Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00215/12.9BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/05/2020
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Barbara Tavares Teles
Descritores:INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO; CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL.
Sumário:1.O prazo de prescrição de dívidas por contribuições à segurança social interrompe-se “por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida”. (artigo 60º da Lei 4/2007, de 16 de Janeiro)

2. Constituem factos interruptivos do prazo de prescrição de dívidas à segurança social a notificação do potencial revertido para audiência prévia à reversão bem como a citação deste para a execução fiscal, sendo que este segundo facto interruptivo tem eficácia duradoura (artigo 327.º n.º 1 do Código Civil), mantendo-se o efeito interruptivo até ao termo do processo de execução fiscal.

3. O n.º 3 do artigo 49.º da LGT é aplicável aos factos interruptivos da prescrição das dívidas à segurança social que tenham não apenas efeito instantâneo, como também o efeito duradouro de impedir que o novo prazo comece a correr enquanto não findar o processo..*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Ministério Publico
Recorrido 1:M.
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I.RELATÓRIO
O Ministério Publico, inconformado com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou procedente a oposição à execução nº 0301200601161172 e apensos, instaurada pela secção de processo executivo de Braga do IGFSS.IP originariamente contra a sociedade “S., Lda.” e revertida contra M., aqui Recorrida, por dívidas de contribuições à Segurança Social relativas a meses diversos dos anos de 2002, 2004, 2005 e 2006, veio dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Termina as suas alegações formulando as seguintes conclusões:






A Recorrida não apresentou contra-alegações.
*
Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.
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Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
A questão suscitada pelo Recorrente consiste em apreciar se a sentença a quo errou ao considerar que, em relação à Recorrida, estão prescritas as dívidas exequendas relativas a Contribuições para a Segurança Social dos anos 2002, 2004, 2005 e 2006.
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II.FUNDAMENTAÇÃO
II. 1. Da Matéria de Facto
A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto:
“Com relevância para a decisão a proferir relativamente à questão em epígrafe consideram-se provados os seguintes factos:
A – Foi instaurada execução fiscal n.º 0301200601161172, contra “S., Lda” por dívidas provenientes de contribuições à Segurança Social relativas a Maio a Dezembro de 2002, Outubro a Dezembro de 2004, Junho, Julho e Dezembro de 2005
B – Em 24/09/2007 foi proferido projecto de decisão/reversão da execução mencionada em A.;
C – A citação da oponente, na qualidade de responsável subsidiária, para a execução mencionada em A., ocorreu em 13/12/2011;
D – Por ofício n.º 435/12, de 06/09/2012, foi solicitado à Entidade Exequente que informasse o Tribunal dos esclarecimentos pedidos sob os pontos 1 e 2 na douta promoção do Digno Magistrado do Ministério Público, os quais se passa a reproduzir:
“1 – Qual a data da notificação da oponente para exercer o direito de audição;
2 – Se antes dessa notificação foi praticada qualquer diligência administrativa com conhecimento do responsável pelo pagamento conducente à liquidação ou à cobrança da dívida (cfr. art. 49.º, n.º 2 da Lei 32/2002, de 20 de Dezembro), devendo juntar os elementos comprovativos.”
E – Dada a ausência de resposta ao ofício mencionado em D., foi remetido novo ofício, n.º 547/12, em 26/10/2012 a insistir pela resposta ao ofício mencionado na alínea imediatamente anterior;
F – Notificada do ofício vindo de referir a Entidade Exequente não só nada remeteu a este Tribunal, como nada disse.
*
Alicerçou-se a convicção do Tribunal no teor de vários documentos juntos aos autos.

FACTOS NÃO PROVADOS
A – A Notificação à oponente do despacho projecto de reversão proferido em 24/09/2007.
Não se provaram outros os factos relevantes para a questão prévia da prescrição.


DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
O Recorrente, nas suas alegações e nas conclusões, impugna os factos vertidos na sentença a quo, dizendo que:

[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Para tanto argumenta, em sede de alegações, que tais datas são relevantes para a contagem da prescrição das referidas dividas e refere ainda que as mesmas constam do processo executivo anexo.
Vejamos:
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.art.596º nº.1 e 607º, nºs.2 a 4, do CPC, e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.art.123º, nº.2, do CPPT).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida. Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual art.640º, nº.1, do CPC que dispõe o seguinte:
“Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa -se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)

Ora, após leitura atenta das alegações e das conclusões de recurso verifica-se que o ónus a que o Recorrente está obrigado se mostra cumprido. O Recorrente tem obrigatoriamente de especificar, nas alegações de recurso os pontos de facto que considera incorrectamente julgados. Deve fazê-lo enunciando quais os factos concretos constantes da PI que não foram dados como provados e que deveriam, em ser entender, ter sido. Isso está feito.
Assim sendo, importa aditar à matéria de facto assente o agora requerido, no entanto o facto dado como não provado terá de se manter uma vez que dos autos e do PEF, não consta a data em que a ora Recorrida foi notificada do despacho projecto de reversão.

Ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº 1, do CPC, corrige-se o ponto A do probatório nos seguintes termos:
A – Em 15/03/2006 foi instaurada execução fiscal n.º 0301200601161172, contra “S., Lda.”, por dívidas provenientes de contribuições à Segurança Social relativas a Maio a Dezembro de 2002, Outubro a Dezembro de 2004, Junho, Julho e Dezembro de 2005 e Janeiro de 2006, cf. fls. 3 a 8 do PEF junto aos autos.

Mais se aditam os seguintes factos:
G- Em 10/10/2007 deu entrada na delegação de Braga do IGFSS, o exercício do direito de audição sobre o projecto de reversão, por parte da oponente, cf. fls. 10 e 11 do PEF junto aos autos.
H- A fls. 1 do articulado apresentado pela Oponente e identificado em H), consta o seguinte:
“Direito de Audição que M.(…) vem exercer, nos termos dos arts. 23º nº 4 e 60º da Lei Geral Tributária (LGT) por força da notificação efectuada pelo oficio nº DC-NTM – 16050/2007, de 24 de Setembro de 2007”, cf. fls. 10 e 11 do PEF.
J - A sociedade executada originária, S., Lda., foi constituída em 15/05/2001, tendo como sócios e gerentes A. e M., sendo suficiente a intervenção de um deles como forma de obrigar a sociedade, cf. fls. 23 e 24 dos autos.
L- Pela Ap. 3/20060201 sob o título “Cessação de Membro de Órgão Social”, foi inscrita a renúncia à gerência da aqui recorrida M., cf. fls. 23 e 24 dos autos.
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Estabilizada a matéria de facto, avancemos para as questões que nos vêm colocadas.
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II.2. Do Direito
A aqui Recorrida, M., deduziu oposição à execução fiscal n.°0301200601161172 e apensos, instaurada originariamente contra a sociedade S., Lda., e contra si revertida para cobrança de contribuições para a Segurança Social de vários meses dos anos de 2002, 2004, 2005 e 2006.
Com base nos factos assentes nos autos a sentença sob analise julgou estarem prescritas todas as dívidas em causa nos autos relativamente à Recorrida, extinguindo a execução fiscal quanto a si.
Inconformado com o decidido veio o Ministério Publico junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga recorrer nos termos e fundamentos supra transcritos, dos quais se destaca o seguinte:



Face ao exposto, importa agora averiguar da prescrição das dívidas exequendas.
Posto isto vejamos.
Estamos em presença de dívidas à Segurança Social, relativas ao período temporal compreendido entre 2002, 2004, 2005 e 2006, pelo que importa ter presente, a entrada da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, (à data dos autos artigo 60º da Lei 4/2007, de 16 de Janeiro) que veio encurtar para 5 anos o prazo de prescrição das cotizações e contribuições devidas à segurança social.
Ora, o referido diploma prescreve no artigo 63º, o seguinte:
“Cobrança coerciva e prescrição das contribuições
1 - A cobrança coerciva dos valores relativos às cotizações e às contribuições é efectuada através de processo executivo e de secção de processos da segurança social.
2 - A obrigação de pagamento das cotizações e das contribuições prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
3 - A prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida. “

Comecemos pela divida mais recente.
Sendo a última dívida de Janeiro de 2006, não restam dúvidas que o fim do prazo de prescrição ocorreu em Fevereiro de 2011, no entanto, tal como se diz no nº 3 da referida norma, o prazo interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável conducente à cobrança.
Vejamos então se tal diligência ocorreu após Janeiro de 2006 e antes de Fevereiro de 2011.
Verifica-se dos factos assente que a Recorrida foi notificada para exercer o direito de audição por ofício de 24/09/2007, e que o exerceu em 10/10/2007, sendo que pelo menos nesta data ocorreu uma diligência administrativa realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento. Efectivamente não consta do probatório, nem foi trazido aos autos ainda que se tenha oficiado nesse sentido, a data da recepção da notificação para audição prévia, no entanto, constando do próprio articulado de audiência prévia entregue pela Recorrida em 10/10/2007, que lhe foi notificada por oficio de 24/09/2007 deve considerar que, pelo menos nessa data, que ocorreu tal diligência, como bem diz o Ministério Publico.
Interrompido o prazo de prescrição - no caso pela notificação para audição prévia- fica inutilizado todo prazo decorrido anteriormente - (art. 326.º, n.º 1 do Código Civil) sendo que o novo prazo de prescrição (in casu, 5 anos) começa novamente a correr.
Sobre a questão que ora nos ocupa já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo, entre outros, no douto Acórdão de 20.05.2015, lavrado in Rec nº01500/14. Porque concordamos integralmente com essa decisão e respectivos fundamentos, iremos aqui segui-la quase integralmente,
“Não é controvertido nos autos o prazo de prescrição aplicável às dívidas exequendas – 5 anos, por estarem em causa dívidas à segurança social, objecto de disciplina especial em relação às demais dívidas tributárias no que ao prazo e factos interruptivos da prescrição respeita (cfr. os n.ºs 1 e 2 do artigo 49.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, os n.ºs 3 e 4 do artigo 60.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro e os n.ºs 1 e 2 do artigo 187º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro) -, como não o é o facto de que este prazo estava em curso à data da notificação para audiência prévia e de que foi interrompido por tal diligência. (destaque nosso)
(…) Embora a questão não seja pacífica, mesmo na jurisprudência do STA (cfr. o Acórdão de 6 de Março de 2013, rec. n.º 01222/12 e a declaração de voto da Senhora Conselheira Dulce Neto nele aposto e bem assim o Acórdão deste STA de 29 de Janeiro de 2014, rec. n.º 1941/13), entendemos que a interrupção da prescrição decorrente da notificação para audiência prévia do revertido tem mero efeito instantâneo, de inutilizar para a prescrição o tempo até então decorrido e determinar o início de novo prazo, ex vi do disposto no artigo 326.º do Código Civil, não havendo suporte legal para que lhe seja atribuído igualmente o efeito duradouro de impedir que novo prazo comece a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo, pois que o Código Civil, subsidiariamente aplicável porquanto nem a lei tributária e a da segurança social dispõem especialmente sobre os efeitos da interrupção da prescrição, apenas prevê excepcionalmente tal efeito para os casos elencados no n.º 1 do seu artigo 327.º.
Assim, no caso dos autos, a notificação para audiência prévia do revertido determinou, na data em que este dela teve conhecimento, no mês Setembro de 2007, a inutilização para a prescrição do tempo anteriormente decorrido e o início da contagem de novo prazo de 5 anos.
O prazo de prescrição completar-se-ia, assim, em Maio de 2013, a não ser que tenha sido de novo interrompido ou suspenso, para o que importa determinar, quanto à interrupção da prescrição, da aplicabilidade às dívidas à segurança social do disposto no n.º 3 do artigo 49.º da LGT, na redacção da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e quanto à suspensão da prescrição, do disposto no n.º 4 do artigo 49.º da LGT.
Não se vê, contrariamente ao alegado pelo recorrido IGFSS, que não haja lugar à aplicação subsidiaria às dívidas da segurança social do disposto no n.º 3 do artigo 49.º da LGT, porquanto a especialidade do regime da prescrição das dívidas à segurança social respeita apenas ao prazo (5 anos e não 8), respectivo dies a quo (a data em que a obrigação deveria ter sido cumprida) e factos interruptivos (quaisquer diligências administrativas, realizadas com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducentes à liquidação ou à cobrança bem como, desde a entrada em vigor do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, a apresentação de requerimento de procedimento extrajudicial de conciliação), sendo de aplicar as regras da LGT no que não está especialmente regulado atenta a vocação desta Lei para regular a generalidade das relações jurídico-tributárias, afirmada no seu artigo 1.º (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária: Notas Práticas, 2.ª ed., 2010, p. 126).
Só assim não seria se o legislador, no domínio da Segurança Social, tivesse afastado a aplicação dessa norma, o que não fez - nem aquando da aprovação da Lei de Bases da Segurança Social (Lei n.º 4/2007), nem aquando da aprovação do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, cuja aprovação e entrada em vigor ocorreram já após a alteração ao artigo 49.º n.º 3 da LGT introduzida pela Lei n.º 53-A/2006 -, ou se o regime especial previsto para tais obrigações fosse incompatível com a aplicação da norma do n.º 3 do artigo 49.º da LGT, o que não é o caso porquanto o facto de no domínio da segurança social serem factos interruptivos da prescrição quaisquer diligências administrativas tendentes à liquidação ou à cobrança da dívida de que seja dado conhecimento ao responsável pelo pagamento apenas significa que o legislador se dispensou de, em concreto ,as enumerar, preferindo utilizar como técnica legislativa uma cláusula geral, ou, finalmente, se se descortinassem razões pelas quais se fosse levado a entender que o regime que vale para a generalidade das obrigações tributárias desde 1 de Janeiro de 2007 não deve valer igualmente para as dívidas à segurança social, o que também se não descortina.
Acresce que sempre entendeu a jurisprudência, que os n.ºs 2 e 3 do artigo 48.º da LGT, bem como o n.º 2 do artigo 49.º da LGT, revogado pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29 de Dezembro, são disposições subsidiariamente aplicáveis às dívidas à Segurança Social, em conformidade, aliás, com o âmbito de aplicação que a LGT define para si própria (cfr. o seu artigo 1.º) e com a natureza jurídica tributária das dívidas à segurança social – cfr., a título de exemplo, os Acórdãos deste STA de 12 de Abril de 2012, rec. n.º 115/12, de 9 de Maio de 2012, rec. n.º 282/12 e de 31 de Outubro de 2012, rec. n.º 761/12.
Entendemos, pois, que a norma do n.º 3 do artigo 49.º da LGT é aplicável à interrupção da prescrição das dívidas à segurança social, embora com adaptações, pois que enquanto os factos interruptivos da prescrição das dívidas tributárias elencados no n.º 1 do artigo 49.º da LGT têm todos eles efeito duradouro (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, op. cit., pp.57/58 e 69/72) , assim não é quanto aos factos interruptivos da prescrição das dívidas à segurança social, alguns dos quais - como a notificação para audiência prévia -, têm efeito meramente instantâneo, enquanto outros têm também efeito duradouro (como a citação para a execução, ex. vi do disposto no n.º 1 do artigo 327.º do Código Civil).
Daí que, por paridade de razões com o que se verifica para as demais dívidas tributárias, se deva entender que a limitação a uma das interrupções da prescrição das dívidas à segurança social apenas valha para as que têm o efeito duradouro de impedir que novo prazo comece a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.”
No caso dos autos, continuando a analise das dividas de 01/2006 a primeira interrupção da prescrição, ocorrida em 10/10/2007, teve efeito meramente instantâneo, sendo que inutilizou o prazo decorrido tendo dado inicio a um novo prazo de 5 anos que terminaria em 10/2012, sendo de atribuir efeito interruptivo duradouro da prescrição à citação para o processo de execução fiscal ocorrida no dia 13/12/2011 (cfr. Alínea C) do probatório), que ocorreu antes daquele novo prazo de prescrição de cinco anos se completar.
Com esta nova interrupção da prescrição (citação), inutilizou-se para a prescrição o tempo antes decorrido, não começando novo prazo de prescrição a correr enquanto não findar o processo executivo no qual aquela interrupção se verificou.
O mesmo se passa com as dividas de Outubro a Dezembro de 2004 e de Junho, Julho e Dezembro 2005, uma vez que primeira interrupção (audiência prévia) de 10/10/2007, aconteceu antes de decorridos os 5 anos.
Já quanto às dividas de Maio a Dezembro de 2002, os 5 anos terminariam:
- em Junho de 2007, as de Maio;
- Julho 2007, as de Junho;
- Agosto 2007, as de Julho;
- Setembro 2007, as de Agosto;
- Outubro de 2007, as de Setembro;
- Novembro 2007, as de Outubro;
- Dezembro 2007, as de Novembro;
- Janeiro 2008, as de Dezembro.
Assim sendo, apenas as dividas de Maio a Agosto de 2002 se podem considerar prescritas relativamente à Recorrida, por terem ocorrido os 5 anos antes da primeira diligência administrativa realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento.
Verifica-se assim que as dívidas exequendas relativas a Contribuições para a Segurança Social aqui em causa, não estão prescritas, à excepção das dividas de Maio a Agosto de 2002 que prescreveram relativamente à ora Recorrida, como responsável subsidiária.
Assim, resta julgar parcialmente procedente o recurso.

Do conhecimento em substituição
Aqui chegados, haverá, ainda, que indagar, de acordo com o artigo 665º do CPC, aplicável nos termos do artigo 2º, alínea e) do CPPT, no presente processo se poderá exercer a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, quanto à apreciação das restantes questões colocadas pela aqui Recorrido, na p.i.
Ou seja, se este Tribunal pode apreciar, da violação do artigo 60º da LGT gerando, em consequência, a invalidade da reversão e da ilegitimidade da recorrida para o pagamento do período de 12/2005, por renúncia à gerência em 18/05/2005.
Atendendo a que dos autos resultam todos os elementos necessários para o conhecimento em substituição e que as partes, após notificadas, nada disseram, importa conhecer os restantes fundamentos da oposição.
Para tanto a Recorrida na sua PI diz singelamente o seguinte:

Comecemos pela analise da preterição da formalidade essencial alegada com fundamento de que a Oponente/Recorrida não foi notificada para exercer o direito de audição ao projecto de reversão:
O artigo 60º da Lei Geral Tributária (LGT), nomeadamente nos seus nºs 1 a 3 determina que:
“1 - A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação;
b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;
c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;
d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
2- É dispensada a audição:

a)No caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe seja favorável;
b) No caso de a liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objectivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito. (…)“

O direito de audição de que gozam os contribuintes, consignado neste artigo 60ª da LGT constitui um direito constitucional aplicado ao procedimento tributário, enquanto corolário do princípio da participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações da Administração Pública que lhe digam respeito, visando assegurar uma tutela preventiva contra qualquer lesão dos seus direitos ou interesses, de acordo com o disposto no artigo 267º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Posto isto, vejamos então o que esta provado nos autos a este respeito.
Conforme consta da alínea G) e H) do probatório por nós aditado, verifica-se que que a Oponente, ora Recorrida, não só foi notificada para o exercício do direito de audição pelo ofício nº DCNTM 16050/2007, de 24 de Setembro de 2007, como exerceu esse direito em 10/10/2007, pelo que resta considerar, sem mais delongas, porque desnecessárias face à evidência da prova, que improcede o vicio de violação de lei invocado na PI.

Quanto à sua ilegitimidade para a reversão, verifica-se do teor da PI que a Recorrida nunca põe em causa a sua gerência de facto (ou falta dela) ou de direito, a não ser quando diz que a partir de 18/05/2005, data da renúncia à gerência, não pode ser responsabilizada pelas dívidas exequendas.
No processo vertente, a eventual responsabilidade subsidiária da Recorrida deve ser analisada à luz do regime previsto no artº.24 da LGT, diploma que entrou em vigor em 1/1/1999 levando em consideração o período temporal dos anos de 2004 a 2005 uma vez que as dividas aqui em causa são relativas a esse período temporal.
A responsabilidade do gerente pela violação das normas que impõem o cumprimento da obrigação fiscal radica no instituto da responsabilidade por facto ilícito assente em culpa funcional, isto é, em responsabilidade civil extracontratual. O estatuto do gerente/administrador advém-lhe por virtude da sua relação negocial com a sociedade, iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequente aceitação do mesmo, em virtude do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens da empresa (cfr.art.146, do CPCI; art.239, nº.2, do CPT; art.153, nº.2, do CPPT).
Analisemos agora os regimes que aqui nos importam e que estão consagrados nos art.24º da LGT
“Artigo. 24º Da LGT
Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”.


Aqui chegados, não pode o aplicador do direito esquecer que é pressuposto da responsabilidade subsidiária o exercício de facto da gerência, e quanto a este primeiro pressuposto da responsabilidade subsidiária resulta do teor da P.I., que não está em causa a gerência de facto ou de direito da Recorrida, mas apenas que esta, por força da renúncia à gerência, não pode ser responsabilizada pelas dívidas de 12/2005.
No entanto, e analisado o probatório, nomeadamente a alínea L), consta que a renúncia foi inscrita em 01/02/2006, em pelo que não colhe tal argumento da Recorrida, por não provado, considerando-se esta parte legítima para a execução.
Face ao exposto julga-se improcedente a oposição.
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III.DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Norte em conceder provimento ao recurso do M.P e, em consequência:
- Revogar a sentença recorrida na parte em que julgou extinta, por prescrição das dividas de Contribuições para Segurança Social de Setembro a Dezembro de 2002, Outubro a Dezembro de 2004, Junho, Julho e Dezembro de 2005, a execução fiscal instaurada contra M..
- E, em substituição, no mais, julgar improcedente a oposição, mantendo-se a execução fiscal contra a Recorrida.
Custas pela Recorrida, em ambas as instâncias, sem prejuízo da dispensa de pagamento de taxa de justiça devida em recurso.

Porto, 5 de março de 2020.


Barbara Tavares Teles
Paula Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares