Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00252/19.2BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/16/2020
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:REVOGAÇÃO DE ATO; CADUCIDADE E INIMPUGNABILIDADE; ATO CONFIRMATIVO
Sumário:1 – O facto de os serviços municipais terem vindo a emitir sucessivamente vários pareceres e informações, na sequência de reclamação da autora relativamente a ato anteriormente proferido, não tem a virtualidade de, só por si, suspender ou dilatar o prazo para decisão e do correspondente Recurso.

2 - Será ato meramente confirmativo aquele que tenha por objeto ato potencialmente lesivo anteriormente praticado, sendo que para a sua verificação importa que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Que o ato confirmado fosse lesivo;
b) Que tal ato fosse do conhecimento do interessado;
c) Que entre o ato confirmado e o ato confirmativo haja identidade de sujeitos, de objeto e de decisão.

No entanto, importa reter que para se poder falar num ato meramente confirmativo não nos poderemos bastar com uma identidade de decisão, isto é, que os efeitos jurídicos produzidos sejam idênticos, ou que exista urna identidade de assunto, já que mesmo levando a idêntica decisão a esta se pode chegar mediante a invocação ou utilização de diferentes fundamentos, na certeza de que essa diversa fundamentação será suficiente para alterar e modificar os pressupostos da decisão e afastar a qualificação do ato como meramente confirmativo.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:N.
Recorrido 1:Município de (...) e Outra
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
N., devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa, intentada contra o Município de (...), tendo como Contrainteressada O., tendente à impugnação do despacho de 03.01.2018, que decidiu revogar os anteriores despachos de 17.10.2015 e de 30.11.2015, que tinham determinado a notificação da Contrainteressada para proceder ao licenciamento de um muro da sua propriedade, e do despacho de 02.04.2019, que decidiu manter despacho anterior, de 29.02.2016, inconformada com a decisão proferida em 31 de março de 2020, no TAF de Mirandela, na qual foram julgadas procedentes as exceções dilatórias de caducidade de direito de ação e de inimpugnabilidade do ato, mais tendo sido determinada a absolvição da instância do Réu, veio interpor recurso jurisdicional.

Formula a aqui Recorrente nas suas alegações do Recurso Jurisdicional, apresentado em 23 de abril de 2020, as seguintes conclusões:

1. A recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto se considera que o Tribunal recorrido procedeu a uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
2. O Tribunal a quo veio julgar procedente a exceção de caducidade do direito de ação e a exceção de inimpugnabilidade do ato administrativo datado de 02 de abril de 2019, considerando que este se subsume no conceito de ato administrativo meramente confirmativo.
3. Com o devido respeito, a recorrente não se conforma com a Decisão assim proferida, porquanto se considera que o Tribunal recorrido realizou uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, como adiante se vai demonstrar.
4. Ora, decorre do disposto no artigo 607° do Código de Processo Civil, sob a epígrafe «Sentença», aplicável por força do disposto no artigo 2° C.P.T.A., o seguinte: 2 - sentença começa por identificar as partes e o objeto do litígio, enunciando, de seguida, as questões que ao tribunal cumpre solucionar.
3 - Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final. 4 - Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção: o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência. (Sublinhado nosso)
5. Por sua vez, dispõe o artigo 615°, n.º 1, al. b) do CPC, sob a epígrafe «Causas de nulidade da Sentença» aplicável por força do artigo 2 do CPTA que: "É nula a sentença quando: b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão."
6. Analisando a sentença em crise resulta com clareza que o Tribunal a quo não especificou os concretos pontos de facto que entendeu como não provados.
7. A sentença proferida limita-se - diga-se, de forma marcadamente sumária - a identificar os pontos da matéria de facto dados como provados, sendo totalmente omissa quanto aos factos dados como não provados.
8. De acordo com os dispositivos consagrados na Constituição da República Portuguesa, mormente o disposto no artigo 205°, n.º 1, as decisões dos Tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
9. Ora, a sentença em mérito não é de mero expediente, porquanto deveria a mesma ter sido devidamente fundamentada nos termos do disposto nos artigos 607°, n° 4, 615°, n.º 1 al. b) do C.P.C. e 205°, n.º 1 da C.R.P
10. O douto tribunal veio, assim, proferir decisão sem especificar a factualidade dada como não provada.
11. Violou assim o tribunal recorrido as normas ínsitas nos artigos 607°, n° 4, 615°, n.º 1 al. b) do C.P.C. e 205°, n.º 1 da C.R.P., o que fere a sentença de nulidade. Por outro lado,
12. O artigo 88° n°1 alínea a) do C.P.T.A estabelece que o despacho saneador se destina a conhecer das exceções dilatórias e nulidades processuais que hajam sido suscitadas pelas partes, ou que, em face dos elementos constantes dos autos, o juiz deva apreciar oficiosamente
13. O artigo 607° n° 4 do C.P.C aplicável por força do artigo 2° do C.P.T.A. dispõe que na fundamentação da sentença, o juiz declara que os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.
14. Nos termos da citada norma legal, o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras da experiência.
15. A sentença de que ora se recorre é omissa quanto à matéria de facto alegada pela A., aqui recorrente, nos artigos 1° a 35°, da petição inicial, designadamente, se os considerava provados ou não provados.
16. Mais, o Tribunal recorrido nem sequer fez o exame crítico das provas que lhe cumpria conhecer quanto a tais factos, não analisou criticamente as provas, nem especificou os fundamentos para não se pronunciar sobre tal matéria de facto.
17. No caso dos autos, a Mm`' Juiz no Tribunal recorrido, não especificou os fundamentos de facto que justificam a decisão, incumprindo o disposto no artigo 154° do C.P.C ex vi artigo 2° do C.P.T.A. relativo ao dever de fundamentar a decisão.
18. A necessidade de fundamentação prende-se com a própria garantia do direito ao recurso e tem a ver com a legitimação de decisão judicial em si mesma - Ac. n° 55/85 do TC, de 23.3.1985; Acs. TC, 5° - 467 e ss.
19. Atento o supra exposto, incorreu a decisão recorrida na nulidade prevista no artigo 615°, n° 1, 13), 1ª parte do CPC, ex vi artigo 2° C.P.T.A que se argui com as legais consequências.
Sem prescindir,
20. Com o devido respeito, o Tribunal recorrido não podia julgar procedente a exceção perentória de caducidade, invocada pelo R., aqui Recorrido.
21. No entendimento da recorrente, a decisão desta exceção importa uma ponderação a montante de todas as contingências que moldaram o procedimento administrativo que impulsionou os presentes autos de impugnação.
22. Nos presentes autos, a construção de um muro pela contrainteressada proprietária do prédio confinante com o da recorrente, motivou a recorrente a dirigir ao Exmo. Presidente da Câmara Municipal de (...) um requerimento a dar conta daquela construção e a peticionar uma vistoria ao local, o que o fez por requerimento datado de 07 de agosto de 2015.
23. Após a realização das diligencias de fiscalização e levantado o respetivo auto de contraordenação por violação da alínea c) do n° 2 do artigo 4° do Decreto-Lei n° 555/99 de 16.12, por despacho proferido pelo R. em 17 de outubro de 2015, foi ordenada a notificação da contrainteressada para promover o respetivo pedido de licenciamento no prazo de 30 dias, sob pena de ordem de demolição, nos termos do artigo 106° e ss. do RJUE.
24. Num primeiro momento, o Recorrente deu razão à recorrente e ordenou a reposição da legalidade por parte da contrainteressada, e tudo porque os técnicos ao serviço do recorrido se deslocaram ao local e, efetivamente, comprovaram a ilegalidade da construção em apreço.
25. Perante a resposta da contrainteressada ao teor daquela notificação, o recorrido, através dos seus técnicos, deslocou-se novamente ao local e após isso elaborou o despacho de 01.12.2015, tendo concluído, que a edificação era de carácter recente, diria não mais de um ano, não apresentando oxidação dos materiais própria da edificação com seis anos.
26. E neste conspecto, por despacho proferido em 07 de dezembro de 2015, foi ordenada nova notificação à contrainteressada para proceder ao pedido de licenciamento no prazo de 30 dias.
27. Na sequência das alegações da contrainteressada, a Técnica ao serviço do recorrido emitiu nova informação na qual considerou dar o benefício da dúvida à contrainteressada e, nesse sentido, propôs a revogação dos despachos datados de 2015/10/17 e 2015/11/30, o que foi sancionado por Despacho datado de 29/02/2016.
28. Em 14 de julho de 2017, a recorrente dirigiu um requerimento ao R., no qual invocou a ilegalidade do despacho que ordenou a revogação dos despachos datados de 17.10.2015 e de 30/11/2015, peticionando a reabertura do processo por forma a apurar a realidade dos factos.
29. Submetido o requerimento ao R., os serviços técnicos proferiram parecer no sentido de ser prolatado novo ato de revogação dos despachos datados de 17.10.2015 e 30.11.2015, que determinaram a notificação da contrainteressada para proceder ao licenciamento do muro.
30. Tais pareceres jurídicos foram ratificados por despacho do Exmo. Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e Urbanismo, datado de 03 de janeiro de 2018.
31. Por entender que o mesmo procedeu a uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, a recorrente apresentou a competente Reclamação Graciosa, peticionando a procedência da reclamação por provada, assim como a procedência das nulidades que ali arguira.
32. Na instrução da Reclamação Graciosa, o R. prolatou um despacho datado de 30 de Julho de 2018, notificando a recorrente de um novo parecer jurídico proferido pelos serviços jurídicos do recorrido.
33. Do parecer dos serviços jurídicos, datado de 30.07.2018, resultam, designadamente, dois aspetos a saber: o reconhecimento de que Administração devia tomar as diligências que necessárias à descoberta da verdade material, o que, na opinião da Técnica do Serviços Jurídicos ao serviço da R., passava pela realização de uma vistoria ao local, com o objetivo de determinar a data concreta da construção do muro; E, após, tendo em conta a natureza essencialmente técnica da questão a apurar, dar uma resposta à recorrente sobre a solicitada vistoria.
34. Ou seja, aquando da instrução da Reclamação Graciosa emergiu a necessidade de responder aquele quesito havia ficado por apurar nos autos - a data precisa de construção do muro.
35. Com a prolação daquele parecer jurídico, com o devido respeito, é sobejamente plausível que a recorrente tenha criado uma expectativa na prolação de uma decisão final de mérito, relativamente à Reclamação Graciosa. Por outro lado,
36. A sentença recorrida procede à determinação do término do prazo legal de que a Administração dispunha para decidir sobre a Reclamação graciosa apresentada.
37. Segundo o entendimento do Tribunal a quo, o prazo legal de que a Administração dispunha para decidir terminava, o mais tardar, em 10 de abril de 2018.
38. Equacionando que não era intenção da Administração proferir decisão final expressa sobre a Reclamação graciosa, porque que razão, já depois do prazo legal para a decisão, elaborar e notificam a aqui recorrente daquele parecer jurídico, sancionado por despacho do Exmo. Vereador do Ordenamento do Território e do Urbanismo?
39. Ademais, do corpo do parecer proferido consta, designadamente do ponto 1 da análise que: "Trata-se de uma reclamação da decisão proferida em 2018/01/03".
40. Reclamação, essa, que ainda estaria a ser alvo de apreciação por parte do Recorrido.
41. Mais, se efetivamente não era intenção do recorrido proferir uma decisão final expressa, porque é que em 20 de fevereiro de 2019, os serviços técnicos do R. emitem novo parecer jurídico?
42. Dissecando o teor do parecer emitido pelos Serviços Técnicos da Divisão de Gestão Urbanística do R., sancionado pelo despacho do Exmo. Vereador do Pelouro, datado de 20 de fevereiro de 2019, resulta que é "necessário proferir uma decisão final de deferimento ou indeferimento relativamente ao induzido na reclamação graciosa de 26 de Fevereiro de 2018, esclarecendo a exponente que a decisão tomada se prende única e exclusivamente com as competências da Câmara Municipal quanto ao cumprimento das normas urbanísticas e ao poder de tutela que possui".
43. Ou seja, em 20 de fevereiro de 2019, a Recorrente veio reiterar que urgia tornar uma decisão definitiva final de deferimento ou de indeferimento relativamente à Reclamação Graciosa.
44. Se a intenção da Administração fosse não proferir urna decisão final sobre o procedimento, não vislumbramos a razão pela qual notificou a recorrente dos pareceres jurídicos sancionados por Despacho, dando conta da necessidade expressa de tomar urna decisão de deferimento ou de indeferimento.
45. Corno também não se vislumbra por que razão encetou diligências e mobilizou esforços no sentido de apurar a verdade material se, efetivamente não pretendesse proferir uma decisão final.
46. A notificação daquele parecer jurídico datado de 20 de fevereiro de 2019, mais adensou a certeza de que, futuramente, o recorrido iria tomar uma decisão final de mérito sobre a Reclamação Graciosa.
47. Tanto que, por requerimento datado de 28 de fevereiro de 2019, o recorrente requereu a aceleração do procedimento administrativo e, bem assim, a prolação de um ato administrativo final.
48. Decisão final que, efetivamente, veio a ocorrer por Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e do Urbanismos do Município de (...), datado de 2 de Abril de 2019.
49. Face à conduta da Administração, deve dizer-se que sempre teria de se entender suspensa a eficácia do ato face às expectativas criadas nesse sentido com os pareceres e notificações do R. a protestar que iriam necessariamente dar urna resposta à Reclamação Graciosa!
50. Foi o próprio recorrido que, com a sua atuação, renunciou a quaisquer efeitos da decorrência do tempo.
51. O recorrido, de forma reiterada, declarou que a Reclamação Graciosa tinha necessariamente de ser decidida e iria, efetivamente, ser alvo de decisão final de deferimento ou indeferimento!
52. A atuação da Administração seguiu sempre uma linha condutora: a Administração sempre reconheceu que estava obrigada a proferir uma decisão sobre a Reclamação Graciosa apresentada.
53. A Administração declarou e informou, diversas vezes, a recorrente da necessidade de proferir urna decisão de mérito sobre o meio gracioso, no sentido de deferir ou indeferir os fundamentos invocados.
54. Contudo, em sede judicial, atraiçoa a recorrente ao invocar a caducidade do direito de ação.
55. Este comportamento manifestamente insidioso por parte da Administração tem assumido uma certa recorrência.
56. O mesmo sucedeu no âmbito do Processo n° 75/18.6BEMDL, onde também era R. o aqui Município, no âmbito do qual a estratégia processual traçada pelo Município passou, igualmente por atraiçoar o particular com a alegação da caducidade do direito de ação.
57. Como se não bastasse, já em sede judicial, quando os particulares pretendem fazer valer os seus direitos e interesses legítimos, os Tribunais de 1ª instância têm vindo a conceder provimento à «fraudulenta» exceção de caducidade do direito de ação.
58. A par do decidido nos presentes autos, no Processo n° 75/18.6BEMDL o Mm° Juiz a quo concedeu provimento à caducidade do direito de ação invocada pelo Município.
59. Decisão, essa, que este douto Tribunal Central veio a revogar, conforme Documento N° 1 junto nas alegações de recurso.
60. Ora se os Tribunais ratificam esta atuação "fraudulenta", as entidades públicas não hesitarão em recorrer consecutivamente a estes expedientes.
61. Com o devido respeito, esta atuação transpõe uma justiça ao serviço das Entidades Públicas, em manifesto menosprezo dos direitos e interesses que os particulares pretendem fazer valer em sede judicial.
62. De facto, ao abrigo do disposto no artigo 59° n° 4 C.P.T.A o prazo de impugnação contenciosa suspende-se com a dedução de impugnação graciosa na data de entrada desta nos serviços da Administração e retoma o seu curso "(..) com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal.".
63. Na circunstância de impugnação graciosa facultativa o efeito é o mesmo no tocante à aplicação do regime estatuído no citado art.° 59° n° 4 CPTA.
64. Na hipótese de imposição legal de uma reclamação ou recurso hierárquico sobre ato praticado no domínio de um específico regime procedimental, tal implica que a notificação do ato, posto que não ponha a correr nenhum prazo de recurso contencioso, constitui a Administração no dever legal de decidir a reclamação ou recurso hierárquico interposto pelo interessado, e torna operativa a suspensão do prazo para o recurso contencioso, nos termos do citado art.° 59° n° 4 CPTA.
65. O que não impede que a impugnação graciosa, ainda que facultativa, tenha exatamente o mesmo efeito que a impugnação graciosa necessária, efeito este que é previsto no artigo 59°, n.º 4 do CPTA, ou seja o da suspensão do prazo da impugnação contenciosa do ato administrativo.
66. Suspensão esta que, in casu só caducou com a notificação da decisão final da reclamação graciosa, que teve lugar em 02 de abril de 2019.
67. A ação foi intentada, precisamente no dia 26 de junho de 2019, dentro do prazo de três meses a que alude o disposto no artigo 58° n° 1 do C.P.T.A.
68. Respeitando assim o prazo de 3 meses para interposição da ação administrativa, pois o prazo para a impugnação contenciosa conta-se a partir da Decisão Final.
69. Ante o exposto, a impugnação judicial foi tempestivamente intentada pela Recorrente, pelo que violou o Tribunal a gila o disposto no artigo 59°, n° 4 do C.P.T.A. Ademais,
70. Por referência aos pareceres jurídicos emitidos pelos técnicos ao serviço do R., sancionados por despacho do Exmo. Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e do Urbanismo e notificados à recorrente, o recorrido admite, expressamente, a necessidade de proferir urna decisão de deferimento ou de indeferimento.
71. A sentença em crise entende que "... em caso algum representa uma conduta passível de induzir o interessado em erro quanto ao prazo de impugnação judicial."
72. De facto, foi o próprio Recorrido que, por mais do que urna vez, declarou que a Reclamação Graciosa tinha necessariamente de ser decidida e iria, efetivamente, ser alvo de decisão final de deferimento ou indeferimento!
73. O Recorrido notificou a recorrente, por mais do que uma vez, dando conta que iria tomar urna decisão definitiva final.
74. Mais, o Recorrido ponderou sob a pertinência de realizar uma vistoria ao local capaz de determinar a data concreta da construção do muro pela contrainteressada.
75. Não se olvide que a revogação dos despachos datados de 17/10/2015 e 30/11/2015 esteirou-se no benefício da dúvida concedido à contrainteressada nos presentes autos, daí a necessidade ponderar a realização de diligências úteis e necessárias à descoberta da verdade material - maxime, a data concreta daquela edificação.
76. Tudo ponderado, somos levados a questionar por que razão a Administração proferiu despachos a informar a recorrente da necessidade de proferir uma decisão final de mérito sobre a Reclamação Graciosa e. em fase judicial, vem invocar a caducidade do direito de ação por parte da recorrente?
77. A este propósito cumpre invocar o disposto no artigo 58° n° 3 alínea b) do C.P.T.A., nos termos do qual a impugnação é admitida, para além do prazo de três meses previsto no n° 1 do artigo: "b) No prazo de três meses, contado da data da cessação do erro, quando se demonstre, com respeito pelo contraditório, que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível a um cidadão normalmente diligente, em virtude de a conduta da Administração ter induzido o interessado em erro;"
78. No caso sub judice, a interpretação e a factualidade aduzida e propugnada pelo recorrido, relativamente a esta matéria, é inclusivamente enquadrável na al. b), do n.º 3 do artigo 58° do CPTA.
79. Em situações semelhantes já decidiu este douto Tribunal no Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo do Norte, proferido em 20/07/2018, no âmbito do processo N.º 75/18.613EMDL, e onde também era R. o aqui Município.
80. Pois, sempre se dirá que aqueles sucessivos despachos induziram a recorrente na mais pura da convicção de que os argumentos aduzidos na Reclamação Graciosa apresentada seriam alvo de decisão final expressa.
81. A conduta do recorrido induziria qualquer administrado ao erro, pois ninguém vai impugnar um ato administrativo quando o Município declara, e confessa, que necessariamente irá prolatar uma decisão de indeferimento ou deferimento da Reclamação Graciosa.
82. A recorrente sustenta assim mais um erro de julgamento, até porque o Tribunal a quo, com o devido respeito, nem se pronunciou devidamente quanto a esta questão da prorrogação do prazo de caducidade, na medida em que nem sequer foi produzida quanto a isso, e ainda que ela tenha sido alegada em sede de réplica, daí que a recorrente entenda não ter sido feita a correta apreciação quanto à conduta da Administração, que, a seu ver, justificaria até a propositura da ação para além dos 3 meses previstos no art.° 58°, n° 3, b), do CPTA, e ainda que se considere que ela foi efetivamente colocada nos 3 meses no que diz respeito também ao 1° ato impugnado.
83. Sobre a conduta da Administração, ela é óbvia: a administração reiteradamente e durante meses assumiu que iria emitir uma decisão final de mérito, que estava até obrigada a isso, depois proferiu o 2° ato impugnado nos termos e condições adequadas para vir posteriormente dizer que a A. impugnou o 1° ato já fora de tempo, desconsiderando que foi ela que sempre declarou que estava obrigada a prolatar uma decisão final de mérito.
84. Assim, no caso em análise, a conduta do recorrido ao declarar e confessar a necessidade de prolatar uma decisão de indeferimento ou deferimento da Reclamação Graciosa, foi suscetível a induzir a administrada em erro.
85. A Administração induziu a recorrente em erro, pois sempre a fez acreditar na prolação de uma decisão final de mérito sobre o meio gracioso.
86. Decisão final que veio a ocorrer por Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e do Urbanismo, datado de 02 de abril de 2019, pelo que a ação é tempestiva quanto ao 1º ato impugnado.
87. Outrossim, não pode o recorrido vir contradizer o que categoricamente já disse no âmbito do procedimento administrativo, incorrendo assim no abuso de direito na modalidade de "venire contra factum proprium".
88. Com a adoção deste comportamento contraditório configura atualmente um instituto jurídico autonomizado, que se enquadra na proibição do abuso do direito, nos termos do artigo 334° do Código Civil.
89. Atua com abuso do direito (já para não falar em má-fé) na modalidade de venire contra factum proprium, o R. quando diz, em fase de procedimento administrativo, que irá necessariamente ser emitida urna decisão final relativamente à Reclamação Graciosa, e depois quando, já no âmbito da ação judicial subsequente, vem dizer que não estava obrigada a prolatar qualquer decisão.
90. Verifica-se assim que o direito de ação da requerente não caducou, pelo que violou o Tribunal recorrido o disposto nos artigos do 59°, nº 4 e o artigo 58º n°3 alínea b) do C.P.T.A.
Sem prescindir,
91. O Tribunal recorrido veio entender pela improcedência dos vícios de nulidade absoluta que a recorrente imputa aos atos impugnados.
92. Como o devido respeito, o Tribunal recorrido labora em erro ao decidir que os vícios imputados não são reconduzíveis a qualquer situação de nulidade prevista.
93. Ora, a decisão final no âmbito do presente procedimento foi tomada sem a notificação da recorrente para o exercício da audiência prévia.
94. No caso sub judice, a recorrente não foi notificada para exercer por escrito o seu direito de audição prévia, nem teve a oportunidade de se pronunciar nem requerer a realização de diligências complementares, sendo certo que o órgão responsável pela direção do procedimento não dispensou a audiência prévia, nos termos do disposto no artigo 124° do C.P.A.
95. Decorre do disposto no artigo 121°, n° 1 do CPA que "os interessados têm o direito a ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente sobre o sentido provável desta".
96. O próprio texto constitucional garante, no seu artigo 268°, n°4, aos cidadãos o direito de participação na formação das decisões administrativas que lhes disserem respeito.
97. Face ao exposto, os atos impugnados e designadamente o ato administrativo de revogação representa a violação de um direito constitucionalmente consagrado da recorrente, que tem por consequência a violação da lei por preterição de uma formalidade essencial do procedimento.
98. Outrossim, nos termos do disposto no artigo 170°, n° 3 do CPA, "são de observar na revogação ou anulação administrativa as formalidades exigidas para a prática do ato revogado ou anulado que se mostrem indispensáveis à garantia do interesse público ou dos direitos e interesses legalmente protegidos dos interessados".
99. Pelo errou o Tribunal recorrido ao declarar que a interposição não podia ser intentada a todo o tempo, tendo em conta que os mesmos se encontram inquinados de Nulidade Absoluta por violação do disposto no artigo 161°, n° 2 alínea d) do CPA. Sem prescindir,
100. A recorrente invocou, ainda, a nulidade absoluta dos atos impugnados, por violação do disposto no artigo 167° do C.P.A por remissão para o artigo 161°, n° 2 alínea g) do C.P.A, por se demonstrarem irrevogáveis os despachos datados de 17/10/2015 e 30/11/2015.
101. Porém, a este respeito vem o Tribunal recorrido entender que tal vicio não é suscetível de reconduzir à nulidade absoluta dos atos impugnado, dando procedência à invocada caducidade do direito de ação.
102. Com o devido respeito, a recorrente entende que o Tribunal recorrido procede a uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, porquanto os despachos datados de 17/10/2015 e 30/11/2015 foram revogados com o fundamento na alínea c) do n° 2 do artigo 167° do C.P.A.
103. A revogação dos despachos datados de 17/10/2015 e 30/11/2015 assentou na "superveniência de conhecimentos técnicos e científicos", sendo que " é justificado que a alteração da decisão se fundamenta em dados cujo conhecimento ocorreu supervenientemente, seja por uma nova análise do processo solicitada pela interessada que revelou um novo enquadramento, seja pelo acesso a novos dados e elementos que justificam e fundamentam uma nova tomada de decisão".
104. A este propósito, dispõe o artigo 167° n° 4 do C.P.A. que "a revogação prevista na alínea c) do n° 2 deve ser proferida no prazo de um ano, a contar da data do conhecimento da superveniência ou da alteração das circunstâncias, podendo esse prazo ser prorrogado por mais dois anos, por razões fundamentadas."
105. No caso dos autos, foi a partir da participação junta pela Contrainteressada, em 08 de janeiro de 2016, na qual foram juntas fotografias que a contrainteressada veio aos autos provar que o aludido muro já existia em 07.02.2016.
106. Foi a partir daqui que o recorrido veio dar o dito por não dito, e proferir o despacho datado de 19.02.2016, no qual diz que, afinal, não existe prova objetiva que permita concluir se o muro foi ou não executado em Julho de 2009.
107. Desde a entrada da exposição da contrainteressada com a junção aos autos daquelas fotografias em 08/01/2016, o que tudo culminou na prolação do despacho de 19.02.2016, até à data em que foi proferido o ato revogatório datado de 03 de janeiro de 2018, mas apenas notificado à recorrente em 31 de janeiro de 2018, passaram mais um e de dois anos!
108. A revogação não foi proferida no prazo de um ano a contar da data do conhecimento da superveniência ou da alteração das circunstâncias, sendo que o recorrido e respetivos órgãos competentes nunca prorrogaram o prazo para a revogação do ato ao abrigo da 1" parte do n° 4 do artigo 167° do C.P.A.
109. Face ao exposto, violou o Tribunal Recorrido ao declarar que a interposição não podia ser intentada a todo o tempo, tendo em conta que os mesmos se encontram inquinados de Nulidade Absoluta por violação do disposto no 161", n° 2 al. g) o que se invoca para as devidas e legais consequências. Sem prescindir,
110. Com o devido respeito, o Tribunal recorrido não podia julgar procedente a exceção inimpugnabilidade do ato do recorrido datado de 02.04.2019.
111. Dispõe o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo n° 00043/14.7BEV1S, de 04-11-2016 o seguinte: "Será ato meramente confirmativo aquele, de entre os atos confirmativos, que tenham por objeto ato potencialmente lesivo anteriormente praticado, sendo que para a sua verificação importa que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos: a) Que o ato confirmado fosse lesivo; b) Que tal ato fosse do conhecimento do interessado; c) Que entre o ato confirmado e o ato confirmativo haja identidade de sujeitos, de objeto e de decisão."
112. Para se poder falar num ato meramente confirmativo não nos poderemos bastar com uma identidade de decisão, isto é, que os efeitos jurídicos produzidos sejam idênticos, ou que exista uma identidade de assunto, porque o idêntico assunto, já que mesmo levando a idêntica decisão a esta se pode chegar mediante a invocação ou utilização de diferentes fundamentos, na certeza de que essa diversa fundamentação será suficiente para alterar e modificar os pressupostos da decisão e afastar a qualificação do ato como meramente confirmativo. (Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 22.02.2013, processo n° 00003/09.0BEBRG)
113. No caso, não estamos perante um ato confirmativo dos atos proferidos em 29-02-2016 e 03-01-2018, porquanto o ato de 29-02-2016 é um ato administrativo tendente a revogar os despachos de 17-10-2015 e de 17-12-2015.
114. Ato este que o recorrido viria a revogar através da prolação de um novo ato revogatório, datado de 03 de Janeiro de 2018, com nova fundamentação de facto e de direito.
115. Aliás no teor do ato administrativo em causa é referido, precisamente, que estão a emitir um "novo ato de revogação".
116. Tal é o que resulta do parecer do Chefe de Divisão nos termos do qual propôs "que seja efetuado novo ato de revogação dos despachos referidos, fundamentado nos termos do disposto na alínea a) da conclusão que seja dado conhecimento do parecer jurídico prestado...", sancionado por despacho do Exmo. Vereador do Ordenamento do Território e do Urbanismo, do qual consta "revogue-se".
117. Foi esse ato que foi alvo da Reclamação Graciosa e que foi decidida por despacho datado de 02 abril de 2019, decisão final notificada à recorrente, por ofício datado de 07 de maio de 2019.
118. O despacho impugnado não se subsume no conceito de ato administrativo confirmativo, pelo que violou o Tribunal recorrido o disposto no artigo 53° do C.P.T.A.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve a decisão recorrida ser revogada, substituindo-a por outra que determine a procedência do presente recurso, tudo conforme alegado e concluído, seguindo-se os demais termos legais, assim se fazendo a costumada e boa JUSTIÇA.

O Município Recorrido veio a apresentar as suas contra-alegações em 26 de maio de 2020, nas quais se refere:

“Quanto á nulidade da sentença:
Da sentença constam, de forma clara, os respetivos fundamentos, quer de facto quer de direito.
Quanto aos fundamentos de facto da decisão tomada, eles constam elencados nos números 1 a 6 da matéria de facto considerada provada, sob a epígrafe de” factos provados”.
Esta indicação cumpre o disposto n nº 3 do artº 607 do C.P.Civil (aplicável ao presente processo) já que desta disposição legal não consta a obrigatoriedade de discriminar os factos que não considera provados.
Já quanto á exigência de fundamentação da sentença e á referencia aos factos não provados, esta necessidade apenas se justificará quando existam e tenham sido alegados factos controversos, que, tendo sido objeto de prova, o tribunal entendeu não terem ficado provados, e isto apenas para permitir ás partes verificar a razão de ser de da respetiva decisão de facto e a poderem sindicar.
No caso presente, para além de inexistir um rol de factos concretos objeto de prova, a fundamentação ficou suficientemente explicita, com referencia ao processo instrutor junto aos autos, inexistindo qualquer falta de fundamentação e violação do disposto no artigo 615, nº 1 do C.P.Civil Como se conclui, o recorrente pretende retirar de um invocado vicio formal da sentença (inexistência de referencia expressa de factos não provados ) para uma situação mais gravosa e respeitante á própria fundamentação da sentença e sua compreensão pelas partes.
Ora, é apenas a total falta de fundamentação ou fundamentação de tal modo deficiente impeça que os destinatários da decisão a possam compreender e sobretudo sindicar o itinerário cognoscitivo que o juiz seguiu ao tomar tal decisão, impedindo ou dificultando gravemente o recurso, que originará a nulidade da sentença.
Oram, no caso presente, e por simples leitura da sentença se constata não ser o caso, já que é clara a fundamentação da decisão.
Inexiste pois qualquer nulidade.
Quanto á decisão proferida:
A sentença decidiu de forma correta quando considerou procedente a exceção de caducidade do direito de ação. Na verdade,
A autora impugnou contenciosamente os seguintes atos administrativos.
i) Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e Urbanismo do Município de (...), datado de 3 de Janeiro de 2018, e que, em exercício de competências delegadas do Presidente do Município de (...), decidiu proceder a revogação dos despachos datados de 17/10/2015 e 30/11/2015, que determinaram a notificação para proceder ao licenciamento, efetuadas através dos Ofícios n.º 10650 de 26/10/2015 e 12405 de 14/12/2015; - Cfr. Doc. 1
(ii) Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e do Urbanismo do Município de (...), datado de 2 de Abril de 2019, no exercício das competências delegadas pelo Sr. Presidente da Câmara em 17/10/2017, e que decidiu manter o despacho proferido em 29/02/2016, que revogou os despachos de 17/10/2015 e 17/12/2015, notificado em 8 de Maio de 2019…
No final, consta do pedido o seguinte:
Declarar-se a Ilegalidade e/ou Nulidade Absoluta, ou Relativa, dos atos impugnados consubstanciados no Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e Urbanismo do Município de (...), datado de 3 de Janeiro de 2018, e no qual se decidiu proceder a revogação dos despachos datados de 17/10/2015 e 30/11/2015, e no Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e do Urbanismo do Município de (...), datado de 2 de Abril de 2019, e no qual se decidiu manter os despachos proferidos e julgar como improcedentes os argumentos apresentados pela A. na reclamação graciosa;
Ora, em simples análise imediata da P.I e do pedido, desde logo parece constatar-se terem sido ultrapassados largamente os prazos para impugnação contenciosa relativamente aos despachos proferidos em 2018.
É certo que, como consta do processo instrutor, e da sentença, a autora apresentou reclamação graciosa do mesmo em 19.02.2018.
Do mesmo modo, e como também refere a sentença, a reclamação apresentada suspendeu o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal Ora, independentemente das considerações que se entenda dever fazer sobre a natureza jurídica do indeferimento tácito, (um verdadeiro ato administrativo impugnável desde logo ou uma mera possibilidade de recurso aos meios contenciosos sem aguardar o ato expresso) do que se trata aqui, e de forma mais simplista, será de saber se o prazo para interposição da ação se esgotou.
Ora, esta conclusão é inequivocamente correta.
Efetivamente a lei é clara quando refere que o prazo fica suspenso em virtude da apresentação de reclamação.
Depois refere que tal prazo “retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar.”
Ora, uma vez que o prazo suspenso retomou o seu curso, e com o decurso do prazo para resposta á impugnação, conclui a sentença, e bem, que tal prazo se esgotou, não podendo ser renovado através de qualquer decisão expressa posterior que incida sobra a referida reclamação.
Também não colhe a invocação de comportamento do Réu que induzisse a autora em erro, levando á respetiva inação quanto á impugnação dos atos referidos.
Note-se que, como do P.A e do processo consta, toda a atividade da autora na sua intervenção no procedimento administrativo, que foi extensa e permanente, foi acompanhada ou mesmo apresentada pelo respetivo mandatário. Ora, a intervenção de um técnico de direito no P.A em representação e em acompanhamento da autora, torna de difícil aceitação, a simples alegação da existência de erro que justifique a ausência de reação ao ato tácito resultante da falta de atempada resposta á impugnação administrativa apresentada.
(Ressalvamos, obviamente, a existência de alegação e prova de factos que constituam provas evidentes do contrário, e que não existem nos autos)
Do mesmo modo, entendemos ser correto o entendimento de que o ato praticado em 2019 se limitou a manter um despacho anterior do Réu, datado de 29.02.2016, simultaneamente indeferindo a reclamação graciosa que havia sido apresentada pela Autora quanto ao ato de 03.01.2018
Aliás, a própria expressão aplicada na decisão em causa declara expressamente “manter os despachos proferidos”.
Acresce que, Entende o recorrente que a solução dada ao litigio seria diferente se a matéria de facto que alegou tivesse sido apreciada e considerada por parte do tribunal.
Também aqui não tem razão.
Isto porque, em primeiro lugar, o facto de os serviços terem emitido vários pareceres na sequência da reclamação da autora, como esta alegou, não tem relevância na suspensão do prazo para decisão da mesma.
Depois, tais pareceres não constituem decisões ou sequer pré decisões do réu, tratando-se de mera atividade interna sem relevância nas várias decisões que o tribunal poderia tomar.
Quanto á decisão sobre a consequência de que, os vícios invocados, mesmo que comprovados, teriam na decisão final, também aqui a sentença parece correta.
Na verdade também parece claro que os eventuais vícios assacados aos despachos proferidos, mesmo a serem provados, apenas originariam a respetiva anulabilidade.
Inexistindo nulidade o prazo para impugnação de tais atos é o que resulta do nº 1 do artigo 68º do CPTA, que a autora não cumpriu. Assim, a ação é extemporânea.
Quanto ao mais, embora irrelevante face á exceção comprovada, também a sentença fez correta aplicação do direito as factos assentes.
Em conclusão: Deve ser mantida a sentença proferida.”

A contrainteressada O., veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 26 de maio de 2020, sem conclusões, terminando, referindo:

“Termos em que e nos demais de direito, deve ser negado provimento ao presente recurso, confirmando-se na íntegra a douta sentença recorrida.”

Em 05 de julho de 2020 foi proferido Despacho de Admissão do Recurso Jurisdicional interposto e sustentação da Sentença proferida.

O Ministério Público, devidamente notificado, veio em 21 de setembro de 2020, nada veio dizer, requerer ou Promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
As questões a apreciar resultam predominantemente da necessidade de verificar se estarão reunidos os pressupostos determinantes, designadamente, da declarada caducidade e inimpugnabilidade dos despachos objeto de impugnação, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade:

“1. Em 26.01.2018, foi dirigida à Autora, através dos seus mandatários, um ofício com o seguinte teor parcial:
“(…)
(dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(…)” (cfr. doc. 1 da p.i.).
2. Em 26.02.2018, foi registado pelos serviços do Réu um requerimento da Autora datado de 19.02.2018, designado por “reclamação graciosa”, em que esta pede a declaração de nulidade ou a anulação do despacho referido no ponto anterior (cfr. requerimento junto como doc. 13 da p.i. e ofício junto como doc. 2 da p.i.).
3. Em 14.03.2018, na sequência do requerimento referido no ponto anterior, foi emitido parecer jurídico pelos serviços do Réu, em que se conclui da seguinte forma:
“(…)

(dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)

(…)”
(cfr. parecer junto como doc. 1 da réplica).
4. Em 03.01.2019, foi emitido parecer pelos Serviços Técnicos da Divisão de Gestão Urbanística do Réu, sancionado por despacho de 20.02.2019, em que se conclui da seguinte forma:
“(…)

(dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)

(…)” (cfr. parecer junto como doc. 14 da p.i.).
5. Em 07.05.2019, foi dirigido à Autora, através dos seus mandatários, um ofício com o seguinte teor parcial:
“(…)

(dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(…)” (cfr. doc. 2 da p.i.).

6. A p.i. dos presentes autos deu entrada no dia 28.06.2019, via SITAF (cfr. fls. 1 dos autos).

IV – Do Direito
No que aqui releva e no que ao direito concerne, discorreu-se em 1ª instância:
“Nos termos do art. 58.º, n.º 1, do CPTA, a impugnação de atos nulos ou inexistentes não está sujeita a prazo, ao passo que a impugnação de atos anuláveis tem lugar no prazo de três meses, se não é promovida pelo Ministério Público.
A Autora foi notificada do ato em causa através de ofício datado de 26.01.2018 (cfr. ponto 1 do probatório), tendo apresentado reclamação graciosa do mesmo em 19.02.2018 (cfr. ponto 2 do probatório).
É certo que, nos termos do art. 59.º, n.º 4, do CPTA, “A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar.”
Assim, por aplicação do art. 59.º, n.º 4, do CPTA, o prazo de impugnação contenciosa deve considerar-se suspenso em virtude da apresentação de reclamação por parte da Autora (cfr. ponto 2 do probatório), só retomando o seu curso com a decisão proferida quanto à impugnação administrativa ou com o decurso do prazo legal para tal decisão.
Uma vez que a decisão quanto à impugnação administrativa apenas veio a ocorrer em 02.04.2019 (cfr. ponto 5 do probatório), cumpre antes do mais determinar em que momento terminou o prazo legal de que a Administração dispunha para decidir.
Nos termos do art. 192.º, n.º 2, do CPA, atinente à reclamação graciosa, “O prazo para o órgão competente apreciar e decidir a reclamação é de 30 dias, podendo confirmar, revogar, anular, modificar ou substituir o ato reclamado, ou praticar o ato ilegalmente omitido.”
Assim, ainda que não resulte do probatório a forma ou a data de envio da reclamação, quer se considere como data da impugnação administrativa o dia 19.02.2018, que corresponde à data aposta à mesma, quer se considere o dia 26.02.2018, que corresponde à data em que os serviços do Réu a registaram, a verdade é que o prazo legal de que a Administração dispunha para decidir terminava o mais tardar em 10.04.2018, pelo que, o mais tardar nesta data, deve retomar-se a contagem do prazo legal para a impugnação do ato, ao abrigo do art. 59.º, n.º 4, do CPTA.
Ora, se assim é, aquando da data da propositura da presente ação mais de um ano depois, em 28.06.2019 (cfr. ponto 6 do probatório), há muito que havia decorrido o prazo legal de três meses de que a Autora dispunha para intentar a presente ação.
*
A este respeito, invoca ainda a Autora que os pareceres emitidos pelos serviços do Réu criaram em si a expectativa da prolação de uma decisão final quanto a esta reclamação, sendo aplicável o art. 58.º, n.º 3, al. b), do CPTA.
Ora, de acordo com o preceito contido nesta al. b) do n.º 3 do art. 58.º do CPTA, a impugnação dos atos administrativos é admitida para além do prazo geral, “no prazo de três meses, contado da data da cessão do erro, quando se demonstre, com respeito pelo contraditório, que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da p.i. não era exigível a um cidadão normalmente diligente, em virtude de a conduta da Administração ter induzido o interessado em erro.”
Encontram-se abrangidas por este preceito circunstâncias em que a própria conduta da Administração é passível de gerar uma falsa expectativa quanto à necessidade ou oportunidade da impugnação judicial de um determinado ato.
(...)
Descendo à situação dos autos, constata-se que o facto de terem sido emitidos dois pareceres dos serviços do Réu em que estes concluem pela existência de um dever de responder ou de decidir por parte da Administração (cfr. pontos 3 e 4 do probatório) em caso algum representa uma conduta passível de induzir o interessado em erro quanto ao prazo de impugnação judicial.
Na verdade, a existência de um tal dever em nada contende com a possibilidade de reação contenciosa ou com a contagem do respetivo prazo, pelo que os pareceres não eram suscetíveis induzir em erro a Autora quanto a tais questões.
Improcede, assim, a invocada aplicação do art. 58.º, n.º 3, al. b), do CPTA, à situação dos autos, improcedendo também, pelos mesmos motivos, o alegado abuso de direito na invocação da caducidade do direito de ação.
*
Invoca ainda a Autora que imputa ao ato impugnado vários vícios de nulidade e que a arguição de tais vícios não depende de prazo, nos termos do art. 58.º, n.º 1, do CPTA.
Vejamos então, desde já se dizendo que também não procede tal argumentação.
É certo que a Autora imputa ao ato impugnado dois vícios que entende implicarem a nulidade absoluta do ato, os quais consistem na preterição de audiência prévia, em violação do disposto no art. 121.º, do CPA, e no vício de violação de lei, por violação do art. 167.º, do CPA.
Sucede, porém, que nenhum destes vícios (nem, de resto, qualquer dos outros vícios concretamente imputados ao ato) seriam suscetíveis de inquinar o ato impugnado do vício gravoso de nulidade, pois não são reconduzíveis a qualquer situação de nulidade legalmente prevista.
(...)
Ao contrário do que pretende a Autora, a preterição de audiência prévia não constitui uma ofensa ao conteúdo essencial de um direito fundamental nos termos e para os efeitos do art. 161.º, n.º 2, al. d), do CPA.
Para aferirmos aquilo que é o conteúdo essencial de um direito, cumpre perceber se está em causa o núcleo duro do direito, por tal forma que este resulte inutilizado.
Recorrendo às doutas palavras do Supremo Tribunal Administrativo:
“A jurisprudência deste STA tem considerado que «… só haverá violação do “conteúdo essencial” ou do “núcleo duro” do direito fundamental, quando o ato administrativo restritivo praticado tenha um tal impacte que não deixe qualquer sentido útil ao direito fundamental, isto é, não há possibilidade de este, depois, de restringido, poder desempenhar a sua finalidade. E que a existência de uma restrição “arbitrária” e “desproporcionada” é um índice relativamente seguro da ofensa do núcleo essencial».
(...)
Ora, nada vem alegado pela Autora que permita reconduzir a preterição de audiência prévia que invoca a uma tal violação gravosa.
Assim, como já afirmou o Tribunal Central Administrativo Norte, “A preterição de audiência prévia, no geral, apenas é sancionada com desvalor de anulabilidade.” (Ac. do TCAN de 02.02.2018, proc. n.º 002737/15.0BEPRT, in www.dgsi.pt).
Por outro lado, a violação do disposto no art. 167.º do CPA também não implica, em caso algum, a nulidade do ato ao abrigo do art. 161.º, n.º 2, al. g), do CPA.
Na verdade, um tal vício encontra-se reservado às situações em que um ato carece, em absoluto, de forma legal, não abrangendo situações em que ocorre, apenas, a violação de alguma disposição legal imperativa, como é o caso do vício que vem alegado pela Autora, de violação do art. 167.º do CPA.
Assim, independentemente da qualificação dada pela Autora aos vícios que invoca, a verdade é que estes se reconduzem à mera anulabilidade do ato, sendo aplicável o prazo de três meses para a respetiva impugnação.
À luz do que vem exposto, há que proceder a invocada caducidade do direito de ação quanto ao ato datado de 03.01.2018.
*
Vista que está a caducidade do direito de ação quanto ao ato do Réu datado de 03.01.2018, cumpre aferir da procedência da exceção de impugnabilidade do ato administrativo datado de 02.04.2019.
Nos termos do art. 51.º, n.º 1, do CPTA, “ainda que não ponham termo a um procedimento, são impugnáveis todas as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta”.
Não são, por princípio, impugnáveis os atos meramente confirmativos de atos anteriores, “entendendo-se como tal os atos que se limitem a reiterar, com os mesmos fundamentos, decisões contidas em atos administrativos anteriores”, nos termos do art. 53.º, n.º 1, do CPTA.
No caso dos presentes autos, o ato que produziu efeitos jurídicos concretos foi o despacho referido no ponto 1 do probatório, que foi notificado à Autora através do ofício datado de 26.01.2018 (cfr. ponto 1 do probatório).
Já o despacho de 02.04.2019 limitou-se a manter um despacho do Réu anterior, datado de 29.02.2016, simultaneamente indeferindo a reclamação graciosa que havia sido apresentada pela Autora quanto ao ato de 03.01.2018 (cfr. pontos 2 e 5 do probatório).
Se assim é, tal ato constitui um ato meramente confirmativo, quer do ato de 29.02.2016, que expressamente mantém, quer do ato posterior, de 03.01.2018 - que constitui o ato impugnado nos presentes autos -, por indeferir a reclamação graciosa quanto ao mesmo apresentada.
É, portanto, indiscutivelmente um ato inimpugnável, por força do disposto no art. 53.º do CPTA (neste sentido, veja-se o Ac. do STA de 29.04.2015, proc. n.º 01882/13, in www.dgsi.pt).
Procede, assim, a invocada inimpugnabilidade do ato do Réu datado de 02.04.2019.
*
Face ao que vem dito, há que proceder a exceção de caducidade do direito invocada quanto ao primeiro ato impugnado, bem como a exceção de inimpugnabilidade do ato invocada quanto ao segundo ato, pelo que determino a absolvição da instância do Réu, nos termos do art. 89.º, n.º 4, als. i) e k), do CPTA, em conjugação com os arts. 278.º, n.º 1, al. e), 576.º, n.º 2, e 577.º do CPC, todos aplicáveis por remissão do art. 1.º do CPTA. (...)”.

Vejamos:
Da Nulidade
É desde logo, em sede recursiva, suscitada a nulidade da Sentença proferida e, 1ª Instância em 31.03.2020.

Alega-se que a sentença recorrida será nula, na medida em que não fixa a factualidade dada como não provada, sendo ainda totalmente omissa quanto à matéria de facto alegada pela Autora nos artigos 1.º a 35.º da p.i..
Mais se alega que a sentença do tribunal a quo também não terá analisado criticamente as provas quanto a tais factos, nem especificado os fundamentos para não se pronunciar sobre tal matéria de facto, o que terá determinado que a Sentença Recorrida tenha incorrido na nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. b), do CPC.

Como sustentado em 1ª instância, está em causa predominantemente uma alegação de falta de fundamentação de facto da sentença, que se reconduziria, em abstrato, a uma causa de nulidade.

Nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA, “É nula a sentença quando (…) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.”

Em qualquer caso, não se vislumbra que a omissão suscitada relativamente à sentença, mesmo que se confirmasse, se reconduzisse a tal nulidade.

Com efeito, tem-se vindo a entender reiteradamente que a referida nulidade apenas ocorrerá quando exista uma total falta de fundamentação de facto e/ou de direito (Cfr. e por todos Ac. do STA de 14.02.2019, proc. n.º 08/18.0BCLSB.

Como afirmado por Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente, é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
(…)
Para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e coloca na base da decisão.” (cfr. ANTUNES VARELA, BEZERRA, J. Miguel, SAMPAIO E NORA – Manual de Processo Civil. 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1985, pp. 687 e 688).

Conclui-se assim, que se não vislumbra que a omissão de fixação de determinados factos provados ou não provados que a Autora considera pertinentes possa reconduzir-se, sem mais, a uma nulidade da sentença, nos termos e para os efeitos do art. 615.º, al. b), do CPC.

Com efeito, e em função da sua legítima apreciação da prova disponível, o tribunal a quo procedeu à fixação da factualidade que se considerou relevante para a decisão a proferir, tendo correspondentemente procedido à respetiva motivação em termos que, sem prejuízo do que se referira infra, se mostram suficientes e adequados.

Assim, não se reconhece a verificação da suscitada nulidade.

Do Recurso
A Recorrente veio impugnar os identificados atos, peticionando a anulação do despacho de 03.01.2018 (1.º ato impugnado), que decidiu revogar os anteriores despachos de 17.10.2015 e de 30.11.2015, e a anulação do despacho de 02.04.2019 (2.º ato impugnado), que decidiu manter despacho anterior, de 29.02.2016.

A Recorrente imputa aos atos impugnados os seguintes vícios:
a) Vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e direito, na medida em que será falso que o muro da contrainteressada tenha sido edificado em 2009, tendo sido construído pelo menos a partir de 2012;
b) Vício de forma, por preterição de audiência prévia, em violação do disposto no art. 121.º, do CPA;
c) Vício de violação de lei, por violação do art. 167.º, n.º 4, do CPA, na medida em que a revogação não foi proferida dentro do prazo de um ano a contar da data do conhecimento da superveniência ou da alteração das circunstâncias em que assenta, ou ainda por violação dos arts. 167.º, n.ºs 1 e 3, e 168.º, n.º 2, do CPA;
d) Vício de violação de lei, por violação dos arts. 115.º, n.º 1, e 116.º, n.ºs 1 e 2, do CPA, na medida em que o Réu não cumpriu as regras do ónus da prova, nem nada fez para averiguar a data da construção do muro;
e) Vício de violação de lei, pelo facto de a obra em causa não ter obtido o devido licenciamento, nos termos previstos no art. 6.º-A, n.º 2, do RJUE, o que representa também a violação dos princípios da legalidade, da justiça e da verdade material.

Em sede de contestação o Município e a Contrainteressada invocaram duas exceções: a caducidade do direito de ação e a inimpugnabilidade do 2.º ato impugnado.

O Tribunal a quo veio a decidir a improcedência da ação administrativa, entendendo terem-se verificado ambas as exceções suscitadas.

Das decisões relativas às exceções:
A sentença recorrida decidiu julgar procedente a exceção de caducidade do direito de ação.

Vejamos:
A autora impugnou contenciosamente os seguintes atos:
a) O Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e Urbanismo do Município de (...), datado de 3 de Janeiro de 2018, que, no exercício de competências delegadas do Presidente do Município de (...), decidiu proceder à revogação dos despachos datados de 17/10/2015 e 30/11/2015, que determinaram a notificação para proceder ao licenciamento, efetuadas através dos ofícios n.º 10650 de 26/10/2015 e 12405 de 14/12/2015;
b) O Despacho proferido pelo Vereador do Pelouro do Ordenamento do Território e do Urbanismo do Município de (...), datado de 2 de Abril de 2019, no exercício das competências delegadas pelo Presidente da Camara em 17/10/2017, e que decidiu manter o despacho proferido em 29/02/2016, que revogou os despachos de17/10/2015 e 17/12/2015, notificado em 8 de Maio de 2019.

O primeiro ato objeto de impugnação foi proferido em 3 de Janeiro de 2018 e notificado à Recorrente por ofício de 26-01-2018, enviado por carta registada em 29 de Janeiro de 2018.

Tendo a presente Ação sido intentada em 28 de Junho de 2019, entendeu o tribunal a quo que o prazo para a propositura da ação estaria ultrapassado (cfr. art.º 58º CPTA).
Efetivamente, nos termos do n.º 1 do artigo 58º do CPTA “Salvo disposição legal em contrário, a impugnação de atos nulos não está sujeita a prazo e a de atos anuláveis tem lugar no prazo de: a) Um ano, se promovida pelo Ministério Público; b) Três meses nos restantes casos.

Não se vislumbrando que os atos objeto de impugnação padeçam de qualquer ilegalidade geradora de nulidade, dir-se-ia que, na realidade, a Ação relativamente ao 1º ato, se mostrará intempestiva, pois que sendo o controvertido ato apenas potencialmente anulável, a respetiva impugnação teria que ocorrer no prazo de 3 meses a partir da sua notificação, prazo manifestamente ultrapassado, mesmo considerando as suspensões entretanto verificadas.

Efetivamente, tendo o despacho objeto de impugnação sido proferido em 3 de Janeiro de 2018 e comunicado à Autora através de ofício datado de 26-01-2018, o prazo de 3 meses para a impugnação, conta-se, a partir dessa data, ou, pelo menos, na data presumida da receção que ocorre no terceiro dia útil.

Como resulta dos elementos de prova disponíveis, o ofício foi enviado por via postal registado em 29 de Janeiro de 2018, em face do que a notificação se efetivou, nos termos do n.º 1 do artigo 113.º do CPA, em 1 de Fevereiro de 2018, sendo que a ação só veio a ser apresentada em 28 de Junho de 2019.

É certo que a Autora, aqui Recorrente, afirma que apresentou reclamação graciosa em 19 de Fevereiro de 2018, o que suspenderá o prazo, circunstância que é contestada pela contraparte, que entende que a reclamação apenas foi apresentada em 26-02-2018.

Mesmo admitindo que a reclamação terá sido apresentada tempestivamente, sempre se dirá, o seguinte:
Nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 59º do CPTA, a utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar.

Por outro lado, dispõe o n.º 2 do art.º 192º do CPA que o prazo para o órgão competente apreciar e decidir a reclamação é de 30 dias, podendo confirmar, revogar, anular, modificar ou substituir o ato reclamado, ou praticar o ato ilegalmente omitido, sendo o referido prazo contado em dias úteis, como decorre do art.º 87º do CPA.

Assim, o prazo para o Município se pronunciar, querendo, sobre a referida reclamação terá terminado em 2 de Abril de 2018, reiniciando-se a contagem partir daí do prazo para impugnação contenciosa, o qual, como se viu, se encontrava suspenso, nos termos do artigo 59.º n.º 4 CPTA.

Resulta assim que o prazo de impugnação contenciosa do primeiro ato havia já sido ultrapassado quando a presente ação foi intentada em 28 de Junho de 2019.

A Recorrente entende, no entanto, que se terão verificado circunstâncias que a induziram em erro, levando á sua inação quanto à impugnação dos atos referidos.

Como afirmado pelo tribunal a quo, “o facto de terem sido emitidos dois pareceres dos serviços do Réu em que estes concluem pela existência de um dever de responder ou de decidir por parte da Administração (cfr. pontos 3 e 4 do probatório) em caso algum representa uma conduta passível de induzir o interessado em erro quanto ao prazo de impugnação judicial.”
“Na verdade, a existência de um tal dever em nada contende com a possibilidade de reação contenciosa ou com a contagem do respetivo prazo, pelo que os pareceres não eram suscetíveis induzir em erro a Autora quanto a tais questões.”

Entende, em qualquer caso, a Recorrente que a solução dada ao litígio seria diferente se a matéria de facto que alegou tivesse sido apreciada e considerada por parte do tribunal.
Em qualquer caso, o facto de os serviços municipais terem emitido vários pareceres na sequência da reclamação da autora, não tem a virtualidade de, só por si, suspender ou dilatar o prazo para decisão.

Mesmo que os invocados vícios imputados ao despacho proferido merecessem procedência, os referidos vícios apenas determinariam a anulabilidade do ato.

Não se reconhecendo a nulidade do ato objeto de impugnação, a sua eventual ilicitude sempre seria sancionada com mera anulabilidade, em face do que, como se viu, o prazo impugnatório encontrar-se-ia já ultrapassado, em face do que não merece censura a declarada caducidade.

Da inimpugnabilidade do despacho de 2 de Abril de 2019
Entende o Recorrente que o Tribunal a quo não podia julgar procedente a exceção inimpugnabilidade do ato do recorrido datado de 02.04.2019.

Na realidade, a sentença recorrida entendeu que o ato que produziu efeitos jurídicos concretos foi o ato notificado à recorrente através de ofício datado de 26.01.2018, mais referindo que o despacho de 02.04.2019 se terá limitado a manter os atos praticados em 29.02.2016 e 03.01.2018, que revogaram os despachos datados de 17.10.2015 e 17.12.2015, em face do que o ato objeto de impugnação se reconduziria a um ato meramente confirmativo.

Apreciemos então a questão da impugnabilidade de atos confirmativos, verificando se, em concreto, estaremos perante ato com tal natureza.

Como se sumariou no Acórdão, com idêntico relator, deste Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no Processo n° 43/14.7BEVIS, de 04-11-2016:

“1 – Será ato meramente confirmativo aquele, de entre os atos confirmativos, que tenham por objeto ato potencialmente lesivo anteriormente praticado, sendo que para a sua verificação importa que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Que o ato confirmado fosse lesivo;
b) Que tal ato fosse do conhecimento do interessado;
c) Que entre o ato confirmado e o ato confirmativo haja identidade de sujeitos, de objeto e de decisão.
Da análise do art. 53.º do CPTA em conjugação com o demais ordenamento vigente resulta que o ato meramente confirmativo não é impugnável se o ato anterior foi objeto de impugnação pelo autor [cfr. al. a)], ou se foi objeto notificação ou publicação (sem que tivesse de haver notificação) [cfr. als. b) e c)] e o particular não o impugnou tempestivamente nos prazos legais que dispunha para o efeito (cfr. arts. 58.º e 59.º do CPTA).
(...)”

No entanto, importa reter que para que se possa falar num ato meramente confirmativo não nos poderemos bastar com uma identidade de decisão, isto é, que os efeitos jurídicos produzidos sejam idênticos, ou que exista uma identidade de assunto, porque o idêntico assunto, já que mesmo levando a idêntica decisão a esta se pode chegar mediante a invocação ou utilização de diferentes fundamentos, na certeza de que essa diversa fundamentação será suficiente para alterar e modificar os pressupostos da decisão e afastar a qualificação do ato como meramente confirmativo.

Neste sentido vejam-se, designadamente, Acs. do TCA Norte de 14.04.2005 - Proc. n.º 01412/04.6BEPRT, de 01.04.2011 - Proc. n.º 00249/10.8BEAVR, de 08.03.2012 - Proc. n.º 01172/09.4BEPRT, de 08.03.2012 - Proc. n.º 00499/07.4BEPRT, de 20.04.2012 - Proc. n.º 00212/09.1BEMDL, de 04.05.2012 - Proc. n.º 00386/07.6BEMDL, de 30.11.2012 - Proc. n.º 00198/10.0BECBR, de 22.02.2013 - Proc. n.º 00003/09.0BEBRG.

Por outro lado, haverá identidade entre as partes quando o autor e o destinatário do ato são os mesmos nos atos em questão, sendo que, no que concerne à autoria do ato, não é requisito essencial a idêntica personalidade dos autores dos atos em causa dado o que releva e importa considerar é a origem da titularidade dos poderes exercidos ao se praticar um ato administrativo.

A identidade de pretensão deverá ser aferida em presença das mesmas circunstâncias de facto e de direito [mesmo quadro factual e normativo aplicável, com idêntica fundamentação], sendo que para a identidade de causa de pedir terá de existir identidade nos fins a atingir com a prática dos atos confirmados e confirmativos [cfr. Ac. do STA de 11.03.2009 - Proc. n.º 01084/08 in: «www.dgsi.pt/jsta»; Acs. do TCA Norte de 14.04.2005 - Proc. n.º 01412/04.6BEPRT, de 08.03.2012 - Proc. n.º 01172/09.4BEPRT, de 08.03.2012 - Proc. n.º 00499/07.4BEPRT, de 20.04.2012 - Proc. n.º 00212/09.1BEMDL, de 04.05.2012 - Proc. n.º 00386/07.6BEMDL, de 30.11.2012 - Proc. n.º 00198/10.0BECBR, de 22.02.2013 - Proc. n.º 00003/09.0BEBRG.
Assim, nos termos do artigo 53.º do CPA, o ato meramente confirmativo não é impugnável se o ato anterior tiver sido objeto de notificação e o particular não o tiver impugnado tempestivamente. Com efeito, o ato confirmativo não tem a virtualidade de abrir qualquer novo prazo para a via contenciosa, exatamente porque não constitui um ato administrativo, faltando-lhe a capacidade de produzir efeitos jurídicos inovatórios.
Estar-se-á perante um ato confirmativo de outro quando “há um ato emanado da mesma entidade e dirigido ao mesmo destinatário, que repete o conteúdo de um ato anterior, perante pressupostos de facto e de direito idênticos e sem que o reexame desses pressupostos decorra de revisão imposta por lei” [cfr. entre muitos outros os Acs. do STA de 25/05/2000 e 28/10/2010, in recs. nº 43440 e 039/10].
Neste sentido veja-se também o Acórdão deste TCAN, de 09.06.2011, no processo n.º 00277/10.3BEAVR.

A jurisprudência é assim consistente e reiterada, ao não admitir que se possam invocar contra um ato administrativo vícios que já se podiam e deviam ter invocado contra atos anteriores, sendo isso mesmo o que resulta da teoria tradicional dos atos meramente confirmativos quando aplicada também aos atos jurídicos de execução que, são sempre, pelo menos, parcialmente, confirmativos (cfr. Mário Aroso, “Suspensão da eficácia de atos administrativos de execução da sentença”, Cadernos de Justiça Administrativa nº11, pág.20)

Resulta claro que a conjugação dos Artº 51º e 53º do CPTA determina correspondentemente que apenas se mostrarão impugnáveis os atos administrativos dotados de eficácia externa, ainda que inseridos num procedimento administrativo, designadamente aqueles cujo conteúdo seja suscetível de lesar posições jurídicas subjetivas.
Como referiu Mário Aroso, “O elemento decisivo da noção de ato administrativo impugnável é a eficácia externa” (in O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 2003, págs. 117 e segs.).
Como resulta ainda do sumariado no Acórdão deste TCAN, de 20/09/2007, no Proc.º n.º 01503/05.6BEPRT, "No âmbito do CPTA, ato administrativo impugnável é ato dotado de eficácia externa, atual ou potencial, neste último caso desde que seja seguro ou muito provável que o ato irá produzir efeitos;
A lesividade subjetiva constitui mero critério, mas talvez o mais importante de aferição de impugnabilidade do ato administrativo, coloca a sua impugnabilidade sob a alçada da garantia constitucional, e confere ao recorrente pleno interesse em agir; (...)”

O conceito de atos administrativos impugnáveis reporta-se aos atos com efeitos externos, com destaque dos lesivos de direitos ou interesses legítimos dos interessados, excluindo os chamados atos instrumentais, nomeadamente os atos meramente preparatórios.
Como lapidarmente referiu Sérvulo Correia (in Noções de Direito Administrativo, vol. 1.º, pág. 346), “ato confirmativo, será aquele que, dirigindo-se ao mesmo destinatário, repete o conteúdo de um ato administrativo anterior, sem que o reexame dos pressupostos decorra de revisão imposta por lei.”
Acresce que “o ato confirmativo, por se limitar a repetir estatuição anterior, não incorpora uma decisão nem inova no ordenamento jurídico” (Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, 2.ª ed., págs. 554/555).
Já Santos Botelho, Pires Esteves e Cândido Pinho estabeleceram como requisitos do ato confirmativo, os seguintes (in Código do Procedimento Administrativo, Anotado e Comentado, 5.ª edição, p. 560):
“a) Que exista identidade nas partes - Em princípio, deverá existir identidade entre as partes: autor e destinatário do ato. Porém, no que concerne à autoria do ato é de salientar não ser requisito essencial a idêntica personalidade dos autores dos atos em causa. De facto, o que releva é considerar a origem da titularidade dos poderes exercidos ao se praticar um ato administrativo. Não será, assim, de negar o caráter confirmativo a um ato apenas pelo facto de não existir identidade entre o autor do ato confirmado e do ato confirmativo.
b) Identidade de pretensão - Deverá existir identidade nas pretensões deduzidas pelas particulares. Tal identidade deverá ser aferida em presença das mesmas circunstâncias de facto e direito.
c) Identidade da causa de pedir - Terá de existir identidade nos fins a atingir com a prática dos atos confirmados e confirmativos. A não identidade dos fundamentos de direito não implica de “per si” a não ocorrência de confirmatividade. É de realçar que só se põe o problema da confirmatividade desde que o ato confirmado seja “de per si” recorrível.”

Sintomaticamente e no mesmo sentido, se afirmou no acórdão do STA de 26/01/2000, no Recurso n.º 044717:
1 – É ato confirmativo, contenciosamente irrecorrível, a deliberação de uma Câmara Municipal que mantém o conteúdo decisório de deliberação anterior, com idêntica fundamentação e manutenção de circunstâncias ou pressupostos da decisão entre ambas.
(...)”
Dito isto, importa, em qualquer caso, não perder de vista, o sumariado no Acórdão deste TCAN de 22.02.2013, proferido no Proc.º nº 3/09.0BEBRG, onde lapidarmente se afirma que “Para se poder falar num ato meramente confirmativo não nos poderemos bastar com uma identidade de decisão, isto é, que os efeitos jurídicos produzidos sejam idênticos, ou que exista urna identidade de assunto, porque o idêntico assunto, já que mesmo levando a idêntica decisão a esta se pode chegar mediante a invocação ou utilização de diferentes fundamentos, na certeza de que essa diversa fundamentação será suficiente para alterar e modificar os pressupostos da decisão e afastar a qualificação do ato como meramente confirmativo.

É certo que o ato administrativo confirmativo é aquele que nada acrescenta ao ato anterior, por assim dizer o ato confirmado, sendo que bastará que se alterem os pressupostos da decisão para que, desde logo, não possamos falar de ato confirmativo, ainda que o sentido da decisão possa ser idêntico.

De facto, nos termos do artigo 51. ° do CPTA "Ainda que inseridos num procedimento administrativo são judicialmente impugnáveis os atos administrativos com eficácia externa e, em especial, aqueles cujo conteúdo seja suscetível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos de terceiros".

O conceito de ato administrativo impugnável é assim hoje reportado aos atos com efeitos externos, designadamente lesivos de direitos ou interesses legítimos dos interessados, nele cabendo a decisão final de um procedimento administrativo, por regular uma situação individual e concreta, declarando o direito aplicável em termos imperativos, não cabendo no mesmo os chamados atos instrumentais, como sejam os atos meramente preparatórios, nomeadamente, propostas, informações, pareceres, relatórios, e os atos complementares, dos quais se destacam, designadamente, as notificações, e as operações materiais de execução de atos.

Singelamente, serão "atos confirmativos" os atos administrativos que mantêm, por concordância, um ato administrativo anterior, tendo em vista a mesma situação e fundamentação, recusando a sua alteração ou revogação.

Em qualquer caso e em concreto, o 2º ato objeto de impugnação, em bom rigor, não constitui um ato confirmativo de anterior ato, na medida em que não assente em pressupostos e fundamentos integralmente coincidentes, não obstante a decisão final ser aparentemente de sentido idêntico, consistindo antes num novo ato.

O segundo ato recorrido não constitui um ato confirmativo do ato proferido em 29.02.2016, tanto mais que este visou revogar os despachos de 17.10.2015 e de 17.12.2015, sendo que os serviços do Município propuseram objetivamente essa revogação ao optarem decisoriamente pela "revogação do despacho de 2015/10/17 e de 2015/11/30, com conhecimento à interessada e à munícipe que solicitou fiscalização".

Foi este ato que o recorrido viria a revogar através do ato de 3 de Janeiro de 2018, com nova fundamentação de facto e de direito, afirmando-se inclusivamente que se estava a emitir "novo ato de revogação", em conformidade com o que resulta de parecer de Chefe de Divisão do Município que propôs "que seja efetuado novo ato de revogação dos despachos referidos, fundamentado nos termos do disposto na alínea a) da conclusão que seja dado conhecimento do parecer jurídico prestado ...", o qual veio a ser objeto de Despacho do Vereador do Ordenamento do Território e do Urbanismo, do qual consta "revogue-se".

O referido ato foi objeto de Reclamação a qual foi decidida por despacho de 2 abril de 2019, decisão notificada à recorrente, por ofício de 7 de maio de 2019, na qual foram julgados improcedentes os argumentos da recorrente, apresentados na reclamação.

Acresce que o próprio Despacho de 2 de abril de 2019, estranhamento refere “que mantém-se o Despacho proferido em 29/02/2016”, (O suposto ato confirmado), quando é certo que este Despacho, em bom rigor, foi revogado exatamente pelo Despacho de 03.01.2018, ao decidir idêntica matéria, com base em divergente fundamentação de facto e de direito.

Assim, é patente que o segundo ato recorrido, resultante de Reclamação apresentada, que assentou em argumentação e factualidade nem sempre coincidente com a anteriormente expendida e que havia determinado a prolação dos anteriores atos, não pode singelamente ser entendido como meramente confirmativo de ato anterior, muito menos do ato revogado de 29/02/2016, tanto mais que foram aduzidos factos e circunstâncias não ponderados, considerados e analisados no suposto ato “confirmado”.

Como supra se afirmou, para se poder falar num ato meramente confirmativo não nos poderemos bastar com uma identidade de decisão, isto é, que os efeitos jurídicos produzidos sejam idênticos, ou que exista urna identidade de assunto, já que mesmo levando a idêntica decisão a esta se pode chegar mediante a invocação ou utilização de diferentes fundamentos, na certeza de que essa diversa fundamentação será suficiente para alterar e modificar os pressupostos da decisão e afastar a qualificação do ato como meramente confirmativo.

Assim, não se acompanha o segmento decisório da Sentença proferida em 1ª Instância, que considerou que o segundo ato objeto de Recurso (02/04/2019), será inimpugnável, por consistir num ato meramente confirmativo do ato de 29/02/2016, em face do que se julgará no referido aspeto, procedente o Recurso, o que determinará a baixa dos Autos à 1ª instância para reanálise e decisão face ao 2º ato recorrido, no pressuposto do mesmo se não mostrar meramente confirmativo e como tal impugnável.
* * *
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em julgar parcialmente procedente o Recurso interposto:
a) Negando-se provimento ao Recurso relativamente ao despacho de 03.01.2018, face ao qual foi declarada a Caducidade do Direito;
b) Conceder provimento ao Recurso relativamente ao despacho de 02.04.2019, face ao qual havia sido declarada a sua inimpugnabilidade;
c) Mais se determinando a baixa dos Autos à 1ª instância para prosseguimento da sua tramitação relativamente ao ato referido na precedente alínea, se a tal nada mais obstar.
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Custas pela Recorrente e Recorridas em partes iguais (1/3 cada)
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Porto, 16 de outubro de 2020
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Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa