Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00219/09.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/13/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IMT. JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE IMPOSTO INDEVIDAMENTE PAGO. JUROS INDEMNIZATÓRIOS.
Sumário:
I) Ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 662º do C. Proc. Civil, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
II) A própria decisão recorrida reconhece que existe um erro na liquidação do IMT imputável aos serviços da Administração Tributária e, como tal, susceptível de viabilizar a pretensão da ora Recorrente, referindo depois que desse erro não resultou qualquer pagamento da dívida tributária, não fazendo a melhor leitura dos elementos presentes nos autos com referência ao valor pago em termos globais com referência ao contrato referido nos autos, quando aquilo que interessava era apenas o valor liquidado com referência ao imóvel descrito nos autos e qualquer eventual alteração relacionada com o mesmo e o referido valor.
III) Ora, não houve qualquer alteração da situação de facto, a não ser em resultado da decisão recorrida, o que equivale a dizer que não existe qualquer motivo para não retirar as consequências do próprio discurso da aludida decisão, ou seja, na medida em houve erro imputável aos serviços para efeitos no disposto no art. 43º nº 1 da Lei Geral Tributária, que levam ao pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes de imposto pagos, calculados desde a data em que à ora Recorrente efectuou o respectivo pagamento do imposto até à data em que vier a ser emitida a respectiva nota de crédito, em conformidade com o disposto no artigo 61º nº 3 do CPPT, procedendo-se naturalmente também à devolução do valor do imposto na parte que não era devida. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrido 1:TREIP, Lda.
Recorrido 2:Autoridade Tributária e aduaneira
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a sentença na parte recorrida
Julgar, nessa parte, procedente a impugnação
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
TREIP, Lda., devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 14-12-2017, na parte em que não atendeu ao pedido de restituição do imposto indevidamente pago e aos juros indemnizatórios na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com a liquidação de IMT no montante de € 174.760,30.
Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
a. O presente Recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, na parte em que negou provimento à Impugnação Judicial apresentada quanto à restituição do imposto indevidamente pago e aos juros indemnizatórios e, em consequência, absolveu a Fazenda Pública de parte do pedido, louvando-se a Recorrente na parte da decisão que deu como procedente o peticionado pela mesma (a qual não constitui objeto do presente Recurso);
b. Não obstante resulte da análise da escritura pública celebrada em 7 de marco de 2008, no Cartório Notarial de A..., que "Foi arquivado no maço de documentos referente a este Livro: a) Declaração para liquidação do IMT, apresentada no Serviço de Finanças de A..., em 07/03/2008 e correspondente comprovativo de cobrança número 160.408.005.188.203, no valor de 0,00€, por compensação do DUC 160.008.005.183.103, no valor de 4.419.238,20€, emitido pelo referido serviço naquela data", a realidade e que a emissão do DUC 160.408.005.188.203, no valor de Eur, 0,00 deveu-se, apenas, ao facto do valor do imposto que (à data dos factos) a Administração Tributária entendeu como devido, ter sido pago, anteriormente, através do DUC 160.008.005.183.103, no valor de Eur. 4.419238,20, emitido na mesma data, pelo mesmo serviço de finanças, como resulta inequivocamente da referida escritura;
c. A emissão do DUC 160.408.005.188.203, no valor de Eur. 0,00 não constitui, como erroneamente interpretou o Tribunal a quo, uma compensação de créditos, mas antes, a manutenção do pagamento indevido do imposto, anteriormente, concretizada em anterior pagamento (no montante de Eur. 4.419.238,20);
d. No que diz respeito ao direito tributário, a compensação de dívidas de tributos por iniciativa da Administração Tributária encontra consagração no n.º 1 do artigo 89.º do CPPT, norma que faz depender essa compensação de vários requisitos, quais sejam: (i) existir um crédito de que é titular um contribuinte e devedor a Fazenda Pública; (ii) que tal crédito resulte de reembolso, revisão oficiosa, reclamação graciosa, impugnação judicial ou de outro meio, administrativo ou contencioso, de contestação; (iii) que o mesmo contribuinte seja, simultaneamente, devedor de tributos cujo prazo de cobrança voluntária já tenha transcorrido; (iv) que esta dívida não esteja garantida ou, estando-o, não estiver pendente reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso contencioso ou oposição à execução tendo por objeto a mesma dívida do contribuinte, nem estar a ser paga em prestações;
e. Do confronto entre a factualidade subjacente ao caso sub judice e o disposto no artigo 89.º do CPPT, constata-se que não estão reunidos quaisquer dos requisitos da compensação de créditos previstos no referido preceito legal;
f. No caso concreto, não estavam, portanto, verificados os pressupostos da compensação, na aceção do n.º 1 do artigo 89.º do CPPT e por isso, quando na matéria de facto se deu como provado que "0 valor do IMT liquidado por força do contrato mencionado em A), no montante total do € 4.419.238,20, foi alvo do compensação pelo DUC n.º 160 008 005 183 103, no montante do €4.41 9.238,20 - cfr. fls. 31 e 38 do processo físico, bem como fls. 23, 30 e 83 do processo de reclamação graciosa apenso ao processo físico, não se pode considerar que essa compensação tenha tido como consequência a devolução do imposto indevidamente pago à Recorrente, na medida em que a mesma não ocorreu;
g. A própria Fazenda Pública jamais alegou, no âmbito dos presentes autos, que o valor do imposto efetivamente pago pela Recorrente teria sido restituído, tendo limitado a sua argumentação unicamente ao facto de entender que o IMT deve ser liquidado sobre o valor global do contrato, abrangendo, por isso, o IVA liquidado sobre o preço do imóvel, posição que, como se viu supra, a Tribunal a quo veio a dar como improcedente (e não é alvo do presente Recurso);
h. Resulta, assim, que o imposto foi efetivamente suportado pela Recorrente e nessa medida a anulação da liquidação em causa deverá ter como consequência - como consta do pedido inicial - a condenação da Administração Tributária à restituição do imposto acrescido de juros indemnizatórios;
i. Deve pois a sentença sufragada pelo Tribunal a quo ser revogada e, em consequência, deverá a mesma ser substituída por uma nova decisão a proferir pelo Tribunal ad quem, por estarem reunidas as condições para o efeito, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 665.º do CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT;
j. Em todo a caso, a Recorrente entende que, com vista à boa decisão da causa, será necessário aditar à matéria de facto provada na sentença recorrida os restantes factos provados no processo, pelo que requer nos termos do n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, o aditamento da seguinte matéria de facto, a saber:
i. Por força do contrato mencionado em A), a Recorrente procedeu, em 7 de março de 2008, ao pagamento de IMT no montante total de Eur. 4.419.238,20, correspondente documento de cobrança número 160,408.005.188.203;
ii. No mesmo dia, foi emitido o DUC 160.008.005.183.103, no valor de Eur. 0,00;
iii. A Administração Tributária manteve o ato tributário impugnado no âmbito dos presentes autos - i.e., documento de cobrança número 160.408.005.188.203, no valor de Eur. 4.419.238,20 - e, por essa razão, não restituiu qualquer valor por conta do IMT pago em excesso.
k. Considerando a matéria de facto provada no âmbito dos autos e, ainda, a matéria de facto que se requer aos Venerandos Desembargadores se dignem dar como provada nos termos acima requeridos, conclui-se que andou mal o Tribunal a quo ao considerar que a Recorrente já havia sido reembolsada (“compensada”) do imposto, pelo montante de Eur. 30.330,30, e, nessa medida, indeferiu o seu reembolso, acrescido de juros indemnizatórios;
l. Caso a Tribunal ad quem entenda que não pode conhecer do mérito dos presentes autos - designadamente por não poder aditar a matéria de facto acima identificada, o que apenas subsidiariamente se admite, mas com o devido respeito sem conceder -, deverá o Venerando Tribunal fazer descer os autos ao Tribunal de primeira instância para que este proceda à alteração da matéria de facto e conheça do mérito do processo à luz dessa alteração, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.0 do CPPT.
Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências suprirão, deverá o presente Recurso ser dado como procedente, por provado, e em consequência ser revogada a decisão recorrida (na parte aqui contestada), por ilegal, e substituída por outra que contemple as interpretações de Direito acima explanadas, dando-se provimento à pretensão da Recorrente e, em consequência, determinar-se o reembolso das quantias indevidamente pagas pela Recorrente, no montante de Eur. 30.330,30, acrescidas de juros indemnizatórios vencidos e vincendos, calculados à taxa máxima legal, até efetivo e integral pagamento, tudo com as legais consequências.
Caso assim não se entenda, com o douto suprimento, sempre se requer subsidiariamente a anulação da sentença recorrida, também nos termos descritos, e a descida dos autos à primeira instância, para que este proceda à alteração da matéria de facto e conheça do mérito do processo à luz dessa alteração, tudo com as legais consequências.”
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A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos.
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Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão a conhecer no presente recurso prende-se com a bondade da decisão recorrida na parte em que não atendeu ao pedido de restituição do imposto indevidamente pago e aos juros indemnizatórios.
3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
A) Por escritura pública de 07.03.2008, outorgada no Cartório Notarial sito na Rua C…, A..., TREIP, Lda. (antiga AAI, Lda.), ora Impugnante, declarou comprar 27 prédios urbanos à sociedade PDS, Lda., de entre os quais o prédio urbano sito em Lugar P…, Vila do Conde (verba três), pelo preço de € 2.688.620,00, com IVA incluído à taxa legal - cfr. fls. 40 e seguintes do processo físico, bem como fls. 32 e seguintes do processo de reclamação graciosa apenso.
B) O valor patrimonial tributário do prédio urbano mencionado na alínea antecedente é de € 1.049.860,00 - cfr. fls. 35 do processo físico, bem como fls. 27 do processo de reclamação graciosa apenso.
C) Da transmissão do referido prédio urbano resultou a matéria coletável do IMT no valor de € 2.688.620,00 e a coleta no valor de € 174.760,30 - cfr. fls. 35 do processo físico, bem como fls. 27 do processo de reclamação graciosa apenso.
D) Foram juntos com a escritura mencionada em A) 27 certificados de renúncia à isenção do IVA na transmissão de bem imóvel - cfr. fls. 75 do processo físico, bem como fls. 67 do processo de reclamação graciosa apenso.
E) O valor de IMT liquidado por força do contrato mencionado em A), no montante total de € 4.419.238,20, foi alvo de compensação pelo DUC n.º 160 008 005 183 103, no montante de € 4.419.238,20 - cfr. fls. 31 e 38 do processo físico, bem como fls. 23, 30 e 83 do processo de reclamação graciosa apenso ao processo físico.
F) Em 07.03.2008, a Impugnante e a sociedade PDS, Lda., outorgaram um contrato, designado de “contrato de arrendamento”, pelo qual a Impugnante deu de arrendamento o aludido prédio urbano sito no Lugar da Pêga, Vila do Conde - cfr. fls. 76 e seguintes do processo físico.
G) Em 16.07.2008 a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação mencionada em E) junto do Serviço de Finanças de Vila do Conde, com fundamento na ilegalidade da inclusão do IVA na base tributável do IMT - cfr. fls. 113 e 118 e seguintes do processo físico, bem como fls. 68 e 72 e seguintes do processo de reclamação graciosa apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
H) Por despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde em 31.12.2008, foi indeferida a reclamação graciosa apresentada pela Impugnante, com os fundamentos constantes do projeto de decisão que faz fls. 118 e seguintes do processo físico – cfr. fls. 115 do processo físico.
I) Pelo ofício n.º 104, datado de 07.01.2009, foi comunicado à Impugnante o indeferimento da reclamação graciosa – cfr. fls. 114 do processo físico.
J) Em 22.01.2009, a presente impugnação deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto – cfr. carimbo aposto a fls. 1 do processo físico.
Factos não provados com relevância para a decisão da causa:
Inexistem.
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Motivação:
Os factos dados como provados resultaram dos documentos juntos aos presentes autos e constantes do processo de reclamação graciosa apenso, que não foram objeto de impugnação por qualquer das partes, tendo sido expressamente indicado, a propósito de cada facto, o documento (ou documentos) que, em concreto, serviu de base à sua prova.”
3.2 DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos e que se prende apenas com a bondade do pedido de restituição do imposto indevidamente pago e aos juros indemnizatórios.
Na sentença recorrida, com referência à realidade apontada no parágrafo anterior, foi considerado que:
“…
No tocante aos juros indemnizatórios
Peticiona a Impugnante a restituição da quantia paga com base na liquidação impugnada, acrescida de juros indemnizatórios.
Os requisitos do direito a juros indemnizatórios previsto no artigo 43.º, n.º 1, da LGT são os seguintes:
a) Que haja um erro num ato de liquidação de um tributo;
b) Que o erro seja imputável aos serviços;
c) Que a existência desse erro seja determinada em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial;
d) Que desse erro tenha resultado o pagamento de uma dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 16.11.2017, tirado no processo n.º 138/17, bem como Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário - Anotado e Comentado, 6.ª edição, 2011, anotação ao artigo 61.º, pág. 530).
Ora, não obstante exista um erro na liquidação do IMT imputável aos serviços da Administração Tributária, a verdade é que desse erro não resultou qualquer pagamento da dívida tributária.
Efetivamente, o valor de IMT liquidado foi alvo de compensação mediante o DUC n.º 160 008 005 183 103, pelo que a Impugnante não chegou a pagar qualquer quantia (cfr. alínea E) do probatório).
Deste modo, não se verificando um dos requisitos consagrados no artigo 43.º da LGT (pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido), improcede o pedido de pagamento de juros indemnizatórios. …”.
Na matéria das suas conclusões do recurso, a Recorrente questiona a sentença recorrida quanto à decisão sobre a matéria de facto, sendo que constituindo tal erro de julgamento não só o primeiro aduzido mas, em especial, aquele de cuja decisão estaria dependente o que este Tribunal de recurso viesse a decidir quanto ao erro de julgamento de direito, impõe-se, naturalmente, que à sua apreciação venha a ser dada primazia.
Vejamos.
Na óptica da Recorrente, com vista à boa decisão da causa, será necessário aditar à matéria de facto provada na sentença recorrida os restantes factos provados no processo, pelo que requer nos termos do n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, o aditamento da seguinte matéria de facto, a saber:
i. Por força do contrato mencionado em A), a Recorrente procedeu, em 7 de março de 2008, ao pagamento de IMT no montante total de Eur. 4.419.238,20, correspondente documento de cobrança número 160,408.005.188.203;
ii. No mesmo dia, foi emitido o DUC 160.008.005.183.103, no valor de Eur. 0,00;
iii. A Administração Tributária manteve o ato tributário impugnado no âmbito dos presentes autos - i.e., documento de cobrança número 160.408.005.188.203, no valor de Eur. 4.419.238,20 - e, por essa razão, não restituiu qualquer valor por conta do IMT pago em excesso.
Como referência aos elementos apontados, e tendo presente os elementos que entretanto foram juntos aos autos nesta Instância, crê-se pertinente, aditar ao probatório, nos termos do art. 712º nº 1 do C. Proc. Civil (actual art. 662º) o seguinte, aproveitamento o esclarecimento prestado pela aqui Recorrida:
K) Por força do contrato mencionado em A), foi liquidado o IMT 2008/56031 - DUC nº 160008005183103, no valor de € 4.419.238,20, pago em 07-03-2008 (fls. 299-309 destes autos).
L) Antes de efectuada, a escritura foi rectificada, por erro na identificação da verba 27, conforme processo de rectificação de IMT de que resultou o IMT 2008/56085 - DUC nº 160408005188203, pago por compensação com o valor anulado no DUC anterior (fls. 299-309 destes autos).
M) Da liquidação, objecto da presente impugnação, respeitante à verba 23, foi liquidado o valor € 2.688.620,00 e pago o IMT correspondente ao valor de € 174.760,30 em 07-03-2008 (fls. 299-309 destes autos).
A partir daqui, importa analisar a bondade do pedido de restituição do imposto indevidamente pago e juros indemnizatórios formulado pela Recorrente e averiguar da pertinência do decidido quando se refere que o valor de IMT liquidado foi alvo de compensação mediante o DUC n.º 160 008 005 183 103, pelo que a Impugnante não chegou a pagar qualquer quantia.
Na verdade, não existe já dissídio nos autos sobre a realidade essencial subjacente à presente impugnação, dado que, no que concerne à verba nº 23 descrita na escritura apontada no ponto A) do probatório, foi entendido que “… Ora, o IVA não faz parte da contraprestação devida ao vendedor pela transmissão do imóvel, dado que o vendedor está obrigado a entregar tal IVA ao Estado, e, qua tale, o IVA não engloba a “contrapartida” devida pela aquisição do imóvel, enquanto valor que ingressa ou é suscetível de ingressar no património do vendedor.
Ademais, na medida em que o comprador tenha direito à dedução do IVA suportado, é duvidoso o entendimento de que o IVA constitua um verdadeiro encargo.
Daí que a sujeição da operação a IVA não tenha a virtualidade de alterar - aumentando-a - a base tributável do IMT.
Por conseguinte, porque o IVA liquidado não deveria ter integrado o valor do contrato para efeitos de inclusão na base tributável, nos termos do artigo 12.º, n.º 1 e n.º 5, alínea h), do Código do IMT, a liquidação de IMT em crise padece da ilegalidade apontada pela Impugnante, o que determina a procedência da ação no tocante à anulação do ato impugnado. …”.
Nesta sequência, e de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 43º da LGT, «São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido», o que significa que o direito a juros indemnizatórios depende da existência de um erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços, de que tenha resultado o pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, ou seja, a lei quis somente relevar, para efeito de pagamento de juros indemnizatórios, o erro que tenha levado a Administração Tributária a uma ilegal definição da relação jurídica tributária do contribuinte, não relevando, assim, os vícios que, ferindo, embora, de ilegalidade o acto, não impliquem uma errónea definição daquela relação, não impliquem a existência de uma liquidação superior à legalmente devida (como acontece com os vícios formais ou procedimentais).
Na verdade, o reconhecimento judicial de um vício formal nada diz ou revela sobre a relação jurídica fiscal e sobre o carácter indevido da prestação tributária face às normas substantivas, pois que se limita a exprimir a desconformidade com a lei do procedimento adoptado para a declarar, não implicando, pois, a existência de um vício na relação jurídica tributária, nem a existência de um juízo sobre o carácter indevido da prestação pecuniária cobrada pela Administração.
Assim sendo, e na medida em houve erro imputável aos serviços para efeitos no disposto no art. 43º nº 1 da Lei Geral Tributária, que levam ao pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes de imposto pagos, calculados desde a data em que ao Impugnante efectuou o respectivo pagamento do imposto até à data em que vier a ser emitida a respectiva nota de crédito, em conformidade com o disposto no artigo 61º nº 3 do CPPT.
Neste ponto, diga-se que a própria decisão recorrida reconhece que existe um erro na liquidação do IMT imputável aos serviços da Administração Tributária e, como tal, susceptível de viabilizar a pretensão da ora Recorrente, referindo depois que desse erro não resultou qualquer pagamento da dívida tributária, não fazendo a melhor leitura dos elementos presentes nos autos com referência ao valor pago em termos globais com referência ao contrato referido nos autos, quando aquilo que interessava era apenas o valor liquidado com referência ao imóvel descrito nos autos e qualquer eventual alteração relacionada com o mesmo e o referido valor.
Pois bem, a leitura dos elementos presentes nos autos, nomeadamente quando se tem presente que por força do contrato mencionado em A), foi liquidado o IMT 2008/56031 - DUC nº 160008005183103, no valor de € 4.419.238,20, pago em 07-03-2008, sendo que, antes de efectuada, a escritura foi rectificada, por erro na identificação da verba 27, conforme processo de rectificação de IMT de que resultou o IMT 2008/56085 - DUC nº 160408005188203, pago por compensação com o valor anulado no DUC anterior, verificando-se que da liquidação, objecto da presente impugnação, respeitante à verba 23, foi liquidado o valor € 2.688.620,00 e pago o IMT correspondente ao valor de € 174.760,30 em 07-03-2008, permite apreender de forma simples o equívoco da sentença recorrida.
Com efeito, é certo que a liquidação de IMT relacionada com o contrato descrito nos autos não sofreu qualquer alteração em função do processo de rectificação (que não envolveu a verba nº 23), o que justificou o procedimento adoptado nos termos referidos no parágrafo anterior.
No entanto, tal situação não tem qualquer relação com a situação do imóvel que interessa de forma particular aos autos, porquanto, em sede de IMT não houve qualquer alteração à matéria colectável e respectiva colecta tal como se alcança da documentação que a AT entretanto juntou aos autos e que foi relevada no âmbito do aditamento ao probatório.
Assim sendo, a Recorrente liquidou o valor de IMT correspondente, questionando depois no âmbito da presente impugnação a pertinência do mesmo com referência ao imóvel descrito nos autos, tendo o Tribunal a quo reconhecido a bondade da alegação da Impugnante, determinando a anulação da liquidação neste domínio.
Tal significa que não houve qualquer alteração da situação de facto, a não ser em resultado da decisão recorrida, o que equivale a dizer que não existe qualquer motivo para não retirar as consequências do próprio discurso da aludida decisão, ou seja, na medida em houve erro imputável aos serviços para efeitos no disposto no art. 43º nº 1 da Lei Geral Tributária, que levam ao pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes de imposto pagos, calculados desde a data em que à ora Recorrente efectuou o respectivo pagamento do imposto até à data em que vier a ser emitida a respectiva nota de crédito, em conformidade com o disposto no artigo 61º nº 3 do CPPT, procedendo-se naturalmente também à devolução do valor do imposto na parte que não era devida.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, condenando-se a Administração Tributária a proceder ao reembolso do imposto pago com referência ao imóvel descrito nos autos, na parte não devida, no montante de € 30.330,30 e a pagar à ora Recorrente juros indemnizatórios calculados sobre o aludido montante de imposto pago por ela, desde a data em que foi efectuado esse pagamento (07-03-2008) até à data em que vier a ser emitida a respectiva nota de crédito.
Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias; nesta instância, as custas não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.
Notifique-se. D.N..
Porto, 13 de Dezembro de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos