Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00393/12.7BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/03/2022
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Margarida Reis
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO; NULIDADE DO ACÓRDÃO; EXCESSO DE PRONÚNCIA
Sumário:A nulidade por excesso de pronúncia reconduz-se às situações em que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido, e já não a um eventual erro na fixação dos factos materiais da causa.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Indeferir a reclamação.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do indeferimento da reclamação.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RElatório

A Autoridade Tributária e Aduaneira, Recorrida nos presentes autos de recurso, notificada do acórdão proferido por este Tribunal Central Administrativo Norte em 2019-05-23, que concedeu provimento ao recurso interposto pela Recorrente E., vem, nos termos do disposto no art. 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e da alínea d) do n.º 1 e n.º 4 do art. 615.º e n.º 1 do art. 666.º, ambos, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi alínea e) do art. 2.º e art. 281.º, ambos do CPPT, arguir a sua nulidade por excesso de pronúncia.

Para tanto, alinha os seguintes fundamentos, que se transcrevem:
1.
O Douto Acórdão, ora em crise, decidiu “Assim sendo, e não vindo demonstrado pela administração tributária o exercício da gerência da executada originária pela Oponente a partir da data da alegada cessação de funções, esta apenas poderia ser responsabilizada pela dívida exequenda ao abrigo da norma da alínea a) [e não da alínea b)] do n.º 1 do citado artigo 24.º da LGT, o que pressupunha que a administração tributária demonstrasse (o que não fez), a sua culpa na insuficiência do património social para a satisfação da dívida tributária.”.
2.
Com a decisão de procedência do recurso, o douto Tribunal apreciou uma questão não suscitada pela Recorrente.
3.
A Recorrente E., nas suas alegações de recurso, solicitou que os autos baixassem à 1ª instância para ser ouvida a prova testemunhal, para que dessa resultasse a prova de que a mesma não era responsável pelo pagamento das dívidas exequendas.
4.
A nulidade da sentença, da al.ª d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, prevê que a sentença é nula quando:
“d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões que não podia tomar conhecimento;”
5.
Por outro lado, de acordo com o disposto no n.º 4 do mesmo artigo (corresponde ao art.º 668.º do anterior CPC), tal nulidade só pode ser arguida:
“… perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, (…).”.
6.
Contudo, tendo em conta doutrina e a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA), nomeadamente a constante do acórdão de 13 de Julho de 2011, exarado no processo n.º 0370/11:
“Embora de natureza ordinária, o recurso de revista previsto no art. 150 do CPTA não pode ser utilizado, dado o seu carácter excepcional, como arguição de nulidades da sentença recorrida, devendo as mesmas ser arguidas em reclamação no tribunal a quo, nos termos do art. 668, n.º 3 do CPC.”.
7.
Podendo, ainda, ler-se, no mesmo aresto: “Como acontece na hipótese semelhante de oposição de acórdãos.”.
8.
Nesta conformidade, vem a Fazenda Pública arguir a nulidade consubstanciada na pronúncia em excesso sobre questões que devesse apreciar.
Vejamos:
9.
No Acórdão agora carecido de correção entenderam, os ilustres Desembargadores, ser de alterar a Sentença recorrida, porquanto:
“No caso em apreço, os prazos para pagamento voluntário dos impostos revertidos (IRC e IVA) terminaram em 30/9/2007, 30/6/2009 e 2/11/2009 [cf. factualidade por nós supra aditada], sendo nestas datas que ocorreu o termo do prazo legal para pagamento do imposto relevante para efeito dos presentes autos. Ou seja, os prazos legais de pagamento terminaram quando a Oponente alegadamente já tinha cessado funções (1/8/2007).
Assim sendo, e não vindo demonstrado pela administração tributária o exercício da gerência da executada originária pela Oponente a partir da data da alegada cessação de funções, esta apenas poderia ser responsabilizada pela dívida exequenda ao abrigo da norma da alínea a) [e não da alínea b)] do n.º 1 do citado artigo 24.º da LGT, o que pressupunha que a administração tributária demonstrasse (o que não fez), a sua culpa na insuficiência do património social para a satisfação da dívida tributária..”.
10.
Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode, a Fazenda Pública, conformar-se com o doutamente decidido, porquanto, o mesmo resulta em pronúncia em excesso quanto ao solicitado pela Recorrente.
Senão vejamos:
11.
Nas suas conclusões de alegações de recurso da decisão de 1ª instância, a Recorrente requereu o seguinte:
“1. – Devem os autos baixar à 1ª Instância para ser ouvida a prova testemunhal, que era apta aos fins em causa, cf. Art.º 392º do C. Civil e Art.º 115º e 118º do CPPT.
2. – A sentença padece de vícios e erros na apreciação do momento relevante para efeitos da al. b) do nº 1, do Art.º 24º da LGT.
3. – Pois, no caso, a situação recaía na alínea a), do n.º 1, do Art.º 24º da LGT, já que o prazo de pagamento ou entrega das declarações de substituição, que nem sequer foram ordenadas pela recorrente, sucederam depois da sua saída da gerência.
4. – Pelo que a recorrente não é, assim, responsável pelo pagamento das dívidas exequendas vencidas após a saída da gerência, sendo em consequência parte ilegítima na execução das mesmas.
5. – Devendo a execução fiscal ser extinta.”
12.
Do recurso apresentado concluímos que o único pedido do mesmo é a descida dos autos à 1ª Instância para ser ouvida a prova testemunhal, para que dessa forma seja provado que a oponente não é responsável pelo pagamento das dívidas exequendas vencidas após a saída da gerência.
13.
Todavia, analisada a matéria de facto dada como provada, não verificamos a existência de factos nem documentos que provem a cessação das funções de gerente da sociedade em causa.
Senão vejamos,
14.
Por despacho de 20/01/2014, o Exmo. Juiz do TAF de Viseu determinou que: “Face ao exposto, determino seja aproveitada, nos presentes autos, a prova testemunhal realizada no processo n.º 1331/07, bem como a junção a estes autos de certidão da ata da audiência de inquirição realizada no processo 1331/07 e cópia do suporte digital contendo os depoimentos prestados. Em consequência, não há lugar a diligência de inquirição de testemunhas.”
15.
Neste processo de oposição foi dado como provado os seguintes factos:
“1. Por Despacho de 13/06/20 11, o Chefe do Serviço de Finanças de Viseu, determinou a reversão contra a Oponente das dívidas de IVA respeitantes ao período 2005 e 2006 e IRC do ano de 2006, em que figura como devedora originária “T., LDA, nos seguintes termos:
(…)
— cfr. fis. 10 a 11 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas, o mesmo se dizendo em relação aos demais que seguem.
2. A citação da oponente para a reversão tem a data de 13/06/2011 – cfr. fls. 7/8 dos autos.
3. A presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Viseu-2, em 12/07/2011 – cfr. fis. 3 dos presentes autos.
4. Os prazos de pagamento voluntário das dívidas exequendas são os seguintes:
a). IRC de 2006 - até 30/9/2007;
b). IVA de 2005 (2005/10- 2005/12) - até 30/6/2009;
c). IVA de 2005 - até 30/6/2009;
d).- IVA 2006 (2006/04-2006/06) - até 2/11/2009;
e). IVA de 2006 - até 3/11/2009
- cf. 12 a 16 e 21 dos autos.”
16.
Tendo sido aproveitada a matéria de facto dada como provado no processo n.º 1331/07.4BEVIS, cumpre-nos verificar se consta da mesma a prova da cessação da gerência.
17.
A matéria de facto dada como provada no processo n.º 1331/07.4BEVIS foi a seguinte:
“1. Por Despacho de 02/08/2007, o Chefe do Serviço de Finanças de Viseu-2, determinou a reversão contra a Oponente das dividas de IVA respeitantes ao exercício de 2005, em que figura como devedora originária “T…, LDA, nos seguintes termos:
(…) – cfr. fls. 10 a 12 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas como as demais que seguem.
2. Nos termos do extrato de remunerações registadas na segurança social, em que figura como beneficiária a oponente, verifica-se que no período de 2009/12, 2010/01 e 2010/09, a oponente tem registadas remunerações por prestação de doença como membro de Órgão Estatuário, e no período de 2004/10 e 2004/11. mesmo tipo de remuneração como trabalhador por conta de outrem – cfr. fls. 75 dos autos.
3. Como membro de Órgão Estatutário da V…, Unipessoal, Lda, a Oponente tem registadas remunerações no período compreendido entre 2005/11 e 2013/03 – cfr. fls. 76 a 79 dos autos.
4. Como trabalhador por conta de outrem da T…, Lda., a Oponente tem registadas remunerações no período compreendido entre 2005/01 e 2005/10 - cfr. fls. 79 dos autos.
5. Com o trabalhador por conta de outrem da S…, Lda., a Oponente tem registadas remunerações no período compreendido entre 2003/01 e 2004/12 – cfr. fls. 79 e 80 dos autos.
6. A oponente no exercício do direito de audição prévia à decisão e reversão, requereu a inquirição das testemunhas A… e M…– cfr fls. 33 a 35 dos autos.
7. A citação da oponente para a reversão tem a data de 03/08/2007 – cfr. fls. 9 dos autos.
8. A presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de 2, em 07 de Setembro de 2007 - cfr. fls. 4 dos presentes autos.”
18.
Assim, apesar de a Recorrente dizer que não era gerente na data limite de pagamento das dívidas em causa, verificamos, pela matéria de facto dada como provada, que não consta qualquer prova de tal alegação.
19.
Apesar de não constar como provado decidiu o tribunal anular a sentença recorrida com base nesse facto.
20.
Efetivamente, estamos em crer que a decisão ultrapassa os limites do solicitado nas alegações de recurso.
21.
Tendo sido requerido pela oponente a descida dos autos à 1ª Instância para ser ouvida a prova testemunhal, não deveria o tribunal decidir pela procedência da oposição com base em factos que não foram dados como provados no processo em causa nem no processo em que fomos recolher a inquirição de testemunhas.
22.
Citando o Acórdão n.º 06832/13 proferido em 31 de outubro de 2013 pelo Tribunal Central Administrativo Sul “Ora, como se infere do que já deixámos expresso, o excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes. Por outras palavras, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “ultra petita”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido).” – Sublinhado nosso.
23.
Ora, não sendo de conhecimento oficioso, não deveria o tribunal apreciar e tomar posição sobre questões de que não deveria conhecer, nomeadamente porque as mesmas não foram arguidas pelas partes.
24.
Nesta conformidade, resulta claramente que o Acórdão deste Douto Tribunal incorre em manifesto lapso, por excesso de pronúncia, devendo ser julgado nulo – al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.
25.
Em face do exposto, verifica-se a nulidade do acórdão, a qual se argui com todas as consequências legais, requerendo-se que se proceda à reforma da decisão em conformidade.

Termina requerendo:

Termos em que, pelo presente, deve o acórdão reclamado ser julgado nulo por excesso pronúncia sobre questões que não devessem ser apreciadas – nos termos do art.º 615.º n.º 1 al. d) do CPC.
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Notificada para se pronunciar sobre o teor da presente Reclamação, a Recorrente nada veio dizer ou requerer.
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O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do indeferimento da Reclamação, argumentando, em síntese, não ser correta a alegação da Recorrida, aqui Reclamante, de que não existiriam “factos nem documentos que provem a cessação das funções de gerente da sociedade em causa”, encontrando-se a mesma provada nos pontos 1 e 2 da matéria de facto provada, pois resulta do próprio despacho que determinou a reversão que “[a] sociedade foi dissolvida e feito o encerramento da liquidação, em 2007-08-01, tendo sido cancelada a matrícula, na mesma data”.
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Os vistos foram dispensados, com a prévia anuência dos Ex.mos Juízes Desembargadores-Adjuntos.
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Questões a decidir na Reclamação:

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Reclamante, ou seja, no caso em apreço, apurar se o acórdão reclamado padece de nulidade, por excesso de pronúncia.
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Vem a Recorrida, ora Reclamante arguir a nulidade por excesso de pronúncia do Acórdão proferido por este Tribunal Central Administrativo Norte em 2019-05-23 nos presentes autos de recurso.
Nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT, constitui causa de nulidade da sentença, entre outras, “a pronúncia sobre questões que [o juiz] não deva conhecer”, constando previsão idêntica da alínea d), in fine, do n.º 1 do art. 615.º do CPC, na redação/numeração atual, norma que veio a suceder à alínea d) do n.º 1 do art. 668.º do CPC, na redação anterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, aplicável à 2.ª instância nos termos do disposto no n.º 1 do art. 666.º do mesmo diploma, e ao caso em apreço por força da remissão constante no art. 281.º do CPPT.
Esta nulidade diz respeito às situações em que se verifica “a apreciação de questões de facto ou de direito que não tenham sido invocadas e que não sejam de conhecimento oficioso” (cf. GERALDES, António Abrantes, PIMENTA, Paulo, e SOUSA, Luis Filipe Pires de – Código de Processo Civil Anotado. Vol. I. 2.ª edição, reimpressão. Coimbra: Almedina, 2020, p. 764), pois “[n]ão podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções não deduzidas na exclusiva disponibilidade das partes (art. 608.º-2), é nula a sentença em que o faça.”
Ou seja, “haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “ultra petita”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido)” (cf. Acórdão do TCAS proferido em 2018-11-01, no proc. 338/17.8BESNT, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Alega a Recorrida, aqui Reclamante, e em síntese, que este Tribunal Central Administrativo Norte no acórdão em apreço (i) apreciou uma “questão” não suscitada pela Recorrente (cf. pontos 2 e 23 do seu requerimento de arguição de nulidade); (ii) fundamentou a decisão sobre o recurso num facto que não está provado nos autos (cf. pontos 13 a 19 do seu requerimento de arguição de nulidade); e (iii) decidiu para além do que foi pedido pela Recorrente nas suas alegações de recurso (cf. pontos 3, 10, 11, 12, 20, 21 do seu requerimento de arguição de nulidade).
A Reclamante não se conforma, em suma, com o facto de no Acórdão em questão este Tribunal ter entendido que a ATA não só não demonstrou que a Recorrente exerceu a gerência da executada originária a partir da data da sua cessação de funções, como não demonstrou, como lhe cabia, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, a respetiva culpa na insuficiência do património social para a satisfação da dívida tributária.
Não tem, no entanto, razão.
Não tem razão quando alega que este Tribunal decidiu sobre uma “questão” que não foi suscitada pela Recorrente, pois é manifesto que esta elege como uma das causas de pedir da sua ação de oposição à execução a circunstância de não ser gerente na data-limite de pagamento das dívidas em causa (cf. artigos 3 a 7.º da PI da Recorrente, matéria a que retorna nos artigos 5.º a 13.º das suas alegações de recurso).
Tanto é, aliás, expressamente reconhecido pela própria Reclamante no ponto 18 do seu requerimento de arguição de nulidade, no qual afirma “Assim, e apesar de a Recorrente dizer que não era gerente na data-limite de pagamento das dívidas em causa, verificamos, pela matéria de facto dada como provada, que não consta qualquer prova de tal alegação” (cf. ponto 18 do requerimento de arguição de nulidade).
Não tem igualmente razão quando alega que este Tribunal fundamentou a decisão que proferiu sobre o recurso num facto que não está provado nos autos.
Antes de mais, porque o que assim pretende é alegar um erro de julgamento, no caso um erro de julgamento de facto, o que lhe está vedado nesta sede, pois nos termos do disposto no art. 666.º do CPC, aplicável ex vi art. 281º do CPPT, apenas está legitimada a aqui suscitar nulidades (ou fundamentos de reforma, o que não é aqui o caso) do acórdão.
Com efeito, o vício que suscita não se enquadra no âmbito da nulidade por excesso de pronúncia, como erradamente pretende, pois como já se explicou acima, a nulidade por excesso de pronúncia reconduz-se às situações em que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido, e já não a um eventual erro na fixação dos factos materiais da causa, que consiste no erro “de subsunção da factualidade dada como representada nos meios de prova a um juízo de realidade ou não realidade da factualidade” (cf. PINTO, Rui – Manual do Recurso Civil. Volume I. Lisboa, AAFDL editora, 2020, p. 31).
Com efeito, e como foi já aqui referido, a Recorrente suscitou à saciedade os factos que sustentaram o seu entendimento de que não era gerente na data-limite de pagamento das dívidas em causa, pelo que esta questão de facto foi por si, aliás, amplamente suscitada, na PI e nas alegações de recurso, nas quais a ela retorna.
Não está, pois, em causa, uma qualquer nulidade por excesso de pronúncia, como pretende a Reclamante.
No entanto, sempre se dirá que esta questão (erro de julgamento de facto) sempre estaria votada ao insucesso caso lhe fosse legítimo vir suscitá-la agora, pois, e como foi já sublinhado – e bem - no parecer proferido nos autos pelo Excelentíssimo Procurador Geral Adjunto, a matéria de facto provada no ponto n.º 1 do Acórdão aqui em causa refere o despacho que determinou a reversão e transcreve-o o ponto n.º 2, resultando expressamente do referido despacho que “2. A sociedade foi dissolvida e feito o encerramento da liquidação, em 2007-08-01, tendo sido cancelada a matrícula, na mesma data (…)”.
Assim, e atento o reconhecimento expresso pela ATA da dissolução e encerramento da liquidação e do cancelamento da matrícula da devedora originária – que pressupõe o registo da liquidação -, a sociedade extinguiu-se (cf. n.º 2 do art. 160.º do CSC) naquela data.
Refira-se ainda que a Reclamante confunde o aproveitamento da prova, no caso, da prova testemunhal, ordenado pelo Tribunal a quo, com o “aproveitamento” da fundamentação de facto da decisão proferida no processo a que alude.
Por último, é manifesto que a Reclamante não tem razão quando alega que o pedido formulado no recurso foi ultrapassado no Acórdão em questão, pois o que a Recorrente ali peticionou foi “Deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios e erros alegados. com efeitos na extinção da execução fiscal, para que assim se faça JUSTIÇA” (sic) (cf. pág. 3 das alegações de recurso), o que em nada é posto em causa pela circunstância de a mesma ali referir que lhe deveria ter sido dada uma oportunidade de provar, através da prova testemunhal que ofereceu ao Tribunal de primeiro conhecimento da causa, que não foi por culpa sua que o património da devedora originária se tornou insuficiente para a satisfação das dívidas tributárias, questão que aqui ficou prejudicada (cf. n.º 2 do art. 608.º ex vi n.º 2 do art. 663.º, ex vi art. 281.º do CPPT), mas que era pertinente atenta a solução dada ao pleito pelo Tribunal a quo, e que não se confunde com o pedido efetuado no recurso.
Donde se conclui que o Acórdão em questão não padece da nulidade por excesso de pronúncia que lhe é imputada pela Reclamante, pelo que a presente Reclamação deve ser indeferida.
*
Em face do exposto, deve ser condenada em custas a ora Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (cf. art. 7.º, n.º 4 do RCP e tabela II anexa).
*
Conclusão:
Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva:

A nulidade por excesso de pronúncia reconduz-se às situações em que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido, e já não a um eventual erro na fixação dos factos materiais da causa.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em indeferir a presente Reclamação.

Custas pela Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

Porto, 3 de fevereiro de 2022 - Margarida Reis (relatora) – Cláudia Almeida – Paulo Moura.