Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00547/22.8BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/14/2023
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL;
SUBCONTRATADO;
HABILITAÇÃO;
Sumário:I- Conforme sumariado no aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte no aresto de 24.03.2023, tirado no processo nº. 00392/22.0BECBR: “(…) Constitui requisito de habilitação profissional a titularidade de alvarás que demonstrem que os concorrentes estão habilitados a realizar as obras da categoria e classe que virão a ser objecto do contrato de empreitada de obras públicas, tendo os concorrentes que ser titulares desses alvarás logo no momento em que apresentam as suas propostas , sob pena de exclusão; ainda que possa o adjudicatário socorrer-se dos alvarás ou certificados de empreiteiros de obras públicas de subcontratados, seria esvaziar a exigência aceitar proposta que ficasse no vazio de indefinição por recurso a subcontratado não identificado; terá a “proporção” de exigência de ser extensível a subcontratado, sem “entorse”, respeitando o fim injuntivo da proposição inicial, o que implica a sua identificação na proposta, e aquando apresentação desta. (…)”.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

* *
I – RELATÓRIO
1. [SCom01...], LDA., Contra-interessada nos autos à margem referenciados de AÇÃO DE CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL em que é Autora [SCom02...], S.A., e Réu MUNICÍPIO ..., vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que (i) anulou o “(…) o acto de adjudicação do contrato concursado à Contra-interessada «[SCom01...], Lda.», praticado em 15.11.2022 pelo R. MUNICÍPIO ..., e todos os actos dele consequentes, assim como o contrato entretanto outorgado (…)”; e (ii) condenou o Réu “(…) a adjudicar à A. «[SCom02...], S.A.» o contrato concursado (…)”.
2. Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
(1) O presente recurso é interposto da douta sentença de fls., datada de 28 de abril de 2023, que julga procedente a acção e, além do mais, «anul[a] do acto de adjudicação do contrato concursado à Contra-interessada (.), praticado em 15.11.2022 pelo R. MUNICÍPIO ..., e todos os actos dele consequentes, assim como o contrato entretanto outorgado», «conden[ando] o R. a adjudicar à A. “[SCom02...], S.A.” o contrato concursado»;
(2) Salvo o devido respeito, pensa-se que o Tribunal a quo não fez boa interpretação e aplicação dos factos e do direito;
(3) Cingido ao essencial, o problema que se discute nos presente autos é o de saber qual o momento procedimental devido para a comprovação dos requisitos de habilitação, concretamente, (i) se é o da fase pós adjudicatória - conforme parece resultar, cristalinamente, da sistemática do Código dos Contratos Públicos, v. artigos 57° e 77°/2.a) -, ou, pelo contrário, conforme vem sendo esboçado numa certa “deriva jurisprudencial” (designadamente, e como expressamente reconhece, pelo próprio signatário da decisão sindicada), (ii) se a habilitação deve ser comprovada logo na apresentação da proposta - em particular, sendo este um aspeto determinante na interpretação jurídica que se impõe, e que o Tribunal a quo parece ignorar em absoluto, quando, face aos elementos existentes, não exista resquício de razão para antecipar qualquer juízo sobre uma conjeturada falta de habilitação do adjudicatário, por esta poder fazer-se, nos termos mais lineares do regime legal instituído, com recurso a habilitações complementares de terceiros;
(4) Aliás, assim enunciada a questão dos autos, impõe-se, desde logo, uma conclusão preliminar: com ressalva do devido respeito, pensa-se que a decisão a quo assenta num clamoroso entendimento contra legem, que faz “tábua rasa” de uma das principais “bandeiras” de novidade do regime transposto para o nosso ordenamento jurídico pelo Código dos Contratos Públicos, face ao Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas (RJEOP), aprovado pelo Decreto-Lei n° 59/99, de 2 de março (v. artigos 67° a 70°) - ou seja, precisamente, a separação entre as formalidades da apresentação da proposta (exigíveis a todos os concorrentes, interessados ou convidados) e as formalidades pós-adjudicatórias, incluindo a habilitação (portanto, nesse âmbito, estritamente exigíveis ao concorrente cuja proposta tenha sido escolhida, isto é, ao adjudicatário);
(5) O prazo fixado para a apresentação das propostas «deve ser exclusivamente dedicado à preparação de uma boa declaração negocial com condições contratuais atrativas para a entidade adjudicante»;
(6) O sistema europeu, entretanto, consagrado na nova Diretiva 2014/24 (cf. artigo 59°/4) aplaudindo e reconhecendo o regime português, assente na autonomia do sistema binominal proposta-habilitação, introduziu um mecanismo de equilíbrio, através do qual se confere às entidades adjudicantes, após a apresentação das propostas, e mediante motivo justificado, exigir aos concorrentes a comprovação de requisitos de habilitação;
(7) Neste sentido, «será ilícita - tornando anuláveis tanto a peça procedimental que o refira quanto o acto de exclusão que aplique essa exigência - a cláusula do programa ou do convite que determine a obrigatoriedade de qualquer concorrente apresentar um documento de habilitação no momento da apresentação da proposta»;
(8) Por maioria de razão, será ilícita, e geradora de anulabilidade, a exclusão de uma proposta quando (i) nem o programa do concurso exigisse a apresentação de documentos de habilitação com a proposta (o que seria ilegal...), (ii) nem a entidade adjudicante tenha exigido essa apresentação, na fase pré-adjudicatória.
Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, com o que, V. Excelências, Senhores Desembargadores, farão Justiça! (…)”.
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3. Notificada que foi para o efeito, a Recorrida [SCom02...], S.A. produziu contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “(…)
A) Por sentença proferida nos autos foi julgada procedente a ação intentada pela Autora/Recorrida, que em consequência determinou a anulação da deliberação do Réu - MUNICÍPIO ... do acto de adjudicação do contrato concursado à Contrainteressada “[SCom01...], Lda.” no âmbito da empreitada de “Requalificação da Escola EB1 e da Educação Pré- Escolar de ...” , tendo determinado a anulação de todos os actos subsequentes incluindo o contrato entretanto outorgado e condenado o Réu a adjudicar o contrato concursado à Autora “[SCom02...], S.A.”.
B) Não se conformando com esta decisão, a Contrainteressada/recorrente veio interpor recurso para este Venerando Tribunal, questionando a bondade da matéria de facto que foi dada como provada e não provada e as consequências que daí se deveriam retirar no seu entender e mais apontando a errada aplicação do direito aos factos pelo tribunal a quo.
C) Em síntese alega a Contrainteressada/recorrente que: “ o Tribunal a quo parece aflorar uma diversidade de questões jurídicas despiciendas para o caso (por exemplo, quando, fazendo uso do armamentário, a exigência de o concorrente instruir a sua proposta com a declaração de preços parciais prevista no n° 4 do artigo 60° do CCP surge confundida com a exigência de instruir a proposta com um alvará de empreiteiro...) -, o problema que se discute nos presentes autos é o de saber qual o momento procedimental devido para a comprovação dos requisitos de habilitação, concretamente, (i) se é o da fase pós adjudicatória - conforme parece resultar, cristalinamente, da sistemática do Código dos Contratos Públicos, v. artigos 57° e 77°/2.a) -, ou, pelo contrário, conforme vem sendo esboçado numa certa “deriva jurisprudencial” (designadamente, e como expressamente reconhece, pelo próprio signatário da decisão sindicada), (ii) se a habilitação deve ser comprovada logo na apresentação da proposta - em particular, sendo este um aspeto determinante na interpretação jurídica que se impõe, e que o Tribunal a quo ignora em absoluto, quando, face aos elementos existentes, não exista resquício de razão para antecipar qualquer juízo sobre uma conjeturada falta de habilitação do adjudicatário, por esta poder fazer-se, nos termos mais lineares do regime legal instituído, com recurso a habilitações complementares de terceiros.
D) E acrescenta, no entendimento, “ A exigência da comprovação dos requisitos de habilitação (apenas) na fase pós adjudicatória - portanto, (apenas) pelo adjudicatário, e não por todos os concorrentes - traduz-se num traço de regime inovador e caracterizante do Código dos Contratos Públicos, conforme sublinha - de forma transversal e, aparentemente, inequívoca - a nossa doutrina mais autorizada e jurisprudência. Concluindo, “no sentido da antecipação (ilegal) da habilitação - e do necessário enquadramento da questão.” (sublinhado e negrito nosso)
E) Porém, salvo o devido respeito, no nosso humilde entendimento, não assiste qualquer razão à contrainteressada/recorrente quanto ao que alega.
F) Pois que, o que está em causa nos presentes autos não é o de saber qual o momento procedimental devido para a comprovação dos requisitos de habilitação, concretamente, (i) se é o da fase pós adjudicatória ou se a habilitação deve ser comprovada logo na apresentação da proposta - em particular” mas antes, a falta de apresentação de um documento na proposta da Contrainteressada/Recorrente, que era exigido no programa de procedimento, designadamente, o “ Documento com a indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondem às habilitações contidas nos alvarás, ou nos certificados ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I.P. (IMPIC, I. P.), nos termos da portaria referida no n° 2 artigo 81 do CCP, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.” exigido no ponto 7.1.3.4 do Programa do Concurso, e que a Contrainteressada/Recorrente não observou.
G) Com resulta da douta sentença em recurso “O Programa do Concurso estipulava, no seu ponto 7.1.3, que as propostas deveriam ser constituídas “pelos documentos que contenham os termos ou condições relativas a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule (...) ”, entre os quais se conta “Documento com a indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondem às habilitações contidas nos alvarás, ou nos certificados ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I.P.), nos termos da portaria referida no n° 2 artigo 81 do CCP, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.” - ponto 7.1.3.4 do Programa do Concurso.”
H) No caso, estabelecia-se expressamente no ponto 7.1.3.4 do citado ponto 7 do Programa de Procedimento e impunha-se a cada concorrente a obrigação de fazer acompanhar a proposta com o “d) Documento com a indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondem às habilitações contidas nos alvarás, ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo instituto da construção e do imobiliário, I.P, nos termos da portaria referida no n.° 2 do artigo 81.°, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.
I) Da análise da proposta da concorrente - [SCom01...], Lda. - é possível constatar que a mesma não cumpriu com o exigido no ponto 7.1.3 - subponto 7.1.3.4 do ponto 7 do Programa de Concurso “ Documentos da Proposta” - porquanto não possui alvará para a 4.a Categoria (Instalações Elétricas e Mecânicas) - 14a Subcategoria (Redes e Ramais de distribuição de gás, instalações e aparelhos a gás) e
J) Por outro lado, também não indica os alvarás de empreiteiros de obras públicas a subcontratar com as autorizações exigidas, bem como declaração de compromisso dos referidos empreiteiros para a execução dos trabalhos relacionados com as referidas habilitações - pelo que, a proposta da concorrente - [SCom01...], Lda. - não cumprindo com o disposto ponto 7 subponto 7.1.3 - subponto 7.1.3.4 do Programa de Concurso, deveria ser excluída com fundamento no disposto na aliena a) do n.° 2 do Art. 70° do CCP conjugado com as alíneas b) e c) do Art. 57° do CCP.
K) Contrariamente ao alegado pela Contrainteressada/Recorrente, tal documento era exigido aquando da apresentação das propostas e não apenas na fase de habilitação como agora tenta inculcar, tanto mais que constava do ponto 7.1.3.4 do ponto 7 do Programa de Procedimento como documento que deveria constituir a proposta.
L) Porém, a Contrainteressada, não era, sequer, detentora de um alvará de obras públicas com a 14ª subcategoria da 4.a Categoria - Redes e Ramais de distribuição de gás, instalações e aparelhos a gás - nem indicou qualquer subempreiteiro que as detivesse, e nessa medida, deveria ter sido excluída ao abrigo do 70°, n.° 2 al. a) do CCP - atento o ponto 7.1.3.4 do ponto 7 do Programa de Concurso, que assim o exigia enquanto documento apresentar na sua proposta.
M) É que, objetivamente, a Contrainteressada/Recorrente, na altura da apresentação das propostas, não possuía as habilitações exigidas no programa de concurso para a realização desta empreitada.
N) Sem do que, a entidade adjudicante exigiu que os concorrentes, logo nas suas propostas indicassem as suas habilitações para executar os trabalhos previstos, por referência aos preços parciais dos mesmos.
O) Sendo que, além da descrição dos preços parciais dos trabalhos a executar, os concorrentes tinham que, nas suas propostas, comprovar as suas habilitações para os executar.
P) Claro está, que as concorrentes o poderiam fazer por referência a entidades a subcontratar para essa execução nos termos do Art.° 3°, n° 2 da Portaria n.° 372/2017, de 14 de dezembro e do Art.° 20° n.° 3 da Lei n.° 41/205, de 3 de junho - contudo teriam de comprovar a respetiva habilitação logo na fase de apresentação das propostas.
Q) Devendo nesse caso a concorrente que pretendesse socorrer-se das habilitações dos empreiteiros a subcontratar, identificar logo na fase de apresentação de propostas qual a entidade a pretendia subcontratar e qual a classe de habilitações que a mesma detinha, para que se pudesse concluir que no caso detinha a classe de habilitações necessária para executar os trabalhos em apreço, o que não sucedeu.
R) No entanto, a Contrainteressada/Recorrente “ [SCom01...], Lda.” não possuía alvará para a 14ª subcategoria da 4ª categoria - Redes e Ramais de distribuição de gás, instalações e aparelhos a gás - nem identificou qualquer empreiteiro que as detivesse.
S) Pelo que, a proposta da concorrente - [SCom01...], Lda. - não cumprindo com o disposto no ponto 7.1.3.4 do ponto 7 do Programa de Concurso deverá ser excluída com fundamento no disposto na aliena a) do n.° 2 do Art. 70° do CCP conjugado com as alíneas b) e c) do Art. 57° do CCP.
T) Motivo, pelo qual, a douta Sentença recorrida, não merece qualquer reparo ou censura.
U) No concurso sub specie, um dos documentos exigidos pela entidade adjudicante a ser apresentado com as propostas pelos concorrentes, era precisamente o “documento com a indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondem às habitações contidas nos alvarás, ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo instituto da construção e do imobiliário, I.P., nos termos da portaria referida no n.° 2 do artigo 81.°, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações”.
V) Desta forma, a entidade adjudicante exigiu que os concorrentes, logo nas suas propostas, indicassem as suas habilitações para executar os trabalhos previstos, por referência aos preços parciais dos mesmos.
W) Isto é, além da descrição dos preços parciais dos trabalhos a executar, os concorrentes tinham que, nas suas propostas, comprovar as suas habilitações para os executar, sendo certo que o poderiam fazer por referência a entidades a subcontratar para essa execução (ao abrigo do disposto no art.° 3°, n.° 2 da Portaria n.° 372/2017, de 14 de dezembro e do art.° 20°, n.° 3 da Lei n.° 41/2015, de 3 de junho), comprovando, claro está, a respetiva habilitação.
X) Pelo que, é contraditório, vir a contrainteressada/recorrente dizer agora que “A exigência da comprovação dos requisitos de habilitação (apenas) na fase pós adjudicatória - portanto, (apenas) pelo adjudicatário, e não por todos os concorrentes - traduz-se num traço de regime inovador e caracterizante do Código dos Contratos Públicos. (...) Portanto, a apresentação do alvará é exigível ao adjudicatário, e não aos concorrentes, porque assim decorre, por imperativo legal expresso, do regime que se consagra no artigo 81 °/2 do CCP e 3°/1 e 2 da Portaria n° 372/2017, de 14 de dezembro.”
Y) Pois, que, se efetivamente assim fosse, então naturalmente que a entidade adjudicante não o faria constar do programa de concurso da relação de documentos apresentar com a proposta.
Z) Concordamos, assim, inteiramente com o vertido na douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, que deverá ser inteiramente mantida,
AA) Porquanto, não colhe a argumentação, agora aventada pelo Contrainteressada/recorrente “A exigência da comprovação dos requisitos de habilitação (apenas) na fase pós adjudicatória - portanto, (apenas) pelo adjudicatário, e não por todos os concorrentes - traduz-se num traço de regime inovador e caracterizante do Código dos Contratos Públicos.
BB) Nem a Contrainteressada/Recorrente, logrou esclarecer de que forma pretende comprovar em sede de habilitações - que detém as classes de habilitação exigidas no Programa de Procedimento, quando não possuía a categoria exigida no Programa de Concurso, nem identifica na sua proposta os subempreiteiros a que pretende recorrer, que pudessem deter tais classes de habilitações que o mesmo não detém, de modo a poder aproveitar das mesmas ou sequer junta declaração de compromisso dos referidos empreiteiros/subempreiteiros para a execução dos trabalhos relacionados com as referidas habilitações.
CC) De acordo com o próprio programa do procedimento aquele específico documento, constitui um atributo da proposta.
DD) Para a lei só há atributo quando esteja em causa um qualquer aspeto (minimamente relevante) da execução do contrato sobre o qual a concorrência é chamada a oferecer a sua prestação, a sua proposta propriamente dita.
EE) Constituindo, assim, um elemento essencial do conteúdo da proposta, os atributos são naturalmente o primeiro dos seus elementos abrangidos pelo princípio da intangibilidade, ou seja, da sua imodificabilidade após a respetiva apresentação e até ao termo da fase de adjudicação, não sendo suscetíveis de alteração pelos concorrentes.
FF) Também por essa razão, não colhe a argumentação, agora aventada pela Contrainteressada/recorrente “de que este documento apenas seria a apresentar na fase de habilitação do concurso ” pois que, tal representaria, desde logo, uma clara violação do principio da intangibilidade/imodificabilidade da proposta - uma vez que, a concorrente - [SCom01...] - nunca chegou a identificar qual a empreiteira para a execução daqueles trabalhos.
GG) Portanto, o Alvará contendo aquelas concretas classes de habilitações, era um documento exigido em sede do Programa de Procedimento e ao qual cada um dos concorrentes se deveria vincular a realizar.
HH) Pelo que, a proposta da concorrente - [SCom01...] - não cumprindo com o disposto ponto 7 do Programa de Concurso deverá ser excluída com fundamento no disposto na aliena a) do n.° 2 do Art. 70° do CCP conjugado com as alíneas b) e c) do Art. 57° do CCP - - como corretamente se concluiu na douta sentença recorrida
II) Resulta do disposto no Art. 8° da Lei n.° 41/2015 de 3 de junho “Adequação das habilitações Sem prejuízo do disposto nos artigos 19.° e 20°, nos procedimentos de formação de contratos de empreitadas de obras públicas, a empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela, respeitante aos trabalhos mais expressivos da mesma, sem prejuízo da exigência de habilitação noutras classes e subcategorias relativas às restantes obras e trabalhos a executar.”
JJ) Pelo que, a Contrainteressada deveria estar habilitada com alvará para a categoria e subcategorias exigidas, ainda que o fosse por recurso a subempreiteiras por si contratadas, logo na fase de apresentação das propostas, tal como era exigido no Programa de Procedimento a todos os candidatos e não apenas na fase de habilitação.
KK) Como bem se refere na douta Sentença do Tribunal a quo , com a qual concordamos inteiramente “...não colhe a argumentação do R. e da Contrainteressada de que este documento apenas seria a apresentar na fase de habilitação do concurso. Em primeiro lugar, porque foi o próprio R. que se vinculou, no Programa do Concurso, a exigir dos concorrentes que os mesmos instruíssem as suas propostas com aquele específico documento. Em segundo lugar, porque não se pode confundir habilitações profissionais para o exercício de uma actividade profissional ou de serviços, com o conceito específico de habilitação a que alude o Capítulo VIII do Título II da Parte II do CCP, que visa a habilitação pessoal do adjudicatário e que se destina a apurar se este está habilitado a celebrar o contrato, por não se encontrar impedido de o fazer (por não se verificar em relação a si nenhuma situação de impedimento nos termos do art.° 55° do CCP) - neste sentido, vd. Pedro Costa Gonçalves, in “Direito dos Contratos Públicos”, 4a edição, Almedina, 2020, pág. 774.
Porém, no caso, o documento exigido pelo R. no ponto 7.1.3.4 do Programa do Concurso visava apurar se os concorrentes (ou as entidades que indicariam subcontratar), e não o adjudicatário, dispunham de habilitações profissionais para executar os trabalhos previstos. Pretendia, por isso, uma vinculação dos concorrentes nesse sentido. Daí exigir a apresentação de um específico documento contendo tais informações.” (negrito nosso)
LL) Como refere Pedro Costa Gonçalves “Distinguimos duas categorias de requisitos: os requisitos gerais, exigidos para todos os contratos e em todos os procedimentos, e os requisitos especiais, requeridos nos procedimentos de formação de certos contratos (v.g., contratos cuja execução reclama habilitações específicas) e nos procedimentos de adjudicação que integrem uma fase de prévia qualificação. Em todos os casos, trata-se de condições jurídicas de participação no procedimento relacionadas com a situação pessoal do interessado: se não as cumprir, o interessado não pode participar. Se, ainda assim, participar, mediante a apresentação de uma candidatura ou proposta, a falta da condição requerida determina, em termos práticos, a «exclusão do concorrente» ou do «candidato...” (....) titularidade de alvará emitido pelo IMPIC, I.P. contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar, conforme exigido pelas peças concursais aprovadas pelo R. [concretamente, no ponto 7.1.3.4 do ponto 7 do Programa do Concurso], assume-se, no presente caso, como um verdadeiro requisito especial de participação no procedimento concursal, isto é, para poder concorrer, e não apenas como uma mera exigência para a habilitação do adjudicatário.
MM) Resulta do disposto nas alíneas b) e c) do n.° 1 do Art. 57° do CCP “ A proposta é constituída pelos seguintes documentos: (....) c) Documentos exigidos pelo programa de procedimento ou convite que contenham termos ou condições relativas a aspetos da execução do contrato não submetido à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule.”
NN) Em termos das peças concursais, era exigível aos concorrentes, em sede de atributos da proposta, a apresentação de um documento com a proposta no ponto do ponto7.1.3.4 do ponto 7 - a apresentação de “Documento com a indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõem executar correspondam às habilitações contidas nos alvarás, ou certificados ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I.P. (IMP, IP), nos termos da portaria referida no n.° 2 artigo 81° do CCP, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações." (...)
OO) Por sua vez, resulta do disposto no Art. 70° n.° 2 al. a) do CCP “ 2. São excluídas as propostas cuja análise revele: a) Que não apresentam algum dos atributos ou algum dos termos ou condições nos termos, respetivamente, do disposto nas alíneas b) e c) do n.° 57.°.’’
PP) Dispõem ainda a al. d) do n.° 2 do Art. 146° do CCP “ No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor , fundamentadamente, a exclusão das propostas: (...) d) Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto nos n.° 1 e 2 do artigo 57°;” - impondo da mesma forma a exclusão da proposta da concorrente - [SCom01...].
QQ) No mesmo sentido, o teor do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte no âmbito do Proc. n. 01093/17.7 BEAVR, de 4 de maio de 2018 da Relatora Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão - que em síntese conclui como se transcreve: “I.2- os requisitos de habilitação devem existir logo no momento da apresentação da proposta e durar até à celebração do contrato (no mínimo, até ao momento da apresentação dos documentos de habilitação) não se admitindo, portanto, a participação de um concorrente que só venha a ter alvará à data da adjudicação ou da apresentação dos documentos de habilitação; “ (sublinhado nosso).
RR) Também, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul - Proc. n.° 10404/13 Secção CA -2° Juízo de 07.11.2013 - da Relatora Cristina dos Santos - sobre Requisitos de Habilitação - Exclusão da Proposta - como se transcreve “ 1. Os requisitos de habilitação não são exigíveis apenas ao adjudicatário, mas a todos os concorrentes. 2. A falta de alvarás, certificados, títulos de registo, etc., exigidos no programa do procedimento em razão de previsão normativa legal ou regulamentar, que habilitam ao exercício da atividade inerente à execução das prestações contratuais detetada antes da adjudicação ou, mesmo, antes da conclusão da fase de análise e avaliação de propostas, implica a exclusão da proposta do concorrente em falta.”
SS) Mais recentemente, também o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte - Proc. 233/20.3BECTB-Viseu, concluiu pelo seguinte “ Ora, não tendo procedido a essa indicação, de forma completa e integral, a Contrainteressada não instruiu devidamente a sua proposta com um documento que deveria conter um termo ou condição relativo a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos, aos quais a entidade adjudicante pretendeu que os concorrentes se vinculassem. Assim, não tendo a Contra-interessada indicado, na sua proposta, ser titular de alvará de construção que a habilitasse à realização das obras abrangidas pelas 2a, 9a e 12a subcategorias da 4a categoria - Instalações elétricas e mecânicas, nem indicando a entidade que iria subcontratar para a execução dos respetivos trabalhos ou sequer indicando ser essa entidade titular de alvará de construção que a habilitasse a executá-los, impunha-se ao R. excluir a sua proposta, nos termos do previsto na alínea a) do n.° 2 do art.° 70° do CCP. [negrito e sublinho nosso]
TT) Que Conclui e “1 - Os requisitos de habilitação elegidos pela entidade adjudicante no âmbito do Programa do Procedimento, são exigíveis não apenas ao adjudicatário, mas a todos os concorrentes, os quais devem ser passíveis de ser aferidos logo com a apresentação das suas propostas. (...) 3 - Da concatenação dos pontos 9.4 e 12 alínea d) do Programa do Procedimento, resulta inequívoco que quem não evidencie a titularidade de alvará contendo as devidas autorizações e por referência às classes a que se reportavam os preços parciais, demonstra a insuficiência da sua proposta, e assim a inevitabilidade da sua exclusão face ao disposto no artigo 57.°, n.° 1, alínea c) do CCP. ( sublinhado e negrito nosso)
UU) Do mesmo modo, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, in Concursos e outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina, 2016, p. 493 e segs. "... na fase da qualificação dos candidatos exige-se logo, com a apresentação da candidatura, a apresentação dos compromissos de subcontratados [vide artigo 168.°/4 do CCP], pelo que, aquando da apresentação da proposta, o concorrente tenha de apresentar as declarações de compromisso subscritas pelos subcontratados “.
VV) Tais circunstâncias factuais, constituem irregularidades, violadoras do disposto nas alienas a) do n.° 2 do Art. 70° do CCP conjugado com as alíneas b) e c) do Art. 57°, do no n.° 2 artigo 81.° todos do CCP, do disposto no Art. 3° da Portaria n° 372/2017 de 14 de dezembro, do disposto no artigo 8.° da Lei n.° 41/2015 de 3 de junho e do próprio Programa de Concurso.
WW) Por outro lado, a jurisprudência que decorre, designadamente, dos arrestos citados no Recurso sob resposta, nomeadamente, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 23-06-2022, proferido no processo n° 393/21.6BEBJA, bem como o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18-11-2021, proferido no processo n° 0452/20.2BEALM não tem qualquer aplicação no caso dos autos, pois que, nos citados arestos não só não estava em causa a falta de titularidade de determinado alvará de obras públicas, como a apresentação do alvará contendo habilitações especificas não era exigido no programa de procedimento como documento a integrar nas propostas pelos concorrentes, mas recaiam apenas, sobre o momento da apresentação dos documentos de habilitação.
XX) Como já vem demonstrado, a Contrainteressada não possuía alvará de construção que a habilitasse à realização das obras abrangidas pela 14ª subcategoria da 4a categoria - Redes e Ramais de distribuição de gás, instalações e aparelhos a gás, nem indicou a entidade que iria subcontratar para a execução dos respetivos trabalhos ou sequer indicando ser essa entidade titular de alvará de construção que a habilitasse a executá-los, impunha-se à Ré excluir a sua proposta, nos termos do previsto na alínea a) do n.° 2 do art.° 70° do CCP
YY) Assim, a decisão, pelo R, de adjudicação da empreitada à contrainteressada - [SCom01...] - é em si ilegal, por violar aquelas disposições legais e procedimentais atrás referidas, que determinam a exclusão da proposta apresentada pela Recorrente e a adjudicação da empreitada à Autora, classificada em segundo lugar (…)”.
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4. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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5. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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6. Com dispensa de vistos prévios, cumpre apreciar e decidir.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
7. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
8. Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir é a de determinar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito, por fazer “(…) “tábua rasa” de uma das principais “bandeiras” de novidade do regime transposto para o nosso ordenamento jurídico pelo Código dos Contratos Públicos, face ao Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas (RJEOP), aprovado pelo Decreto-Lei nº 59/99, de 2 de março (v. artigos 67º a 70º) – ou seja, precisamente, a separação entre as formalidades da apresentação da proposta (exigíveis a todos os concorrentes, interessados ou convidados) e as formalidades pós-adjudicatórias, incluindo a habilitação (portanto, nesse âmbito, estritamente exigíveis ao concorrente cuja proposta tenha sido escolhida, isto é, ao adjudicatário (…)”.
9. É na resolução de tal questão que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
10. A matéria de facto pertinente é a dada como provada na sentença «sub censura», a qual aqui damos por integralmente reproduzida, como decorre do art. 663º, n.º 6, do CPC.
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III.2 - DO DIREITO
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11. A Autora intentou a presente ação de contencioso pré-contratual, peticionando o provimento do presente meio processual por forma a ser anulado o ato adjudicatório do procedimento concursal visado nos autos e o Ré condenado a adjudicar a proposta por si apresentada.
12. Estribou tais pretensões jurisdicionais no pressuposto da ilegalidade da admissão da proposta da Contra-interessada, aqui Recorrente, em virtude desta não integrar o documento exigido na alínea d) do ponto 12 do Programa do Concurso, não possuindo alvará para a 14ª subcategoria da 4ª categoria, assim como não indicar o alvará do empreiteiro de obras públicas a subcontratar com as autorizações exigidas e a declaração de compromisso do referido empreiteiro para a execução dos trabalhos relacionados com as referidas habilitações, em clara contravenção do disposto nos artigos 57º, n.º 1, alíneas b) e c), 70º, n.º 2, alínea a) e 146º, n.º 2, alíneas d) e o) do CC.
13. O Tribunal a quo, como sabemos, julgou procedente a presente ação, tendo reconhecido as pretensões da Autora.
14. A ponderação de direito convocada para arrimar o juízo de procedência da presente ação foi, sobretudo, o seguinte: “(…)
Conforme resulta do probatório [pontos 1. e 2.],o procedimento concursal em causa destinou-se à contratação de empreitada de obras públicas destinada à “Requalificação da Escola EB1 e da Educação Pré-Escolar de ...”.
O Programa do Concurso estipulava, no seu ponto 7.1.3, que as propostas deveriam ser constituídas “pelos documentos que contenham os termos ou condições relativas a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule (.)”, entre os quais se conta “Documento coma indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondem às habilitações contidas nos alvarás, ou nos certificados ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I. P.), nos termos da portaria referida no n° 2 do artigo 81 do CCP, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.” - ponto 7.1.3.4 do Programa do Concurso.
Em sede de audiência prévia, a A. alertou o Júri no sentido de que a Contra-interessada não havia apresentado com a sua proposta tal documento, não possuindo alvará para a 14ª subcategoria (redes e ramais de distribuição de gás, instalações e aparelhos a gás) da 4ª categoria (instalações elétricas e mecânicas).
Mais alegou a A. em audiência prévia que a proposta da Contra-interessada não indica o alvará dos empreiteiros de obras públicas a subcontratar com as autorizações exigidas bem como declaração de compromisso dos referidos empreiteiros para a execução dos trabalhos relacionados com as referidas habilitações.
A tal invocação, respondeu o Júri no Relatório Final, referindo que solicitou parecer jurídico à CCDR Centro, o qual foi emitido no sentido de que “Não determina a exclusão da proposta, ao abrigo da alínea d) do n° 2 do artigo 146° do CCP, a não apresentação pelo concorrente da declaração de compromisso de subempreiteiro, devendo esta ser apenas exigível na fase de habilitação, nos termos do artigo 3° da Portaria n° 372/2017, por remissão do n° 2 do artigo 81° do CCP.”.
E, sustentado em tal parecer, o Júri considerou que apesar de a Contra-interessada não possuir as autorizações correspondentes à 14ª subcategoria da 4ª categoria, pode socorrer-se de alvarás de empreiteiros de obras públicas subcontratados, mediante declaração nos termos do n.° 2 do art.° 3° da Portaria n.° 372/2017, de 14 de dezembro, em sede de habilitação, nos termos do n.° 2 do art.° 81° do CCP. E, assim, concluiu pela manutenção da admissão da proposta da Contra-interessada e da ordenação das propostas feita em sede de Relatório Preliminar.
Entendimento que a entidade adjudicante subscreveu, ao aprovar o Relatório Final, e que sustenta na contestação deduzida na presente acção, entendimento sufragado também pela própria Contra-interessada visada.
Porém, não assiste razão ao R. e à Contra-interessada.
Desde já se refere, que a razão está inteiramente do lado da A., que correta e lapidarmente refere, entre o mais, a jurisprudência formada no processo n.° 233/20.3BECTB produzida pelo Tribunal Central Administrativo Norte no seu Acórdão de 05.02.2021, pelo qual foi integralmente confirmado o juízo formulado por este Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, e pelo ora signatário, num processo que apresentava contornos, quer de facto quer de direito, absolutamente idênticos aos dos presentes autos e que, portanto, é aqui de seguir e reiterar.
Vejamos então.
Conforme preceitua o art.° 56° do CCP, no seu n.° 1, “a proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo”.
Sendo que, “para efeitos do presente Código, entende-se por atributo da proposta qualquer elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos” - é o que estipula o n.° 2 do art.° 56° do CCP.
Já o art.° 57° do CCP, sob epígrafe “documentos da proposta”, determina o seguinte:
“1 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
a) Declaração do anexo i ao presente Código, do qual faz parte integrante;
b) Documentos que, em função do objecto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;
c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento ou convite que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule;
d) (Revogada.)
2 - No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, a proposta deve ainda ser constituída por:
a) Uma lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstas no projecto de execução;
b) Um plano de trabalhos, tal como definido no artigo 361.°, quando o caderno de encargos seja integrado por um projecto de execução;
c) Um estudo prévio, nos casos previstos no n.° 3 do artigo 43.°, competindo a elaboração do projecto de execução ao adjudicatário.
3 - Integram também a proposta quaisquer outros documentos que o concorrente apresente por os considerar indispensáveis para os efeitos do disposto na parte final da alínea b) do n.° 1.
4 - Os documentos referidos nos nºs. 1 e 2 devem ser assinados pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
5 - Quando a proposta seja apresentada por um agrupamento concorrente, os documentos referidos no n.° 1 devem ser assinados pelo representante comum dos membros que o integram, caso em que devem ser juntos à proposta os instrumentos de mandato emitidos por cada um dos seus membros ou, não existindo representante comum, devem ser assinados por todos os seus membros ou respectivos representantes.
6 - Nos procedimentos com publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia, é apresentado, em substituição da declaração do anexo i do presente Código, o Documento Europeu Único de Contratação Pública. ”
Ora, no concurso sub specie, um dos documentos exigidos pela entidade adjudicante a ser apresentado com as propostas pelos concorrentes, era precisamente o “documento com a indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondem às habitações contidas nos alvarás, ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo instituto da construção e do imobiliário, I.P., nos termos da portaria referida no n.° 2 do artigo 81.°, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações”.
Desta forma, a entidade adjudicante exigiu que os concorrentes, logo nas suas propostas, indicassem as suas habilitações para executar os trabalhos previstos, por referência aos preços parciais dos mesmos.
Isto é, além da descrição dos preços parciais dos trabalhos a executar, os concorrentes tinham que, nas suas propostas, comprovar as suas habilitações para os executar, sendo certo que o poderiam fazer por referência a entidades a subcontratar para essa execução (ao abrigo do disposto no art.° 3°, n.° 2 da Portaria n.° 372/2017, de 14 de dezembro e do art.° 20°, n.° 3 da Lei n.° 41/2015, de 3 de junho), comprovando, claro está, a respectiva habilitação.
Pelo que, não colhe a argumentação do R. e da Contra-interessada de que este documento apenas seria a apresentar na fase de habilitação do concurso. Em primeiro lugar, porque foi o próprio R. que se vinculou, no Programa do Concurso, a exigir dos concorrentes que os mesmos instruíssem as suas propostas com aquele específico documento. Em segundo lugar, porque não se pode confundir habilitações profissionais para o exercício de uma actividade profissional ou de serviços, como conceito específico de habilitação a que alude o Capítulo VIII do Título II da Parte II do CCP, que visa a habilitação pessoal do adjudicatário e que se destina a apurar se este está habilitado a celebrar o contrato, por não se encontrar impedido de o fazer (por não se verificar em relação a si nenhuma situação de impedimento nos termos do art.° 55° do CCP) - neste sentido, vd. Pedro Costa Gonçalves, in “Direito dos Contratos Públicos”, 4ã edição, Almedina, 2020, pág. 774.
É certo que o art.° 81° do CCP, entre os documentos exigidos para a fase de habilitação, estipula, no seu n.° 2, que “a habilitação, designadamente a titularidade de alvará e certificado de empreiteiro de obras públicas, bem como o modo de apresentação desses documentos, obedece às regras e termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área das obras públicas”.
E, o n.° 8 daquele artigo, especifica que “o órgão competente para a decisão de contratar pode sempre solicitar ao adjudicatário, ainda que tal não conste do programa do procedimento, a apresentação de quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações objecto do contrato a celebrar, fixando-lhe prazo para o efeito”.
As regras e os termos de apresentação dos documentos de habilitação vêm estabelecidas na Portaria n.° 372/2017, de 14 de dezembro, sendo que o n.° 2 do art.° 2 deste diploma prevê que “o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes”. Isto porque, nos termos do disposto no n.° 3 do art.° 20° da Lei n.° 41/2015, de 3 de junho, “a empresa subcontratante aproveita das habilitações detidas pelas empresas subcontratadas”.
Porém, no caso, o documento exigido pelo R. no ponto 7.1.3.4 do Programa do Concurso visava apurar se os concorrentes (ou as entidades que indicariam subcontratar), e não o adjudicatário, dispunham de habilitações profissionais para executar os trabalhos previstos. Pretendia, por isso, uma vinculação dos concorrentes nesse sentido. Daí exigir a apresentação de um específico documento contendo tais informações.
Importa atender às disposições constantes da Lei n.° 41/2015, de 3 de junho, a qual estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da actividade da construção.
Especifica o n.° 2 do art.° 6° deste diploma, que “o alvará de empreiteiro de obras públicas habilita a empresa a executar obras públicas que se enquadrem nas categorias e subcategorias nele identificadas, conforme previsto no anexo i da presente lei, que dela faz parte integrante, e nas classes respetivas aprovadas por portaria do membro do Governo responsável pela área da construção”.
No que respeita à adequação das habilitações, preceitua o art.° 8° da Lei n.° 41/2015 o seguinte: “Sem prejuízo do disposto nos artigos 19.° e 20.°, nos procedimentos de formação de contratos de empreitadas de obras públicas, a empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela, respeitante aos trabalhos mais expressivos da mesma, sem prejuízo da exigência de habilitação noutras classes e subcategorias relativas às restantes obras e trabalhos a executar”.
Como refere Pedro Costa Gonçalves “Distinguimos duas categorias de requisitos: os requisitos gerais, exigidos para todos os contratos e em todos os procedimentos, e os requisitos especiais, requeridos nos procedimentos de formação de certos contratos (v.g., contratos cuja execução reclama habilitações específicas) e nos procedimentos de adjudicação que integrem uma fase de prévia qualificação. Em todos os casos, trata-se de condições jurídicas de participação no procedimento relacionadas com a situação pessoal do interessado: se não as cumprir, o interessado não pode participar. Se, ainda assim, participar, mediante a apresentação de uma candidatura ou proposta, a falta da condição requerida determina, em termos práticos, a «exclusão do concorrente» ou do «candidato». Note-se, porém, que ao contrário das diretivas que transpõe, o CCP não prevê uma figura específica de exclusão do «concorrente» ou do «candidato»: as situações que poderiam dar lugar a estas consequências determinam, em termos rigorosos, a exclusão das candidaturas ou de propostas (cf., por exemplo, artigos 146.°, n.° 2, e 184.°, n.° 2).
(…)
Como condição do exercício legítimo de inúmeras atividades industriais, comerciais e de serviços, a lei exige aos interessados a titularidade de autorizações, de licenças, de permissões, de concessões, de certificados, de alvarás ou, em certos casos, a inscrição oficial em organismos públicos (ordens profissionais, institutos públicos, etc.) ou até em organismos privados com funções de regulação pública. Trata-se, nesses casos, de profissões ou atividades regulamentadas, cujo exercício se encontra condicionado ou sob reserva de um controlo público prévio de natureza permissiva. Pois bem, quando os contratos públicos a adjudicar envolvam, na sua execução, o exercício de profissões ou de atividades regulamentadas, a participação no procedimento depende da titularidade das habilitações legais para desenvolver as atividades contratadas.” - ob. cit., pp. 674, 675 e 772.
Assim, a titularidade de alvará emitido pelo IMPIC, I.P. contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar, conforme exigido pelas peças concursais aprovadas pelo R. [concretamente, no ponto 7.1.3.4 do Programa do Concurso], assume-se, no presente caso, como um verdadeiro requisito especial de participação no procedimento concursal, isto é, para poder concorrer, e não apenas como uma mera exigência para a habilitação do adjudicatário.
Sublinhe-se, aliás, que a fase de habilitação, conforme previsto no n.° 1 do art.° 81° do CCP, se limita a obter a comprovação documental da inexistência dos impedimentos previstos no art.° 55°, bem como da posse das habilitações/autorizações necessárias para o exercício de certa actividade, sem prejuízo de poder o júri do procedimento exigir a apresentação de tais comprovativos, se entender ser necessário para a correta tramitação do procedimento (cf. art.° 59°, n.° 4 da Diretiva 2014/24/EU).
Donde, a exigência da posse de alvará, emitido pelo IMPIC, I.P., e contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar, era exigível à Contra-interessada, no específico concurso em apreço, logo aquando da apresentação da sua proposta e não apenas em fase posterior à adjudicação, isto é, na habilitação.
Neste sentido, tem vindo a firmar-se jurisprudência nos tribunais superiores. Veja-se, a título meramente exemplificativo, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 23.10.2014 (proc. n.° 019/14), no qual se consignou o seguinte:
“Em princípio, os requisitos de habilitação só devem ser comprovados pelo adjudicatário, após a notificação do acto de adjudicação (cf. arts. 77, n°. 2, al. a) e 81). Porém, quanto aos requisitos de habilitação de carácter pessoal, admite-se que a entidade adjudicante exija aos concorrentes a apresentação do comprovativo de que não incorrem em qualquer das situações previstas no art°. 55 e que, se tiver conhecimento da verificação de alguma delas, exclua a proposta respectiva, nos termos do art°. 146, n°. 2, al. c). E embora não exista qualquer preceito nesse sentido, esta solução será igualmente aplicável aos casos análogos respeitantes aos restantes requisitos de habilitação que também se devem verificar logo no momento da apresentação da proposta, pois não se compreenderia que, com prejuízo da segurança, celeridade e eficiência do procedimento de contratação pública, se deixasse perdurar uma proposta até ao momento pós-adjudicatório da necessidade de comprovação da titularidade desses requisitos, apesar de a entidade adjudicante saber que determinado concorrente não pode cumprir a exigência da apresentação dos documentos de habilitação”.
No mesmo sentido, vejam-se os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 04.05.2018 (proc. n.° 01093/17.7BEAVR) e de 15.06.2018 (proc. n.° 00254/17.4BEPRT), além do já referido Acórdão de 05.02.2021 (proc. n.° 233/20.3BECTB), bem como do Tribunal Central Administrativo Sul de 07.11.2013 (proc. n.° 10404/13).
Aqui chegados, analisada a proposta apresentada pela Contra-interessada, constata-se que a mesma integra um documento, intitulado “Declaração Habilitações”, onde declara ser titular do Alvará de Construção n.° ...36... [cf. ponto 11. do probatório].
Mais declara a Contra-interessada, nesse documento, que o referido alvará lhe confere autorização para executar os trabalhos das 1ª, 2ª, 4ª, 5ª, 6ª, 7ª e 8ª subcategorias da 1- categoria, das 1ª, 6ª, 9ª e 10ª subcategorias da 2ª categoria, das 1ª, 2ª, 9ª, 10ª, 11ª, 12ª e 18ª subcategorias da 4ª categoria e das 1ª, 2ª e 11ª subcategorias da 5ª categoria, sendo o seu alvará de classe que lhe confere autorização para executar os respectivos trabalhos, encontrando-se os preços propostos para esses trabalhos dentro dos respectivos âmbitos [cf. ponto 11. do probatório].
Porém, quanto aos trabalhos referentes à 14ª subcategoria da 4ª categoria, a Contra-interessada indicou, naquele documento, que os mesmos “serão executados por empresa especializada e habilitada pelo IMPIC, sendo a respectiva declaração de vínculo e Alvará entregue, tal como definido na legislação, com os respectivos documentos habilitação em caso de adjudicação”, não identificando, portanto, qual seria a entidade a subcontratar para a execução dos respectivos trabalhos e, consequentemente, nada indicando relativamente à correspetiva habilitação profissional, impedindo, assim, a verificação pelo Júri da conformidade dos preços desses trabalhos com a classe das habilitações profissionais da entidade que os iria executar.
Por conseguinte, a proposta da Contra-interessada apresenta-se incompleta, não tendo sido instruída com todos os documentos exigidos pelo Programa do Concurso.
In casu, o documento em causa, por se mostrar incompleto, contende com um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência pelo Caderno de Encargos e ao qual a entidade adjudicante pretendia que o concorrente se vinculasse.
E a tal conclusão não obsta o disposto no ponto 16.1.3 do Programa do Concurso, porquanto o mesmo destina-se à fase de habilitação. Além disso, o que este normativo do procedimento exige é que a 1ª subcategoria da 1ª categoria seja de classe que cubra o valor global da proposta e que se integre na categoria em que o tipo de obra se enquadra. Nada tem que ver, portanto, com a verificação de habilitações profissionais dos concorrentes para participar no concurso.
É certo que, na fase de habilitação, a Contra-interessada não apenas indicou qual a entidade a subcontratar, como também demonstrou que esta possui o necessário e adequado alvará de construção, emitido pelo IMPIC, I.P., para a execução dos respectivos trabalhos [cf. pontos 18. e 19. do probatório].
Contudo, a falta cometida e que a lei comina com a exclusão da proposta situa-se a montante. Era no momento da apresentação das propostas que a Contra-interessada deveria ter indicado, em documento exigido expressamente para esse efeito - e que, por isso, deveria instruir a proposta -, que o preço parcial que se propõe executar e que corresponde à indicada subcategoria da 4ª categoria correspondia às habilitações contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo IMPIC, I.P. da entidade que os iria executar, uma vez que não seria a própria Contra-interessada a fazê-los - como resulta expressamente da sua proposta. Tudo porque a entidade adjudicante pretendia, na fase de avaliação das propostas, proceder à verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.
Ora, não tendo procedido a essa indicação, de forma completa e integral, a Contra-interessada não instruiu devidamente a sua proposta com um documento que deveria conter um termo ou condição relativo a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos, aos quais a entidade adjudicante pretendeu que os concorrentes se vinculassem.
Assim, não tendo a Contra-interessada indicado, na sua proposta, ser titular de alvará de construção que a habilitasse à realização das obras abrangidas pela 14ª subcategoria da 4ª categoria - Redes e ramais de distribuição de gás, instalações e aparelhos a gás”, nem indicando a entidade que iria subcontratar para a execução dos respectivos trabalhos ou sequer indicando ser essa entidade titular de alvará de construção que a habilitasse a executá-los, identificando esse alvará, impunha-se ao R. excluir a sua proposta, nos termos do previsto na alínea a) do n.° 2 do art.° 70° do CCP.
Assiste, portanto, razão à A. no que invoca.
E não são de acolher os argumentos invocados pelo R. e pela Contra-interessada, quer nas suas contestações, quer nas suas alegações, porquanto não está em causa uma mera irregularidade da proposta da Contra-interessada, mas uma preterição de uma formalidade essencial, não passível de suprimento nos termos do art.°72°,n.° 3 do CCP (na redação à data em vigor, resultante do Decreto-Lei n.° 111-B/2017, de 31 de agosto).
Assim sendo, encontra-se o acto de adjudicação do contrato à Contra-interessada ferido de invalidade, na medida em que a sua proposta deveria ter sido excluída nos termos do disposto nos art.ºs 57°, n.° 1, alínea c), 70°, n.° 2, alínea a) e 146°, n.° 2, alíneas d)e o), todos do CCP.
Procede , desta forma, o invocado vício.
Em face do que fica referido, não deveria o Júri do concurso ter admitido a proposta da Contra-interessada, mas, ao invés, deveria ter procedido à respectiva exclusão.
Ao admiti-la violou o disposto nas alíneas d) e o) do n.° 2 do art.° 146° do CCP (…)”.
15. Com o assim decidido não se conforma a Recorrente, por manter a firme convicção de que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito, desde logo, ao considerar que se a habilitação deve ser comprovada logo na apresentação da proposta.
16. Realmente, clama a Recorrente “(…) o problema que se discute nos presente autos é o de saber qual o momento procedimental devido para a comprovação dos requisitos de habilitação, concretamente, (i) se é o da fase pós adjudicatória – conforme parece resultar, cristalinamente, da sistemática do Código dos Contratos Públicos, v. artigos 57º e 77º/2.a) –, ou, pelo contrário, conforme vem sendo esboçado numa certa “deriva jurisprudencial” (designadamente, e como expressamente reconhece, pelo próprio signatário da decisão sindicada), (ii) se a habilitação deve ser comprovada logo na apresentação da proposta – em particular, sendo este um aspeto determinante na interpretação jurídica que se impõe, e que o Tribunal a quo parece ignorar em absoluto, quando, face aos elementos existentes, não exista resquício de razão para antecipar qualquer juízo sobre uma conjeturada falta de habilitação do adjudicatário, por esta poder fazer-se, nos termos mais lineares do regime legal instituído, com recurso a habilitações complementares de terceiros (…)”.
17. Do que se vem de expor resulta absolutamente cristalino que o nó górdio da questão recursiva está, essencialmente, em determinar se o Tribunal a quo incorreu [ou não] em erro de julgamento ao considerar que se a habilitação deve ser comprovada logo na apresentação da proposta, ou, ao invés e como defende a Recorrente, na fase na pós-adjudicatória.
18. E, podemos, desde já adiantar que não assiste à Recorrente no ataque dirigido à decisão judicial recorrida por duas ordens de razão, a saber:
19. A primeira ordem de razão prende-se com o facto da decisão recorrida não versar sobre a necessidade de demonstração documental das habilitações do terceiro subcontratado, mas antes sobre a falta de expressa identificação deste na proposta apresentada, para além da falta da indicação da titularidade por parte da Recorrente das habilitações abrangidas nos trabalhos subcontratados.
20. Realmente, ao contrário do que a Recorrente pretende conduzir em discussão no seu recurso, a “ratio decidendi” do julgado teve foco, não no (i) incumprimento da eventual exigência de junção de documentos comprovativos das habilitações de subcontratados, mas antes na (ii) ausência de identificação da “(…) entidade a subcontratar para a execução dos respectivos trabalhos e, consequentemente, nada indicando relativamente à correspetiva habilitação profissional, impedindo, assim, a verificação pelo Júri da conformidade dos preços desses trabalhos com a classe das habilitações profissionais da entidade que os iria executar (…)”, associada à (iii) falta de indicação por parte da Recorrente da titularidade “(…) de alvará de construção que a habilitasse à realização das obras abrangidas pela 14ª subcategoria da “4ª categoria - Redes e ramais de distribuição de gás, instalações e aparelhos a gás” (…)”
21. O que nos transporta para evidência do que os termos que a Recorrente desenvolve a sua argumentação não apresentam qualquer correlação com os fundamentos da decisão recorrida, configurando-se, portanto, os mesmos como inócuos e insuficientes para impactar o sentido decisório da mesma.
22. A segunda ordem de razões relaciona-se com a certeza de que o decidido pelo Tribunal a quo não merece o menor reparo, encontrando-se certeiramente justificado.
23. Realmente, como se expendeu no recente aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte no aresto de 24.03.2023, tirado no processo nº. 00392/22.0BECBR: ”(…)
Ainda que possa o adjudicatário socorrer-se dos alvarás ou certificados de empreiteiros de obras públicas de subcontratados, seria esvaziar a exigência aceitar proposta que ficasse em vazio de indefinição por recurso a subcontratado não identificado (as habilitações são confirmadas pela entidade adjudicante mediante consulta à base de dados de empresas de construção do IMPIC, I. P. - art.º 3º, nº 3, da Portaria n.º 372/2017, de 14/12; art.º 81º, n.º 2, do CCP).
Terá a “proporção” de exigência de ser extensível a subcontratado, sem “entorse”, respeitando o fim injuntivo da proposição inicial; “na dimensão conhecimento pleno das ofertas feitas pelos outros concorrentes, só se ganha em se saber com que título e quem - que terceiro - e o quê (que obras concretas) se vão fazer numa obra pública” (Ac. deste TCAN, de 11-02-2022, proc. n.º 01296/21.0BEPRT); implica a sua identificação na proposta, e aquando apresentação desta (…)”.
24. Assim, à míngua de (i) identificação na proposta apresentada pela Recorrente da entidade a subcontratar para a execução dos respectivos trabalhos e, bem assim, da (ii) falta de indicação da titularidade por parte da Recorrente das habilitações abrangidas nos trabalhos subcontratados, deve concluir-se no sentido da inadmissibilidade da proposta apresentada, e, qua tale, pela obrigatoriedade de exclusão da mesma, nos termos do previsto na alínea a) do n.º 2 do art.º 70º do CCP
25. Deste modo, tendo também sido este o caminho trilhado no despacho recorrido, impera concluir que este fez correta subsunção do tecido fáctico apurado nos autos ao bloco legal e jurisprudencial aplicável, não sendo, por isso, merecedora da censura que a Recorrente lhe dirige.
26. E assim fenecem todas as conclusões deste recurso.
27. Consequentemente, deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, e mantida a decisão judicial recorrida.
28. Ao que se provirá no dispositivo.
* *
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso, e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Registe e Notifique-se.
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Porto, 14 de julho de 2023,

Ricardo de Oliveira e Sousa
Rogério Martins
Luís Migueis Garcia