Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01581/08.6BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/12/2023
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paulo Moura
Descritores:FATURAS. FRAUDE EM CARROSSEL;
Sumário:
Decorre da interpretação do n.º 4 do art.º 19.º do CIVA, na versão do Decreto-Lei n.º 31/2001 de 8 de fevereiro, aplicável ao ano de 2004, que é pressuposto da atuação da Administração Tributária a prova do conhecimento efetivo do sujeito passivo que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços tinha intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado e que não disponha de adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

A Recorrente, FAZENDA PÚBLICA, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por [SCom01...], S.A., com o NIPC ..., relativa às liquidações adicionais de IVA, e respetivos juros compensatórios, no valor global de € 8.235,05, relativa às liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), referentes ao ano de 2004.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
I – O OBJECTO DO RECURSO
I. Visa o presente recurso reagir contra a sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por [SCom01...], S.A. contra as liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios referentes aos períodos 2004/04, 2004/05 e 2004/09.
II. A questão decidenda a submeter ao julgamento do Tribunal ad quem consiste em saber se a sentença padece de erro de julgamento, de facto e de direito, por ter considerado não se verificarem indícios suficientes que permitissem afirmar:
a) que a impugnante “tinha ou devia ter conhecimento da existência de irregularidades ou de situações fraudulentas dos respectivos fornecedores” e
b) que “existisse qualquer acordo simulatório entre a Impugnante [utilizadora], a [SCom02...] [emitente] e a [SCom03...] [fornecedora]”.

II – ERRO DE JULGAMENTO – A análise parcelar dos indícios
III. O Tribunal procedeu a uma análise compartimentada, segmentada e atomizada dos indícios carreados para os autos e da prova sobre os mesmos produzida, dado que não estabeleceu quaisquer conexões entre os vários indícios entre si e entre estes e os respectivos meios probatórios.
IV. Assim, laborou em erro de julgamento por incorrecta apreciação e valoração da prova, erro motivado pela análise segmentada dos indícios de falsidade, o que conduziu a que não tivesse apreendido a verificação de vários indícios em relação às facturas que a AT considerou como correspondendo a operações simuladas.

III – ERRO DE JULGAMENTO – A extrapolação de factos genéricos
V. Relativamente à organização em geral e ao modo de funcionamento da impugnante, mormente quanto às relações comerciais com os fornecedores e intermediários, o Tribunal deu como provados os factos 9, 10, 11, 12, 15, 16 e 17.
VI. No entanto, exceptuando a 2.ª parte dos factos 12 e 17, os demais constituem factos genéricos, aplicáveis a toda e qualquer relação comercial estabelecida entre a impugnante e os seus fornecedores e/ou intermediários, sendo certo que importaria que tivessem sido levados à matéria probatória factos concretamente relacionados com as facturas emitidas pela [SCom02...].
VII. Assim, incorreu em erro de julgamento ao ter extrapolado de factos genéricos (os procedimentos adoptados pela impugnante para a maioria das suas relações comerciais) factos concretos (os procedimentos adoptados quanto às operações simuladas).

IV – ERRO DE JULGAMENTO – A valoração da prova testemunhal (imparcialidade e credibilidade)
VIII. O Tribunal, exclusivamente com base na prova testemunhal arrolada pela impugnante, deu como provados os factos 9, 10, 12, 15, 16 e 17, sendo certo que os factos 11 e 14 resultaram igualmente provados do depoimento das testemunhas, ainda que acompanhado de prova documental (in casu, apenas o Relatório Final).
IX. Daqui resultando a importância conferida na sentença recorrida a este meio de prova, que se revelou decisivo para a decisão tomada.
X. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por errónea apreciação e valoração da prova testemunhal, na medida em que valorou positivamente, de forma incorrecta e excessiva, o depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante: sem que procedesse à necessária avaliação da imparcialidade de cada uma dessas testemunhas; sem que ponderasse a existência de uma relação (de trabalho, subordinação ou de interesses económicos) com aquela; sem que tivesse procedido a uma avaliação casuística da posição de cada uma das testemunhas face a esta mesma impugnante; sem que tivesse aferido do interesse ou da vantagem que cada testemunha poderia ter no desfecho da lide; sem que tivesse tomado em consideração as incoerências e a ausência de credibilidade dos seus depoimentos.
XI. Além de ter laborado em erro de julgamento ao ter considerado coerentes e credíveis os depoimentos das testemunhas da impugnante, o Tribunal também errou ao ter tomado apenas em consideração uma parte do discurso testemunhal e desprezado a restante, sem explicitar fundamentadamente essa opção.

V – ERRO DE JULGAMENTO – A matéria de facto
XII. Cotejando a sentença, verifica-se que os factos 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16 e 17 foram qualificados como factos complementares ou concretizadores.
XIII. No entanto, não se encontram preenchidos todos os requisitos cumulativos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º do CPC, o que precludiria a possibilidade de o Tribunal, sem mais, dar como provados tais factos.
XIV. Com efeito, a impugnante não alegou em sede da petição inicial qualquer facto essencial que pudesse ser objecto de complemento ou concretização por parte do Tribunal a quo.
XV. Mesmo que assim se não entenda, teria de ser dada possibilidade, pelo menos à parte desfavorecida com tais factos (in casu, a AT), de se pronunciar sobre os mesmos até ao encerramento da discussão, o que não sucedeu.
XVI. Ainda que se pudesse considerar que a impugnante teria alegado factos essenciais aquando da produção das respectivas alegações escritas, sempre ficaria por preencher este requisito da concessão da possibilidade de pronúncia, atendendo a que não foi aberta, ainda que por mero despacho, uma nova fase que conferisse o aludo direito ao contraditório.
Sem prescindir,
XVII. Manifesta a recorrente a necessária discordância em relação à factualidade dada por assente, na medida em que o Tribunal, atenta a prova documental e testemunhal carreada para os autos, não poderia, nuns casos, dar como provados determinados factos e, noutros, não podia dar como provados com a redacção que deles consta, nem poderia extrair as conclusões que tirou dos mesmos, assim incorrendo em erro de julgamento de facto.
XVIII. Quanto ao facto 9., o Tribunal incorreu em erro de julgamento: por não ter considerado que a intervenção dos agentes intermediários se verificava em relação aos fornecedores estrangeiros, nomeadamente espanhóis; por ter extrapolado de um facto genérico determinados factos concretos.
XIX. Assim, impunha-se ao facto supra a redacção constante do ponto 26.2 da motivação.
XX. Quanto ao facto 11., o Tribunal incorreu em erro de julgamento: por ter considerado que a impugnante recorria aos serviços da [SCom04...] há, pelo menos 10/15 anos; por ter extrapolado de um facto genérico determinados factos concretos.
XXI. Assim, impunha-se ao facto supra a redacção constante do ponto 27.3 da motivação.
XXII. Quanto ao facto 12., o Tribunal incorreu em erro de julgamento: por ter considerado que a impugnante recorria aos serviços da [SCom04...] e à intervenção da Sr.ª «AA» em todas as negociações com os fornecedores; por ter feito constar, na parte final da redacção do facto 12., um juízo conclusivo, ao qual deveria ter chegado através da demonstração de outros factos, não se limitando a uma mera enunciação do mesmo.
XXIII. Assim, impunha-se ao facto supra a redacção constante do ponto 28.3 da motivação.
XXIV. Quanto ao facto 13., o Tribunal incorreu em erro de julgamento por ter dado como assente que a IT apurou que a alteração do emitente das facturas se deu por indicação da responsável da [SCom04...] e não que se tratou de uma mera informação prestada pela [SCom01...].
XXV. Assim, impunha-se ao facto supra a redacção constante do ponto 29.2 da motivação.
XXVI. Quanto ao facto 14., o Tribunal incorreu em erro de julgamento por se ter limitado a enunciar um juízo conclusivo, sem carrear para a fundamentação verdadeiros factos que lhe permitissem atingir aquela conclusão vertida em tal ponto do probatório.
XXVII. Assim, impunha-se ao facto supra a redacção constante do ponto 30.2 da motivação.
XXVIII. Ainda quanto à matéria de facto, o Tribunal laborou igualmente em erro de julgamento ao não dar como provados determinados factos que, face à prova documental produzida nos autos, se impunha incluir na fundamentação, atenta a sua relevância para o apuramento da verdade material.
XXIX. Assim, deveriam ter sido dados como provados os factos constantes do ponto 31.1 da motivação.

VI – O ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO
XXX. Culminando o seu discurso fundamentador, o Tribunal considerou que “os indícios apresentados pela AT não são suficientes para afastar o direito à dedução da ora impugnante, nos termos do artigo 19.º, n.ºs 3 e 4 do CIVA”.
XXXI. É contra esta posição que a aqui recorrente se insurge, por entender que o Tribunal a quo laborou em erro de julgamento no que respeita à motivação de direito da sentença.

VI.1 – O CONCEITO FISCAL DE SIMULAÇÃO E A INTERPOSIÇÃO DE SUJEITOS
XXXII. Entendeu o Tribunal que, para afastar o direito à dedução do IVA, a AT teria de reunir indicadores objectivos da existência de um acordo simulatório entre o verdadeiro fornecedor dos bens, o emitente das facturas e o utilizador das mesmas.
XXXIII. No entanto, tal entendimento resulta de uma errónea transposição acrítica do regime jurídico da simulação consagrado no direito civil para o plano fiscal e, mais concretamente, para o campo da denominada facturação falsa.
XXXIV. A figura da simulação, tal como se encontra recortada no plano civil, não tem pleno cabimento quando se trata de abordar a quaestio das facturas ou operações simuladas, dado que o conceito e o regime jurídico da simulação, tal como se encontram consagrados no artigo 240.º do CC, não foram pensados para a simulação fiscal.
XXXV. Se assim fosse, para se poder falar de facturas ou operações simuladas, seria necessária a existência do tal acordo entre todos os intervenientes (e, consequentemente, que a AT reunisse indicadores objectivos desse acordo simulatório global).
XXXVI. Ora, os SIT não contestam que os produtos constantes das facturas emitidas pela [SCom02...] tenham sido recebidos pela impugnante e utilizados no seu processo produtivo: porém, certo é que não foi esta que as forneceu à impugnante, funcionando aqui como mera emitente de papel falso.
XXXVII. Deste modo, se o juízo formulado pela AT se funda na consideração de que determinadas facturas não correspondem a operações real e efectivamente efectuadas entre as partes, bastar-lhe-á demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas em tais facturas são simuladas, não sendo necessário que prove os pressupostos da simulação previstos no artigo 240.º do CC, sendo bastante a prova de elementos indiciários que levem a concluir nesse sentido.
XXXVIII. Por conseguinte, incorreu-se na sentença em erro de julgamento de direito, por entender aplicável, sem mais, o regime jurídico da simulação consagrado na lei civil e, consequentemente, trazer para o plano fiscal a figura da interposição real de pessoas, violando o disposto no artigo 19.º n.ºs 3 e 4 do Código do IVA e artigo 11.º n.º 2 da Lei Geral Tributária.

VI.2 – A RELAÇÃO SUBJACENTE ENTRE EMITENTE E UTILIZADOR COMO REQUISITO DE DEDUTIBILIDADE
XXXIX. O Tribunal considerou que, para efeitos de IVA, não constitui requisito do direito à dedução que tenha sido o emitente da factura a transmitir os bens ou a prestar os serviços, bastando-se a lei, nos termos do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, com a circunstância de ter sido o utilizador a adquirir esses bens ou serviços.
XL. O que significaria que o legislador ter-se-ia, no fundo, abstraído da relação subjacente titulada na factura, relação esta que, a ser assim, não teria forçosamente de existir entre o emitente e o utilizador da mesma.
XLI. Incorreu o Tribunal em erro de julgamento de direito, violando o disposto nos artigos 19.º e 20.º do Código do IVA, dado que o facto de o bem/serviço não ter sido directamente prestado/fornecido pela [SCom02...], mas sim pela [SCom03...], constitui um óbice ao exercício daquele direito, visto que se exige que quem emite a factura corresponda a quem transmite os bens ou preste os serviços.

VI.3 – O CONHECIMENTO OU DEVER DE CONHECIMENTO DO UTILIZADOR
XLII. Os SIT detectaram a existência de um esquema de «fraude carrossel» envolvendo várias empresas, entre as quais a [SCom02...] e a [SCom04...].
XLIII. No entanto, o Tribunal entendeu inexistirem indícios “que permitam afirmar que a Impugnante tinha ou deveria ter conhecimento da existência de irregularidades ou de situações fraudulentas dos respetivos fornecedores e, bem assim, que existisse qualquer acordo simulatório entre a Impugnante, a [SCom02...] e a [SCom03...]”.
XLIV. Quando à necessidade de demonstração, por parte da AT, de um acordo simulatório entre emitente, fornecedor e utilizador, a aqui recorrente já expressou o seu desacordo face a este entendimento, pelo que a questão em dissídio prende-se agora com a suficiência dos indícios carreados pela AT.
XLV. Assim, atendendo aos indícios apontados pelos SIT (elencados nos pontos 47. a 51. da motivação), dir-se-á que a sentença padece de erro de julgamento, de facto e de direito, por ter considerado que a AT não reuniu indícios suficientes que permitam afirmar que a impugnante conhecia ou devia/podia ter conhecimento da existência de irregularidades ou de situações fraudulentas envolvendo as operações relativas às facturas emitidas pela [SCom02...], violando o disposto no n.º 1 do artigo 74.º e na alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º, ambos da LGT e os n.ºs 3 e 4 do artigo 19.º do Código do IVA.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser considerado procedente, revogando-se a decisão ora posta em crise, considerando-se a impugnação improcedente, assim se fazendo

JUSTIÇA.(…)

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

**
Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito violando o disposto no artigo 19.º, n.º 3 e 4 do CIVA, na redação aplicável à data dos factos.

**

Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
“(…)
1. Em cumprimento da ordem de serviço n.º OI.......39 datada de 14 de maio de 2008, foi a Impugnante sujeita a procedimento de inspeção interna de âmbito parcial pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ... quanto a IVA do exercício de 2004 – (Cfr. ordem de serviço, a fls. 6 do PAT em apenso);

2. Foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ... o “Projeto de Relatório de Inspeção Tributária”, o qual foi levado ao conhecimento da Impugnante através do ofício n.º ...45, datado de 26 de maio de 2008 tendente, ademais, à notificação daquela para audição prévia – (Cfr. projeto de relatório, ofício e registo CTT, a fls. 59 a 62 do PAT em apenso);

3. Em 16 de junho de 2008, a Impugnante apresentou junto da Direção de Finanças ... requerimento pelo qual exerceu o respetivo direito de audição – (Cfr. requerimento e carimbo no mesmo aposto, a fls. 45 e 46 do PAT em apenso);

4. Após a Impugnante ter exercido direito de audição prévia, em 23 de junho de 2008, foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., o Relatório Final de Inspeção, no qual se propunham correções aritméticas quanto aos exercícios de 2004, em sede de IVA, o qual mereceu a concordância por despacho da Chefe de Divisão (por subdelegação), nomeadamente com o seguinte teor:
“(…)
III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
III.1 EM SEDE DE IVA
III.1.1 Exercícios de 2004
III.1.1.1. Aquisições efetuadas à sociedade [SCom02...]
A informação proveniente dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ... dá-nos conhecimento do facto da firma [SCom01...] ter efetuado aquisições em 2004, no montante de €44.697,62, respetivamente, IVA incluído à firma [SCom02...], Lda. NIF ..., relativamente à qual existem provas objetivas e credíveis de ter simulado operações económicas com o objetivo de contornar o IVA. Os montantes em causa referem-se às seguintes faturas, cujas cópias se juntam como Anexo I:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


Relativamente a estas transacções e de acordo com os dados disponibilizados e pelas informações dadas pelos responsáveis pela empresa, constatou-se o seguinte:
- A encomenda do material constante das facturas foi efectuada através da firma [SCom04...], Lda. representada pela Dª «AA» que, de acordo com a informação prestada, é quem representa vários fornecedores comunitários recebendo destes uma comissão de intermediação;
De acordo com informações dadas pelo responsável da empresa, e conforme se constata pela análise dos documentos de transporte e outra correspondência proveniente da [SCom04...] em posse da [SCom01...] (Anexo 2), o material é proveniente de Espanha e foi expedido pela firma espanhola [SCom03...], S.L.;
- O descritivo das facturas emitidas pela [SCom02...], com sede em ..., vem redigido em espanhol;
- O pagamento dos bens adquiridos era normalmente feito por cheque à ordem da empresa [SCom02...], Lda.;
Questionado sobre o porquê da factura ter sido emitida pela firma [SCom02...], Lda. sediada em Portugal quando, ao que tudo indica, a mercadoria foi enviada pela empresa espanhola [SCom03...], S.L., foi-nos dito que, na altura, foram informados pela Dª «AA» que o material seria facturado por uma empresa portuguesa representante da firma espanhola. Referiu ainda que nunca foi estabelecido qualquer contacto directo entre a [SCom01...] e a [SCom02...].
Os responsáveis pela [SCom01...] foram ainda confrontados com o facto de que, segundo o relatório de inspecção da Direcção de Finanças ... resultante da acção inspectiva levada a cabo junto da referida sociedade, existem provas objectivas e credíveis de estarmos perante a simulação de operações económicas, ao introduzir no circuito dos bens vários agentes económicos, com a finalidade de simular operações económicas internas. Trata-se de uma situação de fraude carrossel em que as operações em causa se inserem na criação de um circuito de sucessivas facturas, emitidas por várias sociedades que foram constituídas com tal finalidade, com o objetivo de dar o direito à dedução de IVA a terceiros, sendo que tal imposto nunca dava entrada nos cofres do Estado.
Face à situação descrita, o administrador da empresa mostrou-se indignado e apesar de admitir nunca terem contactado com os responsáveis ou qualquer outro colaborador da referida sociedade, assegura que efetivamente adquiriram aqueles bens, conforme consta dos respetivos documentos de transporte.
Não soube, no entanto, explicar o porquê das faturas serem emitidas pela firma nacional, sem qualquer ligação aparente à firma espanhola de onde eram provenientes os bens cujo transporte era feito diretamente para a firma portuguesa. Esta operação estaria, à partida, isenta de imposto por se tratar de uma transmissão de bens entre dois sujeitos passivos de um estado membro para outro.
III.1.1.2. Circuito documental das operações económicas relacionadas com as aquisições efetuadas à [SCom02...]
Relativamente às transações descritas no ponto anterior, torna-se relevante dar a conhecer determinados factos relacionados com a firma [SCom02...] e outros intervenientes a montante que estão relacionados com os bens faturados pela [SCom02...] à [SCom01...].
· [SCom02...], LDA.
Relativamente a este sujeito passivo, e tendo presente o relatório proveniente da Direcção Finanças ... elaborado em 30/01/2007, torna-se. importante realçar os seguintes aspectos:
- A empresa foi constituída em 01/03/2004 e encontrava-se sediada na Av.ª ..., 3ª em ... que se constatou tratar-se unicamente de um Gabinete de Contabilidade onde é efectuada a contabilidade da empresa e onde possuía um espaço onde se encontrava uma funcionária administrativa.
Segundo o cadastro da Direcção Geral dos Impostos, a firma iniciou a actividade de "Comércio por grosso de minérios e metais - CAE 051520" desde 23/02/2004 e encontra-se cessada oficiosamente para efeitos de IVA desde 31/05/2006;
O sujeito passivo entregou as declarações periódicas de IVA dentro do prazo legal até ao período 05/2006 encontrando-se com declarações em falta a partir do período 06/2006, inclusive. Efectuada uma análise às declarações periódicas entregues relativamente aos exercícios de 2004, 2005 e 2006 verificámos que o sujeito passivo se encontra em crédito de imposto ao longo destes três anos;
A) Ouvido em auto de declarações, um dos sócios gerentes da [SCom02...], este declarou resumidamente o seguinte:
· "O sócio gerente do gabinete de contabilidade ... foi contactado por uma pessoa de um gabinete de contabilidade ... situado em Barcelona, para a constituição e execução da contabilidade da firma com a actividade de comércio por grosso de minérios e metais";
· "O único fornecedor é a sociedade "[SCom05...], Lda.", ... , os sócios conheciam-se antes da constituição das firmas"; Em relação aos clientes são angariados pela sociedade "[SCom04...]" com o NIF ..., onde lhe é paga uma comissão pela "[SCom02...]" e pelo Sr. «BB» através dos nºs ... , esta comissão é paga pela "[SCom06...], não sabe se existem outros clientes a pagar-lhe comissões;
· O transporte de mercadorias de “[SCom05...]” proveniente do “[SCom03...], SL”, «CC» para os clientes da “[SCom02...]” é efetuado através da empresa de transportes “[SCom07...]”, NIF ..., quanto aos outros fornecedores (“[SCom06...]” e “[SCom08...]”) são efetuados pelos veículos do próprio ou outros por eles contratados. O pagamento à “[SCom07...]” é pago pela “[SCom02...]” através de transferência bancária”;
· "A facturação da "[SCom02...]" processa-se num gabinete localizado em Espanha denominado [SCom09...] SL. Para a funcionária administrativa da "[SCom02...]" é enviada uma via do documento que é reencaminhada para os clientes. Posteriormente para a contabilidade é enviada uma 2.ª via para o registo contabilístico".
Perante as declarações prestadas pelo sócio gerente da firma [SCom02...] não podemos deixar de realçar o modo pouco habitual como a firma foi constituída (através do contacto de um gabinete de contabilidade localizado em Espanha com um gabinete de contabilidade localizado em Portugal). Para além disso, o sócio gerente refere que o transporte das mercadorias da [SCom05...] provenientes da [SCom03...] é efectuada pela firma [SCom07...] a quem a [SCom02...] paga através de transferência bancária. Ora, como mais adiante se refere no ponto III.1.1. 3. do relatório, pelos elementos constantes da contabilidade da [SCom02...], não foram detectados quaisquer pagamentos à empresa de transportes [SCom07...].
Pela recolha de elementos efectuada constatou-se que a empresa [SCom02...] tinha efectivamente como único fornecedor um sujeito passivo nacional, a firma [SCom05...] Unipessoal, Lda., NIF ..., e que os clientes são exclusivamente nacionais:
(…)
O volume de aquisições supostamente efetuadas pela [SCom02...] à firma [SCom05...] Unip. Lda ronda os quatro milhões de euros em 2004, cinco milhões de euros em 2005 e 9 milhões de euros em 2006.
O valor acrescentado gerado nas transações comerciais por parte da [SCom02...] é praticamente nulo.
· [SCom05...] – COM DE METAIS E RECICLAGEM DE MATERIAIS UNIP., LDA
· O sujeito passivo [SCom05...], único fornecedor da [SCom02...], foi igualmente alvo de uma acção inspectiva levada a cabo pela Direcção de Finanças .... De acordo com o relatório que resultou da acção, datado de 30/01/2007, constatou-se o seguinte:
· A firma foi constituída no dia 16/03/2004 e tem como objecto social a "Comercialização por grosso de minérios e de metais Reciclagem de Materiais" - "Sucatas", tendo como sócio o Sr. «DD»;
· A sede da empresa sita na Av.ª ..., ..., corresponde unicamente a um centro de escritórios onde existem várias domiciliações de empresas. o sócio desloca-se ao escritório apenas de dois em dois meses, sendo-lhe entregue toda a correspondência em mão;
· A sociedade não possui armazém, imobilizado ou empregados;
· As declarações periódicas de IVA foram entregues dentro do prazo legal até ao período 05/2006 constatando-se que o sujeito passivo se encontra em permanente crédito de imposto;
· O único cliente nacional era a sociedade [SCom02...] e o único fornecedor nacional era a sociedade [SCom08...] Unipessoal, Lda;
· Para além do cliente nacional, [SCom02...], a firma possui ainda dois clientes espanhóis, [SCom10...], SL e [SCom11...] SL;
· As transmissões para os sujeitos passivos espanhóis não constam do sistema VIES e não foram declaradas nas declarações periódicas entregues pelo sujeito passivo;
· Em consulta ao sistema VIES - Sistema de Informação de Trocas Intracomunitárias - cadastro verificou-se que o operador [SCom11...] SL não se encontra registado no cadastro e que o operador [SCom10...] SL ... iniciou a actividade em 21/03/2005 e cessou a 26/07/2005;
· O Sr. «DD», sócio único da firma, que se encontrava a acompanhar no mesmo dia o sócio gerente da firma [SCom02...], declarou resumidamente o seguinte, em auto de declarações, a propósito da actividade da sociedade:
· "Os fornecedores da "[SCom05...], Lda." são: "[SCom03...], S.L. ", ... , "[SCom06...] S.L., ... e "[SCom08...] Sociedade Unipessoal, Lda.";
· "Os pagamentos a estes fornecedores são efectuados por transferência bancária com excepção do "[SCom08...]", que é efectuado em dinheiro. A sociedade "[SCom05...]. " não paga qualquer transporte indica somente o local de carga e descarga";
· O controle das quantidades da mercadoria é efectuado pelo próprio motorista que faz a carga e a descarga;
· "O primeiro contacto com o fornecedor "[SCom08...]" foi efectuado no "terreno" à procura de mercadoria. ";
· Quanto ao processamento de facturas, é efectuado num gabinete situado em Espanha, denominado "[SCom09...] SL " .....
Não foi possível estabelecer mais nenhum contacto posterior com o sócio da empresa, dado o mesmo nunca responder às notificações nem às diligências da funcionária da [SCom02...] (único cliente nacional).
Como veremos ao longo do relatório, as declarações prestadas pelo Sr. «DD» não fazem muito sentido. Por exemplo, sabe-se que ele não pode ter efectuado o primeiro contacto com o fornecedor [SCom08...] no terreno à procura de mercadoria porque foi provado que este sujeito passivo nada comprou e, por isso, não podia ter mercadoria para vender.
· O fluxo de transacções em torno da [SCom05...] é basicamente o seguinte:
(…)
Segundo informações obtidas junto da Administração Fiscal Espanhola, o fornecedor comunitário [SCom03...] S. L. iniciou a actividade a 31/12/2003 tendo como sócios «EE» com uma participação de 99,7% e «FF» com uma participação d 0,3%, esta última foi também sócia gerente da [SCom02...] entre 10/12/2004 e 05/11/2005. O sócio da [SCom02...], «GG», também é sócio da [SCom06...]. Assim constata-se que existem sócios das sociedades [SCom03...] e [SCom06...] que são comuns à [SCom02...];
Analisada a conta corrente do fornecedor [SCom08...], cujo volume de compras contabilizado rondou os 4 milhões de euros, constata-se que não foi efectuado qualquer pagamento.
· [SCom08...] – SOC. UNIP. LDA.
Relativamente ao único fornecedor nacional da firma [SCom05...] foram referidos os seguintes factos relevantes no relatório enviado pela Direcção de Finanças ...:
O sujeito passivo iniciou a actividade de "comércio por grosso de sucatas e de desperdícios" no dia 16/07/2004, encontrando-se a sua sede localizada em ...;
Através da consulta dos anexos O e P da Declaração Anual de informação contabilística e fiscal entregue por este sujeito passivo, em 2004, verificou-se que o único cliente é a sociedade [SCom05...] com um valor de vendas próximo dos quatro milhões de euros e o único fornecedor é o sujeito passivo [SCom12...] Unipessoal, Lda., também com sede em ..., com um valor de compras ligeiramente inferior ao montante das vendas (a diferença é inferior a de mil euros);
Analisadas as declarações periódicas de IVA enviadas constata-se que a empresa se encontra em situação de crédito permanente de imposto;
Tendo em conta que as sociedades [SCom08...] e [SCom12...] iniciaram a actividade no mesmo dia e que esta última não cumpria com as suas obrigações fiscais, a Direcção de Finanças ... solicitou à Direcção de Finanças ... acção inspectiva aos dois sujeitos passivos. Relativamente à firma [SCom08...] a Direcção de Finanças ... informou o seguinte:
A sociedade em causa foi constituída por contrato particular em 16/07/2004, tendo sido mencionado que o gerente e sócio único, «HH» residia, à data, em Espanha;
A sociedade não possui imobilizado nem pessoal ao seu serviço e a sede social é a morada do gabinete do contabilista, sendo apenas uma morada de conveniência;
Os contactos com o técnico oficial de contas são efectuados com o Sr. «II» que lhe entrega os documentos da contabilidade e dinheiro para fazer face às despesas da sociedade, não havendo contacto com o sócio da empresa;
O único fornecedor é o sujeito passivo [SCom12...] Unipessoal, Lda. com início de actividade em 16/07/2004;
Não existem meios de pagamento utilizados na actividade económica, sendo periodicamente emitidas declarações de pagamento em dinheiro para o cliente e para o fornecedor, contabilizadas por contrapartida de caixa, mas nunca foram assinadas;
Não existem facturas de prestações de serviços das empresas de transporte, meio de pagamento, guias de transporte e "CMRs";
Não constam da contabilidade encomendas ou quaisquer contratos entre os sujeitos passivo;
Em género de conclusão a Direcção de Finanças ... referiu que:
1. a sociedade em causa não apresenta qualquer estrutura para o exercício de actividade económica;
2. não foram utilizados meios de pagamento nas transacções contabilizadas;
3. as facturas de compras e venda aparentam terem sido emitidas pelo mesmo sistema informático, eventualmente utilizando folha de cálculo e não se referem a transacções de bens entre as entidades em causa;
4. pelo que se está perante uma simulação de operações económicas na sociedade [SCom08...] Unipessoal, Lda.
(…)
· [SCom12...] UNIPESSOAL, LDA.
Quanto ao único "fornecedor" do sujeito passivo [SCom08...], foram apurados os seguintes factos:
O sujeito passivo iniciou a actividade de "Comércio por grosso de outras máquinas de material i escritório" no dia 16/07/2004 (precisamente no mesmo dia em que a firma [SCom08...] UniP. Lda. também iniciou a actividade) com sede também em ...:
Em análise às declarações periódicas de IVA entregues verificou-se que não cumpriu com as suas obrigações fiscais encontrando-se com declarações em falta a partir do exercício de 2005. É de salientar que somente entregou as declarações periódicas de IVA do 3° e 4º trimestres e exercício de 2004, sem qualquer movimento.
Relativamente a este sujeito passivo, a Direcção de Finanças ... concluiu, com os elementos fornecidos pelo Técnico Oficial de Contas, o seguinte que passamos a descrever:
· A sociedade nunca contabilizou qualquer facto da sua actividade económica;
· Nunca exerceu a actividade, ou se a exerceu nunca a expressou na contabilidade;
· A sociedade tem a sede na mesma morada do técnico oficial de contas;
· O técnico oficial de contas nunca conheceu o sócio da sociedade. Sr. «JJ», foi contactado por um indivíduo que se identificou com «II», que lhe pediu permissão para mencionar a sua morada profissional como sede da sociedade;
· Com data de 13/07/2004 recebeu uma carta do gabinete de contabilidade, onde é efectuada a contabilidade das firmas [SCom02...] e [SCom05...]. acompanhada da escritura de constituição da sociedade em causa, onde alertava para que a declaração de início de actividade fosse entregue até 5/07/2004;
· Mais uma vez se conclui que a sociedade em causa não apresenta estrutura para o exercício da actividade económica.
Segundo informações obtidas junto da Administração Fiscal Espanhola, o fornecedor [SCom08...] é sócio de uma empresa espanhola que pertence ao grupo da [SCom06...]. Foi-nos informado também que o sujeito passivo «JJ», sócio do agente económico [SCom12...] Unipessoal, Lda. é sócio da [SCom11...] (um dos clientes espanhóis da sociedade [SCom05...] Unip. Lda).

III.1.1.3. Descrição das operações realizadas pela [SCom02...]
Após a alusão feita aos intervenientes a montante que estão relacionados com os bens facturados pela [SCom02...], importa referir alguns aspectos relacionados com as transmissões efectuadas por este no mercado nacional que constam do relatório enviado pela Direcção de Finanças ...:
Ouvida a única funcionária administrativa da firma [SCom02...] acerca da actividade da empresa, a mesma afirmou o seguinte:
"1- Os clientes da "[SCom02...]" efectuam directamente ao sócio a encomenda da mercadoria. O sócio desta sociedade vem ao escritório uma a duas vezes por mês;
2- Recebe as facturas para os clientes em duplicado vindas de Espanha por mensageiro (SEUR), tira uma cópia para o seu arquivo interno e outra cópia para a contabilista que se encontra no mesmo espaço físico. Estas facturas são registadas e enviadas com aviso de recepção aos clientes, todos com sede em Portugal;
3- Quanto aos pagamentos efectuam-se da seguinte forma: Os clientes enviam os cheques para o sócio que se encontra em Espanha, posteriormente à data próxima do depósito é-lhe enviado para Portugal por mensageiro (SEUR) os respectivos cheques. Faz um registo interno da factura a que respeita o cheque, tira cópia e deposita o cheque no banco. Quando o pagamento é efectuado por transferência bancária é-lhe enviado pelo cliente comprovativo do banco e arquiva. O cliente dá conhecimento ao sócio desta transferência.
4- Quanto ao pagamento ao fornecedor [SCom05...] Unip. Lda. quando o pagamento é efectuado por transferência bancária, o sócio da "[SCom02...]" indica-lhe para ordenar a respectiva transferência; quando o pagamento é efectuado por cheque não tem conhecimento desse pagamento. "
Concluindo, a sua função na [SCom02...] circunscreve-se ao envio dos originais e duplicados das facturas por correio para todos os clientes que se encontram em Portugal e ao depósito, nas contas bancárias da sociedade, dos cheques dos clientes enviados pelo sócio via SEUR. Por outro lado, mostra um total desconhecimento da actividade da empresa ao prestar informações incorrectas como é o caso do modo como se processam os pagamentos por parte dos clientes.
Quanto ao transporte de mercadorias de [SCom05...] para a [SCom02...], constatou-se a contabilização de facturas da empresa de transportes [SCom07...], S.A., sediada e Espanha, correspondente ao transporte efectuado entre o sujeito passivo [SCom03...] S.L. (fornecedor de [SCom05...]), cujo local de carga se situa em Espanha, e, vários clientes da [SCom02...]. Não se encontram contabilizados documentos de prestaçõ de serviços de empresas de transporte, relativamente aos restantes fornecimentos e mercadorias [SCom05...], provenientes de [SCom08...] ou [SCom06...]. Salienta-se o facto de não se encontrar contabilizado na [SCom02...], nem se ti conhecimento, de pagamentos efectuados à [SCom07...].
· Pela análise do extracto da conta bancária da sociedade [SCom02...], verificou-se a existência de um pagamento de uma comissão de agência por representação de vendas no Norte do País à sociedade [SCom04...], Lda. (que foi quem intermediou todas as aquisições efectuadas pela [SCom01...] à [SCom03...] e facturadas pela [SCom02...] efectuado através de transferência bancária.
Contactada a sócia gerente da referida sociedade, Sr. Dª «AA», a mesma referiu que até Janeiro de 2004 era representante em Portugal da sociedade [SCom03...]. Por indicação do Sr. «KK», sócio da empresa espanhola, todos os assuntos relacionados com esta sociedade passariam a ser tratados com a empresa portuguesa [SCom02...] da qual também era sócio e com as senhoras D. «LL» e D. «MM» do departamento de contabilidade da [SCom02...].
Conforme foi afirmado pelo sócio da [SCom02...], as referidas senhoras são funcionárias da sociedade [SCom06...] o que nos leva a concluir que as pessoas das sociedades [SCom05...], [SCom02...], [SCom03...] e [SCom06...] se relacionam entre si. A D.ª «AA» confirmou telefonicamente ao coordenador desta acção, na visita efectuada a um "adquirente" da [SCom02...], no dia 27 de Março de 2008, que apesar de ter informado os clientes de que as matérias primas passariam a ser facturadas pela [SCom02...] nunca se deslocou às instalações desta mesma empresa.
Por outro lado, a contabilidade da [SCom02...] não evidencia o custo nem o pagamento das referidas comissões. Questionada a TOC da empresa sobre este facto, afirmou que desconhecia os referidos custos dado que, não obstante as facturas serem emitidas em nome de [SCom02...] eram enviadas directamente de Espanha.
Não foi possível concluir que a mercadoria com origem no fornecedor nacional [SCom08...] se destinou aos clientes intracomunitários da [SCom05...] nem ao cliente nacional [SCom02...], por não existir evidência de qualquer fluxo financeiro, quer para pagamento de facturas de mercadorias quer de transporte. Por outro lado, e conforme informação da Direcção de Finanças ..., também não existem facturas de prestações de serviços das empresas de transporte, meio de pagamento, guias de transporte e "CMRs", nem constam da contabilidade encomendas ou quaisquer contratos entre os sujeitos passivos [SCom08...] e [SCom05...];
Constatou-se ainda que os cheques remetidos pelos "clientes" da [SCom02...] eram, muitas vezes, levantados de imediato, sem serem sequer depositados na conta de depósitos à ordem que a [SCom02...] possuía;
Perante os factos descritos constatamos que estamos perante uma fraude de tipo "carrossel", caracterizada pela existência de transacções ficcionadas, efectuadas através de uma cadeia de empresas, controladas por indivíduos coordenados entre si. Ao conciliar todas as facturas emitidas pelos vários operadores económicos [SCom03...], [SCom06...], [SCom08...], [SCom05...] e [SCom02...] que se encontram contabilizadas na [SCom05...]
verifica-se o seguinte:
- As facturas emitidas pelos operadores [SCom03...], [SCom06...], [SCom08...] e [SCom05...] são em tudo idênticas (descritivo, quantidade e datas) e as facturas emitidas por [SCom05...] para os seus clientes intracomunitários diferem das emitidas pelo seu fornecedor ([SCom08...]) pela sigla "IN";
- No decurso das visitas efectuadas a "clientes" da [SCom02...] constatou-se ainda o facto das Notas de Despacho e de Encomenda, emitidas por esta, aparecerem em várias cores e de haver pouco cuidado na indicação da morada. Em vez de "Rua ..." aparece a indicação de "Rua...".
· Face ao exposto, e conforme tem vindo a ser referido ao longo do relatório, existem provas objectivas e credíveis, de nos encontrarmos perante a simulação de operações económicas, ao introduzir no circuito económico dos bens vários agentes [SCom12...], [SCom08...], [SCom05...], e [SCom02...], cujo objectivo seria simular operações económicas internas, conforme se verifica no circuito seguinte que damos imagem. Assim de uma maneira fraudulenta ao liquidarem imposto que nunca foi entregue nos cofres do Estado permitem aos clientes da [SCom02...] a dedução desse imposto segundo os n.ºs 1 e 2 do art.º 19.º do CIVA”.
(…)
Existem fundamentos claros de que os vários agentes económicos desde o início das transacções tinham consciência dos termos em que estavam a efectuar as operações em causa, nomeadamente se atendermos, entre outros, aos seguintes factos:
2) Envio de uma carta para o TOC do agente económico [SCom12...] proveniente do gabinete de contabilidade que elabora as contabilidades da [SCom02...] e da [SCom05...], acompanhada de escritura de constituição da sociedade [SCom12...], alertando para que a declaração de início fosse entregue até ao dia 15/07/2004, conforme indicações do Sr. «DD»;
3) As sociedades [SCom12...], [SCom08...], [SCom05...] e [SCom02...] serem constituídas em datas aproximadas;
4) Os sócios de [SCom12...], [SCom08...], [SCom05...] e [SCom02...] são comuns às sociedades [SCom06...] e [SCom03...];
5) As declarações prestadas pelo Sr. «DD», que levam a crer que se trata de um "testa de ferro", colocado como intermediário onde no contacto inicial efectuado com a Administração Fiscal demonstrou algum "desconhecimento" quanto à forma como se desenvolve a actividade, nomeadamente:
- No 1 º contacto com o fornecedor [SCom08...], conhecendo-o no terreno à procura de mercadoria para venda;
- A venda das mercadorias para a [SCom02...] e desta para os clientes, "confiando" no motorista, Sr. «NN», que controla os pesos no local de carga e descarga.
1.4. Conclusão
Os factos relatados nos pontos III.1.1.2, III.1.1.3 e III.1.1.4, colocam-nos perante a constatação da existência de um esquema fraudulento em que as operações em causa se inserem na criação de um circuito de sucessivas facturas, emitidas por várias sociedades que foram constituídas com a finalidade de não entregar o IVA liquidado nos cofres do Estado e de dar o direito à dedução de IVA a terceiros, IVA esse que nunca chegou a entrar nos cofres do Estado.
Os relatórios provenientes de ... vão mesmo no sentido de que, não só o circuito das mercadorias é falso, como nem sequer houve transacção de mercadorias.
Tendo agora presente as aquisições efectuadas pela [SCom01...] à [SCom02...] em 2004 a que se faz referência no ponto III 1.1.1 cumpre-nos ainda referir o seguinte:
No caso das transacções operadas entre a [SCom02...] e a [SCom01...] somos levados a crer, pelos elementos apresentados, nomeadamente os documentos de transporte e outra correspondência (ver Anexo 2), que houve efectivamente a aquisição das mercadorias indicadas nas facturas emitidas pela [SCom02...], daí aceitar-se o custo para efeitos de IRC.
No entanto, as mercadorias vieram directamente da empresa [SCom03...] sediada em Espanha, com perfeito conhecimento por parte dos responsáveis da [SCom01...], reunindo todas as condições para que a operação fosse isenta de IVA por se tratar de uma transmissão de um Estado Membro para o outro.
Além disso, as mercadorias fornecidas pela [SCom03...] à [SCom01...] nem sequer foram facturadas à [SCom02...] uma vez que o único fornecedor desta era a empresa portuguesa [SCom05...].
Assim, constatamos que estamos perante operações simuladas entre vários agentes económicos que, de acordo com o estipulado nos nºs 3 e 4 do art.º 19º do Código do IV A, não conferem direito à dedução do imposto por parte da [SCom01...].
O n.º 3 do referido artigo estipula que "não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente" e o n.º 4, sua vez, refere que "não poderá igualmente deduzir-se imposto que resulte de operações em que ·o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento de que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não dispõe de adequada estrutura empresarial suscetível de exercer a atividade declarada”.
O técnico oficial de contas referiu, aquando da deslocação à empresa, que não suspeitou que existia alguma anormalidade nas transacções com a [SCom02...] apesar da mercadoria proveniente de um sujeito passivo espanhol ter sido facturada por uma empresa portuguesa. No entanto, existiam vários indícios, que descrevemos a seguir, que poderiam levar a empresa a estranhar a maneira como os bens eram facturados. Se não vejamos:
A mercadoria era proveniente directamente de um sujeito passivo espanhol que poderia ter facturado a mercadoria enviada com isenção de IVA;
Apesar da firma espanhola ter supostamente como representante a firma portuguesa [SCom02...] sediada em ..., que foi quem faturou os bens em questão, todos os assuntos relacionados com os fornecimentos da matéria-prima eram tratados por intermédio da firma [SCom04...], (ver anexo 2);
Relativamente ao fornecimento a que se refere a factura n.º ...14 de 30/07/04, constata-se que a Nota de Encomenda emitida com o timbre da [SCom02...] era enviada pela empresa espanhol [SCom03...] para a [SCom04...] que posteriormente a encaminhava para a [SCom01...] para ser devidamente assinada e devolvida, conforme se constata pela folha que se junta como Anexo 3;
Se a [SCom02...] era uma empresa que efetivamente representava as empresas espanholas em Portugal então qual era a necessidade de utilizar outra empresa portuguesa (a [SCom04...]) para efetuar diligências relacionadas com as transações entre a [SCom02...] e os seus “clientes” e porque é que os documentos emitidos por ela eram "fabricados" em Espanha?;
- Relativamente à factura n.º...6 constata-se que o CMR (documento de transporte). assinado pela, [SCom01...] aquando da receção da mercadoria, refere como expedidor aos bens a firma [SCom03...] sediada em ..., Espanha, e como consignatário/destinatário a firma [SCom05...] sediada no ... (ver Anexo 4). Ora, se a informação que a [SCom01...] tinha era de que a mercadoria viria de Espanha e seria facturada pela [SCom02...], então porque é que no CMR surgia como consignatário/destinatário a firma [SCom05...] sediada no ...?;
- Conforme nos foi referido por vários clientes da [SCom02...], a matéria-prima (lingotes de latão) proveniente da empresa espanhola [SCom03...] geralmente era de melhor qualidade do que a que era fornecida por empresas portuguesas. Mas, apesar disso, o preço a que a empresa espanhola vendia a matéria era inferior aos preços praticados por empresas nacionais. O fax emitido pela [SCom04...] relativo a uma consulta de preços por parte da [SCom01...], datado de 21/04/2004 possui uma anotação manual aposta por um funcionário da [SCom01...] que indica que o preço proposto por um fornecedor nacional, a firma "«OO»", é de 1.700/ton enquanto que o preço praticado pela [SCom03...] é de €1.595/ton (ver Anexo 2).
Não seria de estranhar que uma matéria prima de melhor qualidade em que, inclusivamente, os encargos de transporte e de seguro são superiores fosse oferecida a um preço mais baixo do que aquele que é praticado por firmas nacionais?
De estranhar é também o facto das notas de liquidação serem endereçadas à sede da [SCom02...], Av.ª ..., ..., ..., ..., à excepção da nota de liquidação referente ao pagamento da primeira factura, quando a morada constante das facturas emitidas pela [SCom02...] em nome da [SCom01...] indicam como sede da empresa a Rua ..., ...).
As situações aqui expostos, às quais acresce o facto de nunca ter sido estabelecido qualquer tipo de contacto entre a [SCom01...] e qualquer representante da [SCom02...], seriam indícios mais do que suficientes para concluir que a [SCom02...], na verdade, não possuía uma estrutura montada que lhe permitisse exercer uma actividade económica.
O disposto no n.º 1 do art.º 72º-A do Código do IVA, aditado pela Lei n.º 55-B/2004, de 30/12, prevê ainda que "nas transmissões de bens ou prestações de serviços realizadas ou declaradas com a intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto correspondente são também responsáveis solidários pelo pagamento do imposto os sujeitos passivos abrangidos pela alínea a) do n. 0 1 do art. 20 que tenham intervindo ou venham a intervir, em qualquer fase do circuito económico, em operações relacionadas com esses bens ou com esses serviços, desde que aqueles tivessem ou devessem ter conhecimento dessas circunstâncias. "
Por outro lado, põe-se também em causa a qualidade de sujeito passivo de IVA da [SCom02...] dado que uma das condições para ser considerado como tal, de acordo com a alínea a) do n.º 1 do art.º 2º do Código do IVA é o de exercer uma actividade económica, o que no caso em apreço não corresponde à realidade. A [SCom02...] não funcionava como armazém porque a mercadoria vinha directamente de Espanha e também não funcionava como apoio administrativo uma vez que os documentos com ela relacionados eram todos elaborados em Espanha e as diligências junto dos clientes eram efectuadas pela [SCom04...]. A [SCom02...] foi apenas constituída para emitir faturas e nelas liquidar imposto.
Assim, também está em causa o direito à dedução do imposto de acordo com o estipulado na alínea a) do n.º 1 do art.º 19.º do Código do IVA uma veza que só se pode deduzir o imposto deduzido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos.
Ficou claramente demonstrado que a [SCom02...] só tem facturas de aquisição da [SCom05...], mas também que esta nada lhe poderia ter vendido porque também só tem aquisições simuladas.
Apesar dos fundamentos apresentados nos parágrafos anteriores, por si só, sustentarem a não dedutibilidade do IVA constante das facturas emitidas pela [SCom02...] à [SCom01...], constatou-se ainda que todas as facturas, à excepção de uma, não cumprem todos os requisitos exigidos para considerar que o documento foi emitido em forma legal.
De acordo com o n.º 2 do art.º 19° do Código do IVA "só confere direito à dedução o imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal, ... ". Para ser considerada como tendo sido passada na forma legal uma factura deve conter os requisitos que se encontram elencados no n.º 5 do art. 35 do Código do IVA.
O requisito constante da sua alínea f), acrescida pelo DL n.º 256/2003 que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2004, refere que as facturas ou documentos equivalentes devem conter "a data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, em que os serviços foram realizados ou em que foram efectuados pagamentos anteriores à realização das operações, se essa data não coincidir com a da emissão da factura ".
Acontece que, pela análise dos elementos ao nosso dispor, nomeadamente a factura n.º 6 e Notas de Despacho emitidas pela [SCom02...] em que a [SCom01...] apõe carimbo com indicação da data de recepção dos bens, e que se juntam como Anexo 5, nenhuma das facturas, emitidas pela [SCom02...] à [SCom01...], relativas a bens que foram colocados à disposição do adquirente em data diferente da data de emissão cumpre este requisito.
De salientar ainda o facto de nenhum dos CMR (contrato de transporte internacional de mercadoria por via terrestre) que nos foram apresentados pela empresa, conter a assinatura da empresa expedidora dos bens, [SCom03...], apesar de ser uma das exigências de preenchimento do referido impresso.
Assim, face ao que foi referido ao longo deste relatório e mais concretamente no presente ponto efectuar-se-á a correcção ao IVA deduzido indevidamente pela [SCom01...] relativamente às aquisições efectuadas à firma [SCom02...] no decurso de 2004 e 2005 nos montantes que a seguir se discriminam, por exercício e período de imposto:

IVA deduzido2004
indevidamente
Abril2.692,15
Maio1.543,16
Setembro2.901,29
TOTAL7.136,60

As correções foram refletidas nos períodos em que foram contabilizadas, sendo que o imposto em falta nos cofres do Estado totaliza a importância de€7.136,60 em 2004.
(…)
IX – DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO
O sujeito passivo foi notificado, através do ofício n.º ...45 datado de 26/05/2008, para exercer querendo, no prazo de 15 dias, nos termos do artigo 60.º da LGT e 60.º do RCPIT, o direito de audição.
No dia 16 de junho foi rececionado nestes serviços o exercício desse direito, por escrito, que se junta ao presente relatório como Anexo 6 e que resumidamente refere o seguinte:
- a [SCom01...] é parte estranha às "facturas de carrossel" não encontrando, o sujeito passivo, justificação para o "enredo da Administração Tributária em redor das facturas (de pouca materialidade) em causa". Acrescenta ainda que "formalmente os documentos preenchem o aditado pela alínea f), do art. º 35.º n. º 5, do CIVA."
Perante os fundamentos apresentados, julga-se importante transcrever uma definição do que se entende por fraude carrossel transcrita do artigo publicado por António Carlos dos Santos, Professor Auxiliar Convidado do ISEG, na revista TOC n.º 71 de Fev/2006:
"A fraude carrossel é uma das formas de fraude mais perniciosas a que o IVA está exposto, em particular nas exportações ou nas transacções intracomunitárias de bens. Neste caso, ela traduz-se na existência de uma cadeia de "empresas" que, supostamente, realizam transacções entre si, dedicando-se uma à prática de operações disfarçadas de transmissões para o exterior. Dado beneficiar de uma isenção completa, esta empresa não liquida IVA nessas transmissões de bens, mas deduz o IVA suportado nas supostas aquisições de bens e ou serviços, podendo encontrar-se, ilegitimamente, em permanente situação de crédito de. imposto perante o Estado. A cadeia pode abranger vários sujeitos passivos com níveis de. envolvimento no esquema muito diversos, misturando empresas com verdadeira actividade económica, incluindo o puro desconhecimento da existência da fraude carrossel e empresas sem real actividade económica (meras fábricas de facturas falsas), que realizam operações fictícias. Conforme consta da definição, a cadeia pode abranger vários sujeitos passivos com níveis envolvimento no esquema muito diversos, misturando empresas com verdadeira actividade económica, incluindo o puro desconhecimento da existência da fraude carrossel ( como a [SCom01...]) e empresas sem real atividade económica (mera s fábricas de facturas falsas) que se realizam operações fictícias (como a [SCom02...]).
Quanto à "pouca materialidade" do valor em causa, que se cifra em €7.136,60, cumpre-nos apenas referir que se situa acima do limite mínimo previsto no n.º 5 do art.º 88º do Código do IVA que é de €24,94.
Relativamente à afirmação, feita pelo sujeito passivo, de que formalmente os documentos cumprem o aditado pela alínea f), do n.º 5 do art.º 35° do Código do IVA, importa referir que são as facturas ou documentos equivalentes que servem de suporte à dedução do IVA que deverão cumprir este requisito. Esta situação não consta de nenhuma das facturas emitidas pela [SCom02...] à [SCom01...].
Face ao exposto, serão de manter as correcções constantes do Projecto de Relatório pelo que se procederá, nesta data, à elaboração dos respectivos documentos de correcção e ao levantamento do auto de notícia pelas infracções cometidas.” – (Cfr. relatório final de inspeção e despacho, a fls. 13 a 25 do PAT em apenso);

5. Os aludidos relatório e despacho foram levados ao conhecimento da Impugnante através do ofício n.º ...42, de 26 de junho de 2008 da Direção de Finanças ..., por si rececionado no respetivo domicílio fiscal em 30 de junho de 2008 – (Cfr. ofício, registo CTT e aviso de receção assinado, a fls. 68 a 70 do PAT em apenso);

6. Na sequência da ação inspetiva referida em 1 foram emitidas em nome da Impugnante as seguintes liquidações adicionais e notas de cobrança/demonstrações de compensação:

[imagem que aqui se dá por reproduzida]


(Cfr. demonstração de acerto de contas, juntas pela Impugnante a fls. 30 a 35 dos autos);
Mais se provou que:

7. Foram emitidas pela [SCom02...] em nome da ora Impugnante as seguintes faturas:
N.º FaturaDataValor
609/03/047.289,50
2605/04/049.571,87
3028/04/049.665,03
11430/07/049.083,83
12010/09/049.087,39
(Cfr. faturas, a fls. 27 a 31 do PAT em apenso);

8. Dos documentos de transporte relativos às aquisições à [SCom02...] (CMR – contrato de transporte internacional de mercadoria por via terrestre) constava como remetente a empresa [SCom03...], S.L e como destinatária a empresa [SCom01...], S.A, sendo que, por vezes, surgia nessa qualidade a empresa [SCom05...], ainda que neste último caso, no campo destinado a “instruções do remetente” constasse a menção “Mercadoria Consignada à [SCom02...]” – (Cfr. documentos de transporte (CMR), a fls. 32, 33, 37, 38 e 40 do PAT em apenso);

9. A Impugnante recorria a agentes intermediários com quem negociava os preços, a qualidade e prazos de entrega dos produtos pretendidos, cabendo a tais agentes e não à Impugnante estabelecer os contactos com os fornecedores – (Cfr. prova testemunhal e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

10. A Impugnante optou por atuar no mercado através dos aludidos agentes intermediários, na medida em que os mesmos conseguiam obter condições mais vantajosas junto de fornecedores estrangeiros em comparação com os fornecedores nacionais (os quais não tinham muita capacidade de resposta) e, bem assim, porque apenas existiam dois trabalhadores no sector das compras, o que era insuficiente atento o volume de negócios elevado – (Cfr. depoimentos «PP» e «QQ» e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

11. Um dos agentes a quem a Impugnante recorria pelo menos há 10/15 anos era a [SCom04...], Lda. que selecionava os fornecedores consoante as necessidades e especificações técnicas dos produtos pretendidos pela Impugnante e que apresentava a esta última as diversas propostas – (Cfr. depoimentos «PP» e «QQ», relatório de inspeção e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

12. A [SCom04...] atuava junto da Impugnante por intermédio da Sr.ª «AA», a quem recorria em todas as negociações com fornecedores, nomeadamente com a [SCom02...] – (Cfr. depoimentos «PP» e «QQ» e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

13. Por indicação da Sr.ª «AA» as compras passaram a ser faturadas à [SCom02...] – (Cfr. depoimento «RR» e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

14. As mercadorias adquiridas pela Impugnante através da [SCom04...] à [SCom02...] em 2004 foram todas entregues – (Cfr. depoimento «PP», relatório de inspeção tributária e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

15. Quando a Impugnante rececionava as mercadorias estas eram verificadas nos armazéns (ordens de compra, nomeadamente se o produto respondia às especificações exigidas pela da empresa, o preço e o imposto) e posteriormente pelo setor das compras – (Cfr. – depoimentos «PP» e «QQ» e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

16. O transporte das mercadorias era responsabilidade do fornecedor – (Cfr. depoimento «PP» e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

17. Normalmente os CMR não acompanhavam as faturas, mas permaneciam junto do departamento de compras e do respetivo processo, sendo que as faturas da [SCom02...] encontravam-se junto da contabilidade - (Cfr. depoimento da testemunha «QQ» e artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do CPC);

18. A presente impugnação foi remetida ao presente Tribunal através de carta registada no dia 10 de novembro de 2008 – (Cfr. vinheta de registo, a fls. 29 dos autos).

Factos não provados

1. A Impugnante procedeu ao pagamento do IVA e respetivos juros, resultantes das liquidações aludida no ponto 6 dos factos provados - (falta de suporte documental).

Motivação da matéria de facto
A decisão da matéria de facto teve por base a posição das partes, os documentos juntos, o teor do processo administrativo instrutor em apenso e a prova testemunhal produzida, conforme referido em cada um dos pontos do probatório.

Quanto aos pontos 9 a 12 e 14 a 17 dos factos provados, o Tribunal considerou os depoimentos das testemunhas «PP», programador de faturas da ora Impugnante, concretamente exercendo funções nos aprovisionamentos até há cerca de 7 anos (em que geria stocks e realizava compra de mercadorias, mormente matérias primas e componentes), encontrando-se à data da inquirição a exercer funções nos armazéns e «QQ», Economista e responsável pela contabilidade da [SCom01...] há cerca de 20 anos. Os seus depoimentos manifestaram-se espontâneos, escorreitos e coerentes entre si, denotando conhecimento direto dos factos sobre os quais foram inquiridos. Explicaram, essencialmente qual o procedimento adotado pela Impugnante nas respetivas compras, através do recurso a agentes intermediários, referindo que sempre pensaram que os produtos não fossem produzidos pela [SCom02...] e nunca desconfiaram de nada, pois existia uma relação de confiança com a [SCom04...]/D. «AA» com quem trabalhavam há cerca de 10/15 anos.
Quanto ao ponto 13 dos factos provados, o Tribunal considerou o depoimento da testemunha «RR», inspetora tributária que elaborou o relatório de inspeção tributária que despoletou as liquidações oram em crise, tendo denotado conhecimento direto dos factos. Quanto aos demais factos, considerou-se pouco relevante o seu depoimento, na medida em que reproduziu essencialmente o já constante do referido relatório junto aos autos.(…)”
**
Questão Prévia

A Recorrente juntou com as alegações os documentos A e B - certidão permanente da sociedade [SCom04...], Lda. e Anexo P- Mapa Recapitulativo de Fornecedores, desde o ano de 1999 a 2013, alegando que a informação neles constante, ter assumido relevância após o depoimento da testemunhas revelando-se absolutamente necessária, nos termos do nº 1 do artigo 651.º do Código do Processo Civil, face a importância atribuída pelo Tribunal com a intervenção de [SCom04...] em todo o processo negocial, como elemento preponderante para a justificação do surgimento do emitente [SCom02...].
Face à referida junção de documentos com as alegações de recurso, importa apreciar a sua admissibilidade nos autos.
Como é sabido, no direito português vigora o modelo de apelação restrita, de acordo com o qual o recurso não visa o reexame, sem limites, mas somente a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal a quo quando proferiu a sentença.
Os recursos visam a impugnação de decisões judiciais proferidas e não se destinam a julgar questões novas, daí que não se pode alegar matéria nova nos Tribunais Superiores, na fase de recurso, sem olvidar as questões de conhecimento oficioso.
Porém a lei, prevê exceções, no n.º 1, do artigo 651.º do Código de Processo Civil (CPC), “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações de excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª Instância.”
O advérbio “apenas”, usado no artigo 651.º, n.º 1, do CPC, significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1.ª Instância, isto é, se a decisão da 1.ª Instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento.
O legislador quis, manifestamente, cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objeto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes da decisão da 1.ª Instância ser proferida (cfr. Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.533 e 534).
Ora, lidas as alegações e conclusões de recurso, parece-nos claro que a Recorrente procede à junção dos documentos, nesta fase, por considerar que a mesma apenas se tornou necessária em resultado do julgamento em 1.ª Instância, “face à importância atribuída pelo douto Tribunal a quo a intervenção da [SCom04...] em todo o processo negocial, como elemento preponderante para a justificação do surgimento da emitente [SCom02...].
A Recorrente, nas motivações das alegações, justifica a junção dos documentos para demonstrar que o tribunal recorrido laborou em erro de julgamento ao ter considerado credíveis as testemunhas da Impugnante e também ter errado ao ter tomado em consideração parte do discurso testemunhal e desprezado o restante sem esclarecer a fundamentadamente esta opção.
Tal situação não justifica a junção dos documentos, como infra se verá, no que concerne à impugnação da matéria de facto, pois não existe necessidade de recorrer a esses documentos para eventual alteração, nem mesmo a Recorrente indica factos no seu entender, seriam necessários aditar, com base nesses documentos.
Nesta conformidade, tendo em conta o disposto no artigo 651.º, n.º 1 do CPC, os documentos junto com as alegações de recurso não se mostram relevantes, nem necessários em virtude do julgamento proferido em primeira instância pelo que se indefere a sua junção, devendo ser desentranhados e devolvidos à apresentante.

**
Apreciação do recurso.

Nas conclusões III a XXIX a Recorrente imputa à sentença recorrida erro de julgamento da matéria de facto, nomeadamente dos factos 9, 11, 12, 13 e 14 e pugna pelo aditamento os factos provados os pontos referidos no item 31.1 da motivação das alegações de recurso.
Analisando:
Por força do disposto no n.º 1 do artigo 627.º do CPC que “As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos”.
O recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal superior é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos.
Quer a alteração da matéria de facto ou errada apreciação e valoração da prova, pressupõe o erro do julgamento de facto, o qual ocorre quando, da confrontação dos meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o julgamento efetuado é desconforme com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.
O artigo 607.º, n.º 5 do CPC, ao consagrar o princípio da livre apreciação da prova estabelece como princípio orientador que o julgador não se encontra sujeito às regras rígidas da prova.
No entanto, a atividade de valoração da prova não é arbitrária, estando vinculada à busca da verdade e limitada pelas regras da experiência comum e pelas restrições legais.
Com efeito, o princípio da livre apreciação da prova concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração da prova produzida que deverá encontrar justificação na fundamentação lógica e racional, na sentença permitindo seu escrutínio quer pelas partes quer pelo tribunal de recurso.
Segundo este princípio, e por força do n.º 5 do artigo 607.º, do CPC o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas.
Por força do referido princípio, as provas são apreciadas livremente, de acordo com a convicção que geram no julgador acerca da existência de cada facto, ficando afastadas as situações de prova legal que se verifiquem, por força do disposto nos artigos 350.º, n.º 1, 358.º, 371.º e 376.º, todos do Código Civil, nomeadamente, da prova por confissão, por documentos autênticos, por certos documentos particulares quanto à materialidade das suas declarações e por presunções legais.
Por isso se entende que o princípio da livre apreciação da prova e o princípio da imediação de algum modo limitam o reexame da matéria de facto fixada no tribunal a quo, pelo que o controle do Tribunal de recurso deve restringir- -se aos casos de erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais apontarem inequivocamente em sentido diverso.
O erro deve ser demonstrado pelo Recorrente, delimitando o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera incorrer em erro e fundamentar as razões da sua discordância, especificando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes do processo que, no seu entender, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adotada pela decisão recorrida.
Por força do artigo 640.º, nºs 1 e 2 do CPC, para que o TCA possa proceder alteração da matéria de facto, devem ser indicados os pontos de facto considerados incorretamente julgados, indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
No caso, de se tratar de prova testemunhal, através da indicação exata das passagens da gravação bem como as concretas questões de facto controvertidas, com indicação, no seu entender, de qual a decisão alternativa deve ser proferida pelo tribunal de recurso, em sede de reapreciação dos meios de prova, relevantes, não sendo permitidos recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto.
Importa agora, verificar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento dos factos 9, 11, 12, 13 e 14 e se torna necessário aditar os factos constantes nos pontos referidos no item 31.1 da motivação das alegações de recurso.
Relativamente ao facto 9 alega que o Tribunal incorreu em erro de julgamento, por não ter considerado que a intervenção dos agentes intermediários se verificava em relação aos fornecedores estrangeiros, nomeadamente espanhóis; por ter extrapolado de um facto genérico determinados factos concretos.
E no seu entender, impunha-se a redação constante do ponto 26.2 da motivação, ou seja, o seguinte:
“9. A impugnante recorria a agentes intermediários quando pretendia adquirir produtos a fornecedores estrangeiros, nomeadamente espanhóis, negociando com agentes os preços e qualidade e prazos de entrega de produtos pretendidos, cabendo a tais agentes e não ao Impugnante estabelecer os contactos com os fornecedores- Cfr. Prova testemunhal «PP» e «QQ»).”
Da leitura conjunta dos factos n.ºs 9 e 10 já resulta o quadro que a Recorrente pretende, pelo que não há necessidade de alterar a redação do facto 9.
Quanto ao facto 11, alega que o Tribunal incorreu em erro de julgamento, por ter considerado que a impugnante recorria aos serviços da [SCom04...] há, pelo menos 10/15 anos e por ter extrapolado de um facto genérico determinados factos concretos.
E no seu entender, impunha-se a redação constante do ponto 27.3 da motivação, ou seja, o seguinte;
“11. Um dos agentes a quem impugnante recorria era [SCom04...] que, desde a data não apurada, mas nunca antes de 1999, selecionavam os fornecedores consoante as necessidades e as especificações técnicas dos produtos pretendidos pela impugnante e que apresentava a esta última as diversas propostas. (Cfr. depoimentos a prestados por «PP» e «QQ»)
Consta do probatório o facto 11 com a seguinte redação:
11. Um dos agentes a quem impugnante recorria, pelo menos há 10/15 anos era [SCom04...] Lda que selecionavam os fornecedores consoante as necessidades e as especificações técnicas dos produtos pretendidos pela impugnante e que apresentava a esta última as diversas propostas. (Cfr. depoimentos a prestados por «PP» e «QQ»).
Da análise dos depoimentos das duas testemunhas não é claro que se possa retirar com certeza que a Impugnante/Recorrida recorria, pelo menos à 10/15 anos aos serviços da sociedade [SCom04...] Lda, parecendo mesmo que os serviços eram prestados antes pela Sr.ª «AA», o que se mostra irrelevante sendo certo, que nos autos está em questão IVA do ano de 2004 e nesse ano a Impugnante recorreu ao serviços daquele agente, aliás facto que decorre do relatório de inspeção e não é controverso.
Nesta conformidade procede-se à alteração da redação do facto 11.º nos seguintes termos:
11. Um dos agentes a quem impugnante recorria era [SCom04...] que, desde a data não apurada, selecionavam os fornecedores consoante as necessidades e as especificações técnicas dos produtos pretendidos pela impugnante e que apresentava a esta última as diversas propostas. (Cfr. depoimentos a prestados por «PP» e «QQ» e Relatório de Inspeção).
No que concerne ao facto 12., alega que o Tribunal incorreu em erro de julgamento: por ter considerado que a impugnante recorria aos serviços da [SCom04...] e à intervenção da Sr.ª «AA» em todas as negociações com os fornecedores; por ter feito constar, na parte final da redação do facto 12., um juízo conclusivo, ao qual deveria ter chegado através da demonstração de outros factos, não se limitando a uma mera enunciação do mesmo.
E no seu entender, impunha-se a redação constante do ponto 28.3 da motivação.
Consta do facto 12. da matéria de facto que:12. A [SCom04...] atuava junto da impugnante por intermédio da S.ª «AA», a quem recorria em todas as negociações, com fornecedores, que eram por si intermediados, nomeadamente a [SCom02...] (Cfr. depoimentos a prestados por «PP» e «QQ»)
Com efeito o ponto n.º 12 é parcialmente conclusivo na medida em que, quando reporta “a todas as negociações” pelo que se procede a alteração da redação nos seguintes termos:
12. A [SCom04...] atuava junto da impugnante por intermédio da S.ª «AA», a quem recorria nas negociações, com fornecedores, que eram por si intermediados, nomeadamente a [SCom02...] (Cfr. depoimentos a prestados por «PP» e «QQ»)
Quanto ao facto 13., alega a Recorrente que o Tribunal incorreu em erro de julgamento por ter dado como assente que a IT apurou que a alteração do emitente das faturas se deu por indicação da responsável da [SCom04...] e não que se tratou de uma mera informação prestada pela [SCom01...].
E no seu entender, impunha-se a redação constante do ponto 29.2 da motivação, ou seja, o seguinte:
13. O decurso do procedimento inspetivo ou responsáveis da impugnante declararam aos serviços de inspeção tributária da direção das finanças de ... que, conforme indicação dada pela Senhora «AA», em data não apurada, as compras passariam a ser faturadas pela [SCom02...] (cfr. Depoimento «RR»).
Resulta do teor do relatório de inspeção secundado pelo depoimento da testemunha, os responsáveis da Impugnante/Recorrida declararam aos serviços de inspeção tributária por indicação dada pela Sr.ª «AA», em data não apurada, as compras passariam a ser faturadas pela [SCom02...].
Nesta conformidade procede-se à sua alteração nos termos propostos passando a ter a seguinte redação:
13. O decurso do procedimento inspetivo ou responsáveis da impugnante declararam aos serviços de inspeção tributária da direção das finanças de ... que, conforme indicação dada pela Senhora «AA», em data não apurada, as compras passariam a ser faturadas pela [SCom02...] (cfr. Depoimento «RR» e relatório de inspeção)
Quanto ao facto 14., a Recorrente alega que o Tribunal incorreu em erro de julgamento por se ter limitado a enunciar um juízo conclusivo, sem carrear para a fundamentação verdadeiros factos que lhe permitissem atingir aquela conclusão vertida em tal ponto do probatório.
E no seu entender, impunha-se a redação constante do ponto 30.2 da motivação, ou seja, o seguinte:
14. As mercadorias constantes das faturas emitidas em 2004 pela [SCom02...] a impugnante foram todas entregues (cfr. Depoimento «PP» e relatório de inspeção tributária.
Desde já se diga o que a Recorrente pretende aditar como factos provados não consubstancia factos, trata-se antes de conclusão e afirmações decorrente da interpretação de documento e do depoimento de «PP».
É jurisprudência assente que a matéria de facto deve versar somente sobre factos, reais objetivos, não deve conter conclusões, interpretações, análises de normas, cláusulas, acordos ou qualquer tema jurídico.
Tratando-se de um juízo conclusivo impõem-se a sua eliminação da matéria de facto provada.
Face ao exposto, elimina-se o ponto 14 da matéria de facto.
A Recorrente alega ainda quanto à matéria de facto, que o Tribunal laborou igualmente em erro de julgamento ao não dar como provados determinados factos que, face à prova documental produzida nos autos, se impunha incluir na fundamentação, atenta a sua relevância para o apuramento da verdade material.
Assim, deveriam ter sido dados como provados os factos constantes do ponto 31.1 da motivação, ou seja, os seguintes:
19. No dia 21/04/2004 a [SCom04...] remeteu à impugnante uma mensagem via fax com o seguinte teor e com a anotação manuscrita “1,70 «OO»”:
“Subject: [SCom03...]
Em ref. À v/ consulta, temos o gosto de oferecer:
Lingote de Latão CVE – refinado
5000 kg – EUR 1.595/ton DDU v/ armazém
Despacho: próxima semana, se a encomenda for colocada de imediato
O preço estará sujeito a um desconto de 2% na data do pagamento.
NOTA: o material será facturado pela empresa Portuguesa [SCom02...], associada da [SCom03...]”
– (Cfr. documento de fls. 35 do PA)

20. No dia 15/07/2004 a [SCom04...] remeteu à impugnante uma mensagem via fax com o seguinte teor:
“Subject: [SCom03...]
Em ref. À v/ consulta, temos o gosto de oferecer:
Lingote de Latão CVE – refinado
5000 kg – EUR 1495/ton DDU v/ armazém
Despacho: Semana 30/04, em data a combinar com a [SCom01...]
O preço estará sujeito a um desconto de 2% na data do pagamento.
NOTA: o material será facturado pela empresa Portuguesa [SCom02...], associada da [SCom03...]”
– (Cfr. documento de fls. 36 do PA)

21. No dia 16/07/2004 a [SCom04...] remeteu à impugnante uma mensagem via fax com o seguinte teor:
“Subject: [SCom03...] / [SCom02...]
Junto enviamos cópia da confirmação da v/ encomenda, agradecemos que a assinem e a devolvam novamente por fax”
– (Cfr. documento de fls. 34 do PA)

22. No dia 16/07/2004 a [SCom03...] remeteu à [SCom04...] e esta, por sua vez, remeteu à impugnante uma mensagem via fax com, entre outros elementos, o seguinte teor:
“[SCom02...]
..., S.L.
RUA ...
1700 (sic) ... (PORTUGAL)
NIF ...
N.º ENCOMENDA: 39
EMPRESA: (ENDEREÇO)
[SCom01...]
– (Cfr. documento de fls. 39 do PA)

No que concerne ponto 19, com base em fls. 35 do PA apenso aos autos, não se pode dar como provado, pois no documento, consta na data “21/04/200” e do mesmo não se retira que se reporte o ano de 2004, nem existe outros documentos que se relacionem com o que está em causa nos presentes autos isto é, com as faturas números ..., ...6, ...0, ...14 e ...20.

No que tange ao ponto 20, procede-se ao aditamento de um facto que se atribuirá o n.º 19 e que passará a ter a seguinte redação:
19. Consta do anexo 2, ao Relatório documento 5/7 com data de 15/07/2004 emitido por [SCom04...], Lda, para a Impugnante, (de «AA» att. De D. «SS»), uma mensagem via fax com o seguinte teor:
“Subject: [SCom03...]
Em ref. À v/ consulta, temos o gosto de oferecer:
Lingote de Latão CVE – refinado
5000 kg – EUR 1495/ton DDU v/ armazém
Despacho: Semana 30/04, em data a combinar com a [SCom01...]
O preço estará sujeito a um desconto de 2% na data do pagamento.
NOTA: o material será facturado pela empresa Portuguesa [SCom02...], associada da [SCom03...]” (Cfr. documento de fls. 36 do PA)

No que tange ao ponto 21, procede-se ao aditamento de um facto que se atribuirá o n.º 20 e que passará a ter a seguinte redação:
20.Consta do anexo 2, ao Relatório documento 3/7 com data de 16/07/2004 emitido por [SCom04...], Lda, para a impugnante, (de «AA» att. De D. «SS»), uma mensagem via fax com o seguinte teor:
“Subject: [SCom03...] / [SCom02...]
Junto enviamos cópia da confirmação da v/ encomenda, agradecemos que a assinem e a devolvam novamente por fax” (Cfr. documento de fls. 34 do PA)

No que tange ao ponto 22, procede-se ao aditamento de um facto que se atribuirá o n.º 21 e que passará a ter a seguinte redação:
21. Consta do anexo 3, ao Relatório documento onde consta entre outros elementos, o seguinte teor o logotipo da [SCom02...]
..., S.L.
RUA ...
1700 (sic) ... (PORTUGAL)
NIF ...
N.º ENCOMENDA: 39
EMPRESA: (ENDEREÇO)
[SCom01...]
E ainda espaço reservado a:
CONFIRMAÇÃO DO CLIENTE que não se mostra preenchido
CONFIRMAÇÃO DO REPRESENTANTE onde encontra assinatura M.«AA»
CONFIRMAÇÃO DO [SCom02...] onde se encontra uma rubrica ilegível
– (Cfr. documento de fls. 39 do PA)

Em síntese, procedeu-se à alteração da redação dos factos 11, 12 e 13 eliminou-se o n.º 14 e foram ainda aditados os factos 19 a 21 à matéria de facto provada.
Uma última nota, para a questão de terem sido qualificados como factos complementares e concretizadores os factos 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16 e 17.
Decorre no artigo 5, nos. 1 e 2, alíneas a) e b), que às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas.
E que além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz:
- os factos instrumentais que resultem da instrução da causa (alínea a);
- os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciarem (alínea b)
.
Se atentarmos no teor dos factos somente consta a referência ao art.º 5.º n.º 2, alínea b) do CPC, sem contudo especificar e fundamentar a razão dessa alusão normativa.
No entanto, analisados os referidos factos, para além de resultarem da instrução da causa, nomeadamente do RIT, na sua maioria, face às circustâncias próprias do caso, não tem relevância juridica-fatual, pelo que a sua análise é inconsequente, e contraria os princípios da celeridade e da probição das diligências inutéis.
*
De seguida alega a Recorrente que o Tribunal considerou que “os indícios apresentados pela AT não são suficientes para afastar o direito à dedução da ora impugnante, nos termos do artigo 19.º, n.ºs 3 e 4 do CIVA”.
É contra esta posição que a Recorrente se insurge, por entender que o Tribunal a quo laborou em erro de julgamento no que respeita à motivação de direito da sentença.
A Recorrente insurge-se, por entender que o Tribunal a quo laborou em erro de julgamento no que respeita à motivação de direito da sentença, no que concerne ao conceito de simulação e a interposição de sujeitos, quanto à relação subjacente entre emitente e utilizador do requisito de dedutibilidade, e o conhecimento ou dever de conhecimento do utilizador.
Analisando.
No que concerne ao conceito fiscal de simulação alega que a sentença incorreu em erro de julgamento de direito, por entender aplicável, sem mais, o regime jurídico da simulação consagrado na lei civil e, consequentemente, trazer para o plano fiscal a figura da interposição real de pessoas, violando o disposto no artigo 19.º nos. 3 e 4 do Código do IVA e artigo 11.º n.º 2 da Lei Geral Tributária.
Com efeito tem a jurisprudência do STA, nomeadamente, no acórdão n.º 0591/15 de 17.02.2016, do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, entendido que:
“(…) I - Para que a AT, ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 19º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do CCivil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende.
III - Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.
Ao afastar-se desta interpretação a sentença recorrida incorre em erro de julgamento, no que respeita à motivação de direito que urge reparar.

Nas conclusões XLII a XLV a Recorrente alega que os SIT detetaram a existência de um esquema de fraude carrossel envolvendo várias empresas, entre as quais a [SCom02...] e a [SCom04...]. No entanto, o Tribunal entendeu inexistirem indícios “que permitam afirmar que a Impugnante tinha ou deveria ter conhecimento da existência de irregularidades ou de situações fraudulentas dos respetivos fornecedores e, bem assim, que existisse qualquer acordo simulatório entre a Impugnante, a [SCom02...] e a [SCom03...]”.
E que, tendo em conta os indícios apontados pelos SIT, entende que a sentença padece de erro de julgamento, de facto e de direito, por ter considerado que a AT não reuniu indícios suficientes que permitam afirmar que a Impugnante conhecia ou devia/podia ter conhecimento da existência de irregularidades ou de situações fraudulentas envolvendo as operações relativas às faturas emitidas pela [SCom02...], violando o disposto no n.º 1 do artigo 74.º e na alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º, ambos da LGT e os n.ºs 3 e 4 do artigo 19.º do Código do IVA.
Vejamos:
Antes de mais, importa verificar, o regime legal aplicável aos factos tributários, os quais se reportam ao ano de 2004.
De acordo com o artigo 19.º, n.º 3 do CIVA “não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente”.
O n.º 4 do artigo 19.º, do CIVA, na versão do Dec-Lei n.º 31/2001 de 8.2, tinha a seguinte redação:
“Não poderá igualmente deduzir-se o imposto que resulte de operações em que, com conhecimento do sujeito passivo, o transmitente dos bens ou prestador dos serviços, com a intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado, tenha declarado o exercício de uma atividade e não disponha de adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer”. (Destacado nosso)
Decorre da interpretação deste n.º 4 do art.º 19.º do CIVA, na versão do Dec-Lei n.º 31/2001 de 8.2, aplicável ao ano de 2004, é pressuposto da atuação da Administração Tributária a prova do conhecimento efetivo do sujeito passivo que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços tinha intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado e que não disponha de adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer.
Estão em questão as liquidações de IVA relativas aos anos de 2004 (faturas n.ºs 6, 26, 30, 114 e 120, emitidas em 09/03/2004, 05/04/2004, 28/04/2004, 30/07/2004 e 10/09/2004 no valor de € 37 561,02 s/IVA e IVA no valor de € 7 136,60, cujo emitente é a [SCom02...], Lda.
Dos factos retratados no Relatório, a Administração Tributária apurou a existência de um esquema fraudulento, vulgarmente designada por fraude em carrocel em que as operações em causa se inserem na criação de um circuito de sucessivas faturas, emitidas por várias sociedades que foram constituídas com a finalidade de não entregar o IVA liquidada nos cofres do Estado e de dar o direito à dedução de IVA a terceiros, IVA esse que nunca chegou a entrar nos cofres do Estado.
Apurou que no esquema a montante da Recorrida, encontravam-se várias empresas, entre elas, «[SCom06...]», «[SCom03...]», «[SCom08...] Unip. Lda.», que forneciam a «[SCom05...], Unip, Lda.» e esta tinha por clientes [SCom10...], «[SCom11...] [SCom02...], Lda.», e esta última, por sua vez, a outros operadores, entre eles a Recorrida.
Vejamos então se resulta da matéria de facto provada e do Relatório, que a Recorrida, em 2004, tinha conhecimento efetivo que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços tinha intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado e que não dispunha de adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer.
Compulsada a matéria de facto provada dela não resulta que a AT, sobre quem recai o ónus de prova por força do n.º 1 do art.º 74.º da LGT, que no ano de 2004, a Recorrida tinha ou devesse ter conhecimento que a [SCom02...] tinha intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado não dispunha de adequada estrutura empresarial suscetível de exercer a atividade declarada.
Ora, do coligido no RIT, no ponto III.1.1.4 Conclusão, cujo extrato consta do facto provado n.º 4 (sob o título 1.4. Conclusão referência que se encontra incorretamente feita), sustentado nas informações provenientes de inspeções tributárias a outros operadores económicos, e por outras Direções de Finanças (...) limita-se a fazer referências genéricas e deduções e interrogações generalistas e a verificação de irregularidades.
Os indícios que a Administração pretende fazer valer, tratam-se de alegações genéricas, sustentadas em raciocínios e suposições, sem serem suportadas em factos concretos e objetivos.
A Administração socorre-se de interrogações, as quais não contemplam obviamente factos, sendo meras conjeturas.
Tornava-se necessário que a Administração Fiscal tivesse reunido elementos que relacionassem a utilizadora das faturas com o esquema de fraude, ou seja, que tivesse reunido indícios de que a utilizadora das faturas, aqui Recorrida, participou ou que sabia ou devia saber que a emitente das faturas não era o verdadeiro fornecedor da mercadoria em apreço, salvaguardando-se a hipótese da utilizadora de faturas falsas não saber nem ter a possibilidade de saber da falsidade.
A AT, sustentada na informação do Direção de Finanças ..., conclui que há um circuito documental de operações económicas relacionadas com as aquisições à [SCom02...], e intervenientes a montante que estão ligadas a esquemas fraudulentos nomeadamente, «[SCom06...]», «[SCom03...]», «[SCom08...] Unip. Lda.» que forneciam a «[SCom05...], Unip., Lda.» e esta tinha por clientes [SCom10...], «[SCom11...] [SCom02...], Lda.», e esta última, por sua vez, a outros operadores, entre eles a Recorrida.
Resulta da matéria de facto provada que a Impugnante/Recorrida recorria agentes comerciais, entre as quais a «[SCom04...], Lda.», com a qual trabalhava em 2004 e que era esse agente que negociavam com os fornecedores, em que se destacava a Sr.ª «AA», em quem confiavam, apresentando posteriormente as propostas de cada um deles sem existir qualquer contacto direto com a Impugnante/Recorrente.
As negociações eram realizadas pela «[SCom04...], Lda.», que mediante as necessidades da Recorrida e a especificação dos produtos pretendidos selecionava os fornecedores que correspondessem a detalhes exigências, apresentando posteriormente as propostas existentes. (cfr. Factos 9 a 12)
Resulta provada ainda que as mercadorias foram entregues, sendo que aquando da sua receção eram conferidos nos próprios armazéns a ordem de compra nomeadamente se o produto responde às especificações exigidas da empresa e sempre foram emitidas e respetivas a faturas pela [SCom02...] referente às mercadorias.
Decorre ainda, do Relatório de Inspeção que a AT, ficou convencida pelos elementos constantes na contabilidade da Recorrente, nomeadamente os documentos de transportes e outra correspondência, que houve efetivamente a aquisição de mercadorias indicadas nas faturas emitidas pela [SCom02...] daí aceitar o custo para efeitos de IRC.
Em sede de recurso foi alterada a matéria de facto e aditados os factos 19 a 21 da matéria provada, no entanto, dela não pode retirar que se reportam às faturas n.º 6, 26, 114 e 120, pois não há qualquer correspondência nem a AT a faz.
Os factos constantes em 19 a 21, trata-se de correspondência/fax (2) trocada entre «[SCom04...], Lda.» («AA») e «[SCom01...]» («SS»), em 15/07/2004 e 16/07/2004 relativamente a um fornecimento em 30/04 (o que é controverso atendendo à data dos faxes) e ainda uma nota de encomenda com o n.º 39, onde consta entre outros elementos, o logotipo da [SCom02...], S.L.
RUA ...
1700 (sic) ... (PORTUGAL)
NIF ...
N.º ENCOMENDA: 39
EMPRESA: (ENDEREÇO)
[SCom01...]
E ainda espaço reservado a:
CONFIRMAÇÃO DO CLIENTE que não se mostra preenchido.
CONFIRMAÇÃO DO REPRESENTANTE onde encontra assinatura «AA»
CONFIRMAÇÃO DO [SCom02...] onde se encontra uma rubrica ilegível.
Estes documentos reportam se a uma única transação, (cujo número de fatura não foi identificado, mas que se supõe ser a 114) mas só por si não é suficiente para provar que a Recorrido tinha conhecimento, para além de no espaço reservado ao cliente não se encontrar assinado.
Nesse documento, consta ainda que “o material será faturado pela empresa Portuguesa [SCom02...], associada a [SCom03...]” do que não se pode concluir sem mais, que o material é fornecido [SCom03...].
Estes documentos, só por si desacompanhados, de outros elementos não são suscetíveis de provar que a Recorrida, a utilizadora das faturas, tinha conhecimento e que participou ou que sabia ou devia saber que a emitente das faturas não era o verdadeiro fornecedor da mercadoria em apreço.
Isto permite evidenciar que o RIT carecia de maior labor ao nível da análise da relação estabelecida entre a ora Recorrida e a empresa fornecedora o que a AT não logrou, sustentando-se em outros inspeções efetuadas pela Direção de Finanças ..., limitando-se pura e simplesmente a não aceitar as deduções por entender que a «[SCom01...]» nada adquiriu à «[SCom02...]».
Como é sabido no esquema de fraude em carrossel é seu apanágio a existência de empresas com verdadeira atividade económica desconhecendo que existe uma fraude em carrocel, pelo que se impunha maior cuidado.
Acresce ainda, que relativamente ao outro pressuposto exigido no n.º 4 do art.º 19.º do CIVA, que a emitente das faturas não dispunha de adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer atividade, a Administração limitou-se a referir no relatório queAs situações aqui expostas, às quais acresce o facto de nunca ter sido estabelecido qualquer tipo de contato entre a [SCom01...] e qualquer representante da [SCom02...], seriam indícios mais que suficientes para concluir que a [SCom02...], na verdade, não possuía uma estrutura montada que lhe permitisse exercer uma atividade económica.”
Também nesta parte, a AT limitou a tecer considerações genéricas retiradas dos relatórios a outras empresas e dos autos de declarações de empregada da «[SCom01...]», sem demonstrar que esta não tinha uma estrutura montada que lhe permitisse exercer uma atividade económica nem sequer é explicado que tipos de estrutura teria de ter para ser possível a desenvolvimento da atividade.
E também não credível afirmar que a «[SCom01...]» conhecia, pois se recorria a agentes intermediários, a quem pagava comissões pelos negócios, não é de estranhar que não conhecesse as referidas instalações.

Por fim, a Recorrente nas conclusões XXXIX a XLI alega que o Tribunal considerou que, para efeitos de IVA, não constitui requisito do direito à dedução que tenha sido o emitente da fatura a transmitir os bens ou a prestar os serviços, bastando-se a lei, nos termos do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, com a circunstância de ter sido o utilizador a adquirir esses bens ou serviços.
Incorreu o Tribunal em erro de julgamento de direito, violando o disposto nos artigos 19.º e 20.º do Código do IVA, dado que o facto de o bem/serviço não ter sido diretamente prestado/fornecido pela [SCom02...], mas sim pela [SCom03...], constitui um óbice ao exercício daquele direito, visto que se exige que quem emite a fatura corresponda a quem transmite os bens ou preste os serviços.
Analisando.
A aceitar-se que o ónus da Fazenda Pública se basta com a recolha de indícios ou suspeitas de falsidade relativamente aos emitentes das faturas levaria a que os utilizadores das faturas falsas, que não sabem que são falsas, não pudessem deduzir custos que efetivamente suportaram, sem que tivessem participado em qualquer esquema fraudulento.
Isto permite evidenciar que o RIT carecia de maior labor ao nível da análise da relação estabelecida entre a ora Recorrida e a empresa fornecedora o que a AT não logrou, sustentando-se em outras inspeções efetuadas ao pela Direção de Finanças ..., limitando-se pura e simplesmente a não aceitar as deduções por entender que a «[SCom01...]» nada adquiriu à «[SCom02...]”.
Como a sentença recorrida bem refere, a jurisprudência do TJUE vem afirmando que o direito à dedução de IVA apenas pode ser recusado depois de se apurar, através de elementos objetivos, que o sujeito passivo sabia ou podia saber que a operação em causa fazia parte de uma fraude cometida pelo vendedor (Cfr. processos apensos C-80/11 E C-142/11, de 21/06/2012 e 06/12/2012, respetivamente).
É jurisprudência uniforme e reiterada e espelhada no proc. C-285/11 – Bonik EOOD que: “(...) 37. Assim, compete às autoridades e aos órgãos jurisdicionais nacionais recusar o direito a dedução se se demonstrar, à luz de elementos objetivos, que este direito é invocado fraudulenta ou abusivamente (v. acórdãos, já referidos, Fini H, n.o 34; Kittel e Recolta Recycling, n.o 55; e Mahagében e Dávid, n.o 42).
38. É o que acontece quando o próprio sujeito passivo comete uma fraude fiscal. Com efeito, neste caso, os critérios objetivos nos quais se baseiam os conceitos de entregas de bens ou de prestações de serviços efetuadas por um sujeito passivo agindo nessa qualidade e de atividade económica não estão cumpridos (v. acórdãos, já referidos, Halifax e o., nºs 58 e 59, e Kittel e Recolta Recycling, n.o 53).
39. Do mesmo modo, um sujeito passivo que sabia ou deveria saber que, com a sua aquisição, participava numa operação que fazia parte de uma fraude ao IVA deve, para efeitos da Diretiva 2006/112, ser considerado participante nessa fraude, independentemente da questão de saber se retira ou não benefícios da revenda dos bens ou da utilização dos serviços no quadro das operações tributadas que efetuou a jusante (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Kittel e Recolta Recycling, n.o 56, e Mahagében e Dávid, n.º 46).
40. Daqui resulta que o direito a dedução só pode ser recusado a um sujeito passivo se, à luz de elementos objetivos, se demonstrar que este sujeito passivo, ao qual foram fornecidos os bens ou prestados os serviços que estão na base do direito a dedução, sabia ou deveria saber que, ao adquirir estes bens ou estes serviços, participava numa operação que fazia parte de uma fraude ao IVA cometida pelo fornecedor ou por outro operador a montante ou a jusante na cadeia destes fornecimentos ou destas prestações (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Kittel e Recolta Recycling, n.os 56 a 61, e Mahagében e Dávid, n.º 45)
41. Em contrapartida, não é compatível com o regime do direito a dedução previsto na referida diretiva recusar esse direito a um sujeito passivo que não sabia nem poderia saber que a operação em causa fazia parte de uma fraude cometida pelo fornecedor ou que outra operação incluída na cadeia de fornecimento, anterior ou posterior à realizada pelo referido sujeito passivo, era constitutiva de uma fraude ao IVA (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Optigen e o., n.os 52 e 55; Kittel e Recolta Recycling, n.os 45, 46 e 60; e Mahagében e Dávid, n.º 47).
42. Com efeito, a instituição de um sistema de responsabilidade objetiva ultrapassaria aquilo que é necessário para preservar os direitos da Administração Fiscal (v. acórdão Mahagében e Dávid, já referido, n.o 48).
43. Consequentemente, uma vez que a recusa do direito a dedução é uma exceção à aplicação do princípio fundamental que constitui este direito, incumbe às autoridades fiscais competentes fazer prova bastante dos elementos objetivos que permitam concluir que o sujeito passivo sabia ou deveria saber que a operação invocada para fundamentar o direito a dedução fazia parte de uma fraude cometida pelo fornecedor ou por outro operador interveniente a montante ou a jusante da cadeia de fornecimento (v. acórdão Mahagében e Dávid, já referido, n.º 49). (…)”
Analisada a sentença recorrida verifica-se que teve em consideração o quadro legal a aplicável à data dos factos e valorizou a prova na sua globalidade e não como refere a Recorrente segmentada e atomizada.
Nesta conformidade, não tendo Autoridade Tributária demonstrado os pressupostos da sua atuação, a sentença recorrida fez uma correta subsunção dos factos ao direito, ressalvado a motivação de direito da simulação, sem, contudo, incorrer em erro de julgamento, pelo que, improcede a pretensão da Recorrente.
*
Face ao exposto, o recurso não merece provimento.
*
No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
**
Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
Decorre da interpretação do n.º 4 do art.º 19.º do CIVA, na versão do Decreto-Lei n.º 31/2001 de 8 de fevereiro, aplicável ao ano de 2004, que é pressuposto da atuação da Administração Tributária a prova do conhecimento efetivo do sujeito passivo que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços tinha intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado e que não disponha de adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer.
*
*
Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Subsecção Tributária Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
*
*
Custas a cargo da Recorrente.
*
*
Porto, 12 de outubro de 2023.

Paulo Moura
Cristina Travassos Bento
José António Coelho