Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01109/08.8BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/08/2024
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:IRC; DECLARAÇÃO DE INÍCIO DE ACTIVIDADE;
REGIME GERAL;
REGIME SIMPLIFICADO;
Sumário:
I. O regime simplificado, em vigor nos exercícios a que se reporta a situação dos autos – 2002/2003 - era aplicável aos sujeitos passivos (de IRC) residentes que exercessem, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrassem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentassem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 30 000 000$00 (149 639,37 €) e que não optassem pelo regime geral de determinação do lucro tributável (cf. nº1 do artigo 53º do CIRC).

II. No exercício do início da actividade, o enquadramento fazia-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade (cor. nº2 do artigo 53º do CIRC).

III. A opção pelo regime geral, a que se reportava o nº 1 do citado preceito, deveria ser formalizada na declaração de início de actividade ou na declaração de alterações referida nos artigos 110º e 111º do CIRC, até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime (cf. nº 7 do artigo 53º do CIRC)..
IV. Não tendo o contribuinte optado pelo regime normal de determinação do lucro tributável no início da sua actividade e não o tendo feito posteriormente ao abrigo da alínea b) do n°. 7 do art°. 53° do CIRC, desde que constatado, o volume total anual de proveitos era inferior a € 149.689,37, estava a AF obrigada ex lege a aplicar a esse exercício o regime simplificado, na determinação do lucro tributável, pois encontravam-se reunidos os pressupostos da sua aplicação e à AF porque vinculada à lei no exercício da sua actividade não restava outra solução.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. [SCom01...], Lda. (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 28.11.2016, que no âmbito de impugnação judicial por si deduzida contra o acto de indeferimento do recurso hierárquico relativo ao enquadramento no regime simplificado no exercício de 2003, a julgou improcedente, inconformada vêm dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«(...)
1 - O Douto Tribunal a quo na sua motivação de facto considerou que o litígio das partes se resume na opção pelo Regime Geral de Tributação a que aludem os factos l de 3.1 e 1 de 3.2.
2 - Ainda que a Impugnante não assinalou a opção pelo Regime Geral de Tributação (não assinalou o quadro 19 da dita declaração — facto 1 de 3.1).
3 - Salvo melhor entendimento o Tribunal a quo erra no seu julgamento pois considerou que uma coisa é o enquadramento no Regime Geral de Tributação por imposição legal, em resultado do facto do sujeito passivo ter estimado, na Declaração de Inicio de Atividade, um Volume de Negócios de €45.000,00E em 3 três meses de 2002, correspondente ao Volume de Negócios Anual de €180.000,00 e outra coisa é o enquadramento no Regime Geral por opção.
4 - Mais considerou que um sujeito passivo que deva ser enquadrado no Regime Geral por imposição legal (por ter ultrapassado o limite previsto no artigo 53.", n.º 1 do CIRC, de € 149.639,37 de Volume de Negócios Anual não pode optar por ser tributado de acordo com esse regime).
5 - Consideraram que a imposição legal é uma obrigação resultante da própria lei, sem margem de opção
6 - E que no caso a Recorrente foi enquadrada no Regime Geral (por imposição legal), e não "por opção" própria e voluntária.
7 - A opção deveria ter sido feita no quadro 19 da Declaração de Inicio.
8 - Temos por um lado que como refere a Fazenda Pública o campo destinado à opção pelo Regime Geral de tributação em sede de IRC é o campo 19 da declaração.
9 - Aliás, tal resulta expressamente quer da declaração quer da respectiva instrução de preenchimento.
10 - Por outro, a Impugnante preencheu o campo 6, assinalando o campo de Regime Geral, sendo que a respectiva instrução refere: assinale em sede de IRC o regime de tributação.
11 - Através da cópia da declaração de início de atividade, que consta de fls. 22 e ss., dos autos, cuja autenticidade se tem de considerar provada, constata-se que, efetivamente, a Impugnante assinalou o quadro 6, campo 1, referente ao Regime Geral de tributação.
12 - Atente-se que o campo 19 invocado pela FP refere o seguinte: reunindo os pressupostos de inclusão no Regime Simplificado de tributação previsto nos arts, 31º, do CIRS ou 46°-A do CIRC assinale (...)
13 - A tributação segundo o Regime Simplificado é facultativa, sendo colocada na disponibilidade do sujeito passivo a opção pelo Regime Geral de determinação do lucro tributável, de harmonia com o disposto no n.° 1 do artigo 53.° do Código do IRC. A opção feita na declaração de início de atividade pela aplicação do Regime Geral releva para os três exercícios seguintes (n.° 7 do referido artigo 530), ainda que esse regime já resultasse obrigatório em face do volume total anual de proveitos estimado na declaração inicial - cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 21.05.2008, proferido no recurso nº 10/08.
14 - E, então, havemos de convir que o Regime Simplificado de determinação do lucro tributável, previsto no artigo 53.° do Código do IRC, tem carácter facultativo e não obrigatório - sob pena de violação da disposição constitucional de que «a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real» (n.°2 do artigo 104.° da Constituição da República Portuguesa).
15 - De harmonia com o disposto na alínea a) do n.° 7, do artigo 53.0, do CIRC, na redação dada pelo DL n.° 198/2001, de 3 de Julho, «a opção pela aplicação do Regime Geral de determinação do lucro tributável deve ser formalizada pelos sujeitos passivos: a) Na declaração de início de atividade».
16 - E, por força do disposto no n.° 8, do mesmo artigo 53°, na redação da Lei n.° 109-B/2001, de 27 de Dezembro, «a opção referida no número anterior é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de a renovar pela forma prevista na alínea b) do número anterior».
17 - No que se refere ao preenchimento da declaração no caso em apreço, entendemos que o preenchimento do campo 6 revela a manifestação da opção efectuada pela Impugnante peio Regime Geral. Com efeito, o campo 19 seria fundamental no caso de a Recorrente reunir as condições para ser enquadrado no Regime Simplificado, caso em que o não preenchimento do campo 19 seria relevante.
18 - No caso em apreço, na medida em que a Recorrente não reunia as condições para ficar no Regime Simplificado, sendo obrigatoriamente incluído no Regime Geral o preenchimento do campo 6 é suficiente para se considerar que a Recorrente manifestou a sua opção por tal regime.
19 - O facto de o Impugnante no ano de 2002 ter obtido proveitos de €21.966,36, e conforme considerou o Tribunal a quo, aquele rendimento embora faturado apenas no mês de Dezembro de 2002 corresponde ao Rendimento Real efetivo obtido desde 28/10/2002 até 31/12/2002, isto é, em cerca de 3 meses.
20 - Pelo que o Volume de Negócios efetivo Anualizado corresponde a €21.966,36 * 4 = €87.865,44, valor inferior a €149.639,37, o que não tem qualquer consequência no que concerne ao regime de tributação em IRC, pois, efectuada aquela opção, ela é válida por três anos, como resulta do n.° 8 do artigo 53°.
21 De resto, não havia qualquer obstáculo a que fosse tributada pelo Regime Geral, pois, como resulta da parte final do n.° 1 do referido artigo 53.°, mesmo os contribuintes que tivessem condições de serem tributados pelo Regime Simplificado, podiam optar por afastar este regime.
22 - Assim, tem de se concluir que foi ilegal a atuação da Administração Tributária ao considerar que a Declaração de Rendimentos, Mod. 22 de IRC do Exercício de 2003 apresentava o seguinte erro após verificação central: "D6B — assinalado reg. Geral e suj. Passivo enquadrado no reg. Simplificado".
23 - Pelo que a matéria de facto dada como não provada deverá ser alterada para provada e ser considerado provado que:
1 - Na Declaração de Inicio de Atividade a que laude o facto 2 de 3.1 supra, a Impugnante declarou que optava pelo Regime Geral de Tributação.
24 - Convém analisar as linhas gerais do Regime Simplificado de determinação do lucro tributável, em sede de IRC, tendo presente o disposto no artigo 53º do CIRC, em vigor nos exercícios objecto da decisão recorrida.
25 - Nos termos do artigo 53º do CIRC, era permitido aos sujeitos passivos optar pelo apuramento do lucro tributável de acordo com as regras definidas para o Regime Simplificado de tributação, regime este incluído na determinação do lucro tributável por métodos indiretos.
26 - Tal regime era aplicável aos sujeitos passivos (de IRC) residentes que exercessem, a titulo principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com exceção dos que se encontrassem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentassem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a €149.639,37 e que não optassem pelo regime geral de determinação do lucro tributável (cfr. n.° 1 do artigo 53.° do CIRC).
27 - No exercício do inicio da atividade, o enquadramento fazia-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da Declaração de Início de Atividade (cfr. n.°2 do artigo 53.° do CIRC).
28 - A opção pelo Regime Geral, a que se reportava o n.° 1 do preceito, deveria ser formalizada na Declaração de Inicio de Atividade ou na Declaração de Alterações referida nos artigos 110.° e 111.° do CIRC, até ao fim do 3.° mês do período de tributação do inicio da aplicação do regime (cfr. n.° 7 do artigo 53.n do CIRC).
29 - Por sua vez, efectuada a opção pelo Regime Geral, a mesma era válida por um período de três exercícios, findo o qual caducava, excepto se o sujeito passivo manifestasse a intenção de a renovar através de uma Declaração de Alterações apresentada até ao fim do 3.° mês do período de tributação do inicio da aplicação do regime (n.° 8 do artigo 53.° do CIRC).
30 - Não sendo exercida a opção pela aplicação do Regime Geral e verificando-se os requisitos de enquadramento no Regime Simplificado, este regime era aplicado automaticamente por um período de 3 exercícios, sendo prorrogado por iguais períodos (cfr. n.° 9 do artigo 53.°).
31 - Caso o sujeito passivo não pretendesse ver prorrogada a aplicação do Regime Simplificado, deveria comunicar a opção de transitar para o Regime Geral, mediante declaração de alterações, no prazo antes mencionado.
32 - Ora, retomando o caso dos autos, temos que, no ano do início da atividade, 28/10/2002, a Impugnante, tendo estimado um valor de proveitos de €180.000,00, ficou enquadrado no Regime Geral de determinação do lucro tributável, tendo inclusivamente assinalado possuir contabilidade organizada.
33 - Neste exercício de 2002, a Impugnante ficou, pois, enquadrado no Regime Geral. A Recorrente defende na Declaração de Início a que alude o ponto 1 de 3.1 supra optou expressamente pela Tributação de acordo com as regras do Regime Geral, todavia o Tribunal a quo considerou que isso não é verdade, considerando que uma coisa é o enquadramento no Regime Geral de Tributação por imposição, e outra coisa é o enquadramento no Regime Geral por opção.
34 - Mais o Tribunal a quo considerou que a imposição legal é uma obrigação resultante da própria lei, sem margem de opção.
35 - A possibilidade de opção pelo Regime Geral, está aberta e reservada apenas para os sujeitos passivos que na Declaração de Inicio prevejam não ultrapassar aquele limite (e, por isso, devam ser enquadrados no regime Simplificado) mas declaram expressamente (assinalando essa opção no quadro 19 da Declaração de Inicio) que pretendem ser tributados de acordo com as regras do Regime Geral.
36 - Contudo, como não reunia os pressupostos de inclusão no Regime Simplificado de tributação, previsto no artigo 53º do CIRC, não preencheu o quadro 19, que se destina a quem reúna os respectivos requisitos.
37 - É, realmente, verdade que tal Regime Geral de tributação constitui um pressuposto previsto no n.° 1 do artigo 53.° do CIRC para que aos sujeitos passivos de IRC possa ser aplicado o Regime Simplificado de determinação do lucro tributável, ou possam optar pela aplicação do Regime Geral de determinação do lucro tributável.
38 - Sucede, porém, que pelo facto de efetivamente os proveitos declarados em 2002 não terem ultrapassado o valor de €149.639,37, a Administração 'Tributária veio, para os exercícios de 2002­-2004. a enquadrar a Recorrente no Regime Simplificado, não lhe permitindo a opção pelo Regime Geral de determinação do lucro tributável no exercício de 2003 por esse motivo.
39 - Esta atuação da Administração Tributária corresponde a uma interpretação da lei que não é aceitável, tendo a jurisprudência vindo a tomar posição.
40 - Definindo-se como uma garantia que é conferida ao sujeito passivo de poder ser tributado pelo rendimento real, sendo certo que o Regime Simplificado não constitui o regime regra consagrado no artigo 104º, n° 2 da CRP, entende-se que não se vê razão para não ser atendida a opção pelo Regime Geral de tributação expressa pela Impugnante, tanto mais que assinalou na mesma Declaração de Inicio de Atividade possuir contabilidade organizada.
41 - Muito embora o Regime Geral logo resultasse obrigatório e, face ao Volume Total Anual de Proveitos estimado na Declaração de Início para o ano de 2002, a intenção manifestada por esse Regime não poderia deixar de relevar para o caso de, como veio a acontecer, o valor declarado para esse ano (21.966,36€), determinar a aplicação, em princípio, do Regime Simplificado a partir do exercício de 2003.
42 - Relevando, como releva, essa opção inicial pelo Regime Geral de determinação do lucro tributável em IRC à luz da alínea a) do nº7 do artigo 53.° do CIRC, opção essa válida para os três exercícios seguintes (n.° 8 do mesmo artigo), ao invés do que defende a Fazenda Nacional, a concretização da opção em causa não estava dependente de nova declaração até ao fim do mês de Março de 2003, nos termos da alínea b) do citado n.° 7 (neste mesmo sentido, vide acórdãos de 21/05/08 e 18/06/08, nos recursos n.°(s) 10/08 e 205/08).
43 - É importante lembrar que a determinação dos rendimentos se fazia com base na aplicação das regras do Regime Simplificado ou com base nas regras do regime da contabilidade organizada. Sendo que ficavam abrangidos pelo Regime Simplificado os sujeitos passivos que no exercício da sua atividade não ultrapassassem, no período de tributação imediatamente anterior, qualquer dos limites indicados na norma vinda a referenciar e não tenham optado pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade.
44 - Assim, o Regime Simplificado, que foi criado pela reforma fiscal de 2000, constitui um regime não vinculativo, válido somente para quem não tenha optado pelo regime da contabilidade organizada.
45 - Deste modo, caso o sujeito passivo tivesse optado, logo na Declaração de Início de Atividade, pelo regime de contabilidade organizada, não havia como aplicar-lhe o Regime Simplificado.
46 - Ora, no caso sub judice, e conforme resulta do probatório, a Impugnante apresentou a Declaração de Início de atividade em 28/10/2002, onde inscreveu um total de proveitos estimados de €180.000,00, aludindo, desde logo, à existência de contabilidade organizada; pelo que é forçoso entender-se que a Impugnante reclamou pela aplicação do regime de determinação do lucro tributável por recurso à sua contabilidade organizada, que é o Regime Geral previsto no artigo 17.° do CIRC.
47 - Por outro lado, ainda que esse Regime Geral já resultasse obrigatório em face do Volume Total Anual de proveitos estimado na Declaração Inicial, como é o caso, em sintonia com a jurisprudência citada, tendo sido feita essa opção nessa declaração, por referência à contabilidade organizada, não se vislumbra como pudesse estar enquadrado no Regime Simplificado.
48 - Ou seja, se a Impugnante já estava inserida no Regime Geral, perante o seu comportamento declarativo no Início de Atividade, não se pode deixar de considerar como válida e relevante essa escolha por um período de três exercícios - e o Regime Simplificado só é aplicável quando os sujeitos passivos não optem pela aplicação do Regime Geral de determinação do lucro.
49 - Assim, tem de se concluir que foi ilegal a atuação da Administração Tributária ao declarar que a Declaração de Rendimentos do Mod. 22 do exercício do 2003 apresentava o seguinte erro após verificação central: "D6B — assinalado Reg. Geral e Suj. Passivo enquadrado no regime simplificado.", já que aquela não pode substituir-se ao titular do direito de opção, impondo-lhe este regime, quando a Impugnante, em tempo oportuno, declarou pretender sujeitar-se ao Regime Geral (contabilidade organizada).
50 - Razões pelas quais se impõe dar provimento ao presente Recurso considerando que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, devendo ser revogada e considerar a Recorrente enquadrada no Regime Geral.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao Recurso e revogada a Douta Sentença
Como é de Direito e de Justiça».
1.2. A Recorrida (Autoridade Tributária e Aduaneira), notificada da apresentação do presente recurso, não contra alegou.
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 283 e ss. do SITAF, pugnando pela improcedência do recurso.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e, consequentemente, em erro na aplicação do direito.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«Com base nos documentos junto aos autos e nos apensos considera-se provada a seguinte matéria de facto, com relevância para a decisão:
1. Em 28/10/2002 a sociedade Impugnante, [SCom01...] Lda., apresentou “declaração de inscrição no registo/Inicio de atividade”, indicando como data do início de atividade o dia 28/10/2002, estimando o volume de negócios relativos a 3 meses do ano 2002 em € 45.000,00 e, “para enquadramento em IR”, o volume de negócios anual de € 180.000,00 assinalando, além do mais, o campo 1 do quadro 06 (“IRC Regime de Tributação”, pelo “regime geral”, e campos 2 e 10 do quadro 16, informando que possui contabilidade organizada por exigência legal e não assinando nada no quadro 19 relativo à “opção pelo regime de contabilidade organizada (IRS) ou pelo regime geral de determinação do lucro tributável (IRC)”– fls. 5 e 6 do processo físico;
2. O volume de negócios efetivamente obtido em 2002 pela agora Impugnante somou a quantia de € 21.966,36 – fls. 16, 30, 57, 65 do PA e 46, 67 e 103do processo físico;
3. Por ofício de 31/5/2004 a AT notificou a agora Impugnante de que a declaração de rendimentos mod. 22 de IRC do exercício de 2003 apresentava o seguinte erro, após verificação central: “D6B – Assinalado reg. geral e suj. passivo enquadrado no reg. simplificado” – fls. 8 do PA;
4. Em 14/6/2004 a agora Impugnante apresentou reclamação graciosa no sentido de ser anulado o seu enquadramento do regime simplificado do IRC com efeitos reportados ao exercício de 2003 – fls. 63 do processo físico;
5. Por ofício nº ...07, de 28/3/2005 a AT notificou a agora Impugnante de que, apreciando o pedido a que alude o ponto anterior como “reclamação administrativa”, indeferia o requerido por falta de base legal, considerando que o enquadramento no regime simplificado está de acordo com a lei aplicável – fls. 66 a 68 do processo físico;
6. Em 20/4/2005 foi submetida a declaração de rendimento modelo 22 do ano 2003, sob o lote nº C....9-20, no qual consta o enquadramento no regime simplificado do IRC – fls. 19 do PA;
7. Em 16/5/2005, com base nessa declaração de rendimentos, a AT efetuou a liquidação nº ...44 de IRC do ano 2003, de que resultou imposto a pagar até 4/7/2005 no montante de € 21.335,36, que notificou à agora Impugnante – fls. 7 do PA;
8. Em 11/7/2005 a agora Impugnante reclamou graciosamente da liquidação do IRC do ano 2003 com fundamento em erro no enquadramento no regime simplificado e falta de fundamentação dessa decisão – fls. 1, 2 e seguintes do PA;
9. Notificada do projeto de decisão da reclamação graciosa, a agora Impugnante exerceu direito de audição em 25/5/2006 alegando que deve ser respeitada a manifestação de vontade do contribuinte expressa através da opção pelo regime geral de tributação exercida na declaração de início de atividade – fls. 21 a 42 do PA;
10. Por despacho de 12/6/2006 a AT indeferiu a reclamação graciosa e notificou essa decisão à agora Impugnante em 26/6/2006 – fls. 21 e seguintes e 43 a 52 do PA;
11. Em 18/7/2006 a agora Impugnante apresentou à AT recurso hierárquico contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa alegando falta de fundamentação da decisão recorrida e erro sobre os pressupostos dessa decisão, enriquecimento sem causa e inconstitucionalidade do artigo 53º, nº1, do CIRC na interpretação adotada – fls. 53, 54 e seguintes do PA;
12. Por despacho de 8/5/2008 a AT negou provimento ao recurso hierárquico por considerar que o enquadramento no regime simplificado está de acordo com a lei e remetendo a resposta à questão da inconstitucionalidade para o texto do Acórdão do TCA Sul de 09-05-2006 invocado na petição – fls.125 a 129 do PA;
13. Em 29/5/2008 a AT notificou a agora Impugnante da decisão de indeferimento do recurso hierárquico – fls. 130 e 130 do PA;
14. Em 25/7/2008 a Impugnante remeteu, via postal sob registo daquela data, a petição inicial da presente impugnação para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu – fls. 2 do processo físico;
3.2Matéria de facto dada como não provada:
Com relevância para a boa decisão das questões a apreciar consideram-se não provados os seguintes factos;
1. Na declaração de início de atividade a que alude o facto 2 de 3.1 supra, a Impugnante declarou que optava pelo regime geral de tributação – artigo 4 da p.i.;
4 – Motivação de facto
A convicção do tribunal teve por base o confronto das posições das partes assumidas nos respectivos articulados e a análise global dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo que, por não estarem impugnados, se dão como integralmente reproduzidos, conforme se indica em cada ponto de 3.1 supra.
Da posição das partes resulta que não existe litígio quanto aos factos acima descritos exceto quanto à opção pelo regime geral de tributação a que aludem os factos 1 de 3.1 e 1 de 3.2.
Do conjunto da prova produzida resulta a convicção de que a sociedade apresentou declaração de “início de atividade” reportada a 28/10/2002, tendo estimado que o volume de negócios que iria efetuar nos três meses que faltavam até final do ano rondaria o valor de € 45.000,00, daí resultando uma estimativa anualizada (para 2002) de € 180.000,00.
Não se discute que por causa dessa estimativa tanto o sujeito passivo como a AT concordaram que a Impugnante ficaria enquadrada no regime geral de tributação (por imposição legal).
Resulta dos documentos e da posição das partes que por causa dessa imposição legal a agora Impugnante não assinalou a opção pelo regime geral de tributação (não assinalou o quadro 19 da dita declaração – facto 1 de 3.1 supra). Razão pela qual se dá como não provado o facto 1 de 3.2 supra.
Não se discute que na declaração de rendimentos relativa ao exercício do ano 2002 a agora Impugnante declarou volume de negócios (€ 21.966,36) inferior ao esperado e ao limite de que resultaria o enquadramento no regime geral por imposição legal (artigo 53º do CIRC) – facto 2 de 3.1 supra;
Do mesmo modo subentende-se o acordo das partes quanto ao facto, não negado pelos documentos juntos aos autos, que a agora Impugnante não apresentou posteriormente qualquer declaração de opção pelo regime geral de tributação no exercício do ano 2003 (não se discute que isso terá sucedido por esta entender que não havia a obrigação de tal declaração).
Por não concordar com o enquadramento no regime simplificado, a agora Impugnante reclamou graciosamente contra a liquidação de imposto resultante desse enquadramento no exercício do 2003 e recorreu hierarquicamente do ato de indeferimento daquela reclamação.»
2.2. De direito
In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Aveiro, que manteve o indeferimento do pedido que havia formulado de reverter em sede de IRC para o ano de 2003 a sua sujeição ao regime simplificado de tributação que automaticamente lhe foi imposta por via informática.
Em sede de petição inicial a impugnante elencou contra o acto impugnado (i) nulidade por inconstitucionalidade do artigo 53º, nº1, do CIRC na interpretação adotada, por violação dos artigos 103º, 104º, nº2, 266º, nº2 e 268º, nº 3, da CRP; (ii) inexistência de fundamentação em violação dos artigos 77º, nºs 1 e 2 da LGT e 125º do CPA; (iii) erro sobre os pressupostos de direito por erro na interpretação do artigo 53º, nº 2 e nº 7º, al. b), do CIRC; (iv) preterição de formalidade legal essencial por recusa do direito de audição antes da decisão impugnada, e (v) desvio de poder (expresso no ato administrativo de determinação automática de enquadramento no regime simplificado de tributação).
O tribunal a quo, conhecendo de todos os vícios alegados, conclui, pela improcedência da impugnação, absolvendo a Recorrida de todos os pedidos formulados, relevando nesta sede recursiva a subsunção dos factos provados ao direito de que a opção pelo regime geral de tributação deve ser efectuada no momento da declaração de inicio de actividade, e de que, para tanto a Impugnante teria que ter declarado no campo 19 daquela sua declaração a opção pelo regime geral de tributação para impedir a sua sujeição ao regime simplificado no exercício seguinte.
Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objecto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.
Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a sentença padece de erro de julgamento de facto e de direito, erro de facto porquanto a matéria de facto dada como não provada devia ter sido dada como provada, a saber que “Na Declaração de Inicio de Atividade a que alude o facto 2 de 3.1 supra, a Impugnante declarou que optava pelo Regime Geral de Tributação” e subsequente cumpria concluir, em face de tal, que a Recorrente sempre esteve enquadrada no regime geral para efeito de tributação em IRC.
Cumpre apreciar e decidir.
2.2.1. Do alegado erro de julgamento de facto
Na presente apelação, a Recorrente invoca que na sentença recorrida errou no julgamento de facto (cf. conclusão 23 - das alegações de recurso).
Na presente situação, a Recorrente pretende que seja reconduzida à matéria de facto provada o teor do vertido no item único levado à matéria de facto não provada, a saber, o seguinte:
“1 - Na Declaração de Inicio de Atividade a que alude o facto 2 de 3.1 supra, a Impugnante declarou que optava pelo Regime Geral de Tributação.”
Contudo, se atentarmos no teor da redação supra referida, e a redacção dada ao facto 1. da matéria assente, de que “Em 28/10/2002 a sociedade Impugnante, [SCom01...] Lda., apresentou “declaração de inscrição no registo/Inicio de atividade”, indicando como data do início de atividade o dia 28/10/2002, estimando o volume de negócios relativos a 3 meses do ano 2002 em € 45.000,00 e, “para enquadramento em IR”, o volume de negócios anual de € 180.000,00 assinalando, além do mais, o campo 1 do quadro 06 (“IRC Regime de Tributação”, pelo “regime geral”, e campos 2 e 10 do quadro 16, informando que possui contabilidade organizada por exigência legal e não assinando nada no quadro 19 relativo à “opção pelo regime de contabilidade organizada (IRS) ou pelo regime geral de determinação do lucro tributável (IRC), podemos facilmente concluir que nada mais cumpre reconduzir ao probatório assente na prova documental alegada pelo Recorrente, qual seja, da declaração de início de actividade apresentada em 28.10.2002. É certo, que ocorre ali um erro manifesto ao aludir ao facto 2., quando manifestamente a alusão se prende com o facto 1., ora transcrito, que não colide com o seu teor e que que aqui se dá por suprido.
Mas, mais se diga, que a pretensão da Recorrente, se atentarmos a redacção pretendida e que consta do item 1. dos factos não provados, de que na “Declaração de Inicio de Actividade a Impugnante declarou que optava pelo Regime Geral de Tributação”, ciente e não posto em causa de que o item 1. do probatório alude a todas as menções expressas naquela Declaração, não constitui verdadeira matéria factual, mas antes insere em si um juízo conclusivo, qual seja, de que das menções constantes na Declaração transpostas para o item 1. do probatório têm por pressuposto um demarcado raciocínio que permite concluir naquele sentido.
Pelo que, por duas ordens de razão, a primeira porque atenta a prova documental – Declaração de Inicio de Actividade – nada mais decorre do que o correctamente foi careado para o probatório sob o item 1., a segunda, de que a pretendida inserção não pode ser considerada como matéria factual a aditar por ser manifestamente conclusiva, pelo que terá que improceder o presente recurso na parte supra referenciada.

2.2.2. Do erro de julgamento de direito
Estabilizada a matéria de facto, nos termos vistos, importa avançar na análise do alegado em sede de erro de julgamento de direito.
O tribunal a quo julgou improcedente a impugnação judicial e, consequentemente, manteve a decisão que indeferira o pedido formulado pela Recorrente e que a manteve em sede de tributação de IRC sujeita ao regime simplificado de tributação no exercício de 2003, considerando no que ora importa em sede recursiva, em síntese, que:
«Do erro sobre os pressupostos de direito (por erro na interpretação do artigo 53º, nº 2 e nº 7º, al. b), do CIRC).
A Impugnante alega que a decisão impugnada padece de erro sobre o pressuposto de direito por erro na interpretação dada ao artigo 53º do CIRC (artigos 1 a 56 da p.i.).
A tese da Impugnante assenta no entendimento de que a declaração de início a que alude o facto 1 de 3.1 supra consubstancia uma manifestação de vontade de “opção expressa e clara” pelo regime geral de tributação, confirmada pelo facto de nos anos seguintes (2003, 2004 e 2005) ter declarado sempre volume de negócios superior a € 400.000,00, “que não pode ser alterada por mero efeito automático da vontade da AF, num ato de errada qualificação num regime pelo qual o sujeito passivo não optou” (artigos 4, 20 a 27 p.i.). A Impugnante considera que fez essa opção expressa assinalando o quadro 06, evidenciando, em sede de IRC, o regime geral (artigos 5 e 33 da p.i.), reconhecendo que “porém, no ano do inicio de atividade 2002, o volume de proveitos efetivos obtidos foi apenas de € 21.966,36 (doc. 4) e com referência apenas á faturação do mês de Dezembro” (artigo 37º p.i.) e “ficou, ab initio, enquadrada no regime geral porque estimou um volume de proveitos superior a € 149 639,37” (artigo 38 da p.i.).
A favor da sua tese a Impugnante invoca o artigo do Prof. Saldanha Sanches, Conceito de Rendimento do IRS, publicado na Revista de Fiscalidade nº 7/8, de Julho/Outubro de 2001, citando os dois primeiros parágrafos do ponto 4.1.1, de fls.48 (cfr. artigos 40 e 41 da p.i.), que manifestamente se refere ao regime simplificado do IRS, que não tem adequado paralelismo com o regime previsto no artigo 53º do CIRC. Também invoca (artigo 44 p.i.) o Acórdão do TCA Norte, de 3/7/2008 (processo 00095/05.0BEBRG), que se refere a um caso diferente do dos autos (naquele caso houve opção pelo regime simplificado por o sujeito passivo ter estimado volume de negócios inferior ao limite previsto no artigo 53º, nº1, do CIRC. Ali se diz que “I – Tendo a impugnante no início da sua actividade estimado um proveito que automaticamente a enquadraria no regime simplificado de tributação previsto no artigo 53.º do CIRC optado pelo regime geral de tributação, tal opção releva no caso de o sujeito passivo ter obtido proveitos que automaticamente o enquadrariam no regime simplificado devendo por isso aplicar-se-lhe o regime geral de tributação em sede de IRC ”).
A Impugnante considera que o preenchimento do quadro 19, campo 4, da declaração de início “mais não significa do que um complemento daquela primeira – quadro 6, uma verdadeira redundância” (artigo 46 p.i.), tanto mais que o funcionário da AT assinalou a opção pelo regime geral no quadro 10 (artigo 47 p.i.) e que a interpretação efetuada pela AT, ignorando o facto de o valor efetivamente faturado em 2002 corresponde aos proveitos obtidos apenas no mês de Dezembro, equivale a “interpretar a Lei à medida de um interesse que a sua letra não contem” (artigos 55 e 56 da p.i.).
A Impugnante não tem razão.
A opção deveria ter sido feita (se isso fosse possível, e não é - como já se viu - porque o rendimento estimado implicava o enquadramento no regime geral por imposição legal no ano 2002) no quadro 19 da declaração de início.
No Quadro 6, campo 1, assinalou-se o enquadramento no “regime geral”, por imposição legal (e não por opção) no sentido de que não se aplica qualquer das alternativas indicadas nos campos 2 a 5 (não sujeição, isenção definitiva, isenção temporária ou redução de taxa). Assinalar simultaneamente o quadro 6-1e o quadro 19 não seria uma redundância, mas estimar volume de negócio anual superior ao limite legal previsto no nº1 do artigo 53º do CIRC e simultaneamente assinalar a opção pelo regime simplificado, seria um erro inadmissível (pois, como se viu, quem deva ser enquadrado no regime geral por imposição legal, como sucedeu no caso concreto, não poderia optar por esse regime).
No campo 10, para “Uso exclusivos dos serviços” da AT, o funcionário assinalou o enquadramento no regime geral de tributação previsto no artigo 53º do CIRC resultante da imposição legal por o VN anual estimado (€ 180.000,00) impor esse enquadramento. Em qualquer caso, o enquadramento legal feito na declaração de início, resultante de imposição legal, era válido apenas para o ano 2002.
Relativamente ao ano 2003 aplicava-se, literalmente, o disposto no artigo 53º, nº1, do CIRC, segundo o qual “Ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável os sujeitos passivos residentes que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 30 000 000$00 ( (euro) 149 639,37) e que não optem pelo regime de determinação do lucro tributável previsto na secção II do presente capítulo.”. Caso pretendesse optar pela aplicação do regime geral de tributação no exercício de 2003 a Impugnante deveria ter exercido a opção nos termos do nº 7, al. b) do mesmo artigo até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime (até final de Março de 2003), caso em que, nos termos do nº 8, a opção seria válida por um período de três exercícios, findo o qual caducaria, exceto se o sujeito passivo manifestasse a intenção de a renovar pela forma prevista na alínea b) do número 7.
No caso, a AT não ignorou que o volume de negócios efetivamente obtido no exercício de 2002, € 21.966,36, foi faturado apenas em um mês (dezembro) desse ano. Simplesmente, a AT não poderia fazer a “anualização” desse rendimento multiplicando-o por 12 e fazendo corresponder a um volume de negócios (de € 263.596,32) superior ao limite legal previsto no nº1 (€ 149.639,37) de maneira a permitir a continuação do enquadramento anterior. Aquele rendimento, embora faturado apenas no mês de dezembro de 2002 corresponde ao rendimento real efetivo obtido desde 28/10/2002 até 31/12/2002, isto é, em cerca de 3 meses. Pelo que o volume de negócios efetivo anualizado corresponde a € 21.966,36 x 4 = € 87.865,44.
Pelo que não se reconhece o vício sob análise, nem na vertente do erro relativo aos pressupostos nem na vertente de violação dos princípios da atuação administrativos previstos no artigo 266º da CRP. Pelo que também não reconhece a existência de eventual enriquecimento sem causa.» (fim de transcrição)
A Recorrente como se atenta das suas conclusões de recurso não se conforma com esta decisão e refere que a opção pelo regime de tributação na declaração de inicio da actividade, e por falta de qualquer outro campo para o exercício da correspondente posterior opção se efectiva através da indicação do volume anual de proveitos e preenchimento do quadro 6.
Se bem entendemos a sua posição, defende que a opção a assinalar no campo 19 da declaração do inicio da actividade não pode desvirtuar aquela outra, pelo que não respeita aos contribuintes que em função do volume anual de proveitos se enquadram logo no regime geral, sendo de aplicação e uso exclusivo daqueles que naquele momento por imposição legal do volume de negócio são enquadrados no regime simplificado, o que não é o caso da Recorrente.
A indicação do volume anual de proveitos pelo contribuinte quando indique valor que afaste a tributação pelo regime simplificado vale como opção efectuada pelo contribuinte pelo regime em que pretende ser enquadrado. Sendo que esta indicação face ao disposto no artigo 58.º do CIRC é valida por um período de três exercícios.
Não há assim no entender da Recorrente possibilidade da imposição de um regime imposto unilateralmente pela Administração Tributária sem concordância do contribuinte – “não pode substituir-se ao titular do direito de opção, impondo-lhe este regime, quando a Impugnante, em tempo oportuno, declarou pretender sujeitar-se ao Regime Geral (contabilidade organizada)” (vide conclusão 49) - pugna por isso pela procedência do recurso e pela anulação da decisão que manteve o enquadramento da Recorrente no regime simplificado de tributação relativamente ao ano de 2003.
Relembrada a posição da Recorrente, e com vista à apreciação da questão que vem colocada ao Tribunal, importa traçar em linhas gerais o Regime Simplificado de determinação do lucro tributável, em sede de IRC, tendo presente o disposto no artigo 53º do CIRC, em vigor nos exercícios a levar em consideração 2002 (ano da apresentação da declaração de inicio de actividade), e 2003, exercício a que se reporta o acto impugnado de sujeição da aplicação do regime simplificado ao exercício (O regime simplificado, em sede de IRC, foi entretanto revogado pelo artigo 92º, da Lei nº 3-B/2010, de 28/04 (O.E de 2010)).
O CIRC no seguimento da tributação do lucro seguido pelos países mais industrializados e avançados relativamente às pessoas colectivas criou dois regimes de tributação como se pode ver do disposto no artigo 17.º e 53.º do CIRC.
O artigo 53.º do CIRC determina no seu n.º 1 que ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável os sujeitos passivos residentes que exerçam a titulo principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação com excepção dos que se encontrem sujeitos à revisão legal de contas que apresentem no exercício anterior ao da aplicação do regime um volume total anual de proveitos não superior a € 149.689,37 e que não optem pelo regime de tributação previsto na secção segunda do presente capitulo ou seja a do regime de tributação geral que tem como base uma contabilidade actualizada de acordo com as leis fiscais e o POC – artigo 17.º do CIRC.
Temos então que, nos termos do artigo 53º do CIRC, era permitido aos sujeitos passivos optar pelo apuramento do lucro tributável de acordo com as regras definidas para o regime simplificado de tributação, regime este incluído na determinação do lucro tributável por métodos indirectos.
Tal regime era aplicável aos sujeitos passivos (de IRC) residentes que exercessem, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrassem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentassem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 149 639,37 € e que não optassem pelo regime geral de determinação do lucro tributável (cf. nº1 do artigo 53º do CIRC).
No exercício do início da actividade, o enquadramento fazia-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade (cf. nº2 do artigo 53º do CIRC).
A opção pelo regime geral, a que se reportava o nº1 do preceito, deveria ser formalizada na declaração de início de actividade ou na declaração de alterações referida nos artigos 110º e 111º do CIRC, até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime (cf. nº 7 do artigo 53º do CIRC).
Por sua vez, efectuada a opção pelo regime geral, a mesma era válida por um período de três exercícios, findo o qual caducava, excepto se o sujeito passivo manifestasse a intenção de a renovar através de uma declaração de alterações apresentada até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime (nº 8 do artigo 53º do CIRC).
Não sendo exercida a opção pela aplicação do regime geral e verificando-se os requisitos de enquadramento no regime simplificado, este regime era aplicado automaticamente por um período de 3 exercícios, sendo prorrogado por iguais períodos (cf. nº 9 do artigo 53º).
Caso o sujeito passivo não pretendesse ver prorrogada a aplicação do regime simplificado, deveria comunicar a opção de transitar para o regime geral, mediante declaração de alterações, no prazo antes mencionado.
Ora, retomando o caso dos autos, temos que, no ano do início da actividade, 2002, a Recorrente, tendo estimado um valor de proveitos de € 180.000,00 (considerando um volume de negócios – vendas/ prestações de serviços de € 45.000,00 em 3 meses de 2002), foi automaticamente enquadrada no regime geral de tributação por imposição legal, contudo nada tendo sido assinalado no campo 19 da declaração de inicio de actividade não foi pela mesma então exercida qualquer opção expressa pela tributação ao abrigo do regime geral ou pelo regime simplificado. Nesse exercício de 2002, a Recorrente ficou, pois, enquadrada no regime geral. A questão prende-se com 2003, provado que está nos autos, que a Recorrente perdeu o estatuto do regime geral em que se encontrava, por imposição legal, por haver declinado nos seus pressupostos, no ano de inicio de actividade 2002, o volume de proveitos efetivos obtidos quedou-se em € 21.966,36, que anualizado (x4) corresponde a € 87.865,44, valor inferior ao previsto no artigo 53º, n.º 1 do CIRC.
A este propósito, em caso em tudo idêntico de falta de opção expressa manifestada na declaração de inicio de actividade que por imposição legal decorrente dos valores indicados foi automaticamente enquadrada no regime geral de tributação, fazemos apelo ao acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 06.11.2008, proferido no âmbito do processo n.º 1069/05.9BEBRG, em que a situação ali reportada apresenta inúmeras semelhanças com o caso em análise, no qual se lê, além do mais, o seguinte:

“Da análise deste artigo fácil é constatar que o regime simplificado de tributação não é, ao contrário do que sustenta a Recorrente, um regime optativo.
O que distingue o regime simplificado do regime geral de tributação é a forma de apuramento do lucro tributável, que no regime geral segue as regras dos artigos 17.º e seguintes do CIRC e tem como base a contabilidade devidamente organizada do contribuinte; enquanto que no regime simplificado de tributação o apuramento do lucro tributável resulta da aplicação de indicadores de base técnico-científica definida para os diferentes sectores de actividade económica que devem ser utilizados na medida em que forem aprovados ou na ausência desses indicadores o apuramento desse lucro é determinado segundo as regras estabelecidas no n.º 4 do artigo 53.º do CIRC.
O regime simplificado de tributação como se depreende do artigo 53.º do CIRC também, apenas pode ser utilizado quando o volume total anual de proveitos apresentado no exercício anterior ao da sua aplicação for inferior ou igual a € 149.139,37 e desde que o contribuinte não opte pelo regime geral de determinação do lucro tributável.
E o contribuinte fica igualmente enquadrado no regime simplificado, quando, nos termos do n.º 2 do artigo 53.º do CIRC, “no exercício do início de actividade, verificados os demais pressupostos, face ao valor total de proveitos estimados, o contribuinte não tenha exercido opção pelo regime geral de tributação”.
Vejamos agora os factos constantes do probatório da sentença recorrida que este TCAN desde já igualmente dá como provados por nenhuma das partes os ter questionado.
O primeiro facto que releva é que no inicio da sua actividade, em 2002, a Autora declarou um volume anual de proveitos cujo valor € 399.038,00 que por exceder os € 149.689,37 a enquadrada desde logo no regime geral da tributação.
Além de que declarou nesse momento no campo 16 que possuía contabilidade organizada por exigência legal. – cfr. n.º 1 dos factos provados. E não assinalou o campo 19 da declaração de início de actividade não optando pelo regime geral de tributação.
Como também não fez opção pela aplicação do regime geral na declaração de alterações a que alude a línea b) do n.º 7 do artigo 46.º-A do CIRC na redacção introduzida pela lei 30-G/2000 de 29-12-2000 com início de vigência em 01/01/2001.
Assim porque se encontravam preenchidos os pressupostos legais de tributação do regime simplificado de determinação do lucro tributável e o contribuinte não exercera a opção pelo regime geral de tributação a Administração Fiscal outra coisa não podia fazer que aplicar a lei e determinar-lhe a matéria colectável do ano 2002 pelo regime simplificado de tributação dado o volume total de negócios desse exercício ser apenas de € 83.764,18 com custos de € 104.229,63 – ponto 3 do probatório.
Efectivamente não tendo o contribuinte optado no início do exercício da sua actividade nem posteriormente ao abrigo da alínea b) do n.º 7 do artigo 46.º-A do CIRC, pelo regime geral de tributação porque no exercício de 2002 o volume de proveitos era inferior a € 149.689,37 a Administração Fiscal porque vinculada à lei no exercício da sua actividade face à constatação e verificação dos pressupostos legais que impunham a aplicação do regime simplificado de determinação da matéria colectável, outra coisa não podia fazer que aplicar tal regime.
E não se diga que essa imposição unilateral viola o princípio constitucional incito no artigo 104.º, n.º 2 da CRP.
Efectivamente, muito embora este preceito constitucional preconize a tributação real do lucro e rendimento das empresas tal preceito não exclui que essa determinação se faça por outra via desde que essa via não retire as garantias de defesa ao contribuinte. Ora, ao contribuinte é desde logo dado o direito de optar pelo regime de tributação geral cabendo-lhe o ónus de por ele optar desde que o volume de proveitos não exceda o montante previsto pela lei para imposição do regime simplificado, por isso se o contribuinte não cumpre com esse ónus não pode queixar-se da imposição de um regime que o legislador previu como o mais adequado para a determinação do lucro e fixação do imposto para aquelas situações. (...).” (fim de transcrição do acórdão)
Em suma, no exercício do início da actividade, o enquadramento faz-se em conformidade com o volume de proveitos estimados para um ano de actividade.
O regime simplificado só é aplicável quando os sujeitos passivos não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro, previsto nos artigos 17.° a 46.° do Código do IRC.
A opção pelo regime geral deve ser formalizada: na declaração de início de actividade; ou na declaração de alterações referida nos artigos 110.° e 111.° do Código do IRC, até ao fim do 3.° mês do período de tributação do início da aplicação do regime — cf. a alínea a) do n.° 7 do artigo 53.° do Código do IRC.
Não sendo exercida a opção pela aplicação do regime geral e verificando-se os requisitos de enquadramento no regime simplificado, este regime é aplicado automaticamente por um período de 3 exercícios, sendo prorrogado por iguais períodos.
No caso em apreço, a Recorrente na declaração de registo de início de actividade — item 1. do probatório — não preencheu o campo 19 relativo à opção pelo regime de contabilidade organizada (IRS) ou pelo regime geral de determinação do lucro tributável (IRC).
Atento o volume de negócios anualizado em 2002, de € 87.865,44, inferior a 149.639,37 €, teria de ser enquadrada no regime simplificado de tributação em 2003 e afim de não o ser, deveria efectuar a opção pelo regime geral na declaração de alterações referida nos artigos 110.° e 111.° do Código do IRC, até ao fim do 3.° mês do período de tributação do início da aplicação do regime — cf. a alínea a) do n.° 7 do artigo 53.° do Código do IRC, o que não fez como decorre dos factos.
Em suma, face a tudo o que vem dito e sem necessidade de mais amplas considerações, conclui-se pela improcedência das conclusões e, nessa medida, pelo não provimento do presente recurso jurisdicional.

2.3. Conclusões
I. O regime simplificado, em vigor nos exercícios a que se reporta a situação dos autos – 2002/2003 - era aplicável aos sujeitos passivos (de IRC) residentes que exercessem, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrassem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentassem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 30 000 000$00 (149 639,37 €) e que não optassem pelo regime geral de determinação do lucro tributável (cf. nº1 do artigo 53º do CIRC).
II. No exercício do início da actividade, o enquadramento fazia-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade (cor. nº2 do artigo 53º do CIRC).
III. A opção pelo regime geral, a que se reportava o nº 1 do citado preceito, deveria ser formalizada na declaração de início de actividade ou na declaração de alterações referida nos artigos 110º e 111º do CIRC, até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime (cf. nº 7 do artigo 53º do CIRC)..
IV. Não tendo o contribuinte optado pelo regime normal de determinação do lucro tributável no início da sua actividade e não o tendo feito posteriormente ao abrigo da alínea b) do n°. 7 do art°. 53° do CIRC, desde que constatado, o volume total anual de proveitos era inferior a € 149.689,37, estava a AF obrigada ex lege a aplicar a esse exercício o regime simplificado, na determinação do lucro tributável, pois encontravam-se reunidos os pressupostos da sua aplicação e à AF porque vinculada à lei no exercício da sua actividade não restava outra solução.

3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente.
Porto, 08 de fevereiro de 2024

Irene Isabel das Neves
Cristina Travassos Bento
Carlos Fernandes