Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01904/05.0BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 02/16/2023 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Paulo Moura |
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Descritores: | AJUDAS DE CUSTO; EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO; |
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Sumário: | Nas situações em que o trabalhador é logo contratado para ir trabalhar para o estrangeiro, não existe previsão legal para que seja abonado em ajudas de custo, tanto mais que, no caso concreto, foi dado como não provado que o trabalhador tivesse o seu posto de trabalho fixo na sede da empresa, sita em Portugal. |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: "AA", interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRS do ano de 2001, por entender que ocorre erro de facto e de direito. Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: A- Ocorre erro de apreciação da prova, quando, em face das declarações prestadas pela testemunha ouvida nos autos, e cujo depoimento acima se reproduziu, e aqui se renova, o tribunal não deu como provado que: . Que o Impugnante, nas deslocações para França se deslocava em viatura própria e não em viatura da empresa, pagando do seu bolso as despesas; - Que era o trabalhador quem pagava as despesas de alojamento e alimentação, que lhe não era fornecida pela empresa, ou seja, recebia compensação de tais despesas; B- Como decorre do Ac. do TCAS Ac. do TCAS de 11 de Março de 2021, relatado por Tânia Meireles da Cunha no Proc. n.º: 98/09.6BESNT, cujo sumário se reproduz: I. Em regra, os valores pagos a título de ajudas de custo, dado o caráter compensatório que lhes é reconhecido (compensação por despesas que o trabalhador é obrigado a suportar, designadamente por motivo de deslocações), não se integram no conceito de remuneração, para efeitos de IRS. II. Gozando as declarações de rendimentos apresentadas pelos contribuintes de uma presunção de veracidade, cabe à AT de forma sustentada afastar tal presunção, o que não ocorre quando a fundamentação do ato se consubstancia em afirmações genéricas e não especificadas. III. A circunstância de terem sido pagos valores, a título de ajudas de custo, ao longo de todo o ano e com valores em parte aproximados não é suficiente para a caraterização de tais valores como remuneração para efeitos de IRS. IV. A salvaguarda do interesse público, ao nível tributário, não se reduz ao interesse na mera arrecadação de receitas, configurando-se, sim, como salvaguarda desse interesse, uma atuação em respeito pelos princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade e em respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários. C- Do conjunto de factos dados como provados, que no seu essencial, são conclusões encerradas nos relatórios da AT em sede de inspecção e realizada com a entidade patronal que não directamente com o trabalhador, não se encerra nos mesmos qualquer elemento de prova concreta, nomeadamente a existência dos chamados factos- indices, os quais aliás se encontram contrariados pelo depoimento recolhido junto da testemunha arrolada nos autos e ouvida em audiência de julgamento; D- A douta decisão em recurso não atentou no regime legal da prestação de trabalho temporário, e bem assim, na relação laboral decorrente da prestação de trabalho à empresa de trabalho temporário e posterior locação dos serviços do trabalhador ao cliente final, confundindo a relação de trabalho com a relação de contrato de trabalho realizado com empresa em que o posto de trabalho fosse o no estrangeiro; Por outro lado, e ao contrário do referido na decisão, não era ao trabalhador que cabia fazer a prova que o seu local de trabalho era em Portugal, porquanto tal já decorre da relação de emprego entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador; E- A douta sentença viola o disposto no Art.º 74º da LGT, ao operar a inversão do ónus da prova, e dispensando a AT de cumprir com o ónus da prova que lhe cabia, devendo por tal facto ser revogada; Termos em que ao presente recurso deve ser concedido provimento, revogando-se a decisão recorrida e bem assim, sendo proferido acórdão que a final venha a julgar procedente a presente impugnação, como é de JUSTIÇA Não foram apresentadas contra-alegações. O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser recusado em função do valor da causa ser inferior à alçada. Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais). ** Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir. As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se as quantias recebidas pelo Impugnante correspondiam ou não a ajudas de custo. ** Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte: III. FUNDAMENTAÇÃO 1. FACTOS PROVADOS Com relevância para a decisão da causa, consideram-se ainda provados os seguintes factos: A) Entre o Impugnante, na qualidade de trabalhador, e a sociedade “T, Lda.” foi celebrado, ao abrigo do D.L. n.º 358/89, de 17/10, um “contrato de trabalho temporário”, datado de 02/05/2001, através do qual o trabalhador se obrigou a prestar trabalho à utilizadora "Y”, sob as suas ordens e orientações, desempenhando as funções de serralheiro montador, tendo ficado consignado no referido contrato que este tem como fundamento a necessidade de serralheiros montadores para a obra “W/Aeroporto de Nice”, em França, sendo este o local de trabalho – cfr. fls. 257 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido. B) Entre o Impugnante, na qualidade de trabalhador, e a sociedade “T, Lda.” foi celebrado, ao abrigo do D.L. n.º 358/89, de 17/10, um “contrato de trabalho temporário”, datado de 03/09/2001, através do qual o trabalhador se obrigou a prestar trabalho à utilizadora "Y”, sob as suas ordens e orientações, desempenhando as funções de serralheiro montador, tendo ficado consignado no referido contrato que este tinha como fundamento a necessidade de serralheiros montadores para a obra “W/Aeroporto de Nice”, em França, sendo este o local de trabalho – cfr. fls. 257 verso do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido. C) O Impugnante foi alvo de um procedimento interno de inspeção, realizado pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças ... a coberto da ordem de serviço n.º ...71, da qual resultou uma correção de € 16 218,06 ao rendimento declarado em sede de IRS (categoria A) no ano de 2001, correção essa que apresenta a seguinte fundamentação (cfr. relatório de inspeção tributária inserto a fls. 28 a 32 do processo administrativo [PA] apenso aos autos): “(...) No decurso da acção inspectiva externa realizada à sociedade “T, Lda.” – NIF ..., com sede na Rua ..., ..., ..., foi verificado, cf. informação dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças ... que acompanha o Ofício nº ...85, de 25/03/03, o seguinte: 1 – A sociedade analisada desenvolve uma actividade que consiste na contratação de pessoal em regime de trabalho temporário, que em simultâneo é cedido a determinado cliente e sob a autoridade deste irá exercer funções em local pré-determinado. Estas condições são previamente definidas no contrato de trabalho temporário, comprovando-se através dos contratos estabelecidos. 2 – No exercício de 2001, a empresa efectuou pagamentos a título de ajudas de custo, ao pessoal contratado em regime de trabalho temporário, no qual se inclui o contribuinte alvo desta acção inspectiva, processadas e suportadas com base nos recibos de vencimento dos respectivos funcionários. 3 – O princípio em que assenta a atribuição de efectivas “Ajudas de Custo” é o da compensação dos encargos dos trabalhadores, com deslocação do “Domicílio Profissional” para um outro local. 4 – Por “Domicílio Profissional” temos ... “a área delimitada pela periferia da localidade onde o funcionário ou agente tomou posse no cargo, se aí ficou a prestar serviço ou daquele onde exercer as respectivas funções, se for colocado noutro local” ... cf. dispõe o artº 2º do Dec. Lei nº 519-M/79, de 28/12, com a redacção dada pelo Dec. Lei nº 248/94, de 07/10. 5 – Os pagamentos efectuados pela sociedade “T, Lda.”, designados de “Ajudas de Custo” pagas a pessoal de trabalho temporário, no qual se inclui o contribuinte aqui em análise, destinam-se a compensar a deslocação do local de residência para o local de trabalho, considerado “Domicílio Profissional”, cf. está definido na segunda parte do artº 2º do D.L. nº 519-M/79, de 28/12 com a redacção dada pelo Dec. Lei nº 248/94, de 07/10, e, consequentemente não se enquadram no conceito de “Ajudas de Custo” (deslocação do domicílio profissional para um outro local) nem verificam os pressupostos impostos pela legislação que regula tais atribuições, como se conjugou. 6 – Acresce ainda, o facto de a sociedade “T, Lda.” contabilizar diversos custos relativos a despesas com “pessoal temporário”, no qual se inclui o contribuinte alvo desta acção, custos que dizem respeito a “deslocações e estadas”, “transportes”, “alimentação”, “portagens”, etc. Verifica-se portanto, que as referidas despesas, são suportadas pela empresa “T, Lda.” não pelos trabalhadores (entre os quais se inclui o contribuinte alvo desta acção inspectiva), concluindo-se, face ao exposto, que o pagamento efectuado a título de “ajudas de custo” mais não é que um efectivo complemento das remunerações, consubstanciando um rendimento de trabalho dependente (Categoria A/IRS). Resulta do exposto, que o contribuinte recebeu da sociedade “T, Lda.” (...) o valor de 16 218,06 €, a título de “ajudas de custo”, não os declarando à administração tributária na DR Mod. 3 de IRS do ano de 2001, para efeitos de cálculo dos seus rendimentos sujeitos a IRS, quando, tal como se expôs nos pontos precedentes, tais valores consubstanciam rendimentos do trabalho dependente (Cat. A/IRS), como dispõe a segunda parte da alínea d) do nº 3 do artº 2º do Código do IRS. (...)”. D) O Impugnante foi notificado em 13/03/2004 da alteração ao seu rendimento líquido – cfr. fls. 24 a 27 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido. E) Em 26/06/2004, na sequência da correção efetuada pela inspeção tributária, foi emitida em nome do Impugnante, com referência ao ano de 2001, a liquidação adicional de IRS n.º ...31, no valor de € 2 346,47 (que incluía juros compensatórios no montante de € 269,27) – cfr. fls. 34 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido. F) Após acerto de contas com a primitiva liquidação de IRS de 2001, foi apurado um valor a pagar pelo Impugnante de € 2 901,67 – cfr. fls. 35 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido. Mais se provou que, G) A sociedade “T, Lda.” foi alvo de uma inspeção externa realizada pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças ..., a coberto da ordem de serviço n.º ...73, de 09/09/2002, para controlo das remunerações pagas ao pessoal contratado e cedido – cfr. relatório de inspeção tributária elaborado em 10/03/2003, inserto a fls. 45 a 53 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido. 2. FACTOS NÃO PROVADOS Com interesse para a decisão da causa, não se provou que em 2001 o Impugnante tinha como posto fixo de trabalho a sede da sociedade “T, Lda.”, sita em .... Motivação: A convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados resultou da análise dos documentos, não impugnados, juntos aos autos. No que concerne ao facto não provado, o Impugnante não logrou produzir prova (documental ou testemunhal) tendente a demonstrá-lo. Aliás, a prova documental junta aos autos (os contratos de trabalho temporário celebrados com a “T, Lda.”) aponta noutro sentido, dela resultando que o local de trabalho do Impugnante era o aeroporto de Nice, em França. Por outro lado, da prova testemunhal produzida também não resultou minimamente demonstrado que o Impugnante tivesse o seu posto de trabalho na sede da “T, Lda.”. Com efeito, a testemunha "DD", que, no período em causa, prestava serviços de economista à sociedade “T, Lda.”, apenas referiu que esta sociedade não fornecia alojamento aos seus trabalhadores, pagando-lhes, com uma periodicidade semanal, uma compensação pelas despesas, com alimentação e alojamento, que suportavam nos vários destinos em que trabalhavam e, bem assim, que a sociedade suportava os encargos com portagens e alimentação durante as viagens dos seus trabalhadores para França. Tratou-se de um depoimento vago e genérico, que não permitiu dar como provado que, em 2001, o Impugnante tinha o seu local habitual de trabalho em Portugal e que se deslocou ao estrangeiro, ao serviço da sua entidade patronal, para prestar trabalho, tendo aí suportado despesas, com alojamento e alimentação, que foram compensadas através do recebimento de ajudas de custo. ** Questão Prévia Encontra-se colocada a questão, pelo Exmo. Procurador Geral Adjunto, da inadmissibilidade do recurso, por o valor da Impugnação ser inferior à alçada, cujo valor, à data da instauração da ação era de € 3740,98. Refere que na Sentença foi fixado o valor da causa em € 2.346,47, por isso inferior à alçada, pelo que o recurso não deve ser admitido, sendo que o tribunal as quem, não está vinculado ao despacho judicial da 1.º instância que admitiu o recurso. Apreciando. A alçada dos tribunais tributários encontra-se estabelecida no artigo 6.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, diploma aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, que teve sucessivas alterações, mas para o que aqui nos interessa, é a redação inicial deste preceito, que à data da instauração desta Impugnação, continha a seguinte redação: Artigo 6.º (Alçada) 1 - Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal têm alçada. 2 - A alçada dos tribunais tributários corresponde a um quarto da que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância. 3 - A alçada dos tribunais administrativos de círculo corresponde àquela que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância. 4 - A alçada dos tribunais centrais administrativos corresponde à que se encontra estabelecida para os tribunais da Relação. 5 - Nos processos em que exerçam competências de 1.ª instância, a alçada dos tribunais centrais administrativos e do Supremo Tribunal Administrativo corresponde, para cada uma das suas secções, respectivamente à dos tribunais administrativos de círculo e à dos tribunais tributários. 6 - A admissibilidade dos recursos por efeito das alçadas é regulada pela lei em vigor ao tempo em que seja instaurada a acção. Assim, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do ETAF, a alçada dos Tribunais Tributários, correspondia a um quarto da alçada estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância. Conforme bem refere o Exmo. Procurador Geral Adjunto, a alçada dos Tribunais judiciais de 1.ª instância era, em 2005, de € 3740,98 (valor que foi alterado a partir de 01/01/2008, pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, para € 5.000,00), pelo que, a quarta parte deste valor é 935,25. Desta forma, a alçada a ter em consideração neste processo é de € 935,25. Em face do exposto, verifica-se que o processo tem valor de recurso, pelo que este deve ser admitido; como foi (e bem) pela primeira instância. ** Apreciação jurídica do recurso. Em primeiro lugar, alega o Impugnante que ocorre erro na apreciação da prova e pede o aditamento de dois factos, com base no depoimento testemunhal prestado em Tribunal. Os factos que pretende aditar, são s seguintes: - Que o Impugnante, nas deslocações para França se deslocava em viatura própria e não em viatura da empresa, pagando do seu bolso as despesas; - Que era o trabalhador quem pagava as despesas de alojamento e alimentação, que lhe não era fornecida pela empresa, ou seja, recebia compensação de tais despesas; Relativamente a este assunto, temos de dizer que em momento algum da Petição Inicial se alegam os factos que agora se pretendem aditar, pelo que não é possível aditar matéria de facto com base em depoimentos testemunhais, sem o respetivo suporte de alegações de factos simples e concretos efetuados nos articulados. Isto, sem prejuízo de se poder admitir que as testemunhas tragam ao processo informações que correspondam a factos instrumentais ou complementares, que ajudem a formar a convicção do Tribunal, sendo que tais factos não carecem de serem levados ao probatório. Face ao exposto, não se adita ao probatório a pretendida matéria. De seguida, alega o Impugnante que, ao contrário do referido na Sentença o depoimento prestado pela testemunha, não se revela vago e abstrato, sendo antes bem concretizado, para o efeito indicando as passagens da gravação em que incide tal depoimento, assim como realizando a sua transcrição parcial. Tivemos o ensejo de ouvir as passagens da gravação e a testemunha, num primeiro momento, descreve o funcionamento geral da empresa de trabalho temporário e depois refere-se a deslocações a França dos trabalhadores. Ora, não obstante o depoimento não incidir, na sua essência, sobre o trabalhador em concreto; tal depoimento descreve o funcionamento padrão generalizado da empresa para todas as situações, pelo que se pode aproveitar o depoimento no sentido de se aceitar que, neste caso concreto, também foi aplicado o regime padrão da empresa. Assim, veja-se o depoimento prestado, segundo o indicado no recurso: Questionado pelo advogado, responde: Minuto 4:04, diz: Os salários de um modo geral, tinha a remuneração base e os respetivos subsídios de férias e de Natal, bem como a compensação pela caducidade. Depois, havia uma compensação pelas despesas que o trabalhador suportava diretamente do seu próprio bolso, nos vários destinos para onde ia. Eram destacados, muitas vezes, saltando de uma localidade para outra. 4:44m P: E as ajudas de custo como é que eram calculadas? A que é que se referiam? R: 4:49m: Ajudas de custo pretendiam responder sobretudo aos custos de estadia, inclui naturalmente alimentação e alojamento. P: Eram feitos mapas de deslocação, havia mapa de quilómetros para essas ajudas de custo? Ou não tinham a ver com quilómetros … ou tinham a ver com a própria estadia? R: Tem a ver com a estadia, não tem a ver com distâncias, não é uma compensação quilométrica, é compensação como despesa efetiva que as pessoas, que cada colaborador suportava nos respetivos locais. Em cada local pode ter implicações diferentes nos custos que cada um suporta. P: A empresa às vezes também não fornecia alojamento? R: Não nunca! P: Não fornecia alojamento? R: Nunca! P: 5:44m: Havia algumas despesas, para além das ajudas de custo que a empresa suportasse? R: 5:50m: Com certeza. As pessoas quando se deslocavam, normalmente na sua própria viatura, isto se estivermos a falar do mercado francês de um modo geral, se for para mercados mais distantes seria um bilhete de avião. Juiz, 6:07m: Em relação concretamente ao "AA", recorda-se em 2001 onde ele esteve destacado? R: Em França, com certeza. J: Em França era um dos locais habituais … R: Em França é um dos Países em que … locais eram vários. J: França concretamente? R: Sim, não sei se ele esteve nalgum lado noutro sítio. J: Mas França seria um sítio … R: Sim. Diria que 80% do volume de negócios da empresa advinha de França. Portanto, é natural que quase toda a população destacada estivesse aí a trabalhar. Depois, a única referência concreta ao Impugnante decorre da pergunta que o Juiz faz à testemunha, quando é questionada se conhece o Impugnante, ao que a testemunha responde conhecer e saber as funções que desempenhava, conforme se pode ver pela transcrição que se realiza de seguida. Juiz - 9:50m: Concretamente quanto ao "AA" recorda-se desta pessoa, concretamente? R: Recordo da pessoa. Conheço a pessoa. 10:12m: Juiz: lembra-se concretamente que tipo de funções é que ele desempenhou? R: Devia ser serralheiro, serralheiro montador, serralheiro civil, em serviço de montagem. Nem me recordo se à data terá sido ajudante, não faço ideia, ele era muito novo. Mas a área dele era serralharia. Perante este depoimento, em relação à matéria de facto nada há a alterar. Assim, já ficou consignado nas alíneas A) e B) do probatório que o Impugnante realizaria a sua atividade profissional em França e que tipo de atividade. No que concerne às ajudas de custo ou se se quiser ao pagamento das despesas, conforme acima referido tal não pode ser aditado à matéria de facto, pois não está alegado na Petição Inicial que era o trabalhador quem realizava as despesas de deslocação e estadia, as quais depois lhe eram compensadas. Da mesma forma, nada se refere quanto ao modo de deslocação, nem quanto ao fornecimento de alojamento. Portanto, não estando alegados factos simples, não pode o Tribunal levar ao probatório, factos que nunca antes foram alegados. Ponto de análise é também a matéria de facto dada como não provada. Conforme acima descrito na matéria de facto transcrita, foi dado como não provado, o seguinte: «2. FACTOS NÃO PROVADOS Com interesse para a decisão da causa, não se provou que em 2001 o Impugnante tinha como posto fixo de trabalho a sede da sociedade “T, Lda.”, sita em ....». Ora, esta matéria de facto dada como não provada não está impugnada no recurso, sendo que o Impugnante havia alegado na sua Petição Inicial, que tinha o seu posto fixo de trabalho na sede da empresa de trabalho temporário (ponto 3 da PI); que quando presta serviço no estrangeiro, o faz no âmbito do contrato de trabalho com a empresa de trabalho temporário (ponto 4 da PI); e que sempre teve o núcleo de interesses e família em Portugal e quando não está colocado no estrangeiro, tem de se apresentar no posto de trabalho da empresa de trabalho temporário (ponto 5 da PI). Em face do exposto, não se altera a matéria de facto vertida na Sentença. Passemos então à análise jurídica da causa. O Recorrente alega que a Sentença recorrida, por um lado, não atentou ao regime legal de prestação de trabalho temporário; e, por outro lado, que a decisão recorrida viola o disposto no artigo 74.º da Lei Geral Tributária, ao operar a inversão do ónus da prova. – vide conclusões D) e E), do presente recurso. Conforme é entendimento jurisprudencial firmado, as ajudas de custo visam compensar as despesas suportadas pelo trabalhador em favor da entidade patronal, por motivo de deslocações ao serviço desta, em lugar diverso do habitual local de trabalho, desde que não exista correspondência entre o seu recebimento e a prestação de trabalho. Por sua vez, impende sob a Administração Tributária demonstrar que os pagamentos realizados não preenchiam os requisitos acabados de enunciar. Portanto, incumbe-lhe demonstrar que esses pagamentos constituem antes uma remuneração do trabalho prestado e por isso sujeito a tributação em sede de IRS. Ora, determina a alínea d), do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS que as ajudas de custo são tributadas quando excedam os limites legais ou quando não sejam observados os pressupostos legais da sua atribuição aos servidores do Estado. Portanto, para que haja efetivo abono a título de ajudas de custo, é necessário que estejam preenchidos os pressupostos estabelecidos para a função pública, os quais constam do Decreto-Lei n.º 106/98, de 24 de abril (que revogou do Decreto-Lei 519-M/79, de 28 de dezembro, mantendo no essencial o anterior regime, mormente para a situação em análise), assim como do Decreto-Lei n.º 192/95, de 28 de julho (diploma que disciplina o abono de ajudas de custo por deslocação em serviço ao estrangeiro). O artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 192/95, de 28 de julho, dispunha o seguinte: Artigo 2.º Abono das ajudas de custo 1 - O pessoal que se desloque ao estrangeiro e no estrangeiro, por motivo de serviço público, tem direito, em alternativa e de acordo com a sua vontade, a uma das seguintes prestações: a) Abono da ajuda de custo diária, em todos os dias da deslocação, de acordo com a tabela em vigor; b) Alojamento em estabelecimento hoteleiro de três estrelas, ou equivalente, acrescido do montante correspondente a 70% da ajuda de custo diária, em todos os dias da deslocação, nos termos da tabela em vigor. (…) Portanto, para que o trabalhador tenha direito a ajudas de custo, é necessário que haja deslocação ao estrangeiro e no estrangeiro, pelo que o trabalhador tem de ter o seu domicílio ou a sua sede de trabalho em Portugal, pois de outra forma, não se pode considerar que haja uma deslocação ao estrangeiro ou para o estrangeiro. Ora, segundo o artigo 2.º do Decreto-Lei 109/98, domicílio necessário será aquele que: «Sem prejuízo do estabelecido em lei especial, considera-se domicílio necessário, para efeitos de abono de ajudas de custo: a) A localidade onde o funcionário aceitou o lugar ou cargo, se aí ficar a prestar serviço; b) A localidade onde exerce funções, se for colocado em localidade diversa da referida na alínea anterior; c) A localidade onde se situa o centro da sua actividade funcional, quando não haja local certo para o exercício de funções». O Impugnante exercia a sua atividade em França, sendo que, nos termos dos contratos de trabalho temporário celebrados, o trabalhador: «obrigou-se prestar trabalho à utilizadora "Y”, sob as suas ordens e orientações, desempenhando as funções de serralheiro montador, tendo ficado consignado no referido contrato que este tem como fundamento a necessidade de serralheiros montadores para a obra “W/Aeroporto de Nice”, em França, sendo este o local de trabalho» - vide alíneas A) e B) da matéria de facto assente. Significa isto, que o trabalhador aceitou o lugar, ou seja, o posto de trabalho, na localidade onde ficou a prestar o seu trabalho, no caso, em Nice, França. Acresce que, foi dado como não provado que o Impugnante tivesse como posto fixo de trabalho a sede da empresa de trabalho temporário, sita em .... Portanto, no caso concreto, a Administração Tributária logrou demonstrar que o trabalhador foi contratado para exercer funções em local pré-determinado, conforme referido na alínea C) da matéria de facto, quando no Relatório da Inspeção se diz: 1 - A sociedade analisada desenvolve uma actividade que consiste na contratação de pessoal em regime de trabalho temporário, que em simultâneo é cedido a determinado cliente e sob a autoridade deste irá exercer funções em local pré-determinado. Estas condições são previamente definidas no contrato de trabalho temporário, comprovando-se através dos contratos estabelecidos. Ou seja, quando se refere que o trabalhador é contratado e em simultâneo é cedido para exercer funções em local pré-determinado, está a dizer-se que o trabalhador já é contratado para exercer a sua atividade no local para onde vai ser colocado. Portanto, o trabalhador não foi contratado para exercer as suas funções em Portugal e depois foi deslocado para o estrangeiro. No momento da contratação ficou logo definido que o local de trabalho era no estrangeiro; no caso em França. Desta forma, deve entender-se que a Administração Tributária fez a prova que lhe competia, não havendo inversão do ónus da prova ao contrário do que alega o Recorrente. Por sua vez, no que concerne à alegada inaplicabilidade do regime legal de ajudas de custo previsto para os servidores do Estado, não é de acolher tal alegação, na medida em que é o próprio Código do IRS que determina que as ajudas de custo são tributadas quando não sejam observados os pressupostos legais da sua atribuição aos servidores do Estado, conforme decorre do disposto na já citada alínea d), do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS. Por sua vez, relativamente ao regime legal do trabalho temporário, a Sentença não se lhe referiu concretamente, mas cremos que tal acaba por ser irrelevante para o desfecho da causa, pois tal como referido no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 02/02/2017, proferido no processo 00512/04.7BEPNF (em www.dgsi.pt), o qual a dado passo refere o seguinte: «O argumento de considerar o trabalhador deslocado sempre que o local de trabalho fixado seja fora do domicílio da empresa de trabalho temporário (fazendo corresponder a este o domicílio necessário do trabalhador), não colhe, pois o art.º 2.º do DL 358/89, de 17 de Outubro, que regula tal matéria, define o contrato de trabalho temporário como sendo “o contrato de trabalho celebrado entre uma empresa de trabalho temporário e um trabalhador, pelo qual este se obriga, mediante retribuição daquela, a prestar temporariamente a sua actividade a utilizadores” e o contrato de utilização de trabalho temporário como sendo “o contrato de prestação de serviços celebrado entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual esta se obriga, mediante retribuição, a colocar à disposição daquele um ou mais trabalhadores temporários”. (sublinhados nossos). Se o trabalhador se obriga contratualmente a prestar a sua actividade a utilizadores e isso é da natureza do contrato de trabalho temporário, não vemos como possa sustentar-se ter domicílio necessário na empresa de trabalho temporário, no caso, em ....». No mesmo sentido, também se pronunciou o Acórdão também deste Tribunal Central Administrativo Norte, proferido em 28/01/2016, no processo n.º 00602/04.5BEPNF (em www.dgsi.pt), o qual a dado passo, refere o seguinte «(…) O Dec-lei nº358/89 de 17 de outubro (alterado pelo Dec-Lei nº 39/96 de 31 de agosto e Lei nº 146/99 de 1 de setembro) regula o exercício da atividade das empresas de trabalho temporário (que nesta data se encontra revogado pela lei n.º 19/2007 de 22.05). A alínea a) do art.º 2º (alínea) do Dec-lei nº358/89 define como empresa de trabalho temporário, a pessoa coletiva ou individual, cuja atividade consiste na cedência temporária a terceiros, utilizadores, da utilização de trabalhadores, que para esse efeito, admite e remunera. A alínea b), do citado preceito, define como trabalhador temporário a pessoa que celebra com uma empresa de trabalho temporário, pelo qual se obriga a prestar a sua atividade profissional a utilizadores, a cuja autoridade e direção fica sujeito, mantendo, todavia, o vínculo jurídico-laboral à empresa de trabalho temporário. A alínea c) define como “Utilizador: pessoa individual ou coletiva, com ou sem fins lucrativos, que ocupa, sob a sua autoridade e direção, trabalhadores cedidos por empresa de trabalho temporário”(grifado nosso). O contrato de trabalho temporário é “um contrato de trabalho celebrado entre a empresa de trabalho temporário e um trabalhador, pelo qual este se obriga a, mediante retribuição daquela, a prestar temporariamente a sua atividade a utilizadores” (Cfr alínea d) do art.º 2.º). O contrato de utilização de trabalho temporário é contrato de prestação de serviços celebrado entre o utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual se obriga mediante retribuição, a colocar à disposição daquele um ou mais trabalhadores temporários. (Cfr alínea d) do art.º 2.º). O regime jurídico que regula o trabalho temporário prevê uma relação triangular, entre a: 1) empresa de trabalho temporário e trabalhador temporário (titulada pelo contrato de trabalho de temporário); 2) empresa de trabalho temporário e o utilizador (titulada pelo contrato de utilização de trabalho temporário ou prestação de serviços); e 3) o trabalhador temporário e o utilizador (derivada do contrato de utilização de trabalho temporário ou de contrato de prestação de serviços). Por força daquele regime são necessariamente celebrados dois contratos: o contrato de trabalho temporário e o contrato de utilização de trabalho temporário, tendo estes efeitos jurídicos diferentes. O contrato de trabalho (de) temporário celebrado entre empresa de trabalho temporário e trabalhador temporário é essencial, para se apurar o domicílio necessário, o local e período de trabalho, categoria profissional e funções, remunerações principais e acessórias, a duração e as condições gerais do mesmo. E em função dos termos estabelecidos no contrato de trabalho temporário, pode-se aferir com segurança o local de trabalho e o domicílio necessário, para efeito de ajudas de custo.» Em resumo, pode dizer-se que, nas situações em que o trabalhador é logo contratado para ir trabalhar para o estrangeiro, não existe previsão legal para que seja abonado em ajudas de custo, tanto mais que, no caso concreto, foi dado como não provado que o trabalhador tivesse o seu posto de trabalho fixo na sede da empresa, sita em Portugal. Neste sentido veja-se, ainda o Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, proferido em 09/06/2021, no processo n.º 00217/12.5BEPNF (em www.dgsi.pt), cujo sumário, por facilidade de apreensão, se transcreve: I - O D.L. n.º 358/89 de 17 de Outubro (alterado pelo D.L. n.º 39/96 de 31 de Agosto e Lei n.º 146/99 de 1 de Setembro) regulava o exercício da actividade das empresas de trabalho temporário (que à data da liquidação impugnada se encontrava revogado pela Lei n.º 19/2007 de 22.05). II - O regime jurídico que regula o trabalho temporário prevê uma relação triangular, entre a: 1) empresa de trabalho temporário e trabalhador temporário (titulada pelo contrato de trabalho de temporário); 2) empresa de trabalho temporário e o utilizador (titulada pelo contrato de utilização de trabalho temporário ou prestação de serviços); e 3) o trabalhador temporário e o utilizador (derivada do contrato de utilização de trabalho temporário ou de contrato de prestação de serviços). III - Decorria da alínea b), do artigo 2.º do D.L. n.º 358/89 de 31.08, que o trabalhador temporário obriga-se a prestar a sua actividade profissional a utilizadores, a cuja autoridade e direcção fica sujeito, no entanto, mantém o vínculo jurídico-laboral à empresa de trabalho temporário. IV - Provado que esteja que os trabalhadores foram contratados para trabalhar num país estrangeiro, sendo aí o seu local de trabalho, e que não houve mudança do local de trabalho contratualmente previsto ou deslocações por força da prestação ocasional do trabalho fora do local habitual ou por força da transferência das instalações da sua entidade patronal, não pode deixar de se concluir que as prestações auferidas pelos mesmos a título de ajudas de custo integravam a respectiva retribuição ou remuneração de trabalho, constituindo um complemento desta. V - Não é pelo facto de o trabalho ser prestado no estrangeiro, sem mais, que a entidade patronal pode suportar, a título de ajudas de custo, as despesas de alojamento e alimentação do trabalhador. VI - Relevante, para efeitos da atribuição de ajudas de custo, é que o trabalhador esteja deslocado relativamente ao seu local de trabalho fixado no contrato e que, por força dessa deslocação, incorra em despesas que devem ser suportadas pela entidade patronal, porque efectuadas ao serviço e a favor desta. VII - Apurar se às quantias pagas por entidade empregadora, a título de ajudas de custo, deve ser atribuída natureza remuneratória, implica um trabalho de “qualificação do facto tributário” que, por não ter hoje expressão no artigo 100.º do CPPT, nos leva a afastar a possibilidade de ponderação no âmbito desse normativo, por a dúvida não dever reverter a favor do contribuinte, tratando-se, antes, de uma questão jurídica em que o tribunal tem o dever de julgar imposto pelo artigo 8.º, n.º 1 do Código Civil. Em face do exposto, conclui-se que não assiste razão ao Recorrente, pelo que o recurso tem de soçobrar. * No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil – sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia. ** Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário: Nas situações em que o trabalhador é logo contratado para ir trabalhar para o estrangeiro, não existe previsão legal para que seja abonado em ajudas de custo, tanto mais que, no caso concreto, foi dado como não provado que o trabalhador tivesse o seu posto de trabalho fixo na sede da empresa, sita em Portugal. * Decisão Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. * Custas a cargo do Recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia. * Porto, 16 de fevereiro de 2003. 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