Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00750/22.0BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/16/2023
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:NULIDADE INSANÁVEL DO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL;
FALTA DE CITAÇÃO DO ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA;
ENCERRAMENTO DO PROCESSO DE INSOLVÊNCIA;
Sumário:I - A declaração de insolvência priva o insolvente dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência (artigo 81.º, n.º 1 do CIRE).

II - O administrador de insolvência fica investido nas vestes de administrador de facto, assumindo a gestão da massa insolvente, tarefa que exerce pessoalmente, arcando ainda com a representação do devedor em todos os assuntos com carácter patrimonial que importem à insolvência.

III - Constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal a falta de citação do administrador da insolvência (artigos 156.º, 165.º, n.º 1 e 4, ambos do CPPT, e 81.º, n.º 4 e n.º 5 do CIRE).

IV - O encerramento do processo de insolvência acarreta, inevitavelmente, a cessação de funções do administrador de insolvência (alínea b) do n.º 1 do artigo 233.º do CIRE)..*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

"AA", contribuinte fiscal n.º ..., residente na Rua de ..., em ..., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 12/12/2022, que julgou improcedente a reclamação formulada contra o acto que determinou o arquivamento do requerimento de arguição de nulidade processual por falta de citação e de declaração da prescrição da dívida exequenda, praticado pela Senhora Coordenadora do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (IGFSS) – Secção do Processo Executivo de ..., em 04/10/2022, proferido no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...21 e apensos, instaurados originariamente contra a sociedade «B,Lda.», para cobrança coerciva de dívidas de contribuições à Segurança Social, respeitantes aos anos de 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
“I. Por sentença de 12/12/2022, o Tribunal a quo julgou improcedente a reclamação apresentada pelo recorrente, do despacho proferido em 04/10/2022, pela Sr.ª Coordenadora do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (IGFSS) – Secção do Processo Executivo de ..., no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...21 e apensos;
II. Julgou o Tribunal a quo improcedentes, todos os pedidos deduzidos pelo Recorrente, mormente: a ilegalidade do despacho reclamado por violação do dever de decisão - artigo 56º da LGT; a nulidade insanável por falta de citação do responsável subsidiário, para a Reversão, na pessoa do Administrador de Insolvência, por poder prejudicar a defesa do interessado, com a consequente anulação do processo de execução fiscal, de acordo com o previsto no artigo 165º n.º 1 al. a), n.º 2 e n.º 4 do CPPT, artigo 156º do CPPT e artigo 81º n.º 4 e n.º 5 do CIRE; a prescrição da quantia exequenda;
III. O Recorrente, não se conforma com tal decisão, pois que a mesma assenta numa errada subsunção dos factos ao direito, e numa errada valoração da prova, tendo o Tribunal a quo omitido resposta à matéria de facto alegada quanto à nulidade por falta de citação, questão de conhecimento oficioso, pelo que incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento de facto e de direito, padecendo a douta sentença recorrida, ainda, do vício de nulidade por omissão de pronúncia, previsto no artigo 615º n.º 1 al. d) do CPC;
IV. O presente recurso tem por objeto: a impugnação da matéria de facto; o erro de julgamento de facto e de direito; a nulidade por omissão de pronúncia de questão de conhecimento oficioso (artigo 615º n.º 1 al. d) CPC e artigo 165º n.º 1 al. a), n.º 2 e n.º 4 do CPPT);
V. Quanto à impugnação da matéria de facto dada como provada, impugnam-se os pontos 20, 23 e 24 da douta sentença recorrida, por entendermos que atenta a prova documental constante dos autos, incorreu o Tribunal a quo, em erro de julgamento;
VI. No que respeita ao ponto 20 dos factos provados, impugna-se a transcrição efetuada, quanto aos fundamentos que levaram ao indeferimento do requerimento onde o recorrente invocou a nulidade da citação e a prescrição da quantia exequenda, por tal transcrição não corresponder ao conteúdo do despacho de 21/04/2022, proferido pela Sr.ª Coordenadora do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (IGFSS), enviado ao Recorrente em 22/04/2022, despacho junto pelo Recorrente à reclamação como doc.2 e constante de fls. 158 a 160 do PEF junto aos autos;
VII. Foi de tal despacho que o Recorrente, deduziu reclamação, em 06/05/2022, reclamação que veio a ser indeferida, liminarmente;
VIII. Só a decisão e fundamentos comunicados ao Recorrente no despacho 21/04/2022, podem ser tidos em conta quanto à matéria dada como provada no ponto 20; pelo que, os fundamentos transcritos no ponto 20 devem passar a ter a redação constante do despacho de 21/04/2022, constante do doc. 2 junto à reclamação e de fls. 158 a 160 do PEF junto aos presentes autos, dando-se o seu conteúdo aqui por integralmente reproduzido e integrado;
IX. O mesmo se diga quanto ao ponto 24 da matéria de facto dada como provada, quanto aos fundamentos transcritos, pelo que se impugna tal transcrição quanto aos fundamentos da decisão de arquivamento proferida em 04/10/2022, decisão cuja reclamação apresentada pelo aqui Recorrente, deu origem aos presentes autos;
X. Apenas sobre a decisão e fundamentos constantes do despacho de 04/10/2022, junto à reclamação e constante de fls. 273 e 274 do PEF junto aos autos, recaiu reclamação do aqui Recorrente, pois só este despacho lhe foi comunicado por correio registado de 06/10/2022; assim, deverão os fundamentos transcritos no ponto 24 da matéria de facto dada como provada passar a ter a redação constante do despacho de 04/10/2022, conforme consta de fls. 273 a 274 do PEF junto aos presentes autos, dando-se o seu conteúdo aqui por integralmente reproduzido e integrado para os devidos efeitos legais;
XI. Quanto à matéria de facto constante do ponto 23, fez o Tribunal a quo uma errada valoração da prova documental junta aos autos, mormente, do requerimento apresentado pelo Recorrente, em 07/09/2022, junto da Secção de Processo Executivo de ..., e junto aos autos como doc. 4 com a reclamação judicial apresentada, quando dá como provado que em tal requerimento o Recorrente invocou “a nulidade da citação”;
XII. Pois, no requerimento de 07/09/2022, o Recorrente requereu fosse conhecida e declarada a nulidade insanável por falta de citação do responsável subsidiário, para a Reversão, na pessoa do Administrador de insolvência, por poder prejudicar a defesa do interessado, com a consequente anulação do processo de execução fiscal, de acordo com o previsto no artigo 165º n.º 1 al. a), n.º 2 e n.º 4 do CPPT, artigo 156º do CPPT, artigo 81º n.º 4 e n.º 5 do CIRE, não invocando, em nenhum momento, a nulidade da citação;
XIII. Pelo que vai, expressamente, impugnada a factualidade dada como provada no ponto 23 dos factos provados, na parte em que dá como provado que “Em 07.09.2022 o Reclamante, representado pela sua advogada, remeteu à Secção de Processo Executivo de ..., novo requerimento invocando a nulidade da citação”; assim, impõe-se alterar a factualidade dada como provada em 23 dos factos provados, devendo o ponto 23 passar a ter a seguinte redação: “23. Em 07.09.2022 o Reclamante, representado pela sua advogada, remeteu à Secção de Processo Executivo de ..., novo requerimento invocando a nulidade insanável por falta de citação do responsável subsidiário na pessoa do Administrador de insolvência, por poder prejudicar a defesa do interessado, com a consequente anulação do processo de execução fiscal, de acordo com o previsto no artigo 165º n.º 1 al. a), n.º 2 e n.º 4 do CPPT, artigo 156º do CPPT, artigo 81º n.º 4 e n.º 5 do CIRE e a prescrição da dívida exequenda, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e aqui se transcreve parcialmente: (...)”.
XIV. Quanto ao erro de julgamento de direito e à nulidade por omissão de pronúncia sobre questão de conhecimento oficioso (artigo 615º n.º 1 al. d) CPC e artigo 165º n.º 1 al. a), n.º 2 e n.º 4 do CPPT), entendemos que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por não ter declarado a ilegalidade do despacho reclamado, por violação do artigo 56º da LGT, assim como, por não ter conhecido da arguida nulidade insanável por falta de citação, por poder prejudicar a defesa do interessado, o que, implica a nulidade da douta sentença recorrida por omissão de pronúncia sobre questão de conhecimento oficioso;
XV. O Tribunal a quo julgou improcedente a invocada ilegalidade do despacho reclamado por violação do dever de decisão previsto no artigo 56º da LGT, por entender que no âmbito do processo de execução fiscal a citação e a decisão que aprecia a arguição de nulidade por falta de citação são atos que revestem natureza de actos processuais não jurisdicionais, e por esse motivo, aos mesmos não se aplicarem os princípios inerentes ao procedimento tributário, nomeadamente, os artigos 54º e ss da LGT, concretamente, o artigo 56º;
XVI. Contudo, jamais podemos concordar com tal decisão, pois, embora no processo de execução fiscal os órgãos da administração tributária possam praticar, atos materialmente administrativos - como resulta do n.º 2 do artigo 103.º da LGT - e atos de natureza processual, revestindo o ato de citação natureza de ato processual não jurisdicional, e que em tal ato o órgão de administração tributária assume um estatuto neutral, supra partes, agindo na qualidade de um mero colaborador operacional do Juiz; o certo é que, quando o órgão de execução fiscal pratica o ato de reversão, dúvidas não podem existir, que aí o órgão de administração tributária intervém no seu exclusivo interesse e como tal, tal ato tem de revestir natureza de ato administrativo em matéria tributária, estando sujeito ao dever legal de decisão e fundamentação;
XVII. O mesmo se diga, quanto à decisão que aprecia a arguição da nulidade insanável por falta de citação do devedor subsidiário, para a Reversão, na pessoa do Administrador de Insolvência; pois que, tal decisão não se trata de um acto automático, mas antes, trata-se de um acto que não prescinde de adequadas ponderações por parte do agente que o pratica, quer a nível fático, quer ao nível da interpretação jurídica, procedendo a operações de raciocínio;
XVIII. No nosso modesto entendimento, estamos perante o enxerto de verdadeiros procedimentos no processo judicial de cobrança; pois, que, no ato em que a Administração Tributária (OEF) conhece e decide sobre a arguida nulidade insanável por falta de citação, não age a mesma com a neutralidade e estatuto supra partes exigido, agindo e assumindo, antes, a qualidade de parte credora/exequente, passando a intervir no seu exclusivo interesse;
XIX. Por esse motivo, entendemos que o órgão de execução fiscal estava obrigado a proferir decisão, expressa, clara e fundamentada, relativamente ao requerimento de 07/09/2022, apresentado pelo Recorrente; não o tendo feito, pugnamos pela ilegalidade do despacho reclamado por violação do dever de decisão previsto no artigo 56º da LGT, ilegalidade que pretendemos ver conhecida e declarada;
XX. No que respeita ao conhecimento da prescrição, entendeu o Tribunal a quo que a dívida não se encontra prescrita, por entender que o prazo de prescrição se interrompeu com a regular citação do responsável subsidiário para a reversão, em 22/10/2012, por força do despacho de 21/04/2022, proferido pela Sr.ª Coordenadora do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (IGFSS) – Secção do Processo Executivo de ..., atribuindo, o Tribunal a quo, efeitos de caso julgado a tal decisão do órgão do execução fiscal, e assim se abstendo de se pronunciar quanto à arguida nulidade insanável por falta de citação, por poder prejudicar a defesa do interessado;
XXI. Decisão com a qual o recorrente jamais pode concordar, pois, que, a Administração Tributária apenas pode praticar no processo de execução fiscal actos que não tenham natureza jurisdicional - artigo 103.º, n.º 1 da LGT -, uma vez que, actos de natureza jurisdicional, somente, podem ser praticados por juízes, dado que são atos com conteúdo decisório que resolvem o conflito de interesses, e só estes estão abrangidos pela força do caso julgado, quando se esgota o poder jurisdicional – artigo 628º do CPC -, leia-se o Acórdão STA de 01/10/2008, Processo n.º ...8, (in www.dgsi.pt), para cuja transcrição constante das Alegações desde já se remete;
XXII. Saliente-se, que no despacho de 21/04/2022, o Órgão de Execução Fiscal, em nenhum momento tomou qualquer decisão sobre a invocada nulidade insanável por falta de citação, apenas tendo decidido sobre a nulidade da citação (que é questão diferente da invocada nulidade por falta de citação) e sobre a prescrição, leia-se o referido despacho, na parte decisória do mesmo;
XXIII. Mais se diga, que embora, o aqui Recorrente, tenha apresentado reclamação de tal despacho, nos termos do artigo 276º do CPPT, invocando a nulidade insanável por falta de citação, o certo é que tal reclamação foi liminarmente indeferida, não tendo o Tribunal conhecido do mérito da causa, sendo tal decisão incapaz de produzir efeito de caso julgado material, por não conhecer sobre o mérito da reclamação;
XXIV. Assim, e porque nenhuma decisão havia sido proferida sobre a invocada nulidade insanável por falta de citação - artigo 165º nº 1 al. a), nº 2 e n.º 4 do CPPT, artigo 156º do CPPT, artigo 81º n.º 4 e n.º 5 do CIRE – requereu, o Recorrente, junto da Secção do Processo Executivo de ... fosse conhecida e declarada a nulidade insanável por falta de citação do responsável subsidiário, para a Reversão, na pessoa do Administrador de Insolvência, por poder prejudicar a defesa do interessado, com consequente anulação do processo de execução fiscal, assim como requereu fosse declarada verificada a prescrição da quantia exequenda;
XXV. Contudo, o órgão de execução fiscal decidido arquivar tal requerimento, alegando como fundamento já ter analisado e decidido tal questão, quer por despacho datado de 27/05/2020, relativamente à prescrição da dívida exequenda, quer por despacho datado de 21/04/2022, relativamente à invocada nulidade por falta de citação do administrador de insolvência e prescrição da quantia exequenda;
XXVI. Uma vez que no despacho de 04/10/2022 o órgão de execução fiscal não se pronunciou, expressamente, quanto à arguida nulidade insanável por falta de citação, nem dela decidiu, (aliás, como já não se tinha pronunciado, expressamente, nem decidido, no despacho anterior, 21/04/2022), peticionou o Recorrente na reclamação judicial apresentada, fosse conhecida e declarada a ilegalidade do despacho reclamado por violação do dever de decisão previsto no artigo 56º da LGT;
XXVII. No entanto, o Tribunal a quo na douta sentença recorrida para além de entender que não se aplica ao ato administrativo reclamado o regime do artigo 56º da LGT, prevalece-se do despacho de 21/04/2022, atribuindo-lhe efeito de caso julgado, para não se pronunciar sobre a arguida nulidade insanável;
XXVIII. Decisão, no nosso modesto entendimento, errada, pois que os actos administrativos não têm a força de caso julgado, por não serem atos jurisdicionais; pelo que, incorreu o Tribunal a quo em manifesto erro de julgamento; e o mesmo sucederia, caso se entendesse que, o ato reclamado é meramente processual de natureza não jurisdicional; leia-se o Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Norte de 19/05/2022, Processo n.º 00040/22.9BEVIS, (in www.dgsi.pt), e cujo trecho se encontra transcrito nas Alegações, e para o qual desde já se remete;
XXIX. Como podemos concluir, estamos perante uma situação idêntica à apreciada no sobredito Acórdão; tal como nos presentes autos, não só não foi proferida qualquer decisão de mérito sobre a questão em causa, pelo que não se formou caso julgado material, como o despacho reclamado (de 04/10/2022) que deu origem aos presentes autos, não é o mesmo de 21/04/2022, embora ambos os despachos sejam semelhantes, assim como os pedidos a eles subjacentes, o certo é que, até ao momento, nenhuma decisão de mérito recaiu sobre os mesmos, com força de caso julgado;
XXX. É, ainda, de referir que, o facto da reclamação do despacho de 21/04/2022 não ter sido conhecida pelo Tribunal, fez com que o direito do Recorrente, a ver a sua pretensão apreciada e decidida, ainda, por um Tribunal, não se encontre precludida, pois que a absolvição da instância, nos ternos do CPC, não prejudica a possibilidade da parte voltar a interpor novamente a ação judicial, tendo por objecto o mesmo pedido, ou lançar mão dos meios adequados para ver a sua pretensão jurisdicionalmente apreciada e decidida;
XXXI. E entendemos que esse também é o entendimento do legislador em matéria tributária ao prever no artigo 56º nº 2 al. a) da LGT que a administração tributária se tiver pronunciado há menos de dois anos sobre pedido do mesmo autor com idênticos objecto e fundamentos não está obrigada a decidir; contudo, tal decisão não tem força de caso julgado, pois, passados 2 anos, volta a estar obrigada a decidir sobre a mesma questão, caso a mesma lhe seja, novamente, apresentada;
XXXII. Quanto ao caso específico das nulidades insanáveis previstas no artigo 165º n.º 1 do CPPT, tais nulidades são de conhecimento oficioso, e a sua arguição é possível até ao trânsito em julgado da decisão final; não sendo nulidades passíveis de sanação por mero decurso do tempo, por falta da sua arguição, ou conhecimento dentro de certos prazos normativamente definidos para esse efeito, então, enquanto não transitar em julgado a decisão final, poderão os interessados invocar as referidas nulidades a todo o tempo, e poderá o tribunal competente delas conhecer oficiosamente;
XXXIII. Sendo as nulidades insanáveis as mais gravosas que podem afetar o processo, dir-se-á, que a nulidade insanável, enquanto não seja conhecida, e enquanto não esteja transitada em julgado a decisão final do processo, sempre será possível de ser arguida ou conhecida oficiosamente;
XXXIV. O Órgão de execução fiscal, quando decide sobre uma nulidade insanável por falta de citação do responsável subsidiário, para a Reversão, na pessoa do administrador de Insolvência, por poder prejudicar a defesa do interessado, como ficou supra exposto quanto à natureza do ato em causa, não age com neutralidade e estatuto supra partes, mas antes assume a qualidade de parte credora/exequente, passando a intervir no seu exclusivo interesse, e nessa medida jamais poderia, no nosso sistema jurídico, a sua decisão, produzir efeitos definitivos, pois tais poderes estão atribuídos pela Constituição da República Portuguesa aos Tribunais;
XXXV. Ao entender-se que a decisão do órgão de execução fiscal produz efeitos de caso julgado, está a violar-se o princípio da reserva da função jurisdicional, princípio de reserva de juiz e o direito do Recorrente ter um processo justo e equitativo, princípios e direitos constitucionalmente consagrados nos artigos 20º, 202º, 203º, 204º e 205º todos da CRP;
XXXVI. Assim, sempre será de concluir, que devido ao facto das nulidades insanáveis serem de conhecimento oficioso, existe o poder-dever dos Tribunais de conhecer das nulidades insanáveis até que se consolide na ordem jurídica a decisão de extinção do processo de execução fiscal; conforme entendimento de Hugo Flores da Silva, mesmo que a nulidade insanável seja, “impropriamente comunicada” a “tomada de consciência” da ocorrência de uma “nulidade insanável” não poderá ser ignorada pelo tribunal, dele se exigindo uma pronúncia sobre a mesma, pois, de outra forma estaríamos perante a negação do carater oficioso do conhecimento das nulidades insanáveis previstas no artigo 165º do CPPT;
XXXVII. Deste modo, e salvo melhor opinião, entendemos que o Tribunal a quo tinha o dever de conhecer da arguida nulidade insanável por falta de citação do responsável subsidiário, para a Reversão, na pessoa do Administrador de insolvência, por poder prejudicar a defesa do aqui Recorrente, ainda que tal conhecimento ocorresse a título acidental, por tal nulidade insanável por falta de citação ser uma questão prévia relativamente ao conhecimento da prescrição e indispensável para da prescrição poder, corretamente, decidir;
XXXVIII. O Tribunal a quo, ao não ter conhecido sobre a invocada nulidade insanável por falta de citação quando possa prejudicar a defesa do interessado, nulidade que é de conhecimento oficioso, omitiu pronúncia sobre questão que devia apreciar, atento o seu dever de ofício, incorrendo, assim, a douta sentença recorrida em nulidade, nos termos do artigo 615º n.º 1 al. d) do CPC, nulidade que desde já requer seja conhecida e declarada;
XXXIX. No que respeita à prescrição, e sendo que para a apreciação da mesma são de ter em consideração se ocorreu alguma causa interruptiva ou suspensiva da prescrição, tais questões incidentais têm de ser tidas em conta para a apreciação da invocada prescrição;
XL. Tendo o Tribunal a quo, como ficou supra exposto, se imiscuído de conhecer da arguida nulidade insanável, considerou que o Recorrente se encontrava validamente citado, em 22/10/2012, enquanto responsável subsidiário para a Reversão, por força do efeito do caso julgado que atribuiu ao despacho do órgão de execução fiscal de 21/04/2022, tendo tal citação o efeito de interromper o prazo de prescrição em curso, julgando a dívida exequenda não prescrita;
XLI. Contudo, como ficou supra exposto, jamais poderá proceder a decisão do Tribunal a quo, por a mesma não ter conhecido da nulidade insanável invocada pelo Reclamante, por falta de citação do responsável subsidiário para a Reversão na pessoa do Administrador de Insolvência, por poder prejudicar a defesa do aqui Recorrente, conforme o alegado em sede de reclamação;
XLII. Se o Tribunal a quo tivesse conhecido da arguida nulidade insanável, sempre deveria decidir pela declaração da mesma, pois que a reversão no âmbito do PEF e apensos em causa ocorreu quando o Recorrente se encontrava insolvente, e como tal, a citação do responsável subsidiário para a reversão deveria ter sido efetuada na pessoa do Administrador de Insolvência, nos termos do preceituado no artigo 156º do CPPT e artigo 81º n.º 4 e 5 do CIRE, o que não aconteceu, sendo que a falta de citação do Administrador de Insolvência implica, sempre, a possibilidade de prejuízo para a defesa do interessado, aqui Recorrente;
XLIII. Declarada a nulidade insanável por falta de citação, sempre se teria de concluir pela não interrupção do prazo de prescrição da dívida exequenda, quanto ao Recorrente, por o mesmo não se encontrar citado para a reversão, pelo que a dívida exequenda por falta de pagamento de contribuições à Segurança Social respeitantes aos anos de 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011, encontra-se prescrita, por já terem decorrido mais de 5 anos sobre aquelas datas, nos termos do artigo 187º n.º 1 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social;
XLIV. Pelo que deverá ser declarada a prescrição da dívida exequenda, com consequente extinção da execução, motivo pelo qual também quanto à prescrição deverá ser revogada a sentença recorrida e ser verificada a prescrição da dívida exequenda, declarando-a extinta;
XLV. Com a decisão recorrida o Tribunal a quo violou o preceituado nos artigos: 56º e 103º n.º 2 ambos da LGT; 165º nº 1 al. a) e n.º 2 e nº 4 do e 276º ambos do CPPT; 608º n.º 2, 628º e 629º todos do CPC; 20º, 202º, 203º, 204º e 205º todos da CRP.
Termos em que requer a V. Ex.ªs se dignem conceder provimento ao presente recurso, revogando a douta sentença recorrida, fazendo assim Inteira e Sã JUSTIÇA.”
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O Recorrido não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida enferma de nulidade, por omissão de pronúncia, e se incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, por considerar que o acto reclamado em crise era legal, não se verificando, além do mais, a prescrição das dívidas exequendas em causa.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto
Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
A. De facto
Compulsados os autos e analisada a prova produzida dão-se como provados, com interesse e bastantes para a decisão, os factos infra indicados:
1. Correm termos na Secção de Processo de Executivo de ... do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. os seguintes processos de execução fiscal (PEF), instaurados contra «B,Lda.»:
a. ...21, instaurado para cobrança de contribuições dos períodos de 2008/03 a 2008/12;
b. ...24, instaurado para cobrança de contribuições e cotizações dos períodos de 2007/06 a 2007/09 e de 2009/01 a 2009/07;
c. ...93, instaurado para cobrança de contribuições e cotizações dos períodos 2009/08 a 2010/01;
d. ...77, instaurado para cobrança de contribuições dos períodos de 2010/02 a 2010/06;
e. ...51, instaurado para cobrança de contribuições dos períodos de 2010/07 a 2010/11;
f. ...77, instaurado para cobrança de contribuições dos períodos de 2010/12, 2011/02 e 2011/05;
– cfr. os aludidos PEFs, constantes da plataforma SITAF;
2. Os PEF’s mencionados nas alíneas b. a f. foram apensados ao PEF mencionado na alínea a. – cfr. informação prestada pelo órgão de execução fiscal;
3. Em 19.06.2009 foi remetido à executada ofício “citação” no âmbito do PEF n.° ...21, por carta registada com aviso de receção assinado em 01.07.2009 – cfr. fls. 2-7 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
4. Em 24.07.2009 foi deferido o plano prestacional n.° 1936/2009 para o PEF n.° ...21, cuja notificação de deferimento foi remetida à executada em 31.07.2009, com prestações pagas entre 24.08.2009 e 31.01.2011 – cfr. fls. 48-49 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
5. Em 20.12.2009 foi remetido à executada ofício “citação” no âmbito do PEF n.° ...24, por carta registada com aviso de receção assinado em 01.02.2010 – cfr. fls. 9-14 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
6. Em 26.02.2010 foi deferido o plano prestacional n° 852/2010 para o PEF n.° ...24, cuja notificação de deferimento foi remetida à executada em 09.03.2010, com prestações pagas entre 30.04.2010 e 31.01.2011 – cfr. fls. 54-56 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
7. Em 21.05.2010 foi remetido à executada ofício “citação” no âmbito do PEF n.° ...93, por carta registada com aviso de receção assinado em 26.05.2010 – cfr. fls. 15-20 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
8. Em 15.06.2010 foi deferido o plano prestacional n.° 2607/2010 para o PEF n.° ...93, com prestações pagas entre 30.09.2010 e 31.01.2011 – cfr. fls. 59-60 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
9. Em 19.09.2010 foi remetido à executada ofício “citação” no âmbito do PEF n.° ...77, por carta registada com aviso de receção assinado em 27.09.2010 – cfr. fls. 21-25 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
10. Em 07.12.2010 foi deferido o plano prestacional n.° 4901/2010 para o PEF n° ...77, cuja notificação de deferimento foi remetida à executada em 07.01.2011, com prestações pagas entre 30.01.2011 e 29.07.2011 – cfr. fls. 63-66 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
11. Em 16.02.2011 foi remetido à executada ofício “citação” no âmbito do PEF n.° ...51 e apensos, por carta registada com aviso de receção assinado em 21.02.2011 – cfr. fls. 28-32 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
12. Em 09.04.2011 foi deferido o plano prestacional n.° 1195/2011 para o PEF n.° ...51, com prestações pagas entre 29.06.2011 e 29.07.2011 – cfr. fls. 68-69 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
13. Em 12.08.2011 foi remetido à executada ofício “citação” no âmbito do PEF n.° ...77 e apensos, por carta registada com aviso de receção assinado em 24.08.2011 – cfr. fls. 35-39 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
14. Em 26.08.2011 foi deferido o plano prestacional n.° 6324/2011, para os PEF’s n.°s ...21, ...24, ...93, ...77, ...51 e ...77, cuja notificação de deferimento foi remetida à executada na mesma data, com prestações pagas entre 27.09.2011 e 17.11.2011 – cfr. fls. 71-73 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
15. Por sentença transitada em julgado em 11.07.2011, proferida no âmbito do processo de Insolvência pessoa singular número ...4/11.8TB..., que corre termos no Tribunal Judicial de ... – ... Juízo Cível, foi declarada a insolvência do Reclamante – cfr. documento com o número de ordem 14 do processo em suporte digital constante da plataforma SITAF;
16. Por ofício de 03.10.2011 o Tribunal Judicial de ... comunicou ao Centro Distrital da Segurança Social de ... que, no âmbito do processo mencionado no ponto antecedente, foi proferido despacho inicial no incidente de exoneração do passivo restante – cfr. fls. 148-149 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
17. Em 08.10.2012, foi proferido despacho de reversão da dívida em execução nos PEF’s mencionado em 1. para o aqui Reclamante – cfr. fls. 81 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
18. Na mesma data foi emitido ofício “Citação (Reversão)”, o qual foi remetido ao Reclamante por correio registado com aviso de receção, assinado em 22.10.2012 pelo próprio – cfr. ofício e aviso de receção de fls. 81-83 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
19. Em 05.04.2022 o Reclamante, representado pela sua advogada, remeteu à Secção de Processo Executivo de ..., requerimento invocando a nulidade da citação e a prescrição da dívida exequenda, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e aqui se transcreve parcialmente:
“(...)
10.
Em face da declaração de insolvência do Requerente, pretendendo a Segurança Social levar a cabo o ato de citação com vista a Reversão, e apesar de, como se disse, sermos do entendimento que, devido a suspensão dos processos executivos, não poderiam ser realizadas diligencias tendentes a citação, o facto e que caso se considerasse que a mesma deveria ser praticada com vista a evitar dano irreparável.
11.
Sempre tal citação, sob pena de ser considerada nula — artigo 165 n.° 1 e 4° do CPPT - deveria ser efetuada na pessoa do Administrador de Insolvência, (nos termos do artigo 156° do CPPT, a qual dispõe:
“Se o funcionário ou a pessoa quo deva realizar o ato verificarem quo o executado foi declarado em estado de falência, o órgão de execução fiscal ordenará que a citação se faça na pessoa do liquidatário judicial”.
12.
Estas disposições legais têm de ser lidas de forma atualista, atendendo a entrada em vigor do CIRE, aprovado pelo DL n.° 53/2004, de 18 de marco, e que revogou o Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência (cfr. art.° 11º do preâmbulo deste diploma).
13.
Assim, as menções feitas ao liquidatário judicial têm de ser interpretadas no sentido de serem feitas ao administrador de insolvência.
14.
Por sua vez, preceitua o artigo 81.º n.º 4 e 5 do CIRE:
“4 - O administrador da insolvência assume a representação do devedor pare todos os efeitos de carácter patrimonial qua interessem a insolvência.
5 - A representação não se estende a intervenção do devedor no âmbito do próprio processo de
insolvência, seus incidentes a apensos, salvo expressa disposição em contrário.”.
15.
Como tal, qualquer citação que V. Ex.as pretendessem realizar, embora não fosse admissível enquanto o processo executivo estivesse suspenso, sempre teria de ser feita na pessoa do administrador de insolvência, o que não sucedeu.
(...)
17.
Aqui chegados, concluímos que em momento algum houve a citação do Requerente para a
Reversão uma vez que a citação para a Reversão sempre teria de ser feita na pessoa do Sr. Administrador de Insolvência nos termos do artigo 156° e artigo 81° n.º 4 e 5 do CIRE.
18.
Ao não ter sido efetuada na pessoa do Sr. Administrador de Insolvência, a citação é nula, nulidade que e de conhecimento oficioso, tudo nos termos do artigo 165° n.° 1 al. a) e n.° 4 do CPPT. (...)”.
– cfr. requerimento de fls. 141-145 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
20. Por despacho de 21.04.2022 da Sr.ª Coordenadora da SPE ... do IGFSS, remetido à advogada do Reclamante por correio registado em 22.04.2022, foi indeferido o requerimento mencionado no ponto antecedente designadamente, com os seguintes fundamentos:
“ (...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)”. – cfr. despacho, informação e ofício de fls. 153-160 do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
21. Em 06.05.2022 o Reclamante deduziu reclamação judicial do despacho mencionado no ponto antecedente, a qual deu origem ao processo n.º 417/22.0BEAVR neste Tribunal – cfr. reclamação de fls. 164 e ss. do PEF (parte II) integrante do SITAF (numeração manual);
22. A reclamação judicial apresentada pelo ora Reclamante foi liminarmente indeferida por decisão de 27.06.2022, notificada à mandatária do Reclamante por ofício de 28.06.2022, por não ter sido dada resposta ao convite para apresentar nova petição onde fossem incluídas conclusões – cfr. decisão de fls. 240 e ss. do PEF (parte II) integrante do SITAF (numeração manual) e consulta do aludido processo no SITAF;
23. Em 07.09.2022 o Reclamante, representado pela sua advogada, remeteu à Secção de Processo Executivo de ..., novo requerimento invocando a nulidade da citação e a prescrição da dívida exequenda, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e aqui se transcreve parcialmente:
“(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)”. – cfr. requerimento de fls. 246 e ss. do PEF integrante do SITAF (numeração manual);
24. Por despacho de 04.10.2022 da Sr.ª Coordenadora da SPE ... do IGFSS, remetido à advogada do Reclamante por correio registado em 06.10.2022, foi arquivado o requerimento mencionado no ponto antecedente designadamente, com os seguintes fundamentos:
“(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)”. – cfr. docs. de fls. 270 e ss. do PEF integrante do SITAF (numeração manual).
*
No mais, considera-se não provada, conclusiva, de direito ou sem relevância para a decisão a proferir, a matéria alegada a que se não fez referência.
*
Motivação da matéria de facto
No que respeita aos factos provados, conforme especificado nos diversos pontos da matéria de facto provada, a decisão da matéria de facto efetuou-se com base na conjugação dos documentos e informações oficiais constantes dos autos.
É esta, em suma, a motivação que subjaz ao juízo probatório formulado.”
*
Para melhor compreensão das decisões pertinentes que foram proferidas no âmbito dos processos de execução fiscal em causa, reformula-se a decisão da matéria de facto da seguinte forma, ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, indo ao encontro das alterações solicitadas pelo Recorrente [cfr. conclusões V. a XIII. das alegações do recurso]:
20. Em 19/04/2022 foi emitida informação sobre o requerimento referido no ponto 19, sendo indicado como assunto “arguição de nulidade da citação”, da qual se extractam os fundamentos acima reproduzidos por imagem (anterior ponto 20) – cfr. fls. numeradas manualmente 154 a 157 do PEF ínsito no SITAF.
20-A. Em 21/04/2022 foi proferida decisão, pela Senhora Coordenadora da SPE de ..., sobre o requerimento mencionado no ponto 19 com o seguinte teor:
“Face ao exposto na presente informação, indefiro o requerimento de arguição de nulidade da citação e de declaração de prescrição, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...21 e apensos, apresentado pelo revertido "AA", por não ter ocorrido nulidade da citação, bem como por se manter, nos termos do meu despacho proferido em 27/05/2020, a exigibilidade, por não prescrição, de toda a dívida que o enforma, relativamente ao mesmo revertido.
Notifique-se o mandatário em conformidade.” - cfr. fls. numerada manualmente 153 do PEF ínsito no SITAF.
20-B. Foi enviada carta registada à advogada do Reclamante com o seguinte teor:
“(…) ASSUNTO Reversão - Arguição nulidade da citação
PEF n.º ...21 a apensos
Revertido: "AA", NIF ...
Devedor originário: «B,Lda.», NIPC ...
Pelo presente, fica V./ Exa. notificada, na qualidade de mandatária do revertido "AA", que, por meu despacho de 21/04/2022, foi indeferido o requerimento de arguição de nulidade da citação e declaração de prescrição, apresentado nos autos supra identificados, com os seguintes fundamentos:
Nos presentes autos, o requerente/revertido invoca que a citação em reverso é nula por não ter sido efetuada na pessoa do Sr. Administrador de Insolvência, requerendo que seja declarada a nulidade da citação.
Nulidade por falta de citação e nulidade da citação são coisas distintas.
A falta de citação só constitui nulidade insanável se a sua efetivação puder ter prejudicado a defesa do interessado. A possibilidade de prejuízo existe quando for precludida, pelo decurso do prazo, a oportunidade de deduzir oposição à execução. No entanto, só ocorre falta de citação quando o respetivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do ato por motivo que lhe não foi imputável, nos termos do n.º 6 do art.º 190.º do CPPT.
Por seu turno, a nulidade da citação ocorre quando a citação tenha sido realizada, mas não tenham sido observadas as formalidades prescritas no art.º 190.º do CPPT (art.º 191.º, n.º 1 do CPC).
A nulidade insanável provocada por falta de citação pode ser conhecida oficiosamente ou pode ser invocada a todo o tempo, pelo interessado; já a nulidade da citação só pode ser conhecida na sequência de arguição do interessado e dentro do prazo legal para deduzir oposição, sendo que tal prazo é de 30 dias (art.º 203.º, n.º 1 do CPPT).
Veja-se, neste sentido, a posição jurisprudencial firmada no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 10/07/2014, proferido no processo nº 07845/14, no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 30/03/2017, proferido no processo n.º 00239/126BEPNF, bem como no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 02/04/2014, proferido no processo n.º 0247/14.
Nos presentes autos, não ocorreu falta de citação, uma vez que mesma foi remetida, por carta registada com aviso de receção, a0 responsável subsidiário, tendo sido o aviso de receção assinado em 22/10/2012.
Por outro ado, a citação foi pessoal, nos termos da al. b) do n.º 3 do art.º 191.º do CPPT, e foi efetuada nos termos da al. b) do n.º 2 do art.º 225.º do CPC, ex vi do n.º 1 do art.º 192.º do CPPT.
O facto de o responsável subsidiário da devedora originária se encontrar insolvente não é impeditivo de se efetuar contra ele a reversão da execução fiscal, estando a mesma prevista no art.º 23.º, n.º 7 da LGT. Por outro ado, essa reversão torna-se necessária para que o credor tributário possa reclamar os seus créditos sobre o responsável subsidiário no seu processo de insolvência.
Acresce ainda que, antes da reversão, não existe qualquer processo de execução contra o responsável subsidiário que deva ser sustado, o qual só passa a existir com o ato de reversão.
Vejam-se, neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, datados de 12/02/2020 e de 11/05/2015, proferidos, respetivamente, nos processos nºs 0105/15.3BESNT e 01017/14.
O fundamento que o revertido alegada para justificar a nulidade da citação (o facto de a mesma não ter sido efetuada na pessoa do Administrador de Insolvência), não seria uma causa de nulidade da citação, a arguir por requerimento, no prazo de 30 dias a contar da citação, mas uma eventual causa de ilegalidade da reversão, a qual seria fundamento de oposição à execução, nos termos da al. i) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT.
Assim, nos presentes autos, por um lado, a citação em reversão foi efetuada nos termos legais, pelo que não padece de nulidade; por outro ado, tendo sido o responsável subsidiário citado em 22/10/2012, o mesmo dispunha de 30 dias a contar dessa data para arguir, perante este órgão de execução, tal nulidade e/ou para, não concordando com a reversão, deduzir oposição à execução, nos termos do art.º 204.º do CPPT. O revertido não fez uso de qualquer desses direitos no referido prazo, sendo o requerimento agora apresentado manifestamente extemporâneo.
Relativamente à invocada prescrição, a mesma foi analisada relativamente ao revertido "AA", em Maio de 2020, no âmbito do PEF n.º ...21 e apensos, tendo sido declarada não prescrita a dívida, por despacho proferido em 27/05/2020, atentos os factos interruptivos e suspensivos ocorridos, nomeadamente, a eficácia duradoura da citação. O teor deste despacho foi notificado ao revertido por ofício remetido sob registo postal, com aviso de receção, em 28/05/2020, aviso este rececionado em 01/06/2020, cujas cópias se anexam.
Nos termos do n.º 2 do art.º 56.º da Lei Geral Tributária, este órgão de execução não tem que proferir nova decisão sobre o pedido de prescrição agora efetuado pelo revertido, uma vez que proferiu, há menos de dois anos, despacho sobre pedido do mesmo revertido e com o mesmo objeto e fundamentos.
No entanto, sendo a prescrição de conhecimento oficioso, na presente data, reitera-se o conteúdo do despacho proferido em 27/05/2020, uma vez que se mantêm os factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição então apurados.
Do presente despacho cabe reclamação, nos termos do art.º 276.º e seguintes do CPPT. (…)” – cfr. fls. numeradas manualmente 158 a 160 do PEF ínsito no SITAF.
23. Em 07/09/2022, o Reclamante, representado pela sua advogada, remeteu à Secção de Processo Executivo de ..., requerimento invocando a nulidade insanável do processo de execução fiscal por falta de citação do responsável subsidiário na pessoa do Administrador de Insolvência, por poder prejudicar a defesa do interessado, com o consequente pedido de anulação do processo de execução fiscal, de acordo com o previsto no artigo 165.º, n.º 1, al. a), n.º 2 e n.º 4 do CPPT, no artigo 156.º do CPPT, no artigo 81.º, n.º 4 e n.º 5 do CIRE, e a prescrição da dívida exequenda, com o teor parcialmente transcrito supra através de imagem (anterior ponto 23) – cfr. fls. numeradas manualmente 246 e seguintes do PEF ínsito no SITAF.
24. Em 03/10/2022 foi emitida informação sobre o requerimento referido no ponto 23, sendo indicado como assunto “arguição de nulidade da citação”, da qual se extractam os fundamentos acima reproduzidos por imagem (anterior ponto 24) – cfr. fls. numeradas manualmente 270 a 272 do PEF ínsito no SITAF.
24-A. Em 04/10/2022 foi proferida decisão, pela Senhora Coordenadora da SPE de ..., sobre o requerimento mencionado no ponto 23 com o seguinte teor:
“Face ao exposto na presente informação, arquive-se o requerimento de arguição de nulidade da citação e de declaração de prescrição, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...21 e apensos, apresentado pelo revertido "AA", uma vez que tal pretensão já foi analisada e decidida quer por despacho datado de 21-04-2022, relativamente à invocada nulidade por falta de citação do administrador de insolvência e prescrição da dívida exequenda, quer em 27-05-2020, relativamente, prescrição da dívida exequenda.
Notifique-se o mandatário em conformidade.” - cfr. fls. numerada manualmente 270 do PEF ínsito no SITAF.
24-B. Foi enviada carta registada à advogada do Reclamante com o seguinte teor:
“(…) ASSUNTO Reversão - Arguição nulidade da citação e prescrição
PEF n.º ...21 a apensos
Revertido: "AA", NIF ...
Devedor originário: «B,Lda.», NIPC ...
Pelo presente, fica V. Exa. notificada, na qualidade de mandatária do revertido "AA", que, após análise ao requerimento apresentado em 07-09-2022, o mesmo foi arquivado por meu despacho de 04-10-2022, com os seguintes fundamentos:
A arguição da nulidade por falta de citação do Administrador de Insolvência e de prescrição da dívida exequenda, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...21 e apensos, já foi analisada e decidida quer por despacho datado de 27-05-2020, relativamente a prescrição da dívida exequenda, quer por despacho datado de 21-04-2022, relativamente a invocada nulidade por falta de citação do administrador da insolvência e prescrição da dívida exequenda.
Tal decisão foi devidamente notificada por ofício remetido a 22-04-2022, sob o registo postal n.º RF........50PT.
Desta notificação, foi apresentada reclamação judicial em 05-05-2022, a qual foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro em 02-06-2022, onde corre termos com o n.º 417/22.0BEAVR.
Consultado o SITAF, a fls. 244, consta Sentença datada de 27-06-2022, a indeferir liminarmente a reclamação judicial, tendo a mesma sido notificada, por aquele Tribunal, em 28-06-2022. Mais se verifica que não foi apresentado Recurso da mesma.
Face ao exposto e nos termos do n.º 2 do art.º 56.º do Lei Geral Tributária (LGT) este órgão de execução não tem que proferir nova decisão sobre os pedidos agora efetuados pelo revertido, uma vez que proferiu, há menos de dois anos, despacho sobre pedido do mesmo revertido e com o mesmo objeto e fundamentos.
No entanto, sendo a prescrição de conhecimento oficioso, na presente data, reitera-se a conteúdo dos despachos proferidos em 27-05-2020 e em 21-04-2022, uma vez que se mantêm os factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição então apurados.
Do presente despacho cabe reclamação, nos termos do art.º 276.º e seguintes do CPPT. (…)” – cfr. fls. numeradas manualmente 273 e 274 do PEF ínsito no SITAF.

Pela pertinência para o conhecimento do objecto do recurso e uma vez que os respectivos documentos identificados se mostram ínsitos nos autos, adita-se ao probatório a seguinte factualidade, nos termos do artigo 662.º, n.º 1 do Código de Processo Civil:
25. Em 25/05/2011, foi enviada pelo Tribunal Judicial de ... carta registada ao Centro Distrital da Segurança Social de ... contendo informação prestada nos termos do artigo 38.º do CIRE, relativa à declaração de insolvência de "AA", aqui Recorrente, no âmbito do processo n.º ...4/11.8TB..., bem como identificação do respectivo administrador da insolvência nomeado – cfr. fls. numeradas manualmente 80, 180 e 181 do PEF ínsito no SITAF.
26. Por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo de Comércio de ... – Juiz ..., proferida em 26/02/2015, foi determinado o encerramento do processo de insolvência, referido nos pontos 15 e 25, com os efeitos previstos no artigo 233.º, n.º 1, alíneas a), b), d) e n.º 2, alínea a) do CIRE, tendo transitado em julgado em 17/03/2015 – cfr. fls. numeradas manualmente 188 e 189 do PEF ínsito no SITAF e certidão junta à reclamação como documento n.º 6.
27. Em 27/05/2020, foi enviada pela Senhora Coordenadora do Processo Executivo de ... ao Recorrente carta registada com aviso de recepção, assinado em 01/06/2020, com o seguinte teor:
ASSUNTO Análise do prazo prescricional
Processos Executivos n.º ...21 e apensos
Revertido: "AA", NIF ...
Exmo(a). Senhor{a)
Fica V/ Ex.a notificado de que foi declarada a exigibilidade da dívida, por não prescrição, nos processes de execução fiscal n.º ...21 e apensos, considerando o efeito interruptivo, com eficácia duradoura, da citação nos termos do n.º 1 do art.º 327.º do Código Civil, conjugado com o efeito suspensivo do pagamento em prestações devidamente autorizado, nos termos do n.º 4 do artigo 49.º da Lei Geral Tributária, pelo que se mantém até termo dos processos de execução fiscal (cópias em anexo).
Da presente decisão cabe reclamação judicial para o tribunal tributário de 1.ª instância, nos termos do art.º 276.º e seguintes do Código de Procedimento e Processo Tributário e 103.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária. (…)” – cfr. fls. numeradas anualmente 209 e 210 do PEF ínsito no SITAF.

2. O Direito

Na conclusão XIV das alegações do recurso, o Recorrente invocou a nulidade da sentença recorrida, com base no disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil (CPC), porquanto, na sua perspectiva, o tribunal “a quo” omitiu pronúncia sobre questão que deveria ter apreciado, pois não conheceu sobre a invocada nulidade insanável por falta de citação quando possa prejudicar a defesa do interessado.
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia ou a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), no penúltimo segmento da norma.
A nulidade por omissão/excesso de pronúncia traduz-se no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artigo 608.º, n.º 2 do CPC, que impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; e, por outro lado, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes, salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente.
Lembramos que ocorre nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões a que esteja obrigado a pronunciar-se.
Nesta matéria, a jurisprudência tem reiteradamente afirmado que “só pode ocorrer omissão de pronúncia quando o juiz não toma posição sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento, e da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio” (cfr. Acórdão do STA, de 19/09/2012, processo n.º 0862/12).
Por conseguinte, só há omissão de pronúncia “quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões” (cfr. Acórdão do STA, de 28/05/2014, processo n.º 0514/14).
Efectivamente, não residem dúvidas que a imputação de nulidade insanável ao processo de execução fiscal por falta de citação do administrador da insolvência é a questão fulcral que foi colocada ao órgão de execução fiscal e que este se absteve de conhecer, com base na motivação constante do acto aqui impugnado. Conforme decorre da petição de reclamação, o reclamante pretende, nos presentes autos, não só a eliminação da ordem jurídica do acto reclamado, mas também a declaração de nulidade insanável por falta de citação e consequente anulação do processo de execução fiscal, bem como a declaração da prescrição das dívidas exequendas.
Vejamos como a sentença recorrida abordou a questão:
«(…) Acontece que o Reclamante considera que se verifica uma nulidade insanável por falta de citação do administrador da insolvência para a reversão, não tendo a sua citação, por isso, qualquer efeito interruptivo da prescrição.
Ora, quer a falta de citação quer a nulidade da citação, por inobservância das formalidades rescritas na lei devem ser arguidas perante o órgão da execução fiscal, sendo a eventual decisão desfavorável passível de reclamação para o Tribunal Tributário.
Embora se admita o seu conhecimento a título incidental pelo Tribunal, se a nulidade/falta de citação forem de considerar como questão prévia relativamente ao conhecimento de uma outra questão (cf. neste sentido o Acórdão do TCA Norte de 29.01.2015, exarado no Proc. n.° 00321/13.2BECBR), no caso que nos ocupa, mesmo sendo essencial aferir da regularidade/concretização da citação do Reclamante para efeitos de conhecer da prescrição da dívida exequenda, está a signatária vinculada à decisão proferida pelo órgão de execução em 21.04.2022. (…)
Ora, quando um despacho judicial (ou, no caso que nos ocupa, do órgão de execução fiscal) se pronuncia no sentido de não dever ser praticado certo ato prescrito por lei - neste caso, a citação do administrador da insolvência - a questão deixa de ter o tratamento das nulidades processuais para seguir o regime do erro de julgamento, por a infração praticada passar a ser coberta pela decisão proferida (cfr. neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no Proc. n.° 1250/20.9T8VIS.C1).
Tal erro "de julgamento", no caso de um despacho do órgão de execução fiscal, só pode ser invocado dentro do prazo legalmente estabelecido no artigo 277.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário para o exercício do direito de reclamar, conforme tem vindo a ser entendido pelo STA (v., a título de exemplo, o Acórdão de 25.09.2019 proferido no Proc. n.° 0673/19.0BESNT).
O despacho de 21.04.2022, porque recaiu unicamente sobre a relação processual, designadamente na parte que se referiu à falta de citação do administrador da insolvência, tem força obrigatória dentro do processo (cfr. artigo 620.° do Código de Processo Civil), encontrando-se consolidado na ordem jurídica com efeitos de caso julgado, pois que não é mais suscetível de reclamação (cfr. artigos 628.° do Código de Processo Civil e 277.°, n.° 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
Impõe-se, por isso, nesta sede, considerar que se mostra regular a citação do responsável subsidiário, efetuada pelo ofício que lhe foi dirigido e que este recebeu em 22.10.2012 (cfr. ponto 18 do probatório). (…)»
Portanto, entendeu a Meritíssima Juíza “a quo” que tal questão já se mostrava consolidada na ordem jurídica, pelo que não poderia ser, agora, sindicada.
Reiteramos que a apontada nulidade por omissão de pronúncia só ocorre nos casos em que o Tribunal “pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. No entanto, mesmo que entenda não dever conhecer de determinada questão, o tribunal deve indicar as razões por que não conhece dela, pois, tratando-se de uma questão suscitada, haverá omissão de pronúncia se nada disser sobre ela” - Vide Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e comentado, volume II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 363. Neste sentido, entre muitos outros, podem ver-se os acórdãos do STA de 13/07/11 e de 20/09/11, proferidos nos recursos n.º 0574/11 e n.º 0268/11, respectivamente.
A este propósito, importa recordar Alberto dos Reis, segundo o qual “uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção” - Vide Alberto dos Reis, CPC, anotado, Volume V, pág. 143.
Ora, in casu, conforme decorre da transcrição parcial que realizámos da sentença recorrida, observa-se que a Meritíssima Juíza “a quo” apontou razões para justificar a sua não tomada de posição sobre a falta de citação do administrador da insolvência para o processo executivo em apreço.
Uma vez que a sentença recorrida indicou explicitamente os motivos para não tomar conhecimento da questão indicada pelo Recorrente, não podemos falar em nulidade da mesma, mas somente em eventual erro de julgamento quanto a esta parte.

Na medida em que a decisão da matéria de facto se encontra estabilizada, uma vez que, genericamente, já acolhemos supra os pedidos de alteração formulados pelo Recorrente quanto aos pontos 20, 23 e 24 da mesma, haverá, então, que apreciar se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento.
Como resulta da sentença recorrida, a Meritíssima Juíza considerou que tanto na decisão proferida em 21/04/2022 (pontos 20, 20-A e 20-B do probatório) como na decisão proferida em 04/10/2022, aqui reclamada, (pontos 24, 24-A e 24-B do probatório) se tratou a mesma questão suscitada junto do órgão de execução fiscal.
É um facto que o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. tratou sempre o assunto como “arguição de nulidade da citação”. Porém, o tribunal recorrido interpretou os elementos disponíveis como tendo sido invocado e decidido, nos dois momentos, a falta de citação: «(…) Efetivamente, no requerimento apresentado em 05.04.2022, o Reclamante havia já concluído que “(...) que em momento algum houve a citação do Requerente para a Reversão uma vez que a citação para a Reversão sempre teria de ser feita na pessoa do Sr. Administrador de Insolvência nos termos do artigo 156° e artigo 81° n.º 4 e 5 do CIRE.” (cfr. ponto 19 do probatório), invocando, assim a falta de citação.
E compulsada a decisão que sobre tal requerimento foi proferida (cfr. ponto 20 do probatório) verifica-se que dela consta expressamente que “Nos presentes autos, não ocorreu falta de citação, uma vez que mesma foi remetida, por carta registada com aviso de receção, ao responsável subsidiário, tendo sido o aviso de receção assinado em 22/10/2012 (...)” e que “a citação em reversão foi efetuada nos termos legais, pelo que não padece de nulidade”. (…)»
Neste momento, não residem dúvidas que são distintas as situações em que ocorre no processo de execução fiscal falta de citação e nulidade de citação. Poderá não ter sido sempre assim no decurso de todos os incidentes no presente processo de execução fiscal, para todos os seus intervenientes, apesar de o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. ter vincado, desde logo na informação emitida em 19/04/2022, as diferenças.
A falta de citação só ocorre se se verificar uma situação enquadrável nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 188.º do CPC e, para além disso, o respectivo destinatário alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que lhe não foi imputável (artigo 190.º, n.º 6 do CPPT); a nulidade da citação ocorre quando a citação tenha sido efectuada, mas não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (artigo 191.º, n.º 1, do CPC).
Com efeito, só a falta de citação, e não também a nulidade de citação, é enquadrável na alínea a) do n.º 1 do artigo 165.º do CPPT e, por isso, só aquela pode constituir nulidade insanável do processo de execução fiscal, invocável a todo o tempo até ao trânsito em julgado da decisão final, se a falta prejudicar a defesa do citado. A nulidade de citação, no processo de execução fiscal, só pode ser arguida dentro do prazo indicado para a oposição (equivalente à contestação em processo declarativo), ou, nos casos de citação edital ou quando não tiver sido indicado prazo para deduzir oposição, na primeira intervenção do citado no processo.
Vejamos o teor do acto reclamado, que aqui estamos a sindicar: arquive-se o requerimento de arguição de nulidade da citação e de declaração de prescrição, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...21 e apensos, apresentado pelo revertido "AA", uma vez que tal pretensão já foi analisada e decidida quer por despacho datado de 21-04-2022, relativamente à invocada nulidade por falta de citação do administrador de insolvência e prescrição da dívida exequenda, quer em 27-05-2020, relativamente, prescrição da dívida exequenda.
Na verdade, é nossa convicção que tal acto proferido em 04/10/2022 não pode manter-se na ordem jurídica, porque, em rigor, a pretensão formulada em 07/09/2022 ainda não havia sido apreciada no âmbito do processo de execução fiscal, pelo menos em parte – cfr. ponto 23 do probatório.
Não questionamos que a prescrição da dívida exequenda já havia sido analisada em 27/05/2020 (cfr. ponto 27 do probatório). Porém, tratando-se de questão de conhecimento oficioso e com natureza dinâmica, ou seja, pode alterar-se pelo decurso do tempo, em tese, haverá que dela conhecer, principalmente se, por algum motivo, não se mantiverem factos interruptivos ou suspensivos detectados.
Julgamos ser inequívoco que no requerimento apresentado em 07/09/2022 o Recorrente pretende a declaração de nulidade insanável do processo de execução fiscal por falta de citação – cfr. ponto 23 do probatório.
Por outro lado, no requerimento apresentado em 05/04/2022 o Recorrente arguiu, expressamente, a nulidade da citação (independentemente dos factos invocados e do enquadramento jurídico que realizou): “a citação é nula” – cfr. ponto 19 do probatório.
Nesta conformidade, os pedidos formulados em 05/04/2022 e em 07/09/2022 são distintos: reconhecimento da verificação de nulidade da citação e da falta de citação, respectivamente. Pelo que, necessariamente, as decisões/pronúncias do órgão de execução fiscal terão que ser consentâneas com os respectivos pedidos.
Em 21/04/2022, efectivamente, a Senhora Coordenadora decidiu indeferir o requerimento de arguição de nulidade da citação, por a mesma não ter ocorrido: indefiro o requerimento de arguição de nulidade da citação e de declaração de prescrição, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...21 e apensos, apresentado pelo revertido "AA", por não ter ocorrido nulidade da citação, bem como por se manter, nos termos do meu despacho proferido em 27/05/2020, a exigibilidade, por não prescrição, de toda a dívida que o enforma, relativamente ao mesmo revertido.
Logo, a decisão proferida pela Senhora Coordenadora em 04/10/2022, aqui reclamada, não pode manter-se com a presente fundamentação, dado que o objecto da mesma (o requerimento de 07/09/2022) era o pedido de reconhecimento da ocorrência de falta de citação, gerador de nulidade insanável do processo executivo, e não a verificação de nulidade da citação, que, como vimos, não coincidem. Pelo que não poderia afirmar-se no acto em crise que tal pretensão já foi analisada e decidida por despacho datado de 21/04/2022, relativamente à invocada nulidade por falta de citação (o que foi analisado e decidido foi a nulidade da citação).
Não tendo sido, em concreto, analisada a questão colocada ao órgão de execução fiscal da necessidade de citar o administrador da insolvência, errou a sentença recorrida no julgamento ao considerar que a decisão da questão da falta de citação já se mostrava consolidada na ordem jurídica, pelo que não poderia ser pelo tribunal sindicada.
Apesar de estarmos perante uma recusa de conhecimento das questões colocadas no requerimento apresentado em 07/09/2022, na prática, in casu, tal equivale a uma omissão de decisão. A inércia do órgão de execução fiscal na apreciação da nulidade do processo executivo por falta de citação, arguida perante o mesmo, permite que o executado solicite a intervenção do tribunal, pedindo que o juiz tome conhecimento da questão – cfr. Acórdão do STA, de 08/01/2014, proferido no âmbito do processo n.º 032/13.
Foi precisamente isso que o reclamante fez através do presente meio processual, solicitando que seja declarada a nulidade insanável por falta de citação e, consequentemente, pediu a anulação do processo de execução fiscal – cfr. o teor da petição de reclamação apresentada.
Aqui chegados, observamos que o Recorrente estriba a sua tese em jurisprudência dos tribunais superiores, com a qual concordamos, designadamente no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 06/02/2020, proferido no âmbito do processo n.º 415/19.9BECTB.
Com efeito, como decorre do artigo 81.º, nºs.1 e 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores/gerentes, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência. Tal significa que o administrador de insolvência fica investido nas vestes de administrador de facto, assumindo a gestão da massa insolvente, tarefa que exerce pessoalmente (cfr. artigo 55.º, n.º 2, do CIRE), arcando ainda com a representação do devedor em todos os assuntos com carácter patrimonial que importem à insolvência, designadamente a cobrança dos créditos do insolvente sobre terceiros, vencidos e vincendos (excepcionando-se a intervenção do devedor no próprio processo de insolvência, nos termos do artigo 223.º e seg. do CIRE).
O Recorrente foi declarado insolvente por sentença transitada em julgado em 11/07/2011, proferida no âmbito do processo n.º ...4/11.8TB... (cfr. ponto 15 do probatório), tendo, em 25/05/2011, sido enviada pelo Tribunal Judicial de ... carta registada ao Centro Distrital da Segurança Social de ... contendo informação prestada nos termos do artigo 38.º do CIRE, relativa à declaração de insolvência do aqui Recorrente, por sentença proferida em 24/05/2011 no âmbito do dito processo n.º ...4/11.8TB..., bem como identificação do respectivo administrador da insolvência nomeado (cfr. ponto 25 do probatório).
Assim, tendo a Segurança Social tomado conhecimento da insolvência do revertido (cfr. ponto 25 do probatório), deveria a citação ter sido efectuada na pessoa do Administrador da Insolvência, nessa missiva identificado, nos temos do disposto no artigo 156.º do CPPT: “Se o funcionário ou a pessoa que deva realizar o acto verificarem que o executado foi declarado insolvente, o órgão de execução fiscal ordena que a citação se faça na pessoa do liquidatário judicial”. Pelo que a falta de citação do Administrador da Insolvência implica a possibilidade de prejuízo para a defesa do Recorrente, dado que qualquer meio de defesa ou reacção judicial teria que, necessariamente, ser levado a cabo pelo Administrador da Insolvência, ainda que com a colaboração do Recorrente.
Nesta conformidade, constitui nulidade insanável do processo executivo a falta de citação do Administrador da Insolvência, que se verifica in casu, porque poderá prejudicar a defesa do Recorrente (artigos 156.º, 165.º, n.º 1 e 4, ambos do CPPT e 81.º, n.º 4 e 5 do CIRE) – cfr. Acórdão do TCA Sul, de 06/02/2020, proferido no âmbito do processo n.º 415/19.9BECTB.
Esta nulidade tem por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo executivo que dela dependam absolutamente, aproveitando-se as peças úteis ao apuramento dos factos – cfr. artigo 165.º, n.º 2 do CPPT.
O exposto é suficiente para conceder provimento ao recurso, ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões colocadas. Isto apesar de o reclamante ter solicitado, ainda, a declaração de prescrição das quantias exequendas.
O Tribunal “a quo”, como não conheceu a nulidade insanável por falta de citação, considerou que o Recorrente se encontrava validamente citado, em 22/10/2012, enquanto responsável subsidiário na execução. Porém, atentas as conclusões a que chegámos na apreciação do presente recurso, observamos que a ausência do efeito interruptivo valorado na sentença recorrida, quanto à citação do Recorrente, poderá provocar alterações na contagem do prazo de prescrição, pelo que se justificaria a reapreciação desta questão, tendo em conta a falta de citação na sequência da reversão.
Contudo, não podemos esquecer que a decisão de encerramento do processo de insolvência transitou em julgado em 17/03/2015 (cfr. ponto 26 do probatório). O encerramento do processo de insolvência acarreta, inevitavelmente, a cessação de funções do administrador da insolvência – cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 233.º do CIRE – “Encerrado o processo, e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 217.º quanto aos concretos efeitos imediatos da decisão de homologação do plano de insolvência: (…) b) Cessam as atribuições da comissão de credores e do administrador da insolvência, com excepção das referentes à apresentação de contas e das conferidas, se for o caso, pelo plano de insolvência. (…)”
No entanto, a própria decisão do Tribunal Judicial da Comarca de ..., Juízo de Comércio de ..., proferida em 26/02/2015, determinou o encerramento do processo de insolvência, com os efeitos previstos no artigo 233.º, n.º 1, alíneas a), b), d) e n.º 2, alínea a) do CIRE – cfr. ponto 26 da decisão da matéria de facto.
Assim sendo, agora, já não será legalmente possível citar o administrador da insolvência (já não se encontra em exercício de funções), mantendo-se, por isso, a anulação dos termos subsequentes à decisão de reversão do processo de execução fiscal; sendo, então, irrelevante para o Recorrente a declaração da prescrição das dívidas exequendas, na medida em que, por força da nulidade insanável de que enferma o processo por falta de citação do administrador da insolvência, já não lhe poderão ser exigidas, pois venceram-se antes da declaração de insolvência do revertido (cfr. pontos 1 e 15).
Por tudo o exposto, urge conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a reclamação procedente, anulando o acto reclamado e declarando a nulidade insanável do processo de execução fiscal e apensos por falta de citação do administrador da insolvência, com as consequências para o Recorrente indicadas supra; ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões colocadas.

Conclusões/Sumário

I - A declaração de insolvência priva o insolvente dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência (artigo 81.º, n.º 1 do CIRE).
II - O administrador de insolvência fica investido nas vestes de administrador de facto, assumindo a gestão da massa insolvente, tarefa que exerce pessoalmente, arcando ainda com a representação do devedor em todos os assuntos com carácter patrimonial que importem à insolvência.
III - Constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal a falta de citação do administrador da insolvência (artigos 156.º, 165.º, n.º 1 e 4, ambos do CPPT, e 81.º, n.º 4 e n.º 5 do CIRE).
IV - O encerramento do processo de insolvência acarreta, inevitavelmente, a cessação de funções do administrador de insolvência (alínea b) do n.º 1 do artigo 233.º do CIRE).

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a reclamação procedente, anulando o acto reclamado e declarando a nulidade insanável do processo de execução fiscal e apensos por falta de citação do administrador da insolvência, com as legais consequências.

Custas a cargo do Recorrido em ambas as instâncias; nesta instância, as custas não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.

Porto, 16 de Fevereiro de 2023

Ana Patrocínio
Paula Moura Teixeira
Conceição Soares