorrendo a adjudicatária à subcontratação aproveita das habilitações detidas pelas empresas subcontratadas.”
Vejamos.
O artigo 81.º do CCP, sob a epígrafe “Documentos de habilitação” dispõe o seguinte:
1 - Nos procedimentos de formação de quaisquer contratos, o adjudicatário deve apresentar os seguintes documentos de habilitação:
a) Declaração do anexo ii ao presente Código, do qual faz parte integrante;
b) Documentos comprovativos de que não se encontra nas situações previstas nas alíneas b), d), e) e h) do n.º 1 do artigo 55.º.
2 - A habilitação, designadamente a titularidade de alvará e certificado de empreiteiro de obras públicas, bem como o modo de apresentação desses documentos, obedece às regras e termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área das obras públicas.
3 - (Revogado.)
4 - (Revogado.)
5 - (Revogado.)
6 - (Revogado.)
7 - (Revogado.)
8 - O órgão competente para a decisão de contratar pode sempre solicitar ao adjudicatário, ainda que tal não conste do programa do procedimento, a apresentação de quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações objeto do contrato a celebrar, fixando-lhe prazo para o efeito.
Por seu turno, no artigo 3.º da Lei n.º 41/2015, de 3/06, sob a epígrafe ”Definições” estipula-se que “Para efeitos da presente lei, entende-se por:
a) «Alvará» a permissão, emitida pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I. P.), em suporte eletrónico e comprovável mediante consulta no respetivo sítio na Internet e no balcão único eletrónico dos serviços, que habilita a empresa de construção a realizar obras e respetivos trabalhos especializados cujo valor não exceda o limite previsto para a respetiva classe e, no que se refere às obras públicas, que estejam compreendidos nas subcategorias que elenca;
b) «Atividade da construção» a atividade que tem por objeto a realização de obras, englobando todo o conjunto de atos que sejam necessários à sua concretização;
c) «Categorias» os diversos tipos de obra e trabalhos especializados compreendidos nas habilitações dos empreiteiros de obras públicas;
d) «Certificado» a permissão, emitida pelo IMPIC, I. P., em suporte eletrónico e comprovável mediante consulta no respetivo sítio na Internet e no balcão único eletrónico dos serviços, que habilita a empresa de construção a realizar obras e trabalhos cujo valor não exceda o limite previsto na presente lei e, no que se refere às obras públicas, que estejam compreendidos em determinadas subcategorias;
e) «Classe» o escalão de valores das obras e respetivos trabalhos especializados que as empresas de construção estão habilitadas a executar, sem prejuízo da aplicação de regimes especiais para a execução de certos trabalhos especializados;
(…)
q) «Subcategorias» as obras ou trabalhos especializados em que se dividem as categorias, compreendidos nas habilitações dos empreiteiros de obras públicas;
r) «Subcontratação» a entrega, mediante contrato, de uma empresa de construção a outra da execução dos trabalhos que lhe foram adjudicados pelo dono da obra.
(…)”
E no artigo 6º dessa mesma lei, sob a epígrafe “Alvará de empreiteiro de obras públicas” prescreve-se que:
“1 - O ingresso na atividade de empreiteiro de obras públicas mediante alvará, a requerer nos termos do artigo 12.º, depende do preenchimento cumulativo, pelos requerentes, dos seguintes requisitos:
a) Possuir idoneidade comercial, nos termos do artigo 9.º;
b) Possuir capacidade técnica, nos termos do artigo 10.º;
c) Possuir capacidade económico-financeira, nos termos do artigo 11.º;
d) Ser titular de seguro de acidentes de trabalho para os trabalhadores contratados ao abrigo do direito nacional ou que, em qualquer caso, executem obra a seu cargo em território nacional.
2 - O alvará de empreiteiro de obras públicas habilita a empresa a executar obras públicas que se enquadrem nas categorias e subcategorias nele identificadas, conforme previsto no anexo i da presente lei, que dela faz parte integrante, e nas classes respetivas aprovadas por portaria do membro do Governo responsável pela área da construção.
3 - O alvará de empreiteiro de obras públicas habilita ainda a empresa de construção a executar obras particulares cujo valor se inclua na classe para que está autorizada.
4 - O alvará é válido por tempo indeterminado, sem prejuízo do controlo oficioso dos respetivos requisitos e do seu cancelamento ou suspensão, nos termos da presente lei.
5 - A detenção de alvará de empreiteiro de obras públicas não isenta o titular do cumprimento da Lei n.º 31/2009, de 3 de julho.
(…)”
Por fim, no artigo 8.º, sob a epígrafe “Adequação das habilitações” prevê-se que “Sem prejuízo do disposto nos artigos 19.º e 20.º, nos procedimentos de formação de contratos de empreitadas de obras públicas, a empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela, respeitante aos trabalhos mais expressivos da mesma, sem prejuízo da exigência de habilitação noutras classes e subcategorias relativas às restantes obras e trabalhos a executar.
(…)”;
Por sua vez a Portaria n.º 372/2017, de 14/12, quedefine as regras e os termos de apresentação dos documentos de habilitação do adjudicatário no âmbito de procedimentos de formação de contratos públicos” ( art.1.º) dispõe no seu artigo 2.º, sob a epígrafe “ Documentos de habilitação do adjudicatário em contratos de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços” o seguinte:
1 - Para além dos documentos de habilitação previstos no n.º 1 do artigo 81.º do CCP, no caso de se tratar de um procedimento de formação de um contrato de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços, o adjudicatário deve ainda apresentar os documentos de habilitação que o convite ou o programa do procedimento exija, nomeadamente, no caso de se tratar de um contrato de aquisição de serviços, quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a prestação dos serviços em causa.
2 - Para efeitos de comprovação das habilitações referidas no número anterior, o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes.
3 - Tratando-se de empresas sem sede e direção efetiva em Portugal, o adjudicatário, para além dos documentos referidos no número anterior, deve também apresentar o respetivo comprovativo de inscrição em lista oficial de fornecedores de bens móveis ou de prestadores de serviços de qualquer Estado signatário do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu que revele a titularidade das habilitações adequadas e necessárias à execução das prestações objeto do contrato a celebrar.
4 - O adjudicatário, ou um subcontratado, nacional de Estado signatário do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu ou do Acordo sobre Contratos Públicos da Organização Mundial de Comércio pode ainda apresentar, em substituição dos documentos de habilitação, uma declaração sob compromisso de honra, prestada perante notário, autoridade judiciária ou administrativa ou qualquer outra competente, de que pode executar a prestação objeto do contrato a celebrar no Estado de que é nacional de acordo com as regras nele aplicáveis.
E no artigo 3, sob a epigrafe “Documentos de habilitação do adjudicatário em contratos de empreitada ou de concessão de obras públicas”, determina-se que:
1 - Nos termos previstos no n.º 2 artigo 81.º do CCP, no caso de se tratar de um procedimento de formação de um contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, o adjudicatário deve apresentar documento comprovativo da titularidade de alvará ou certificado de empreiteiro de obras públicas, emitido pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I. P.), contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar.
2 - Para efeitos de comprovação das habilitações referidas no número anterior, o adjudicatário pode socorrer-se dos alvarás ou certificados de empreiteiros de obras públicas de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes.
3 - A titularidade dos alvarás e certificados referidos no número anterior é confirmada pela entidade adjudicante mediante consulta à base de dados de empresas de construção do IMPIC, I. P.
4 - O adjudicatário, ou um subcontratado, nacional de Estado signatário do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu ou do Acordo sobre Contratos Públicos da Organização Mundial de Comércio que não seja titular do alvará ou do certificado referidos nos números anteriores deve apresentar, em substituição desses documentos, uma declaração emitida pelo IMPIC, I. P., comprovativa de que pode executar a prestação objeto do contrato a celebrar por preencher os requisitos que lhe permitiriam ser titular de um alvará ou de um certificado de empreiteiro de obras públicas contendo as habilitações adequadas à execução da obra a realizar.
5 - Independentemente do objeto do contrato a celebrar, o adjudicatário deve ainda apresentar outros documentos de habilitação que o convite ou o programa do procedimento exija.
6 - Os documentos a que se refere o número anterior não são exigíveis a concorrentes nacionais de outro Estado signatário do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu ou do Acordo sobre Contratos Públicos da Organização Mundial de Comércio, quando nesse Estado aqueles documentos não sejam emitidos, devendo porém ser substituídos por uma declaração sob compromisso de honra, prestada perante notário, autoridade judiciária ou administrativa ou qualquer outra competente, de que os documentos em causa não são emitidos nesse Estado.
7 - O órgão competente para a decisão de contratar pode sempre solicitar ao adjudicatário, ainda que tal não conste do convite ou do programa do procedimento, a apresentação de quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações objeto do contrato a celebrar, fixando-lhe prazo para o efeito.
Tenha-se ainda em conta a Portaria n.º 119/2012, de 30/04, com a redação da Declaração de Retificação n.º 27/2012, de 30/05, segundo a qual “Nos termos do n.º 5 do artigo 4.º do Decreto –Lei n.º 12/2004, de 9 de janeiro, alterado pelo Decreto –Lei n.º 69/2911 de 15 junho, as habilitações nas várias categorias e subcategorias contidas nos alvarás das empresas de construção são atribuídas por classes, de acordo com o valor dos trabalhos que os seus titulares ficam habilitados a realizar, fixados anualmente por portaria do membro do Governo responsável pelo sector da construção, sob proposta apresentada anualmente pelo Instituto da Construção e do Imobiliário.
(…)
Artigo 1º
As classes de habilitações contidas nos alvarás das empresas de construção, bem como os valores máximos de obra que cada uma delas permite realizar, são fixados no quadro seguinte:
(…)”.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Isto posto, no caso, não estamos perante um contrato de empreitada de obras públicas stricto sensu mas perante um contrato de prestação de serviços que inclui a realização de trabalhos de diversa natureza (3 tipologias de trabalhos), sendo a componente relativa à execução de obras de construção civil de diminuta expressão na economia do contrato.
Conforme resulta do elenco dos factos provados, a entidade adjudicante quantificou a dimensão/ peso dos trabalhos de construção civil a realizar âmbito do contrato a celebrar , tendo estabelecido na Cláusula 28.º, n.º1, alínea c), do Programa do Procedimento a obrigação do concorrente selecionado entregar, de entre os documentos necessários nos termos do artigo 81.º do CCP, em especial, a necessidade de apresentação de Alvará emitido pelo IMPIC, IP com habilitação para a 13.ª subcategoria da 5.ª categoria e da classe correspondente ao valor de € 75.000.
No presente concurso, cujo objeto é a prestação de serviços florestais, em que o preço base do procedimento se encontra distribuído pelas três tipologias de atividade especificadas no Anexo III do caderno de Encargos, e a única espécie de trabalho enquadrável no Alvará exigido pelo Programa do Concurso é a referente aos serviços de beneficiação de caminhos florestais, uma vez que as demais atividades não são enquadráveis no Alvará exigido, e em que o valor base previsto para os trabalhos de beneficiação de caminhos florestais, foi de 76.189,80, como resulta do Anexo II ao caderno de encargos, resultando inequívoco que no presente procedimento a componente relativa à realização de obras tem uma escassa relevância, a exigência de Alvará emitido pelo IMPIC, IP com habilitação para a 13.ª subcategoria da 5.ª categoria e da classe correspondente ao valor de € 75.000, que a entidade adjudicante previu como necessário na cláusula 28.ª, n.º1, alínea c) do Programa de Concurso satisfaz as necessidades de habilitação reclamadas pela natureza dos trabalhos de construção a realizar.
Note-se que não existe Alvará para a execução de serviços florestais por não se considerarem os serviços florestais como trabalhos de construção, conforme resulta do disposto na al. k ) do artigo 3.ºda Lei 45/2015, não sendo as obras de correção torrencial enquadráveis na lista de atividades realizadas no âmbito do Alvará para executar os serviços descritos na 13.º subcategoria da 5.ª categoria e da classe correspondente ao valor de € 75.000.
Deste modo, como bem decidiu a 1.ª Instância “…está provado que pela apreciação dos preços unitários referentes ao Lote 2 adjudicado ao contrainteressado, na verdade, nem todos os trabalhos exigem a posse de qualquer Alvará de construção civil, desde logo, por se tratarem de trabalhos agrícolas ( Facto provado 3…)”.
Ora, a Contrainteressada cumpriu com a exigência colocada pela entidade adjudicante relativamente ao alvará, e esse alvará habilita à realização das obras necessárias efetuar no âmbito do procedimento em causa, que, como própria entidade adjudicante previu, tem mui diminuta relevância na globalidade das prestações a executar.
Assim, tal como entendeu a 1.ª Instância, afigura-se-nos que a adjudicatária, que cumpriu a exigência prevista no artigo 28.º, n.º1, al. c) do Programa de Concurso, quanto ao alvará a juntar, tem de considerar-se titular das habilitações necessárias à execução do contrato ab initio.
Não se desconhece a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo constante do recente Acórdão de 14/01/2021, proferida no processo n.º 0955/19.13BEAVR, que revogou o acórdão proferido por este TCAN, de 15/07/2020, em que estava em causa saber se “face à ausência do programa do procedimento, no que respeita à classe que o alvará deve ter, basta a apresentação de um alvará, na categoria especificada, mas de qualquer classe”.
Partindo da premissa de que nos termos do artigo 8.º da Lei 41/2015 a “empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela” entendeu o STA, nesse aresto, que “ apesar da A./ora recorrida ser titular do alvará de empreiteiro de obras públicas na categoria pretendida, a verdade é que, sendo de 800.000€ o valor do contrato em concurso, e sendo o referido alvará de classe 2 – isto é, até ao valor de 332.000€ - o mesmo não habilita a A./recorrida à realização global e em prestação única – o que, sempre poderá vir a suceder - dos trabalhos que o contrato em concurso neste procedimento pode vir a ser necessário realizar.
Com efeito, podendo considerar-se este contrato como um “contrato tipo cabaz”, de execução continuada e destinado a compreender prestações várias e de naturezas diversas [contrato misto] - a verdade é que durante a pendência do mesmo, pode ser necessário realizar um trabalho de empreitada cujo valor exceda os 332.000,00€ para cuja execução a A./recorrida não estava ab initio habilitada.
Sendo o valor global das obras a realizar no âmbito do concurso em causa de 800 000€, a classe do alvará exigível teria de ser a classe 4, a única que permite a execução das obras até ao valor de 1 400 000€, dado que a classe 2 se destina apenas a obras até ao máximo de 350 000€ e a classe 3 a obras até ao máximo de 700 000€ como decorre do artº 1º da Portaria 119/2012 de 30-04, supra referida.
Isto porque, se os trabalhos a realizar atingem o valor referido no programa do concurso, de 800 000€, então era exigível aos concorrentes que apresentassem o comprovativo da detenção do alvará da categoria 4 e da classe 4, desde logo, por tal exigência resultar do regime legal aplicável [independentemente de tal exigência de classe não constar expressamente prevista nas condições do concurso]”.

Porém, no caso em análise, os trabalhos de construção civil para cuja execução se exige Alvará de empreiteiro de obras públicas foram estimados pela entidade adjudicante, tendo a mesma exigido que fosse apresentando um alvará que em termos de classe cobrisse a realização de obras de construção civil até €75.000,00. Neste concurso, a entidade adjudicante delimitou/definiu e quantificou os trabalhos de construção civil que seria necessário realizar durante a execução do contrato de prestação de serviços florestais, pelo que, no caso, não estamos perante uma situação em aberto quanto à dimensão que tais trabalhos de construção civil possam vir a assumir na economia do contrato durante a sua execução, logo, estamos perante situação diversa da que vem equacionada no referenciado aresto do STA.

Sempre se dirá que, a exigência de um Alvará de empreiteiro de obras públicas de classe correspondente, in casu, ao valor global do contrato relativo à prestação de serviços florestais quando a natureza dos trabalhos de construção civil a realizar no âmbito desse contrato, dado o seu reduzido peso, são marginais, enquadrando-se num valor a que corresponde uma classe de Alvará distinta da relativa ao valor total do contrato, é que seria uma estipulação arbitrária e violadora do princípio da concorrência. Um tal procedimento, afastaria do concurso como está bom de ver todas aquelas empresas que, tendo capacidade para executar o contrato de prestação de serviços florestais se veriam impedidas de se candidatam ao concurso por no mesmo se prever a necessidade de realização de algumas obras de construção civil, de reduzido significado no contrato mas para cuja execução se estivesse a exigir a titularidade de um alvará de empreiteiro de construção civil de classe correspondente ao valor global do contrato e que apenas fossem detentoras de alvará de classe correspondente ao valor das obras de construção civil a realizar efetivamente no âmbito do contrato em causa.

Em face de tudo quando se expôs, também não assiste razão à apelante no que a este este segmento do recurso concerne.
**
IV- DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso, e, confirmam a decisão recorrida.

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Custas pela Apelante, nos termos do artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

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Notifique.

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Porto, 19 de março de 2021.

Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Isabel Jovita, em substituição

____________________________________
i-. Cfr. Ac. do TCAS, de 26/07/2019, proc. N.º 190/18.6BESNT; Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina /2011, págs. 962 e 584; Luís Valadares Tavares, O guia da boa contratação pública - As directivas de 2014 e o DL 111-B/2017, págs.108-110.

ii- Cfr. Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, in ob. cit., pág. 974.

iii- Cfr. Miguel Assis Raimundo, A formação dos contratos públicos, aafdl/2013, pág. 833; Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos …, págs. 963, 969/971, 974/975.Marcelo Rebelo de Sousa, Lições de Direito Administrativo, Vol. I, Lex, 1999, págs. 107-108.

iv- Cfr. Ac. do TCAS, já citado, de 26/07/2019.

v- Cfr.Jorge Andrade da Silva, Dicionário dos contratos públicos, Almedina/2010, págs. 341/342

vi- Cfr. E-book do CEJ, Contratação Publica, abril de 2018, Ana Sofia Alves “ Alterações ao regime do preço anormalmente baixo”, pág. 61

vii- Idem, pág. 65;

viii- Idem, pág. 74;