Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00058/21.9BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/27/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Manuel Escudeiro dos Santos
Sumário:I - O artigo 52.º, n.º 4, da LGT, estabelece que a par de dois requisitos de verificação alternativa — (i) o caso de a prestação de garantia causar prejuízo irreparável ou (ii) a verificação de manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, existe um outro critério, de verificação cumulativa com os anteriores, com vista ao deferimento do pedido de isenção de garantia - (iii) a inexistência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.

II - A apreciação da legalidade do ato de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia só pode fazer-se tendo em conta os elementos de facto e de direito que condicionaram a respetiva prolação.

III – Sem a concretização dos custos com a prestação de garantia não é possível aquilatar, mediante um juízo de prognose póstuma, da probabilidade de eclosão de um dano irreversível na atividade da Recorrente.

IV – Sobre a Recorrente recai o ónus de alegar e demonstrar os factos suscetíveis de integrarem a insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, reveladora da manifesta falta de meios económicos.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:H., SA
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1. RELATÓRIO

H. S.A., veio interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou totalmente improcedente a Reclamação deduzida contra a decisão do Diretor de Finanças do Porto, de 14/12/2020, que no processo de execução fiscal n.º 1759202001062980, instaurado no Serviço de Finanças de Amarante para cobrança coerciva de dívida ao Município da (...), referente a ato administrativo praticado no ano de 2014, cuja quantia exequenda é de € 445.998,00, à qual acrescem juros e custas, indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:

“A. A douta Sentença proferida nos presentes autos negou provimento à reclamação da decisão do órgão de execução fiscal, apresentada pela ora Recorrente com vista à anulação do despacho proferido em 19/01/2021 pelo Exmo. Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Amarante, através do qual indeferiu a dispensa de garantia apresentada pela ora Recorrente.
B. O Tribunal recorrido considerou não estarem reunidas as condições necessárias para que possa ser concedida a dispensa de garantia, para efeitos de suspensão do processo de execução, tendo fundamentado a sua decisão, no facto de que “ (...) não estão preenchidos os requisitos previstos para que fosse atribuída à reclamante a dispensa de prestação de garantia.”
C. Na sua motivação considerou que “a reclamante deveria ter demonstrado em que é que se concretiza o prejuízo irreparável que a prestação de garantia lhe acarretaria, o que não sucedeu, uma vez que não concretizou quais os montantes a suportar com sua constituição e em que medida os eventuais encargos, que nunca quantificou, iriam provocar estrangulamento financeiro”. Por outro lado, que “a reclamante não fez qualquer prova que a insuficiência ou inexistência dos bens não é da sua responsabilidade, não fazendo, de facto, qualquer menção quanto a este requisito”.
D. Concluindo que que “a reclamante no procedimento do pedido de dispensa de prestação de garantia não logrou fazer prova da verificação de todos os pressupostos para o deferimento do seu pedido. A prova documental não foi bastante para comprovar a verificação de todos os requisitos para o deferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, sobretudo para demonstrar que a insuficiência ou inexistência dos bens não é da sua responsabilidade”.
E. Não colocando em causa o respeito que a Sentença proferida pelo Tribunal recorrido merece, a Recorrente jamais poderá concordar com o sentido da mesma, pelos motivos que seguidamente tentará expor;
F. De facto, a Recorrente considera que o Tribunal a quo não valorou, pormenorizadamente e detalhadamente, os meios de prova juntos aos autos, o que conduziu a um entendimento completamente distinto daquele a que a matéria factual deveria ter encaminhado;
G. Nesse sentido, considerou, “em síntese, que a reclamante no procedimento do pedido de dispensa de prestação de garantia não logrou fazer prova da verificação de todos os pressupostos para o deferimento do seu pedido. A prova documental não foi bastante para comprovar a verificação de todos os requisitos para o deferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, sobretudo para demonstrar que a insuficiência ou inexistência dos bens não é da sua responsabilidade”.
H. Com tal entendimento não pode a Recorrente concordar, principiando por dissecar a alegada existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação de garantia e da falta de bens económicos para a prestar, previstas no n.º 4 do artigo 52.º da LGT;
I. Efetivamente, a Recorrente alegou e sustentou que se encontra a cumprir um Plano Especial de Revitalização, para o qual canaliza grande parte do seu rendimento, tendo que disponibilizar uma parte considerável do seu rendimento para dar cumprimento às obrigações do PER, uma vez que a principal fonte de rendimento para o cumprimento integral do PER seria a recuperação de créditos junto dos seus clientes, tendo para o efeito intentado diversas ações judiciais que ainda se encontram a decorrer.
J. Situação a que acresce, que no exercício da sua atividade, a 31 de agosto de 2020, a Recorrente totalizava a quantia de € 341.008,08 como médios mensais da empresa e o montante de € 128.823,59, antes de impostos, como fluxo de caixa de atividade, valor que a Recorrente não pode dispor para prestação de garantia, uma vez que isso levaria ao incumprimento generalizado das suas obrigações, nomeadamente, salários, encargos fiscais, segurança social, seguros, encargos com a sua organização e os seus compromissos assumidos no seu PER.
K. Uma vez que não possuía capacidade financeira para satisfazer a prestação de caução com recursos próprios, a Recorrente tentou obter junto de entidade bancária a emissão de garantia bancária no valor da caução a prestar, a qual foi indeferida, uma vez que a entidade bancária “após a análise da operação solicitada, tendo presente o risco inerente, o banco não se encontra disponível para a emissão da garantia bancária solicitada”.
L. O que leva a concluir, que estando a Recorrente, impossibilitada de apresentar garantia bancária, teria de canalizar todo o seu fluxo de caixa da atividade para a prestação de garantia no processo de execução fiscal, o que lavaria ao incumprimento a todas as suas obrigações, o quer por si só acarretaria um prejuízo irreparável para a Recorrente e, consequentemente, para com todos os seus credores, uma vez que entraria de imediato em situação de insolvência.
M. Conforme acórdão do TCAN de 23/11/2012, processo 01158/12.1BEPRT, “Quanto ao prejuízo irreparável com a prestação de garantia, deve o interessado indicar em que é que se concretiza e indicar as razões que o levam a crer que existe uma séria possibilidade de tal prejuízo vir a ocorrer caso a mesma lhe venha a ser exigida.”
N. Ora, a Recorrente logrou demonstrar o prejuízo irreparável com a prestação de garantia, uma vez que resulta evidente que a prestação da garantia levaria a Recorrente a incumprir as suas obrigações de forma generalizada, despontando a sua Insolvência, o que por si só constitui um prejuízo irreparável.
O. Pelo que é notório o erro de julgamento, em matéria de facto e direito, pois resulta evidente que Recorrente logrou demonstrar que a prestação de garantia no valor de € 693.692,35 constitui um prejuízo irreparável, pelo que a Recorrente logrou demonstrar, nos termos do artigo 52.º n.º 4 da LGT, 170.º do CPPT e 342.º do CC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea d) da LGT e artigo 74.º n.º 1 da LGT, o prejuízo irreparável.
P. De igual modo resultou da prova documental, que a situação económica da Recorrente não lhe permite oferecer garantia bancária, tal como adveio do documento bancário junto com o requerimento, nos termos do qual a entidade bancária recusou a emissão de garantia.
Q. Por outro lado, a Recorrente alegou que não dispunha de bens capazes de constituírem uma garantia para o valor em causa, entendendo o Tribunal a quo “A verdade é que apesar de o valor dos referidos bens, € 66.365,96, não ser suficiente para garantir o valor em causa, a reclamante sempre poderia oferecer como garantia o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica, tal como mencionado pela AT” e que “existem na esfera jurídica, da reclamante bens suscetíveis de poderem constituir garantia, designadamente ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados, intermédios, produtos e trabalhos em curso e/ou o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica, conforme se pode constatar pelo balancete e pela IES.”
R. Ora, resulta dos fatos dados como provados que sobre os imóveis, enumerados no pedido apresentado pela Recorrente, incidem vários encargos, como hipotecas e penhoras, sendo os que aqueles sobre os quais se poderia constituir hipoteca, no seu conjunto, totalizam o valor patrimonial de € 66.356,96.
S. Ainda, conforme alínea L), dos fatos dados como provados, que a Recorrente “dispõe de viaturas automóveis e outros ativos fixos tangíveis, no valor de €36.844,50, em inventário o valor de €3.572.593,25, nos anos de 2018 e 2019, produtos acabados e intermédios, no valor de €2.468.692,71, e/ou produtos e trabalhos em curso, no valor de €1.047.121,90 (balancete e IES juntos à petição inicial como documentos n.ºs 3, 4 e 5).
T. No entanto, resulta do Balancete apresentado pela Recorrente que os bens que constam do inventário, produtos acabados e intermédios e/ou produtos e trabalhos em curso, correspondem aos bens móveis e imóveis, constantes da listagem junta com a Petição Inicial sobre os quais recaem obrigações.
U. É notório o erro de julgamento, em matéria de facto e direito, quando o Tribunal a quo, dá como provado na alínea L) que a Recorrente “dispõe de viaturas automóveis e outros ativos fixos tangíveis, no valor de €36.844,50, em inventário o valor de €3.572.593,25, nos anos de 2018 e 2019, produtos acabados e intermédios, no valor de €2.468.692,71, e/ou produtos e trabalhos em curso, no valor de € 1.047.121,90.
V. Na verdade, os “ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados, intermédios, produtos e trabalhos em curso”, os quais o Tribunal a quo considera que poderiam ser oferecidos para garantir o valor a prestar, totalizam a quantia de € 77.572,85, valor que se mostra, conforme resulta da douta Sentença, “não ser suficiente para garantir o valor em causa”.
W. Conclui ainda o Tribunal a quo que “a reclamante sempre poderia oferecer como garantia o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica, tal como mencionado pela AT”.
X. Como resulta do acórdão do TCA Sul, processo 1868/17.7BELRS, “Incorre em erro de direito o órgão de execução fiscal que indefere o pedido de dispensa de prestação de garantia com base na existência de estabelecimento comercial penhorável quando no despacho reclamado reconhece que o seu valor é insuficiente para pagamento da quantia exequenda, pois o critério legal é o da insuficiência dos bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, e portanto, ainda que existam bens penhoráveis, se estes forem insuficientes para o pagamento da dívida exequenda, encontra-se preenchido um dos pressupostos legais alternativos do n.º 4 do art. 52.º da LGT, devendo ser dispensada a prestação da garantia”.
Y. É notório que os bens penhoráveis da Recorrente, totalizam a quantia de € 77.572,85, pelo que o critério da insuficiência de bens para pagamento da quantia exequenda, se encontra verificado, mesmo considerando o estabelecimento comercial, uma vez que resulta que todo o ativo não se mostra suficiente para garantir a quantia exequenda.
Z. A Recorrente não tem, manifestamente, condições económicas bastantes para obter garantia bancária, nem tão pouco caucionar com depósito de dinheiro, títulos de crédito, nem património seu para constituir penhor ou hipoteca, de forma a garantir a quantia de € 693.692,35.
AA. De acordo com o acórdão do TCA Sul, diz-nos ainda que só não se encontram preenchidos os pressupostos legais alternativos do n.º 4 do artigo 52.º da LGT se “o órgão de execução fiscal demonstrar a existência de “fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado”, o que não se verificou.
BB. Resulta do despacho de 14-12-2020 “Dispõe o n.º4 do artigo 52.º da LGT que a concessão da dispensa depende da não existência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado. No entanto, e dado que não ficou demonstrada a insuficiência/inexistência de bens ou prejuízo irreparável, fica prejudicada a apreciação da sua irresponsabilidade relativamente á insuficiência/inexistência de bens”.
CC. Da prova apresentada com o Pedido de Dispensa de Garantia e com a Reclamação, resulta evidente que se verificou erro de julgamento, quanto à matéria de facto e direito, pelo que douta decisão é ilegal.
DD. Na verdade, a prestação de uma garantia no valor de € 693.692,35 causa um prejuízo irreparável à Recorrente, uma vez que levaria a que a mesma à insolvência.
EE. Ainda, é manifesta falta de meios económicos, uma vez que considerando todos os ativos constantes do Balancete apresentado e a resposta da entidade bancária, o que se deu como provado, a Recorrente não tinha como garantir o pagamento da divida exequenda, através da constituição de hipoteca, penhor, sobre os seus bens, e de prestar garantia bancária.
FF. Não tendo o órgão de execução fiscal logrado demonstrar que o prejuízo irreparável e a insuficiência ou inexistência bens penhoráveis se devem a atuação dolosa da Recorrente.
GG. Em face à prova documental junta, fácil é concluir que Tribunal a quo fez uma interpretação errada da prova junta, pelo se verifica o preenchimento dos requisitos de que depende a isenção da prestação de garantia, devendo, consequentemente, ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, determinando-se a anulação do despacho de indeferimento proferido pelo Exmo. Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Amarante, por violação do disposto no n.º 4 do artigo 52º, da LGT, substituindo-se por outro a deferir a dispensa de prestação de garantia e a suspensão do processo de execução fiscal. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, com as legais consequências, fazendo-se assim
Justiça!
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Não foram apresentadas contra-alegações de recurso.
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O Digno Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Atendendo à existência do processo em suporte informático e à conjuntura atual de pandemia, dispensa-se os vistos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.
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DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO ─ Questões a apreciar:

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)].
Cumpre apreciar e decidir se, face aos fundamentos invocados pela ora Recorrente, estão reunidos os pressupostos previstos nos artigos 52.º, n.º 4, da LGT e 170.º do CPPT, para a dispensa de prestação de garantia.
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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. MATÉRIA DE FACTO

2.1.1. O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma:

“O Tribunal julga provados os seguintes factos relevantes para a decisão da causa:
A) Em 11/11/2014, no processo n.º 353/14.3TBAMT, que correu termos na Comarca Porto Este, Amarante – Instância Central – Secção do Comércio – J2, foi homologado por sentença o plano de revitalização da reclamante (doc. 1 junto à petição inicial).
B) Em 24/8/2020, o Serviço de Finanças de Amarante instaurou contra a reclamante o PEF n.º 1759202001062980, no montante de €445.998,00, para cobrança coerciva da dívida ao Município da (...), do ano de 2014 (informação de 3/12/2020 a fls. 78-86).
C) Em 31/8/2020, a reclamante enviou um e-mail para o Banco (...) com o seguinte teor (doc. 8 junto à petição inicial):
“Bom dia Dr. E..
Espero que se encontre bem…
No seguimento da Citação do Processo Executivo da AT N.º 1759202001062980, relativo à multa contratual do Município da (...), pelo presente solicitamos a v/ apreciação para emissão de garantia bancária no valor de €693.692,35, de forma a prestarmos caução, no âmbito da contestação que iremos efetuar, nos termos legais, a esta citação. (…)”.
D) Em 2/9/2020, a reclamante recebeu um e-mail do Banco (...) com o seguinte teor (doc. 8 junto à petição inicial):
“Bom dia
Após análise da operação solicitada, tendo presente o risco inerente, o banco não se encontra disponível para emissão da garantia bancária solicitada.
Com os melhores cumprimentos”.
E) Em 15/9/2020, a reclamante foi citada para o PEF referido em B), através do via CTT (fls. 75-76).
F) Em 29/9/2020, a reclamante apresentou oposição à execução (informação de 3/12/2020 a fls. 78-86).
G) Em 13/10/2020, a reclamante pediu a dispensa de prestação de garantia, com o seguinte teor (informação de 3/12/2020 a fls. 78-86 e doc. 1 junto à petição inicial):
“Exma. Senhora:
Diretora do Serviço de Finanças de Amarante
(…)
Processo de execução fiscal n. º 1759202001062980
Identificação do Executado: 502220821
H. S.A, com sede em (…), com o NIPC (…), Executada no processo à margem melhor identificado, vem usando do direito consignado no artigo 52. º, n. º 4 da LGT em conjugação com o artigo 170. º do CPPT, requerer a
DISPENSA DA PRESTAÇÃO DE GARANTIA
Nos termos e com os fundamentos seguintes:
1- A Executada é uma sociedade anónima que se dedica à execução, mediante contrato de empreitada, de obras públicas e particulares, tais como estradas, pontes, aeroportos, vias férreas, portos, barragens, edifícios e outras construções e obras de quaisquer natureza, promoção, construção e venda, por conta própria de empreendimentos imobiliários e turísticos, bem como urbanização, loteamento e venda de terrenos para construção; compra de terrenos e prédios para revenda; elaboração de estudos técnicos de engenharia e montagem de equipamentos, entre outras, conforme resulta da consulta da certidão permanente com o código de acesso n º 5142-8675-8479.
2- No âmbito da sua atividade nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 a Executada em virtude da crise no setor da construção entrou numa situação económica difícil, que se ficou a dever aos constantes atrasos nos pagamentos dos seus clientes, bem como na dificuldade em proceder à venda de ativos.
3- No dia 11 de março de 2014, a Executada apresentou-se a um Plano Especial de Revitalização, nos termos do C.I.R.E., dando entrada com o respetivo requerimento oque deu origem ao Processo n. º 353/14.3 TBAMT, a correr termos no 2. º Juízo do Tribunal Judicial de Amarante.
4- Por sentença já transitada em julgado a 28 de novembro de 2014, foi homologado o plano de revitalização apresentado pela H., conforme documento que ora se junta e que, para os devidos e legais efeitos, se dá por integralmente reproduzido, cfr. doc. 1
5- No âmbito do referido plano foi relacionado montante de € 23.570.904,30 (vinte e três milhões quinhentos e setenta mil novecentos e quatro euros e trinta cêntimos).
6- A H. encontra-se a cumprir o Plano Especial de Revitalização o qual canaliza uma grande parte do seu rendimento mensal, sendo previsível dispensar para pagamento da divida proveniente do PER a quantia de € 850.309,61 (oitocentos e cinquenta mil trezentos e nove euros e sessenta e um cêntimos) no ano de 2020, cfr. doc. 2.
7- Uma das fatias importantes para o cumprimento integral do PER seria a recuperação de créditos junto dos seus clientes os quais mostraram ser necessário o acionamento judicial, processos que ainda se encontram pendentes, conforme lista que se junta como doc. 3, que aqui se junta para os devidos efeitos.
8- A Executada vê-se obrigada todos os meses a reajustar o Plano Especial de Revitalização junto dos seus credores, tendo que disponibilizar uma parte considerável do seu rendimento atual de forma a dar cumprimento às obrigações decorrentes do PER.
9- Como resulta da declaração de informação simplificada da Executada, relativa aos anos de 2018 e 2019, verifica-se que a demonstração de resultados positiva no montante de € 97.678,35 (noventa e sete mil seiscentos e setenta e oito euros e trinta e cinco cêntimos), conforme doc. 4 e 5 que aqui se junta para os devidos efeitos legais e que oficiosamente podem consultar.
10- A Executada no exercício da sua atividade tem uma despesa de € 259.961.34 (duzentos e cinquenta e nove mil novecentos e sessenta e um euros e trinta e quatro cêntimos), com o pessoal ao seu serviço, aquisição de produtos e fornecimento de serviços, conforme resultados de exploração que se junta como doc. 6 que aqui se junta para os devidos efeitos legais.
11- A 31 de agosto de 2020 os custos médios mensais da empresa são de € 341.008,02 (trezentos e quarenta e um mil e oito euros e dois cêntimos), sendo que o resultado do fluxo de caixa da atividade, antes de impostos, apresenta um saldo positivo de € 128.823,59 (cento e vinte oito mil oitocentos e vinte e três euros e cinquenta e nove cêntimos), cfr. doc. 7 que aqui se junta para os devidos efeitos legais.
12- Em face das circunstâncias demonstradas, a Executada encontra-se numa situação em a prestação de caução no valor de € 693.692,35 (seiscentos e noventa e três mil seiscentos e noventa e dois euros e trinta e cinco cêntimos), lhe provoca um prejuízo irreparável, uma vez que os proveitos da sua atividade são inferiores à mesma o que levaria à falência da sua tesouraria, levando a que parasse a sua atividade.
Ainda,
13- Dada falta de capital para satisfazer a prestação de caução a título de garantia, a Executada tentou obter junto da banca garantia bancária no valor da garantia a prestar.
14- Motivada pelos pontuais atrasos no pagamento das prestações resultantes do Plano Especial de Revitalização e por não dispor de bens desonerados de encargos, foi recusada a emissão da garantia bancária solicitada. Cfr. Doc. 8 que aqui se junta para os devidos efeitos legais.
15- Por outro lado, a emissão de garantia bancária no montante da caução a prestar, impossibilita que a Executada possa exercer a sua atividade, o que provocaria o seu colapso financeiro.
Vejamos,
16- Executada dedica-se à realização de Empreitadas Publicas, sendo esta no momento a sua única atividade.
17- De acordo com o previsto no Código dos Contrato Públicos no seu artigo 88. º e ss., para celebrar Contratos Públicos e permitir que as obras lhe sejam adjudicadas, a Executada necessita de prestar caução que garanta a celebração do contrato, bem como o exato e pontual cumprimento de todas as obrigações legais e contratuais, sendo a mesma feita através da prestação de garantias bancárias dada a atual debilidade económica da Executada.
18- No exercício da sua atividade a Executada tem dificuldades na emissão de garantias bancárias, o que ficaria irremediavelmente comprometido com a emissão de uma garantia no valor de € 693.692,35 (seiscentos e noventa e três mil seiscentos e noventa e dois euros e trinta e cinco cêntimos)
19- Assim, é de todo impossível à Executada prestar garantia no processo de Execução n. º 1759202001062980.
Acresce,
20- A Executada manifesta insuficiência de bens suscetíveis de penhora ou que possam assegurar integralmente o crédito da Administração Tributária.
21- A H. possui os seguintes imóveis:

–––––––– ver imagem no documento original ––––––––––––––––––

22- Como resulta da listagem, sobre os referidos imóveis incidem vários encargos, como hipotecas e penhoras, conforme oficiosamente pode ser verificado.
23- As Hipotecas foram constituídas no âmbito da atividade da Executada de forma a permitir a liquidez da mesma e garantir a emissão de garantias bancárias.
24- No entanto, existe uma parte dos imóveis que não incidem encargos, mas o seu valor patrimonial não se mostra suficiente para garantir a totalidade do valor a caucionar.
25- Acresce, que tem ainda em sua propriedade dois veículos automóveis coma as matrículas XX-XX-XX e XX-XX-XX, os quais são essenciais para o exercício da sua atividade.
26- A penhora dos referidos veículos impossibilitaria o exercício da atividade da executada o que causaria prejuízos avultados.
27- O valor patrimonial dos referidos veículos é diminuto.
28- Assim, face ao supra exposto, é evidente a manifesta a falta de condições económicas de a Executada garantir através de caução a quantia exequenda e seus acrescendo, o que não se deve de todo à sua conduta.
29- Termos em que deve ser ordenada a isenção da prestação de garantia por parte da Executada, por a mesma lhe causar um prejuízo irreparável e pela manifesta falta de meios económicos para pagamento da divida exequenda e acrescido.
Termos em que requer a V. Exa. que seja reconhecida a isenção da prestação de garantia Processo de execução fiscal n.º 1759202001062980, ao abrigo do disposto no artigo 52.º, n.º 4 da LGT em conjugação com o artigo 170.º do CPPT”
H) Com este requerimento a reclamante juntou prova documental (informação de 3/12/2020 a fls. 78-86 e doc. 1 junto à petição inicial).
I) Pelo ofício n.º 2020S000198018 de 15/12/2020, através de carta com aviso de receção com registo RF 5400 1936 6 PT, a reclamante teve conhecimento, em 16/12/2020, do despacho de 14/12/2020, no qual foi decidido o indeferimento do pedido de dispensa de garantia (fls. 94-95 e fls. 78-86).
J) A reclamante tem, na sua titularidade os seguintes bens:
- Um total de 198 imóveis (5 prédios rústicos e 193 prédios urbanos) com um VPT global de €2.323.965,83; e
- 2 veículos automóveis: um Peugeot 206, com matrícula XX-XX-XX, com data de 2007/02/28 (encontra-se registada hipoteca a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social IP, com registo em 2015/10/30) e uma Toyota Dyna, com matrícula XX-XX-XX, com data de 2009/7/23, sem ónus registados (informação de 3/12/2020 a fls. 78-86).
K) A reclamante tem, na sua esfera patrimonial, os seguintes imóveis, livres de quaisquer ónus: artigo urbano 2847 – fração AI, da freguesia de (…), - com VPT de € 893,20; artigo urbano 2847 – fração AQ da freguesia (…), - com VPT de €2.486,75; artigo urbano 2847 – fração J da freguesia de (…), - com VPT de € 1.552,95; artigo urbano 2773 – fração B da freguesia de (…), - com VPT de € 3.593,10; urbano 2869 – fração G da freguesia de (…), - com VPT de € 3.136,35; artigo urbano 2955 – fração AA da freguesia de (…), - com VPT de € 1.168,90; artigo urbano 2955 – fração AB da freguesia de (…), - com VPT de € 1.441,30; artigo urbano 2955 – fração AC da freguesia de (…), - com VPT de € 1.461,60; artigo urbano 2955 – fração AE da freguesia de (…), - com VPT de € 1.898,05; artigo urbano 2955 – fração Z da freguesia de (…), - com VPT de € 1.278,90; artigo urbano 2116, da freguesia de (...), - com VPT de € 23.679,95; artigo urbano 2115, da freguesia de (...), - com VPT de € 23.679,95; artigo rústico 1073, da freguesia de (...), - com VPT de € 47,99; artigo rústico 1074, da freguesia de (...), - com VPT de € 46,97, perfazendo o valor total de €66.365,96 (informação de 3/12/2020 a fls. 78-86).
L) A reclamante dispõe de viaturas automóveis e outros ativos fixos tangíveis, no valor de €36.844,50, em inventário o valor de €3.572.593,25, nos anos de 2018 e 2019, produtos acabados e intermédios, no valor de €2.468.692,71, e/ou produtos e trabalhos em curso, no valor de €1.047.121,90 (balancete e IES juntos à petição inicial como documentos n.ºs 3, 4 e 5).
M) O PEF referido em B) encontra-se suspenso (informação de 19/1/2021 a fls. 87-93).
Com relevância para a decisão da causa, inexiste matéria de facto julgada não provada.

3.1.1 – Fundamentação da matéria de facto.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, na parte em que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT) e 342.º do Código Civil (CC)), também são corroborados pelos documentos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do CC) identificados em cada um dos factos e confessados pelas partes.
A restante matéria alegada não foi julgada provada ou não provada, por constituir considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito ou por não ter relevância para a decisão da causa.”

*
2.2. DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

A Recorrente nas alegações recursivas “considera que o Tribunal a quo não valorou, pormenorizadamente e detalhadamente, os meios de prova juntos aos autos, o que conduziu a um entendimento completamente distinto daquele a que a matéria factual deveria ter encaminhado; (…) Pelo que é notório o erro de julgamento, em matéria de facto e direito, pois resulta evidente que a Recorrente logrou demonstrar que a prestação de garantia no valor de € 693.692,35 constitui um prejuízo irreparável, pelo que a Recorrente logrou demonstrar, nos termos do artigo 52.º n.º 4 da LGT, 170.º do CPPT e 342.º do CC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea d) da LGT e artigo 74.º n.º 1 da LGT, o prejuízo irreparável. (…) Da prova apresentada com o Pedido de Dispensa de Garantia e com a Reclamação, resulta evidente que se verificou erro de julgamento, quanto à matéria de facto e direito, pelo que douta decisão é ilegal (…) É notório o erro de julgamento, em matéria de facto e direito, quando o Tribunal a quo, dá como provado na alínea L) que a Recorrente “dispõe de viaturas automóveis e outros ativos fixos tangíveis, no valor de €36.844,50, em inventário o valor de €3.572.593,25, nos anos de 2018 e 2019, produtos acabados e intermédios, no valor de €2.468.692,71, e/ou produtos e trabalhos em curso, no valor de € 1.047.121,90.”.

Vejamos:
Consagra artigo 607.º, n.º 5, CPC o princípio da livre apreciação da prova, segundo o qual o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - cfr. Artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação. Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência, nos termos do artigo 607.º, n.ºs 2 a 4, do CPC.

Como se refere no acórdão do TCAS, de 11-04-2019, recurso n.º 492/11.2BELRS, consultável em www.dgsi.pt:
“O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos atos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorretas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexata dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72)”.

Atento o disposto no artigo 640.º, n.º 1, do CPC aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT
1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Da interpretação conjugada dos artigos 662.º e 640.º do CPC, resulta que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, desde que o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, indique os concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

No caso sub judice, a Recorrente nalgumas situações não especifica os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados ou, quando os especifica, não indica os concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

Nesta medida, o presente recurso não pode ser conhecido nesta parte.

*
2.2.1. Aditamento oficioso à matéria de facto:

Ao abrigo do artigo 662.º do Código do Processo Civil importa aditar ao probatório os seguintes factos que igualmente se mostram provados:
N) Em apreciação do pedido de dispensa da prestação de garantia foi elaborada na DF do Porto a seguinte informação:
«ASSUNTO: APRECIAÇÃO DE DISPENSA DE GARANTIA
A. Processo
1. Nome: H., S.A. NIF (…)
2. PEF: 1759202001062980
3. Serviço remetente: Serviço de Finanças (SF) Amarante
4. Natureza da dívida: Ato Administrativo - Exequente Município da (...)
5. Valor instaurado: €445.998,00
B. Sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia
1. Data da apresentação do pedido: 2020-09-04
2. Causa suspensiva Oposição Judicial (SICJUT n.º 1759202009000054), com data de apresentação a 2020-09-29
3. Valor da garantia apurada €692.722,76, conforme simulação à data de 2020-11-27
4. Valor atual em dívida €571.713,99
5. Fundamentos apresentados pelo sujeito passivo:
- Alega: Manifesta falta de meios económicos e prejuízo irreparável
6. Elementos juntos ou requeridos:
Requeridos: Balancete analítico atualizado, balanço e respetivos anexos de 2019, mapa de depreciações/amortizações 2019, extratos Bancários atualizados e outros documentos que julgasse pertinentes.
C. Apreciação do Pedido
Dos Factos,
No Serviço de Finanças de Amarante, foi instaurado à executada o PEF 1759202001062980, em 2020-08-24, para cobrança de dívida ao Município da (...), referente a ato administrativo, do ano de 2014, com a quantia exequenda no montante de €445.998,00, a que acrescem juros e custas.
Decorrente da apresentação de Oposição Judicial, à qual foi atribuído o n.º 1759202009000054, apresentada em 2020-09-29, vem a executada solicitar a dispensa de prestação de garantia, à data de 2020-10-13.
Dispõem o n.º1 do art.º170.º do CPPT que “Quando a garantia possa ser dispensada nos termos previstos na lei, deve o executado requerer a dispensa ao órgão da execução fiscal no prazo de 15 dias a contar da apresentação de meio de reação previsto no artigo anterior.”, pelo que o presente pedido se mostra tempestivo.
Na petição em apreço a executada alega que “ (…), face ao supra exposto, é evidente a manifesta a falta de condições económicas de a Executada garantir através de caução a quantia exequenda e seus acrescendo, o que não se deve de todo à sua conduta.”, acrescenta ainda “ Termos em que deve ser ordenada a isenção da prestação de garantia por parte da Executada, por a mesma lhe causar um prejuízo irreparável e pela manifesta falta de meios económicos para pagamento da dívida exequenda e acrescidos.”.
Por outro lado, informa “ 3- No dia 11 de março de 2014, a Executada apresentou-se a um Plano Especial de Revitalização, nos termos do C.I.R.E., dando entrada com o respetivo requerimento que deu origem ao Processo n.º 353/14.3 TBAMT, a correr temos no 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Amarante.
4- Por sentença transitada em julgado a 28 de novembro de 2014, foi homologado o plano de revitalização apresentado (…).”.
Refira-se que da consulta ao portal CITIUS verificou-se que, em 2014-11-11 foi homologado o PER n.º 353/14.3 TBAMT. No entanto, nem a Autoridade Tributária (AT) nem o Município da (...) fazem parte dos credores reclamantes, não estando incluídas no mesmo.
Decorrente do PER, tem a executada obrigações para com os seus credores, que se podem constatar do documento anexo à petição, com a designação Plano de pagamentos, no qual consta o valor em dívida de €7.991.697,97, no ano de 2020.
Afirma ainda o executado que “Motivada pelos pontuais atrasos no pagamento das prestações resultantes do Plano Especial de Revitalização e por não dispor de bens desonerados de encargos, foi recusada a emissão de garantia bancária solicitada.”.
Comprovou a impossibilidade de constituição de garantia bancária, mediante a junção aos autos de declaração de recusa, remitida por correio eletrónico, com data de 2020-09-02, pela entidade bancária Millenium BCP.
Tem a requerente legitimidade, pelo que nada obsta à apreciação do mesmo.
Nos termos do n.º 3 do artigo 150.º do CPPT a competência para apreciação do pedido pertence ao órgão periférico regional.
Da Dispensa de Garantia,
Ora, os pressupostos necessários para a concessão da dispensa de prestação de garantia são os previstos no n.º 4 do art.º 52.º da LGT:
- A prestação de garantia deve ser causa de um prejuízo irreparável para o contribuinte executado, ou;
- A prestação de garantia deve ser causa da manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para pagamento da dívida exequenda e acrescido;
- E desde que, em qualquer um dos casos, não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.
Importa referir que o n.º 3 do art.º 170.º do CPPT, ao estabelecer que o pedido deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária, pressupõe que toda a fundamentação e prova, seja desde logo apresentada pelos executados para ser possível o deferimento da sua pretensão, o que não se considera verificado.
Assim, com o intuito de sanar as deficiências detetadas no requerimento, foi o executado notificado, na pessoa do seu mandatário, Dr. Luís Barbosa, para o efeito através do ofício, datado de 2020-10-15, com n.º de saída 2020S000159703.
A notificação instava o requerente a demonstrar, com a apresentação de elementos concretos, que a prestação de garantia causa um prejuízo irreparável, ou a manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, com a apresentação dos seguintes elementos:
- Balancete analítico atualizado, balanço e respetivos anexos de 2019, mapa de depreciações/amortizações 2019, extratos Bancários atualizados e outros documentos que julgasse pertinentes.
A notificação referida foi rececionada, tendo remetido a executada, em 2020-11-03, via correio eletrónico, os elementos solicitados.
Assim, cabe analisar,
Da manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis,
Da petição alega a executada:
“ 20- A Executada manifesta insuficiência de bens suscetíveis de penhora ou que possam assegurar integralmente o crédito da Administração Tributária.
[…]
22- Como resulta da listagem, sobre os referidos imóveis incidem vários encargos, como hipotecas e penhoras, (…).
23- As Hipotecas foram constituídas no âmbito da atividade da Executada de forma a permitir a liquidez da mesma e garantir a emissão de garantias bancárias.
24- No entanto, existe uma parte dos imóveis que não incidem encargos, mas o seu valor patrimonial não se mostra suficiente para garantir a totalidade do valor a caucionar.
25- Acresce, que tem ainda em sua propriedade dois veículos automóveis com as matrículas XX-XX-XX e XX-XX-XX, os quais são essenciais para o exercício da sua atividade.
26- A penhora dos referidos veículos impossibilitaria o exercício da atividade da executada o que causaria prejuízos avultados.
27- O valor patrimonial dos referidos veículos é diminuto.
28- Assim, face ao supra exposto, é evidente a manifesta falta de condições económicas de a Executada garantir através de caução a quantia exequenda e seus acrescendo, o que não se deve de todo à sua conduta.”
Entende a requerente que a penhora dos seus ativos, designadamente dos veículos, iria obstar o seu uso para o exercício da atividade.
Ora, não podemos acompanhar a argumentação da executada, uma vez que a penhora não inviabiliza o exercício da atividade da mesma.
A penhora de ativos efetuada nos termos do n.º 2 do artigo 221.º do CPPT refere que “A penhora de bens móveis que façam parte do ativo de sujeitos passivos de IVA, ainda que dele isentos, pode ser feita mediante notificação que discrimine os bens penhorados e identifique o fiel depositário.”
sendo que, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo legal, “A penhora (…) não obsta a que o executado possa dispor livremente dos bens, desde que se trate de bens de natureza fungível e assegure a sua apresentação, no prazo de cinco dias, quando notificado para o efeito pela administração tributária.”.
Da consulta das bases de dados da AT, verifica-se que na sua titularidade constam os seguintes bens:
1 - Um total de 198 imóveis (5 prédios Rústicos e 193 prédios Urbanos) – com um VPT global de €2.323.965,83;
2 - Dois veículos automóveis:
- PEUGEOT 206, com a matrícula XX-XX-XX, com data de 2007-02-28 – encontra-se registada hipoteca a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social IP, com registo em 2015-10-30
- TOYOTA DYNA, com a matrícula XX-XX-XX, com data de 2009-07-23 – sem ónus registados.
Do requerimento consta uma listagem de imóveis da titularidade da executada.
Desta mesma listagem e segundo a executada “…, existe uma parte dos imóveis que não incidem encargos, mas o seu valor patrimonial não se mostra suficiente para garantir a totalidade do valor a caucionar.”
Da referida listagem, identificaram-se os seguintes, sobre os quais não foram indicados quaisquer ónus:
1 – Artigo Urbano 2847 - fração AI, da freguesia de (...) – com o VPT de €893,20;
2 – Artigo Urbano 2847 - fração AQ, da freguesia de (...) – com o VPT de €2486,75;
3- Artigo Urbano 2847 – fração J, da freguesia de (...) – com o VPT de €1.552,95;
4 – Artigo Urbano 2773 – fração B, da freguesia de (...) – com o VPT de €3.593,10;
5 – Artigo Urbano 2869 – fração G, da freguesia de (...) – com o VPT de €3.136,35;
6 – Artigo Urbano 2955 – fração AA, da freguesia de (...) – com o VPT de € 1.168,90;
7 – Artigo Urbano 2955 – fração AB, da freguesia de (...) – com o VPT de €1.441,30;
8 – Artigo Urbano 2955 – fração AC, da freguesia de (...) – com o VPT de €1.461,60;
9 – Artigo Urbano 2955 – fração AE, da freguesia de (...) – com o VPT de €1.898,05;
10 – Artigo Urbano 2955 – fração Z, da freguesia de (...) – com o VPT de €1.278,90;
11 – Artigo Urbano 2116, da freguesia de (...) – com o VPT de €23.679,95;
12 – Artigo Urbano 2115, da freguesia de (...) – com o VPT de €23.679,95;
13 – Artigo Rústico 1073, da freguesia de (...) – com o VPT de €47,99;
14 – Artigo Rústico 1074, da freguesia de (...) – com o VPT de €46,97;
15 – Artigo Urbano 9549 – fração B, da freguesia de (...) – com o VPT de €3.094,28.
Resultante do VPT dos artigos acima identificados, temos um valor global de €69.460,24.
Efetuadas as buscas junto da Conservatória do Registo Predial de Matosinhos, com base nos imóveis que constavam da listagem fornecida pela executada e em que a mesma não identificou qualquer ónus ou encargo, aferiu-se:
- Não existirem ónus ou encargos registados sobre 14 dos imóveis identificados;
- Excetua-se o Artigo Urbano 9549 – fração B, da freguesia de (...) – com o VPT de €3.094,28, em que se encontra registada Hipoteca voluntária a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., NIPC 500715505, com data de registo em 2019-05-23, no montante máximo segurado de €78.311,84.
Assim, o valor dos imóveis identificados, em que não se encontram registados quaisquer ónus e encargos, e os quais poderia a executada aqui oferecer como garantia no presente PEF, têm um VPT Global de €66.365,96.
Da análise ao balancete atualizado a 10 de novembro de 2020, facultado pelo executado,
verifica-se:
- Saldo da conta 11 – Caixa - €31.283,78;
- Saldo da conta 12 – Depósitos à ordem - €92.558,09 (saldo credor);
- Saldo da conta 13 – Outros depósitos bancários (Depósitos a prazo) - €82.500,00;
- Saldo da conta 14 – Outros Instrumentos Financeiros - €10.000,00;
- Saldo da conta 21 – Clientes - €8.998.282,17;
- Saldo da conta 22 – Fornecedores - €7.678.868,23;
- Saldo da conta 27 – Outras Contas a receber e a pagar - €1.082.189,56 (saldo devedor);
- Saldo da conta 32 – Mercadorias - €45.206,33;
- Saldo da conta 34 – Produtos acabados e Intermédios - €2.468.692,71;
- Saldo da conta 36 – Produtos e trabalhos em curso - € 1.047.121,90;
- Saldo da conta 41 – Investimentos financeiros - €5.384,87;
- Saldo da conta 43 – Ativos Fixos Tangíveis - €36.844,50;
- Saldo da conta 45 – Investimentos em curso – €3.955,26 (saldo credor).
Através da consulta à IES/DA de 2017, 2018 e 2019, constata-se:
- Os Ativos Não Correntes apresentam as seguintes rubricas e correspondentes montantes:
- Ativos fixos tangíveis - €28.618,06 (2017), €30.250,93 (2018) e €28.222,55 (2019);
- Outros ativos Financeiros - €2.607,97 (2017), €2.973,92 (2018) e €4.469,33 (2019);
- Ativos por Impostos Diferidos - €940.365,46 (2017), €940.365,46 (2018) e €919.764,13 (2019).
- Os Ativos Correntes apresentam as seguintes rubricas e correspondentes montantes:
- Inventários - €3.587.637,24 (2017), €3.572.593,25 (2018) e €3.572.593,25 (2019);
- Clientes - €4.179.493,12 (2017), €8.770.910,15 (2018) e €3.572.593,25 (2019);
- Outras Contas a Receber - €1.811.092,31 (2017), €1.696.542,76 (2018) e €1.539.293,83 (2019);
- Diferimentos - €469.747,82 (2017), €467.750,71 (2018) e €471.843,32 (2019);
- Ativos Financeiros detidos para negociação - €10.000,00 (2017), €10.000,00 (2018) e €10.000,00
(2019);
- Caixa e Depósitos Bancários – €422.997,31 (2017), €313.393,37 (2018) e €489.600,65 (2019).
No que diz respeito às contas de Capital Próprio da IES de 2017 a 2019, aferiu-se o seguinte:
- Resultado Líquido do Exercício de €767.886,69 (2017), €226.191,38 (2018) e €97.678,35 (2019);
- Resultados Transitados de €-8.854.726,18 (2017), €74.139,04 (2018) e €0,00 (2019);
- Outras Reservas de €3.894.540,00 (2017), €0,00 (2018) e €300.330,42 (2019)
Da declaração Mod.22, no ano de 2019, consta os seguintes valores relativamente ao Resultado Tributável e volume de negócios:
- Lucro tributável no valor de €140.145,10;
- Volume de Negócios no valor de €3.037.777,18;
- Total de Rendimentos do período no valor de €3.253.259,07.
Tendo a requerente apelado à insuficiência de bens da empresa, verifica-se que, contrariamente ao alegado, da análise ao balancete fornecido, foram identificados ativos suscetíveis de serem oferecidos como garantia – imóveis, viaturas automóveis, outros ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados e Intermédios e/ou produtos e trabalhos em curso.
Como afirma o próprio executado, do requerimento no qual solicita a dispensa “ (…) da listagem, sobre os referidos imóveis incidem vários encargos, como hipotecas e penhoras (…),existe uma parte dos imóveis que não incidem encargos, mas o seu valor patrimonial não se mostra suficiente para garantir a totalidade do valor a caucionar, (…)”, acrescenta ainda “(…),tem ainda em sua propriedade dois veículos automóveis com as matrículas 48-DB38 e 71-HZ64, os quais são essenciais para o exercício da sua atividade.”, ou seja, afirma que detém bens apesar de alegar que parte dos mesmos se encontram onerados.
E, pese embora os mesmos poderem não ser suficientes, sempre poderia a executada oferecer como garantia o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica.
Compondo-se o estabelecimento comercial de um conjunto de elementos patrimoniais que permitem o exercício de uma atividade comercial (comércio, indústria ou serviços) afetos a um local detido pelo empresário, estes elementos podem ser corpóreos ou incorpóreos.
Efetivamente, o estabelecimento comercial constitui uma universalidade de bens e direitos abrangendo o conjunto das instalações, utensílios, mercadorias, know-how, relações com clientes e fornecedores ou outros elementos que integram o estabelecimento, inclusivamente o direito ao arrendamento se se tratar de estabelecimento arrendado.
Sendo que, o acórdão de 2011-12-07, do TCA Sul, define o estabelecimento comercial como “uma organização de fatores produtivos, é o conjunto de bens posto à disposição da empresa pelo empresário, entre os quais se costumam destacar, o local, o aviamento, a reputação, as relações com fornecedores, com clientes, direitos de crédito, de débito, contratos de trabalho, contratos de fornecimentos, marcas, o Know-how”.
Por outro lado, ainda que tal penhora/penhor - do estabelecimento comercial - se afigurasse insuficiente para assegurar o valor necessário para garantia da dívida, oferecendo a requerente todos os bens e não dispondo de mais nenhum poder-se-ia entender demonstrada a insuficiência de bens.
Pelo que não pode dar-se por verificada a manifesta falta de bens penhoráveis.
Assim e desde logo afigura-se não se encontrar cumprido um dos pressupostos para a concessão de dispensa de garantia - insuficiência/inexistência de bens - porquanto existem na esfera jurídica, da executada, bens suscetíveis de poderem constituir garantia, designadamente ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados e Intermédios, produtos e trabalhos em curso e/ou o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica.
Do Prejuízo Irreparável,
No que diz respeito ao prejuízo irreparável vem a executada, através do respetivo mandatário, nos pontos n.º 12 a n.º 15 e n.º 29 da petição, declara o seguinte:
“12- Em face das circunstâncias demonstradas, a Executada encontra-se numa situação em a prestação de caução no valor de €693.692,35 (…), lhe provoca um prejuízo irreparável, uma vez que os proveitos da sua atividade são inferiores à mesma o que levaria à falência da sua tesouraria, levando a que parasse a sua atividade.
13- Dada a falta de capital para satisfazer a prestação de caução a título de garantia bancária no valor da garantia a prestar.
14- Motivada pelos pontuais atrasos no pagamento das prestações resultantes do Plano Especial de Revitalização e por não dispor de bens desonerados de encargos, foi recusada a emissão da garantia bancária solicitada. (…)
15- Por outro lado, a emissão de garantia bancária no montante da caução a prestar, impossibilita que a Executada possa exercer a sua atividade, o que provocaria o seu colapso financeiro.
(…)
25- Acresce, que tem ainda em sua propriedade dois veículos automóveis com as matrículas 48-DB38 e 71-HZ64, os quais são essenciais para o exercício da sua atividade.
26- A penhora dos referidos veículos impossibilitaria o exercício da atividade da executada o que causaria prejuízos avultados.
(…)
29- Termos em que deve ser ordenada a isenção da prestação de garantia por parte da Executada, por a mesma lhe causar um prejuízo irreparável e pela manifesta falta de meios económicos para pagamento da dívida exequenda e acrescidos.”.
Relativamente às viaturas automóveis, de facto, configurando a penhora uma apreensão, tal inviabilizaria a utilização das viaturas. No entanto tal já não acontece quanto à hipoteca voluntária.
Pelo que a constituição de garantia mediante a constituição de hipoteca voluntária sobre as viaturas não configura o prejuízo irreparável alegado.
Por outro lado, e quanto ao prejuízo irreparável, importa dizer o n.º 4 do art.º 52.º da LGT alude, em termos de pressuposto para a dispensa de prestação de garantia, é o prejuízo irreparável com a prestação da garantia.
Assim, o referido prejuízo irreparável, é o prejuízo irreparável com a prestação da garantia exigida em sede de execução fiscal e não, como parece ter sido entendido, o prejuízo irreparável na eventualidade de não ser deferida a pretensão do aqui requerente.
Tal como referido no Acórdão do TCAN proferido no processo 01158/12.1BEPRT em 23-11-2012, disponível em www.dgsi.pt “quanto ao prejuízo irreparável com a prestação da garantia, deve o interessado indicar em que é que ele se concretiza e indicar as razões que o levam a crer que existe uma séria possibilidade de tal prejuízo vir a ocorrer caso a mesma lhe venha a ser exigida.
Assim por exemplo, importava que o recorrente demonstrasse que a obtenção de financiamento ou de uma garantia bancária acarretaria custos tais que não eram por si suportáveis, em face do seu rendimento disponível”.
Deveria o executado demonstrar em que é que se concretiza o prejuízo irreparável que a prestação da garantia lhe acarretaria, o que não aconteceu, uma vez que não concretizou quais os montantes a suportar com a sua constituição, e em que medida os seus eventuais encargos (que nunca quantificou) iriam provocar o estrangulamento financeiro.
Competia-lhe, assim, comprovar quais os encargos que iria efetivamente suportar com a constituição de uma garantia, o que não fez.
O caráter irreparável dos prejuízos deve traduzir-se numa situação de diminuição dos proveitos resultantes da atividade desenvolvida pelo executado. Este, em resultado dos encargos financeiros impostos pela prestação da garantia, deixa de poder fazer face aos compromissos económico-financeiros de que depende a manutenção e desenvolvimento da atividade económica por si levada a cabo, o que ocasiona um dano resultante do decréscimo ou interrupção dessa atividade.
Da (in)existência indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado,
Dispõe o n.º 4 do artigo 52.º da LGT que a concessão da dispensa depende da não existência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.
No entanto, e dado que não ficou demonstrada a insuficiência/inexistência de bens ou prejuízo irreparável, fica prejudicada a apreciação da sua irresponsabilidade relativamente à insuficiência/inexistência de bens.
D. Conclusão
Afigura-se, assim não estarem reunidos os pressupostos previstos no n.º 4 do art.º 52.º da LGT para a dispensa de garantia, pelo que se propõe o indeferimento do pedido.
À consideração superior.”
(Cfr. doc. n.º 007357990, 26-01-2021, 19:51:29, do SITAF)
O) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu, em 14/12/2020, o despacho da Diretora de Finanças Adjunto da Direção de Finanças do Porto, de concordância com a informação e de indeferimento da reclamação, que aqui se dá por reproduzido.
(Cfr. doc. n.º 007357990, 26-01-2021, 19:51:29, do SITAF)

*
2.3. DE DIREITO

O discurso argumentativo desenvolvido pela Recorrente nas conclusões das alegações de recurso apresenta-se direcionado para os diferentes requisitos de que depende a isenção de prestação de garantia a que se refere o n.º 4 do artigo 52.º da LGT:
i) Prejuízo irreparável;
ii) Manifesta falta de meios económicos;
ii) Inexistência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.

Vejamos:
Prevê o artigo 52.º, n.º 4, da LGT na redação dada pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro:
“A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado”.

Estatui o artigo 170.º, n.º 3, do CPPT:
“3 - O pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária.”

Quanto aos requisitos do pedido de dispensa de prestação de garantia refere LOPES DE SOUSA, Jorge, in Código do Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Volume III, 6.ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 232:
“O pedido de dispensa da prestação da garantia deve conter a indicação das razões de facto e de direito em que se baseia a pretensão (n.º 3 deste artigo).
A fundamentação de direito parece ser a mera indicação do art. 52.º, n.º 4, da LGT que constitui o único fundamento legal das pretensões deste tipo, sendo uma exigência que, neste condicionalismo, não terá suficiente justificação, já que não pode ser outra.
No que concerne ao prejuízo irreparável, o interessado deverá indicar em que é que ele se concretiza e indicar as razões que levam a crer que existe uma séria probabilidade de ele poder vir a ocorrer, se não for dispensado da prestação da garantia. (…)”

Em anotação ao artigo 52.º, n.º 4, da LGT escrevem LEITE DE CAMPOS, Diogo; SILVA RODRIGUES, Benjamim e LOPES DE SOUSA, Jorge, in Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4.ª Edição 2012, encontro da escrita editora, pág. 424 e segs.:
“Como resulta do n.º 4 deste artigo, a prestação de garantia não é imprescindível para a obtenção de efeito suspensivo, pois ela poderá ser dispensada.
A forma de o executado obter a dispensa da prestação da garantia está prevista no art. 170.º do CPPT.
O número 4 distingue o prejuízo irreparável da falta de meios económicos, só se aplicando a esta o pressuposto subsequente (“revelada pelos...”).
A responsabilidade do executado, prevista na parte final do número 4, deve entender-se em termos de dissipação dos bens com o intuito de diminuir a garantia dos credores. E não mero nexo de casualidade desprovido de carga de censura ou simples má gestão dos seus bens.”
(…)
Como se depreende do art. 52.º, n.º 4, da LGT, para ser deferida a dispensa de prestação de garantia é necessário que se satisfaçam três requisitos, cumulativamente, embora dois deles comportem alternativas, pelo que o executado deverá na petição tê-los em conta:
- que haja uma situação de inexistência de bens ou sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e do acrescido;
- que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado;
- que a prestação da garantia cause prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos.
Estando-se num processo de natureza judicial, as regras aplicáveis em matéria de ônus da prova são as previstas no CC, designadamente as que constam dos seus arts. 342.º e 344.º.
À face destas regras, é de concluir que é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, invocando explícita ou implicitamente o respetivo direito, que recai o ônus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois trata-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido.
Aliás, mesmo que se entenda que se está perante uma situação de dúvida, terá de considerar-se todos os factos de que depende a prestação de garantia como constitutivos do direito do executado, por força do disposto no n.º 3 do citado art. 342.º do CC.

Do exposto resulta que a mencionada norma (artigo 52.º, n.º 4, da LGT) estabelece que a par de dois requisitos de verificação alternativa — (i) o caso de a prestação de garantia causar prejuízo irreparável ou (ii) a verificação de manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, existe um outro critério, de verificação cumulativa com os anteriores, com vista ao deferimento do pedido de isenção de garantia - (iii) a inexistência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.

Demonstrado um destes pressupostos alternativos, a AT pode deferir o pedido “desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a acuação dolosa do interessado”.

A competência para conhecer do pedido de dispensa de prestação de garantia é da Administração Tributária. O tribunal não pode praticar atos que são da competência da Administração Tributária, como resulta do disposto no n.º 4 do artigo 52.º da LGT.

Não pode, por isso, o tribunal conhecer do pedido de dispensa de prestação da garantia, pelo que apenas lhe compete apreciar a legalidade da decisão, neste âmbito, proferida pela Administração Tributária. Compete-lhe apenas aferir da legalidade/ilegalidade das decisões proferidas pela administração, verificando da ofensa/não ofensa dos princípios jurídicos que condicionam toda a atividade administrativa, e, anular/não anular o ato reclamado, sem qualquer possibilidade legal de, em substituição da Administração Tributária, definir se a Recorrente fica ou não dispensada de prestar garantia – cfr. acórdão do STA, de 15/10/2014, proferido no âmbito do processo n.º 0918/14.

A apreciação da legalidade do ato de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia só pode fazer-se tendo em conta os elementos de facto e de direito que condicionaram a respetiva prolação.

O tribunal deve atender à prova que foi feita perante o órgão de execução fiscal e com base na qual foi proferida decisão, deve reexaminar a prova produzida para poder aferir da legalidade da decisão reclamada, não relevando para esse efeito, a prova que tenha sido produzida pelo executado após a prática do ato, que não tenha a virtualidade de ter influenciado o seu conteúdo – cfr. acórdão do TCAS, de 10/07/2015, recurso n.º 08813/15, consultável em www.dgsi.pt .
*
2.3.1. Prejuízo irreparável.
Quanto ao prejuízo irreparável a Recorrente alega “… que se encontra a cumprir um Plano Especial de Revitalização, para o qual canaliza grande parte do seu rendimento, tendo que disponibilizar uma parte considerável do seu rendimento para dar cumprimento às obrigações do PER, uma vez que a principal fonte de rendimento para o cumprimento integral do PER seria a recuperação de créditos junto dos seus clientes, tendo para o efeito intentado diversas ações judiciais que ainda se encontram a decorrer. (…) Situação a que acresce, que no exercício da sua atividade, a 31 de agosto de 2020, a Recorrente totalizava a quantia de € 341.008,08 como médios mensais da empresa e o montante de € 128.823,59, antes de impostos, como fluxo de caixa de atividade, valor que a Recorrente não pode dispor para prestação de garantia, uma vez que isso levaria ao incumprimento generalizado das suas obrigações, nomeadamente, salários, encargos fiscais, segurança social, seguros, encargos com a sua organização e os seus compromissos assumidos no seu PER.

Considerou a sentença recorrida:
“Ora, quanto ao prejuízo irreparável a que o n.º 4 do art. 52.º da LGT faz referência, em termos de pressuposto para a dispensa de prestação de garantia, é o prejuízo com a prestação de garantia exigida em sede de execução fiscal, e não o prejuízo irreparável na eventualidade de não ser deferida a pretensão do requerente da mesma, conforme bem refere a Autoridade Tributária, em sede de contestação.
“Quanto ao prejuízo irreparável com a prestação de garantia, deve o interessado indicar em que é que se concretiza e indicar as razões que o levam a crer que existe uma série possibilidade de tal prejuízo vir a ocorrer caso a mesma lhe venha a ser exigida. Assim por exemplo, importava que o recorrente demonstrasse que a obtenção de financiamento ou de uma garantia bancária acarretaria custos tais que não eram por si sustentáveis, em face do seu rendimento disponível.” (acórdão do TCAN de 23/11/2012, processo n.º 01158/12.1BEPRT).
Desta feita, a reclamante deveria ter demonstrado em que é que se concretiza o prejuízo irreparável que a prestação de garantia lhe acarretaria, o que não sucedeu, uma vez que não concretizou quais os montantes a suportar com sua constituição e em que medida os eventuais encargos, que nunca quantificou, iriam provocar estrangulamento financeiro.
Competia-lhe, pois, nos termos dos arts. 170.º do CPPT, 342.º do CC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea d) da LGT e art. 74.º, n.º 1, da LGT, aliás como já mencionado, comprovar quais os encargos que iria, efetivamente, suportar com a constituição de uma garantia, o que não sucedeu.”

Vejamos:
No acórdão do TCAS, de 17/05/2011, recurso n.º 04745/11, consultável em www.dgsi.pt, a propósito do conceito de prejuízo irreparável refere-se:
«O legislador recorre a um conceito relativamente indeterminado na norma em exame (prejuízo irreparável), o qual permite a avaliação judicial concreta da natureza do prejuízo (ou dano) invocado, sendo que dano irreparável não é o mesmo que dano de difícil reparação ( cfr.artº.120, nº.1, alªs.b) e c), do C.P.T.A.), e muito menos o mesmo que prejuízo considerável ( cfr. artº. 692, nº.4, do C.P.Civil), ou seja, não basta, pois, que o reclamante alegue e prove o risco de lesão considerável, ou até de lesão de difícil reparação. Antes é necessário que o dano invocado e objeto de prova tenha a característica de irreparável, que não seja suscetível de reparação. Prejuízo esse a analisar de acordo com as regras da experiência comum e segundo um juízo de probabilidade (teoria da causalidade adequada), mais sendo o caráter irreparável do mesmo derivado, desde logo, de uma conjuntura de impossível reparação ou reconstituição da situação existente.»

Quanto à comprovação do prejuízo irreparável refere-se no acórdão do TCAS, de 25/05/2017, recurso n.º 925/16.1BESNT, consultável em www.dgsi.pt
“O prejuízo irreparável é comprovado através de um juízo de prognose sobre a probabilidade da eclosão do dano irreversível na atividade da executada decorrente da prestação de garantia. (…) Existe prejuízo irreparável quando a executada demonstra que a prestação de garantia lhe causa risco de asfixia económica, num quadro de insuficiência de património e de falta de liquidez. (…)”

No caso sub judice a Recorrente não concretiza quais os custos que teria de suportar com a prestação da garantia tendente à suspensão do processo de execução fiscal.

Sem a concretização desses custos com a prestação de garantia não é possível aquilatar, mediante um juízo de prognose póstuma, da probabilidade de eclosão de um dano irreversível na atividade da Recorrente.

Não concretiza em que medida a disponibilização de uma parte considerável do seu rendimento para dar cumprimento às obrigações do PER a impedia de suportar os custos com a prestação da garantia.

Também, sem a concretização dos custos que teria de suportar com a prestação da garantia não fica demonstrada a probabilidade da ocorrência de incumprimento generalizado das suas obrigações, nomeadamente, salários, encargos fiscais, segurança social, seguros, encargos com a sua organização e os seus compromissos assumidos no seu PER e a entrada em situação de insolvência.

Sem a indicação dos custos que teria de suportar com a prestação de garantia, ao contrário do afirmado pela Recorrente, não ficou demonstrado em que medida a prestação de garantia no valor de € 693.692,35 constitui um prejuízo irreparável.

E como refere a Recorrente na conclusão M) das suas alegações de recurso, conforme acórdão do TCAN de 23/11/2012, processo 01158/12.1BEPRT, “Quanto ao prejuízo irreparável com a prestação de garantia, deve o interessado indicar em que é que se concretiza e indicar as razões que o levam a crer que existe uma série possibilidade de tal prejuízo vir a ocorrer caso a mesma lhe venha a ser exigida.”

Porém, por falta de indicação dos custos que teria de suportar com a prestação de garantia impede a concretização do prejuízo irreparável.
Termos em que, nesta parte a sentença recorrida não merece censura.
*
2.3.2. Insuficiência de bens penhoráveis para pagamento da divida exequenda e do acrescido.

Alega a Recorrente (nas conclusões U e V das suas alegações) que “[é] notório o erro de julgamento, em matéria de facto e direito, quando o Tribunal a quo, dá como provado na alínea L) que a Recorrente “dispõe de viaturas automóveis e outros ativos fixos tangíveis, no valor de €36.844,50, em inventário o valor de €3.572.593,25, nos anos de 2018 e 2019, produtos acabados e intermédios, no valor de €2.468.692,71, e/ou produtos e trabalhos em curso, no valor de € 1.047.121,90. (…) Na verdade, os “ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados, intermédios, produtos e trabalhos em curso”, os quais o Tribunal a quo considera que poderiam ser oferecidos para garantir o valor a prestar, totalizam a quantia de € 77.572,85, valor que se mostra, conforme resulta da douta Sentença, “não ser suficiente para garantir o valor em causa”.
Ora, a AT não deu por verificada a manifesta falta de bens penhoráveis, por ter considerado “…não se encontrar cumprido um dos pressupostos para a concessão de dispensa de garantia - insuficiência/inexistência de bens - porquanto existem na esfera jurídica, da executada, bens suscetíveis de poderem constituir garantia, designadamente ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados e Intermédios, produtos e trabalhos em curso e/ou o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica”.

Da sentença recorrida resulta a este título “[a] verdade é que apesar de o valor dos referidos bens, €66.365,96, não ser suficiente para garantir o valor em causa, a reclamante sempre poderia oferecer como garantia o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica, tal como mencionado pela AT. Para mais, existem na esfera jurídica da reclamante bens suscetíveis de poderem constituir garantia, designadamente ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados, intermédios, produtos e trabalhos em curso e/ou o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica, conforme se pode constatar pelo balancete e pela IES (facto provado K))”.

Quanto ao erro de julgamento em matéria de facto remetemos para o que acime referimos, no entanto acrescentamos o que na decisão de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia se refere:
“Assim, com o intuito de sanar as deficiências detetadas no requerimento, foi o executado notificado, na pessoa do seu mandatário, Dr. L., para o efeito através do ofício, datado de 2020-10-15, com n.º de saída 2020S000159703.
A notificação instava o requerente a demonstrar, com a apresentação de elementos concretos, que a prestação de garantia causa um prejuízo irreparável, ou a manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, com a apresentação dos seguintes elementos:
- Balancete analítico atualizado, balanço e respetivos anexos de 2019, mapa de depreciações/amortizações 2019, extratos Bancários atualizados e outros documentos que julgasse pertinentes.
A notificação referida foi rececionada, tendo remetido a executada, em 2020-11-03, via correio eletrónico, os elementos solicitados.”

A própria Recorrente forneceu, pelo menos parcialmente, os documentos que suportam tais factos e também os juntou com a petição inicial da reclamação, não se compreendendo que agora com os mesmos se não conforme.

A Recorrente conclui que se encontra na situação de insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido reveladora da manifesta falta de meios económicos por considerar que:
– Os “ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados, intermédios, produtos e trabalhos em curso”, os quais o Tribunal a quo considera que poderiam ser oferecidos para garantir o valor a prestar, totalizam a quantia de € 77.572,85, valor que se mostra, conforme resulta da douta Sentença, “não ser suficiente para garantir o valor em causa”;
– Os imóveis sobre os quais se poderia constituir hipoteca, no seu conjunto, totalizam o valor patrimonial de € 66.356,96;
– Não lhe é permitido oferecer garantia bancária, porquanto a entidade bancária recusou a emissão de garantia.

Reafirmamos que à Recorrente incumbe o ónus de alegar e demonstrar os factos suscetíveis de integrarem a invocada manifesta falta de meios económicos por insuficiência de bens penhoráveis suscetíveis de garantir a dívida exequenda e o acrescido, em ordem a obter a dispensa de prestação de garantia, o que deve fazer com o requerimento de pedido, instruindo-o com a documentação pertinente (cf. artigo 342.º do CC, artigo 77.º, n.º 1, da LGT e artigo 170.º, n.º 1, do CPPT).

Não pode considerar-se que a Recorrente cumpriu esse ónus se a AT demonstrou a existência de bens suscetíveis de serem dados como garantia, porquanto concluiu que “… existem na esfera jurídica, da executada, bens suscetíveis de poderem constituir garantia, designadamente ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados e Intermédios, produtos e trabalhos em curso e/ou o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica”.

Também a sentença recorrida chegou à mesma conclusão quando refere:
«Para mais, existem na esfera jurídica da reclamante bens suscetíveis de poderem constituir garantia, designadamente ativos fixos tangíveis, inventário, produtos acabados, intermédios, produtos e trabalhos em curso e/ou o próprio estabelecimento comercial enquanto unidade jurídica, conforme se pode constatar pelo balancete e pela IES (facto provado K))”

Quanto ao oferecimento do estabelecimento comercial como garantia, conclui a Recorrente, sem em concreto demonstrar o seu valor, que mesmo considerando o estabelecimento comercial, todo o ativo não se mostra suficiente para garantir a quantia exequenda.

Tal como refere a AT na decisão de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia “… ainda que tal penhora/penhor - do estabelecimento comercial - se afigurasse insuficiente para assegurar o valor necessário para garantia da dívida, oferecendo a requerente todos os bens e não dispondo de mais nenhum poder-se-ia entender demonstrada a insuficiência de bens.”

À mesma conclusão chegou a sentença recorrida.

Efetivamente a Recorrente não logrou cumprir o ónus de alegar e demonstrar os factos suscetíveis de integrarem a insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido reveladora da manifesta falta de meios económicos, sendo que a AT logrou indicar a existência de bens suscetíveis de serem dados em garantia.

Assim, nos termos expostos, por improcedência das conclusões, o presente recurso não merece provimento.
*

2.3.3. Inexistência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.

Quanto a este item a Recorrente alega apenas que “não tendo o órgão de execução fiscal logrado demonstrar que o prejuízo irreparável e a insuficiência ou inexistência bens penhoráveis se devem a atuação dolosa da Recorrente”.

Sobre a mesma questão refere-se na sentença recorrida que “… a reclamante não fez qualquer prova que a insuficiência ou inexistência dos bens não é da sua responsabilidade, não fazendo, de facto, qualquer menção quanto a este requisito.
Daqui resulta, em síntese, que a reclamante no procedimento do pedido de dispensa de prestação de garantia não logrou fazer prova da verificação de todos os pressupostos para o deferimento do seu pedido. A prova documental não foi bastante para comprovar a verificação de todos os requisitos para o deferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, sobretudo para demonstrar que a insuficiência ou inexistência dos bens não é da sua responsabilidade.

Vejamos:
Com efeito, a nova redação deste segmento dada pela Lei n.º 42/2016 de 28 de dezembro, demonstra claramente que a prova deste facto negativo recai sobre a AT.

Vai neste sentido o acórdão do TCAS, de 14/01/2021, recurso n.º 1095/20.6BELRS, consultável em www.dgsi.pt, onde se refere que: Saber se existem fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado é, com a redação introduzida ao n.º 4 do artigo 52º LGT pela Lei n.º 42/2016, de 28/12, matéria que deve ser averiguada e provada pela AT e não pelo Requerente da pretensão”.
Não se ignora que no processo de execução fiscal, conforme resulta da certidão de dívida, está em causa uma dívida que tem a natureza de sanção contratual por atraso na conclusão da execução de empreitada de requalificação do Património (...) e juros de mora.

Uma vez que não foi demonstrado que a prestação de garantia cause prejuízo irreparável nem a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, fica prejudicado o conhecimento da inexistência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa da Recorrente.

*
Nos termos do artigo 667.º, n.º 3, do CPC, formulamos o seguinte sumário:

I - O artigo 52.º, n.º 4, da LGT, estabelece que a par de dois requisitos de verificação alternativa — (i) o caso de a prestação de garantia causar prejuízo irreparável ou (ii) a verificação de manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, existe um outro critério, de verificação cumulativa com os anteriores, com vista ao deferimento do pedido de isenção de garantia - (iii) a inexistência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.

II - A apreciação da legalidade do ato de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia só pode fazer-se tendo em conta os elementos de facto e de direito que condicionaram a respetiva prolação.

III – Sem a concretização dos custos com a prestação de garantia não é possível aquilatar, mediante um juízo de prognose póstuma, da probabilidade de eclosão de um dano irreversível na atividade da Recorrente.

IV – Sobre a Recorrente recai o ónus de alegar e demonstrar os factos suscetíveis de integrarem a insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, reveladora da manifesta falta de meios económicos.
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3. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
*
Sem custas [artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP].
*
Porto, 27 de maio de 2021.

Manuel Escudeiro dos Santos
Bárbara Tavares Teles
Paula Maria Dias de Moura Teixeira