Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00964/09.9BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/07/2017
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:FALTA DE NOTIFICAÇÃO NO PRAZO DE CADUCIDADE
CULPA NA INSUFICIÊNCIA DO PATRIMÓNIO
Sumário:I. A partir de 01.01.2001, data da entrada em vigor da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro, que deu nova redação ao n.º 3 do artigo 139.º do CIRS, redação que foi mantida no artigo 149.º, n.º 3 do CIRS, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 03 de julho, a regra no domínio das notificações relativas a IRS é que estas sejam efetuadas por mera carta registada (cfr. o n.º 3 do artigo 149.º do CIRS), apenas se efetuando através de carta registada com aviso de receção as notificações a que se refere o artigo 66.º (do CIRS), ou seja, as notificações referentes a atos de fixação ou alteração da matéria tributável do imposto previsto no artigo 65.º daquele Código.
II. Tem a jurisprudência entendido que a prova da remessa de tal carta ao contribuinte cabe à Administração Fiscal, não bastando para o efeito, um mero print interno, processado pelos respetivos serviços, mas sim o registo da correspondência emitido pelos CTT, ainda que coletivo, onde constem os elementos aptos a comprovar que a correspondência foi remetida para o seu domicílio fiscal.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:M...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO

A Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 11.05.2016, que julgou procedente a pretensão da Recorrida na presente instância de OPOSIÇÃO com referência à execução fiscal n.º 2500200301000500, por dívidas de IRS, respeitantes aos exercícios de 1999 a 2001.
A Recorrente não se conformando com a decisão interpôs recurso e formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

(…) 1. A. Incide o presente recurso sobre a sentença proferida em 11/05/2016, que julgou procedente a presente oposição, com a consequente extinção do processo de execução fiscal n° 2500200301000500, instaurado no serviço de finanças de Armamar, por dívidas de IRS dos exercícios de 1999, 2000 e 2001.
B. Alicerça a Meritíssima Juíza a quo a sua posição no facto de a Autoridade Tributária não ter logrado demonstrar que a notificação das liquidações objeto destes autos tenha sido efetuada; daí retirando a inexigibilidade da dívida exequenda, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
C. Do que discordamos: no que concerne à notificação das liquidações consta da sentença: “Relativamente á factualidade dada como não provada, resulta de a Administração Tributária não ter juntado aos autos os registos postais comprovativos do envio das liquidações, mas apenas os prints informativos extraídos da sua base de dados informática”; concluindo: “… não existindo nos autos quaisquer elementos aptos a confirmar e validar a informação contida nos mencionados “prints internos” extraídos da base de dados da Administração Tributária não se pode dar como provado que as cartas de notificação das liquidações tenham sido efetivamente remetidas para o domicílio fiscal da oponente”.
D. Entende o Tribunal a quo, que, para a Administração Tributária provar a remessa das cartas, para notificação das liquidações de imposto à oponente, teria de ter junto aos autos um registo de correspondência emitido pelos CTT, ainda que coletivo, onde constassem os elementos aptos a comprovar que a correspondência foi remetida para o domicílio fiscal do contribuinte naquela data, o que, do seu ponto de vista, não sucedeu.
E. Contudo, da factualidade decorrente dos autos, legislação aplicável e jurisprudência sobre a matéria, não podemos extrair a mesma conclusão: a Fazenda Pública não ignora a jurisprudência invocada na douta decisão judicial, nem a doutrina na mesma mencionada, contudo, entende que dos documentos dos autos ficou suficientemente comprovado a notificação das liquidações de IRS e juros compensatórios à oponente dentro do prazo de caducidade.
F. Melhor explicitando: dos autos resulta (fls. 72) que foi endereçada notificação das liquidações para a morada existente no Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes (SGRC), à data da emissão da liquidação. Tal quer dizer que foram observadas nas ditas notificações todas as formalidades prescritas por lei a esse respeito, não havendo qualquer irregularidade ou insuficiência praticada pela AT, nem qualquer norma que tenha sido violada.
G. Salvo melhor opinião, os documentos juntos a fls. 75 e 78 dos autos não consubstanciam um mero print informático elaborado pela AT e para efeitos internos. Na verdade, trata-se de guias de expedição de registos, documentos com a sigla dos “CTT Correios”, contendo o respetivo carinho da entidade expedidora “CTT”, datado e rubricado, complementado pela identificação do registo da notificação a fls. 76, 77 e 79. O documento em questão está devidamente numerado, com indicação do cliente expedidor (Direção Geral dos Impostos) e data da expedição, sendo que foi junto aos autos na sequência de pedido de comprovativo da notificação das liquidações.
H. Não podemos aceitar a qualificação e desvalor atribuídos a esse documento por parte do julgador no sentido de que estamos perante meros documentos internos elaborados pela AT, porquanto, se trata de um documento de entidade terceira, precisamente a entidade responsável pelas notificações - “CTT”, complementado pela indicação do correspondente registo.
I. Acresce que dos autos constam documentos retirados do sistema informático de cobrança do IRS, demonstrativos da notificação das liquidações de imposto, contendo nomeadamente o período do imposto, o prazo de cobrança, o número da liquidação, o n° de registo dos CTT, entre outros elementos (fls. 27, 29 e 31 dos autos).
J. Para justificar a posição por nós aqui assumida, importa apelar ao designado “princípio da persuasão racional”, o qual tem vindo a ser citado em decisões jurisprudenciais recentes. Relevando, nesta sede, o Acórdão do STA de 01.10.2014 (processo n° 0603/13), que seguiremos aqui de perto, por concordarmos com o seu teor e, salvo melhor opinião, ser aplicável ao caso dos autos, a saber:
“I - É a administração tributária que tem o Ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais.
II - O «recibo de aceitação» e o «recibo de entrega» da cada registada pelos serviços postais, previstos nos nºs 2 e 4 do artigo 28 do Regulamento do Serviço Público de Correios são documentos idóneos para provar que a carta foi registada, remetida e colocada ao alcance do destinatário.
III - Trata-se, porém, de uma formalidade simplesmente probatória ou «ad probationem», cuja falta podo ser substituída por outros meios de prova.
IV - O registo informático dos mesmos dados de facto existente em entidades diferentes, o emissor (Administração Tributária) e o distribuidor da carta (CTT), é uma circunstância concreta que, num sistema de livre apreciação das provas, ainda que (limitado pelo princípio da persuasão racional, justifica suficientemente que se dê como provado que o registo foi efectivamente realizado.
V - O registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo, uma presunção legal que se destina a facilitar a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando, presunção que, tendo por base o registo postal, só existe quando se prove que o registo foi efectuado.
VI - Não tendo a oponente elidido a referida presunção, o que levou a que no probatório da decisão de 1ª Instância tenha sido dado como assente a recepção das liquidações na sede daquela falece o fundamento de inexigibilidade da divida exequenda por falta de notificação”
K. No mesmo sentido, veja-se o Acórdão do STA de 01/10/2014 proferido no processo n°01450/13 e o Acórdão do TCA Norte de 27/06/2014, proferido no processo n° 00883/09.9BEBRG.
L. Note-se que, no caso em apreço, a AT demonstrou que foram cumpridos, na notificação dos atos de liquidação (de imposto e juros compensatórios), os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais.
M. Destaca-se, ainda, que as decisões emanadas dos tribunais superiores, como as anteriormente descritas, não desconsideram determinados meios de prova carreados para os autos, como o registo informático de dados ou, de forma mais explicita, os “prints” retirados do sistema informático.
N. Pois que, todos os meios de prova são aceites e devem ser valorados, razão porque, salvo melhor opinião, os documentos trazidos aos autos, mesmo os que foram retirados do sistema informático, servem para prova das notificações aludidas.
O. Conforme decore dos Acórdãos citados, os elementos dos autos (documentos extraídos do sistema informático e guia de expedição de registo dos CTT), contêm a indicação da data em que foram emitidas as notificações relativas às liquidações de IRS, o número do registo postal dessas notificações, a indicação que foram recebidas e a data da sua receção, pelo que, podemos afirmar que, do conjunto das provas produzidas, é forçoso concluir que o registo foi efetuado e e oponente notificada.
P. Cabendo á oponente elidir a presunção de registo, o que não ocorreu. Assim sendo, temos de concluir que a oponente não logrou elidir a presunção de notificação, razão porque falece o argumento da inexigibilidade da divida exequenda por falta de notificação.
Q. Em suma, a Meritíssima Juíza incorreu em erro de julgamento, por errónea aplicação da lei, mormente o disposto nos art.s 38°, 39°, n°4 e 204°, n° 1, i), todos do CPPT.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que se julgue improcedente, por não provado, o fundamento da inexigibilidade da dívida, com as legais consequências. .(…)”

1.2 A recorrida contra alegou tendo formulado as seguintes conclusões:
Em causa nos presentes autos estão as liquidações de IRS referentes aos exercícios de 1999, 2000 e 2001.
2. E, em causa está igualmente o facto das mesmas não terem sido notificadas.
3. Em face de tal afirmação efetuada pela recorrente, a AT limitou-se a juntar prints informativos extraídos da sua base de dados informática, portanto, limitou-se a juntar documentos meramente internos, quando a prova da notificação tinha de ser efetuada através da junção dos registos postais comprovativos do envio das liquidações.
4. Ora, das guias de expedição juntas não resulta se a correspondência foi expedida para a ora recorrente ou para outra pessoa, nem tampouco a morada para a qual a remessa foi feita,
5. E, contrariamente ao que afirma a AT, não existe presunção de notificação, sendo que cabe àquele que invocar um direito fazer prova do mesmo.
6. Incontestável é que as notificações não respeitaram o disposto no art. 149° do CIRS, com a redação à data em vigor, e no art. 38° do CPPT, sendo as mesmas ineficazes de acordo com o art. 36° do CPPT.
7. Face ao exposto, dúvidas não há que a douta sentença recorrida nenhuma censura merece, que não pode até deixar de louvar-se, quer pela sua lucidez, quer pelo rigor técnico-jurídico.
8. Na verdade, a douta sentença posta em crise não infringiu qualquer norma legal, não merecendo, deste modo, qualquer reparo.
9. Pelo que, deve o recurso ser julgado improcedente por não provado, mantendo-se na íntegra a douta sentença recorrida.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve o recurso interposto ser julgado improcedente por não provado e ser integralmente confirmada a douta decisão da 1ª instância. Assim se fazendo
A SEMPRE E ACOSTUMADA JUSTIÇA! (…)”

O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 660.º, n.º 2, 684.º, nº s 3 e 4 e 685-A.º, atuais art.ºs 608.º, nº 2, 635.º, nº 4 e 639.º todos do CPC “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT), sendo a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por errónea aplicação da lei, mormente o disposto nos art.s 38°, 39°, n°4 e 204°, n° 1, i), todos do CPPT.

3. JULGAMENTO DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“(…)1. A) Em 21/11/2002 foram emitidas as seguintes liquidações:
Liquidação n.º 5133996202, relativa a IRS do ano de 1999 e respetivos juros compensatórios no montante global de 10.100,22 € - cfr. fls. 26 dos autos;
Liquidação n.º 5133997801, referente a IRS do ano de 2000 e respetivos juros compensatórios, no montante global de 20.525,29 €. – cfr. fls. 28 dos autos.
B) Em 25/01/2003 foi emitida a liquidação n.º 5340021540, relativa a IRS do ano de 2001 e respetivos juros compensatórios, no valor global de 11.409,84 € - cfr. fls. 30 dos autos.
C) Em 25/06/2003, o Serviço de Finanças de Armamar instaurou contra N… e M…, aqui oponente, o processo de execução fiscal n.º 2500200301000500, para cobrança coerciva das dívidas provenientes das liquidações de IRS e respetivos juros compensatórios a que se alude nas alíneas A) e B), cujo montante global ascende a 42.035,35 € - cfr. fls. 1 e ss. do processo executivo [doravante, PEF] apenso aos autos.
D) Em 27/06/2003, o executado N… foi citado para o processo de execução fiscal. – cfr. fls. 5/7 do PEF apenso aos autos.
E) Em 17/11/2003, foi efetuada a penhora dos seguintes bens imóveis:
prédio urbano, sito …, da freguesia de Queimada, concelho de Armamar inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 3…, com o valor patrimonial de 23.366,19 € e atribuído de 100.000,00 €;
prédio rústico, sito no Vale…, freguesia de Queimada, concelho de Armamar, inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo 4…, com o valor patrimonial de 224,76 € e atribuído de 100.000,00 €;
prédio rústico, sito na…, freguesia de Queimada, concelho de Armamar, inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo 3…, com o valor patrimonial de 335,79 € e atribuído de 100.000,00 €. – cfr. fls. 8/10 do PEF apenso aos autos.
F) Em data incerta do ano de 2004 foi efetuada a penhora do saldo da conta de depósito à ordem n.º 2…, no montante de 48,86 €, titulada pela oponente no Banco…, S.A. – cfr. fls. 30/31 do PEF apenso aos autos.
G) Em data incerta do ano de 2004, foi efetuada a penhora do crédito no montante detido pela sociedade “P…, Lda.”, sobre a Câmara Municipal de Lamego, no montante de 3.459,36 € - cfr. fls. 33, 40 e 43 do PEF apenso aos autos.
H) Em 24/03/2009, a oponente foi citada nos termos do artigo 239.º, n.º 1 do CPPT. – cfr. fls. 53/55 do PEF apenso aos autos.
I) A presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Armamar em 29/04/2009 – cfr. carimbo aposto a fls. 4 dos autos.
J) A fls. 27 dos autos consta um print retirado da Base de Dados da Autoridade Tributária e Aduaneira, em 20/05/2010, do qual consta, designadamente:
“Nr. Liquidação 5133996202 Dt liquidação 2002-11-21 (…) Dt emissão 2002-11-26 (…) Reg privativo: RY142547550PT (…) Dt. Reg CTT 2002-11-29 (…)”.
K) A fls. 29 dos autos consta um print extraído da Base de Dados da Autoridade Tributária e Aduaneira, em 20/05/2010, do qual se extrai, designadamente:
“Nr. Liquidação 5133997801 Dt liquidação 2002-11-21 (…) Dt emissão 2002-11-26 (…) Reg privativo: RY142547563PT (…) Dt. Reg CTT 2002-11-29 (…)”.
L) A fls. 31 dos autos consta um print extraído da Base de Dados da Autoridade Tributária e Aduaneira, em 20/05/2010, do qual consta, designadamente:
“Nr. Liquidação 5340021540 Dt liquidação 2003-01-25 (…) Dt emissão 2003-01-30 (…) Reg privativo: RY144072865PT (…) Dt. Reg CTT 2003-02-05 (…) Dt assinat aviso recepção/notificação 2003-02-07 (…)”.
M) A fls. 97 dos autos consta um print extraído da Base de Dados da Autoridade Tributária e Aduaneira, em 02/02/2015, do qual consta, designadamente:
“Reg. Priv. Inicial (…) RY142521314PT (…) Reg. Priv. Final (…) RY142551510PT (…) Data emissão 2002-11-26 (…) Data envio 2002-11-29 (…)”.
N) Da guia de expedição de registos dos CTT n.º 175/2002 extrai-se que, em 29/11/2002, a Direção Geral dos Impostos expediu 4724 registos – cfr. fls. 96 dos autos.
O) A fls. 100 dos autos consta um print extraído da Base de Dados da Autoridade Tributária e Aduaneira, em 02/02/2015, do qual se extrai:
“Reg. Priv. Inicial (…) RY144070847PT (…) Reg. Priv. Final (…) RY144073295PT (…) Data emissão 2003-01-30 (…) Data envio 2003-02-05 (…)”.
P) Da guia de expedição de registos dos CTT n.º 34/2003 extrai-se que, em 05/02/2003, a Direção Geral dos Impostos expediu 3166 registos – cfr. fls. 99 dos autos.
Factos não provados
Não se provou que as notificações das liquidações que estiveram na origem do processo de execução fiscal a que se reportam os autos tenham sido efetivamente efetuadas.
Motivação da matéria de facto
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto teve por base a análise crítica dos documentos constantes dos autos, os quais não foram impugnados, tudo conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.
Relativamente à factualidade dada como não provada, resulta de a Administração Tributária não ter juntado aos autos os registos postais comprovativos do envio das liquidações, mas apenas os prints informativos extraídos da sua base de dados informática. Acresce que as cópias das duas guias de expedição de registos dos CTT, juntas aos autos, na sequência do despacho de fls. 62, contendo unicamente o número de registos expedidos pela Administração Tributária nos dias 29/11/2002 e 05/02/2003, desacompanhadas de quaisquer elementos externos, designadamente os respetivos talões de registo ou, pelo menos, um registo coletivo, não permitem concluir que os registos indicados nos referidos prints internos (RY142547550PT, RY142547563PT e RY144072865PT) tenham sido efetivamente expedidos para a morada dos executados.
Em suma, não existindo nos autos quaisquer elementos aptos a confirmar e validar a informação contida nos mencionados “prints internos” extraídos da base de dados da Administração Tributária não se pode dar como provado que as cartas de notificação das liquidações tenham sido efetivamente remetidas para o domicílio fiscal da oponente(…)”.

3.1. Aditamento Oficioso à Matéria de Facto
Ao abrigo do artigo 712º, nº 1, alínea a) do Código do Processo Civil (ex vi, artigo 281.º do CPP atual art.º 662.º ) importa aditar ao probatório o seguinte facto que igualmente se mostra provado:

Q) A fls. 80/82 dos autos constam três documentos denominados “Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes/Situação Cadastral Anterior”, com datas de 29.11.2002, 05.02.2003 e 12.02.2015, constando no item domicilio fiscal “ Morada: R…; Localidade: QUEIMADA; Código Postal 5110-00 QUEIMADA; Concelho: ARMAMAR; freguesia: QUEIMADA; Ser. Finanças 2500- ARMAMAR.

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A questão a resolver é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito, por errónea aplicação da lei, mormente o disposto nos art.ºs 38.°, 39.°, n.º 4 e 204.°, n° 1, i), todos do CPPT.
A Recorrida invoca que não foi notificada das respetivas liquidações, que como ato em matéria tributária afeta os seus direitos e interesse legítimos, uma vez que só produz efeito quando for validamente notificado e que se mostra violado o art.º 36.º n.º do CPPT.
A sentença recorrida entendeu que não resultou provado que as notificações das liquidações tenham sido efetuadas, uma vez que a informação extraída dos registos informáticos da Administração Tributária não tem a virtualidade de demonstrar que as notificações foram efetivamente expedidas para a morada da oponente, ao que acresce que as cópias das guias de expedição juntas aos autos, não permitem concluir que os registos indicados nos prints internos (RY142547550PT, RY142547563PT e RY144072865PT) tenham sido expedidos através das mesmas, não existindo nelas qualquer elemento que permita estabelecer a correspondência entre tais guias e as liquidações objeto de cobrança coerciva no processo de execução fiscal a respeita a presente oposição.”
A Recorrente não se conforma com o assim decido entendendo que demonstrou que foram cumpridos, na notificação dos atos de liquidação os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais.
E que os meios de prova são aceites e devem ser valorados, pelo que os documentos trazidos aos autos, mesmo os que foram retirados do sistema informático, servem para prova das notificações aludidas.
E que os elementos dos autos (documentos extraídos do sistema informático e guia de expedição de registo dos CTT), contêm a indicação da data em que foram emitidas as notificações relativas às liquidações de IRS, o número do registo postal dessas notificações, a indicação que foram recebidas e a data da sua receção, pelo que, podemos afirmar que, do conjunto das provas produzidas, é forçoso concluir que o registo foi efetuado e oponente notificada.
Vejamos:
Analisemos então o regime jurídico em vigor à data dos factos. De harmonia com o preceituado no artigo 36.º, n.º 1 do CPPT “os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.
Determina o artigo 38.º do CPPT, que:
1 – As notificações são efetuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de receção, sempre que tenham por objeto atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em atos ou diligências.
[…]
3 – As notificações não abrangidas pelo n.º 1, são efetuadas por carta registada. (na redação anterior à entrada em vigor da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro).
4 - As notificações relativas a liquidações de impostos periódicos feitos nos prazos previstos na lei são efetuadas por simples via postal.
[…].
Os n.ºs 1 e 2.º do artigo 39.º do CPPT, sob a epigrafe a perfeição das notificações, dispõe-se que:
“1 - As notificações efetuadas nos termos do n.º 3 do artigo anterior presumem-se feitas no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.
2 – A presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo notificado quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida, devendo para o efeito a administração tributária ou o tribunal, com base em requerimento do interessado, requerer aos correios informação sobre a data efetiva da receção.”
Por sua vez, o art.º 149.º do CIRS preceitua que “As notificações por via postal devem ser feitas para o domicilio fiscal do notificando ou do seu representante.
2- As notificações a que se refere o art.º 66.º, quando por via postal, devem ser efetuadas por meio de carta registada com aviso de receção.
3- As restantes notificações devem ser feitas por carta registada, considerando-se a notificação efetuada no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, caso esse dia não seja útil. (na redação inicial da Lei n.º 30-G/2000 de 29.12 que alterou o art.º 139.º do CIRS o qual por força do Decreto-lei n.º 198/2001 de 03.06 deu lugar ao art.º 149.º do CIRS)
4- (…)”
Baixando ao caso dos autos, estamos perante liquidações de IRS dos anos de 1999, 2000 e 2001.
E como refere a sentença recorrida “Ora, não foi trazida aos autos factualidade que revele as circunstâncias em que foram efetuadas as liquidações de IRS objeto de cobrança coerciva na execução fiscal a que se referem os autos.”
Apesar de se desconhecer a que título foram efetuadas as liquidações objeto de execução fiscal, no entanto a partir de 01.01.2001, data da entrada em vigor da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro, que deu nova redação ao n.º 3 do artigo 139.º do CIRS, redação que foi mantida no artigo 149.º, n.º 3 do CIRS, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 03 de julho, a regra no domínio das notificações relativas a IRS é que estas sejam efetuadas por mera carta registada (cfr. o n.º 3 do artigo 149.º do CIRS), apenas se efetuando através de carta registada com aviso de receção as notificações a que se refere o artigo 66.º (do CIRS), ou seja, as notificações referentes a atos de fixação ou alteração da matéria tributável do imposto previsto no artigo 65.º daquele Código. Cfr acórdãos do STA 0685/11 de 28.03.2012, 0297/16 de 15.06.2016, 0564/10 de 28.11.2012 e 0491/11 de 05.02.2015
Tem a jurisprudência entendido que a prova da remessa de carta registada ao contribuinte cabe à Administração Fiscal, não bastando para o efeito, um mero print interno, processado pelos respetivos serviços, mas sim o registo da correspondência emitido pelos CTT, ainda que coletivo, onde constem os elementos aptos a comprovar que a correspondência foi remetida para o seu domicílio fiscal (Cfr. acórdãos do TCAS n.ºs 03499/09 de 23.03.2010 e e 04631/11 de 17.05.2011)
As liquidações de IRS foram liquidadas em 21.11.2002 (IRS de 1999 e 2000) e 25.01.2003 (IRS de 2000) devendo pois ser notificadas à Recorrida por carta registada.
Esta questão não é controvertida, o que a Recorrente não se conforma é com o valor atribuído aos documentos, na sentença recorrida.
Alega que resulta de fls. 72 que foi endereçada notificação das liquidações para a morada existente no Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes (SGRC), à data da emissão da liquidação.
Compulsadas fls. 80/82 dos autos ( e não 72 que certamente por lapso foi indicada) delas constam três documentos denominados “Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes Situação Cadastral Anterior, com data de 29.11.2002,05.02.2003 e 12.02.2015, delas constando no item domicilio fiscal “ Morada: R…; Localidade: QUEIMADA; Código Postal 5110-00 QUEIMADA; Concelho: ARMAMAR; freguesia: QUEIMADA; Ser. Finanças 2500- ARMAMAR.
Refira-se que não é identificado o contribuinte, podendo reportar-se à Recorrida como a qualquer outro contribuinte.
No entanto, admite-se que se reporta à Recorrida, pois quer a petição quer a procuração mantêm o mesmo endereço.
Relativamente aos documentos juntos a fls. 75 e 78 dos autos a Recorrente alega que não consubstanciam um mero print informático elaborado pela Administração Tributária e para efeitos internos. E que se trata de guias de expedição de registos, documentos com a sigla dos “CTT Correios”, contendo o respetivo carinho da entidade expedidora “CTT”, datado e rubricado, complementado pela identificação do registo da notificação a fls. 76, 77 e 79. O documento em questão está devidamente numerado, com indicação do cliente expedidor (Direção Geral dos Impostos) e data da expedição, sendo que foi junto aos autos na sequência de pedido de comprovativo da notificação das liquidações.
Resulta da matéria assente nas alíneas N) e P) que das guias de expedição de registos dos CTT n.º 175/2002 se extrai que, em 29.11.2002, a Direção Geral dos Impostos expediu 4724 registos e da guia n.º 34/2003, em 05.02.2003, 3166 registos (identificando fls. 96 e 99 dos autos e não 75 e 78 uma vez que foram solicitadas pelo tribunal cópias legíveis)
De fls. 97 e 98 (corresponde a fls. 76 e 77 ilegíveis), dois documentos exatamente iguais, (deferindo somente na hora da sua impressão) designados “Manutenção do Registo Privativo/ Consulta de Registo Privativo “ da DGCI, em 29.11.2002 consta em Reg.Priv.Inicial RY142521314PT, e Reg. Priv. Final RY142551510PT.
Concatenando os documentos de fls. 26 a 31 dos autos – factos J), K) e L) – com os de fls. 97 e 98 –factos M) e O) não se referem aos mesmos registos.
No que concerne às guias de expedição de registos dos CTT n.ºs 175/2002 de 34/2003 não comprovam que tenha sido efetuada a notificação à Recorrida.
Por isso, não merece qualquer reparo a sentença recorrida ao dar como não provado que as notificações das liquidações que estiveram na origem do processo de execução fiscal a que se reportam os autos tenham sido efetivamente efetuadas.
E “que as cópias das duas guias de expedição de registos dos CTT, juntas aos autos, na sequência do despacho de fls. 62, contendo unicamente o número de registos expedidos pela Administração Tributária nos dias 29/11/2002 e 05/02/2003, desacompanhadas de quaisquer elementos externos, designadamente os respetivos talões de registo ou, pelo menos, um registo coletivo, não permitem concluir que os registos indicados nos referidos prints internos (RY142547550PT, RY142547563PT e RY144072865PT) tenham sido efetivamente expedidos para a morada dos executados.”
Para sustento da sua tese a Recorrente invoca a jurisprudência dos acórdãos do STA de 01.10.2014, n.º 0603/13, 01.10.2014 n.° 01450/13 e o Acórdão do TCA Norte de 27.06.2014, n° 00883/09.9BEBRG, a qual não se aplica ao caso em apreço pois a Recorrente não faz mínima prova relativamente à notificação das liquidações efetuadas.

4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões:
I. A partir de 01.01.2001, data da entrada em vigor da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro, que deu nova redação ao n.º 3 do artigo 139.º do CIRS, redação que foi mantida no artigo 149.º, n.º 3 do CIRS, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 03 de julho, a regra no domínio das notificações relativas a IRS é que estas sejam efetuadas por mera carta registada (cfr. o n.º 3 do artigo 149.º do CIRS), apenas se efetuando através de carta registada com aviso de receção as notificações a que se refere o artigo 66.º (do CIRS), ou seja, as notificações referentes a atos de fixação ou alteração da matéria tributável do imposto previsto no artigo 65.º daquele Código.

II. Tem a jurisprudência entendido que a prova da remessa de tal carta ao contribuinte cabe à Administração Fiscal, não bastando para o efeito, um mero print interno, processado pelos respetivos serviços, mas sim o registo da correspondência emitido pelos CTT, ainda que coletivo, onde constem os elementos aptos a comprovar que a correspondência foi remetida para o seu domicílio fiscal.


5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pela Recorrente.

Porto, 7 de dezembro de 2017

Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira

Ass. Mário Rebelo

Ass. Cristina Travassos Bento