Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00933/18.8BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/27/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:ABONO FALHAS;
ABONO PARA FALHAS;
PERÍODO FÉRIAS OU FALTAS SERVIÇO;
Sumário:1 . Para que se possa concluir que um trabalhador titular da categoria de assistente técnico tem direito a auferir abono para falhas por exercer funções nas áreas de tesouraria ou cobrança há que atender à caracterização de funções do seu posto de trabalho de acordo com o mapa de pessoal.

2 . Assim, a representada pelo A. que detém a categoria de assistente técnico e que, entre outras funções, realiza a cobrança de taxas moderadoras, não tem direito a esse suplemento se não ocupa, no mapa de pessoal do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia / Espinho, E.P.E. um posto de trabalho nas áreas de tesouraria ou cobrança que envolvesse a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos.

3 . Constituindo o abono para falhas um suplemento remuneratório que visa cobrir riscos que o exercício das funções de manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos, envolve, a sua perceção terá de reportar-se aos dias em que o trabalhador está efetivamente a desempenhá-las.

4 . Assim, o abono para falhas deveria apenas ser processado reportando-se ao número de dias úteis de exercício efetivo de funções que o trabalhador presta mensalmente, deixando de ser devido em todas as situações em que o trabalhador não se encontre em exercício efetivo de funções, pelo que, estando o abono para falhas sujeito a um regime especial, só sendo devido quando haja serviço efetivo, não há lugar à sua percepção nas ausências equiparadas a serviço efetivo, designadamente, por motivo de férias.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
I
RELATÓRIO
1. O Centro Hospitalar ... / ..., E.P.E., inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto, datada de 09 de Novembro de 2020, que, julgando procedente a Acção Administrativa instaurada pelo SINDICATO dos TRABALHADORES da FUNÇÃO PÚBLICA do NORTE, com sede na Rua ..., ..., ..., em representação das suas associadas AA e BB --- na qual peticionavam o reconhecimento do direito ao abono de falhas e consequente pagamento desde 01 de Janeiro de 2007 até ao presente, acrescido de juros de mora, bem como o pagamento das custas e demais encargos do processo ---, condenou o Réu/Recorrente no reconhecimento e respetivo pagamento do direito ao suplemento remuneratório respeitante ao referido abono, desde 01/01/2009 a AA e, desde 01/01/2010, a BB e ainda no pagamento das custas processuais.
*
2. Nas suas Alegações, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:
“Vem o presente recurso interposto da sentença proferida no processo à margem identificado que decidiu:
“V - DECISÃO
Pelo exposto, nos termos e com os fundamentos acima expostos, julgo a presente ação procedente, não provada e, em consequência:
a) Condeno o Réu a reconhecer que as Representadas do Autor têm o direito à perceção do suplemento remuneratório respeitante ao abono para falhas desde a data de 01/01/2009, no caso de AA e desde 01/01/2010, no caso de BB; e
b) Condeno o Réu a proceder ao pagamento, a cada uma das associadas do Autor do suplemento remuneratório respeitante a abono para falhas desde 01/09/2009, a AA e desde 01/01/2010, a BB, em consonância com a tabela estipulada no artigo 9.º da Portaria n.º 1553-C/2008, de 31 de dezembro.
Custas pelo Réu, nos termos do art.º 527.º, nº 1 do CPC e artigo 26.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, e artigo 189.º do CPTA.”
I- Salvo o devido respeito, a sentença recorrida não se pronuncia sobre questões que devia ter apreciado, em violação no disposto no artigo 615º, nº 1 alínea d), ex vi” do art. 1º. do CPTA conduzindo à nulidade da mesma.
II- A sentença recorrida, faz uma Errónea interpretação da aplicação do direito aos factos, em violação do disposto no artigo no art.º 2.º-1 do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06-01, do Despacho n.º 15409/2009, de 08-07 (º 1); artigo 159º nº 3 alínea b) da Lei 35/2014 de 20.06
1º- Consta da sentença recorrida:
O Tribunal “a quo” deu como PROVADOS os seguintes factos:
III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Com relevância para a decisão a proferir, estão provados os fados que, de seguida, se enumeram:
1) As representados do A. BB e AA, exercem funções nos serviços do Réu, com a categoria de Assistente Técnica em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado – cfr. doc. junto com o PA.
2) A representada do Autor, AA, no âmbito do exercício das suas funções junto do Réu, no período compreendido entre 01/01/2007 e 15/03/2018, procedeu à emissão de diversos recibos - cfr. fls. 9 verso a 15 e 35 dos autos.
3) A representada do Autor, BB, no âmbito do exercício das suas funções junto do Réu, no período compreendido entre 01/01/2010 e 26/03/2018, procedeu à emissão de diversos recibos - cfr. fls. 15 verso a 22 verso dos autos.
4) Em 11 de janeiro de 2018, representada do Autor BB, a exercer funções no Centro Ambulatório, Consulta Externa de ... do Réu, dirigiu a este requerimento pelo qual solicitou o pagamento de abono para falhas com efeitos retroativos – cfr. fls. 24 verso e 25 dos autos.
5) Em 23 de janeiro de 2018, representada do Autor AA, a exercer funções na Consulta Externa da Unidade 3 do Réu, dirigiu a este requerimento pelo qual solicitou o pagamento de abono para falhas com efeitos retroativos – cfr. fls. 23 verso a 24 dos autos.
Factos não provados:
Inexistem
2º- O TRIBUNAL “A QUO” FEZ A SEGUINTE ANÁLISE CRÍTICA DA PROVA
“IV-SEGMENTO FÁCTICO-JURÍDICO
Ora, a questão suscitada pelo A. reconduz-se, em suma, a saber se as suas associadas têm direito a receber abono para falhas, em virtude das concretas funções e tarefas que desempenham no exercício da sua atividade profissional.
Vejamos.
O horizonte em que se delineia a solução para o caso posto é constituído pelo preceituado no Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, na redação que lhe foi conferida peto Decreto-Lei n.º 276/98, de 11 de Setembro, e com as alterações introduzidas pelo Decreto Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro, bem como pelo disposto no art.º 112.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e ainda pelo que estipula o Despacho n.º 15409/2009, de 30 de Junho de 2009, publicado no Diário da República, 2ª série, n.º 130, de 8 de Julho de 2009.
Desta feita, o Decreto-Lei n.º 4/89 (já com as alterações introduzidas pelo citado Decreto Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro) dispõe, em termos de relevância para decidir o caso sujeito, o que se segue:
Artigo 2.º
1- Têm direito a um suplemento remuneratório designado ‘abono para falhas’ os trabalhadores que manuseiem ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis.
2-(...) 3- O direito a ‘abono para falhas’ pode ser reconhecido a mais de um trabalhador por cada órgão ou serviço, quando a actividade de manuseamento ou guarda referida no n.º 1 abranja diferentes postos de trabalho.
Importa referenciar que, o diploma legal em questão estende o regime legal instituído peio Decreto-Lei nº 4/89 aos trabalhadores que exercem funções públicas, independente mente da modalidade de constituição da relação jurídica de emprego público.
Por seu turno, a Lei nº 12-A/2008, que estabelece os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, consagrou a obrigação de proceder a revisão dos suplementos remuneratórios- como é o caso do abono para falhas no prazo de 180 dias, estabelecendo que, nas situações em que aquele suplemento for mantido, o mesmo continua a ser auferido pelos trabalhadores até ao fim da sua vida ativa na carreira ou na categoria por causa de cuja integração ou titularidade adquiriram o respetivo direito, devendo o montante de tal suplemento ser fixado por Portaria conjunta, nos termos do disposto nos artºs 1129 nº 4 e 68º do diploma em exame.
Derradeiramente, o Despacho n.º 15409/2009 veio, no seguimento do que dispõe o art.º 2º, nº 2 do Decreto-Lei nº 4/89 (com a redação que foi conferida peto Decreto-Lei n.º 276/98 e pela Lei n.º 64-A/2008), consignar o seguinte:
“(...)
1 - Têm direito ao suplemento designado «abono para falhas», regulado peto Decreto-Lei nº 4/89, de 6 de Janeiro, alterado peto Decreto-Lei nº 276/98, de 11 de Setembro, e pela Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro, os trabalhadores titulares da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico que ocupem postos de trabalho que, de acordo com a caracterização constante do mapa de pessoal, se reportem às áreas de tesouraria ou cobrança que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos.
2 – (...)
3 - O montante pecuniário do abono para falhas é o quo se encontra fixado na portaria a que se refere o n,º 2 do artigo 68º da Lei nº 12-A/2008. de 27 de fevereiro.
4 - Nos termos da nº 4 e 5 do artigo 73º da Lei nº 12-A/2008, o abono para falhas é apenas devido quando haja efetivo exercício de funções e enquanto perdurarem as condições que determinaram a sua atribuição.
5 - O reconhecimento do direito a abono para falhas a trabalhadores integrados noutras carreiras, ou titulares de outras categorias, efectua-se mediante despacho conjunto dos membros do Governo da tutela e das Finanças e da Administração Pública.
6 - O presente despacho produz efeitos a 1 de janeiro de 2008, relativamente aos trabalhadores que nessa data se encontrassem nas condições para o reconhecimento do direito ao abono para falhas”.
Em suma, o regime de atribuição e processamento do suplemento remuneratório, correntemente designado abono para falhas, consagra o seguinte:
Artigo 2.º-A
As propostas do reconhecimento do direito ao abono para falhas deverão ser sempre devidamente fundamentadas, designadamente por referência à ou às carreiras abrangidas, aos riscos efectivos e às responsabilidades que impendem sobre os funcionários ou agentes para os quais é solicitado o abono e aos montantes anuais movimentados.
Artigo 3.º
1 - Sempre que se verifique impedimento temporário dos titulares do direito ao abono para falhas, será o mesmo atribuído aos funcionários ou agentes que os substituam no exercício efectivo das suas funções.
2 - O processamento do abono aos substitutos será autorizado pelo director-geral ou equiparado do respectivo organismo.
Artigo 4.º
1 - O montante pecuniário do ‘abono para falhas’ é fixado na portaria referida no n.º 2 do artigo 68.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro.
2 - Os abonos para falhas que, à data da entrada em vigor do presente diploma, sejam de montante superior ao definido pelo modo descrito no número anterior só serão actualizados quando, por virtude de futuras alterações salariais e da aplicação da mesma regra, tal montante seja ultrapassado.
Artigo 5.º
1 - O abono para falhas é reversível diariamente a favor dos funcionários ou agentes que a ele tenham direito e distribuído na proporção do tempo de serviço prestado no exercício das funções. 2 - O valor diário do abono para falhas calcula-se por aplicação da fórmula (Abono para falhas x 12)/ (n x 52) em que n é igual ao número de dias de trabalho por semana.
3 - Em casos excecionais, a reversibilidade de área de abono para falhas pode ser fracionada a favor dos funcionários ou agentes que a ele tenham direito e distribuída na proporção do tempo de serviço prestado no exercício das funções.
O valor do abono para falhas encontra-se fixado pela Portaria nº 1553-C/2008, de 31 de Dezembro (que aprovou a tabela remuneratória única dos trabalhadores que exercem funções públicas, contendo o número de níveis remuneratórios e o montante pecuniário correspondente a cada um e atualizou os índices 100 de todas as escalas salariais), correspondendo ao montante de € 86,29, de acordo com o nº 99 desta Portaria.
2. O abono para falhas assume a natureza de suplemento remuneratório, de acordo com os artigos 1469 e 1599 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada em anexo à Lei nº 35/2014, de 20 de junho, (com a última redação dada pela Lei n.º 27/2017, de 30 de maio).
Têm direito a abono para falhas os trabalhadores que “manuseiam ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis” (artigo 2º, nº 1), podendo o direito ser reconhecido a mais de um trabalhador por órgão ou serviço (nº 3 do artigo 2º), mediante proposta fundamentada (artigo 29-A).
A finalidade do abono para falhas é a de indemnizar quem dele beneficie das despesas e riscos decorrentes do exercício de funções particularmente suscetíveis de gerar falhas contabilísticas em operações de recebimentos e pagamentos como as que se processam em serviços de tesouraria. Sublinhado nosso
Finalidade esta que não é contrariada pelo disposto no artigo 159º da LTFP, de onde se alcança que são condições mais exigentes de exercício de funções relativamente a outros postos de trabalho caracterizadas por idêntico cargo ou por idêntica carreira e categoria que estão na base da atribuição dos suplementos remuneratórios a certos trabalhadores.
No caso em apreço, o abono para falhas dos trabalhadores destina-se a compensar eventuais quebras de dinheiro ou valores que, por força das especificidades das suas funções, estão à sua guarda e são da sua responsabilidade. Enquanto exercerem essas funções específicas (quando as exerçam efetivamente), têm direito àquele suplemento, que visa fazer face a essas quebras, passíveis de ocorrer no exercício normal e voluntário dessas funções de risco acrescido.- Sublinhado nosso
Ao abrigo do nº 2 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 4/89, foi publicado o Despacho nº 15409/2009, do então Ministro de Estado e das Finanças, publicado no Diário da República, II Série, nº 130, de 8- 07-2009.
Visa este despacho, sobretudo, indicar quais as categorias que podem ter direito ao abono para falhas, aí se indicando os titulares da categoria de assistente técnico.
Sendo certo que devem verificar-se as demais condições exigidas, quanto ao conteúdo dos postos de trabalho ocupados.
No entanto, no nº 9 admite-se a possibilidade de a outros trabalhadores, integrados em quaisquer outras carreiras ou titulares de outras categorias, vir a ser atribuído abono para falhas, se tal for reconhecido, expressa e fundamentadamente, no caso, pelos órgãos autárquicos competentes, sem prejuízo, claro está, de cumulativamente se verificarem as demais condições legais exigidas.
Examinados os normativos acabados de espraiar, apresenta-se como lógico e razoável concluir que a lei faz depender a atribuição do suplemento remuneratório respeitante ao abono para falhas aos trabalhadores que exerçam funções em determinadas e efetivas condições. E constituem condições de concessão de tal abono, em primeiro lugar, a circunstância do trabalhador manusear ou ter à sua guarda valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsável, e desde que tal manuseamento ou guarda suceda no domínio de atividades reportadas a tesouraria ou que envolvam a realização de cobrança.
Em concomitância, é de salientar que o legislador permite que o suplemento em discussão seja atribuído a mais do que um trabalhador no mesmo órgão ou serviço, exigindo para tanto que o manuseamento e a guarda abranjam diferentes postos de trabalho.
Finalmente, e agora nos termos do estabelecido no n.º 1 do Despacho n.º 15409/2009, importa também que o trabalhador detenha a categoria de assistente técnico da mesma carreira.
Sendo assim, o reconhecimento do direito à perceção do abono para falhas não depende da integração do trabalhador no departamento de tesouraria de cada serviço ou órgão, em termos de mapa de pessoal. O que o legislador impõe é que o trabalhador exerça funções em áreas de tesouraria ou cobrança e não no serviço de tesouraria, isto é, desenvolva tarefas que respeitem a atividades de tesouraria ou que envolvam a cobrança de numerário, implicando, por isso, que o trabalhador tenha de lidar com tais valores, guardando-os, contabilizando-os e entregando-os no final do dia, prestando as inerentes contas sobre os valores cobrados, recebidos, pagos ou devolvidos, consoante o caso. E se assim sucede, não pode deixar de se concluir que o manuseamento ou guarda daqueles valores implica que o trabalhador assuma responsabilidade quanto aos mesmos, designadamente, quanto ao acerto contabilístico final.
De resto, a Jurisprudência tem vindo a trilhar interpretação similar à que vem de se expender, como bem ilustram os Acórdãos promanados pelo Venerando Tribunal Central Administrativo Norte em 17/03/2005 no processo nº 91/04 e em 29/09/2005 no processo nº 123/04.7BEPRT.
Revertendo ao caso versado, e nos moldes da factualidade que se encontra descrita nos pontos do probatório reunido, está demonstrado que as associadas do A. exercem funções que envolvem a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos.
Como vimos de referir, a atribuição do suplemento remuneratório pretendido não exige que o trabalhador esteja incluído, em termos de mapa de pessoal, no serviço de tesouraria, mas apenas que desenvolva atividade concreta de cobrança de valores, assumindo a correspetiva responsabilidade, e que o seu posto de trabalho descrito no mapa de pessoal pressupunha que realize e desenvolva tal atividade de cobrança.
E do probatório, pontos 1 a 3, resulta que as representadas do Autor e que exercem funções na Consulta Externa da Unidade 3 (AA) e no Centro Ambulatório, Consulta Externa de ... (BB). Resultam igualmente provado que procederam à emissão de recibos e de onde resulta que para a emissão de recibo ocorreu o correspondente pagamento recebido, tendo no período compreendido entre 01/01/2007 e 15/03/2018 (AA) e entre 01/01/2010 e 26/03/2018 (BB), procedido à cobrança e guarda de quantias respeitantes a quantias pagas pelos utentes dos respetivos serviços.
Assim, à luz da Jurisprudência expendida e das normas legais citadas, é forçoso concluir que as Representadas do Autor preenchem os requisitos elencados no Decreto Lei n.º 4/89 e no Despacho n.º 15409/2009 para atribuição do suplemento remuneratório de abono para falhas, destinado a cobrir riscos a que aquelas associadas estão sujeitas por o manuseamento das quantias em causa ser suscetível de gerar falhas contabilísticas.
E tendo as Representadas do Autor direito a receber o abono para falhas, incumbe ao Réu proceder ao pagamento às Autoras de tal suplemento, o que conduz à procedência do pedido formulado pelo Autor.
Assim, a pretensão de reconhecimento do direito à perceção do suplemento remuneratório respeitante ao abono para falhas desde a data de 01/01/2007, no caso da Representada do Autor AA e desde 01/01/2010, no caso da Representada do Autor BB.
Considerando que as atividades de cobrança, manuseio e guarda de numerário por parte das associadas do Autor já corre desde as mencionadas datas de 01/1/2007 e 01/01/2010, respetivamente, como resulta do probatório e dado que é esse o marco temporal inicial do exercício daquelas atividades que não é impugnado pelo Réu e considerando que o Despacho n.º 15409/2008, produz efeitos a 01 de janeiro de 2009, por força do seu ponto 6, segundo o qual: O presente despacho produz efeitos a 1 de Janeiro de 2009, relativamente aos trabalhadores que nessa data se encontrassem nas condições para o reconhecimento do direito ao abono para falhas, é forçoso concluir que o direito ao recebimento do abono para falhas por parte das Representadas do Autor, constitui-se em 01/01/2009, em relação à representada AA e em 01/01/2010, em relação à Representada BB e mantém-se enquanto as representadas do Autor se mantiverem no exercício das mesmas funções que envolvam atividades de cobrança, manuseio e guarda de numerário.
Pelo exposto, a pretensão de pagamento do abono em causa merece inteira procedência, devendo o Réu proceder ao pagamento, a cada uma das Representadas do Autor, do suplemento Remuneratório respeitante a abono para falhas desde 01/01/2009, relativamente a AA e desde 01/01/2010, relativamente a BB, em consonância com a tabela estipulada no artigo 9.º da Portaria n.º 1553-C/2008, de 31 de dezembro, publicada no Diário da República, 1ª série, de 31 de dezembro de 2008.”
3º- I-A sentença recorrida não se pronuncia sobre questões que devia ter apreciado, em violação no disposto no artigo 615º, nº 1 alínea d), conduzindo à nulidade.
4º- O Réu alegou de 20 a 21 e de 23 a 30 da sua contestação, factos sobre os quais o meritíssimo juiz “a quo” não se pronunciou, e que, a serem provados, como foram, consubstancia, no entender do recorrente, a ausência de pressupostos integrantes do direito de que as representadas do autor se arrogam - O direito ao abono para falhas.
5º- Ou seja, o Réu, ora recorrente, alegou, na sua contestação, nomeadamente, que:
“20. O abono para falhas, não é, de atribuição genérica a qualquer trabalhador que manuseia numerário, sendo certo que as RA, ao contrário do que alegam em 6. não exercem maioritariamente funções de manuseamento, recebimento de valores e/ou bens, títulos e documentos.
21. Aliás, a identificada AA, presta serviço na unidade 3 /..., que tem movimento de cobrança muitíssimo reduzido.
23. Conforme se retira do respetivo preâmbulo do Dec.Lei. nº 4/89, o “abono para falhas” visa compensar o risco adveniente do manuseamento de dinheiro e outros valores. O designado suplemento para falhas é um abono destinado a indemnizar funcionários e agentes pelas despesas e riscos inerentes ao exercício de funções que, pela sua particularidade, são suscetíveis de gerar falhas contabilísticas em operações de tesouraria.
24. No caso concreto da Ré, Centro Hospitalar .../..., E.P.E., o risco não existe, já que, quando se têm verificado falhas nos serviços de cobrança, SEMPRE o hospital assumiu esse prejuízo, e NUNCA foi exigido ao trabalhador, nem é, a reposição dos montantes em falta.
27. Enunciadas as circunstâncias de facto e de direito, que no entender do Réu, Centro Hospitalar, devem relevar para a boa decisão do caso concreto, importa reiterar que as RA não têm qualquer direito ao suplemento remuneratório que vêm peticionar.
29. Por outro lado, quando vêm peticionar o pagamento do suplemento de “abono para falhas” com efeitos desde 01 de Janeiro de 2007, não consideraram que, na eventualidade de lhes ser reconhecido tal direito, o que só por mero dever de patrocínio se admite, o mesmo é indevido, no período de férias e dias de ausência ao serviço.
30. A legislação vigente determina que o abono seja calculado em função dos dias de serviço prestado, conforme o previsto no artigo 5º do Decreto-Lei 4/89, de 6 de Janeiro.”
6º- Sobre nenhum destes alegados factos o meritíssimo Senhor Juiz “a quo” se pronunciou.
7º- Não obstante, o meritíssimo Juiz “a quo”, considera que inexistirem factos não provados.
8º- Donde, os factos alegados em 20 e 21, 24 e 29 da contestação do Réu, ora recorrente, foram dados como provados, ou seja, que:
-a) As representadas do autor, não exercem maioritariamente funções de manuseamento, recebimento de valores e/ou bens, títulos e documentos.
-b) Que, a identificada AA, presta serviço na unidade 3 /..., que tem movimento de cobrança muitíssimo reduzido.
-c) Que, no caso concreto do Réu, Centro Hospitalar .../..., E.P.E., o risco não existe, já que, quando se têm verificado falhas nos serviços de cobrança, SEMPRE o hospital assumiu esse prejuízo, e NUNCA foi exigido ao trabalhador, nem é, a reposição dos montantes em falta.
9º- No caso subjudice as representadas do requerido não eram responsáveis pelos valores que manuseavam, porquanto não lhe era exigida a reposição de valores em falha por contagem ou por quaisquer perdas.
10º- Em consequência não há risco para as representadas do autor, risco pelas falhas no manuseamento do dinheiro/valores que recebiam.
11º- Logo, face à prova feita, as representados do Recorrido, não detinham uma responsabilidade específica, por via das funções que desempenhavam, inerente à obrigação de responder por quantias em falta, por falhas que eventualmente cometessem na contagem ou no manuseamento dos valores que recebessem ou entregassem.
12º- Salvo melhor opinião em contrário, inexistindo o risco inerente ao manuseamento de dinheiro ou de outros valores, por o trabalhador não ser responsável por falhas na contagem ou por quaisquer perdas, inexiste também o direito a ser compensado a título de abono para falhas.
13º- Pelo que, entende o recorrente, que a tomada de posição sobre estas questões-sobre as quais o Senhor juiz “a quo” não se pronunciou – são de especial relevo, para aferir do preenchimento dos pressuposto da atribuição do abono para Falhas- e que, podem conduzir a decisão distinta da proferida.
14º- Assim sendo, como é, afigura-se que o meritíssimo juiz “a quo”, cometeu omissão de pronuncia, determinantes para a boa decisão do mérito da causa e justa composição do litígio, designadamente, as questões supra elencadas, tal como adiante melhor se explanará.
15º- A sentença recorrida é nula, por não se pronunciar sobre questões alegadas nos autos pelo recorrente, que devia ter apreciado, em violação no disposto no artigo 615º , nº 1 alínea d) do CPC, o que desde já se invoca e requer.
II- Errónea interpretação da aplicação do direito aos factos, em violação do disposto no artigo no art.º 2.º-1 do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06-01, do Despacho n.º 15409/2009, de 08-07; artigo 159º nº 3 alínea b) da Lei 35/2014 de 20.06
16º- Conforme supra se explanou, a sentença recorrida, dá como provado que:
-a) As indicadas funções de manuseamento ou de guarda de valores ou de numerário não estão descritas no mapa de pessoal para a sua categoria.
-b) Os Mapas de pessoal do Réu, Centro Hospitalar .../..., E.P.E., não contêm a caracterização do posto de trabalho das representadas do autor.
-c) As representadas do autor, não exercem maioritariamente funções de manuseamento, recebimento de valores e/ou bens, títulos e documentos.
-d) O Centro Hospitalar, aqui Réu, não tem previsão orçamental para o pagamento do “abono para falhas”, às trabalhadoras em questão.
-e) A identificada AA, presta serviço na unidade 3 /..., que tem movimento de cobrança muitíssimo reduzido.
-f) No caso concreto do Réu, Centro Hospitalar .../..., E.P.E., quando se têm verificado falhas nos serviços de cobrança, SEMPRE o hospital assumiu esse prejuízo, e NUNCA foi exigido ao trabalhador, nem é, a reposição dos montantes em falta.
17º- Têm direito ao suplemento designado “abono para falhas”, regulado pelo Decreto-Lei 4/89, de 6 de Janeiro, alterado pelo Decreto-Lei 276/98, de 11 de Setembro, e pela Lei 64 -A/ 2008, de 31 de Dezembro os trabalhadores titulares da categoria de assistente técnico de carreira geral de assistente técnico, que ocupem postos de trabalho que, de acordo com a caraterização do mapa do pessoal, se reportem às áreas da tesouraria ou cobrança, que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos.
18º- O Ministro do Estado e das Finanças clarificou esta última alteração, através do Despacho n.º 15409/2009, afirmando que “têm direito ao suplemento designado «abono para falhas» (...), os trabalhadores titulares da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico que ocupem postos de trabalho que, de acordo com a caracterização constante do mapa de pessoal, se reportem às áreas de tesouraria ou cobrança que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos”.
19º- E “o reconhecimento do direito a abono para falhas a trabalhadores integrados noutras carreiras, ou titulares de outras categorias, efetua-se mediante despacho conjunto dos membros do Governo da tutela e das Finanças e da Administração Pública.
20º- Sendo tal caracterização relevante, havendo de identificar os trabalhadores detentores da categoria de assistente técnico em serviço nos postos de cobrança, com eventual direito ao suplemento “abono para falhas”, uma vez que este direito não é de aferição automática nem é de atribuição genérica.
21º- As Representadas do Autor não reúnem as condições de atribuição do completo “abono para falhas”, devido ao facto de os postos de trabalho não estarem caracterizados nos mapas, de forma a identificar a atividade, e a quem pertence a responsabilidade pelo manuseamento e guarda de dinheiros públicos.
22º- Determina o art.º 2.º, n.ºs 1 a 3, do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06-01, na versão dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31-12, o seguinte: “1 - Têm direito a um suplemento remuneratório designado ‘abono para falhas’ os trabalhadores que manuseiem ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis.
2 - As carreiras e ou categorias, bem como os trabalhadores que, em cada departamento ministerial, têm direito a ‘abono para falhas’, são determinadas por despacho conjunto do respetivo membro do Governo e dos responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública.
23º- Na Lei n.º 35/2014, de 20-06, vêm-se depois a estipular o seguinte:
“Artigo 159.º
Condições de atribuição dos suplementos remuneratórios
1 - São suplementos remuneratórios os acréscimos remuneratórios devidos pelo exercício de funções em postos de trabalho que apresentam condições mais exigentes relativamente a outros postos de trabalho caracterizados por idêntico cargo ou por idênticas carreira e categoria.
2 - Os suplementos remuneratórios estão referenciados ao exercício de funções nos postos de trabalho referidos na primeira parte do número anterior, sendo apenas devidos a quem os ocupe.
3 - São devidos suplementos remuneratórios quando trabalhadores, em postos de trabalho determinados nos termos do n.º 1, sofram, no exercício das suas funções, condições de trabalho mais exigentes:
(...)
b) De forma permanente, designadamente as decorrentes de prestação de trabalho arriscado, penoso ou insalubre, por turnos, em zonas periféricas, com isenção de horário e de secretariado de direção.
4 - Os suplementos remuneratórios são apenas devidos enquanto perdurem as condições de trabalho que determinaram a sua atribuição e haja exercício de funções efetivo ou como tal considerado em lei.
5 - Os suplementos remuneratórios devem ser fixados em montantes pecuniários e só excecionalmente podem ser fixados em percentagem da remuneração base mensal.
6 - Os suplementos remuneratórios são criados por lei, podendo ser regulamentados por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.”
24º- Com este enquadramento legal, por Despacho n.º 15409/2009, de 30-06-2009, publicado no DR II série, n.º 130, de 08-07-2009, determinou-se que “1 - Têm direito ao suplemento designado «abono para falhas», regulado pelo Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11 de Setembro, e pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, os trabalhadores titulares da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico que ocupem postos de trabalho que, de acordo com a caracterização constante do mapa de pessoal, se reportem às áreas de tesouraria ou cobrança que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos.
3 - O montante pecuniário do abono para falhas é o que se encontra fixado na portaria a que se refere o n.º 2 do artigo 68.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
4 - Nos termos dos n.os 4 e 5 do artigo 73.º da Lei n.º 12-A/2008, o abono para falhas é apenas devido quando haja efectivo exercício de funções e enquanto perdurarem as condições que determinaram a sua atribuição.
25º- Ora, da leitura conjugada das indicadas normas, facilmente se conclui que a atribuição do abono para falhas alicerça a sua razão de ser nas especificidades da prestação de trabalho de quem sofre o risco de erros e perdas quando manuseia dinheiro ou outros valores, relativamente aos quais é responsável perante o empregador.
26º- Assim, a jurisprudência e doutrina, de forma pacífica, vêm indicando este suplemento remuneratório como um suplemento que se destina a compensar dos riscos decorrentes do manuseamento de dinheiro e outros valores – cf. neste sentido, entre outros, os Acs. do STA n.º 05184/00, de 22-04-2004, n.º 45.875, de 03-04-2001 ou do TCAN n.º 02018/10.6BEPRT, de 08-02-2013, n.º 02456/15.8BEPRT, de 16-02-2018 ou n.º 00928/14.0BEPRT, de 26-10-2018. Na doutrina vide, MOURA, Paulo Veiga e – Função Pública, Regime Jurídico, Direitos e Deveres dos Funcionários e Agentes. 1.º v., 2.ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2001, pp. 345 e ss. ou ALFAIA, João – Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público. II vol. Coimbra: Almedina, 1988, pp. 872-873.
27º- No Ac. do STA n.º 45.875, de 03-04-2001, afirma-se: “o abono para falhas têm carácter tendencialmente objectivo, isto é não dependente de elementos subjectivantes da remuneração do interessado, mas do risco da movimentação de valores e condições de especificidade em que é prestado determinado trabalho.
Idealmente, o abono para falhas deveria ser função do montante dos valores movimentados, sua natureza e espécie e das condições de exercício quanto à probabilidade de cometer erros...”.
Também para Paulo Veiga e Moura “o suplemento para falhas é um abono destinado a indemnizar funcionários e agentes pelas despesas e riscos inerentes ao exercício de funções que, pela sua particularidade, são susceptíveis de gerar falhas contabilísticas em operações de tesouraria.
(...) Têm direito a ser abonados com este suplemento todos aqueles que, estando ou não integrados na carreira de tesoureiro, manuseiem ou tenham à sua guarda, não áreas de tesouraria ou de cobrança, quaisquer valores, numerário, títulos ou documentos pelos quais sejam responsáveis” (in do Autor, Função..., op. cit., pp. 345- 346).
28º- Pelo exposto, há que concluir que inexistindo o risco inerente ao manuseamento de dinheiro ou de outros valores, por o trabalhador não ser responsável por falhas na contagem ou por quaisquer perdas, inexiste também o direito a ser compensado a título de abono para falhas. Nessa mesma lógica, a mera integração de um trabalhador numa categoria cujo conteúdo funcional inclui a possibilidade do exercício de funções que implicam o manuseamento de dinheiro, não é, por si só, condição bastante para que o referido trabalhador tenha o direito a auferir o abono para falhas.
29º- Diferentemente, tal direito dependerá do exercício efectivo de funções de manuseamento de dinheiro ou de guarda de valores e da responsabilidade do trabalhador pelo referido manuseamento ou guarda, visando compensar o risco inerente a quaisquer perdas e despesas por que fique responsável frente à sua entidade patronal.
30º-Nestes termos, para um trabalhador tenha direito a auferir abono para falhas:
(i) terá de manusear ou ter à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, assumindo o risco e a responsabilidade de tal tarefa;
(ii) sendo um trabalhador da administração central, terá de ser titular da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico e terá de ocupar posto de trabalho que se reporte às áreas de tesouraria ou cobrança; .......... Relativamente a trabalhadores integrados noutras carreiras, ou titulares de outras categorias, o reconhecimento do direito a abono para falhas a trabalhadores, efectua-se mediante despacho conjunto dos membros do Governo da tutela e das Finanças e da Administração Pública;
(iii) terão as indicadas funções de manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos de estar descritas no mapa de pessoal.
31º- Ora, no caso dos autos, tal como decorre da factualidade provada (e não impugnada), as representadas do Recorrido não preenchem as supra indicadas condições- e são cumulativas-para poderem arrogar-se ao direito a auferir o suplemento de abono para falhas.
32º- Ficou provado nos autos, que não era imputável pelo Réu, aqui recorrente, às representadas do Recorrido, o risco pelas falhas no manuseamento do dinheiro/valores/títulos que receberam.
33º- Logo, face à prova que vem feita, as representadas do Recorrido não detinham uma responsabilidade específica, por via das funções que desempenhavam, inerente à obrigação de responder por quantias em falta, por falhas que cometesse na contagem ou no manuseamento dos valores que receberam ou entregaram.
34º- Neste sentido, o Acórdão do TCAS-processo 533/16.7BELLE de 04/07/2019, supra transcrito, para onde expressamente se remete.
35º- Conforme provado, as representadas do autor, não exercem maioritariamente funções de manuseamento, recebimento de valores e/ou bens, títulos e documentos.
36º- Ou seja, não exercem predominantemente o exercício de funções que implicam o manuseamento de dinheiro, e ou valores. É incontornável o facto do abono por falhas ter carater excecional e pressupor uma atividade funcional predominante relacionada com o manuseamento de dinheiro.
37º- Assim, há errónea interpretação da aplicação do direito aos factos, em violação do disposto no artigo no art.º 2.º-1 do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06-01, do Despacho n.º 15409/2009, de 08-07; artigo 159º nº 3 alínea b) da Lei 35/2014 de 20.06, porquanto: a) As indicadas funções de manuseamento ou de guarda de valores ou de numerário não estão descritas no mapa de pessoal para a sua categoria.
-b) Os Mapas de pessoal do Réu, Centro Hospitalar .../..., E.P.E., não contêm a caracterização do posto de trabalho das representadas do autor.
-c) O Centro Hospitalar, aqui Réu, não tem previsão orçamental para o pagamento do “abono para falhas”, às trabalhadoras em questão.
-d) Inexiste o risco inerente ao manuseamento de dinheiro ou de outros valores, e as trabalhadoras não exercem predominantemente funções que implicam o manuseamento de dinheiro, e ou valores.
Assim a douta sentença recorrida, data vénia,
- É nula, por não se pronunciar sobre questões alegadas nos autos pelo recorrente, que devia ter apreciado, em violação no disposto no artigo 615º, nº 1 alínea d) do CPC conforme supra se alega, e o que desde já se invoca e requer.
- A sentença recorrida fez uma errónea interpretação da aplicação do direito aos factos, por violação do disposto no artigo no art.º 2.º-1 do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06-01, do Despacho n.º 15409/2009, de 08-07 (º 1); artigo 159º nº 3 alínea b) da Lei 35/2014 de 20.06 devendo ser revogada, não sendo reconhecida às representadas do Autor, o peticionado Direito ao Abono para Falhas, e em negado o Direito ao pagamento dos montantes peticionados a esse título, o que desde já se requer.
Termos em que deve o Recurso merecer provimento, nos termos supra peticionados,
V. Exas. farão contudo JUSTIÇA!”
*
3. O R./Recorrido, Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública do Norte, apresentou Contra-alegações, que concluiu do seguinte modo:
1. Efectivamente a douta sentença recorrida contempla uma solução legal, justa e completa do litígio, nomeadamente, no que respeita à subsunção do direito aplicável ao caso concreto.
2. Por outro lado, quer em termos materiais, quer em termos formais, o Recorrente nada alega de novo, que o Tribunal a quo não se tivesse pronunciado.
3. Acrescendo ainda que o Recorrente não logrou demonstrar ter sido violada qualquer norma substantiva ou processual.
4. Ou pronunciado infundada e ilegalmente, já que, em boa verdade, não é concretizada qualquer irregularidade ao Aresto sub iudice.
5. Deste modo, salvo o devido respeito, o Aresto a quo não poderia ter decidido por diversa aplicação dos normativos em causa, sob pena de incorrer em vício de violação de Lei e da Constituição e, consequentemente, erro de julgamento.
6. A função do Tribunal a quo, de controlo judicial, foi bem exercida, plasmada na douta sentença recorrida.
7. O suplemento remuneratório denominado “abono para falhas”, criado pelo Decreto-lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, alterado pelo Decreto-lei n.º 276/98, de 11 de Setembro e pela Lei 64-A/2008, de 31 de Dezembro em complemento com o Despacho n.º 15409/2009, do Ministro de Estado e das Finanças, reconhece, inequivocamente, tal suplemento aos Trabalhadores sujeitos a esse risco ou falhas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, sem distinguir se são ou não trabalhadores da saúde, tal como o Recorrido interpreta.
8. E, com o devido respeito, as Representadas do Recorrido preenchem na íntegra todos os requisitos previstos na Lei para lhe ser abonado o aludido suplemento, pois, como oportunamente alegado e provado, as RR. são detentores da categoria de Assistente Técnica, e, maioritariamente, as funções que exercem envolvem manuseamento, recebimento, pagamento e ter a sua guarda e responsabilidade valores e/ou bens, títulos e documentos.
9. Destarte, é reconhecido às RR. o direito à perceção do aludido suplemento remuneratório, pelo que, entendimento diverso incorreria em vício de violação de Lei, designadamente, do Decreto-lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, alterado pelo Decreto-lei n.º 276/98, de 11 de Setembro e pela Lei 64-A/2008, de 31 de Dezembro em complemento com o Despacho n.º 15409/2009.
10. Bem como estaria em total contradição com Jurisprudência referente à mesma questão de facto e de direito (a titulo meramente exemplificativo: Acórdão do TAF Porto, in Proc.º n.º 3219/10.2BEPRT; Acórdão do STA, lavrado no Processo n.º 037119, da 2ª Secção do contencioso administrativo, de 12/11/1996, in, www.sta.mj.pt....).
11. Ofendendo, também, os princípios que norteiam a atividade administrativa, especialmente, o princípio da legalidade, da justiça, da boa-fé e da decisão consagrados, respetivamente, nos Arts. 3º, 6º, 6º-A e 9º todos do CPA.
12. O que não pode ser consentido num Estado de Direito (Art. 2º CRP).
13. Não está em causa uma questão jurídica complexa, porquanto, a apreciação da existência do direito à perceção do aludido suplemento remuneratório ou o preenchimento de pressupostos objetivos da concessão do mesmo não reveste qualquer complexidade jurídica, nem exige, para ser solucionada, difíceis operações exegéticas, ou sequer pressupõe um enquadramento jurídico especialmente intrincado ou a concatenação de diversos regimes legais ou institutos jurídicos.
14. Além de não decorrer da interposição do presente recurso, a possibilidade de melhor aplicação do direito, na medida em que o entendimento constante do Aresto recorrido se mostrar conforme o texto e a coerência interna das normas interpretandas, respeitar a natureza jurídica e a ratio daquele suplemento remuneratório, no quadro de estrita legalidade a que o disciplina dos requisitos / pressupostos objetivos exigíveis, a que o intérprete e aplicador da lei não se pode subtrair.
15. Como referido, o que o Recorrente manifesta, na verdade, em sede de recurso é a sua discordância com o entendimento e a solução jurídica propugnada na sentença a quo e, obviamente, com o próprio regime jurídico vigente.
16. Pelo que, e em face de todo o exposto a sentença ora recorrida fez uma correta interpretação e aplicação da Lei aos factos provados, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica, para as devidas e legais consequências”.
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4. O Digno Magistrado do M.º P.º neste TCA, notificado nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, não se pronunciou.
*
5. Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
*
6. Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts. 1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA de FACTO

São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida:
1) As representados do A. BB e AA, exercem funções nos serviços do Réu, com a categoria de Assistente Técnica em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado – cfr. doc. junto com o PA.
2) A representada do Autor, AA, no âmbito do exercício das suas funções junto do Réu, no período compreendido entre 01/01/2007 e 15/03/2018, procedeu à emissão de diversos recibos - cfr. fls. 9 verso a 15 e 35 dos autos.
3) A representada do Autor, BB, no âmbito do exercício das suas funções junto do Réu, no período compreendido entre 01/01/2010 e 26/03/2018, procedeu à emissão de diversos recibos - cfr. fls. 15 verso a 22 verso dos autos.
4) Em 11 de janeiro de 2018, representada do Autor BB, a exercer funções no Centro Ambulatório, Consulta Externa de ... do Réu, dirigiu a este requerimento pelo qual solicitou o pagamento de abono para falhas com efeitos retroativos – cfr. fls. 24 verso e 25 dos autos.
5) Em 23 de janeiro de 2018, representada do Autor AA, a exercer funções na Consulta Externa da Unidade 3 do Réu, dirigiu a este requerimento pelo qual solicitou o pagamento de abono para falhas com efeitos retroativos – cfr. fls. 23 verso a 24 dos autos.
*
Com interesse para a decisão a proferir no presente recurso jurisdicionalcfr. art.º 662.º, n.º1 do Cód. Proc. Civil, ex vi, art.º 140.º do CPTAcomo veremosimporta ainda e apenas ter em consideração a seguinte factualidade, que, independentemente da repercussão jurídica consequente, esta divergente, acolhe a concordância das partes:
6) Os Mapas de pessoal do Réu, Centro Hospitalar .../..., E.P.E., não contêm a caracterização do posto de trabalho das representadas do A./Recorrido, referentes ao manuseamento ou guarda de valores ou de numerário.
2. MATÉRIA de DIREITO
Atentas as posições das partes, veiculadas nas alegações e contra alegações, supra transcritas - aquelas nas suas extensas conclusões -, conjugadas com a sentença recorrida, as questões que constituem o objecto decisório deste Tribunal recursivo podem sintetizar-se/objectivar-se nos seguintes pontos:
nulidade da sentença, por omissão de pronúncia – art.º 615.º, n.º l. al. d) do Cód. Proc. Civil;
- erro de direito – em violação do disposto nos arts. 2.º-1 do Dec. Lei n.º 4/89, de 6/11, do Despacho n.º 15409/2009, de 8/7, 159.º n.º 3, al. b) da Lei 35/2014 de 20/6.
**
Quanto à nulidade da sentença, por alegada omissão de pronuncia - Art.º 615.º, n.º1, al. d) do Cód. Proc. Civil.
Neste conspectu, entende o Centro Hospitalar que, indevidamente, a sentença recorrida ignorou o alegado nos arts. 20.º, 21.º e 23.º a 30.º da contestação, donde deriva, no essencial, que, por um lado, não sendo o abono para falhas de atribuição genérica a qualquer trabalhador que manuseia numerário, não assiste direito à sua percepção pelas representadas do Sindicato uma vez que não exercem maioritariamente funções de manuseamento de numerário, sendo que a representada AA “tem movimento de cobrança de muitíssimo reduzido”, por outro, o Centro Hospitalar assume as falhas verificadas nos serviços de cobrança, nunca tendo exigido aos trabalhadores a reposição de montantes em falta.
Mais refere, a este propósito, que, sendo devido o pagamento do abono para falhas – que afasta – não será devido no período de férias e dias de ausência ao serviço.
Se no que diz respeito a esta questão de omissão de pronúncia, indutora de nulidade da sentença, a mesma não se verifica, de todo, na medida em que a tese justificadora da decisão tomada pelo TAF do Porto, com base numa assertiva subsunção legal, esclarece a razão da sua decisão, sendo certo que não importa qualquer nulidade a refutação de todos os argumentos apresentados – como, aliás, foi dito no despacho de sustentação exarado pelo TAF, de 19/1/2021 – já entendemos que a sentença deveria ter emitido pronúncia acerca da questão referente ao pagamento (ou não) do subsídio em causa em período de férias ou ausência ao serviço do trabalhador.
Ocorre, deste modo e nesta parte, de omissão de pronúncia a sentença recorrida, que, nos termos do disposto no art.º 149.º, n.º 1.º do CPTA, este TCA supriria analisando e decidindo esta questão, caso se concluísse pela negação de provimento ao recurso, o que, como de seguida, se analisará/decidirá, não se verifica, ou seja, procederá o recurso.
*
Quanto ao mérito da sentença recorrida, propriamente dita, assiste razão ao R./Recorrente Centro Hospitalar, em toda a linha argumentativa, como infra melhor se desenvolverá.
Na verdade, da interpretação das normas legais aplicáveis e que nos dispensamos de aqui reproduzir, duplicando o que já foi efectivado com a reprodução da sentença em sede de alegações, resulta que, se a actividade característica que importa a percepção do abono para falhas não tenha (ou não) de ser maioritária, mesmo de reduzidas dimensões, como refere quanto à funcionária AA, o certo é que os requisitos legais têm de ser cumulativos.
Se se torna necessária a cobrança/o manuseamento de valores monetários efectivamente exercido, in casu, pelos assistentes técnicos, cabendo à administração pública a alocação adequada, em termos de números, dos trabalhadores encarregados dessas tarefas, sem prejuízo também do respectivo pagamento aos trabalhadores em regime de substituição, também se mostra imperioso, nos termos legalmente aplicáveis, que os funcionários com direito ao recebimento do abono para falhas tenham de estar inseridos nos Mapas de Pessoal de tesouraria, com as inerentes funções (de manuseamento ou de guarda de valores ou de numerário), diversamente do que se conclui na sentença recorrida.
Como foi já referido em anteriores arestos deste TCA-Norte --- seja no já algo longínquo Acórdão de 8/2/2013, in Proc. 020188/10.6BEPRT – com o mesmo Relator – seja no Ac. de 2/6/2021, in Proc. 407/19.0BEVIS, relatado pela 1.ª Sr.ª Juíza Desembargadora Adjunta – bem como no Ac. do STA, de 23/4/2020 (em sede de decisão de Recurso de Revista e mesmo no Ac. de 23/3/2019 que admitiu a Revista, prolatados no Proc. 928/14.0BEPRT) que revogou decisão em sentido dissonante deste TCA, os requisitos legais supra enunciados têm de ser cumulativos, pelo que, no caso dos autos, resultando demonstrado que não constam dos respectivos Mapas de Pessoal que as representadas do Sindicato têm, nas suas funções, o manuseamento ou de guarda de valores ou de numerário – cfr. ponto 6 da factualidade provada, supra aditada - , não têm direito ao abono para falhas.
Como se sumariou no douto Ac. do STA, de 23/4/2020, “I - Para que se possa concluir que um trabalhador titular da categoria de assistente técnico tem direito a auferir abono para falhas por exercer funções nas áreas de tesouraria ou cobrança há que atender à caracterização de funções do seu posto de trabalho de acordo com o mapa de pessoal.
II - Assim, o representado pelo A. que detém a categoria de assistente técnico e que, entre outras funções, realiza a cobrança de taxas moderadoras, não tem direito a esse suplemento se não ocupa, no mapa de pessoal da ARS do Norte, IP, um posto de trabalho nas áreas de tesouraria ou cobrança que envolvesse a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos”.
No caso dos autos, não se provando, como seria necessário, à luz da jurisprudência veiculada nos arestos do STA e deste TCA, que as trabalhadoras representadas pelo Apelante ocupassem postos de trabalho que, de acordo com a caracterização constante do mapa de pessoal, se reportassem às áreas de tesouraria ou cobrança, ou que, tenham o direito a abono para falhas reconhecido por despacho dos membros do Governo da tutela e das Finanças e da Administração Pública, não têm direito a receber o abono em causa.
Na verdade, no Mapa de Pessoal do Centro Hospitalar recorrente não constam postos de trabalho que, de acordo com a respetiva caracterização das funções, se reportem à área da tesouraria ou cobrança das representadas do Sindicato A./Recorrido.
Ou seja, para que as trabalhadores do Centro Hospitalar .../..., EPE, com a categoria de assistentes técnicas e que procediam à cobrança de taxas moderadoras, pudessem usufruir da perceção do abono para falhas, era imperativo, na vigência Dec. Lei 4/89, de 6/01 e Despacho n.º 15409, de 30/6, que ocupassem, cada uma delas, no mapa de pessoal do Centro Hospitalar, posto de trabalho nas áreas de tesouraria ou cobrança que envolvesse a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos.
Assim e considerando o entendimento preconizado nos referidos arestos do STA e do TCA Norte, jurisprudência que subscrevemos, e tendo em atenção a manifesta similitude do caso em discussão com o versado naqueles arestos, não podemos senão concluir que assiste razão ao Recorrente.
Neste conspectu, sem necessidade de mais considerações, impor-se-á julgar como procedentes os invocados fundamentos de recurso, e, consequentemente, revogar a sentença recorrida e substituí-la por outra que julgue a ação improcedente.
Salienta-se, no entanto, que, caso improcedesse o recurso --- o que, como vimos – não sufragámos --- assistiria razão também ao R./Recorrente no que se refere à inexistência de suporte para pagamento do abono para falhas, em período de férias ou faltas ao serviço.
Na verdade, o Dec. Lei n.º 25/2015, de 6 de fevereiro O Dec.Lei n.º 25/2015, de 6 de fevereiro explicita as obrigações ou condições específicas que podem fundamentar a atribuição de suplementos remuneratórios aos trabalhadores abrangidos pela Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, bem como a forma da sua integração na Tabela Única de Suplementos., determina que a atribuição de suplementos remuneratórios só é devida enquanto perdurem as condições de trabalho que determinaram a sua atribuição e haja exercício de funções efetivo ou como tal considerado em lei, constituindo fundamento para a atribuição de suplemento remuneratório com carácter permanente, nomeadamente, as obrigações ou condições específicas decorrentes do manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos representativos de valores ou numerário - de acordo com as disposições conjugadas do n.º 1 e da alínea g) do n.º 2 do artigo 2.º do referido diploma legal. Daí que o Despacho n.º 15409/2009, que regulamenta o abono para falhas, estipule, nomeadamente, e em cumprimento do n.º 4 do artigo 159.º da LTFP, que “o abono para falhas é apenas devido quando haja efetivo exercício de funções e enquanto perdurarem as condições que determinaram a sua atribuição.” (cf. ponto 4). De acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 4/89 “O abono para falhas é reversível diariamente a favor dos funcionários ou agentes que a ele tenham direito e distribuído na proporção do tempo de serviço prestado no exercício das funções.”.
Assim e nessa medida, “O valor diário do abono para falhas calcula-se por aplicação da fórmula (Abono para falhas x 12)/(n x 52) em que n é igual ao número de dias de trabalho por semana.” (cf. n.º 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 4/89). O princípio da reversibilidade do abono para falhas fixado neste artigo 5.º do Dec. Lei n.º 4/89 surge, em nosso opinião e nos termos em que se encontra redigido este preceito legal, como medida de apurar o valor do montante deste suplemento remuneratório a que um trabalhador tem direito quando o seu posto de trabalho não implique o exercício quotidiano das funções que justificam a atribuição do abono por falhas ou quando essas funções são, num determinado mês, exercidas em regime de substituição.
Parece-nos, assim, decorrer das disposições conjugadas dos ns. 1 e 2 do art.º 5.º do Dec. Lei n.º 4/89, do n.º 4 do art.º 159.º da LTFP, do ponto 4 do Despacho n.º 15409/2009, do n.º 1 e da al. g) do n.º 2 do art.º 2.º do Dec. Lei n.º 25/2015, de 6 de Fevereiro, que a atribuição do abono para falhas é feita de forma diária e com referência aos dias nos quais, em cada mês, o trabalhador desempenhou as funções que lhe conferem direito a este suplemento remuneratório.
Com efeito, pode suceder que certas funções apenas exijam o manuseamento, a guarda ou a cobrança de valores, numerário, títulos ou documentos, em determinados dias da semana, pela natureza pontual de determinadas atividades e eventos, ou mesmo por força das escalas de serviço.
Constituindo o abono para falhas um suplemento remuneratório que visa cobrir riscos que o exercício das funções de manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos, envolve, a sua perceção terá de reportar-se aos dias em que o trabalhador está efetivamente a desempenhá-las.
Assim, o abono para falhas deveria apenas ser processado reportando-se ao número de dias úteis de exercício efetivo de funções que o trabalhador presta mensalmente, deixando de ser devido em todas as situações em que o trabalhador não se encontre em exercício efetivo de funções, pelo que, estando o abono para falhas sujeito a um regime especial, só sendo devido quando haja serviço efetivo, não há lugar à sua percepção nas ausências equiparadas a serviço efetivo, designadamente, por motivo de férias.
Como escreve Bernardo Lobo Xavier (Direito do Trabalho, Verbo, 2011, pág. 547) é o trabalho prestado a causa determinante da retribuição, sendo as duas prestações de carácter correspectivo e sinalagmático: “(…) retribui-se quem trabalha, trabalha-se porque se é retribuído – se não, não.
Este carácter de correspectividade da retribuição faz excluir do seu campo certas atribuições patrimoniais que não têm causa no serviço prestado, e em que não está presente a causa-função de troca de serviços por dinheiro, mas que assumem outra função jurídico-prática. Queremos referir-nos especialmente (…) às compensações por prejuízos que o trabalhador sofre por causa do trabalho (p. ex., abonos para falhas)”.
E mais adiante (pág. 563) precisa o mesmo autor que, em muitos casos, são atribuídos aos trabalhadores diversos quantitativos, a título não retributivo ou só aparentemente retributivo, acrescentando “ “…Um dos exemplos mais frisantes é o do abono para falhas, concedido a cobradores e caixas, já que, como dizem os nossos tribunais, “tal abono não tem carácter remuneratório do trabalho prestado, mas indemnizatório do risco a que na sua actividade aqueles empregados estão sujeitos”. Na verdade, neste tipo de trabalhos pode suceder com alguma frequência que o trabalhador tenha de responder por quantias em falta decorrentes de uma errada manipulação ou de uma deficiente contabilização dos valores com que quotidianamente lida. Daí a ideia de que estes «abonos para falhas» têm, normalmente, uma função compensatória de uma responsabilidade específica da actividade em causa”.
Não se trata, pois, de remunerar o trabalho, ou a disponibilidade para o trabalho, mas sim de compensar o risco decorrente das específicas funções desempenhadas, donde resulta que o valor recebido a título de abono para falhas não representa qualquer ganho para o trabalhador (já que em caso de falhas nos recebimentos e/ou pagamentos o trabalhador terá que suportar as mesmas).
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Destas considerações resultaria, à evidência, que, no período de férias ou faltas, o funcionário, concreta e juridicamente enquadrável na percepção do abono para falhas, não teria direito ao mesmo nos dias de férias ou faltas ao serviço.
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Tudo visto e ponderado, em provimento do recurso, importa revogar a sentença recorrida e assim julgar improcedente a acção.


III
DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em :
- conceder provimento ao recurso;
- revogar a sentença recorrida; e assim,
- julgar a acção improcedente, absolvendo o R./Recorrente dos pedidos.
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Sem custas, em ambas as instâncias, atenta a isenção de que goza o A./Recorrido – al. f) do n.º 1 do art.º 4.º do RCP -, sem prejuízo, porém, do disposto nos ns. 6 e 7 do art.º 4.º do RCP.
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Notifique-se.
DN.

27 de Janeiro de 2023

Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho