Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00298/08.6BEVIS |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 01/13/2022 |
| Tribunal: | TAF de Viseu |
| Relator: | Tiago Miranda |
| Descritores: | MÉTODOS INDIRECTOS, FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DO PROCEDIMENTO DE REVISÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL |
| Sumário: | I – Assentando a liquidação impugnada num acto emanado no procedimento de revisão, mais propriamente na decisão do respectivo Director de Finanças, é nesse acto final que se deve colher a fundamentação adoptada pela Administração Tributária. II – Nada obsta a que os requisitos da fundamentação, no que respeita à decisão final do procedimento de revisão, sejam encontrados mediatamente no RIT e ou em pareceres pregressos. Aliás, isso é expressamente salvaguardado no artigo 77º nº 1 da LGT, cuja aplicação em caso de fixação da matéria tributável por métodos indirectos os nºs 4 e 5 do mesmo artigo, por compatíveis, não prejudicam. III – Porém, o discurso da sobredita decisão administrativa que, mantendo a avaliação reclamada, não tenha qualquer fundamentação própria tem de proceder de modo expresso e congruente a essa remissão, sem o que será anulável, por falta de fundamentação, o acto tributário de liquidação adicional de IRC que dela derivar.* * Sumário elaborado pelo relator |
| Recorrente: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
| Recorrido 1: | A., LDA |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso. |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: * I - RelatórioA Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou procedente a impugnação judicial movida por A., Lda., contribuinte n.º (…), com sede na Quinta (…), relativamente à liquidação de IRC do ano de 2003, derrama e respectivos juros compensatórios, no montante total de € 244 105,40, que, entretanto, por via de compensação, ficou reduzido a € 160 738,81 para pagamento. As alegações de recurso da Recorrente terminam com as seguintes conclusões: “Em conclusão: a) Incide o presente recurso sobre, a aliás douta sentença, que julgou procedente a presente impugnação por falta de fundamentação do recurso à aplicação de métodos indirectos, dessa forma considerando prejudicado o conhecimento das demais questões; b) Assentou o recurso à aplicação de métodos indirectos: Constatação de que a contabilidade não reflecte a realidade no que respeita aos volumes e montantes de produção de ovos e correspondentes vendas e, bem assim, às compras de ração (Veja-se o ponto 6 do relatório, capítulo IV, no qual é descrito que a inspecção tributária procedeu à análise dos dados relativos à produção e venda de ovos a partir dos documentos arquivados, facturas e vendas a dinheiro, bem como, ao levantamento das quantidades de ração vendida à impugnante); A produção evidenciada nos mapas é, em alguns meses de 2003, muito superior aos valores facturados e contabilizados; Existência de guias de remessa para as quais não foi emitida factura nem venda a dinheiro, sendo que os duplicados respectivos não foram disponibilizados, facto que segundo a inspecção tributária evidencia a existência de transacções sem a correlativa emissão do documento de venda; Salienta-se que o TOC “V.” recusou-se a proceder ao encerramento das contas do exercício de 2003 por falta de credibilidade das mesmas; Existência de dois documentos (relatório de auditoria e estudo elaborado por funcionário), que denotam a existência de irregularidades na contabilidade da impugnante que se traduzem na omissão de proveitos; Existência de um bando de galinhas na posse da empresa durante o período de produção sem a correspondente evidência da venda dessa produção; Os únicos registos da produção são uns mapas que, além de não registarem a produção de todos os bandos em posse da impugnante, dizem apenas respeito ao primeiro semestre de 2003, sendo que os dados que serviram de base à sua elaboração (registos diários de produção), não foram facultados à inspecção, pelo que, não é possível aferir sobre a veracidade da informação que deles consta. c) Desde logo e salvo melhor posição, a argumentação vertida na sentença prende-se com a verificação/inverificação de um dos pressupostos elencados no relatório para aplicação de métodos indirectos e não com o vício de falta de fundamentação do recurso à avaliação indirecta; d) Na verdade, defende a douta sentença que a AT entra em contradição porque as instalações da impugnante comportam três pavilhões com capacidade para cerca de 100 mil galinhas, inexistindo capacidade efectiva para o excedente de 26 000 galinhas, daí concluindo que a alusão a maior necessidade de ração do que aquela documentada como adquirida derivou da consideração do excedente de 26 000 galinhas (vide ponto 8 do relatório); e) Somos de parecer que na situação vertente a douta sentença considerou que a AT errou ao considerar o motivo indicado enquanto pressuposto que conduziu à aplicação de métodos indirectos, dando como não verificados os requisitos para recorrer à avaliação indirecta, contudo, imputa-lhe o vício de falta de fundamentação, o que configura erro de julgamento sobre a matéria de facto; f) Sobre o vício formal em causa, diremos que não se verifica qualquer falta de fundamentação do recurso aos métodos indirectos, porquanto o contribuinte ficou na posse de todos os elementos de facto e de direito que conduziram à decisão, ou seja, foi-lhe dada nota do “itinerário cognoscitivo e valorativo” seguido para a tomada da decisão; g) No ponto 8 do relatório está explicitada a motivação porque o excedente de 26 000 galinhas não foi justificado pela impugnante, em função da análise dos elementos contabilísticos, mormente os documentos de compras e vendas, além de que, em sede de procedimento de revisão a mesma questão foi suscitada, debatida e analisada por ambos os peritos – da AT e da impugnante, não tendo o perito do contribuinte logrado demonstrar a razão de ser do excedente em causa; h) Impondo-se, pois, concluir pela não verificação do aludido vício de falta de fundamentação; i) De qualquer forma, a AT não entrou em contradição quanto ao pressuposto de aplicação de métodos indirectos mencionado na decisão judicial consistente na alegada inexistência de capacidade dos pavilhões da impugnante para o excedente de 26 000 galinhas; j) Decorre do ponto 8 do relatório que, após análise aos inventários dos exercícios de 2003 e 2004 (inventários esses, note-se, elaborados pela própria impugnante), bem como aos documentos de compras e vendas e, ainda, em função do consumo de ração fornecido pela N., que existe um excedente de 26 000 que não foi objecto de venda por parte da impugnante; k) A douta sentença refere que, uma vez que as instalações da impugnante não possuem capacidade efectiva para o excedente de 26 000 galinhas e que a ração era fornecida exclusivamente pela N., logo se conclui que a maior necessidade de ração do que a que está documentada como adquirida derivou da consideração do excedente de 26 000 galinhas; l) Já em sede de procedimento de revisão tal questão foi apreciada, contudo, o perito da Autoridade Tributária apurou que não ficou provada a alegada duplicação dos bandos (nº. 5 e 6) pelas razões que constam da Acta da reunião; m) Depois, o facto de as alterações legislativas ocorridas em 2003 terem determinado o aumento das jaulas/baterias de 450 para 550, não significa que tenha aplicação à situação da impugnante, pois que, o que importava averiguar de facto era se a impugnante acatou nos exercícios em questão as alterações ao nível da capacidade de produção; n) Releva-se ainda o declarado pela N. no documento junto em sede de Comissão de Revisão, o qual atesta que houve um bando que foi entregue à impugnante mais tarde por falta de capacidade desta, tendo sido feito um débito relativo aos custos que o Grupo N. teve por ter ficado com as aves durante esse período adicional; o) Do que se retira que nem todas as aves foram criadas nos pavilhões da impugnante, situação que justifica a teórica incapacidade das instalações da impugnante para obter a produção considerada em sede de procedimento inspectivo (o invocado excedente de 26 000 galinhas); p) Acresce que no ponto V do relatório (fls. 16), é afirmado “Nota: Nos meses de Outubro de 2003 e Novembro de 2004 foram apuradas quantidades de produção inferiores às quantidades vendidas declaradas pelo sujeito passivo”, do que se conclui que a impugnante tinha capacidade para produzir mais do que o que foi obtido no controlo efectuado pela inspecção e cálculos realizados, em instalações próprias ou de terceiros; q) Resulta, pois, dos elementos dos autos, que não está demonstrado que a impugnante nos exercícios de 2003 e 2004 cumpriu as alterações legislativas quanto ao aumento das jaulas/baterias de 450 para 550, a circunstância de nem todos os bandos terem sido criados nas instalações da impugnante e ainda a constatação de que nalguns meses a impugnante produziu maior quantidade de galinhas do que as que foram apuradas no controlo inspectivo, se encontra plenamente justificado que a impugnante produziu o número de aves considerado pela inspecção (sic); r) Não obstante e ainda que o pressuposto elencado de recurso à aplicação de métodos indirectos não se verificasse, o que não se concebe, também diremos que os indícios apurados pela Administração Fiscal e que constam do relatório da acção inspectiva não podem ser analisados isoladamente, pois todos eles contribuíram para a impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável; s) Pois que, vários outros pressupostos (para além daquele) conduziram à aplicação de métodos indirectos, sendo que não foram sindicados em sede de decisão judicial, pelo que, ao valorar apenas um dos pressupostos de aplicação de métodos indirectos e descurar os restantes, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento; t) Tendo em atenção toda a factualidade avançada pela Administração Fiscal é manifesto que a contabilidade da impugnante não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, tendo a AT cumprido o ónus da prova dos pressupostos para a tributação por métodos indirectos; u) Em suma, o Meritíssimo Juiz incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação da lei, mormente o disposto nos art.º 77º da LGT e art.º 125º do CPA e art.º 90º do CIVA e art.º 87º a 90º da LGT. Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que se julgue improcedente, por não provado, o vício de falta de fundamentação do recurso à aplicação de métodos indirectos imputado à liquidação impugnada, com as legais consequências.” Notificada, a Recorrida não respondeu à alegação. A digna Procuradora-geral Adjunta neste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso, redutível à seguinte transcrição: «(…) Decidiu o Mm° Juiz que a AT não fundamentou adequadamente os pressupostos de que depende a tributação por métodos indirectos, o que constitui vício de violação de lei, por erro nos seus pressupostos, pelo que julgou procedente a impugnação. É desta decisão que a Fazenda Pública recorre, invocando o erro de julgamento em matéria de facto e violação de lei. (…) * O direito à fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos, tem garantia constitucional, conforme o artigo 268º n°3 da CRP.Nos termos do artigo 77° da LGT há um dever de fundamentação, no tocante aos actos decisórios do procedimento tributário e dos actos tributários. A questão a decidir é determinar se o despacho ora sindicado de determinação do lucro tributável para efeitos de IRC através de métodos indirectos, constante do relatório de inspecção tributária (RIT) a fls. seg., do PA apenso, se encontra fundamentado. Citando o Ac. do STA de 1/7/2009 no processo 239/09: “Um acto encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo e valorativo seguido pelo agente, permitindo, ao interessado conhecer, assim, as razões, de facto e de direito que determinaram a sua prática”. Entendeu o Mm° Juiz, em síntese, que “na totalidade dos fundamentos carreados para alicerçar o recurso à avaliação indirecta ela tem o seu núcleo fundamental na alegada existência de um excedente de 26.000 galinhas ao longo do ano de 2003” e que as conclusões são contraditórias com outros elementos que a AT teve como inquestionáveis, havendo uma desconformidade não susceptível de explicação por exceder a capacidade efectiva de impugnante. É jurisprudência consolidada que” na determinação indirecta da matéria colectável nos termos dos artigos 87.°, n.° 1, alínea b) e 88.°, ambos da Lei Geral Tributária, cabe à administração tributária demonstrar a existência de anomalias e incorrecções no cumprimento dos deveres de declaração, de escrituração ou de documentação a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável - artigo 74.°, n.° 3, da Lei Geral Tributária” V. Ac. do TCA Norte de 1/4/2014 no processo 00237/15.6BEMDL in www.dgsi.pt. Conforme consta do R1T, v. fls 38 e seg. do PA, a AT em conclusão da factualidade que mencionou no relatório, enunciou as anomalias e incorrecções na contabilidade que verificou, elencando sete situações que determinaram o porquê da avaliação indirecta, por as considerar enquadráveis nas alíneas b) do art. 87° e a) do art. 88°, ambos da LGT. Em nosso entender, encontra-se fundamentado o recurso aos métodos indirectos, atento o teor do aí exarado e para cuja leitura remetemos. O que concerne ao bando de galinhas apenas respeita aos dois últimos itens, que a Administração Tributária analisou no ponto 8 do relatório, referente aos inventários finais de 2003 e 2004. v. fls, 37 e seg. do PA. Esse particular não constitui, longe disso, a totalidade dos fundamentos carreados para o recurso à avaliação indirecta. A recorrida quer através do pedido de revisão da matéria tributável quer sobretudo do que articulou na petição inicial - v. artigos 131 a 154 - conheceu e percebeu as razões de facto e direito do relatório inspectivo, motivo pelo qual impugnou tal, alegando que havia duplicação em relação ao bando de galinhas. Acresce que o Tribunal não dirimiu essa questão, apenas aduzindo que há contradições e esse respeito e não cuidou de sindicar os restantes. Face ao exposto, o recurso merece provimento.» Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir. II - Âmbito do recurso: questão a decidir Conforme jurisprudência pacífica, extraída dos artigos 608º, 635º nº 4 e 639º do CPC, aqui aplicáveis ex vi 281º do CPPT, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações. Então, a questão a resolver por este tribunal de apelação consiste em saber se o Tribunal recorrido errou no julgamento em matéria de facto e de direito ao concluir que os actos impugnados padeciam do vício de falta de fundamentação quanto à decisão de recurso a métodos indirectos na determinação da matéria colectável em IVA quanto ao ano de 2003, violando, por isso, o disposto nos art.º 77º da LGT, 125º do CPA, 90º do CIVA e art.ºs 87º a 90º da LGT. III – Apreciação do Recurso A decisão recorrida em matéria de facto é redutível à transcrição seguinte: III I Factos provados A) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 01200600312 de 23-05-2006 no dia 14-11-2006 teve início a inspecção à Impugnante A., Lda., e o fim ocorreu em 13-06-2007, tendo sido ampliado por um prazo de três meses. Cf. fls. 3 do relatório de inspecção, cuja cópia constitui fls. 30 do Processo Administrativo (PA), aqui dada por reproduzida o mesmo se dizendo dos demais elementos infra referidos; B) A Impugnante é “uma empresa familiar cuja sociedade foi constituída em Março de 1987 com o capital social de 2.000 contos e tendo por objecto a «exploração avícola, agrícola e pecuária» (em concreto o objecto é a produção de ovos para venda). A sociedade está sediada no Lugar (…), onde se situam também os pavilhões de exploração. (3 pavilhões com capacidade para alojar cerca de 100.000 galinhas com 1120, 1568 e 1540 m2). Entre outros, fazem também parte do património da empresa 2 aviários, cada com 1248 m2 situados no lugar de (...), (inscritos na matriz predial urbana da freguesia de (…)sob o artigo 1521). Por razões de natureza litigiosa, a gerência da firma tem sofrido ao longo dos tempos, já desde 2003, alterações na sua composição. Nos anos objecto da presente acção de inspecção eram gerentes os sócios F. e P. até Julho de 2003 e a partir de Agosto do mesmo ano, os sócios J. e A.. 2- Actividade desenvolvida A actividade desenvolvida pela S.P. consiste na produção de ovos para consumo doméstico. As raças de galinhas utilizadas são a ISA (França) e a HY-Line, ambas castanhas. … Os subprodutos (ovos partidos e gemas de ovos) têm algum valor económico e são vendidos para transformação.Esgotada a capacidade produtiva de um bando de galinhas, também estas são vendidas por um valor residual. O peso de cada galinha nesta fase é de cerca de 2 kg. 3· Normas e Regulamentos O Decreto-Lei n." 72-F/2003, de 14 de Abril, transpõe para a ordem jurídica nacional, a Directiva n.º 1999/74/CE, do Conselho, relativa à protecção das galinhas poedeiras e a Directiva n° 2002/4/CE, do Conselho, relativa ao registo de explorações de produção de galinhas poedeiras. Neste Decreto-Lei estabelecem-se as condições gerais de produção de galinhas poedeiras, bem como as características específicas dos sistemas alternativos ou de solo, das gaiolas não melhoradas e das gaiolas melhoradas. Destaca-se a importância das explorações disporem de registos, nos quais se encontre informação relativamente: data de nascimento, n.º de aves que entraram no pavilhão de postura, data de entrada, idade das aves, mortalidade diária, existências diárias e produção diária. Estes registos devem ser mantidos durante pelo menos três anos. 4· Terceiros A N. é o principal cliente e o único fornecedor de ração. As vendas para este cliente fazem-se acompanhar de guias de remessa e a facturação só é processada após controlo de qualidade e calibragem levado a cabo nas instalações da N.. Embora notificado o sujeito passivo para o efeito, não nos foram exibidas as Guias de remessa. Relativamente ao produto principal não existem excedentes de produção visto que o principal cliente da sociedade (N.) compra toda a produção que a empresa A. lhes disponibiliza para venda. Outro cliente com algum peso, a D., empresa participada pela A., compra ovos com casca, à dúzia, e também em gemas, estas acondicionadas em depósitos. É de salientar o facto de ser também comum a venda de ovos no local da exploração. Essa venda é feita a particulares ou a outros sujeitos passivos revendedores, tal como se depreende pela análise dos documentos de "Venda a Dinheiro" disponíveis na contabilidade. Também se constata pela análise das vendas a dinheiro que são vendidas no local galinhas vivas (nos períodos em que são vendidos os bandos que terminaram o ciclo produtivo). 5- Elementos contabilísticos e documentos auxiliares Para além de documentos emitidos e recebidos durante o exercício de 2003, do inventário de existências referido a 31.12.2003 e de um balancete analítico do mês de encerramento, não foram exibidos quaisquer outros elementos da contabilidade daquele ano, nomeadamente, livros selados e auxiliares.”, vide fls. 5 a 7 do relatório constante de fls. 32 e segs. do PA; C) A Impugnante foi notificada pessoalmente em 23 de Novembro de 2006 para proceder à entrega no “Gabinete de Contabilidade (…)”, em ……., “local onde está centralizada a escrita da firma”, dos elementos de contabilidade referidos na notificação, nomeadamente os relativos ao exercício de 2003, por que “Para além de documentos emitidos e recebidos durante o exercício de 2003, do inventário de existências referido a 31.12.2003 e de um balancete analítico do mês de encerramento, não foram exibidos quaisquer outros elementos da contabilidade daquele ano, nomeadamente, livros selados e auxiliares.”. Cfr. doc. fls. 46 e fls. 7 do Relatório, ambos do PA; D) A Impugnante, para além de solicitar prorrogação de prazo referiu que “grande parte da contabilidade e das informações solicitadas estiveram apreendidas no Tribunal Judicial de Tondela durante diversos meses” a Inspecção, aguardando e “não lhe sendo remetidos quaisquer elementos adicionais consultou os processos judiciais junto do Tribunal de Tondela onde não foram encontrados novos elementos relativos à contabilidade”, apenas disponibilizando “dois documentos que apontam para a existência de irregularidades na contabilidade (nomeadamente omissão de proveitos)”, vide fls. 47 a 57 e fls. 7 do relatório, ambos do PA; E) “Relativamente ao ano de 2004 foram apresentados os elementos relativos à contabilidade da empresa excepto os duplicados das "guias de transporte" e "guias de remessa" emitidas nesse ano. Também não foram apresentados duplicados de algumas vendas a dinheiro de 2004. Não foi dado assim cumprimento ao disposto no nº 6 do art° 6° do "Regime de bens em circulação objecto de transacções entre sujeitos passivos de IVA" (Decreto-Lei n.º 147/2003) que obriga à conservação dos exemplares dos documentos de transporte até ao fim do 2° ano seguinte. (Nota: a notificação para apresentação destes elementos foi a efectuada em 23/11/2006, Anexo, folha 1). Relativamente às vendas a dinheiro foi possível, através da contabilidade, verificar que as mesmas se encontram registadas sem interrupções na numeração (ou que essas interrupções estão justificadas). Já o mesmo não se passa no que concerne às guias de remessa visto que após análise aos duplicados ou cópias de guias que constam nos documentos da contabilidade, foi possível verificar que: - a cada factura emitida aos clientes "N.", "D." e "G." corresponde uma guia de remessa cuja cópia ou duplicado se encontram arquivados juntos à respectiva factura. - verificada a sequência das guias de remessa constatou-se que não estão presentes cópias ou justificação para um total de 35 guias de remessa (anexo pags. 25). - as guias cujas cópias se juntam nas págs. 26 e 27 dos anexos, provam que também são usadas guias de remessa em transacções (vendas de ovos) efectuadas no local na exploração (Anexos 26 e 27). As guias de remessa, embora não sejam um meio de prova pleno das transacções, constituem um elemento de análise da contabilidade que aliado a outros serve para aferir da veracidade de que, em princípio, goza a escrita do contribuinte. A existência de guias para as quais não foi emitida factura nem venda a dinheiro, e cujos duplicados não nos foram disponibilizados nem tendo sido justificado o uso dessas mesmas guias, constituem factos que põem em causa a referida veracidade da escrita, e conforme previsto na al. b) do art° 87° e nas alíneas a) e b) do art°88° da LGT, no caso de inviabilizarem o correcto apuramento da matéria colectável poderão dar origem à aplicação de métodos indirectos. Note-se ainda que em declaração do órgão de gestão, datada de 20/11/2005, referindo-se à contabilidade de 2004, é dito que por falta de colaboração por parte da anterior gerência e por falta de acesso aos documentos fundamentais para a elaboração da contabilidade, a empresa dispõe de uma base frágil para a elaboração da contabilidade referente ao exercício de 2004 (anexo, pág. 28). 6 - Análise dos dados relativos à produção e venda de ovos A partir dos documentos arquivados, facturas e vendas a dinheiro, foram apuradas as vendas anuais de ovos em quantidade e valor, relativas a 2003 e 2004. Recolhemos também junto do fornecedor N. as quantidades de ração vendida à A. e os ovos comprados naqueles mesmos nos anos. Foram tratados alguns documentos fornecidos pela gerência em exercício no período posterior a Julho de 2003, entre os quais se encontravam mapas extraídos de computador contendo um conjunto de dados relativos ao resumo semanal da produção de bandos de galinhas. (Vide papeis em anexo, pág. 14 a 24). Os referidos mapas, onde constam várias informações de exploração, nomeadamente, nº de galinhas que constitui cada bando, data de nascimento do bando, mortalidade, produção e consumos semanais, serviriam para o registo das ocorrências ligadas à exploração do negócio, ocorrências de extrema importância para a gestão, mas também para dar resposta às exigências legais ligadas ao sector. A produção evidenciada em alguns mapas, uma vez que nem todos relevam esta informação, é, em alguns meses de 2003, largamente superior aos valores facturados e contabilizados: [imagem que aqui se dá por reproduzida] 7· Análise comparativa dos resultados apresentados Quanto aos resultados apresentados nas Demonstrações Financeiras verifica-se uma redução da margem primária de 2003 ara 2004: [imagem que aqui se dá por reproduzida] Foi apontada como justificação para esta redução o facto de durante o ano de 2004 os preços dos ovos terem sofrido uma queda, enquanto que o preço da ração sofreu um aumento. Para além destes 2 factores não houve qualquer outro de grande relevância que pudesse influenciar estes valores, dado que a actividade foi exercida de uma forma contínua, mantendo as mesmas características (os mesmos métodos e técnicas de produção, a mesma capacidade instalada, o mesmo tipo de matérias primas usado). Vejamos o resultado após eliminar o efeito dos preços nesta margem, fazendo uma comparação não em valor mas sim em quantidade. Usaremos por base o consumo de ração (em toneladas) e a quantidade (em dúzias) de ovos vendidos. (anexo pags. 29 a 33). Em resumo:
Vejamos o resultado após eliminar o efeito dos preços nesta margem, fazendo uma comparação não em valor mas sim em quantidade. Usaremos por base o consumo de ração (em toneladas) e a quantidade (em dúzias) de ovos vendidos. (anexo pags. 29 a 33). Em resumo:
No entanto, se fizermos a comparação, dividindo os resultados de 2003 em dois períodos distintos (períodos com 2 gerências distintas) obtemos os seguintes resultados:
Isto significa que, se tomarmos como base de comparação o 2° semestre de 2003, houve em 2004 uma diminuição injustificada da margem industrial primária em quantidade em cerca de 9,7%. Também constatamos que no 1° semestre de 2003 a margem industrial primária em quantidade foi de cerca de 14% mais baixa que no 2° semestre.”, cfr. fls. 8 a 10 do relatório constantes de fls. 35 a 37 do PA; F) A Inspecção analisando os inventários finais de 2003 e 2004 concluiu pela existência de um excedente de cerca de 26 000 galinhas ao longo do ano de 2003 mas os “mapas de produção… apenas nos fornecem valores sobre a produção de cerca de 97 000 galinhas em 3 pavilhões. Os mapas evidenciam ainda um consumo de ração superior aos dados relativos aos fornecimentos da N.. Considerando o número de galinhas na posse da empresa, as quantidades de ração necessárias para alimentar esse efectivo são em vários meses superiores às quantidades contabilizadas (ver mapas com cálculos de consumo usando os dados técnicos- Anexo pago 61). Tal evidencia que os registos contabilísticos também omitem compras de rações. Em conclusão: Verificada a existência de anomalias e incorrecções na contabilidade, a determinação directa da matéria tributável só é possível de realizar se for possível ter conhecimento das operações e respectivos valores que não se encontram na contabilidade. Como já ficou patente, dada a omissão de vários documentos, tal quantificação não é possível de realizar com base em elementos objectivos… Pelo exposto, propõe-se a determinação do lucro tributável para efeitos de IRC e IVA, nos anos de 2003 e 2004, através da realização de avaliação indirecta nos termos do artigo 90° da Lei Geral Tributária uma vez que se verificam as condições previstas na al. b) do art° 87°, al. a) do art°88° da Lei Geral Tributária.”, idem anterior fls. 10 a 12 do relatório, constante de fls. 37 a 39 do PA; G) E, relativamente aos “V CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS” considerou a Inspecção: “Critérios Os critérios propostos têm como objectivo o apuramento do lucro tributável determinando com recurso a métodos indirectos tendo em conta o disposto no n.º 1 do art° 90° da LGT, determinando assim o valor das vendas e o valor de compras de ração omitidos. Para determinar esses valores propõe-se: • Cálculo das vendas omitidas: O cálculo da produção mensal de ovos para os anos de 2003 e 2004 (para todos os bandos na posse da empresa). - Apurar a diferença entre as quantidades calculadas e as quantidades declaradas. Aplicar a essa diferença os preços mensais mais frequentes para a zona de Viseu obtidos junto do Gabinete de Planeamento e Politica Agro-Alimentar do Ministério da Agricultura (propõe-se o uso destes preços dado que para valorizar vendas cujos clientes se desconhecem esta fonte de informação é a que apresenta uma maior abrangência e credibilidade - Anexo pags. 38 a 43). • Cálculo do acréscimo do custo da ração consumida: - Apurar a quantidade de ração consumida mensalmente para os anos de 2004 e 2005 - Apurar a diferença entre as quantidades calculadas e as quantidades declaradas - Aplicar a essa diferença os preços médios mensais (a informação mais completa sobre os preços deste tipo de produto foi obtida junto da N. - Anexo pags. 32 e 33) À falta de outros elementos credíveis propõe-se como base de cálculo os dados técnicos disponíveis relativos ao tipo de galinhas "Isa Brown". Apesar de na exploração do sujeito passivo serem também usadas galinhas do tipo "Hy-Line", como não é possível distinguir as proporções de cada tipo de galinha usadas, propõe-se a aplicação dos dados disponíveis para o tipo "Isa Brown" por apresentarem valores de produção ligeiramente mais baixos. (anexo pags. 44 a 46) Propõe-se igualmente o uso desses dados para apurar o consumo de ração e a mortalidade das galinhas ao longo do ciclo produtivo. Relativamente aos subprodutos (ovos partidos, ovos sem casca) propõe-se que se aceitem os valores declarados dado que este tipo de produção é comprada por um número restrito de clientes (por ser necessário proceder à sua transformação). Quanto aos cálculos relativos a períodos em que as galinhas têm uma idade superior a 80 semanas, propõe-se que se considere uma diminuição na sua produtividade em 12%, tendo por base informação prestada por profissionais do sector (informação prestada pelo Engº J., funcionário da N., dado que não existem ao momento dados técnicos científicos que quantifiquem essa redução)." Será considerado um período de depena em que as galinhas não efectuem postura. De acordo com os mapas que servem de guia a este procedimento (anexo pág. 47) verifica-se que este período tem uma duração de 39 dias, em que ao 26º já existe consumo de ração GPBE. Por tal, propõe-se que se considere que o início do novo ciclo produtivo à 84ª semana. Quando a venda de um bando no fim do seu ciclo produtivo evidenciar uma mortalidade inferior à considerada, propõe-se como base de cálculo o número de galinhas no final do ciclo para todos os meses em que esse número seja superior ao número calculado. Propõe-se ainda a correcção do Custo das Mercadorias Vendidas dos anos de 2003 e 2004 tendo em consideração a omissão de galinhas detectada no inventário do final de 2003. As quantidades omitidas coincidem com as quantidades compradas em 15-05-2003 (26004 em Factura AV302010011 dos Aviários (…), Lda.). Propõe-se por tal a correcção ao resultado líquido valorizando a omissão do inventário tendo por base os valores desta factura. Para determinação do IVA liquidado em falta propõe-se a utilização dos valores das vendas omitidas apuradas segundo os critérios anteriormente enumerados e a aplicação da respectiva taxa de IVA (5%). …”, vide fls. 13 e segs. do relatório, correspondendo a fls. 40 e segs. do PA; H) Elaborado projecto de relatório foi a Impugnante notificada para, querendo, exercer o direito de audição. Não o exerceu, convertendo-se o projecto em relatório definitivo, superiormente ratificado e comunicado à Impugnante através de carta recebida em 03-08-2007, cfr. fls. 27 a 29, 45, 107 e 108 do PA, estas últimas duplicadas a fls. 39 e 40 destes autos, do processo físico; I) A Impugnante reagiu à comunicação apresentando pedido de revisão o qual veio a ser decidido em 03-10-2007, dada a falta de acordo entre os peritos, “Decido por falta de elementos que, nesta fase, os ponham em causa… manter os valores fixados, …”, vide fls. 109 a 115 e 121 do PA, repetidas a fls. 35 a 38 e 42 a 45 destes autos, do processo físico; J) Na sequência da inspecção e pedido de revisão vindos de referir, a Administração Fiscal emitiu a liquidação adicional em sede de IRC relativa ao ano de 2003 e respectivos juros compensatórios, cuja cópia constitui o doc. nº 1 que instruiu a PI; K) Liquidação emitida em 10-10-2007, tendo dois dias depois se operado compensação, e com data limite de pagamento de 21 de Novembro de 2007, idem anterior e 124 a 127 do PA; L) A petição inicial que deu origem aos presentes autos foi apresentada em 19-02-2008, vide a folha de rosto da PI; M) Os pavilhões referidos em B) só três são usados para as baterias das galinhas poedeiras sendo que os outros dois, sitos no (...), se destinam à recria de frangas. A sua exploração em tempos foi cedida à N., cfr. depoimentos das 1ª e 4ª testemunhas inquiridas que demonstraram conhecer a realidade sobre que depuseram: A 1ª exercia à data as funções de médico veterinário e deslocava-se às instalações da Impugnante com uma periodicidade, em regra, trimestral; a 4ª foi engenheiro agrícola da N.. Atente-se também no demais referido em B); N) As alterações legislativas ocorridas em 2003 e também referidas no ponto 3 da al. B) determinaram o aumento das jaulas/baterias de 450 passou para 550 diminuindo, consequentemente, a capacidade de produção das empresas de produção de ovos, veja-se o depoimento da primeira testemunha; O) As galinhas, embora pudessem começar a postura com 18 semanas a mesma era retardada até às 20, 21, 22 porque o mercado nacional valorizava, nomeadamente nos anos de 2003 e 2004, os ovos de maior tamanho, potenciados pelo referido retardamento da postura, cfr. depoimento da 1ª e 4ª testemunhas. P) A N. e os Aviários (…) pertenciam ao mesmo grupo e a sua autonomização resultou de uma reestruturação corrida nos finais de 2002 e princípios de 2003, vide docs.de fls. 116 a 120 do PA e depoimento da 3ª testemunha, a qual também explicou a sua razão de ciência, enquanto ROC e chamado a intervir, nessa qualidade, na Impugnante; Q) Por via das alterações referidas em N) a Impugnante, com o objectivo de retardar a efectividade de redução da sua capacidade de produção daquela decorrente fez uma encomenda de cerca de vinte e seis mil galinhas à N., ainda no ano de 2002, mas apenas para serem fornecidas no ano seguinte, cf. docs. referidos em P) e depoimento das testemunhas 1ª, 3ª e 3ª;(sic). R) As percentagens, produtividade e outras indicações técnicas descritas pelas empresas produtoras das galinhas de postura utilizadas pela Impugnante raramente são reproduzidas pelas empresas produtoras de ovos, nomeadamente a Impugnante, vide o depoimento da 4ª testemunha. III Factos não provados Não se provaram factos que estejam em contradição com a factualidade provada, ou outros. (…)» Densificação da descrição de um facto julgada provada: Por tal convir a uma mais fácil compreensão deste acórdão, sem qualquer inovação substancial densifica-se a proposição contida na alª I) dos factos provados da sentença recorrida, nos seguintes termos: I) O teor integral da decisão final do procedimento de revisão da matéria tributável foi o seguinte: “Nos termos do n° 6 do artigo 92° da Lei Geral Tributária, cumpre ao órgão competente para a fixação da matéria tributável resolver, na falta de acordo entre os peritos. Analisada a respectiva acta verifica-se. entre outros, o seguinte: 1- O Perito do Sujeito Passivo mantém os argumentos constantes na reclamação apresentada cm termos do Art° 91° da LGT, referindo que no relatório da Inspecção Tributária foi considerado um bando em duplicado, originando, assim, um erro nos cálculos a: apresentados. 2- O Perito da Administração Tributária, depois de analisados os documentos apresentados, verificou que: . - o “sujeito passivo contabilizou duas facturas de compra de galinhas, emitidas por dois fornecedores diferentes que de acordo com o descritivo respeitam a bandos diferentes (tendo em conta a idade das galinhas)" - e "na factura emitida pela N. encontram-se facturadas galinhas e não foi feita qualquer indicação que a mesma respeita a adiantamento nem a mesma foi contabilizada como tal”. Deste modo, não fica provada a duplicação dos bandos, pelo que mantém os valores do relatório da Inspecção. Assim, considerando todos os elementos existentes, relatório da Inspecção Tributária, posição dos peritos, decido, por falta de elementos que, nesta fase, os ponham em causa e nos termos do nº do Art° 92° da LGT, atendendo à posição/defesa do Perito da Administração Tributária, manter os valores fixados em sede de IRC e IVA, nos exercícios de 2003 e 2004”. Cf. a prova documental invocada na referida alínea. Discussão do recurso: Pretende, a Recorrente, que este Tribunal de apelação julgue que o Tribunal recorrido errou no julgamento em matéria de facto e de direito violando os artigos 77º da LGT e art.º 125º do CPA, 90º do CIVA e art.º 87º a 90º da LGT, ao julgar que a AT não fundamentou a decisão de recurso a métodos indirectos na determinação da sua matéria tributável em IRC no ano de 2003. O Juízo da sentença recorrida, quanto a esta matéria, é redutível aos seus seguintes excertos: «(…) Analisando os fundamentos da Impugnação e transmutando-os em questões a resolver, podemos agrupá-los em: Não há decisão expressa a mudar o rumo da tributação da directa para a indirecta não valendo a indicação por remissão para o relatório de inspecção face aos superiores interesses constitucionais; não foi notificada da decisão de aplicação dos métodos indirectos e das liquidações e para exercer a audição antes da liquidação; A Administração Fiscal não fundamentou as suas conclusões pelo que deve manter-se a presunção de veracidade da contabilidade da Impugnante; verifica-se errónea quantificação e manifesto excesso da capacidade contributiva pois, os bandos n.ºs 5 e 6 são o mesmo e foram considerados pela AT como dois bandos distintos; as semanas de produção são menos do que as referidas pela Inspecção e o aproveitamento também é menor do que o referido por aquela; os desperdícios não foram considerados e transformaram-se as vendas marginais, realizadas para além das efectuadas à N. e D., quase em principais; em última ratio requer-se a aplicação da dúvida fundada; A ilegalidade das liquidações também atinge negativamente as relativas aos juros compensatórios. (…) A Administração Fiscal não fundamentou as suas conclusões pelo que deve manter-se a presunção de veracidade da contabilidade da Impugnante; verifica-se errónea quantificação e manifesto excesso da capacidade contributiva pois, os bandos n.ºs 5 e 6 são o mesmo e foram considerados pela AT como dois bandos distintos; as semanas de produção são menos do que as referidas pela Inspecção e o aproveitamento também é menor do que o referido por aquela: Sabemos que as partes divergem sendo que a posição da Fazenda Pública foi defendida também pelo Mº Pº, cfr. já se aludiu no Relatório desta sentença. E o que resulta da factualidade apurada? Aponta para irregularidades na contabilidade, para omissões de documentação e para significativas incongruências na comparação entre períodos contíguos. Mas, se bem atentarmos na totalidade dos fundamentos carreadas para alicerçar o recurso à avaliação, ela tem o seu núcleo fundamental na alegada “existência de um excedente de cerca de 26 000 galinhas ao longo do ano de 2003 mas os “mapas de produção… apenas nos fornecem valores sobre a produção de cerca de 97 000 galinhas em 3 pavilhões. Os mapas evidenciam ainda um consumo de ração superior aos dados relativos aos fornecimentos da N.. Considerando o número de galinhas na posse da empresa, as quantidades de ração necessárias para alimentar esse efectivo são em vários meses superiores às quantidades contabilizadas (ver mapas com cálculos de consumo usando os dados técnicos- Anexo pago 61). Tal evidencia que os registos contabilísticos também omitem compras de rações.”, cfr. a factualidade assente, mormente as conclusões referidas na al. F) E, em parte, as referidas conclusões compreendem-se pois que a documentação apresentada pela Impugnante, nomeadamente em sede de pedido de revisão, para explicar a alegada duplicação dos bandos 5 e 6 não é totalmente esclarecedora. Quiçá por que ela foi o resultado assumido de contornar ou retardar as exigências legais quanto às dimensões das jaulas/baterias. Mas já não se compreende que as referidas conclusões sejam contraditórias com elementos que a própria AT teve como inquestionáveis: - As instalações da Impugnante comportam três pavilhões com capacidade de cerca de 100 mil galinhas (as demais instalações constituídas por dois aviários não reúnem condições para a produção de ovos), inexistindo capacidade efectiva para o aludido excedente de 26 000 galinhas. No bom rigor, a partir de 2003 a capacidade dos pavilhões sofreria uma redução dado o aumento das jaulas/baterias de 450 para 550 como referiu a 1ª testemunha e se consignou na alínea N) dos fatos assentes. A AF não indicou que a Impugnante tivesse ou explorasse outras instalações, para além dos referidos três pavilhões, para explicar a possibilidade efectiva da existência do excedente mencionado; - A ração era fornecida exclusivamente pela N., cfr. ponto 4 da al B) dos fatos (sic) assentes que resulta da transcrição de parte do relatório da inspecção, pelo que se duvidas houvesse a Inspecção deveria indagar junto da fornecedora. Analisando a argumentação da AT facilmente se verifica que a alusão a maior necessidade de ração do que aquela documentada como adquirida derivou da consideração do excedente de 26 000 galinhas. Portanto, independentemente do suporte documental constante da Impugnante há uma desconformidade não susceptível de explicação por exceder a capacidade efectiva da Impugnante. Assim, resulta irremediavelmente abalado o núcleo fundamentador do recurso à avaliação indirecta pelo que, sem necessidade de mais considerações, tem nesta parte de proceder a Impugnação, na medida em que se verifica falta de fundamentação. Falta de fundamentação que determina a anulação da liquidação impugnada. Face à verificação da falta de fundamentação do recurso à avaliação indirecta e suas consequências entendemos como prejudicada a análise das demais questões colocadas pela Impugnante». Cumpre começar por dizer que o Tribunal a quo assestou indevidamente a mira da sua crítica, no que à decisão de recurso aos métodos indirectos concerne, no RIT, sem mais. Com efeito, a decisão cuja legalidade aqui releva para a validade das liquidações adicionais impugnada não é a que directamente decorreu do RIT, mas sim a que pôs termo ao incidente de revisão da matéria tributável movido em devido tempo pela Recorrida (cf. artigos 91º e 92º da ÇGT e 117º do CPPT). Ora, compulsado o teor da decisão final do procedimento de revisão da matéria tributável, verificamos que ela, sim, enferma de falta de fundamentação, daí decorrendo a improcedência do recurso, embora esteja prejudicado o acerto de todo aquele labor da fundamentação de direito da sentença recorrida. Tal é o que nos propomos demonstrar de seguida. Da falta de fundamentação da decisão final do procedimento de revisão da matéria tributável. In casu o valor da matéria tributável foi achado mediante o recurso a métodos indirectos, ao cabo do procedimento de revisão previsto nos artigos 91º e sgs da LGT. Por isso é a decisão deste procedimento que está directamente sob escrutínio, não o RIT, per se. Este só releva se, na medida e nos termos em que, naquela, tiver sido objecto de remissão. Importa, portanto, apreciar se as impugnadas liquidações adicionais de IRC de 2003 e juros compensatórios, na medida em que para elas concorreu a determinação da matéria tributável com recurso aos métodos indirectos mediante a decisão final do procedimento de revisão, que manteve os valores propostos no Relatório, enfermam da insuficiência de fundamentação dessa decisão, sendo certo que tanto bastará para as liquidações serem anuladas. Com efeito, como se escreve no Ac. do STA de 14.11.2011, 0747/11 "[...] 4.2. Especificamente, também a decisão em matéria de procedimento tributário exige sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo essa fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os integrantes do relatório da fiscalização tributária, e devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo (cfr. o art. 77° da LGT). Ou seja, o dever legal de fundamentação deve, em suma, cumprindo as referidas funções endógena e exógena, responder às necessidades de esclarecimento do destinatário (do contribuinte, no presente caso), informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do respectivo acto e permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática. E a violação destes requisitos da decisão implica a respectiva ilegalidade, fundamento de subsequente anulação, em sede de impugnação judicial da correspondente liquidação [...]" Nada obsta, a nosso ver, a que os sobreditos requisitos da fundamentação, no que respeita à decisão final do procedimento de revisão, sejam encontrados no RIT e ou em pareceres emitidos no procedimento, designadamente na posição do perito da AT no debate contraditório pregresso. Aliás, isso é expressamente salvaguardado no artigo 77º nº 1 da LGT, cuja aplicação em caso de fixação da matéria tributável por métodos indirectos os nºs 4 e 5 do mesmo artigo, por compatíveis, não prejudicam. Necessário é, contudo, que essa remissão aconteça, isto é, esteja expressa numa exposição inteligível do iter cognoscitivo e valorativo do autor da decisão, o Director de Finanças. Ora, percorrido o curto texto da decisão final do procedimento de revisão da matéria tributável, acima transcrito, não se topa com remissão alguma, seja para o RIT, seja para anteriores pareceres, designadamente para as declarações do perito da AT, ou qualquer menção no sentido de se assumir a fundamentação destes. Nem mesmo uma remissão tácita se pode considerar existir, já que se alude, a um tempo, sem se explicitar se se opta por alguma delas e porquê, quer ao relatório da Inspecção, quer às posições dos peritos, contraditórias entre si e contraditória, a do perito da parte, com o RIT, sendo certo que é logicamente impossível uma remissão para posições que se excluem mutuamente. Se se quiser entender, ignorando aquela impossibilidade lógica, que há uma remissão implícita para o RIT e os laudos dos peritos, então desemboca-se numa fundamentação contraditória ou, no mínimo, obscura, atenta a incompatibilidade entre o laudo do perito da parte e o RIT, por um lado, e entre os laudos de ambos os peritos, por outro, sem que nada seja dito no sentido de suprir essas contradições. Ora, conforme artigo 125º nº 2 do CPA então aplicável, equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentação obscura ou contraditória. Não havendo, desta feita, exposição congruente dos factos e das valorações, designadamente de direito, que resultaram na manutenção dos valores fixados na decisão de revisão, as liquidações impugnadas são anuláveis por falta de fundamentação. Este Tribunal Central já assim julgou plúrimas vezes relativamente a decisões do procedimento de revisão da matéria tributável literalmente idênticas ou muito semelhantes à aqui sub juditio. Não releva, em sentido oposto, o facto de desta feita se fazer uma alusão ao RIT, uma vez que a mesma é feita nos termos, inaproveitáveis para uma ideia de remissão, acima apontados. Dessas decisões são exemplo os acs. de 7/12/2016, no processo 1206/07.7BEVIS, de 14/10/2021, no processo 5/15.7BUPRT e de 12/4/2018, no processo nº 01228/09.3BEVIS. Deste último transcrevemos o seguinte e esclarecedor segmento: «Tendo presente o acabado de expor, ressalta que a fundamentação adoptada pela Administração Tributária, e os motivos pelos quais considera legalmente justificado o recurso aos métodos indirectos de tributação e respectiva quantificação, se condensaram no despacho do Exmo. Director de Finanças de Viseu, por a liquidação impugnada assentar num acto emanado no procedimento de revisão, mais propriamente, na decisão do Exmo. Director de Finanças, de 07/04/2009, acta n.º 09/09 – cfr. pontos 5 e 6 do probatório. Logo, será este o acto que cumpre analisar. Todavia, como referido supra, a sentença, para concluir pela falta de fundamentação do recurso aos métodos indirectos apreciou, apenas, o relatório inspectivo sem ponderar e relevar, como devia, o despacho do Director de Finanças, acto que esteve na origem da liquidação. E analisado o dito despacho de indeferimento do pedido de procedimento de revisão, constata-se que tal acto não faz qualquer alusão aos factos descritos em sede de procedimento de revisão nem tão pouco apela ao que consta do relatório, não explicando o itinerário cognoscitivo que levou à conclusão ali constante. Releia-se o ali decidido e que se encontra transcrito no ponto 6 dos factos dados como provados “Nos termos do nº 6 do art. 92º da Lei Geral Tributária, cumpre ao órgão competente para a fixação da matéria tributável resolver, na falta de acordo entre os peritos. Assim, considerando que o perito da Administração Tributária defende a manutenção dos valores objecto do pedido de revisão e o perito do contribuinte, sem nada de novo trazer à discussão, defende a manutenção dos valores inicialmente declarados pelo contribuinte, decido, por falta de elementos, que, nesta fase, os ponham em causa, manter os valores fixados, aqui, em discussão.” E, como já apreciado por este TCA Norte, no aresto de 07/12/2016, proferido no processo n.º 1206/07.7BEVIS “(…) a decisão em apreço é um exemplo daquilo que uma fundamentação mais exigente não pode ser, pois que, limita-se a constatar a posição dos peritos, não procedendo a qualquer discussão da realidade em apreço no sentido de justificar a manutenção dos valores em causa, não existindo qualquer remissão para o RIT, nem sequer qualquer referência a este elemento, o que significa que a AT não deu a conhecer à Recorrente os elementos que enquadram a sua decisão nesta sede, impedindo assim a Recorrente de aceitar tal decisão, conformando-se com a mesma, ou de contra a mesma reagir, discutindo o seu alcance.” Assim, encontrando-se o Despacho supra transcrito despojado de qualquer matéria factual, não remetendo sequer para o conteúdo do relatório da Inspecção Tributária, não nos permite descortinar qualquer conteúdo fundamentador, quer quanto aos pressupostos de aplicação do método indirecto, quer em matéria de quantificação da matéria tributável, pelo que padece o mesmo de manifesta falta de fundamentação – cfr., entre outras decisões deste TCAN no mesmo sentido, o Acórdão, de 08/02/2018, proferido no âmbito do processo n.º 550/10.0BEVIS. Face ao supra decidido, impõe-se, desde já, manter a sentença recorrida com a presente fundamentação, negando-se provimento ao recurso.» Os actos impugnados padecem assim, de invalidante vício de falta de fundamentação, em termos que prejudicam a apreciação do RIT, do ponto de vista desse vício ou de qualquer outro e têm por consequência a improcedência do recurso e bem assim a procedência da impugnação, se bem que com esta outra fundamentação. IV – Custas As custas, nas duas instâncias, ficam a cargo da Recorrente conforme decorre do artigo 527º do CPC. V- Dispositivo Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em julgar o recurso improcedente e em manter o dispositivo da sentença recorrida, de procedência da Impugnação, com esta outra fundamentação. Custas pela da Recorrente. Porto, 13/1/2022 Tiago Afonso Lopes de Miranda Cristina da Nova Paula Moura Teixeira |