Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02746/09.9BRPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/08/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:AUSÊNCIA DE CULPA NA INSUFICIÊNCIA DO PATRIMÓNIO
PRESCRIÇÃO
Sumário:I - Tem sido entendimento reiterado deste TCAN que o conhecimento da prescrição, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal de recurso só será possível no recurso se no processo constarem todos os elementos necessários para efeito.
III - Se em sede de recurso jurisdicional, a Recorrente se alheou em absoluto das razões que fundamentaram a sentença recorrida, limitando-se a repetir o que já havia dito, não ataca o julgado, não pode o Tribunal de recurso alterar o decidido pelo Tribunal a quo, já que a tal se opõe o preceituado no n.º 4 do artigo 684.º do CPC
III - Não tendo a Recorrente dissentido, em sede de petição inicial, da aplicação da alínea b) do nº 1 do art.º 24.º da LGT, ao caso presente, cabia-lhe demonstrar que a falta de entrega do IVA e o pagamento do IRC, não lhe é imputável.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:P...
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
O Recorrente, P... com o NIF 2…e residente na Rua…, Porto, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Porto por ter julgado improcedente a oposição ao processo de execução fiscal n.º 3190200701045989 e apensos contra si revertido e originariamente instaurado contra a sociedade P… Unipessoal, Lda., por dividas de IVA, IRC e Coimas fiscais dos anos de 2005, 2006 e 2008.

A sentença recorrida julgou parcialmente procedente a oposição na parte correspondente às dívidas de coimas, e improcedente o alegado quanto às dividas de IVA e de IRC, mantendo-se a execução nessa parte.

O Recorrente não se conformando com a decisão interpôs recurso tendo formulado as seguintes conclusões, que se reproduzem:

“(…) PRIMEIRA

Salvo o devido respeito, a dívida de IVA constante do ponto 2 e a dívida respeitante a IRC do ponto 4 dos factos provados, estará prescrita, ao abrigo do disposto no art. 48º n.º 1 da Lei Geral Tributária.

SEGUNDA

De acordo com o art. 24º da LGT, à semelhança do art. 13º do CPT, o legislador tributário no âmbito do actual regime da responsabilidade pela dívida imputa à Fazenda Pública a obrigação de lograr provar o exercício efectivo das funções de gerência/administração, como requisito da responsabilidade subsidiária dos gerentes/administradores das pessoas colectivas.

TERCEIRA

Não sendo controverso que o opoente exerceu a gerência de direito.

QUARTA

Mas, não incumbirá ao opoente a prova no sentido de demonstrar que não exerceu a gerência de facto e que, não o logrando, a oposição deva ser decidida contra ele.

QUINTA

Sobre esta matéria, consideramos pertinente o teor do douto Ac. do Supremo Tribunal Administrativo de 02.03.2011, proferido no Rec. N.º 0944/10.

Enfileirando pelo caminho apontado na jurisprudência supra referida, dúvidas não restam de que é sobre a Fazenda Pública que recai tal obrigação, ou seja, é sobre esta que impende o ónus de demonstrar que o gerente de direito, contra quem reverteu a execução fiscal, exerceu de facto as funções inerentes ao cargo para que fora designado. No mesmo sentido, citamos o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo 808/11.1BEPNF, Data do Acordão: 27-03-2014, acessível em www.dgsi.pt: "I. A determinação da responsabilidade subsidiária por dívidas tributárias afere-se à luz do regime legal em vigor à data em que as dívidas se constituíram (artigos 12º do Código Civil e 12º da Lei Geral Tributária).

II.A gerência de facto constitui requisito da responsabilidade subsidiária dos gerentes, não bastando a mera titularidade do cargo, ou seja, a gerência nominal ou de direito.

III. É sobre a administração tributária, enquanto exequente e como titular do direito de reversão, que recai o ónus de alegar e provar os factos integradores do efectivo exercício da gerência." *

SEXTA

Assim, é mister da Fazenda Pública terá de alegar e provar, por qualquer meio de prova admissível, o exercício efectivo das funções de administração/gestão pelo opoente, sob pena de ser improcedente a pretendida reversão.

SÉTIMA

No caso em apreço, a exequente não exibiu um único cheque emitido e assinado pelo opoente; não identificou trabalhadores que recebessem ordens do opoente; não exibiu nenhuma fatura por si emitida; não provou rendimentos auferidos. O opoente não foi citado pessoalmente na qualidade de legal representante da devedora originária.

OITAVA

O opoente aduziu prova bastante nos autos que não praticou atos de gestão efectiva da sociedade, designadamente, através da prova testemunha arrolada e inquirida, tendo o Tribunal a quo concluído que estes declararam que "estar convictas que o opoente não exercia funções de gerente na devedora originária".

NONA

É do conhecimento geral e facto notório que o sector da construção civil atravessa graves dificuldades, que a construção civil está associada.

DÉCIMA

De outro passo, é facto que a referida sociedade não viu o seu património reduzido ou dissipado, por culpa dos seus órgãos sociais.

DÉCIMA PRIMEIRA

Houve subida dos preços da matéria prima, dos custos agregados, das taxas bancárias e dos custos finais, que resultou numa situação económica e financeira inesperadamente asfixiante, factos que devem ser aditados à matéria de factos provada.

DÉCIMA SEGUNDA

O executado chegou a ser admitido como trabalhador por conta de outrém, a fim de pagar as dívidas fiscais com a retribuição mensal auferida, facto que deve ser aditado à matéria de facto provada.

DÉCIMA TERCEIRA

Apesar do relatado, importa aduzir que não há qualquer relação entre a gestão levada a efeito pelos responsáveis da empresa e a insuficiência do património desta para o cumprimento das dívidas tributárias.

DÉCIMA QUARTA

Tudo visto, a questão de saber se o recorrido é parte legítima, consubstanciando-se pelo não exercício de facto da gerência e na ausência de culpa do gerente na diminuição das garantias patrimoniais da sociedade executada, deverá ser decidida contra a Fazenda Pública, atenta a prova produzida.

TERMOS EM QUE DEVERÁ SER PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO INTERPOSTO PELO OPOENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, SER O OPOENTE CONSIDERADO PARTE ILEGÍTIMA ABSOLVENDO-O DO PEDIDO EXEQUENDO.

Assim, se fazendo inteira e sã Justiça(…)”


Não houve contra-alegações.

Dada vista ao digno magistrado do Ministério Público emitiu parecer concluindo que o recurso não merece provimento.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sendo as de saber se a dívida se encontra prescrita e se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e direito ao julgar parte legitima na execução o Recorrente.

3. JULGAMENTO DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
(…):
Factos Provados
Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:
1) Da inscrição – Ap.17/250050119 da certidão da Conservatória do Registo Comercial do Porto consta que em 19.01.2005 P… foi designado como gerente da sociedade P… Unipessoal, Lda. – a fls. 29 e 30 dos autos.
2) O Serviço de Finanças do Porto 5 instaurou o processo de execução fiscal n.º 3190200701045989 por dívidas de IVA do período de 0605, 0905, 1205 no montante de €24.303,26 em nome de P… Unipessoal, Lda., NIPC 5…– cfr. fls. 16 a 22 dos autos.
3) O Serviço de Finanças do Porto 5 instaurou o processo de execução fiscal n.º 3190200801045644 por dívidas de Coimas do ano de 2008 no montante de €516,80 em nome de P… Unipessoal, Lda., NIPC 5…– cfr. fls. 23 e 24 dos autos.
4) O Serviço de Finanças do Porto 5 instaurou o processo de execução fiscal n.º 3190200801081748 por dívidas de IRC do ano de 2006 no montante de €31.589,62 em nome de P... Unipessoal, Lda., NIPC 5…– cfr. fls. 25 dos autos.
5) Em 2.09.2009 foi proferido despacho de reversão pelo Chefe de Finanças Adjunta do Serviço de Finanças do Porto 5 com o seguinte teor: “Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art.24º/nº1/b) LGT] .” – cfr. fls. 35 e 36 dos autos.
**
Factos não provados
Não resultou provado da instrução dos autos que:
a) Houve subida dos preços das matérias-primas, dos custos agregados, das taxas bancárias e dos custos finais,
b) Que resultou numa situação económica e financeira inesperadamente asfixiante.
c) Que o executado chegou a ser admitido como trabalhador por conta de outrem, a fim de pagar as dívidas fiscais com a retribuição mensal auferida..(…)”

3.1. O Recorrente na parte final das conclusões 11.ª e 12.º alega que houve subida dos preços da matéria prima, dos custos agregados, das taxas bancárias e dos custos finais, que resultou numa situação económica e financeira inesperadamente asfixiante, factos que devem ser aditados à matéria de factos provada. E que chegou a ser admitido como trabalhador por conta de outrem, a fim de pagar as dívidas fiscais com a retribuição mensal auferida, factos que devem ser aditados à matéria de facto provada.

O n.º 1 do artigo 662.° do Código de Processo Civil, determina que “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Por sua vez, o art.º 640.º do mesmo diploma impõem que “1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender deve ser proferida sobre questões de facto impugnadas.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. (…)”
Como refere António Abrantes Geraldes, in Recursos do Novo Código de Processo Civil – Novo Regime. Almedina, 2014, 2º edição, pag 135 e segs.
“(…) A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto, deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto;
b) Falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
c) Falta de especificação nas conclusões dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registado (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente ao segmento da impugnação;
f) Apresentação de conclusões deficientes, obscuras ou complexas, a tal ponto que a sua análise não permita concluir que se encontram preenchidos os requisitos mínimos que traduzem alguns dos elementos referidos…)
Resulta da conjugação dos art.ºs 662.º e 640.º do CPC que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa e desde que o recorrente especifique nas conclusões, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios e a decisão que, no seu entender deve ser proferida.
Assim, para que o TCA possa proceder a alteração da matéria de facto, devem ser indicados os pontos de facto considerados incorretamente julgados, indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
O Recorrente no presente recurso limita-se a impugnar genericamente o julgamento da matéria de facto e não identifica os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, pese embora se perceba que pretende atacar a matéria de facto não provada [nas alínea a) e c)]
Quantos aos meios de prova não especifica os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, limitando no corpo das alegações de recurso a referir que se encontra provado pelo depoimento das testemunhas.
No que se refere a decisão que, no seu entender deve ser proferida sobre questões de facto impugnada a Recorrente nada avançou.
Assim, o Recorrente, contrariamente ao disposto no n.º 1 do 640.º do CPC, limita-se a uma impugnação genérica das decisões da matéria de facto não dando cumprimento ao n.º 1 do 640.º do CPC , não cumpriu o ónus da impugnação da matéria de facto que sobre si recaia ficando este Tribunal impedido de apreciar o recurso.
Nesta conformidade, rejeita-se o recurso.

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. Alega o Recorrente na primeira conclusão que a dívidas IVA e IRC, constantes dos pontos 2 e 4 dos factos provados, encontram-se prescritas, nos termos do art.º 48.º da LGT.
Cumpre saber se em sede de recurso pode ser apreciada a prescrição dos tributos em causa, quando a referida questão não foi apreciada na sentença recorrida.
Com efeito, o artigo 175.º do CPPT prescreve que nos processos de execução fiscal a prescrição é uma questão de conhecimento oficioso pelo juiz, se o órgão de execução fiscal que anteriormente tenha intervindo o não tiver feito.
Decorre desse normativo que quem tem competência para conhecer da prescrição é o órgão de execução fiscal; a prescrição pode ser invocada no processo executivo, sem sujeição a qualquer prazo; e que o tribunal pode conhecer da prescrição, mesmo que não tenha sido invocada.
Ora, o artigo 635.º nº 2 do Código de Processo Civil estabelece que o âmbito do recurso é delimitado pela própria decisão recorrida, limitando assim, objeto do mesmo.
Assim o recurso só pode incidir sobre questões que tenham sido ou devessem ter sido apreciadas pelo tribunal recorrido.
É certo que o tribunal tem o dever de se pronunciar sobre questões do conhecimento oficioso - cfr. artigo 660º nº 2, segunda parte, do Código de Processo Civil (actual art. 608º nº 2), sendo que a prescrição é uma questão do conhecimento oficioso - artigo 175.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Mas são distintas a questão que o tribunal de recurso aprecia incidentalmente no âmbito dos seus poderes oficiosos e a questão de conhecimento oficioso que o recorrente levanta no recurso contra a decisão recorrida.
No primeiro caso, o tribunal de recurso consulta os elementos do processo e extrai oficiosamente uma conclusão (em primeira mão), que poderá até extinguir o recurso e impedir, na prática, o conhecimento do seu objecto.
No segundo caso, o tribunal de recurso verifica - ao conhecer do objecto do recurso - se a questão poderia ter sido oficiosamente apreciada pelo tribunal recorrido (designadamente porque a prescrição já teria então ocorrido) e se, por isso, o tribunal recorrido omitiu o dever respectivo, o que poderá conduzir à procedência do recurso e, se for o caso, ao conhecimento dessa questão, em substituição do tribunal recorrido.
No primeiro caso, a prescrição não faz parte do âmbito do recurso e é apreciada no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal de recurso (em primeiro grau).
No segundo caso, a prescrição é questão central do recurso e a segunda instância verifica se a prescrição deveria ter sido apreciada no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal recorrido (em segundo grau). (…)” in acordão TCAN 01490/06.3 BEVIS de 16.10.2014.
No caso sub judice, não tem enquadramento em nenhuma das situações, uma vez que o Recorrente não alegou a questão em sede de petição inicial nem por outro meio ao tribunal recorrido nem mesmo alegou que a questão deveria ter sido apreciada pelo tribunal recorrido e que tal apreciação deveria ter conduzido a decisão diversa em primeira instância.
O pedido de apreciação da prescrição, em sede de recurso, não tem sustentação na medida em que a decisão recorrida apreciou todos os vícios que o ora Recorrente alegou em sede de petição inicial.
Importa salientar que o âmbito do recurso extravasa o âmbito da decisão recorrida ao pretender que este Tribunal de recurso conheça da prescrição sem limitação, pretendendo-se integrar no objeto de recurso matéria que não faz parte do objeto da decisão recorrida.
Assim sendo, o recurso é ilegal, nesta parte.
Importa agora saber se a prescrição pode ser conhecida incidentalmente no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal de recurso, isto é, se existem elementos necessários para conhecer a prescrição.
Como é sabido, a apreciação da prescrição está dependente do apuramento de diversa factualidade relevante, que não é possível com os elementos disponíveis nos autos, até porque o processo não chegou a este tribunal ad quem acompanhado pelo respetivo processo de execução fiscal.
Tem sido entendimento reiterado deste TCAN que o conhecimento da prescrição, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal de recurso só será possível no recurso se no processo constarem todos os elementos necessários para efeito (Cfr. Acórdão TCAN 12.07.2012 proc. 0116/05.7 BEVIS, e 17.05.2012, proc. nº 291/04 e 01490/06.3 BEVIS de 16.10.2014).
No entanto o não conhecimento, nesta sede não acarreta prejuízos para o Recorrente, uma vez que, poderá requerer ao órgão de execução fiscal que declare a prescrição das obrigações tributárias, e da eventual decisão de indeferimento cabe reclamação para o tribunal.
Face ao supra exposto, não se toma conhecimento do recurso jurisdicional interposto relativamente à prescrição da dívida

4.2 O Recorrente nas conclusões 2.ª a 8.ª veio alegar a gerência de facto da executada originária referindo que a Fazenda Pública terá de alegar e provar, por qualquer meio de prova admissível, o exercício efetivo das funções de administração/gestão pelo opoente, sob pena de ser improcedente a pretendida reversão.

Compulsada a petição inicial verifica-se que não foi alegada a gerência de facto do executado, aliás decorre, ainda que subtilmente, que o mesmo exerceu a gerência (ponto 12.º e 16.º e 18.º).
Da leitura da sentença recorrida consta: “Veio o Oponente no articulado inicial sustentar a falta de culpa na insuficiência do património da devedora originária, que constitui fundamento de oposição à execução fiscal admitido pela alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º CPPT.
No entanto, em sede de alegações, nos termos do disposto no artigo 210º do CPPT o Oponente veio invocar a impossibilidade das coimas serem revertidas contra os responsáveis subsidiários e ainda que não praticou actos de gestão efectiva na devedora originária.
Há que aferir da possibilidade de ampliar a causa de pedir em sede de alegações finais.
À causa de pedir referem-se na nossa lei, e à data de interposição dos presentes autos os artigos. 498º nº 4 e 467º nº 1 alínea d) do CPC, normativos dos quais se extrai a ideia de que ela se traduz no acto ou facto jurídico do qual procede a pretensão trazida ao tribunal e em relação à qual se defende tenha dado origem ao direito que é objecto da acção.
A causam pretendi é o facto jurídico que constitui o fundamento legal do benefício ou do direito objecto do pedido e o princípio gerador do direito, a sua causa eficiente, sendo constituída pelos factos necessários para individualizar a situação jurídica alegada pela parte e para fundamentar o pedido formulado para essa situação.
Ora, o artigo 206º do CPPT enuncia os requisitos da petição, como a sua entrega em triplicado, a junção de todos os documentos, o arrolamento de testemunhas, assim como a requisição das demais provas.
Acresce que, para além destes elementos o Oponente tem de expor, de forma articulada os factos fundamentadores da sua tese e as razões de direito que a fundamentam como determinava à data da interposição da oposição o artigo 151º n.º 2 do CPC. Neste sentido vide comentário ao artigo 206º do CPPT anotado e comentado por Jorge Lopes de Sousa, 6ª edição, 2011, volume III, pag. 534.
Por outro lado e como decorre do disposto no artigo 13º do CPPT ”Aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer”.
A par, estatui o artigo 99º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) que “O tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer.”
Com efeito, o tribunal encontra-se limitado pelos factos alegados pelas partes no articulado inicial, salvo quanto a questões de conhecimento oficioso.
Mas poderá posteriormente ser ampliada a causa de pedir?
Quanto a essa questão não encontramos resposta no CPPT (cfr. Acórdão do STA de 23-10-2013, rec. 0150/13).
Não obstante, a jurisprudência já veio esclarecer essa questão em Acórdão do STA de 25-11-2003, rec. 00774/03.
Como tal, aí foi decidido que “(…) é na petição inicial que as partes devem alegar os factos e as razões de direito que suportam a pretensão deduzida em juízo.
Na petição inicial da oposição deverá, pois, o oponente expor os factos em que baseia a oposição e as razões de direito que a fundamentam, incluindo a alínea ou alíneas do art. 204.º, n.º 1, do CPPT, em que a enquadra, regra que só conhece as excepções previstas nos arts. 272.º, 273.º e 506.º do CPC, aplicáveis por força do preceituado na alínea e) do art. 2º do CPPT. Assim, fora do condicionalismo previsto naqueles preceitos legais e das questões de conhecimento oficioso, a invocação de novos factos ou questões de direito susceptíveis de integrar fundamento de oposição, designadamente em sede das alegações previstas no art. 120.º do CPPT, aplicável à oposição ex vi do art. 211.º, n.º 1, do mesmo código, envolvendo alteração da causa de pedir, não pode ser aceite.”
Concluindo o mesmo Aresto que “Não pode, pois, o oponente usar as alegações pré-sentenciais, fase destinada à apreciação crítica das provas produzidas e à discussão das questões de direito suscitadas na petição inicial, para alterar a causa de pedir.”
Ora, se no articulado inicial o Oponente somente invocou a inexistência de culpa pela insuficiência patrimonial da devedora originária e nas alegações invocou a impossibilidade das coimas serem revertidas contra os responsáveis subsidiários e ainda que não praticou actos de gestão efectiva na devedora originária, conclui-se que em sede de alegações o Oponente veio ampliar a causa de pedir, invocando novos factos conducentes à extinção da execução contra ele revertida.
Assim, não sendo de conhecimento oficioso nem não se verificando qualquer uma das situações previstas nos sobreditos normativos legais, consubstanciando uma qualquer situação de superveniência, as causas de pedir elencadas nas alegações pelo Oponente (impossibilidade de reversão de coimas e falta de gerência do Oponente em sede da devedora originária) não podem ser aqui apreciadas e decididas. (…)”
Com efeito o assim decidido não nos merece qualquer reparo. Em sede de recurso o Recorrente ignora o supra decidido insiste na gerência de facto e do ónus que recai sobre a Administração Fiscal.
O Recorrente não questiona a sentença recorrida, ignorando por completo o que nela foi decidido. Não contraria os fundamentos e a posição sustentado pela MMª juíza na sentença, recorrida como se a questão não tivesse sido objeto de apreciação judicial.
Importa referir que o objeto do recurso, nos termos do n.º 1 do art.º 676.º do CPC são as decisões judiciais e não os atos administrativos e tributários praticados pela Administração Fiscal.
O recurso terá de demonstrar a sua discordância com a decisão proferida, ou melhor, os fundamentos por que a Recorrente acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o Tribunal tome conhecimento delas e as aprecie.
O Recorrente terá de convocar argumentos contra os vários fundamentos desfavoráveis sob pena de o decidido não poder ser alterado, na parte não impugnada.
A propósito da imposição do ónus de alegação ao recorrente já referia Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 357 que “(...) em vista obrigar o recorrente a submeter expressamente à consideração do tribunal superior as razões da sua discordância para com o julgado, ou melhor, os fundamentos por que o recorrente acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o tribunal tome conhecimento delas e as aprecie.(…)”.
É jurisprudência deste Tribunal se em sede de recurso jurisdicional, o Recorrente se alheou em absoluto das razões que fundamentaram a sentença recorrida, limitando-se a repetir o que já havia dito, não ataca o julgado, não pode o Tribunal de recurso alterar o decidido pelo Tribunal a quo, já que a tal se opõe o preceituado no nº 4 do artigo 635.º do CPC (Cfr. TCAN n.º 01806/09.0BEBRG de 15-02-2012 e ac. do STA n.º 0508/13 de 15-05-2013).
Nesta conformidade e pelos motivos supra referidos não se conhece do recurso nesta parte.

4.3. Insurge-se ainda o Recorrente contra a sentença recorrida - conclusões 9.ª a 14.º - por esta o ter considerado parte legítima para a execução, dado não ter demonstrado a falta de culpa pelo não pagamento das dívidas exequendas.
Esclareça-se que sobre a questão da culpa, relativa às dívidas decorrentes de coimas a sentença recorrida julgou procedente a pretensão do Recorrente, uma vez que competia a Administração Tributária o ónus de comprovar a culpa do Oponente na insuficiência do património da devedora originária ou pela falta de pagamento dos créditos tributários o que não logrou provar. Julgando procedente a oposição na parte correspondente às dívidas de coimas, extinguindo, em consequência, a execução revertida.
Relativamente dividas de IVA e de IRC, e após exaustivo enquadramento factual e de direito, a sentença recorrida, julgou improcedente uma vez que considerou que:Pois, sabido que no exercício das suas funções os gerentes têm o dever de administrar a sociedade que gerem, de forma a que esta subsista e cresça, devendo cumprir os contratos celebrados, pagar as dívidas da sociedade e cobrar os seus créditos, reitera-se, tornava-se necessário que este provasse que a falta de cumprimento da obrigação de pagamento da dívida exequenda foi de todo alheia à sua vontade, demonstrando que tomou todas as diligências que um gerente prudente e responsável teria tomado nas mesmas circunstâncias para cumprir tais obrigações.
Assim, a actuação do Oponente é passível de censura, porquanto nas circunstâncias em concreto, podia e devia ter agido de modo diverso, actuando como um gestor prudente e competente, como um “bonus pater familias”, improcedendo o que vem alegado.
Concludentemente, não logrando carrear para os autos a prova atinente à tese que sustentou, inexistência de culpa, a questão decidenda terá de ser contra si decidida, tal como decorrem das regras do ónus da prova determinado pelo artigo 342° do Código Civil e artigo 74° da LGT, em consonância com o dever que sobre si impendia decorrente da alínea b) do n.º 1 do artigo 24º da LGT.(…)”
Desde logo importa relembrar que estamos perante a execução de dívidas de IVA de alguns períodos de 2005 e IRC de 2006.
Decorre da sentença recorrida que a reversão de tais dívidas ocorreu ao abrigo da aliene b) do artigo 24º, nº 1, da LGT, onde se encontra prevista a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento, tenha terminado no período do exercício do seu cargo.
Não tendo o Recorrente dissentido, em sede de petição inicial, da aplicação da alínea b) do nº 1 do art.º 24.º da LGT, ao caso presente, cabia-lhe demonstrar que a falta de entrega do IVA e pagamento do IRC, não lhe é imputável.
Mas não bastava, para almejar tal fim, aludir generalidades, nomeadamente, que a construção civil atravessou uma grave crise, a retração do mercado, a subida dos preços das matérias-primas, dos custos agregados, das taxas bancárias e dos custos finais originou numa situação económica e financeira inesperadamente asfixiante, impeditiva do cumprimento das obrigações fiscais, como aconteceu no presente caso.
Apesar das partes só serem obrigadas a alegar os factos essenciais, têm que ser factos concretos, historicamente contextualizados, que consubstanciem a sua causa de pedir, demonstrando de forma cabal, em que medida tais razões externas comprometeram fatalmente a devedora originária (Cfr ARTUR ANSELMO DE CASTRO, in Direito Processual Civil Declaratório, volume I, Almedina, pág.s 205 e seguintes).
O que a Recorrente não logrou fazer, como bem se explanou na sentença recorrida e da instrução do processo não resultaram comprovados tais factos como consta dos pontos a) e b) da factualidade não provada nem a mesma foi devidamente impugnada.
Não tendo sido impugnada a matéria de facto dada como não provada, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento de facto e de direito improcedendo assim, as conclusões de recurso.

4.4. Nesta conformidade formulamos as seguintes conclusões:
I - Tem sido entendimento reiterado deste TCAN que o conhecimento da prescrição, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal de recurso só será possível no recurso se no processo constarem todos os elementos necessários para efeito.
III - Se em sede de recurso jurisdicional, a Recorrente se alheou em absoluto das razões que fundamentaram a sentença recorrida, limitando-se a repetir o que já havia dito, não ataca o julgado, não pode o Tribunal de recurso alterar o decidido pelo Tribunal a quo, já que a tal se opõe o preceituado no n.º 4 do artigo 684.º do CPC
III - Não tendo a Recorrente dissentido, em sede de petição inicial, da aplicação da alínea b) do nº 1 do art.º 24.º da LGT, ao caso presente, cabia-lhe demonstrar que a falta de entrega do IVA e o pagamento do IRC, não lhe é imputável.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 8 de março de 2018
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Fernanda Esteves
Ass. Cristina Travassos Bento