Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02441/15.0BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/23/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO; PRAZO LEGAL DE PAGAMENTO; IVA, AUTOLIQUIDAÇÃO.
Sumário:I - Nos termos do disposto nos artºs 2º, 4º, nº 1, 28º, nº 1 e 26º do CIVA, a liquidação do IVA é, por via de regra, da responsabilidade do seu sujeito passivo, o qual está, assim, obrigado a enviar periodicamente (mensal ou trimestralmente) aos Serviços do IVA uma declaração descritiva das operações comerciais realizadas no referido período, com a indicação do imposto devido e do crédito existente e dos elementos que tenham servido de base ao respetivo cálculo, a qual deve ser acompanhada do montante do respetivo imposto.

II - Tal significa que o regime de liquidação e pagamento do IVA é acionado pelo respetivo sujeito passivo com base nos seus próprios elementos.

III- Estando em causa nos autos a autoliquidação efetuada pela sociedade executada, manifestada através da entrega da declaração periódica de IVA, desacompanhada do competente pagamento, com prazo limite em 15.02.2013, tendo a insolvência ocorrido em 26.02.2013, logo estão verificados os pressupostos de reversão, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT.

IV- Tem a jurisprudência entendido que para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (art.º 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).

V- Relativamente, às dívidas provenientes de IVA, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.

VI- Terá que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.

VII- A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:M.
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*
1. RELATÓRIO

A Recorrente, Autoridade Tributária e Aduaneira, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou procedente a pretensão de M., na Oposição ao Processo de Execução Fiscal (PEF) n.º 1848201301017195 e apenso (n.º 1848201301049100), contra si revertidos, originariamente instaurados pelo Serviço de Finanças (SF) de Paredes contra a sociedade C., Lda. com vista a cobrança coerciva de uma dívida proveniente de IVA, e juros de mora, do quarto trimestre de 2012, no montante global de € 6.928,13.

Inconformada a Recorrente dela veio interpor recurso jurisdicional, formulando nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
(…)
A. A Fazenda Pública vem apresentar recurso da douta sentença que julgou procedente a oposição em referência, na qual está em causa a reversão da dívida da sociedade devedora originária (SDO) referente a IVA e respetivos juros compensatórios, do 4º trimestre de 2012.
B. Com todo o respeito que a decisão proferida nos merece, não pode a Fazenda Pública conformar-se com a fundamentação e sentido da mesma, pelas motivações que a seguir se expõem.
C. A sentença deu como assente no probatório o seguinte facto:
C. Em 15/03/2013 e em 31/05/2013, o SF de Paredes, com base nas certidões de dívida n.ºs 2013/287241 e 2013/464530, instaurou contra a sociedade C., Lda., respetivamente, o processo de execução fiscal n.º 1848201301017195 e apenso n.º 1848201301049100, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA do período 12T/2012 e respetivos juros de mora, no valor exequendo global de € 6.928,13, com datas limite de pagamento em 13/03/2013 e 10/05/2023, respetivamente – cfr. capa do processo e certidões de dívida, de fls. 22 a 24 dos autos;
D. Considerou assim o Tribunal a quo, que “os processos de execução fiscal (…) respeitam a dívidas relativas a créditos vencidos em 13/03/2013 e em 10/05/2013, ou seja, vencidos em data posterior à declaração de insolvência da sociedade devedora originária, decretada em 26/02/2013 (portanto, vencidos numa data em que a Oponente já não exercia funções de gerente da devedora originária) (…)”.
E. Considera, contudo, a Fazenda Pública que o “prazo legal de pagamento ou entrega” (a que se refere o art. 24º n.º 1 al. b) da LGT) é o dia 16/02/2013 (i.e. anterior à declaração de insolvência da SDO), e não as datas que constam das certidões de dívida.
F. Para tal, sustenta o Tribunal a quo que o imposto aqui em causa (IVA do 4º trimestre de 2012) não teria sido autoliquidado, mas sim liquidado oficiosamente.
G. Para tal, apoia-se no entendimento vertido no Acórdão do TCA Sul n.º 625/15.0BELRA, que entendemos, com todos o devido respeito, não ser aqui aplicável, uma vez que, nesse processo (embora estivesse em causa uma divergência entre o prazo constante da certidão de dívida, e o prazo legalmente previsto de IRC) estava efetivamente em causa uma liquidação oficiosa de IRC.
H. Bem pelo contrário, no caso dos presentes autos, está em causa uma autoliquidação1, efetuada pela própria SDO, com a entrega da respetiva declaração periódica, em 14/02/2013, embora sem qualquer meio de pagamento.
I. Assim, estando em causa uma liquidação efetuada pelo próprio sujeito passivo (autoliquidação), deveria ter sido considerado, como prazo limite de pagamento (para efeito de apuramento de responsabilidade nos termos do art. 24º n.º 1 al. b) da LGT), o prazo (legal) de 15/02/2013.
J. Este é o prazo que resulta da aplicação do art. 27º (na redação então em vigor), conjugado com o art. 41º, ambos do CIVA (estando em causa IVA do 4º trimestre de 2012), que determina que o pagamento do imposto deve ser efetuado até ao dia 15 do 2º mês seguinte ao trimestre a que respeita.
K. Assim sendo, o prazo limite de pagamento terminou no período de gerência da Oponente (e antes da declaração de insolvência), recaindo sobre esta o ónus de provar que não lhe era imputável a falta de pagamento das dívidas tributárias.
L. Assim, com todo o respeito que a decisão aqui em apreciação nos merece, entendemos que a sentença proferida padece de erro de julgamento de facto, por errónea valoração da prova produzida o que levou o tribunal a incorrer em erro de julgamento de direito, por errónea subsunção dos factos ao direito.
Termos em que, e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com o que se fará inteira e sã Justiça..(…)”

O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso, tendo alegado em síntese que “Pese embora a fundamentação apresentada na douta sentença não nos parece estar plenamente justificada a posição assumida pelo tribunal recorrido quanto à referência de estamos perante uma liquidação oficiosa, quando dos elementos juntos resulta claro que se trata de uma autoliquidação efectuada pelo sujeito passivo, mas entregue sem os valores de pagamento nela referidos.
E como tal, sendo essa autoliquidação de IVA relativa ao 4º trimestre de 2012, o seu pagamento deveria ser efetuado até ao dia 15 do 2º mês seguinte ao trimestre a que respeita, pelo que o prazo de pagamento seria até 16/2/2013.
Nada existe nos autos que permita concluir, como refere o tribunal recorrido, que estamos perante uma liquidação oficiosa então se aplicando os princípios apontados no Acórdão do TCA Sul.

Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF e atendendo à situação atual de pandemia, com a sua concordância, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC, submetendo-se à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber se se a sentença recorrida incorreu em erro de e julgamento de facto, por errónea valoração da prova produzida e erro de julgamento de direito, por errónea subsunção dos factos ao direito.

3. JULGAMENTO DE FACTO

3.1. . Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
A) Por sentença de 26/02/2013, a sociedade C., Lda. foi declarada insolvente no âmbito do processo n.º 546/13.0TBPRT, que correu termos no 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Paredes – cfr. informação de fls. 33 dos autos;
B) O processo de insolvência identificado na alínea precedente foi encerrado em 07/05/2013 por insuficiência de bens da massa – cfr. informação de fls. 33 dos autos;
C) Em 15/03/2013 e em 31/05/2013, o SF de Paredes, com base nas certidões de dívida n.ºs 2013/287241 e 2013/464530, instaurou contra a sociedade C., Lda., respetivamente, o processo de execução fiscal n.º 1848201301017195 e apenso n.º 1848201301049100, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA do período 12T/2012 e respetivos juros de mora, no valor exequendo global de € 6.928,13, com datas limite de pagamento em 13/03/2013 e 10/05/2023, respetivamente – cfr. capa do processo e certidões de dívida, de fls. 22 a 24 dos autos;
D) Por inexistência ou insuficiência de bens da devedora originária, foi preparado o processo executivo para reversão contra os gerentes da sociedade executada – cfr. informação de fls. 33 dos autos;
E) Por ofício do SF de Paredes de fls. 25 dos autos, a Oponente foi notificada para exercer o direito de audição prévia quando ao projeto de reversão das dívidas descritas em C) – cfr. ofício de fls. 25 e informação de fls. 33 dos autos;
F) Em 14/09/2015, a Oponente emitiu pronúncia em sede de audição prévia, nos termos constantes de fls. 29 a 30 dos autos do PEF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. requerimento de fls. 29 a 30 dos autos;
G) Em 06/10/2015, o SF de Paredes elaborou a “Informação” de fls. 33 a 34 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e no qual pode ler-se o seguinte: “(…) - cfr. informação de fls. 33 dos autos;
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

H) Em 06/10/2015, o Chefe do SF de Paredes proferiu o seguinte despacho:
“Analisados os argumentos expostos e atenta a informação que antecede, (…) prossiga a reversão das dívidas por responsabilidade subsidiária nos moldes propostos, contra a gerente: M. (…). A reversão é efetuada nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 24.º da LGT: Culpa pelo não pagamento dos impostos vencidos no período de exercício do cargo de gerente e inexistência de bens propriedade da sociedade executada (…), uma vez verificados os respetivos pressupostos. (…)” – cfr. despacho de fls. 34 dos autos;
I) Em 09/10/2015, a Oponente foi citada nos termos constantes de fls. 35 dos autos e anexo, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, podendo ler-se no ofício de citação, entre o mais, o seguinte: “(…)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

(…)” - cfr. citação, de fls. 35 dos autos.
* . (…) ”

3.2. Aditamento oficioso à matéria de facto não provada.

Ao abrigo do disposto no artigo 662.º, ex vi artigo 2º, alínea e) e 281.º do CPPT, importa completar oficiosamente o probatório, uma vez que da prova produzida não resultou provado o seguinte:

A) Que a Oponente sempre pautou a sua conduta, no âmbito da gestão empresarial da devedora, pelos princípios de gerente diligente e cumpridora.
B) Que sempre diligenciou na liquidação das suas dívidas;
C) Que desde finais de 2011, devido à conjuntura e agravamento das condições de mercado deixou de conseguir cobrar créditos da sociedade, o que levou que não pudesse cumprir com os seus compromissos, perante os credores.
D) Que a Oponente deixou de auferir quaisquer rendimentos provenientes da sua gestão;
E) Que a Oponente sempre reuniu esforços no sentido de inverter a situação económica e financeira a fim de conseguir solver as dívidas, nomeadamente as fiscais.

Tais asserções não resultam provadas uma vez, que não foi produzida prova nem documental ou testemunhal que o demonstre.

Ouvida o depoimento da testemunha arrolada pela Oponente, C., contabilista disse ser ter sido o TOC da devedora originária “C. Lda” desde o seu início até à insolvência, início de 2013.

Refere que a Oponente era a única gerente da sociedade, e que alertou várias vezes para fechar, mas esta tinha esperança que a situação mudasse. Que havia um esforço de pagar em primeiro lugar aos funcionários e depois aos fornecedores e por fim os impostos.

Referiu que a partir de 2011 as condições de mercado para os têxteis agravaram, que muitos clientes deixaram de trabalhar com a sociedade, e que esta tentou angariar clientes, tendo trabalhado com grandes grupos, nomeadamente, o detinha a marca “Zara” o que se revelou prejudicial, pois as margens de lucro eram muito baixas.

O depoimento é vago e genérico, não concretiza situações, relativas à insuficiência do património ou mesmo, não descreve em concreto atos de gestão, não sendo suscetível de se poder extrair prova de qualquer das alegações da Oponente.

4. JULGAMENTO DE DIREITO

A oposição à execução fiscal tem por objeto a reversão da dívida da sociedade devedora originária referente a IVA e respetivos juros compensatórios, do 4º trimestre de 2012.

O presente recurso recai essencialmente sobre erro de julgamento de direito, por errónea valoração da prova produzida.

Vejamos:
A sentença recorrida considerou que os processos de execução fiscal foram revertidos contra a Oponente ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 24.º, da LGT, e respeitam a dívidas relativas a créditos vencidos em 13.03.2013 e em 10.05.2013, ou seja, vencidos em data posterior à declaração de insolvência da sociedade devedora originária, decretada em 26.02.2013 (portanto, vencidos numa data em que a Oponente já não exercia funções de gerente da devedora originária) com base nas alíneas A), C), G), H) e I) dos factos provados.

Desde já se diga que a sentença incorreu em erro de julgamento, pois como resulta da matéria facto, nomeadamente do facto provado na alínea G), informação que sustenta o despacho de reversão, que o processo de execução fiscal n.º 1848201301017195, reporta-se ao documento de origem 13102100036000000255988, IVA autoliquidado, relativo ao período de tributação 01.10.2012 a 31.12.2012 (201212T), no valor de 6 898,10€ cujo termo de prazo de pagamento voluntário ocorreu em 16.02.2013.

O artigo 27.º do CIVA, na redação em vigor à data, dispunha que: “1 - Sem prejuízo do disposto no regime especial referido nos artigos 60.º e seguintes, os sujeitos passivos são obrigados a entregar o montante do imposto exigível, apurado nos termos dos artigos 19.º a 26.º e 78.º, no prazo previsto no artigo 41.º, nos locais de cobrança legalmente autorizados.”

Determina a alínea c) do artigo art.º 29.º do CIVA, que para além da obrigação do pagamento do imposto, os sujeitos passivos são obrigados aEnviar mensalmente uma declaração relativa às operações efetuadas no exercício da sua atividade no decurso do segundo mês precedente, com a indicação do imposto devido ou do crédito existente e dos elementos que serviram de base ao respetivo cálculo.”;
Sua vez, o art.º 41.º do CIVA dispunha que “1 - Para efeitos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 29.º, a declaração periódica deve ser enviada por transmissão eletrónica de dados, nos seguintes prazos:
a) (…)
b) Até ao dia 15 do 2.º mês seguinte ao trimestre do ano civil a que respeitam as operações, no caso de sujeitos passivos com um volume de negócios inferior a € 650 000 no ano civil anterior.

Como refere o sumário do acórdão do STA n.º 0316/03 de 05.07.2003 “I - Nos termos do disposto nos artºs 2º, 4º, nº 1, 28º, nº 1 e 26º do CIVA, a liquidação do IVA é, por via de regra, da responsabilidade do seu sujeito passivo, o qual está, assim, obrigado a enviar periodicamente (mensal ou trimestralmente) aos Serviços do IVA uma declaração descritiva das operações comerciais realizadas no referido período, com a indicação do imposto devido e do crédito existente e dos elementos que tenham servido de base ao respectivo cálculo, a qual deve ser acompanhada do montante do respectivo imposto.
II - Tal significa que o regime de liquidação e pagamento do IVA é accionado pelo respectivo sujeito passivo com base nos seus próprios elementos.
III - Assim, tendo a declaração periódica de IVA efectuada pelo sujeito passivo e desacompanhada do respectivo meio de pagamento, o valor de liquidação, não têm os Serviços de Cobrança de IVA de proceder a liquidação prévia do referido imposto e à consequente notificação do imposto a pagar, acrescido dos eventuais juros compensatórios.”

Refere o acórdão citado pela sentença recorrida n.º 0304/10 de 23.06.2010, a propósito da interpretação da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, aplicável ao caso em apreço, que: Resulta do exposto que o legislador, por um lado, faz coincidir o alcance das expressões “prazo legal de pagamento” e “prazo para pagamento voluntário” (embora tal equiparação possa não ser rigorosa, pois que o pagamento voluntário contrapõem-se ao pagamento coercivo e o que está rigorosamente em causa é o pagamento “pontual”, em tempo, dentro do prazo), por outro, que, para efeitos de IRC, a lei fixa prazos de pagamento distintos consoante o imposto tenha sido ou não autoliquidado, sendo que quer um, quer outro dos prazos, são prazos legais, pois que fixados pela lei.(…)”

Nesta conformidade estando em questão IVA do 4º trimestre de 2012, autoliquidado o “prazo legal de pagamento” completava-se em 15.02.2013.

A sociedade executada foi declarada insolvente em 26.02.2013, logo 15.02.2013 a Oponente/Recorrida ainda estava munida do seu poder de gerência, logo estão verificados os pressupostos de reversão, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT.

Refira-se ainda que quanto à prossecução do processo de execução fiscal para cobrança de dívidas vencidas antes da declaração de insolvência, já tomou posição o tribunal superior, por acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 17.02.2016, no processo n.º 0122/15, segundo o qual é legalmente viável a prossecução da execução fiscal contra o responsável subsidiário, por reversão realizada antes ou depois da declaração de insolvência da sociedade devedora, com a penhora de bens do revertido independentemente da data da sua aquisição, na medida em que só relativamente à entidade insolvente fica a possibilidade de penhora limitada a bens ulteriormente adquiridos.

Por fim um última nota, para esclarecer que o prazo que consta das certidões de dívida é o prazo para pagamento voluntário, no âmbito do processo de execução fiscal, ou seja, no âmbito do pagamento coercivo e dai o processo de execução fiscal apenso n.º 1848201301049100, reporta-se ao documento de origem n.º 1021000360000002527775, relativo ao período de tributação 01.10.2012 a 31.12.2012 (201212T), no valor de 30.03€ cujo termo de prazo de pagamento voluntário ocorreu em 13.05.2013, reportando-se aos juros derivados da falta de pagamento pontual do imposto.

Estando em causa nos autos a autoliquidação efetuada pela sociedade executada, manifestada através da entrega da declaração periódica de IVA, desacompanhada do competente pagamento, com prazo limite de pagamento em 15.02.2013, tendo a insolvência ocorrido em 26.02.2013, logo estão verificados os pressupostos de reversão, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT.

Nesta conformidade, não pode a sentença recorrida, que assim não entendeu, manter-se na ordem jurídica, sendo de conceder provimento ao recurso.

4.2. A sentença recorrida deu como prejudicados as questões equacionadas pelo Recorrida/Oponente, nomeadamente, aplicabilidade do art.º 7.º do CIVA e ainda a ilegitimidade substantiva, por não ter culpa na falta de pagamento dos tributos em cobrança.

Notificadas as partes efeitos do n. º 3 do art.º 665.º CPC, não se pronunciaram.

Face ao disposto no art.º 665º do CPC cabe a este tribunal conhecer do mérito dessa parte, em substituição, se os autos fornecerem os necessários elementos.

Com efeito o n.º 2 art.º 665.º do CPC prevê a hipótese de o TCA se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha de elementos necessários.

Vejamos:
Na petição inicial a Recorrida/Oponente alega no ponto 55.º que não se verifica nenhuma das situações previstas no artigo 7.º do CIVA e como tal o imposto nunca poderá ser exigido à gerente.

A oposição à execução fiscal, só pode ter por fundamentos algumas das situações previstas no art.º 204.º do CPPT e tem por objetivo opor-se ao pagamento da dívida exequenda.
Porém, a alínea h) do mesmo preceito, prevê como fundamento a “Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra a liquidação.
O art.º 99.º do CPPT, determina com causa de impugnação judicial qualquer ilegalidade designadamente, errónea qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores, incompetência, ausência ou vício da fundamentação e preterição de formalidades essenciais.

A Oponente, sem consubstanciar factos, alega que não se verifica nenhuma das situações previstas no artigo 7.º do CIVA, remetendo-nos para o campo da verificação da legalidade de divida, isto é, se há ou não lugar a liquidação do IVA.

A questão de saber se verifica ou não as situações previstas no artigo 7.º do CIVA, em concreto, ou seja, se foi ou não legalmente liquidado o IVA, constitui, fundamento de impugnação judicial, não podendo ser objeto oposição.

Como supra se disse, em sede de oposição só é permitido discutir ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra a liquidação.

No caso em apreço, a lei concede aos gerentes, nos termos do n.º 4 do art.º 23.º da LGT, a possibilidade de impugnar a dívida cuja responsabilidade lhe for atribuída nos mesmos termos do devedor principal.
Logo, assegurando a lei, meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação, não pode ser objeto de oposição à execução fiscal.

Por fim refira-se que, atentando, no presente processo ao concreto pedido que foi formulado, ou seja, a pretensão de tutela jurisdicional que a Oponente visa obter, é “a extinção da execução”. Ora a concreta causa de pedir referente à legalidade do IVA não é apta a alcançar tal pretensão, nem mesmo pode ser conhecida em sede de oposição à execução.
Nesta conformidade, improcede a pretensão da Oponente.

4.3. A Oponente na petição inicial - pontos 44.º a 54.º alega a ilegitimidade substantiva, por não ter culpa na falta de pagamento dos tributos em cobrança.

Alega que sempre pautou a sua conduta, no âmbito da gestão empresarial da devedora, pelos princípios de gerente diligente e cumpridora.

E que a partir de 2011, devido à conjuntura e agravamento das condições de mercado levou que não pudesse cumprir com os seus compromissos, perante os credores.

Que a Oponente sempre reuniu esforços no sentido de inverter a situação económica e financeira a fim de conseguir solver as dívidas, nomeadamente as fiscais.

Sendo seu entendimento que não lhe deverá ser assacada qualquer responsabilidade.

Vejamos.
Relembramos que estamos perante a execução de dívidas de IVA e juros de mora, do ano de 2012, no montante global de € 6 928,13.

O regime de responsabilidade subsidiária aplicável é o vigente no momento em que se verifica o facto gerador dessa responsabilidade (artigo 12º do Código Civil), pelo que sendo as dívidas exequendas referentes ao referido ano é de aplicar o regime previsto no artigo 24.º da LGT, que foi, aliás, o normativo invocado pelo órgão de execução fiscal no despacho de reversão e também pela sentença recorrida.

Prevê o artigo 24.º, n.º 1 da LGT que: “1. Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. (…)”.

Como supra ficou dito, a reversão em causa foi efetuada ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT,

Como se relatou no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), de 10.10.2013, no âmbito do processo n.º 242/06.5BECBR: “(…) Quanto às dívidas cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, o administrador ou gerente é responsável pelo seu pagamento, salvo se provar que a falta de pagamento lhe não foi imputável. Neste caso, existe uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária. Ora, “esta presunção, apesar de contrária à regra geral da responsabilidade extracontratual prevista no artigo 487.º do Código Civil (CC), compreende-se neste caso, pois se o gestor não tiver culpa pela falta de pagamento ou de entrega do imposto ocorrida no período em que exerceu funções, ser-lhe-á fácil prová-lo (Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., II volume, anotação 32 ao art. 204º, pág. 356.). Note-se que, embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida” - assim, por todos, acórdão do TCAN, de 29 de Outubro de 2009, Processo 228/07.2.”

Em síntese, a alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT comporta uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária.

Demonstrada que seja, a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora recai sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas coletivas ou ente fiscalmente equiparados “o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas” (art.º 32º da LGT).

Têm a jurisprudência entendido que a culpa consiste na omissão da diligência exigível, e exprime sempre um juízo de censura em relação à atuação do agente (por este, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, poder e dever ter agido de outro modo), tornava-se necessário que prove que administrou a empresa de molde a evitar que o seu património se tornasse insuficiente para a satisfação suas dívidas.

Sendo que, os deveres dos gerentes ou administradores que decorrem do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais "é a de dirigir, administrar, conduzir a gestão social, o que se deve concretizar, particularmente, no exercício da atividade para que a sociedade se constituiu.”

Assim, quem assume as funções de administrador ou gerente, deverá ter uma postura responsável e refletida, sem prejuízo da inerente discricionariedade técnica, no desempenho das suas funções, que se mostre, adequado ao alcance dos objetivos para que a sociedade se constituiu.

Tem a jurisprudência entendido que para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (art.º 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).

Relativamente, às dívidas provenientes de IVA, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.

Terá que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.
A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente. (Cfr. Acórdão TCA Norte n.º 00228/07.2BEBRG de 29.10.2019).

Neste mesmo sentido, entre muitos outros, acórdão TCA Norte n.º 0086/01 de 07.12.2005, 0032/02 de 23.02.2006, 0002/03, de 16.03.2006 e 0021/12 de 06.04.2006, 00242/06.5 BECBR de 10.10.2013, 00333/11.0BEAVR de 16.10.2014 e 0589/06.0 BEPNL de 16.10.2014, disponíveis em www.dgsi.pt.

No caso dos autos, face ao supra decidido e assumido na petição inicial (pontos 48.º a 52.º da petição inicial), a Oponente exercia a gerência efetiva da executada originária sendo portanto, a situação enquadrável na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT.

Nesta conformidade, para que a Oponente, afastasse a responsabilidade subsidiária teria que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passava pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.

Desde já se diga, que da matéria de facto provada e não provada a Oponente não logrou demostrar tal pressuposto.

Ouvido o depoimento da testemunha indicada pela Oponente, C., contabilista, da devedora originária desde o seu início até à insolvência, dele não se pode extrair a prova de qualquer das alegações da Oponente.

Referiu que a Oponente era a única gerente da sociedade, e que alertou várias vezes para fechar, mas esta tinha esperança que a situação mudasse. Que havia um esforço de pagar em primeiro aos funcionários e depois aos fornecedores e por fim ao Estado.

E que a partir de 2011 as condições de marcado para os têxteis agravaram, que e muitos clientes deixaram de trabalhar com a sociedade, e que esta tentou angariar clientes, e que trabalhou com grandes grupos, o que se revelou prejudicial pois as margem de lucro eram muito baixas.

Da análise do depoimento prestado, desacompanhado de outras provas, ter-se-á de concluiu que a Oponente não logrou, demonstrar que não teve culpa pela insuficiência patrimonial não provou factos demonstrativos de que o desaparecimento do património social não se ficou a dever à sua gestão, nem tendo sequer provado que haja desenvolvido esforços e empregue o melhor do seu saber para acautelar o pagamento das dívidas em apreço.

A Oponente, em sua defesa, na petição inicial, alega que não teve culpa na insuficiência dos bens para pagamento das dívidas tributárias, uma vez que exerceu a gerência de forma diligente e cumpridora.

Da prova produzida, não resulta provado qualquer facto suscetível de afastar a presunção legal de culpa, nem mesmo existe um esforço probatório que a falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censurável do gestor.

Concluímos, pois, que não há nos autos prova alguma no sentido de que a falta de pagamento IVA ora em cobrança coerciva não seja imputável à Oponente, não logrando, demonstrar tal facto através de comportamentos concretos e atuações, no sentido de afastar a culpa pela não entrega dos impostos, terá de ser responsabilizado pelas mesmas ao abrigo da alínea b) do art.º 24.º, n.º 1, da LGT.
Destarte, julga-se improcedente a oposição à execução.

4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões, com suporte no acórdão do STA n.º 0316/03 de 05.07.2003 supra citado:

I - Nos termos do disposto nos artºs 2º, 4º, nº 1, 28º, nº 1 e 26º do CIVA, a liquidação do IVA é, por via de regra, da responsabilidade do seu sujeito passivo, o qual está, assim, obrigado a enviar periodicamente (mensal ou trimestralmente) aos Serviços do IVA uma declaração descritiva das operações comerciais realizadas no referido período, com a indicação do imposto devido e do crédito existente e dos elementos que tenham servido de base ao respetivo cálculo, a qual deve ser acompanhada do montante do respetivo imposto.

II - Tal significa que o regime de liquidação e pagamento do IVA é acionado pelo respetivo sujeito passivo com base nos seus próprios elementos.

III- Estando em causa nos autos a autoliquidação efetuada pela sociedade executada, manifestada através da entrega da declaração periódica de IVA, desacompanhada do competente pagamento, com prazo limite em 15.02.2013, tendo a insolvência ocorrido em 26.02.2013, logo estão verificados os pressupostos de reversão, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT.

IV- Tem a jurisprudência entendido que para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (art.º 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).

V- Relativamente, às dívidas provenientes de IVA, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.

VI- Terá que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.

VII- A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente.

5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, julgar procedente o recurso, revogar a sentença recorrida, no segmento impugnado, e em substituição julgar improcedente a oposição à execução fiscal.
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Custas pela Recorrida, nos termos do art.º 527.º do CPC, dispensando-se o pagamento da taxa de justiça, por não ter contra-alegado.
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Porto, 23 de junho de 2021.


Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares
Paulo Moura