Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00167/22.7BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/20/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:PRESCRIÇÃO, CITAÇÃO, PRESUNÇÃO;
ADVERTÊNCIA DE COMINAÇÃO, ARTIGO 192.º, N.º 2 E N.º 3 DO CPPT;
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO;
Sumário:I - De acordo com o n.º 2 do artigo 192.º do CPPT, no caso de a citação pessoal ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção e este vier devolvido ou não vier assinado o respetivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal, então há que convocar a 2ª parte do mencionado n.º 2, repetindo-se a citação, através do envio de nova carta registada com aviso de recepção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte.

II - A cominação em causa refere-se ao disposto no n.º 3 do artigo 192.º do CPPT, ou seja, a advertência relativa a considerar-se a citação efectuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados.

III – No caso em apreciação, tal advertência não ocorreu, pelo que não pode operar a presunção de citação.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Representação da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 29/09/2023, que julgou procedente a reclamação do acto do órgão de execução fiscal, apresentada contra o acto de indeferimento do pedido de reconhecimento de prescrição das dívidas exequendas, por referência aos processos de execução fiscal n.º ...40 (Imposto sobre o Valor Acrescentado 2008/06T), ...16 (Imposto sobre o Valor Acrescentado 2008/09T), ...25 (Imposto sobre o Valor Acrescentado 2009), ...07 (Imposto sobre o Valor Acrescentado 2009 e 2010), ...48 (Imposto sobre o Valor Acrescentado 2011/12T), ...73 (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas 2011) e ...70 (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas 2012) instaurados contra a devedora originária, a sociedade comercial “[SCom01...] Unipessoal, Lda.”, e revertidos contra o reclamante «AA», titular do NIF ...93, residente na Calçada ..., ..., em ....

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
“A. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida em 29.09.2023 pelo Douto Tribunal a quo, que julgou procedente a reclamação deduzida contra a decisão proferida pelo Chefe do Serviço de Finanças ... (doravante SF ou OEF), atento o sentido do indeferimento da pretensão do Reclamante com vista ao reconhecimento da prescrição das dívidas tributárias tituladas pelos processos de execução fiscal; ...40, ...16, ...25, ...07, ...48, ...78 e ...70.
B. Em suma, considerou o douto Tribunal que a prova documental produzida pela Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, AT), mais concretamente, o Serviço de Finanças ... (doravante SF ou OEF), não carrearam para os autos elementos probatórios que sustentassem a não prescrição das dívidas tributárias.
C. Com o assim decidido não pode a Fazenda Pública (FP) conformar-se, porquanto considera que a douta Sentença do Tribunal a quo enferma de erro de julgamento, de facto e de direito, conforme se concluirá.
D. O Tribunal a quo deu por assente como factos não provados:
“1) No âmbito dos Processo de Execução Fiscal referidos em A) dos factos provados, verifica-se a citação do executado em:
- 2010-...40
- 2013-...16
- 2013-...25
- 2013-...07
- 2013-...48
- 2014-...73
- 2014-...70”
E. Ou seja, não considerou os processos de execução fiscal citados ao aqui Reclamante, com a motivação de que o SF “Na verdade, não foi junto qualquer elemento probatório para prova das efetivas citações, mormente, carta registada com aviso de receção devidamente assinado pelo Reclamante (sendo que no Processo de Execução Fiscal ...73 apesar de constar do AR de citação uma assinatura de terceiro, não fora satisfeito pela Autoridade Tributária e Aduaneira o ónus probatório que sobre si impende no que à citação pessoal efetuada em pessoa diversa do citando concerne – cfr art.º 233.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 2.º, al. e) do Código de Processo e Procedimento Tributário).”
F. Retornando aos presentes autos, salvo melhor opinião, como se pode verificar na cópia dos PEFs ínsitos nos presentes autos constam os efetivos comprovativos do cumprimento no disposto do número 3 do artigo 192º do CPPT,
G. ou seja, a citação pessoal do aqui Reclamante na qualidade de Revertido das dívidas em crise nos presente autos, cf. documento com a referência 007992186, de 21.10.2022, de pág. 55 a pág. 109 do processo eletrónico do SITAF, cujo o teor integral do mesmo consta do facto provado A) da fundamentação de facto da Sentença recorrida.
H. O Tribunal a quo firma na sua motivação que: “Na verdade, não foi junto qualquer elemento probatório para prova das efetivas citações, mormente, carta registada com aviso de receção devidamente assinado pelo Reclamante (sendo que no Processo de Execução Fiscal ...73 apesar de constar do AR de citação uma assinatura de terceiro, não fora satisfeito pela Autoridade Tributária e Aduaneira o ónus probatório que sobre si impende no que à citação pessoal efetuada em pessoa diversa do citando concerne – cfr art.º 233.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 2.º, al. e) do Código de Processo e Procedimento Tributário).”
I. Tal realidade foi obtida consultando a cópia dos PEFs já anteriormente enunciada, à qual a FP adere pelo facto de que a tentativa de citação relativa ao PEF ...73, não foi efetivada por falta de cumprimento do disposto no artigo 233º do CPC.
J. Assim sendo e pela consulta da cópia dos restantes PEFs verifica-se a existência de cópias dos Avisos de Receção devolvidos e também das repetições da citação com a aposição da data em que as aludidas citações foram depositadas por parte dos CTT no recetáculo da morada que corresponde ao domicílio fiscal do Reclamante, isto no cumprimento do disposto no número 3 do artigo 192º do CPPT.
K. Pelo que, não podia a douta Sentença sob escrutínio decidir como decidiu, ao ter dado como não provada a citação das dívidas tributárias em questão na esfera do aqui Reclamante para os restantes PEFs, ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70, por não ter sido junto qualquer elemento probatório das efetivas citações, mormente, carta registada com aviso devidamente assinado pelo Reclamante.
L. Os Avisos de receção constam dos respetivos PEFs e só não estão assinados pelo Reclamante pelos motivos apostos nas vinhetas dos CTT.
M. E por tal facto foram efetuadas novas citações nos termos e para os efeitos determinados no número 8 do artigo 192º do CPPT.
N. Só podendo ser decidido pela efetiva citação pessoal dos PEFs, ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70, na esfera do Reclamante, na qualidade de Revertido.
O. Dos efeitos daquela em relação aos PEFs, ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70, nomeadamente quanto ao efeito instantâneo, como quanto ao efeito duradouro acompanhamos o teor do ponto 14. da informação do SF de 26.11.2021, cujo respetivo despacho de sancionamento tem data de 09.12.2021, ínsitos nos presentes autos com a referência 007992184, 21.01.2022, de pág. 42 a pág. 51 do SITAF.
P. Da mesma informação retira-se dos pontos 12. e 18. que os PEFs ...40, ...16, ...07 e ...48 foram declarados em falhas com data de 06.01.2017 e o PEF ...25 foi declarado em falhas com data de 05.01.2018. O que resultou no início do prazo de prescrição.
Q. Quanto ao PEF ...70 não foi declarado em falhas, pelo que o início do prazo de prescrição ainda não se iniciou.
R. Entende a FP, sempre com o devido respeito pelo doutamente decidido, que enferma a douta Sentença sob recurso de erro de julgamento da matéria de facto, por erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais relevantes para a boa decisão da causa e que resultam dos elementos tidos nos autos, em violação do disposto no número 4 do artigo 607º do CPC,
S. considerando, pois, que os invocados erros de julgamento conduziram a que o Tribunal a quo tomasse, a final, uma decisão contrária à que se impunha face aos elementos tidos nos autos, pelo que, deve a mesma ser revogada, relativamente aos PEFS, ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70 com as legais consequências.
Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência,
Deve ser revogada a douta Sentença recorrida, por erro de julgamento, com as legais consequências.”
****
O Recorrido contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
I. Iniciaram os presentes autos com Reclamação por falta de citação dos processos de reversão, prejudicando, essa falta de citação, a possibilidade de defesa do Reclamante.
II. A sentença não merece, por isso, qualquer censura, não existindo como resulta das Alegações de Recurso qualquer Erro de Julgamento.
III. A Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu à junção da documentação referente aos processos executivos em curso resultando evidente que o ali Reclamante não tomou conhecimento dos mesmos enquanto legal representante da responsável pelos mesmos e, igualmente não foi pessoalmente citado da reversão enquanto responsável subsidiário.
IV. Os parcos avisos juntos, referentes aos processos executivos, não permitem aferir o conhecimento pessoal dos mesmos pelo verdadeiro interessado, impedindo, assim, a sua defesa, ou seja, colocando em crise o direito fundamental do revertido ao acesso ao direito e à justiça e à tutela jurisdicional efetiva (que têm consagração no art. 18.º, 20.º e 268.º, n.º 4, todos da CRP) e dos princípios da confiança (art. 2.º da CRP) e da boa fé (arts. 6.º-A e 59.º, n.º 2 da LGT)
V. Aqui chegados, importa perceber que a Autoridade Tributária e Aduaneira confessa ter conhecimento que a citação remetida fora recebida por terceira pessoa, conformando-se com o seu desfecho e da possibilidade de a mesma nunca chegar ao verdadeiro interessado, como ocorreu.
VI. Além disso, não procedeu ainda como se impunha ao envio de nova comunicação postal para cumprimento do disposto no artigo 233.º do CPC, advertindo das consequências da citação poder ocorrer por notificação a terceira pessoa.
VII. Dito isto, a citação pessoal não ocorreu, assim como não ocorreu o envio de comunicação posterior, o que resulta evidente da falta de prova documental junta pela AT.
VIII. Tal como Acórdão do TCA Sul, processo n.º 1119/18.7BESNT disponível em www.dgsi.pt “(...) a diligência em causa não se consumou. É que «[a] citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender» (artigo 219.º/1, do CPC e 35.º/2, do CPPT). Ou seja, ocorreu a falta de citação do executado, por preterição das formalidades legais relativas à citação pessoal e recurso não justificado à citação em pessoa diversa do citando (artigo 188.º/a) e b)), do CPC).”
IX. No caso, a falta de materialidade do ato preclude a indagação sobre se o destinatário do ato da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato por facto que lhe seja imputável (artigo 188.º/e), do CPC). Pelo que, ao julgar procedente a reclamação, determinando a anulação de todos os atos subsequentes à diligência questionada inclusive, a sentença recorrida não enferma de erro ou vício, pelo que deve ser confirmada.
Assim se fazendo a tão acostumada Justiça.”

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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer, suscitando questão prévia no sentido de ser colmatada a falta processual da notificação do Ministério Público na primeira instância para apresentar alegações nos termos do disposto no artigo 282.º, n.º 3 do CPPT.
Sucede que tal notificação ocorreu em 02/11/2023, conforme fls. 197 do processo virtual, pelo que nada se determina relativamente a esta questão.
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Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e, consequentemente, de direito, ao eliminar da ordem jurídica o acto reclamado que não reconheceu a prescrição das dívidas exequendas, relativamente aos processos de execução fiscal n.ºs ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ....70.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
IV. IV.1 De facto
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
“A) Correm junto da Autoridade Tributária e Aduaneira contra a Reclamante, os Processos de Execução Fiscal PEF: ...40 (IVA 2008/06T), ...16 (IVA 2008/09T), ...25 (IVA 2009), ...07 (IVA 2009 e 2010), ...48 (IVA 2011/12T), ...73 (IRC 2011) e ...70 (IRC 2012), no valor global de EUR 30.358,56 - (cfr. acordo, fls. 47/50 do processo SITAF e Processo de Execução Fiscal em apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
B) Em 18/08/2021, o Reclamante, no âmbito dos processos referidos em A), apresentou requerimento junto da Autoridade Tributária e Aduaneira do qual consta, entre o mais, o seguinte: “(...)
«AA», Ni£ ...93, com domicílio na Calçada ..., ..., ... ..., Vem exercer o direito de audição relativamente à divulgação das listas de devedores tributários na internet, (...)
Estão, assim prescritos, vários processos e respetivos apensos, cujo reconhecimento se requer junto de V. Exa., num total de €30.358,56 (trinta mil trezentos e cinquenta e oito euros e cinquenta e seis cêntimos):
...402008-12-132.861,87 €
...162008-12-192.077,87 €
...252010-11-282.375,92€
...072012-05-0822.544,42 €
...482012-10-17498,48 €
Total 30.358,56 €

Não ocorreu, ainda, qualquer causa interruptiva da prescrição.
Termos em que, deve ser reconhecida a prescrição dos processos supra mencionados e corrigido o montante legalmente em dívida junto da administração tributária. Não devendo o contribuinte ser incluído na lista de devedores tributários, pelos elementos supra referidos. (...)” – (Cfr. fls. 42/44 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
C) Em 26/11/2021, no âmbito do requerimento referido em B), foi proferida Informação pela Autoridade Tributária e Aduaneira da qual consta, entre o mais, o seguinte: “(...)
4. Os processos executivos ...40, ...16, ...25, ...07 e ...48 referem-se a dividas de IVA relativas aos exercícios de 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012.
5. De acordo com o artigo referido, a contagem do prazo prescricional faz-se a partir do inicio do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a partir de 01/01/2009, 01/0112010, 01/01/2011, 01/01/2012 e 01/01/2013.
6. Os processos n° ...73 e ...70 referem-se a dívidas do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas relativas aos exercícios de 2011 e 2012, pelo que a contagem do prazo prescricional faz-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, respetivamente, a partir de 31/12/2011 e 31/12/2012.
7. No entanto. temos de atender ao estipulado no artigo 49° da LGT, que prevê as causas de suspensão ou interrupção da prescrição: (...)
8. Aplicando o referido normativo legal a este caso concreto, e analisando os autos, verifica-se uma causa de interrupção do prazo de prescrição: a citação do executado em:
- 2010-...40
- 2013-...16
- 2013-...25
- 2013-...07
- 2013-...48
- 2014-...73
- 2014-...70
inutilizando o prazo decorrido até então.
9. Além disso, existiram várias causas de suspensão do processo executivo: a suspensão decretada pela Lei n.º 1-A/2020. de 19 de março de 2020 (que no artigo 7°, n° 1, 2 e 3, que decretou a suspensão da contagem dos prazos de prescrição), de 12 de março a 30 de junho de 2020 (111 dias), assim como a Lei n.° 4-B/2021, de 1 de fevereiro, que no seu artigo 6.°-B (Prazos e diligências) estabelece o seguinte: (...)
10. No caso Lei n.° 4-8/2021, de 1 de fevereiro, o período de suspensão ocorreu de 22/01/2021 a 06/04/2021 (75 dias). Também existe uma outra causa de suspensão dos processos executivos
- a Suspensão por Pagamento em Prestações - Oficioso, que decorreu entre 2021-02-27 e 2021-07-26 (processo n° ...25, ...07, ...48), entre 2021-02-24 e 2021-07-30 (processo n° ...73) e entre 2021-02-27 e 2021-07-30 (processo n° ...51 e ...70).
11 Nestes termos, o início do prazo da contagem da prescrição iniciou-se naquelas datas (citação), mas aos oito anos acresceu o prazo em que estes processos executivos estiveram suspensos. (...)
Assim, os processos analisados não se encontram prescritos. (...)” – (Cfr. fls. 46/51 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
D) Em 09/12/2021, foi proferido despacho de indeferimento ao peticionado em B), pelo Chefe do Serviço de Finanças ..., do qual consta, entre o mais, o seguinte: “vista a informação prestada e de acordo com o parecer emitido, com os mesmos fundamentos que aqui dou por integralmente reproduzidos (...)” – (Cfr. fls. 46/51 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
E) O despacho referido em C) foi notificado ao Reclamante – (cfr. acordo e fls. 45 do processo SITAF e Processo de Execução Fiscal em apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
F) Em 23/12/2021, o Reclamante remeteu, via correio eletrónico, à Autoridade Tributária e Aduaneira a petição inicial da presente reclamação - cfr. fls. 1 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
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Factos Não Provados
Com relevância para a decisão da causa, dos autos não resultou provado:
1) No âmbito dos Processo de Execução Fiscal referidos em A) dos factos provados, verifica-se a citação do executado em:
- 2010-...40
- 2013-...16
- 2013-...25
- 2013-...07
- 2013-...48
- 2014-...73
- 2014-...70
2) Também existe uma outra causa de suspensão dos processos executivos - a Suspensão por Pagamento em Prestações - Oficioso, que decorreu entre 2021-02-27 e 2021-07-26 (processo n° ...25, ...07, ...48), entre 2021-02-24 e 2021-07-30­ (processo n° ...73) e entre 2021-02-27 e 2021-07­30 (processo n° ...51 e ...70).
*
Motivação
O Tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos juntos aos autos e no Processo de Execução Fiscal apenso, conforme indicado em cada uma das alíneas do probatório – Cfr. art.º 74.º, 76.º da Lei Geral Tributária (mormente os n.ºs 1 e 4) conjugado com o art.º 115, n.ºs 2 e 4 do Código de Processo e Procedimento Tributário.
Relativamente aos factos considerados não provados, os mesmos resultam da consequência de nenhuma prova ter sido junta pela Autoridade Tributária e Aduaneira no sentido de demonstrar o alegado.
Na verdade, não foi junto qualquer elemento probatório para prova das efetivas citações, mormente, carta registada com aviso de receção devidamente assinado pelo Reclamante (sendo que no Processo de Execução Fiscal ...73 apesar de constar do AR de citação uma assinatura de terceiro, não fora satisfeito pela Autoridade Tributária e Aduaneira o ónus probatório que sobre si impende no que à citação pessoal efetuada em pessoa diversa do citando concerne – cfr art.º 233.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 2.º, al. e) do Código de Processo e Procedimento Tributário).”

2. O Direito

A Recorrente, Fazenda Pública, defende que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento da matéria de facto, por erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais relevantes para a boa decisão da causa e que resultam dos elementos tidos nos autos, em violação do disposto no n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC).
Partindo dos óbices identificados quanto à falta de citação, matéria julgada não provada no ponto 1 da decisão da matéria de facto, a Recorrente sustenta que esses invocados erros de julgamento conduziram a que o Tribunal a quo tomasse, a final, uma decisão contrária à que se impunha face aos elementos tidos nos autos, pelo que, deve a mesma ser revogada, relativamente aos processos de execução fiscal (PEF) n.ºs ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70, por as respectivas dívidas exequendas não se mostrarem prescritas.
Constata-se, portanto, que a Recorrente se conformou com o julgamento quanto ao PEF n.º ...73, pelo que, nessa parte não recorrida, a decisão transitou em julgado – cfr. conclusões H), I), J) e S) das alegações do recurso.
Pelo exposto, são objecto do presente recurso os restantes PEFs n.ºs ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70, visados no despacho reclamado.
No respeitante a estas dívidas exequendas, a sentença recorrida afirma, expressamente, não ter sido junto qualquer elemento probatório para prova das efectivas citações, mormente, carta registada com aviso de recepção devidamente assinado pelo reclamante, aqui Recorrido, concluindo, consequentemente, mostrarem-se as mesmas prescritas.
Conseguimos detectar o alcance de se ter levado tal matéria aos factos não provados (ponto 1), dado que, efectivamente, no concernente a estes PEFs n.ºs ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70 nada consta de entre os elementos carreados para os autos pelo órgão de execução fiscal (nem cartas ou ofícios contendo a citação, nem registos dos mesmos nos CTT, Correios, nem respectivos avisos de recepção ou quaisquer outros documentos susceptíveis de comprovar a realização da citação do Recorrido para esses processos executivos).
Neste contexto, não era facilmente apreensível a alegação da Recorrente quanto à existência de cartas e de avisos de recepção: “(…) Assim sendo e pela consulta da cópia dos restantes PEFs verifica-se a existência de cópias dos Avisos de Receção devolvidos e também das repetições da citação com a aposição da data em que as aludidas citações foram depositadas por parte dos CTT no recetáculo da morada que corresponde ao domicílio fiscal do Reclamante, isto no cumprimento do disposto no número 3 do artigo 192º do CPPT.
Pelo que, não podia a douta Sentença sob escrutínio decidir como decidiu, ao ter dado como não provada a citação das dívidas tributárias em questão na esfera do aqui Reclamante para os restantes PEFs, ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70, por não ter sido junto qualquer elemento probatório das efetivas citações, mormente, carta registada com aviso devidamente assinado pelo Reclamante.
Os Avisos de receção constam dos respetivos PEFs e só não estão assinados pelo Reclamante pelos motivos apostos nas vinhetas dos CTT.
E por tal facto foram efetuadas novas citações nos termos e para os efeitos determinados no número 8 do artigo 192º do CPPT.
Só podendo ser decidido pela efetiva citação pessoal dos PEFs, ...40, ...16, ...25, ...07, ...48 e ...70, na esfera do Reclamante, na qualidade de Revertido. (…)”
Somente a informação oficial, prestada nos termos do disposto no artigo 277.º do CPPT, trouxe a pista que faltava, consubstanciada na menção à existência de processos executivos apensos: Os processos de execução fiscal foram instaurados nas seguintes datas: ...40 instaurado em 13/12/2008, ...16 instaurado em 2008/12/19, ...13 instaurado em 17/11/2012 e apensos (...25 instaurado em 28/11/2010, ...07 instaurado em 28/05/2012 e ...48 instaurado em 17/10/2012), ...73 instaurado em 12/02/2013 e ...70 instaurado em 12/11/2013.
De facto, não existe nos autos qualquer elemento demonstrativo de eventual decisão de apensação de PEFs, sendo certo que quanto ao PEF n.º ...13 (que, aparentemente, nem estará em apreço na presente reclamação) existe uma menção a “n.º processo principal”. Percebe-se, agora, que os PEFs n.ºs ...25, ...07 e ...48 (em causa nos presentes autos) estarão apensos ao PEF n.º ...13 e que, quanto a este último, existem, com efeito, alguns elementos ínsitos no processo, com base nos quais a Recorrente defende ter sido cumprido o disposto no artigo 192.º, n.º 3 do CPPT.
Observamos que foram, ainda, carreados elementos relativos aos processos n.º ...51 e n.º ...34, mas nada na petição de reclamação indica que a mesma visasse também tais PEFs ou que os mesmos tivessem sido objecto de análise no despacho reclamado. Por outro lado, o órgão de execução fiscal não facultou quaisquer elementos reveladores ou qualquer informação oficial no sentido de que os restantes PEFs (n.ºs ...70, ...40 e ...16) estivessem apensos àqueles. Salientamos que o recurso em apreciação é vago e genérico, sem concretizar para cada PEF os documentos que terão passado despercebidos ao tribunal “a quo” em cada situação. Por estes motivos, impõe-se concluir, na linha do decidido no tribunal de primeiro conhecimento, que inexiste qualquer documento que comprove a chamada do aqui Recorrido para os PEFs n.ºs ...70, ...40 e ...16.
Acolhendo a referência na informação prestada nos termos do artigo 277.º do CPPT e considerando que os factos ínsitos no processo de execução fiscal são de conhecimento oficioso (cfr. artigo 412.º do CPC), analisaremos os elementos carreados relativos ao PEF n.º ...13, dado que os outros PEFs em causa a ele estarão apensos – n.ºs ...25, ...07 e ...48.
Antes de mais, importa referir que, de acordo com o artigo 35.º, n.º 2 do CPPT, «A citação é o acto destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada.».
O regime da citação, no âmbito de um processo de execução fiscal, encontra-se previsto nos artigos 189.º e seguintes do CPPT.
Para o que nos interessa, importa salientar que o artigo 191.º, n.º 3, alínea b) do CPPT refere que na efectivação da responsabilidade solidária e subsidiária, a citação é pessoal, sendo que tal normativo é aqui aplicável uma vez que o ora Recorrido foi chamado à execução na qualidade de responsável subsidiário pela dívida exequenda.
Por sua vez, dispõe o artigo 192.º do CPPT que:
«1 – As citações pessoais são efetivadas nos termos do Código de Processo Civil, (…).
2 – No caso de a citação pessoal ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção e este vier devolvido ou não vier assinado o respectivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal, nos termos do artigo 43.º, é repetida a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte.
3 – A citação considera-se efectuada, nos termos do artigo anterior, na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação da alteração do seu domicílio ou sede. (…)».
Tendo por base este pano de fundo, vejamos, então, o que resulta do acervo documental coligido para os presentes autos.
Em primeiro lugar, sobressai que o ofício “citação reversão” que foi emitido não tem aposta qualquer data, nem qualquer menção a eventual registo de carta com aviso de recepção que tenha sido realizado, por referência ao respectivo número de registo, pelo que, dificilmente, será possível relacioná-lo, com a segurança e certeza exigíveis, com o aviso de recepção devolvido que consta nas páginas seguintes – cfr. fls. 3, 4 e 5/55 do processo virtual.
Porém, dando de barato que o mesmo foi, de facto, expedido sob registo postal com aviso de recepção, com vista a citar o destinatário, na qualidade de responsável subsidiário, relativamente à dívida exequenda, pretendendo-se dar cumprimento ao estipulado nos artigos 191.º, n.º 3, alínea b) e 192.º, n.º 1 e 2, todos do CPPT e nos artigos 225.º, n.º 2, alínea b) e 227.º, n.º 1 do CPC (correspondentes aos artigos 233.º, n.º 2, alínea b) e 235.º, n.º 1 do anterior CPC, aplicáveis à data); sucede que, no caso versado, a citação foi frustrada, pois, tal ofício de citação terá sido devolvido ao remetente [o que também não se mostra seguro, dado inexistir qualquer “marca do dia” (carimbo) aposta pela Estação dos Correios que devolve o aviso], pese embora tenha sido deixado aviso para levantamento em 17/06/2013.
Perante o sucedido e comprovando-se que a morada para a qual foi remetido o ofício de citação corresponde ao domicílio fiscal do citando, impunha-se ao órgão da execução fiscal repetir a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção ao citando, com a advertência de que a citação considerar-se-á efectuada na data que vier a ser certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação da alteração do seu domicílio ou sede, conforme sobressai do estatuído no artigo 192.º, n.º 2 e 3 do CPPT.
Acontece que o órgão da execução fiscal não deu cabal cumprimento ao determinado no artigo 192.º, n.º 2 e 3 do CPPT.
Com efeito, o órgão da execução fiscal não fez constar no novo ofício a cominação em que o citando incorria, concretamente, que se presumiria a sua citação na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data.
Na verdade, constata-se que, provavelmente, nem sequer existiu um novo ofício de citação, pois o ofício que terá sido reexpedido mostra-se igual ao primeiro, também sem ostentar qualquer data ou aposto de qualquer número de registo (impossibilitando a conexão com o aviso de recepção seguinte). Apenas o tal aviso de recepção seguinte indica “citação via postal 2.ª tentativa” – cfr. fls. 6 e 7/55 do SITAF.
Tal actuação não corresponde, na íntegra, àquela que deveria ter sido levada a cabo, à luz do artigo 192.º, n.º 2 e 3 do CPPT, mas poderia ser aceitável se não fosse a relevante particularidade do regime da repetição da citação: o de na segunda citação dever constar a cominação de que a citação considerar-se-á efectuada na data que vier a ser certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados.
Sem essa cominação expressa no teor desse 2.º ofício de citação não se pode concluir que tenha sido dado integral cumprimento ao estatuído no artigo 192.º, n.º 2 e 3 do CPPT, pelo que não poderá operar a presunção de citação aí prevista.
Não obstante o que se disse a respeito do PEF n.º ...34 (que não é objecto dos presentes autos), a verdade é que o procedimento adoptado mostra-se em tudo idêntico – cfr. 31, 32, 35 a 45/55 do processo virtual.
Pelo exposto, é ostensivo que os elementos genericamente indicados pela Recorrente não são susceptíveis, com a segurança e certeza exigíveis, de alterar o julgamento realizado em primeira instância quanto ao ponto 1 dos factos não provados.
Na medida em que a decisão da matéria de facto se mantém, estabilizada, não tendo sido alterada mediante transferência dos factos não provados vertidos no ponto 1 para os factos provados, não se vislumbra a existência do facto interruptivo (citação) em relação ao Recorrido, com efeito duradouro, indicado na decisão reclamada, pelo que é forçoso concluir pela anulação do despacho reclamado, como o efectuou o tribunal recorrido, ficando prejudicado o conhecimento ou improcedendo, necessariamente, as conclusões O) a S) das alegações do recurso.
Nesta conformidade, restará negar provimento ao recurso e manter na ordem jurídica a sentença recorrida.

Conclusões/Sumário

I - De acordo com o n.º 2 do artigo 192.º do CPPT, no caso de a citação pessoal ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção e este vier devolvido ou não vier assinado o respetivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal, então há que convocar a 2ª parte do mencionado n.º 2, repetindo-se a citação, através do envio de nova carta registada com aviso de recepção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte.
II - A cominação em causa refere-se ao disposto no n.º 3 do artigo 192.º do CPPT, ou seja, a advertência relativa a considerar-se a citação efectuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados.
III – No caso em apreciação, tal advertência não ocorreu, pelo que não pode operar a presunção de citação.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.

Porto, 20 de Dezembro de 2023

Ana Patrocínio
Cláudia Almeida
Maria do Rosário Pais