Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02095/17.9BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/24/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:ÓNUS IMPUGNATÓRIO; NULIDADE PROCESSUAL; PRESCRIÇÃO - ;
REMUNERAÇÕES ADICIONAIS;
ESTRANGEIRO; JUROS DE MORA;
Sumário:I- A lei processual, para facultar a reapreciação da decisão matéria da facto, exige que o Tribunal Superior seja confrontado com (i) os concretos pontos que, no entender do Recorrente, se mostram como incorretamente julgados; (i.1) a indicação do meio probatório que impõe decisão diversa da recorrida; (i.2) a definição da decisão que, no entender daquele, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas; e, quando aplicável, a (i.3) expressa de indicação com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso.

II- Não tendo o Recorrente cumprido este ónus da impugnação da matéria de facto, logo fica este Tribunal Superior impedido de alterar a matéria de facto fixada na sentença recorrida.

III- Na ausência de notificação das partes para alegarem, não se pode falar em contravenção do preceituado no 91º-A do C.P.T.A. nas situações em que não tenha havido lugar à abertura de um período de instrução de prova.

IV- A prescrição é um instituto que visa regular a perda do direito de acionar judicialmente por efeito do decurso de um prazo legalmente estabelecido para o exercício de determinada[s] obrigação[ões].

V- Assim, para que se possa sequer equacionar o decurso do prazo prescricional, mister é que a obrigação subjacente [já] exista e possa ser exercida.

VI- Captando-se que a obrigação de pagamento das diferenças remuneratórias adicionais peticionadas só eclodirá se forem os Réus condenados judicialmente na prática do despacho conjunto referido na alínea f) do petitório, não há sequer que equacionar a aplicação do instituto da prescrição in casu.

VII- Legitimando os autos a aquisição processual de que as remunerações adicionais que foram pagas ao Autor pelos cargos militares que ocupou no estrangeiro continuaram a ser processadas pelo anterior regime remuneratório, isto é, o decorrente da aplicação do Despacho Conjunto n.° A-220/86-X, de 16/9/1986, dos Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, aplicável à situação do Autores por força do determinado através do Despacho Conjunto n.° A-19/87-X, de 18 fevereiro, dos Ministros da Defesa e das Finanças, deve concluir-se no sentido da violação do disposto no artigo 8º do Decreto-Lei n° 56/81, de 31 de março, n° 1 do artigo 5º do Decreto-Lei n° 55/81, da mesma data, e do artigo 7º do Decreto-Lei n° 233/81, de 01 de agosto.

VIII- Os juros de mora são uma forma de compensação à entidade lesada pelo atraso no pagamento da dívida principal, que, obviamente, já tem que existir.

IX- Não sendo esse o caso dos autos [existência de dívida principal], não pode ser o Réu condenado no pagamento dos peticionados juros de mora, na medida em que falta o pressuposto apontado.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento aos recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
* *
I – RELATÓRIO
O MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL e AA, melhor identificados nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA por este intentados contra aquele e contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, vêm interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou parcialmente procedente a presente ação e, em consequência, condenou os Réus Ministérios da Defesa Nacional e das Finanças “(…) à prática de Despacho Conjunto, aplicável ao A., o qual deve estabelecer a equivalência entre o posto do Autor e as funções militares desempenhadas, com o dos Negócios Estrangeiros, com base no mesmo critério em uso para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro, incluindo os subsídios de instalação por ida e regresso de missão, nos mesmos termos em que ocorreria caso tivesse existido Despacho Conjunto, aplicando o regime do pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no Posto Consular/Embaixada de referência, incluindo os câmbios ao tempo de desempenho de funções do A., em igualdade de circunstâncias com os câmbios efetuados ao pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros retroagindo à data de desempenho de funções, devendo ser pagas ao A. as quantias que lhe resultem devidas no período que decorreu entre 1 de outubro de 2002 e 1 de dezembro de 2004 face à prática de tal despacho (…)”, mais absolvendo os Réus “(…) do demais peticionado (…)”.
Alegando, o Recorrente Ministério da Defesa Nacional formulou as seguintes conclusões: “(…)
A - Sobre o recebimento e notificação dos abonos
Cumpre apreciar os factos referidos em 1.1 desta alegação. São factos instrumentais que contribuem para provar o momento e termos do recebimento dos abonos pecuniários pelo autor. Estes factos são relevantes para se determinar o momento da contagem do prazo prescricional aplicável ao direito de crédito invocado pelo autor.
Propõe-se que se decida esta matéria seguindo a mesma lógica de raciocínio que se seguiu no processo n.° 644/17.1BEALM, no processo 233/10.1BESNT, e no acórdão do Tribunal Constitucional no acórdão 379/2017, de 12.07.2017. Note-se que não são casos vagamente semelhantes com o aqui em análise. São todos casos em que o litígio é relativo a abonos pecuniários a receber por Militares portugueses no âmbito de funções públicas que desempenharam no estrangeiro.
Mesmo que se queira seguir a posição maioritária do STA de 05.05.1992 na questão de fundo, que se reconheça que esta questão dos efeitos da passagem do tempo - e da necessidade de aplicar o regime de prescrição - nunca foi apreciada no STA neste tipo de casos.
B - O Tribunal a quo omitiu pronúncia e decisão sobre a factualidade referida na conclusão A.
Trata-se de omissão ilegal, injustificada, que configura uma situação de denegação de justiça. Cumpre apreciar criticamente o momento e termos em que o autor foi recebedor e informado dos abonos pecuniários que recebeu.
Toda a factualidade foi alegada e instruída nos autos pelo réu MDN. De igual modo, é bem patente como o autor tentou fugir desse momento instrutório, bem sabendo que não é crível colocar em crise factualidade tão simples e evidente. Bem sabendo também que é insustentável para a viabilidade desta acção o tempo que passou entre o recebimento e notificação das quantias pecuniárias e o tempo em que decidiu iniciar este litígio judicial (passou todo o tempo que vai de 2004 a 2017).
Controvertido o facto, cabe ao Tribunal apreciar e decidir. O Tribunal a quo não decidiu, pelo que se solicita agora ao Tribunal de recurso que corrija a 1ª instância e aprecie está matéria controvertida e carecedora de apreciação e decisão de um Tribunal Público Português.
C - Momento e oportunidade de Alegações finais
O Tribunal elaborou a sentença de 30.09.2022 sem antes notificar as partes para alegações finais. Foram feitas, no processo, diligências de instrução. Estão nos autos os requerimentos probatórios do réu MDN. Sobre a matéria probatória, o Tribunal além de nada apreciar ou decidir sobre a matéria na sentença, também não notificou sequer as partes para alegações escritas.
Além de uma grosseira e preocupante violação das regras do processo, esta conduta revela total desconsideração pela instrução dos autos feita pelo réu MDN. Por tudo isto, é ilegal a não notificação das partes para alegar por escrito, cabendo corrigir este ponto e dar as partes a oportunidade de que se cumpra o disposto no artigo 91.°-A do CPTA.
D - Sobre a existência e conhecimento do despacho conjunto de Ministério das Finanças e Ministério da Defesa Nacional n.° A-85/86-X, publicado em Diário da República em 15 de maio de 1986.
Cumpre reconhecer nos autos a existência e o concreto conteúdo do despacho conjunto de Ministério das Finanças e Ministério da Defesa Nacional n.° A-85/86-X, publicado em Diário da República em 15 de maio de 1986.
Trata-se de regulamento publicado em Diário da República, que o réu MDN referiu nas suas intervenções nestes autos, e que o Tribunal pode conhecer oficiosamente. É, de resto, elemento determinante no gerar da litigância analisada no acórdão do STA de 05.05.1992. Conhecer a existência e conteúdo deste diploma regulamentar é um dos caminhos possíveis para se perceber com clareza que a jurisprudência do STA de 2017 e posterior sobre esta temática não é aplicável a este caso concreto na parte em que considera que a paridade entre regimes de abonos tem de ser quantitativamente igual. Na decisão do STA de 05.05.1992 nunca se decidiu que a equiparação entre regimes de abonos tinha de ser numericamente igual. Nunca tal foi escrito no acórdão. O acórdão existe, está escrito, têm um início e um fim. Não era sequer possível em 05.05.1992 o STA decidir pela igualdade quantitativa de abonos pecuniários, pois que cada ministério tinha seu regulamento próprio. Assim, este facto é de toda a relevância pois é prova que o MDN, naquele tempo, tinha o seu próprio regulamento de abonos, pelo que não havia aplicação da regra de equiparação quantitativa para diploma de outro ministério. Isto é coerente com a circunstância de no acórdão do STA de 05.05.1992, no seu dispositivo, não existir qualquer referência a equiparação quantitativa. Isto é também coerente com o facto de o autor deste autos, diferentemente dos autores no processo que gerou a decisão de 05.05.1992, ter levado mais de 12 anos entre a “situação lesiva” dos seus direitos e a apresentação do caso perante um Tribunal.
E- Sobre o regime de prescrição aplicável
Passando à questão do regime de prescrição aplicável, ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, cabe nestes autos aplicar a prescrição cível, de 5 anos, relativa a créditos decorrentes de obrigações periódicas. A invocação da prescrição foi feita pelo réu MDN logo na contestação, e depois referida em vários momentos posteriores do processo. É matéria de toda a relevância.
Esta questão foi apreciada ao mais alto nível no Tribunal Constitucional em 2017, no acórdão n.° 379/2017, de 12.07, sendo relator um Magistrado de carreira, da Ordem dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que integrou os quadros no STA.
Note-se que o processo ali em litígio era em tudo semelhante a este, mais uma situação de Militar português a pedir - muito - fora de tempo a alteração do legal regime de abonos pecuniários que lhe foi aplicado. Consideramos que cabe seguir aquela linha interpretativa. Se não for seguida, terá o Tribunal de fundamentar por que não segue aquela linha interpretativa. A questão terá de ser uniformizada. Cumpre ao réu MDN fazer esta conclusão, peticionado que não se decida o regime prescricional a aplicar a este caso sem que se tome na devida conta o que se apreciou e decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017, de 12.07.
Sobre esta temática, o tribunal a quo, na sua decisão de 30.09.2022, não seguiu a interpretação fixada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017, de 12.07; dessa decisão pode recorrer-se para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.°, n.° 1, alínea i), parte final, da Lei 28/82, de 15.11. Isto dado ser possível recorrer para o Tribunal Constitucional de decisões que recusem aplicação de norma constante de acto legislativo quando a norma seja aplicada com sentido diferente do anteriormente decidido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional.
Assim, peticiona o réu MDN que se decida a questão do regime prescricional, e o modo de início de contagem do prazo prescricional, como o decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017. Se se mantiver o conteúdo da decisão do TAF do Porto de 30.09.2022 quanto a esta temática, fica o réu MDN legitimado para, quando esgotado o campo impugnatório na Ordem dos Tribunais Administrativos e Fiscais sem que a decisão se altere, levar a questão à apreciação do Tribunal Constitucional. Cabe referir que naquela decisão que gerou o Acórdão n.° 379/2017 foram os autores nos autos a levar a questão ao Tribunal Constitucional, tendo perdido a questão que lá levaram a apreciação. O caso é, para o que está em causa nesta matéria, exatamente igual.
F- Sobre o modo de contar o prazo de prescrição
Quanto ao momento da contagem do prazo prescricional, cabe começar a contagem desde a data do recebimento e notificação dos abonos. Neste sentido se decidiu no acórdão do Tribunal Constitucional n.° 379/2017, de 12.07. De igual modo, com esse critério jurídico se decidiu no Acórdão do TCA Sul de 18.10.2018, no processo que correu em 1.a instância com o número 233/10.1BESNT e no TCASul com o número 12789/15.
Ao tempo que o Militar aqui autor recebeu o abono pecuniário o regulamento de abonos era totalmente válido, ninguém o impugnou. Desde 10.12.2007 que está publicado em Diário da República o regime de abonos que o Militar aqui autor invoca ser-lhe aplicável.
Onde esteve o autor nestes autos em 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, e até setembro de 2017? Cabe aplicar as consequências jurídicas decorrentes da passagem do tempo sem que o direito tenha sido exercido. Se isto não é assim, terá de ser um Tribunal a dizer como então se aplica o regime de prescrição a este caso. Ao réu, por dever de patrocínio, cumpre alertar para esta flagrante ilegalidade e injustiça que se está aqui a criar com a sentença de 30.09.2022.
G - Sobre a questão de Fundo - A legalidade de não aplicar a autor o regime de abonos igual ao presente no Despacho n.° 27676/2007, de 08.11.2007, publicado no Diário da República n.° 237, 2.a série, de 10.12.2007.
Nenhuma norma, quer legal, quer regulamentar, obriga a administração a pagar ao autor nos termos em que peticiona neste autos. O Despacho n.° 27676/2007, de 08.11.2007 não é aplicável a autor. Todos o quadro normativo, legal e regulamentar, sob o qual se processou o pagamento de abonos ao autor é legal, lícito; e hoje, e desde bem antes da propositura desta acção judicial, não impugnável, pois que se consolidou com a passagem do tempo. O tempo que passou desde o processamento e pagamento dos abonos, e o tempo em que os termos dos mesmos foram impugnados é bem demonstrativo da falta de fundamento, quer legal, quer de sentido de justo, presente nestes autos.
Por não existir o direito invocado pelo autor ( direito a alterar o valor de abonos pecuniários que recebeu entre 2002 e 2004), e por estar prescrito o direito a sequer litigar sobre um assunto que se passou entre 2002 e 2004, pede o réu MDN que se revogue a sentença do TAF do Porto de 30.09.2022 na parte em que condenou o réu MDN e o réu Ministério das Finanças; consequentemente que se extinga esta acção judicial, com total improcedência do pedido pelo autor. Dessa forma se fará nestes autos alguma justiça (…)”.
*
Já quanto ao seu recurso, o Recorrente AA rematou nos seguintes termos: “(…)
1ª O presente recurso deve ser limitado à parte da decisão tomada no Despacho Saneador/Sentença que absolve os RR do pagamento de juros moratórios, por não serem devidos, com o fundamento de o acto devido ainda não ter sido praticado.
2ª. O despacho Saneador/Sentença recorrida considerou que o abono de remunerações efectuadas ao A., ora Recorrente “de harmonia com o disposto nos Despachos A-244/86-X, de 17 de novembro e A19/87-X, de 18 de fevereiro, e Despacho conjunto de 11 de maio de 1982 referente aos abonos devidos por ida em missão e respetivo regresso” foi ilegal, porquanto deveria ter sido abonado nos termos do Despacho Conjunto de 24.12.1994 dos Ministério das Finanças e do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
3ª. Na execução que houver lugar, sendo ilegais a aplicação ao A. dos despachos nos termos dos quais tinha sido abonado, encontramo-nos numa situação jurídica de reconstituição de situação hipotética nos termos do artigo 173° e ss., do CPTA, ficando a administração fica constituída no dever de praticar os actos dotados de eficácia retroativa e reconstituir a situação que existiria, caso não tivesse sido praticados os actos agora anulados.
4º. Tendo em atenção que o Estado não se encontra isento do pagamento de juros, a reconstituição da situação hipotética, quando está em causa o pagamento de quantias monetárias ex ante, nomeadamente vencimentos, abonos ou outros do mesmo teor, implica o pagamento de juros moratórios, independentemente de terem ou não sido peticionados, como consequência da anulação do acto que recusou o pagamento dessas quantias, ou as pagou num valor errado.
5ª. Os juros são devidos em virtude da ilegalidade do acto anulado retroagir à data da sua prática, podendo-se considerar que são indemnizatórios até ao pagamento do capital, e moratórios até pagamento integral, ainda que a taxa legal seja a mesma.
6ª. Sobre a matéria acima, conforme Ac. STA de 9.10.2003, processo 41619 A, Ac. de 9FEV93 do STA, in A. D. n° 379, fls. 756 e ss., e Ac. TCA SUL de 5.5.2022 proferido no processo 321/07.1BESNT-A.
8ª. Sendo semelhantes as situações invocadas nos acórdãos que antecedem e a situação dos autos, no Despacho Saneador/Sentença recorrida errou-se, na medida em que não se considerou que existindo actos ilegais de pagamento de quantias praticados ao tempo que terão de ser anulados, na reconstituição da situação hipotética que existiria caso os actos ilegais não tivessem sido praticados, os novos actos de pagamento das quantias decorrentes da execução da sentença devem retroagir às datas em que foram anulados os correspondentes actos ilegais, com o pagamento de juros moratórios, contados à taxa legal desde as datas em que retroagem os referidos actos (…)”.
*
Notificado da interposição do recurso jurisdicional por parte do Ministério da Defesa Nacional, o Recorrido AA produziu contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos: ”(…)
A. Conforme jurisprudência pacífica e reiterada dos tribunais, atento o disposto nos artigos 144°, n° 2, e 146°, n° 4, do CPTA e dos artigos 5°, 608°, n° 2, 635°, n°s 4 e 5, e 639° do CPC novo (Lei n.° 41/2013) ex vi dos artigos 1° e 140° do CPTA, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações.
B. Lidas e interpretadas globalmente as conclusões das alegações do Recorrido mostra-se que são ininteligíveis, porquanto não se encontram devidamente articuladas, não refletem as alegações efectuadas, e contêm afirmações que se consideram a despropósito, o que deixa o Recorrido sem possibilidade de as contrariar, tantas são as referências que lhe parecem escritas sem sentido.
C. As conclusões das alegações do Recorrente têm frases que não são possíveis de contraditar e que não podem ser consideradas como conclusões, como as que seguem:
-“Note-se que não são casos vagamente semelhantes com o aqui em análise. São todos casos em que o litígio é relativo a abonos pecuniários a receber por Militares portugueses no âmbito de funções públicas que desempenharam no estrangeiro.”
-“Cumpre apreciar criticamente o momento e termos em que o autor foi recebedor e informado dos abonos pecuniários que recebeu”.
-“Toda a factualidade foi alegada e instruída nos autos pelo réu MDN”
“ De igual modo, é bem patente como o autor tentou fugir desse momento instrutório, bem sabendo que não é crível colocar em crise factualidade tão simples e evidente. Bem sabendo também que é insustentável para a viabilidade desta acção o tempo que passou entre o recebimento e notificação das quantias pecuniárias e o tempo em que decidiu iniciar este litígio judicial (passou todo o tempo que vai de 2004 a 2017).”
“Controvertido o facto, cabe ao Tribunal apreciar e decidir. O Tribunal a quo não decidiu, pelo que se solicita agora ao Tribunal de recurso que corrija a 1.a instância e aprecie está matéria controvertida e carecedora de apreciação e decisão de um Tribunal Público Português”.
“Além de uma grosseira e preocupante violação das regras do processo, esta conduta revela total desconsideração pela instrução dos autos feita pelo réu MDN”.
“Conhecer a existência e conteúdo deste diploma regulamentar é um dos caminhos possíveis para se perceber com clareza que a jurisprudência do STA de 2017 e posterior sobre esta temática não é aplicável a este caso concreto na parte em que considera que a paridade entre regimes de abonos tem de ser quantitativamente igual. ”
. “Nunca tal foi escrito no acórdão. O acórdão existe, está escrito, têm um início e um fim. ”
“Esta questão foi apreciada ao mais alto nível no Tribunal Constitucional em 2017, no acórdão n.° 379/2017, de 12.07, sendo relator um Magistrado de carreira, da Ordem dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que integrou os quadros no STA”.
“Consideramos que cabe seguir aquela linha interpretativa. Se não for seguida, terá o Tribunal de fundamentar por que não segue aquela linha interpretativa”.
“A questão terá de ser uniformizada”
“Cumpre ao réu MDN fazer esta conclusão, peticionado que não se decida o regime prescricional a aplicar a este caso sem que se tome na devida conta o que se apreciou e decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017, de 12.07. ”
“Sobre esta temática, o tribunal a quo, na sua decisão de 30.09.2022, não seguiu a interpretação fixada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017, de 12.07; dessa decisão pode recorrer-se para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.°, n.° 1, alínea i), parte final, da Lei 28/82, de 15.11. Isto dado ser possível recorrer para o Tribunal Constitucional de decisões que recusem aplicação de norma constante de acto legislativo quando a norma seja aplicada com sentido diferente do anteriormente decidido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional.”
“Se se mantiver o conteúdo da decisão do TAF do Porto de 30.09.2022 quanto a esta temática, fica o réu MDN legitimado para, quando esgotado o campo impugnatório na Ordem dos Tribunais Administrativos e Fiscais sem que a decisão se altere, levar a questão à apreciação do Tribunal Constitucional”. Cabe referir que naquela decisão que gerou o Acórdão n.° 379/2017 foram os autores nos autos a levar a questão ao Tribunal Constitucional, tendo perdido a questão que lá levaram a apreciação. O caso é, para o que está em causa nesta matéria, exatamente igual”.
“Se isto não é assim, terá de ser um Tribunal a dizer como então se aplica o regime de prescrição a este caso. Ao réu, por dever de patrocínio, cumpre alertar para esta flagrante ilegalidade e injustiça que se está aqui a criar com a sentença de 30.09.2022”.
“Onde esteve o autor nestes autos em 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, e até setembro de 2017?”
D. No que concerne ao recurso em matéria de facto, o Recorrido não consegue descortinar quais os concretos pontos de facto que se consideram incorretamente julgados e onde se encontram na Sentença Recorrida, bem como os meios probatórios que impunham uma decisão diferente, porquanto o Recorrente, contrariamente ao devido, não os indicou.
E. Decorre da Conclusão que antecede que no recurso intentado existe manifesta violação do disposto no artigo 640°, do CPC.
F. Tendo em atenção que, no entender do Recorrido, o Recorrente não se soube exprimir em termos adequados, apesar disto, o Recorrido sempre dirá algo, incompleto, obviamente, devido à dificuldade em interpretar o recurso.
G. Tendo o Recorrente invocado na parte intitulada “B - O Tribunal a quo omitiu pronúncia e decisão sobre a factualidade referida na conclusão A”, que a factualidade que invoca é “simples e evidente” não a articulou, nem a concretizou nas conclusões das alegações que efetuou, de modo a poderem ser contraditadas pelo Recorrido, pelo que as alegações efectuadas violam os artigos 639° e 640°, do CPC.
H. Contrariamente ao por si invocado, o Recorrente exerceu o direito de se pronunciar em alegações finais de facto e de direito na audiência prévia, conforme se constata da ata a fls. 807 e ss., do P E.
I. O Despacho Conjunto n.° A-85/86-X, publicado em Diário da República em 15 de maio de 1986 não foi aplicado nos presentes autos, sendo que é manifesto que a Sentença Recorrida ao mesmo se não refere.
J. Sendo manifesto que o MDN pretende pagar as quantias que quer, sem atender às quantias que eram pagas ao tempo de desempenho de funções ao chefe de missão equiparável do MDN, não se descortina o fundamento da alegação do Recorrente no sentido que tal questão não foi decidida no Ac. STA de 05.05.1992 no sentido de que, por interpretação do artigo 8°, do DL 56/81, de 31 de março, as remunerações adicionais dos militares devem corresponder qualitativamente e quantitativamente às pagas ao pessoal equiparável do MNE em serviço nas embaixadas de Portugal no estrangeiro.
K. Decorre do Ac. STA de 05.05.1992 que quando no mesmo se afirma, referindo-se aos militares a prestar serviço nas missões militares, “por forma a que esse pessoal receba, nas mesmas condições as remunerações acessórias e os abonos a que aquele tenha direito”, manifestamente, SE está a fazer uma equiparação quantitativa.
L. Decorre da conclusão que antecede que não se descortina que o Acórdão do STA em questão interprete o artigo 8°, do DL 56/81 no sentido que o pessoal militar possa ser discriminado no que se refere aos abonos adicionais, abonos de instalação e outros abonos relativamente ao pessoal equiparável do MNE em serviço nas embaixadas de Portugal no estrangeiro.
M. Contrariamente ao invocado pelo Recorrente, à situação dos autos não cabe aplicar a prescrição de cinco anos, contados desde os pagamentos efetuados ao Recorrido porquanto nos encontramos, no dizer da Sentença Recorrida perante “um pedido de condenação à prática de ato devido, os montantes resultantes de tal ato e que possam ser devidos não são ainda líquidos, pelo que a prescrição não pôde começar a contar - cf. artigo 306.°, n.°s 1 e 4 do Código Civil”.
N. Inexistindo Despacho Conjunto atualizado ao tempo de desempenho de funções do ora Recorrido, que determine as equivalências entre o militar e o pessoal equiparável do MNE em serviço nas embaixadas de Portugal no estrangeiro, bem como os abonos devidos atentas as alterações no estatuto do pessoal do MNE originadas pelos DL n°s 79/92, de 6 de maio e DL 40-A/98, de 27 de fevereiro, o ora Recorrido encontrava-se impossibilitado de saber quanto recebia o pessoal equiparado do MDN para poder agir e exercer o seu direito a abonos em igualdade de circunstâncias.
O. O Despacho Conjunto Despacho Conjunto do MF e do MNE de 20DEZ94 que permitiu a atualização das remunerações adicionais, abonos de instalação e outros abonos ao pessoal do MNE decorrentes da entrada em vigor dos DL n°s 79/92, de 6 de maio e DL 40-A/98, de 27 de fevereiro, nunca foi publicado ou por qualquer forma dado a conhecer ao Recorrente ou aos militares e foi guardado a “sete chaves” no MNE.
P. Contrariamente ao afirmado pelo Recorrente, o Despacho Conjunto n° 27676/2007, publicado no Diário da República, 2a série n° 237 de 10 de dezembro de 2007 não refere quais os abonos devidos, nem o seu modo de cálculo, nem remete para diploma que os refira, contrariamente ao Despacho Conjunto A-19/87-X, publicado no DR II Série n° 47, de 25.2.1987 que determina que o pessoal militar em serviço nas missões militares no estrangeiro passe a ser abonado, a partir de 1-l0-86 pelo regime remuneratório estabelecido pelo Desp. Conj. A220/86-X, de 16-9-86, dos Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros.
Q. Admitindo-se que o processamento mensal de cada abono constitui um acto jurídico individual e concreto e não uma simples operação material, o R MDN não demonstrou que os processamentos efetuados contêm os elementos essenciais à sua notificação (tais como a identificação do autor do acto, sentido e data da decisão) exigidos pelo n.° 1 e pelo n° 2, do art. 114° do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
R. O R. não demonstra os actos de processamento de abonos para efeitos impugnatórios (artigo 188°, do CPA) tenham sido notificados ao ora Recorrido.
S. O R. MDN não demonstrou que os boletins de remunerações adicionais, abonos de instalação ou outros abonos pagos ao ora Recorrido refletissem o facto dos abonos neles expressos estarem ou não em conformidade com os pagos ao pessoal equiparável do MNE em serviço no estrangeiro, pelo que não podem constituir actos administrativos relativamente a esta questão.
T. Decorrente do segredo em que foi mantido o Despacho Conjunto (DC), MNE_MF_24DEC94 que entrou em vigor em 01JAN95, dado a conhecer às embaixadas pela circular DRH n° 3/95 P° 210.10.01, os boletins de vencimentos dos militares não refletiam na altura qualquer relação ou invocação com o referido despacho conjunto de 24 de dezembro de 1994.
U. As quantias (diferenciais) pretendidas pelo A nunca foram orçamentadas, cabimentadas ou, por qualquer forma, autorizadas a pagar, indício óbvio que o direito não podia ser exercido, a administração nunca se encontrou autorizada a pagar e não se iniciou o prazo de prescrição.
V. Não podendo ter sido exercido o direito, o mesmo não prescreveu, por exigência dos artigos 306°, n° 1, e 329°, ambos do CC, que preveem que os prazos de prescrição e de caducidade só começam a correr quando o direito poder ser exercido.
W. Contrariamente ao afirmado pelo Recorrente, é falso que o que está em causa na matéria no Acórdão do Tribunal Constitucional n° 379/2017 seja “exatamente igual” ao objecto ou à matéria subjacente aos presentes autos..
X. O acórdão referido na Conclusão que antecede não aborda o tema da prescrição, mas a SITUAÇÃO DA MCSUB e o facto o pessoal integrante de tal missão ter passado a receber ajudas de custo ao abrigo de legislação emitida para o efeito.
Y. As situações subjacentes ao Acórdão do TCA Sul de 18.10.2018, no processo que correu em 1.a instância com o número 233/10.1BESNT e no TCA Sul com o número 12789/15 não são iguais ou semelhantes ao caso dos autos, pelo que não tendo o Recorrente demonstrado a similitude, o Recorrido dispensa-se de demonstrar o contrário.
Z. Contrariamente ao afirmado pelo Recorrente é falso que desde 10.12.2007 esteja “publicado em Diário da República o regime de abonos que o Militar aqui autor invoca ser-lhe aplicável”.
AA. Do artigo 8°, do DL 56/81, de 31 de março, quando conjugado com o art.° 5.° do Decreto-Lei n°. 55/81, de 31 de março, e com o art.° 7.° do Decreto-Lei n.° 233/81, de 1 de agosto, extrai-se a norma que determina que o pessoal das missões militares junto das Embaixadas de Portugal no estrangeiro e o pessoal das missões NATO têm direito às remunerações adicionais, abonos de instalação e outros abonos a que se refere o sobredito artigo 8°, em igualdade de circunstâncias e valor com os pagos aos pessoal equiparável do MNE em serviço nas embaixadas.
BB. Sobre a matéria referida na conclusão que antecede, a sentença recorrida exprime- se de forma clara, suficiente e justa, aliás de acordo com a jurisprudência nela invocada e transcrita, nomeadamente do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 12 de fevereiro de 2016, proferido no processo n.° 2431/09.1BEPRT.
CC. Sobre a mesma matéria, o invocado pelo Recorrente Acórdão do Tribunal Constitucional n° 379/2017, de 12.07, contém na sua fundamentação análise que interessa para o presente recurso, nomeadamente na parte em que neste se afirma, o direito do recorrente a ser pago em igualdade de circunstâncias com o pessoal equiparável do MNE.
DD. O preceito legal do artigo 8°, do DL 56/81, de 31 de março, quando conjugado com paralelismo de remunerações acessórias e abonos determinados pelos Decretos-Leis n.°s 55/81, 56/81, de 31 de março, e 233/81, de 1 de agosto, entre o pessoal militar em serviço nas missões militares junto das representações diplomáticas no estrangeiro, relativamente ao pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros, impõe que as remunerações adicionais, abonos de instalação e outros abonos pagos aos militares, na situação do ora Recorrido, devem ser qualitativamente e quantitativamente iguais às pagas ao pessoal equiparável do MNE, em serviço nas embaixadas de Portugal no estrangeiro
EE. O direito referido na Conclusão que antecede já tinha sido reconhecido pelo Despacho Conjunto de 11.05.1982, o qual foi publicado no DR II Série n° 55 de 2.7.1982, pg. 5171 (…)”.
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O Recorrido Ministério da Defesa Nacional também contra-alegou o recurso apresentado por AA, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “(…)
A. O eventual cálculo de juros de mora, a ser necessário nestes autos, terá de seguir o regime cível, e o prazo prescricional de 5 anos fixado no artigo 310.º, alínea d) do Código Civil.
B. Desde a data do recebimento e notificação dos abonos pecuniários que o autor se encontra em condições de impugnar os termos em que foi recebedor de abonos pecuniários devidos por conta das funções públicas que desempenhou entre 2002 e 2004.
C. Está-se na presença de quantias pecuniárias com natureza cível, não laboral, pelo que é o regime cível de prescrição que cumpre aqui aplicar. Assim se decidiu, quando à apreciação da natureza das quantias aqui em litígio, no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 379/2017 (…)”.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão dos recursos, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre apreciar e decidir.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir são as seguintes:
(i) Recurso interposto pelo Ministério da Defesa Nacional [segundo ordem de invocação]: (i.1) erro[s] de julgamento de facto; (i.2) nulidade processual, por violação do disposto no artigo 91º do CPTA; (i.3) erro de julgamento de direito em matéria prescricional; e (i.4) erro de julgamento de direito, por violação do disposto no artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81;
(ii) Recurso interposto por AA: (ii.1) erro de julgamento de direito quanto à decidida improcedência do pedido de condenação ao pagamento dos juros moratórios.
E na resolução de tais questões que consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.
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III- DO MÉRITO DA INSTÂNCIA DE RECURSO
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III.1- Recurso interposto pelo Ministério da Defesa Nacional
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III.1.1- Dos[s] imputado[s] erro[s] de julgamento de facto
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1. A primeira questão decidenda consubstancia-se em saber se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto nos pontos indicados pelo Recorrente Ministério da Defesa Nacional.
2. Vejamos.
3. A lei processual, para facultar a reapreciação da decisão matéria da facto, exige, desde logo, o cumprimento do ónus processual preconizado no artigo 640º do CPC.
4. Destaca-se, nesta problemática, o Acórdão produzido por este Tribunal Central Administrativo Norte de 04.12.2015, no processo nº. 418/12.6BEPRT, cujo teor ora parcialmente se transcreve:”(…)
Como resulta do art.º 640, nºs. 1, b) e 2, a), do CPC, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar (dá-se aqui uma “ênfase redundante” nas palavras de Cardona Ferreira in Guia de Recursos em Processo Civil, 5º edição, pág. 167), os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, sendo que quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Tem por objectivo responsabilizar as partes (princípio da auto-responsabilidade das partes), vedando-lhes a impugnação a decisão da matéria de facto como uma mera manifestação de inconformismo infundado – cfr. A. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 3ª edição, 2010, Almedina, p. 159 – bem como garantir, para além do contraditório, a cooperação processual entre as partes e o Tribunal.
Cfr. Ac. RL, de 26-03-2015, proc. nº 183/13.0TBPTS.L1-2 [destaque nosso]:
«(…) o art. 640.º do CPC fixa o ónus de alegação a cargo do recorrente que impugna a decisão relativa à matéria de facto.
Desse ónus, consta, designadamente, a especificação obrigatória dos concretos pontos de facto considerados incorretamente julgados, dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou da gravação nele realizada e da decisão que, no entender do recorrente, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (art. 640.º, n.º 1, do CPC).
O estabelecimento desse ónus de alegação destina-se, fundamentalmente, a proporcionar o efetivo contraditório da parte contrária e, por outro lado, a facilitar a compreensão e decisão da impugnação pela Relação, que pode modificar a decisão de facto, nos termos do disposto no art. 662.º, n.º 1, do CPC.
O incumprimento de tal ónus de alegação implica, sem mais, a rejeição da impugnação da decisão relativa à matéria de facto (art. 640.º, n.º 1, do CPC).».
Conforme se sumaria no Ac. deste TCAN, de 22-05-2015, proc. nº 132/10.7BEPNF [destaque nosso]:
I) – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente: (i) sob pena de rejeição, especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; (ii) sob pena de imediata rejeição na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados.
De igual forma no Ac. deste TCAN, de 28-02-2014, proc. nº 00048/10.7BEBRG [destaque nosso]:
I. Resulta do art. 685.º-B do CPC que quando se visa impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto o recorrente deve, obrigatoriamente, especificar, sob pena de rejeição do recurso, não só os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, como os concretos meios de prova constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizado, que impunham decisão diversa sobre a matéria de facto impugnada.
Igualmente no Ac. deste TCAN, de 22-10-2015, proc. nº 1369/04.3BEPRT, se lembra [destaque nosso]:
«Como já salientámos em casos idênticos (v. Acórdão do TCAN, de 22.05.2015, P. 1224/06.2BEPRT), as competências dos Tribunais Centrais Administrativos em sede de intervenção na decisão da matéria de facto encontram-se reguladas, por força da remissão do artigo 140.º do CPTA, nos artigos 640.º e 662.º do CPC/2013, que acolheram um regime que, de um lado, assume a alteração da matéria de facto como função normal da 2.ª instância e, do outro, não permite recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, mas apenas admite a possibilidade de revisão de “concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente” (v. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra, 2014, 130). Neste contexto, recai sobre o recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, o ónus de especificar, por um lado, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e, por outro, os concretos meios probatórios que, no seu entender, impunham decisão diversa da recorrida, quanto a cada um dos factos que entende que deviam ter sido dados como provados ou não provados, incluindo a indicação exata das passagens da gravação, no caso de depoimentos gravados (artigo 640.º do CPC) (…)”.
5. Em reforço deste entendimento, ressalte-se o expendido no Acórdão deste T.C.A.N. de 17.01.2020 [processo n.º 141/09.9BEPNF], consultável em www.dgsi.pt:
“(…) Sintetizando, à luz deste regime, seguindo a lição de Abrantes Geraldes António Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 4ª ed., 2017, pág. 155 sempre que o recurso de apelação envolva matéria de facto, terá o recorrente: a) em quaisquer circunstâncias indicar sempre os concretos factos que considere incorretamente julgados, com a enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; c) relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos.
O cumprimento dos referidos ónus tem, como adverte Abrantes Geraldes, a justificá-lo a enorme pressão, geradora da correspondente responsabilidade de quem, ao longo de décadas, pugnou pela modificação do regime da impugnação da decisão da matéria de facto e se ampliasse os poderes da Relação, a pretexto dos erros de julgamento que o sistema anterior não permitia corrigir; a consideração que a reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida; a ponderação de que quem não se conforma com a decisão da matéria de facto realizada pelo tribunal de 1ª instância e se dirige a um tribunal superior, que nem sequer intermediou a produção da prova, reclamando a modificação do decidido, terá de fundamentar e justificar essa sua irresignação, sendo-lhe, consequentemente, imposto uma maior exigência na impugnação da matéria de facto, mediante a observância de regras muito precisas, sem possibilidade de paliativos, sob pena de rejeição da sua pretensão e, bem assim o princípio do contraditório, habilitando a parte contrária de todos os elementos para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações.
É que só na medida em que se conhece especificamente o que se impugna e qual a lógica de raciocínio expandido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a parte contrária a poder contrariá-lo em sede de contra-alegações.
A apreciação do cumprimento das exigências legalmente prescritas em sede de impugnação da matéria de facto deve ser feita à luz de um “critério de rigor” como decorrência dos referidos princípios de autorresponsabilização, de cooperação, lealdade e boa-fé processuais e salvaguarda cabal do princípio do contraditório a que o recorrente se encontra adstrito, sob pena da impugnação da decisão da matéria de facto se transformar numa “mera manifestação de inconsequente inconformismo”(…)”.
6. Deste modo, à luz de tudo o quanto se vem de expender, haverá que se entender que a lei processual, para facultar a reapreciação da decisão matéria da facto, exige que o Tribunal Superior seja confrontado com (i) os concretos pontos que, no entender do Recorrente, se mostram como incorretamente julgados; (i.1) a indicação do meio probatório que impõe decisão diversa da recorrida; (i.2) a definição da decisão que, no entender daquele, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnada; e, quando gravado, com a (i.3) expressa de indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso.
7. Cientes do que se vem de expor, importa agora analisar a situação sob apreciação aferindo do cumprimento do ónus processual supra sintetizados, e, mostrando-se necessário, do acerto da matéria de facto sob impugnação.
8. E, neste domínio, dir-se-á, desde logo, que o Recorrente não cumpre minimamente o ónus de impugnação que lhe impedia.
9. Efetivamente, veio o Recorrente Ministério da Defesa Nacional invocar que “(…) foram incorretamente julgados os seguintes concretos facto: (…) 1.1 A existência de boletins de abonos, o seu conteúdo material, e sua notificação ao autor destes autos. 1.2 A existência de um regulamento de abonos aplicável ao Ministério dos Negócios Estrangeiros autónomo e diferente do regulamento de abonos aplicado no Ministério da Defesa em 1986 (…)”, remetendo, para tal, “(…) Quanto a 1.1, [par]a prova documental, testemunhal de depoimento de parte proposto pelo réu MDN no seu requerimento escrito datado de 29.10.2020 (…)”, e no que tange à “(…) prova do facto alegado em 1.2, [para a leitura e conhecimento de] um determinado regulamento administrativo publicado em Diário da República, e escrito numa única folha (…) O despacho conjunto de Ministério das Finanças e Ministério da Defesa Nacional n.º A-85/86-X, publicado em Diário da República em 15 de maio de 1986 (…)”.
10. Ora, não cumpre aquele ónus o apelante que, nas suas alegações, não procede à identificação com exatidão (i) das passagens da gravação em que se funda o seu recurso e (ii) dos documentos de que resulta a prova dos factos a alterar e/ou aditar, limitando-se a mencionar genericamente (i.1) depoimentos testemunhais, (ii.1) documentos e, inclusive, (ii.2) diplomas legais, tomando como referência determinados tópicos que elencou no libelo inicial.
11. E nestas situações, não tem lugar à aplicação do princípio pro actione, no sentido do convite ao aperfeiçoamento.
12. Efetivamente, como se decidiu no aresto do Tribunal da Relação de Guimarães, 29.09.2014, tirado no processo nº. de 81001/13.0YIPRT.G1, com plena mais valia para o caso em apreço: ”(…) Cumpre também referir que esta rejeição parcial do recurso não deve ser precedida de despacho de aperfeiçoamento. Em primeiro lugar, porque é a própria lei que refere a rejeição deve ser imediata, ou seja, próxima, sem algo de permeio; em segundo lugar porque quando a lei do processo, sob o art.º 639º, nº 3, prevê, em sede de recurso, o dever funcional de prolação de despacho de aperfeiçoamento, fá-lo apenas relativamente às conclusões deficientes, obscuras, complexas ou quando nelas não se tenha procedido às especificações a que alude o anterior nº 2, e não também quanto às alegações propriamente ditas, sendo que, no caso sub judice, as insuficiência são comuns às alegações e às conclusões. Dir-se-á ainda que a admitir a reapreciação dos depoimentos gravados nos termos em que ela é solicitada, estaria aberta a porta ao incumprimento de um dos pressupostos indispensáveis da impugnação da decisão em matéria de facto, obrigando a Relação à audição de toda a prova gravada em qualquer processo, com todo o esforço inútil que isso pode representar para o tribunal ad quem, tendo como contrapeso a desresponsabilização processual do recorrente. Assim se contrariaria absolutamente todo o sentido e o espírito do circunstancialismo jurídico que orientou os novos termos da admissibilidade do recurso em matéria de facto e o próprio art.º 640º, nº 2, al. a) que lhes dá corpo ao prever a imediata rejeição do recurso - portanto, sem possibilidade de aperfeiçoamento - quando é possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, como sempre é, e o recorrente não indica com exatidão as passagens da gravação em que se funda (…)”.
13. Nestes termos, e por tudo o quanto ficou antes exposto, improcede o invocado erro de julgamento da matéria de facto, que assim se mantém inalterada.
14. Ponderado o acabado de julgar e o que demais se mostra fixado na decisão judicial recorrida temos, então, como assente o seguinte quadro factual: “(…)
1. O A. AA, Tenente-General, no período compreendido entre 1 de outubro de 2002 e 1 de dezembro de 2004 foi titular do cargo de Comandante da EUROFOR, sob proposta do Governo, formulada após iniciativa do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, aprovada pelo Conselho Superior da Defesa Nacional, conforme nomeação por decreto do Presidente da República n.º 41/2002, de 17/09, publicada no Diário da República, I Série – A, n.º 221, de 24 de setembro de 2002, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 29.º, da Lei n.º 29/82, de 11 de dezembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 18/95, de 13 de julho, e exoneração pelo Decreto do Presidente da República n.º 15/2005, de 11/02, publicada em Diário da República, Iª Série A, n.º 35, de 18 de fevereiro de 2005 - cf. documentos n.ºs ... e ... juntos com a petição inicial.
2. Por registo de correio de 23 de junho de 2017, o A. requereu ao Ministro da Defesa Nacional e ao Ministro das Finanças que “atento o disposto no DL 56/81 de 31 de março, máxime no seu artigo 8.º, por ilegalidade do Despacho n.º ...6... e por não terem sido atualizados os abonos de instalação por ida e regresso, e o abono de representação, requer a V. Exas., que seja proferido despacho conjunto, semelhante ao projeto anteriormente assinado pelo Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. BB, e ao que foi proferido e entrou em vigor a partir de 1 de janeiro de 2008, aplicável ao requerente, que preveja os abonos devidos ao Chefe de Missão e atualize as remunerações adicionais e outros abonos com base no mesmo critério em uso para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro, de modo a que, em consequência, lhe venham a ser abonadas as diferenças remuneratórias relativas às remunerações adicionais, outros abonos, e despesas de ida para a missão a que teria direito, por idêntico critério ao pessoal do MNE, nos termos do n.º 1 e n.º 2 do artigo 8.º do DL 56/81, tudo com a taxa de câmbio equiparável à que foi percebida pelo pessoal equiparável do MNE (taxa de câmbio 0,9016 DD EUA para 1 Euro ou seja à taxa fixa de 1 DD EUA = 1,109139€), no período de desempenho de funções a partir de 1 de outubro de 2002” – cf. documentos n.ºs ... e ... juntos com a petição inicial.
3. O Ministro das Finanças não respondeu ao requerimento referido no n.º anterior.
4. Em 20/07/2017 foi emitida a seguinte informação por serviços da defesa nacional – cf. documento n.º ... junto à petição inicial:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
5. Em 31/07/2017 foi proferido pelo Secretário de Estado da Defesa Nacional o seguinte despacho: “Concordo com o teor da presente informação. Proceda-se em conformidade com o proposto no ponto III da informação em apreço. Solicito, ainda, que o requerimento do requerente e a presente informação sejam remetidos à consideração de S. Exa. o Ministro das Finanças.” – cf. documento n.º ... junto à petição inicial.
6. Em 10 de dezembro de 2007 foi publicado no Diário da República, II.ª Série, o Despacho n.º ...07, com o seguinte teor:
“MINISTÉRIOS DAS FINANÇAS E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DA DEFESA NACIONAL
Despacho n.º ...07
De acordo com o disposto nos artigos 5.º do Decreto-Lei n.º 55/81, de 31 de março, 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81, de 31 de março e 7.º do Decreto-Lei n.º 233/81, de 01 de agosto, os militares providos em cargos internacionais ou integrados em missões militares junto das representações diplomáticas e missões militares junto da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), têm direito aos abonos em uso para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE).
Com a aprovação do Estatuto da Carreira Diplomática pelos Decretos-Leis n.ºs. 79/92, de 06 de maio, e 40-A/98, de 27 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 153/2005, de 2 de setembro, foram introduzidas alterações significativas no que respeita às categorias que integram a carreira diplomática, bem como no regime remuneratório respetivo, pelo que os Despachos Conjuntos A-244/86-X, de 17 de novembro, e A-19/87-X, de 18 de fevereiro, ficaram desatualizados e desajustados face ao novo enquadramento jurídico decorrente das alterações referidas.
Pelo exposto, impõe-se proceder à atualização do regime de abonos dos militares providos em cargos internacionais ou integrados em missões militares no estrangeiro, de acordo com as alterações introduzidas no regime jurídico do pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Assim, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/81, de 31 de março, nos n.ºs. 1 e 2 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81, de 31 de março, e no n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 233/81, de 01 de agosto, determina-se: 1- Aos oficiais das Forças Armadas providos em cargos internacionais ou integrados em missões militares junto das representações diplomáticas no estrangeiro e em missões militares junto da OTAN, é aplicável o regime de abonos em vigor para o pessoal da carreira diplomática do MNE em funções nas missões diplomáticas e postos consulares, de acordo com as equiparações constantes do anexo ao presente despacho do qual faz parte integrante, sem prejuízo da revisão dos suplementos remuneratórios, no âmbito da reforma dos regimes de vinculação, carreira e remunerações que está em curso. 2— Os sargentos e praças providos em cargos internacionais ou que integram os gabinetes das missões militares a que se refere o número anterior, têm direito ao abono da remuneração correspondente a 75% e 55%, respetivamente, do montante atribuído à categoria de adido de embaixada. 3— Nos casos em que, da aplicação do presente despacho, resulte para os militares atualmente em comissões de serviço, uma redução dos montantes dos abonos percebidos, a estes continuará a ser aplicado, até ao termo das respetivas comissões, o regime que vigorava no momento em que iniciaram funções. 4 - São revogados os Despachos Conjuntos A-244/86-X, de 17 de novembro, e A-19/87-X, de 18 de fevereiro, e os Despachos Conjuntos do CEMGFA e do Ministro das Finanças e do Plano de 11 de maio de 1982 e de 12 de novembro de 1982. 5 - O presente despacho produz efeitos a partir de 1 de janeiro de 2008. 8 de novembro de 2007. - O Ministro de Estado e das Finanças, CC. - O Ministro da Defesa Nacional, DD.” -cf. documento n.º ... junto com a contestação do Ministério da Defesa Nacional.
7. A presente ação foi interposta em 19/09/2017 e com a mesma se pretende a anulação do ato do Secretário de Estado da Defesa Nacional de 31 de julho de 2017, por violação dos artigos 7.º do Decreto-Lei n.º 233/81, de 1 agosto, 5.º do Decreto-Lei n.º 55/81, de 31 de março e 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81, de 31 de março e a condenação dos Réus a proferir despacho conjunto que atualize as remunerações adicionais e outros abonos, com base no mesmo critério em uso para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros – cf. fls. 1 do suporte físico do processo e petição inicial dos presentes autos.
(…)
Adicionalmente, consideram-se provados os seguintes factos:
A) Em 2 de julho de 1982 foi publicado na II.ª Série do Diário da República o Despacho Conjunto do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e o Ministro de Estado e das Finanças e do Plano, com o seguinte teor: “Considerando que, nos termos do Decreto-Lei n.º 97/82, de 3 de abril, foram alteradas as condições anteriormente estabelecidas para a concessão dos abonos para encargos de instalação aos funcionários diplomáticos do Ministério dos Negócios Estrangeiros; Considerando o paralelismo de remunerações acessórias e abonos determinados pelos Decretos-Leis n.ºs 55/81, 56/81, de 31 de março, e 233/81, de 1 de agosto, para o pessoal militar em serviço nas missões militares junto das representações diplomáticas no estrangeiro, relativamente ao pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros; O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e o Ministro de Estado e das Finanças e do Plano, nos termos do disposto no art.º 4.º, alínea b), do Decreto-Lei 465/79, de 5 de dezembro, determinam o seguinte: 1 – Os quantitativos de abonos para encargos de instalação fixados pelo quadro constante da alínea a) do n.º 1 do despacho conjunto do chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e o Ministro de Estado e das Finanças e do Plano de 24 de fevereiro de 1982 são alterados para os seguintes valores: a) Na ida, o abono correspondente a duas vezes o abono único mensal que o militar vai perceber no posto onde é colocado. Este abono recebe uma redução de 25% quando o militar vai residir em habitação mobilada por conta do Estado; b) No regresso, o montante do abono será equivalente a 4 vezes o vencimento correspondente à categoria do militar. 2 – A metodologia de aplicação deste abono segue a filosofia definida para o pessoal diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros pelo Decreto-Lei n.º 97/82, de 3 de abril, tendo-se em conta as equiparações estabelecidas nos despachos conjuntos de 14 de agosto de 1978, 16 de fevereiro de 1981 e 24 de fevereiro de 1982 do Chefe Estado-Maior-General das Forças Armadas e o Ministro de Estado e das Finanças e do Plano. 3 – Este despacho produz efeitos a partir de 8 de abril de 1982. (…) 11 de maio de 1982 (…)”. – cf. documento n.º ...0 junto à petição inicial.
B) Em 16 de setembro de 1986 foi proferido o Despacho Conjunto n.º A-220/86- X, pelo Ministro das Finanças e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, fixando os termos dos abonos de representação dos funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros, nos termos do documento n.º ... da petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido – cf. documento n.º ... junto à petição inicial.
C) Em 2 de dezembro de 1986 foi publicado na II.ª Série do Diário da República o Despacho Conjunto A-244/86-X, do Ministro da Defesa Nacional e das Finanças com o seguinte teor: “1 – Considerando que o quadro de equiparações a que se refere o n.º 1 do despacho conjunto de 14-8-78 do Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas e do Ministro das Finanças e do Plano, publicado no DR, 2.ª, 236, de 13-10-78 é omisso quanto às equiparações dos adidos naval, militar e aeronáutico quando oficiais generais. 2- Considerando igualmente a necessidade de manter a mesma equiparação dos oficiais superiores das representações militares na NAMSA e AFSOUTH, a que se refere o despacho conjunto de 31-12-84, publicado no DR, 2.ª, 301, de 31-12-84, mesmo que promovidos ao posto de coronel ou capitão de mar e guerra durante a sua comissão de serviço. 3 – Considerando ainda de interesse fazer constar de um documento único a legislação que se encontra dispersa: Determina-se que o quadro de equiparações a que se refere o n.º 1 do despacho conjunto do Chefe-de-Estado-Maior-General das Forças Armadas e do Ministro das Finanças e do Plano de 14-8-78 passe a seguinte redação com efeitos a partir da data de publicação.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. documento n.º ... junto com a petição inicial.
D) Em 25 de fevereiro de 1987 foi publicado na II.ª Série do Diário da República o Despacho Conjunto A-19/87-X com o seguinte teor: “Considerando que foi alterado o regime remuneratório dos funcionários diplomáticos e equiparados em serviço no estrangeiro, a partir de 1-10-86: Ao abrigo do n.º 1 do art.º 8.º do Decreto-Lei 56/81, de 31/03, e do n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei 233/81, de 1-8, determina-se que o pessoal militar em serviço nas missões militares no estrangeiro passe a ser abonado, a partir de 1-10-86, pelo regime remuneratório estabelecido pelo Desp. Conj. A-220/86-X, de 16-9-86, dos Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros. 18-12-87. – O Ministro da Defesa Nacional (...)- O Ministro das Finanças (…)” –cf. documento n.º ... junto à petição inicial.
E) Em 24/12/1994, o Ministério das Finanças e dos Negócios estrangeiros proferiram o Despacho Conjunto com o seguinte teor: “
Ministério das Finanças e dos Negócios Estrangeiros
Despacho conjunto
Considerando que o sistema de cálculo dos abonos de representação deverá distinguir as várias componentes que atendam às distintas situações os funcionários diplomáticos colocados no quadro externo; Considerando que, para atingir tal desiderato haverá que estruturar um modelo que contenha um sistema de variação relativa das várias componentes integrantes desses abonos, o qual deverá, na medida do possível, refletir os diferentes custos de vida do lugar de afetação, o posicionamento dos funcionários no serviço diplomático, as funções que desempenhas nas diversas missões diplomáticas e postos consulares e a importância relativa destes na rede de representação externa do Estado; Considerando que deverá ser assegurada, tendencialmente, a invariabilidade dos abonos a liquidar; Ao abrigo do artº 59 do Decreto-Lei n.º 79/92, de 6 de maio (adiante referido por Estatuto), determina-se o seguinte:
1. No conceito administrativo de !Abono mensal de representação!, referido no art.º 6.º n. 1 do Estatuto, devem distinguir-se as seguintes componentes;
- de base (Arb)
- de representação específica: (Arr)
- eventual de cônjuge (Arc)
- eventual para descendentes (Ard)
- eventual de posto C (Apc)
- eventual de zona de risco (Arzr)
1.1. Haverá ainda que considerar, sempre que a situação o requeira, o “Abono mensal para subsídio de residência” (Ah) e o “Abono para custear a educação dos filhos dependentes” (Ae) previstos, respetivamente, nos nºs 2 e 3 do artº 56º do Estatuto.
2. As categorias de serviço diplomático, como previstas no respetivo Estatuto, são as seguintes: a) Embaixador
b) Ministro Plenipotenciário
c) Conselheiro de Embaixada
d) Secretário de Embaixada
e) Adido de Embaixada
2.1. Para os efeitos previstos no presente despacho, os conselheiros técnicos e do quadro especializado receberão abonos equivalentes aos conselheiros do serviço diplomático e os adidos técnicos e do quadro especializado receberão os abonos correspondentes aos do secretário do serviço diplomático.
2.2. Os secretários privativos receberão os abonos correspondentes aos dos secretários do serviço diplomático, com exceção do Arr, que será apenas de 50% do percebido por aqueles funcionários.
3. As componentes constituintes do abono mensal de representação, referidas no ponto 1, têm os valores indicados no presente despacho, expressos em dólares norte-americanos (USD) e obedece aos termos a seguir estipulados:
3.1 Componente de base (Arb)
3.1.1 A componente de base é a componente principal do abono mensal de representação e consiste nos seguintes montantes fixos, para as funções de chefe de missão e para os restantes funcionários diplomáticos colocados no serviço externo:
a) Chefe de Missão. .............................................................. 4.700 USD
b) Restantes funcionários diplomáticos ...................................... 3.300 USD
3.1.2 O Arb não é afetado por qualquer coeficiente de correção para além do referido no ponto 6 do presente despacho.
3.2 Componente de representação específica (Arr)
3.2.1 O Arr é um abono de montante variável, a processar numa base mensal, cujo montante deve atender aos seguintes parâmetros relativos à missão ou posto e ao país de afetação: - custo de vida; - importância diplomática / consular da missão ou posto no âmbito da rede de representação externa do Estado; - exigência acrescida de representação; - dimensão da comunidade portuguesa ou lusodescendente radicada na área de jurisdição da missão ou posto.
3.2.2. O índice do custo de vida é o constante da coluna, excluindo habitação, dos “Retail price indexes relating to living expenditures of United Nations Officials”, publicados em setembro de cada ano no “UN Bulletin of Statistics”.
3.2.3 A importância diplomática / consular tem os seguintes valores: - 50 para as Embaixadas em Bona (…); - 30 para as Embaixadas em Ankara (…); - 10 para as restantes missões diplomáticas e postos consulares.
3.2.4 O parâmetro e exigência acrescida de representação tem os seguintes valores:
- 30 para as Embaixadas nas capitais dos países membros da União Europeia e ainda em Brasília (…);
- 10 para as embaixadas em Ankara, (…)
3.2.5. O valor determinado pela dimensão da comunidade portuguesa é: - 20 para as Embaixadas e postos consulares na América do Norte, (…);
- 10 para as Embaixadas e postos consulares na Austrália (…).
3.2.6 De acordo com o somatório obtido pela aplicação dos parâmetros anteriormente definidos, as missões diplomáticas e postos consulares são classificados nos quatro seguintes grupos:
a) Grupo I – Postos em que o somatório seja superior a 220
b) Grupo II – Postos em que o somatório seja superior a 160 e igual ou inferior a 220;
b) Grupo III – Postos em que o somatório seja superior a 120 e igual ou inferior a 160;
b) Grupo IV – Postos em que o somatório seja inferior a 120.
3.2.7 Os valores do Arr, expressos em USD, são os seguintes, consoante a categoria do funcionário e o grupo em que a missão diplomática ou posto consular se encontre integrada:
Grupo I Grupo II Grupo III Grupo IV
A – Chefe de Missão 7000 4250 2750 1750
B – Ministro / Cônsul Geral 5000 2750 2250 1500
C- Conselheiro / Substituto legal / Cônsul 4000 2252 1750 1250
D – Secretário / Adido 3000 1750 1250 1000
3.3 Componente eventual de Cônjuge (Arc)
3.3.1 É um abono complementar, estabelecido em função da situação familiar dos funcionários, que tem os seguintes valores: para Chefe de Missão, 1.050 USD nos países do grupo I, e 600 USD para os países dos grupos II, III e IV; para os outros funcionários diplomáticos, 750 USD, nos países do grupo I, e 400 USD para os países dos grupos II, III e IV. O abono será liquidado sempre que o funcionário seja casado ou tenha a seu cargo ascendentes e/ou descendentes que com ele vivam, em economia comum, e ainda nas situações previstas no art.º 2020º do Código Civil.
3.3.2 Nos casos em que ambos os cônjuges sejam funcionários públicos, a prestar serviço no mesmo posto ou cidade, recebendo remunerações, e independentemente das situações profissionais efetivas, não haverá lugar à liquidação de Arc.
3.4 Componente eventual para descendentes (Ard)
3.4.1 É um abono complementar estabelecido em função da existência de descendentes a cargo do funcionário, e terá um valor correspondente a 150 USD por cada descendente a cargo.
3.4.2 A elegibilidade para a perceção do Ard e o respetivo regime obedecem às regras aplicáveis em matéria de abono de família.
3.4.3 No casos em que suceda, o Ard e o Arc são cumuláveis,
3.4.4 Quando se verifique a situação prevista no ponto 3.1.2, a presente componente apenas poderá ser processada a um dos cônjuges.
3.5 Componente eventual de Posto C (Apc)
3.5.1 É um abono a atribuir aos funcionários colocados em postos nos quais o exercício de funções seja considerado particularmente difícil e é destinado a compensar os custos sociais e familiares acrescidos decorrentes dessa situação.
3.5.2 O Apc é equivalente a 10% da componente de base (Arb) que competir a cada funcionário.
3.6 Abono eventual de zona de risco (Arzr)
3.6.1 É um abono a atribuir aos funcionários colocados em postos nos quais o exercício de funções seja considerado como particularmente arriscado em função do ambiente de guerra ou de conflito que aí se viva.
3.6.2 O Arzr é equivalente a 10 % da componente de base (Arb) que competir a cada funcionário.
3.7. A definição das missões diplomáticas e postos consulares elegíveis para efeitos de aplicação do Apc e do Arzr, é feita por despacho conjunto dos Ministérios das Finanças e dos Negócios Estrangeiros.
4. Os funcionários que não disponham de casa do Estado, sem encargos, de harmonia com o art.º 56.º n.º 2 do Estatuto, têm direito a abono complementar para habitação (Ah), de montante variável.
4.1 Os montantes máximos do Ah, estabelecidos em função da categoria ou cargo exercícios, e expressos em USD, são os seguintes:
a) Embaixador e Ministro 2700
b) Conselheiro / Cônsul-Geral 2400
c) Secretário / Cônsul 2000
d) Outros 1700
4.2 Sobre os montantes indicados no número anterior incide, para efeitos de correção, o índice do custo de vida, excluindo habitação, dos “Retail price indexes relating to living expenditures of United Nations Officials”, publicados em setembro de cada ano no “UN Bulletin of Statistics” correspondente ao país onde o funcionário presta serviço.
4.3 O Ah está sujeito a prestação de contas, até aos montantes máximos aplicáveis a cada caso, e é concedido por reembolso, mediante a apresentação de faturas / recibos das despesas decorrentes de: - arrendamento, incluindo ou não aluguer de mobiliário, aluguer de garagem ou parqueamento, climatização, condomínio, taxas e impostos municipais, bem como qualquer outro encargo, com enquadramento legal, cuja liquidação seja autorizada por despacho do Ministro dos Negócios Estrangeiros; - alojamento em hotel ou estabelecimento similar (só dormida), até o momento da obtenção da residência.
4.4 O processamento deste abono é feito mensalmente, a partir da apresentação do contrato de arrendamento ou da fatura recibo do hotel.
A prestação de contas terá a periodicidade que resultar do contrato de arrendamento, elaborado nos termos da lei local.
4.5. O câmbio a aplicar para a liquidação deste abono será o publicado pelo “The Wall Street Journal”, relativo ao “commercial rate -floating rate”, diariamente ou em tabela semanal se não figurar naquela.
4.6. Os montantes decorrentes da aplicação dos pontos 4.1. e 4.2. do presente despacho aplicam-se aos contratos celebrados após a entrada em vigor do mesmo, mantendo-se inalterados os montantes atualmente pagos a título de abono de habitação, de acordo com o disposto no ponto 8.
4.7. Por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, sob proposta devidamente fundamentada do secretário-geral, poderá proceder-se pontualmente, a ajustamentos extraordinários dos valores estabelecidos em 4.1., sempre que, em determinados postos, se verifiquem oscilações estruturais que não sejam suscetíveis de correção através do disposto em 6.1.
5. Os funcionários diplomáticos têm direito a perceber um abono complementar de educação (Ae), composto por uma parte fixa e por uma parte variável, proporcional às despesas escolares efetivas dos seus filhos.
5.1. A parte fixa, no valor de 500 USD, nos países do grupo I é de 300 USD, nos países dos grupos II, III e IV, é liquidada relativamente a cada filho menor, entre os 6 e os 15 anos, ou entre os 15 e os 25 anos, mediante apresentação de certificado comprovativo da frequência, com aproveitamento, de estudos secundários ou superiores.
5.2. A parte variável é liquidada por reembolso e corresponde a uma percentagens de 75% da diferença entre a parte fixa e a despesa escolar efetiva com cada filho entre os 6 e os 25 anos, nas condições referidas na segunda parte do número anterior, não podendo contudo ultrapassar o montante da parte fixa.
5.3. O processamento deste abono será efetuado a partir do momento da apresentação da fatura/recibo do estabelecimento de ensino frequentado pelo filho do funcionário a que se aplicar este despacho, recorrendo-se, para a conversão das moedas, ao disposto no ponto 4.5.
5.4. Quando se verifique a situação prevista no ponto 3.3.2., as componentes do presente abono apenas poderão ser processadas a um dos cônjuges.
6. O abono de representação (Ar) e os complementares (Ah e Ae) serão sempre fixados em dólares norte-americanos.
6.1. Por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros pode proceder-se a ajustamentos extraordinários daqueles abonos sempre que o câmbio médio USD/moeda local, relativamente ao trimestre anterior, tenha sofrido uma oscilação, num sentido eu noutro, igual ou superior a 5% (quando comparado com o utilizado na fixação do abono).
7. No primeiro trimestre do ano, os quantitativos do Arr poderão ser objeto de correção sempre que a variação homóloga do índice de (…)
8. As alterações dos montantes das representações, nomeadamente as que resultam no disposto nos pontos 6.1. e 7., ficarão sujeitas ao respetivo cabimento orçamental.
9. No caso em que, da aplicação do presente despacho, resulte redução dos montantes dos abonos atualmente em vigor, estes manter-se-ão até à absorção dos mesmos pelo novo sistema.
10. Os Índices dos países que não figurem no “UN Bulletin of Statistics” são estimados pela média aritmética (“Total2 e “Excluindo habitação”) de, pelo menos três países vizinhos (limítrofes ou próximos) do país para o qual se pretende determinar o índice; na impossibilidade de destrinçar os dois índices, aplicar-se-á o mesmo valor para os dois casos.
11. O sistema de cálculo constante do presente despacho entra em vigor em 1 de janeiro de 1995.
12. Fica revogado o Despacho Conjunto N.º A-220/86-X, de 16 de setembro O Ministro das Finanças, … O Ministro dos Negócios Estrangeiros…”. – cf. documento n.º ... junto à petição inicial e documento nº ...0 junto à contestação do Ministério da Defesa Nacional.
F) Em 29 de dezembro de 1998 foi assinado pelo Ministro da Defesa Nacional um Despacho Conjunto com o Ministério das Finanças [embora por este não subscrito] visando proceder à atualização do regime de abonos de pessoal militar em serviço em missões militares no estrangeiro de acordo com as alterações introduzidas no regime jurídico do pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro, onde constava uma tabela de equiparação entre as patentes militares e categorias de funcionários – cf. documento n.º ...1 junto à petição inicial.
G) O Ministério dos Negócios Estrangeiros, através do despacho conjunto do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e Ministro das Finanças, de 12.12.2001, decidiu aplicar a taxa de câmbio, a partir de 1.1.2002, fixa para o seu pessoal nos termos definidos no documento n.º ...9 junto à petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido, prevendo a utilização da taxa de câmbio média EURO/USD, divulgada pelo Banco de Portugal em 14 de dezembro de 2001, que era de 0,9016 dólares dos EUA para 1 Euro – cf. documentos n.ºs ...9 e ...0 juntos à petição inicial.
H) Pelo exercício dos cargos de pessoal militar no estrangeiro, foi o A. abonado de harmonia com o disposto nos Despachos A-244/86-X, de 17 de novembro e A19/87-X, de 18 de fevereiro, e Despacho conjunto de 11 de maio de 1982 referente aos abonos devidos por ida em missão e respetivo regresso.
Motivação: Os factos provados resultam da posição assumida pelas partes nos articulados e dos documentos juntos aos autos, conforme indicado em cada um dos números (…)”
*
III.1.2- Da imputada nulidade processual
*
15. Esta questão encontra-se veiculada na conclusão C) das alegações do recurso do Ministério da Defesa Nacional supra sintetizadas, substanciando-se na alegação de “(…) Sobre a matéria probatória o Tribunal além de nada apreciar ou decidir sobre a matéria na sentença, não notificou sequer as partes para alegações escritas (…)”, tendo, por isso, incorrido em contravenção do preceituado no 91º-A do C.P.T.A.
16. Adiante-se, desde já, que esta argumentação não irá proceder.
17. Com efeito, compete ao juiz aferir da necessidade ou não de produzir prova, como resulta inequivocamente do disposto no n.º 3 do art. 90º do CPTA.
18. Assim, quando, após a contestação ou o decurso do prazo para a mesma, o juiz, sem mais, profere decisão, é porque entendeu decidir sem que haja lugar à produção da prova.
19. Nesse caso, como é manifesto, a falta de inquirição das testemunhas oferecidas pelo Ministério da Defesa Nacional [e de prestação de depoimento de parte] não é um problema de omissão de formalidade imposta pela lei, mas sim de suficiência ou veracidade da matéria de facto considerada na sentença.
20. Competindo ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova testemunhal oferecida pelas partes e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária.
21. Se, por qualquer motivo, o Recorrente Ministério da Defesa Nacional discorda da matéria de facto que o despacho saneador-sentença deu por assente, então tem ao seu dispor meio processual da apelação para manifestar tal desconformidade.
22. Refira-se que a lei não prevê a prolação de decisão alguma a dispensar a produção da prova oferecida pelas partes.
23. Ora, se a lei não prescreve tal despacho, não se compreende como a falta de emanação do mesmo constitui um desvio ao formalismo processual que deveria ter sido seguido e, consequentemente, como sustentar que se verifica uma nulidade.
24. Recorde-se que a nulidade processual consiste num desvio entre o formalismo prescrito na lei e o formalismo efetivamente seguido nos autos.
25. Por sua vez, e com reporte à alegada violação do artigo 91º-A do CPTA, impera sublinhar que a exigência de notificação de partes para alegaram só subsiste quando sejam realizadas diligências de provas.
26. De facto, é o seguinte o teor da normação em questão: “Quando sejam realizadas diligências de prova, sem que haja lugar à realização de audiência final, as partes, finda a instrução, são notificadas para apresentarem alegações escritas pelo prazo simultâneo de 20 dias”.
27. No caso versado, conforme se depreende grandemente do que supra expôs, a Mmª. Juiz a quo considerou inútil ordenar quaisquer diligências de prova, por desnecessidade destas ao apuramento da verdade.
28. Logo, não se reconhece a existência de qualquer contravenção do preceituado no 91º-A do C.P.T.A, na medida em que falta o pressuposto apontado – abertura de um período de instrução -, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão em relação à pretensão do Recorrente no plano em análise.
29. E assim fenece a conclusão em análise deste recurso.
*
III.1.3- Do imputado erro de julgamento de direito em matéria prescricional
*
30. A terceira questão decidenda invocada pelo Recorrente Ministério da Defesa Nacional consubstancia-se em saber se a sentença recorrida, ao desatender a excecionar a excecionada prescrição dos montantes em causa, incorreu em erro de julgamento de direito.
Retenhamos o sentido da decisão do T.A.F. do Porto expresso nos seguintes excertos:”(…)
Como adiantamos, a questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se os Réus deve ser condenados a praticar ato administrativo que defira a pretensão do Autor (despacho conjunto que atualize as remunerações adicionais e outros abonos, com base no mesmo critério em uso para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros para efeitos do período em que decorreu entre 1 de outubro de 2002 e 1 de dezembro de 2004, em que o A. foi Comandante da EUROFOR).
Foi excecionada pelas Rés a prescrição dos montantes em causa com base no regime de prescrição dos créditos laborais e à data de cessação de funções no cargo em causa nos presentes autos (1 de dezembro de 2004).
O A., por seu turno, alega que a inexistência de despacho conjunto impossibilitava o cálculo das quantias devidas ao A. ou que o direito pudesse ser exercido, conforme exige o artigo 306.º, nº 1 do Código Civil.
Cumpre conhecer a questão da prescrição neste momento.
Atendendo a que estamos perante um pedido de condenação à prática de ato devido, os montantes resultantes de tal ato e que possam ser devidos não são ainda líquidos, pelo que a prescrição não pôde começar a contar – cf. artigo 306.º, n.ºs 1 e 4 do Código Civil.
Quantos aos juros e respetiva prescrição, uma vez que o ato ainda não foi praticado, os mesmos tão pouco são devidos, inexistindo qualquer prescrição.
Face ao exposto, a exceção de prescrição invocada improcede, bem como o pedido de pagamento de juros (…)”
31. É sabido que o objeto do presente recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações.
32. Nas conclusões E) e F), o Recorrente Ministério da Defesa Nacional põe em causa o juízo decisório firmado pelo Tribunal a quo em matéria prescricional aplicável, invocando que “(…) cabe nestes autos aplicar a prescrição cível, de 5 anos, relativa a créditos decorrentes de obrigações periódicas (…)”, na senda do decidido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 379/2017, e pelo Tribunal Administrativo Central Sul no aresto tirado no processo nº. 12789/15 de 19.01.2017.
33. Esta alegação, porém, é absolutamente imprestável para demonstrar a existência de qualquer erro de julgamento da decisão recorrida.
34. Com efeito, a prescrição é um instituto que visa regular a perda do direito de acionar judicialmente por efeito do decurso de um prazo legalmente estabelecido para o exercício de determinada[s] obrigação[ões].
35. Assim, para que se possa sequer equacionar o decurso do prazo prescricional, mister é que a obrigação subjacente [já] exista e possa ser exercida.
36. Pois bem, no caso dos pedidos jurisdicionais formulados nos autos, isso não sucede.
37. Para facilidade da análise, convoque-se o petitório inicial: “(…)
Nestes termos e nos mais de direito que ao caso se apliquem e que o Tribunal doutamente suprirá, deve a presente acção ser considerada procedente e anulado o acto impugnado, atento aos n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/81, de 31 de março, nºs 1 e 2 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81, de 31 de março, e n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei 233/81, de 1 de agosto, e em consequência:
a) Deve ser considerado ilegal com efeitos circunscritos ao caso concreto o Despacho Conjunto A-220/86-X, de 16 de setembro de 1986, dos Ministérios das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, no período que decorre entre 1 de janeiro de 1995 e 1 de janeiro de 2008, por violação do artigo 8º do Decreto-Lei nº 56/81, de 31 de março, n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/81, de 31 de março, e artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 233/81, de 1 de agosto, quando em conjugação com o Despacho A-244/86-A de 17.11.86, e o Despacho Conjunto A-19/87-X, de 18 FEV dos Ministros da Defesa Nacional e das Finanças, na medida em que as remunerações adicionais deles resultantes não se encontram estabelecidas com base no mesmo critério no período referido de desempenho de funções do A. em uso pelo pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros, em serviço no estrangeiro.
b) Também deve ser julgado ilegal, com efeitos circunscritos o caso concreto o Despacho A-244/86-A de 17.11.86, e o Despacho Conjunto A-19/87-X, de 18 FEV dos Ministros da Defesa Nacional e das Finanças na medida em que não se encontram conforme o critério, à data do desempenho de funções, em uso pelo pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro.
c) Deve ainda ser considerada ilegal a aplicação ao A., do Despacho Conjunto de 11 de maio de 1982, do Despacho Conjunto do Estado Maior General das Forças Armadas e Ministério das Finanças publicado no DR II Série nº 150 de 2-7-1982, na medida em que os subsídios de instalação por ida e regresso de missão, no mesmo previsto, não se encontram de acordo com o critério em uso, aplicável (ou aplicado) ao tempo, ao pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros, em serviço no estrangeiro.
d) Também deve ser considerado ilegal o pagamento efetuado das remunerações adicionais à taxa de conversão de 1USD =0,78333 ou outra que não tenha sido a de 0,9016 dólares dos EUA para 1 EURO que foi a utilizada como critério para o pagamento das remunerações adicionais do pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro.
e) Devem ser considerados ilegais os actos administrativos de pagamento de remunerações adicionais por se encontrarem determinados e concretizados com base em despachos ilegais não estabelecidos com base no mesmo critério para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro.
f) Devendo os Réus ser condenados à prática de despacho conjunto concreto devido aplicável ao A. como consequência necessária da ilegalidade dos Despachos Conjuntos A-220/86-X, A-244/86-A de 17.11.86, e A-19/87-X, de 18 FEV dos Ministros da Defesa Nacional e das Finanças
g) O despacho conjunto devido a proferir deve estabelecer a equivalência entre o posto do Autor e as funções militares desempenhadas, com o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
h) O despacho conjunto a proferir, que se requer que seja aplicável unicamente ao A, mas sem oposição que possa ser aplicado a outros militares que não o A, deve explicitar que têm direito aos abonos a estabelecer com base no mesmo critério em uso para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro, tal modo que o A. possa a vir a perceber as quantias a que teriam ao tempo direito, descontadas daquelas que efectivamente perceberam, incluindo os subsídios de instalação por ida e regresso de missão, caso tivesse existido Despacho Conjunto ao tempo de desempenho de funções que não contivesse as ilegalidades agora invocadas.
i) O Despacho Conjunto a proferir deve conter suficientemente fundamentação que permita efetuar os cálculos e pagamento da diferença de valores para cada um dos abonos em igualdade de circunstâncias e valores pagos ao pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no Posto Consular/Embaixada de referência, incluindo os câmbios ao tempo de desempenho de funções dos AA, em igualdade de circunstâncias com os câmbios efetuados ao pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
j) A emissão do Despacho Conjunto a proferir por fundamento a existência de ilegalidades na conformação, conteúdo e desconformidade com a lei e despachos e normas acima referidos, julgados ilegais pelo Tribunal, por ofensa às normas e lei superior do Decreto-Lei 56/81, deve retroagir à data do desempenho de funções do Autor, de tal modo que a sanação da ilegalidade se verifique à data em que foram ou deviam ter sido pagas as quantias consideradas num valor ilegal.
k) Em consequência da retroação da sanação das ilegalidades referidas acima, devem ser pagas as quantias devidas ao A. no período que decorre entre 1 de outubro de 2002 e 1 de dezembro de 2004, bem como os juros moratórios à taxa legal entre a data do desempenho de funções que deveriam ter sido pagas as quantias, ainda que parcelares agora em dívida, e aquela em que efectivamente será paga.
l) Deve ser considerado que o A. tendo desempenhado as funções de chefe de missão tem direito também, no novo despacho a proferir, que neste esteja previsto o pagamento das quantias, em igualdade de circunstâncias, também pagas ao chefe de missão equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço em missão diplomática de Portugal no estrangeiro.
m) Sendo que a emissão do acto pretendido poderá envolver a formulação de valorações próprias da atividade administrativa, requer-se ainda que o tribunal formule as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto devido, nomeadamente a concessão de prazo para a prática do acto, e que defira, para momento ulterior, e em execução de sentença, a determinação das quantias concretas envolvidas na sequência de produção do acto devido (…)”.
38. Conforme emerge grandemente do que se vem de transcrever, o Autor, por intermédio da presente ação, visa [de forma abreviada] (i) o reconhecimento da ilegalidade dos actos administrativos de pagamento de remunerações adicionais por se encontrarem determinados e concretizados com base em despachos ilegais não estabelecidos com base no mesmo critério para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro, e, nessa esteira, a (ii) condenação dos Réus (ii.1) à prática de despacho conjunto a estabelecer a equivalência entre o posto do Autor e as funções militares desempenhadas com o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e, bem assim, (ii.2) ao pagamento das respetivas diferenças remuneratórias adicionais no período que decorre entre 1 de outubro de 2002 e 1 de dezembro de 2004.
39. Donde se capta que a obrigação de pagamento das diferenças remuneratórias adicionais peticionadas nos autos só eclodirá se forem os Réus condenados na prática do despacho conjunto referido na alínea f) do petitório.
40. Realmente, só após a condenação dos Réus à prática do despacho conjunto que reconheça a situação jurídica do Autor é que emergirá fundamento para proceder ao pagamento peticionado nos autos.
41. Até lá, tudo se passa como nada existisse, isto é, como se nenhum fundamento legal houvesse para dar procedência às pretensões jurisdicionais melhor identificadas sob as alíneas k) a m) do petitório inicial.
42. E se assim é, então até à eventual validação judicial - transitada em julgado - da peticionada condenação do Réu à prática do despacho conjunto referido na alínea f) do petitório, nem sequer se pode equacionar a aplicação do instituto da prescrição à situação jurídica do Autor.
43. E o assim decidido nada bule com os arestos mencionados pelo Recorrente.
44. De facto, perlustrando o teor do aresto do Tribunal Constitucional nº. 319/2017, facilmente se atinge que o mesmo tem por “objeto confesso” o controle de constitucionalidade [com base no parâmetro de fiscalização o direito à retribuição, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da CRP, e o princípio da proteção da confiança, que deflui do artigo 2.º da mesma Lei Fundamental] da norma extraída dos números 1 e 2 da Portaria n.º 611/2008, de 2 de maio, do Ministro dos Negócios Estrangeiros, do Ministro das Finanças e Administração Pública e do Ministro da Defesa Nacional, conjugada com n.º 13 do Despacho n.º 4.182/2008, de 18 de fevereiro, do Ministro das Finanças e do Ministro da Defesa Nacional, que revogou a remuneração adicional e demais abonos previstos no n.º 5 da Portaria n.º 1157/2004, de 22 de outubro, dos Ministros de Estado, da Defesa Nacional, e dos Assuntos do Mar, das Finanças e da Administração, substituindo-os pelo abono de ajudas de custos fixado naquele Despacho, com efeitos a partir de 1 de julho de 2008, com base no parâmetro de fiscalização o direito à retribuição, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da CRP, e o princípio da proteção da confiança, que deflui do artigo 2.º da mesma Lei Fundamental.
45. Nada do aqui se decidiu tem reflexo impactante do entendimento ora acolhido.
46. De igual modo, examinado os termos do aresto do T.C.A Sul nº. 12789/15 de 19.01.2017, assoma evidente que o mesmo não versa sobre qualquer “regime prescricional ou sobre o modo de início de contagem do prazo prescricional” dos montantes em causa, nem sequer apresenta alcance capaz de rebater a tese que se vem de perfilhar.
47. Assim deriva, naturalmente, que, por umas ou outras razões, se não antolha a existência de qualquer fio condutor lógico jurídico que justifique a reversão da decisão versada.
48. Por conseguinte, falecem as objeções do Recorrente no particular conspecto em análise.
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III.1.4- Do imputado erro de julgamento de direito por violação do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81
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49. A última questão a dirimir no âmbito do recurso jurisdicional interposto pelo Ministério da Defesa Nacional consiste em determinar se a sentença recorrida, ao julgar que o pessoal militar colocado no estrangeiro, em missões OTAN ou outras de cariz semelhante deveria ter sido remunerado adicionalmente nos termos fixados em despacho conjunto do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e do Ministro das Finanças e do Plano, incorreu [ou não] em erro decisório, por ofensa do regime plasmado do disposto no artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81.
50. Antecipe-se, desde já, que a resposta é negativa.
51. Na verdade, a sentença recorrida seguiu o sentido da jurisprudência vertida nos arestos que cita, entre os quais se inclui o Acórdão deste T.C.A.N., de 15.11.2019, tirado no processo nº. 2431/09, que confirmou a sentença da 1.ª Instância que julgou parcialmente procedente uma ação administrativa de “objeto confesso” idêntico à dos presentes autos.
52. No seu acórdão, este T.C.A.N. considerou que: “(…) Com a acção de que emana o presente recurso jurisdicional pretenderam os obter a declaração de ilegalidade do Despacho Conjunto A-220/86-X, de 16-09-1986, dos Ministérios das Finanças e dos Negócios Estrangeiros; do Despacho A-244/86- X de 17/11/86; do Despacho Conjunto A-19/87-X, de 18-02-1987, dos Ministros da Defesa Nacional e das Finanças; e do Despacho Conjunto n ° 27676/2007, do MEF e do MDN. Para tanto, assacaram-lhe, no essencial, vício de violação de lei, por ofensa do disposto no artigo 8º do Decreto-Lei n° 56/81, de 31 de março; no n° 1 do artigo 5º do Decreto-Lei n° 55/81, de 31 de março; e do artigo 7º do Decreto-Lei n° 233/81, de 01 de agosto. A sentença ora recorrida reconheceu razão aos Autores e, entre o mais, veio a declarar a ilegalidade, com efeitos circunscritos ao caso concreto, dos identificados despachos conjuntos, por enfermarem de vício de violação de lei, por ofensa do disposto no artigo 8º do Decreto-Lei n° 56/81, de 31 de março, no n° 1 do artigo 5º do Decreto-Lei n° 55/81, de 31 de março, e do artigo 7º do Decreto-Lei n° 233/81, de 01 de agosto. Para tanto, desenvolveu um discurso dirimente com arrimo nuclear em pertinente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, que identifica, bem como doutrina (….)”.
53. E mais adiante: “(…) A decisão recorrida harmoniza-se com esta jurisprudência e doutrina no entendimento basilar de que as remunerações adicionais que foram pagas aos Autores e ora Recorridos pelos cargos militares que ocuparam no estrangeiro continuaram a ser processadas pelo anterior regime remuneratório, isto é, o decorrente da aplicação do Despacho Conjunto n.° A-220/86-X, de 16/9/1986, dos Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, aplicável à situação do Autores por força do determinado através do Despacho Conjunto n.° A-19/87-X, de 18 fevereiro, dos Ministros da Defesa e das Finanças, pelo que se entendeu ser forçosa a conclusão de que a violação do disposto no artigo 8º do Decreto-Lei n° 56/81, de 31 de março, n° 1 do artigo 5o do Decreto-Lei n° 55/81, da mesma data, e do artigo 7º do Decreto-Lei n° 233/81, de 01 de agosto. Como tal, dispensamo-nos o exercício de reescrever o que tão eloquentemente foi exarado nos citados arestos do STA e deste TCAN e Parecer da PGR quanto a questão idêntica à ora dirimenda e adotam-se aqui os seus fundamentos, os quais, enquanto fundamentos desta decisão, impõem a total improcedência das razões em que assenta o presente recurso (…)”.
54. O Supremo Tribunal Administrativo, na sequência da revista que foi admitida desse acórdão deste T.C.A.N., não inverteu essa linha jurisprudencial.
55. A posição jurisprudencial que se vem ora de evidenciar – que integra também o conhecimento nas instâncias sindicadas da eventual ofensa da normação vertida no artigo 8º do D.L. nº. 56/81 - constitui motivação mais do que suficiente para que se concluir que a sentença recorrida não merece qualquer censura no que concerne ao seu julgamento de direito, o que se declara expressamente.
56. Isto para dizer que não vinga, portanto, a tese recursiva do Recorrente em análise.
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III.2- Recurso interposto por AA
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57. Resta-nos a questão de saber se a sentença recorrida, ao desatender o pedido de condenação do Réu no pagamento de juros, incorreu [ou não] em errado julgamento da matéria de direito.
58. A resposta é, manifestamente, desfavoravelmente, às pretensões do Recorrente.
59. De facto, como se evidenciou nos parágrafos 30) a 48) do presente aresto, não existe sequer a obrigação de pagamento das diferenças remuneratórias adicionais peticionadas nos autos, que só eclodirá se forem os Réus condenados na prática do despacho conjunto referido na alínea f) do petitório.
60. Logo, e sopesando que os juros de mora são uma forma de compensação à entidade lesada pelo atraso no pagamento da dívida principal - que, obviamente, já tem que existir -, assoma evidente que o Réu não pode ser condenado no pagamento dos mesmos, na medida em que falta o pressuposto apontado.
61. Deste modo, tendo sido este o caminho trilhado na sentença recorrida, é mandatório concluir que esta fez correta subsunção do tecido fáctico apurado nos autos ao bloco legal e jurisprudencial aplicável, não sendo, portanto, merecedora da censura que o Recorrente lhe dirige.
62. Consequentemente, e em face de tudo o quanto antes se expôs, deve ser negado provimento a ambos os recursos interpostos nos autos, e mantida a sentença recorrida.
63. Ao que se provirá no dispositivo.
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V – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO a ambos os recursos interpostos nos autos e manter a sentença recorrida.
Custas do recurso interposto pelo Ministério da Defesa Nacional pelo Recorrente.
Custas do recurso interposto por AA pelo Recorrente.
Registe e Notifique-se.
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Porto, 24 de fevereiro de 2023,

Ricardo de Oliveira e Sousa
Rogério Martins
Luís Migueis Garcia