Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00731/20.9BELSB
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/19/2021
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:CONCURSO; MAIS BAIXO PREÇO; CAPACIDADE TÉCNICA; EXCLUSÃO; ESCLARECIMENTOS; ARTIGO 56º, N.º2, DO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS;
ALÍNEA A) DO ARTIGO N.º2 DO ARTIGO 70º DO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS.
Sumário:1. A exclusão de uma proposta reduz a concorrência. Logo as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas.

2. Este mínimo necessário traduz-se precisamente em apenas permitir a exclusão nos casos expressos previstos na lei (tipificação dos casos de exclusão) e interpretar estas normas de forma restritiva e não extensiva e, menos ainda, analógica.

3. No caso de concurso em que o critério de adjudicação é o do mais baixo preço, apenas o preço constitui atributo da proposta pois é o único “aspecto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos” (artigo 56º, n.º2, do Código dos Contratos Públicos).

4. Não havendo omissão da comprovação da capacidade técnica de uma empresa concorrente, após a prestação de esclarecimentos pedidos, não se justifica a exclusão da sua proposta, ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo n.º2 do artigo 70º do Código dos Contratos Públicos.

5. Ainda que as faltas detectadas – não relativas ao preço - fossem relevantes para o controle da execução do contrato, não seriam omissões insupríveis e relevantes para efeitos de exclusão da proposta.

6. Isto porque podiam – e deviam – ser pedidos esclarecimentos sem que daí resultasse necessariamente qualquer alteração ou reformulação da proposta no seu todo. E sendo certo que, inequivocamente no caso concreto, apenas o preço era atributo das propostas, submetido à concorrência, e não a forma de execução.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:C., S.A.
Recorrido 1:MS., E.M e Outras
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

C., S.A. veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal, de 07.12.2020, pela qual foi julgada improcedente a acção intentada pela ora Recorrente contra a MS., E.M e em que foram indicadas como Contra-Interessadas a O. S.A. e a E., S.A., para anulação da decisão de adjudicação a estas do contrato de “Prestação de serviços para manutenção e reparação do parque de máquinas dos equipamentos desportivos da MS, EM, SA.”, constante da informação n.º 8/20-DTM de 18 de Fevereiro 2020”.

Invocou para tanto, em síntese, que: ao ter entendido que a admissão dos esclarecimentos não violava o princípio da comparabilidade das propostas, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, tendo interpretado incorretamente o disposto nos artigos 70º, nº 2, alíneas a) e b) e 72º, nºs 2 e 3 do Código dos Contratos Públicos; viola também os nºs 1 a 3 do artigo 73º, artigo 124º, artigo 148º todos do Código dos Contratos Públicos, sendo, por conseguinte, nulo todo o processado posteriormente, isto é, Relatório Final a adjudicação e Contrato que venha a ser celebrado.

Termina pedindo: a) A declaração de nulidade parcial do procedimento do concurso público nacional nº 34/17-DTM “Para Aquisição de Serviços de Manutenção e Reparação do Parque de Máquinas dos Equipamentos Desportivos Geridos pela MS”, das peças que o compõem após a reclamação apresentada pela Autora no seguimento do direito de audiência prévia, por violação dos artigos 73º e 148º ambos do Código dos Contratos Públicos. b) A anulação decisão de adjudicação constante da Informação nº 08/20DTM datada de 18 de Fevereiro de 2020 às Contra-Interessadas. c) Subsidiariamente, caso o contrato venha a ser celebrado com a Ré na pendencia do processo, a anulação do mesmo.

Apenas a Empresa Municipal recorrida contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
*
Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
*

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

A. A situação em discussão no presente recurso pode resumir-se, de forma breve, nos seguintes aspetos:

XXIII. Por anúncio publicado Diário da República, nº 17, de 24 de Janeiro, de 2020, a Ré abriu o procedimento n.º 718/2020 para os efeitos da alínea b) nº 1 do artigo 20º do Código dos Contratos Públicos, para nos termos do artigo 115º e seguintes do mesmo Código apresentar proposta para Concurso Público Nacional de "PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PARA MANUTENÇÃO E REPARAÇÃO DO PARQUE DE MÁQUINAS DOS EQUIPAMENTOS DESPORTIVOS DA MS, EM, S.A.".

XXIV. A decisão de contratar foi tomada em 23 de Janeiro de 2020, pelo Conselho de Administração da MS, como resulta do ponto 3.1 programa de concurso.

XXV. O procedimento é composto ainda por caderno de encargos.

XXVI. Este procedimento que tem por objeto a prestação de serviços para manutenção e reparação do parque de máquinas dos equipamentos desportivos do Município de (...)/MS como resulta do ponto 1.1 do programa de concurso.

XXVII. A fundamentação do procedimento em causa assenta na alínea b) do artigo 20º do Código dos Contratos Públicos (crf. ponto 4.1 do programa de concurso).

XXVIII. O órgão competente para prestar esclarecimentos será o Júri do Concurso, cuja composição foi aprovada em reunião de Conselho de Administração da Ré e de acordo com o Código dos Contratos Públicos (crf. ponto 5.1 do programa de concurso).

XXIX. A Autora apresentou a sua proposta em 5 de Fevereiro de 2020.

XXX. As Contra-Interessadas, por sua vez, apresentaram a proposta em 5 de Fevereiro de 2020.

XXXI. A entidade adjudicante notificou às concorrentes do Relatório Preliminar em 6 de Fevereiro de 2020, conferindo-se o prazo até 13 de Fevereiro de 2020 para se pronunciar.

XXXII. Do Relatório Preliminar proferido pela MS esta ordenou as Contra-Interessadas em primeiro lugar com o valor da proposta em 179.985,36 € e a C. em segundo lugar com o valor da proposta em180.405,76 €.

XXXIII. Em 13 de Fevereiro de 2020, a C. apresentou nos termos do artigo 147º do Código dos Contratos Públicos a reclamação sobre o Relatório Preliminar.

XXXIV. A MS em 11 de Março e 2020 notificou a C. do Relatório Final.

XXXV. Consigna-se na alínea a) do ponto 12.3 do Programa de Concurso que a “Experiência profissional na prestação de serviços de idêntica natureza em Piscinas, comprovada por declarações abonatórias de pelo menos dois clientes a quem o concorrente tenha prestado tais serviços nos últimos dois anos, de natureza idêntica ou superior em valor e âmbito”.

XXXVI. A declaração abonatória da C,, não tem valor nem data da prestação para comprovar o solicitado.

XXXVII- A declaração abonatória do Hotel (...), está em língua espanhola sem tradução e a sua validade vai até 2013.

XXXVIII. A declaração abonatória do O., está em língua espanhola sem tradução, reporta-se somente a instalação e não contempla a manutenção, sendo a mesma datada de 2009.

XXXIX. A declaração abonatória da Câmara de Marco Canaveses, de 5 Janeiro de 2020, refere-se a um contrato assinado em 19 Dezembro de 2019, logo sem experiência efetiva nos dois últimos anos, para um período de 12 meses no valor de 186.030,59 €, inferior ao valor possível do atual contrato de 25.000/ano ou 50.000€ 24 meses.

LX. Prevê-se na alínea c) do ponto 12.3 do Programa de Concurso a necessidade da existência no quadro da empresa, comprovada, de técnicos com as seguintes habilitações profissionais e especialidades:

“I. 2 Técnicos de instalação e manutenção “TIM2”.
II. 2 Técnicos de instalação e manutenção “TIM3”.
III. 2 Técnicos certificados para gases fluorados com efeitos de estufa, conforme DL 145/2017, de 30/11 e subsequentes atualizações.
IV. 1 Técnico com o grau de licenciatura em Engenharia Mecânica ou Eletrotécnica.
V. 1 Técnico Habilitado para gases com efeito ODP, conforme D.L. 152/2005 alterado pelo D.L. 35/2008.
VI. 2 Mecânicos de Aparelhos a gás com licença válida emitida pela DGEG.
VII. 1 Técnico de Gás com licença válida emitida pela DGEG.

d) Possuir certificado de implementação de Sistema de Gestão da Qualidade nos termos da norma NP EN ISO 9001;2015.
e) Possuir certificado de implementação de Sistema de Gestão de Saúde e Segurança no Trabalho, de acordo com o disposto na NP 4397;2008/OHSAS 18001;2007 / NP 4397:2008.
f) O concorrente estar acreditado para montagem e reparação de redes e equipamentos a gás na DGEG”.

XLI. O técnico L. referenciado na proposta da concorrente em causa não faz parte dos quadros das empresas, na medida em que o seu curriculum vitae indica entrada na O. em Fevereiro de 2020, logo não ser possível encontrar o seu nome na lista da segurança social disponibilizada a dezembro de 2019.

XLII. Não é apresentada a autorização provisória para o exercício da atividade, da DGEG, como Instalador de aparelhos de gás do Técnico F..

XLIII. Resulta da leitura do Relatório Final, a entidade adjudicante notificou a MS para que esta se pronunciasse sobre o conteúdo da reclamação apresentada pela C., conferindo-lhe a faculdade de proceder à junção de novos elementos à sua proposta ratificando, desse modo, a omissão que lhe havia sido apontada pela Autora.

XLIV. O Júri não só não notificou a C. da junção pela MS de novos elementos à proposta - constituindo qualquer decisão sobre os mesmos uma surpresa para a Autora – como também os documentos solicitados não visam suprimir irregularidades não formais constantes da proposta da Contra-Interessada.

B. As questões em discussão no processo, incidem (I) sobre se sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, ao considerar que a Entidade Demandada poderia ou não ter pedido esclarecimentos - na fase após a apreciação das propostas – (crf. nº 3 do artigo 73º Código dos Contratos Públicos) não constituindo tal conduta uma alteração de proposta por parte da Contrainteressada, violadora dos princípios gerais dos procedimentos adjudicatórios; (II) omissão de notificação à Recorrente da entrega pela Contra-Interessada de novos elementos no procedimento adjudicatório.

1. Da aplicabilidade do nº 3 do artigo 73º do Código dos Contratos Públicos.

C. Preceitua o artigo 72º Código dos Contratos Públicos que o júri pode pedir aos concorrentes, esclarecimentos sobre as propostas apresentadas (nº 1), estabelecendo o nº 2 que: “Os esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º.”

D. A proposta inicial deve manter-se tal como foi apresentada a concurso, devendo os esclarecimentos ser limitados a tornar claro o que já se incluía, embora de forma ambígua, na proposta inicial.

E. O esclarecimento que se traduza na reformulação ou complementação da proposta é ilícito.

F. Ora, no caso presente os esclarecimentos não se limitaram a tornar claros elementos que já constavam da proposta.

G. De facto, a proposta da concorrente O., S.A/ E., S.A, nos termos em que foi apresentada violava as alíneas a) e c) do ponto 12.3 do Programa de Concurso e os nº 1º do artigo 58º conjugado com o nº 2 do artigo 169º ambos do Código dos Contratos Públicos, pelo que, não tem os requisitos previstos na alínea c) do nº 1 do artigo 57º do Código dos Contratos Públicos, devendo nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 70º também do Código dos Contratos Públicos ser a proposta excluída.

H. Ao prestar-se os esclarecimentos nos termos em que foram realizados, estão a aditar-se elementos que não constavam da proposta inicial.

I. Ao ter entendido que a admissão dos esclarecimentos não violava o princípio da comparabilidade das propostas, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, tendo interpretado incorretamente o disposto nos artigos 70º, nº 2, alíneas a) e b) e 72º, nºs 2 e 3 do Código dos Contratos Públicos (Veja-se nesse sentido Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proc nº 07196/11, de 17 Março de 2011).

J. O que está em causa no preceituado nº 3 do artigo 72º do Código dos Contratos Públicos trata-se de formalidades cuja observância não tem de ter lugar quando a lei exige que as mesmas sejam observadas, podendo ainda ser cumpridas em momento posterior, sem que tal ponha em causa os objetivos para que foram estabelecidas.

K. Ou seja, pode-se concluir que o nº 3 do artigo 72º não poderá ser utilizado quando esteja em causa qualquer irregularidade para a qua a lei ou o programa culmine a sanção da exclusão da proposta.

L. A omissão na proposta dos documentos que foram posteriormente juntos pelas Contra-Interessadas, violava as alíneas a) e c) do ponto 12.3 do Programa de Concurso e os nº 1º do artigo 58º conjugado com o nº 2 do artigo 169º ambos do Código dos Contratos Públicos, já que, não tinha a mesma os requisitos previstos na alínea c) do nº 1 do artigo 57º do Código dos Contratos Públicos, devendo nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 70º também do Código dos Contratos Públicos ser excluída.

2. Da não notificação da junção dos documentos à C..

M. No caso em apreço, o Júri não só não notificou a C., em sede de procedimento de concurso, da junção pelas Contra-Interessadas de novos elementos à proposta constituindo qualquer decisão sobre os mesmos uma surpresa para a Recorrente.

N. Logo, sendo outro o entendimento da sentença recorrida, esta, viola os nºs 1 a 3 do artigo 73º, artigo 124º, artigo 148º todos do Código dos Contratos Públicos, sendo, por conseguinte, nulo todo o processado posteriormente, isto é, Relatório Final a Adjudicação e Contrato que venha a ser celebrado.

O. Refira-se, por fim, que, de acordo com o disposto no artigo 283.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, “[o]s contratos são anuláveis se tiverem sido anulados ou se forem anuláveis os actos procedimentais em que tenha assentado a sua celebração.

P. Nesta medida, e caso a Entidade Demandada venha a celebrar, na pendência do presente processo, o contrato deve o Tribunal proceder à sua anulação, porquanto a decisão de não adjudicação (i. e. o ato procedimental em que assentou a sua celebração) padece de manifesta ilegalidade por violação dos procedimentos já explicitados.

Termos em que se requer a V. Exas. se dignem admitir e dar provimento ao presente recurso, revogando a sentença recorrida e, em sua substituição, se digne:

a) A declaração de nulidade parcial do procedimento do concurso público nacional nº 34/17-DTM “Para Aquisição de Serviços de Manutenção e Reparação do Parque de Máquinas dos Equipamentos Desportivos Geridos pela MS”, das peças que o compõem após a reclamação apresentada pela Autora no seguimento do direito de audiência prévia, por violação dos artigos 73º e 148º ambos do Código dos Contratos Públicos.

b) A anulação decisão de adjudicação constante da Informação nº 08/20DTM datada de 18 de Fevereiro de 2020 às Contra-Interessadas.

c) Subsidiariamente, caso o contrato venha a ser celebrado com a Ré na pendencia do processo, a anulação do mesmo.
*

II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

A). Em 13.01.2020, pelos serviços da Ré foi elaborada a informação n.º 03/20-DTM, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzida e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)
1 – Considerando que:
- Terminando a 31/03/2020 o contrato celebrado por dois anos entre a MS, EM e a empresa C. , SA. referente à prestação de serviços de manutenção referida em epígrafe, torna-se necessário proceder à celebração de um novo contrato, para o mesmo efeito,
- o valor base global da despesas previsto para a realização do novo contrato, cuja duração será de 2 anos, é de cerca de 50.000€ para manutenção preventiva por série de preços e de 140.000,00€ para trabalhos de manutenção curativa à percentagem, valores sem IVA.
(…)
2 – Solicita-se aprovação do convite e caderno de encargos que se anexam, nos termos alínea a) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 40.º.
(…)”,
a qual foi objecto de deliberação de aprovação, por unanimidade, no dia 23.01.2020 – cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 1».

B). Em 24.01.2020, no Diário da República IIª Série, n.º 17 – Parte L, foi publicado o “Anúncio de Procedimento n.º 718/2020”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)
2 – OBJETO DO CONTRATO
Designação do contrato: Prestação de serviços de reparação e manutenção do parque dos equipamentos desportivos da MS.
Descrição sucinta do objeto do contrato: Prestação de serviços de reparação e manutenção do parque de máquinas dos equipamentos desportivos da MS.
(…)
Valor do preço base do procedimento: 190000,00 EUR
(…)”
- cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial.

C). O teor do “caderno de encargos” que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)
1. Identificação do Concurso
1.1. Objecto do Concurso
O objecto do concurso de “Prestação de Serviços para Manutenção e Reparação do Parque de Máquinas dos Equipamentos Desportivos do Município de (...)/ MS” consta das condições Técnicas do Caderno de Encargos. (…)”.
- cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 4».

D). O teor do “programa de concurso” que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”.
- cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 5».

E). Em 05.02.2020, a Autora apresentou a sua proposta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 7 e 9».

F). Em 05.02.2020, a Contrainteressada apresentou a sua proposta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e da qual consta, além do mais, o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

(…)
NÚMERO 12, PONTO 3. ALÍNEA a) DO PROGRAMA DO CONCURSO
EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL
DECLARAÇÃO
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

(…)
NÚMERO 12, PONTO 3. ALÍNEA c) DO PROGRAMA DO CONCURSO TÉCNICOS
(…)
LISTA DOS TÉCNICOS
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”.
- cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 8 e 10».

G). Com data de 06.02.2020, o júri do procedimento concursal em causa elaborou “relatório preliminar”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”.
- cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 11».

H). Em 13.02.2020, a Autora exerceu o seu direito de audiência prévia, em requerimento, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 12 e 13».

I). Com data de 13.02.2020, o júri do procedimento concursal em causa remeteu à Contrainteressada, uma mensagem, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

“(…)
- cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 14».

J). Em 18.02.2020, em resposta à mensagem remetida – constantes do ponto antecedente – a Contrainteressada apresentou os documentos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

“(…)
Direção Geral de Energia e Geologia
(…)
F.o
14 Jan 2020 00348
(…)
Junto se envia a autorização a título provisório n.º 6614-Prov/IA/2020, devendo estar sempre munido do original da mesma e apresenta-la sempre que para tal lhe for solicitado, no âmbito da sua atividade profissional.
Mais se informa, que a presente autorização é válida até à emissão do cartão de identificação previsto na alínea i) do art.º 42º da Lei n.º 15/2015 de 16 de Fevereiro.
(…)”;
“(…)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”.
- cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 14».

K). Em 18.02.2020, o júri do procedimento concursal em causa elaborou “relatório final”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
“(…)
- cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 16».

L). Em 10.03.2020, sobre o relatório identificado no ponto antecedente recaiu despacho de aprovação do conselho de administração da Ré, o que foi notificado à Autora em 11.03.2020.
– cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 17 e 18».

M). Com data de 20.03.2020, a Ré e a Contrainteressada subscreveram documento denominado “Contrato de Prestação de Serviços para a Manutenção e Reparação do Parque de Máquinas dos Equipamentos Desportivos da MS, E.M., SA.”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. processo administrativo - suporte físico - «separador 20”.

N). Em 06.04.2020, a Autora apresentou em juízo, através do «SITAF», a petição inicial relativa à presente lide – cfr. fls. 1 dos autos (suporte físico).
*
III - Enquadramento jurídico.

Da sentença, ressalta o seguinte enquadramento jurídico:

“Nos presentes autos, a questão decidenda acima enunciada traduz-se em saber se, com base nos factos considerados provados, se verificam ou não, as invalidades que a Autora assaca ao acto de adjudicação, na medida em que, defende, esta proposta deveria ter sido objecto de exclusão.

A Autora clama que a proposta da Contrainteressada deveria ter sido excluída porque as declarações abonatórias apresentadas não cumprem as exigências constantes do ponto 12.3 alínea a) do Programa de Concurso, violando o disposto no artigo 58º n.1, artigo 169º n.2, artigo 57º alínea c), todos do CCP.

Em concreto, refere que atento o teor do relatório preliminar e analisando a proposta da contrainteressada, em sede audiência prévia, invocou que: (i) a declaração da C, “não tem valor nem data da prestação para comprovar o solicitado”; (ii) a declaração do Hotel (...) está “em língua espanhola sem tradução e a sua validade vai até 2013;” (iii) a declaração da O. “em língua espanhola sem tradução, reporta-se somente a instalação e não contempla a manutenção, sendo a mesma datada de 2009”; e, (iv) a declaração da Câmara de Marco de Canaveses, refere-se a contrato celebrado em 19.12.2019, para um período de 12 meses, no valor de 186.030,59€ “inferior ao valor possível do atual contrato de 25.000/ano ou 50.000€ 24 meses.” [cfr. pontos F), G) e H) do probatório]; e, também, que o técnico L., identificado na proposta da Contrainteressada, não faz parte dos quadros da mesma, nem foi apresentada a autorização provisória da DGEG para o exercício da actividade do trabalhador F.o.

Perante tal pronúncia a Ré optou por solicitar esclarecimentos à Contrainteressada, a qual em resposta apresentou uma declaração por si subscrita, indicando o valor e a data da prestação do serviço relativamente à declaração da C,, o comprovativo de admissão, nos seus quadros, do trabalhador L. em data anterior à apresentação da proposta, e a autorização provisória emitida pela DGEG ao técnico Francisco Bonito [cfr. pontos I) e J) do probatório].

Ora, perante esta tramitação, a Autora alega que, ao abrigo do disposto no artigo 72º n.3 do CCP, a Ré não poderia ter pedido esclarecimentos - na fase de apreciação das propostas - e, que estes, no seu entender, constituem uma alteração de proposta por parte da Contrainteressada, violadora dos princípios gerais dos procedimentos adjudicatórios, porquanto o programa de procedimento prevê a exclusão da proposta. Mais invoca que não foi notificada da junção dos novos elementos à proposta.

Conclui, pela violação do disposto no artigo 72º n.ºs 1 a 3, artigos 124º e 148º, todos do CCP.

A Ré em sede de contestação defendeu que a proposta da Contrainteressada preenchia ab initio os requisitos enunciados pela cláusula 12.3 alínea a) do Programa de Procedimento, motivo pelo qual não foi alvo de exclusão. Refere que, o facto de terem sido apresentadas duas declarações em espanhol não constituiu factor de exclusão, nem de valorização, porquanto a exigência formulada era de duas declarações – e estas foram apresentadas, e por outro lado, o único factor submetido à concorrência era o preço, como resulta da cláusula 14º do mesmo Programa de Concurso [cfr. ponto D) do probatório]. No mais, defende que foram devidamente comprovadas as qualidades e competências dos trabalhadores em causa e a sua integração nos quadros da empresa, em momento anterior ao da apresentação da proposta. Clamou, igualmente, pela tempestividade e admissibilidade dos esclarecimentos solicitados.

Já a Contrainteressada na sua contestação defendeu que a sua proposta apresentava mais declarações abonatórias do que as exigidas, que as declarações apresentadas em espanhol estavam acompanhadas da respectiva tradução, e que, portanto, estava cumprido o requisito enunciado na cláusula n.º 12.3 alínea a) do programa de procedimento quanto à apresentação de duas declarações abonatórias. Acrescenta, no que se refere aos trabalhadores identificados que o L. integrava os quadros da empresa desde 03.03.2020 – motivo pelo qual não constava da lista da segurança social de 2019, constando da lista de Fevereiro de 2020; e, no tocante ao trabalhador Francisco Bonito afirma que este possui certificado de instalador de gás, estando, por isso, observado o requisito enunciado na cláusula n.º 12.3 alínea c) do programa de procedimento.

Apreciemos.

Dispõe o Programa de Concurso [cfr. ponto D) do probatório] na cláusula 12º:

“12. Admissão de Concorrentes
12.1 (…)
12.2 (…)
12.3 Capacidade Técnica
Para avaliação da sua capacidade técnicas os concorrentes devem cumprir cumulativamente, os seguintes critérios mínimos de capacidade técnica, sob pena de exclusão:
a) Experiência profissional na prestação de serviços de idêntica natureza em Piscinas, comprovada por declarações abonatórias de pelo menos dois clientes a quem o concorrente tenha prestado tais serviços nos últimos dois anos, de natureza idêntica ou superior em valor e âmbito;
b) (…)
c) Existência no quadro da empresa, comprovada, de técnicos com as seguintes habilitações profissionais e especialidades:
i. 2 técnicos de instalação e manutenção “TIM2”.
ii. 2 técnicos de instalação e manutenção “TIM3”.
iii. 2 técnicos certificados para gases fluorados com efeitos de estufa, conforme DL 145/2017, de 30/11 e subsequentes atualizações.
iv. 1 técnico com o grau de licenciatura em Engenharia Mecânica ou Eletrotécnica.
v. 1 técnico habilitado para gases com efeito ODP, conforme DL 152/2005 alterado pelo DL 35/2008.
vi. 2 Mecânicos de aparelhos de gás com licença válida emitida pela DGEG. vii. 1 técnico de gás com licença válida emitida pela DGEG. (…)
(…).”

Assim, importa aferir se a proposta da Contrainteressada deveria, ou não, ter sido excluída por força do disposto na cláusula 12.3 alínea a) do Programa de Concurso.

Com efeito, da cláusula em causa resulta que, sob pena de exclusão, os concorrentes, além do mais, têm que apresentar declarações abonatórias, de dois clientes, a quem tenham prestado serviços nos últimos dois anos - sem exigência de período mínimo de duração -, de natureza idêntica ou de valor e âmbito superior.

Ora, analisando a proposta da Contrainteressada à luz das exigências formuladas na dita cláusula, o Tribunal não vislumbra causa de exclusão: - da factualidade assente resulta que a Contrainteressada apresentou quatro declarações abonatórias, quando o programa de concurso apenas exigia duas [cfr. ponto F) do probatório]. Se excluirmos, tal como o fez o júri do concurso, as declarações relativas ao Hotel (...) e a O., porque se reportam a período prévio aos dois anos anteriores estipulados na identificada cláusula do Programa de Concurso – e não por causa da língua em que foram apresentadas, uma vez que do processo administrativo constam na proposta da Contrainteressada as referidas declarações acompanhadas da sua tradução – ficamos ainda com duas declarações abonatórias, de dois clientes diferentes.

Alega a Autora que a declaração da C, não indica o valor, nem a data da prestação. É certo que não contém o valor, mas preenche o outro requisito alternativo que é a natureza idêntica do serviço que ali se encontra descrito; é patente, porém, que não tem aposta a data da prestação de serviço.

Todavia, julga o Tribunal que em face dos termos em que a referida cláusula está redigida tal não constitui uma causa de exclusão; causa de exclusão seria a ausência absoluta de tal declaração ou a apresentação de uma declaração que não satisfizesse qualquer dos requisitos enunciados.

No tocante às demais invalidades invocadas pela Autora e referentes à existência de técnicos, no quadro da empresa, com as habilitações técnicas necessárias, a verdade é que da proposta da Autora constam devidamente identificados os técnicos que satisfazem os requisitos enunciados na cláusula 12.3 alínea c) do programa de concurso [cfr. ponto F) do probatório, maxime quadro ilustrativo «Lista dos técnicos»], estando, por isso, cumprida a exigência ali formulada, a qual resultava demonstrada pelo curriculum vitae do L. que declarava exercer funções na Contrainteressada desde Fevereiro 2020, e bem assim do curriculum vitae do Francisco Bonito e documentação anexa, do qual consta um certificado de formação profissional relativo à frequência, com aproveitamento, em 03.07.2019, de curso de formação profissional de instalador de aparelhos de gás [cfr. ponto F) do probatório, maxime fls. 821 e ss. dos autos «SITAF»].

Assim, tendo a Ré admitido a proposta por não vislumbrar qualquer causa de exclusão, foi só na sequência do exercício do direito de audiência prévia por parte da Autora que a Ré entendeu ser necessário clarificar os elementos que a Autora defendia que deveriam ter conduzido à exclusão da proposta da Contrainteressada.

Vejamos.

Com relevo para a apreciação da questão sub iudice, o artigo 72º do CCP, sob a epígrafe “Esclarecimentos e suprimentos de propostas e candidaturas”, prevê que:

“1 - O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas.

2 - Os esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º

3 - O júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento.

4 - O júri procede à retificação oficiosa de erros de escrita ou de cálculo contidos nas candidaturas ou propostas, desde que seja evidente para qualquer destinatário a existência do erro e os termos em que o mesmo deve ser corrigido.

5 - Os pedidos do júri formulados nos termos dos n.os 1 e 3, bem como as respetivas respostas, devem ser disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo todos os candidatos e concorrentes ser imediatamente notificados desse facto.”.

Ora, sobre o âmbito de aplicação deste normativo, pronunciou-se recentemente o Tribunal Central Administrativo do Sul, afirmando que:

“(…) dando-se como assente que não se verificou a falta de apresentação de documentos obrigatórios (cfr. termos e fundamentos referentes à alínea d) supra do presente acórdão), o que está em causa nos presentes autos é saber se a formalidade constante do artigo 6.3.2. do Programa do Concurso pode ser alcançada por outra via, e se, nesse caso, ou mesmo que assim não fosse, deveria a entidade adjudicante ter lançado mão do disposto no art. 72.º, n.º 3, do CCP, por forma a permitir a regularização da proposta.

Atentemos, desde já, no disposto no art. 72.º, n.º 3, do CCP, que, sob a epígrafe “Esclarecimentos e suprimento de propostas e candidaturas “, diz o seguinte:

«1 – (…)
2 – (…)
3 - O júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento.(…)» (sublinhados nossos).

Atente-se ainda que, nesta abertura à regularização de propostas, de que é exemplo a disposição legal que antecede, e, muito impressivamente, o disposto no n.º 3, supra transcrito, deverão ter-se em conta os princípios do favor participationis, em benefício do concorrente, e da máxima abertura à concorrência, em benefício da entidade adjudicante (3).

E que, no caso em apreço, a concorrente, ora Recorrente J......, era a que tinha apresentado o mais baixo preço, sendo esse o único critério de adjudicação (cfr. artigo 13.1 do Programa do Concurso – facto n.º 3 da matéria de facto considerada provada na sentença recorrida - e n.º 11 do Anúncio do mesmo - factos n.º 1 e 2 da matéria de facto considerada provada na sentença recorrida -, e documentos juntos com o p.a.).

Imperioso se torna, pois, não perder de vista a visão de equilíbrio que resulta das Diretivas, designadamente, da 2014/24/UE, e, bem assim, das recentes alterações ao CCP(4).

Nestes termos, e face a todo o exposto, retomemos o caso em apreço.

O tribunal a quo dispensou a produção de prova, tendo considerado que os autos continham já todos os elementos – documentais - necessários para decidir, e, tal como a entidade adjudicante, entendeu que não se aplicava o art. 72.º, n.º 3, do CCP ao caso em apreço, decisão que não acompanhamos.

Vejamos porquê.

Abrir a possibilidade de a então concorrente, ora Recorrente J......, detalhar que meios estariam afetos a que espécie de trabalho – detalhe este que, como sabemos, não podia resultar numa alteração do conteúdo da proposta apresentada pela J...... – confirmando que na proposta apresentada – sendo os meios os mesmos e mantendo-se a sua afetação temporal – era possível a indexação a cada espécie de trabalho, embora tenham sido apresentados por outra forma, é, claramente, uma situação que se enquadra no artigo 72.°, n.° 3, do CCP, visto que estaria em causa apenas detalhar, esclarecer ou clarificar a proposta apresentada pela J.......

Acresce que, como se disse supra, tendo dado como assente que não se verificou a falta de apresentação de documentos obrigatórios (cfr. termos e fundamentos referentes à alínea d) supra do presente acórdão), e sendo essencial para a entidade adjudicante, a desagregação dos elementos constantes da proposta da Recorrente J......, pois foi essa falta que motivou a exclusão da proposta, ficou por fazer, embora tenha sido alegada tal possibilidade, pela Recorrente, em sede de audiência prévia (cfr. facto n.º 7 e fundamentação supra), a demonstração de que o cumprimento da formalidade constante do artigo 6.3.2. do Programa do Concurso não podia ser alcançado por outra via, sendo que, para isso, no caso em apreço, deveria a entidade adjudicante ter lançado mão do disposto no art. 72.º, n.º 3, do CCP, por forma a permitir a regularização da proposta(5),(6) e(7).

Se, na sequência de tal regularização, a entidade adjudicante, ora Recorrida, chegasse à conclusão que a concorrente, ora Recorrente, J......, havia modificado a proposta inicialmente apresentada – designadamente, aumentando ou diminuindo meios inicialmente apresentados, por referência às concretas espécies de trabalhos ou alterando a sua afetação temporal - só então poderia exclui-la, pois esta regularização tem como único limite a impossibilidade de tais detalhes ou clarificações implicarem uma modificação da proposta(8), em virtude de assim se poder afetar a concorrência e a igualdade de tratamento entre todos os concorrentes (cfr. art. 72.º, n.º 3, in fine, do CCP).

À luz dos critérios expostos, tratando-se, como entendemos que se trata, de uma irregularidade formal não essencial, e carecendo a mesma de suprimento, face à decisão de exclusão proferida perante a proposta não suprida, deve seguir-se o procedimento de regularização previsto no art. 72.º, n.º 3, do CCP(9).

Pedro Costa Gonçalves, insiste, aliás, nesta ideia: as propostas objeto de regularização são aquelas que padecem de uma irregularidade para a qual a lei (art. 146.º, n.º2) ou o programa do procedimento, determinam a exclusão(10).

Como diz a Recorrida, clarificar ou esclarecer é apenas tornar explícito o que não está claro (cfr. alínea u) das conclusões das contra-alegações de recurso). Isto, sem embargo do disposto no artigo 6.3.4. do Programa do Concurso (cfr. facto n.º 3 da matéria de facto – ao dispor que 6.3.4 O não cumprimento do disposto nos números anteriores é causa de exclusão da proposta -, pois, face a todo o exposto, a liberdade e autonomia contratual têm de ceder perante normas imperativas, sendo que a única interpretação conforme a lei, in casu, exige o cumprimento prévio do disposto no já citado n.º 3 do art. 72.º do CCP, antes de se tomar a decisão de excluir o concorrente(11).
(…)”
– cfr. Acórdão proferido em 27.02.2020, no âmbito do Processo n.º 219/19.0BEFUN.

Em comentário a este normativo, PEDRO COSTA GONÇALVES escreveu que:
“(…)
Os esclarecimentos visam proceder à clarificação ou explicitação da proposta, dos seus termos ou condições ou atributos; segundo um critério objetivo, a clarificação tem de encontrar uma correspondência no texto ou nos elementos que constituem a proposta.

A regulamentação constante do n.º 2 do artigo 72.º - cuja redação se mantém nos mesmos termos desde a versão originária do CCP – define um princípio de relevância condicionada dos esclarecimentos prestados. Na verdade como ali se indica, os esclarecimentos só farão parte integrante das propostas (só serão relevantes) se não contrariarem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterarem ou completarem os respectivos atributos, nem visarem suprir omissões que determinariam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70º. (…).

Precisamente no sentido da proibição de alteração da proposta, decorre do n.º2 do artigo 72º que os esclarecimentos não podem contrariar os elementos constantes dos documentos que constituem as propostas, nem alterar ou completar os respectivos atributos, assim como não podem visar suprir omissões que determinam a exclusão das propostas nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70º. Esclarecer é clarificar: não é, nem pode ter o efeito de completar ou de modificar a proposta, designadamente a sua substância (atributos, termos e condições). (…).” [p. 875 a 878]. E, adiante, no que à regularização da proposta concerne, faz a seguinte síntese: “(…) deve entender-se que a regularização de propostas abrange todas as propostas com irregularidades formais não essenciais, mas que padecem de irregularidades que, não sendo supridas, conduzem à exclusão. De resto, o sentido da referência legal à “carência de suprimento” reside precisamente em referir que, apesar de se tratar de irregularidades não essenciais, tem, ainda assim, de haver lugar a suprimento. E tem de haver lugar a suprimento, sob pena de exclusão da proposta irregular. (…).

A exposição anterior conduz-nos às seguintes conclusões:

a) as propostas com irregularidades substanciais, de fundo, ou com irregularidades orgânicas não são passíveis de regularização;

b) as propostas com irregularidades formais essenciais ou insanáveis - porque o respetivo suprimento envolveria a vulneração dos princípios da transparência ou da igualdade de tratamento – também não são passíveis de regularização;

c) as propostas com irregularidades formais não essenciais, ou seja, irregularidades causadas pela preterição de formalidades não essenciais, quando não careçam de suprimento não são passíveis de regularização, por inutilidade; nesse caso não se produz o efeito da irregularidade (teoria da degradação das formalidades essenciais);

d) admitidas ao processo de regularização são as propostas com irregularidades formais não essenciais (sanáveis), que careçam de suprimento, sob pena de exclusão, nos termos da lei ou das peças do procedimento;

e) pode ainda admitir-se a mobilização do processo de regularização no caso das propostas com irregularidades que resultam da preterição de exigências feitas por lei ou pelas peças do procedimento, sem se associar a essa preterição a exclusão da proposta; estas irregularidades “não carecem de suprimento” como um meio de evitar a exclusão (uma vez que a exclusão não está prevista), mas também não parece que o júri esteja proibido de solicitar o suprimento. (…)”.
– vd. «Direito dos Contratos Públicos», 4ª Ed., Almedina, 2020, p. 891 e ss.

Já abordando, especificamente, o momento em que estes podem ocorrer, o mesmo Autor afirma que:

“(…)
Em regra, o incidente não deve ter lugar depois da fase de análise e de avaliação, por ex., no momento da audiência prévia. Não obstante, pode suceder que o concorrente se pronuncie no momento da audiência contra a proposta da sua exclusão, baseada numa irregularidade que o júri qualificou como essencial, mas que o concorrente considera não essencial. Pois bem, no caso de o júri aceitar a bondade da pronúncia, nada impede que o concorrente seja convidado a suprir a irregularidade neste momento, evitando assim a pártica de um ato ilegal.
(…)”.
– cfr. ob. cit., p. 893.

Por sua vez, também quanto à tempestividade de tal pedido de esclarecimentos, o autor PEDRO SÁNCHEZ, diz que:

“(…)Podendo tais esclarecimentos revelar-se decisivos para uma correcta formulação das decisões pelo júri, não deve este coibir-se de solicitar todas as informações de que carece a todo o tempo e pelo número de vezes que considere necessárias. Não existe, por isso, qualquer obstáculo ou inconveniente a que tais esclarecimentos sejam pedidos – ainda que por mais do que uma vez – mesmo após a elaboração do relatório preliminar, como meio de confirmar ou infirmar as observações que algum dos concorrentes tenha realizado em sede de audiência prévia.
(…)”
- vd. «Direito da Contratação Pública», Volume II, AAFDL Editora, 2020, p. 191.

Assim, volvendo ao caso concreto, o Tribunal julga que não está em causa a não apresentação de um documento cuja ausência determinaria a exclusão da proposta da Contrainteressada, mas sim a demonstração de qualidades que são exigidas pelo programa de procedimento, que têm de existir previamente à apresentação da proposta. Estamos, pois, em face de uma irregularidade / formalidade não essencial, mas que em virtude das peças do procedimento carece de suprimento, sob pena de exclusão, e como tal é susceptível de ser regularizada, ao abrigo do disposto no artigo 72º n.3 do CCP.

Foi, pois, o que ocorreu.

Em face das dúvidas suscitadas pela A. em sede de audiência prévia, o júri do procedimento, solicitou, como é seu dever, os esclarecimentos da Contrainteressada com vista à sanação das irregularidades apontadas pela A..

E, fê-lo, tempestivamente, já que acolheu a pronúncia da A. e considerou necessários tais esclarecimentos, com vista a confirmar ou infirmar as alegações da A. ali contidas.

Ora, perante tal pedido de esclarecimentos, a Contrainteressada cumpriu.

Isto é, esclareceu a data da prestação do serviço que motivou a declaração abonatória da C,; juntou aos autos documento comprovativo da inscrição na Segurança Social do trabalhador L. em data anterior à apresentação da proposta; e, bem assim, juntou a autorização provisória emitida pela DGEG ao técnico Francisco Bonito [cfr. ponto J). do probatório], sem que, saliente-se, haja alterado, modificado ou completado a substância da proposta que apresentou.

Do exposto, resulta, pois, terem sido sanadas as irregularidades formais não essenciais, apontadas pela A..

E, sendo assim, improcede a sua alegação a este respeito.

No que tange à alegação da Autora de que não foi notificada do pedido de esclarecimentos remetido à Contrainteressada, nem mesmo da resposta que esta apresentou, não resulta da factualidade assente que esta notificação haja sido realizada, o que constitui, portanto, uma violação do disposto no artigo 72º n.5 do CCP.

Esta exigência de notificação tem a ver com a garantia da transparência em todo o procedimento concursal. Contudo, a ausência desta notificação, e consequentemente da transparência que a mesma visa assegurar, acaba por ser ultrapassada e satisfeita, respectivamente, com a notificação do relatório final, onde estão descritos os esclarecimentos pedidos e prestados, e anexos os documentos apresentados.

Com efeito, entende o Tribunal que a ausência de tal notificação à Autora não contende com a validade intrínseca do acto, mas meramente com a sua eficácia, constituindo irregularidade que ficou sanada com a notificação do relatório final [cfr. pontos K) e L) do probatório].

Destarte, improcede, por isso a alegação da Autora a este respeito.

Por fim, uma breve nota para salientar que, considerando que a alegação da Autora no tocante à “violação dos princípios gerais dos procedimentos adjudicatórios” se estriba num juízo conclusivo sem qualquer consubstanciação fáctica e concretizada, o Tribunal julga que esta não está suficientemente concretizada de modo a reclamar uma apreciação e um juízo autónomo.

Em suma, perante enquadramento legal espraiado e a factualidade apurada, o Tribunal julga improcedente a alegação da Autora no tocante à alegação de que o procedimento que culminou com o acto de adjudicação ora impugnado viola o disposto nos artigos 58º, 70º n.2 alínea a), 72º n.1 a 3, 124º e 148º, todos do CCP, pelo que não padecendo o acto impugnado das invalidades imputadas, soçobram, sem mais, todos os pedidos formulados pela Autora.”

Em bom rigor a Recorrente não ataca a sentença recorrida limitando-se, em substância, a repetir os vícios invocados no articulado inicial relativamente ao procedimento concursal em apreço.

E a decisão mostra-se na verdade inatacável nos seus pontos essenciais.

As Contra-Interessadas apresentaram quatro declarações abonatórias, quando o programa de concurso apenas exigia duas.

Assim, excluindo as duas que se reportam a período anterior aos dois anos estipulados no programa de concurso (em castelhano, mas com tradução me português) ficam ainda com duas declarações abonatórias, de dois clientes diferentes, como esclareceu o Júri do concurso.

Quanto ao técnico L. em sede de esclarecimentos foi apresentado documento comprovativo de que trabalhava para as Contra-Interessadas no momento da apresentação da proposta, o que basta para se considerar não verificada a irregularidade apontada.

No que diz respeito ao técnico Francisco Bonito foi apresentado em sede de esclarecimentos o título provisório para o exercício da actividade em causa.

Reitera-se, de resto, aqui o entendimento sufragado no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 16.02.2018, no processo 1335/16.6 BRG (sumário), com o mesmo Relator:

“1. A exclusão de uma proposta reduz a concorrência. Logo as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas.

2. Este mínimo necessário traduz-se precisamente em apenas permitir a exclusão nos casos expressos previstos na lei (tipificação dos casos de exclusão) e interpretar estas normas de forma restritiva e não extensiva e, menos ainda, analógica.

3. No caso de concurso em que o critério de adjudicação é o do mais baixo preço, apenas o preço constitui atributo da proposta pois é o único “aspecto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos” (artigo 56º, n.º2, do Código dos Contratos Públicos) … .

4. Não havendo omissão de plano de trabalhos nem nenhum ponto do plano de trabalhos apresentado pela candidata excluída contrário aos instrumentos do concurso, não se justifica a exclusão desta proposta, ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo n.º2 do artigo 70º do Código dos Contratos Públicos.

5. Ainda que as faltas detectadas fossem relevantes para o controle da execução do contrato, não seriam omissões insupríveis e relevantes para efeitos de exclusão da proposta.

6. Isto porque podiam – e deviam – ser pedidos esclarecimentos … sem que daí resultasse qualquer alteração ou reformulação da proposta no seu todo. E sendo certo que, inequivocamente no caso concreto, apenas o preço era atributo das propostas, submetido à concorrência, e não a forma de execução”.

Termos em que se impõe manter na íntegra a decisão recorrida.
*

IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantém a decisão recorrida.
*
Custas pelo Recorrente.
*

Porto, 19.02.2021


Rogério Martins
Luís Garcia
Frederico Branco