Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00232/07.0BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/23/2023
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Tiago Miranda
Descritores:IVA DEDUTÍVEL;
MÉTODOS INDIRECTOS;
ÓNUS DA PROVA
Sumário:
I – A falta de discriminação como provados ou não provados, com a respectiva fundamentação, de quaisquer factos atendíveis para a discussão da causa em alguma solução plausível desta constitui nulidade da sentença, nos termos do nº 1 do artigo 125º do CPPT, por falta parcial da fundamentação de facto da decisão, nulidade que pode ser parcial, se não afectar o sentido do dispositivo e suprível nos termos dos artigos 662º nº 1 e ou 665º nº 1 do CPC.
I
I - Quando da prova ou da não prova de um facto resulta logicamente a não prova de outro, também ele alegado, o que sucede, verdadeiramente, é haver pronúncia, tácita, mas clara, pela não prova deste, não sendo, assim, indispensável, para cumprir com o artigo 123º do CPPT, uma expressa referência à sua não prova.

III - Tudo o que forem considerações gerais e abstractas ou juízos de valor, mesmo em matéria de facto, não é logicamente passível da decisão probatória, pois esta refere-se a factos concretos, mas apenas de um juízo de validade ou invalidade, pelo que não tem de ir à discriminação de factos provados e não provados.

IV – O artigo 640º nºs 1 e 2 do CPC faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente o que em seu entender são factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, a decisão que devia ter sido tomada e os meios de prova determinantes, sob pena de rejeição do recurso.

V – Havendo lugar ao procedimento de revisão de matéria tributável previsto no artigo 91º da LGT, ao menos na parte que releva do emprego das regras dos metidos indirectos, a fundamentação a sindicar das liquidações impugnadas, reside não no Relatório da Inspecção, em si mesmo, mas na decisão que lhe pôs termo, mas o RIT pode relevar enquanto fundamentação desta, se e na medida em que tiver sido objecto de remissão.

VI - Feita a prova, pela AT, de factos de que decorra a prova ou fundados indícios que a contabilidade não corresponde à realidade, passa a ser do sujeito passivo de IVA, conforme os artigos 74º nº 1 e 75º nº 2 alª a) da LGT, o ónus de provar a relação do negócio facturado com a sua actividade tributada em IVA, não sendo, tal IVA, dedutível nos termos do artigo 19º do CIVA, no caso de não ser feita essa prova.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - Relatório
[SCom01...] S.A., contribuinte fiscal n.° ...05, com sede no ..., apresentou o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, quanto à parte em que foi julgada parcialmente improcedente a sua impugnação das liquidações oficiosas de IVA dos anos de dos anos de 2002 a 2004, no montante global de € 154.328,87 €

As alegações de recurso da Recorrente terminam com as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES:
1) Existe omissão de pronúncia sobre determinados factos alegados pela Impugnante, os quais, em seu entendimento, eram - todos eles - essenciais para a boa decisão da causa, até porque visam obstar a prevalência de omissões de vendas de sucata (factos alegados sob os artigos (93°, 103°, 105°, 106°, 111°, 182° e 204°), da petição inicial (impugnação)).
Sem prescindir;
2) Deve ser aditado, em conformidade aos factos dados como provados em III da sentença, em razão dos depoimentos credíveis das testemunhas e da prova documental, Art.°s 362° e 392° do Código Civil e Art.° 115° do CPPT, os factos alegados sob artigo 93°, 103°, 105, 111°, 182° e 204° da petição inicial (impugnação), nomeadamente;
- ..., valor de venda depende de critérios comerciais distintos em função do produto, mercado, acabamento da embalagem, etc...
- ..., parte do latão consumido é transformado em pó (polimento) misturado em lamas residuais (vibração) e associado em processos químicos (galvanoplastia), processos estes que envolvem a quase totalidade dos produtos.
- —, o volume de vendas estimado em 2004 baixou para limiar inferior aos dos depósitos em numerário. 

3) Deve ser alterada em conformidade os factos dados como não provados em 45, 46 e 47 da sentença, para factos provados, em razão dos depoimentos credíveis das testemunhas e dos documentos sociais, Art.°s 362° e 392° do Código Civil e Art.° 115° do CPPT.
Não obstante;
4) Deve ser dado como provado, o que não consta nos factos provados os seguintes termos:
Os desperdícios gerados no processo produtivo da [SCom01...] eram maioritariamente aproveitados na empresa nos anos de 2002 e 2003 tal como em 2004”;
A actividade da recorrente gera desperdícios normais, no latão, como limalhas, jorra, pós em resultado do polimento, lamas residuais e associados em processos químicos (por galvanoplastia)”.
5) Existe falta de fundamentação, quanto ao estabelecimento da taxa de desperdício de 25%, pela AT, para efeitos de pressuposto e aplicação dos métodos indirectos, conforme Art.° 77° da LGT.
6) Existe vício de violação da lei, quanto à mudança do rumo de tributação da tributação directa para a indirecta, conforme Art.°s 87°, n.° 1, al. b), e 88°, ambos da LGT e Art.° 90° do CIVA.
7) Existe errónea quantificação e manifesto excesso de capacidade contributiva, conforme Art.° 86° da LGT e Art.° 100° do CPPT.
8) Existe vício de violação da lei, Art.° 19° e 20° do CIVA, ao não permitir à recorrente deduzir o IVA suportado nas aquisições de produtos ao fornecedor “[SCom02...]”, bem como nas aquisições de serviços prestados pelo advogado Dr. «AA» e ainda nas despesas com combustíveis sem indicação dos elementos referentes às viaturas e da empresa adquirente, despesas com combustíveis apresentadas pelos administradores e colaboradores a quem está atribuído o cartão de abastecimento e despesas de reparações relativas às viaturas que não pertenciam ao activo imobilizado da recorrente.
9) E consequentemente devem as liquidações recorridas ser anuladas. 
TERMOS EM QUE, E NOS QUE DOUTAMENTE FOREM SUPRIDOS, DEVEM V. EXAS. DAR PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, E, EM FACE DAS CONCLUSÕES ATRÁS ENUNCIADAS ANULANDO A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA, FACE ÀS NULIDADES INVOCADAS OU CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA DEVE A SENTENÇA SER REVOGADA E ORDENADA A SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRA QUE, RESPEITANDO AS NORMAS LEGAIS APLICÁVEIS, JULGUE A IMPUGNAÇÃO PROCEDENTE E APRECIE OS VÍCIOS E ERROS ALEGADOS, COM EFEITOS NA ANULAÇÃO DAS LIQUIDAÇÕES RECORRIDAS E COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS,»


Notificada, a Recorrida não respondeu à alegação.

O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal apresentou douto parecer no sentido da improcedência do recurso, redutível aos seguintes excertos:
«(…)
PARECER
. PROCESSO 232/07.0BEVIS
[SCom01...], S.A. e a Fazenda Pública vêem interpor recurso da sentença da Mma Juiz do TAF de Aveiro que, no âmbito de processo de impugnação judicial de liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios, dos anos de 2002 a 2004, a julgou parcialmente procedente.
A recorrente na sequência de acção inspectiva tributária, veio impugnar as referidas liquidações, invocando, entre outros fundamentos, o erro nos pressupostos de facto e de direito em que estas assentaram, conforme menciona na petição inicial que aqui se dá por reproduzida para todos os feitos legais.
*
E jurisprudência pacífica que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pelas recorrentes das respectivas alegações.
*
Alega [SCom01...], S.A., em resumo, que a sentença é nula por omissão de omissão de pronúncia e padece de erro de julgamento de facto e direito, como melhor refere em sede conclusiva e para cuja leitura remetemos.
Cremos que não lhe assiste razão.
O Mm° Juiz sustentou que não se verificam as apontadas nulidades, em termos que, em nosso entender, não merecem reparo.
*
A recorrente impugna a matéria de facto, por entender, que do depoimento das testemunhas que arrolou, resultou demonstrado o que alegou na petição inicial, ou seja, põem em causa a factualidade dada como assente, entendendo que deveria ser substituída por outra factualidade.
Na decisão da matéria de facto, o juiz aprecia livremente as provas, conforme dispõe o artigo 605° do CPC, analisa-as de forma crítica e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, especificando os fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção, excepto quando a lei exija formalidades especiais para a prova dos factos controvertidos, caso em que tal prova não pode ser dispensada. E, pois pela fundamentação invocada para a decisão que normalmente se afere do juízo crítico sobre as provas produzidas.
Aliás, a nossa lei processual determina e faz impender sobre o julgador um ónus de objectividade da sua convicção, através da exigência da fundamentação da matéria de facto (da factualidade provada e da não provada), devendo aquele analisar citicamente as prova e especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (cfr. art. 653° n° 2 do CPC).
A luz desta perspectiva temos que se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.” Ac. do TCAN de 11/4/2014 no processo 00819/10.4BEPNF.
No caso em apreço, a recorrente discorda dos factos dados como provados e dos não provados e a convicção do Tribunal, ou seja, o que pretende é retirar da prova produzida ilações distintas das que o Mm° Juiz percepcionou e explicitou na respectiva fundamentação.
A modificação quanto à valoração da prova, nomeadamente a testemunhal, tal como foi captada e apreendida na Ia instância, só se justificaria se, feita a reapreciação, fosse evidente a grosseira análise e valoração que foi efectuada pelo Tribunal, o que não se verifica, neste particular, pelo que, não merece provimento, em nosso entender, o alegado erro de julgamento, como pretende a recorrente.
*
Estabilizada a base factual, não merece censura o enquadramento jurídico efectuado.
A [SCom01...], S.A. não aduz, nas referidas conclusões, qualquer novidade ao que já tinha alegado na petição inicial, voltando a repetir as mesmas instâncias que não tiveram acolhimento na bem fundamentada decisão.
O julgador procedeu à indicação dos fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, com especificação dos meios de prova e das razões ou motivos substanciais que relevaram ou obtiveram ou não credibilidade, conforme se apreende da leitura do texto da decisão.
Constam da sentença as razões de facto e direito em que esta assentou. A Mma Juiz analisou a prova e fundamentou a decisão, em nosso entender, merecedora de confirmação, não se verificando os mencionados vícios.
O recurso, em nosso entender, não merece provimento.»

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.

II - Âmbito do recurso e questão a decidir
Conforme jurisprudência pacífica, extraída dos artigos 608º, 635º nº 4 e 639º do CPC, aqui aplicáveis ex vi artigo 281º do CPPT, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações.
Assim, não serão apreciadas as questões de facto ou de direito suscitadas no corpo das alegações que não sejam inteligivelmente abrangidas pela síntese das conclusões – e que não sejam de conhecimento oficioso. Designadamente, não integram o objecto do recurso as concretas alegações de causas de nulidade da sentença (que não a que abaixo discutiremos, que o recorrente alegou mas não qualificou como tal) feitas no corpo das alegações mas não concretamente reflectidas nas conclusões.
Posto isto, as questões suscitadas no recurso são, pela ordem, em que emergem das conclusões do recurso, as seguintes:

1ª questão
Existe omissão de pronúncia sobre factos alegados pela Impugnante, essenciais para a boa decisão da causa, porque visam obstar à prevalência de omissões de vendas de sucata, designadamente os factos alegados sob os artigos (93°, 103°, 105°, 106°, 111°, 182° e 204°), da petição inicial (impugnação)?
2ª Questão
Uma vez que a sua prova resultou da prova testemunhal alegada no corpo das alegações devem ser aditados à descriminação da matéria de facto provada os factos constantes dos artigos 93º, 103º, 105º, 111, 182º e 204º da Petição inicial, designadamente que:
a - o valor de venda depende de critérios comerciais distintos em função do produto, mercado, acabamento da embalagem, etc...
b - parte do latão consumido é transformado em pó (polimento) misturado em lamas residuais (vibração) e associado em processos químicos (galvanoplastia), processos estes que envolvem a quase totalidade dos produtos.
c - o volume de vendas estimado em 2004 baixou para limiar inferior aos dos depósitos em numerário?
3ª Questão
Releva de erro de julgamento em matéria de facto a decisão de dar com não provados os factos 45 e 46 e 47 na discriminação da matéria de facto não provada, pois deviam ter sido julgados como provados pelos documentos sociais e depoimentos transcritos no corpo das alegações, sendo-o o artigo 45 com as alterações inerentes à seguinte reformulação:
Os desperdícios gerados no processo produtivo da [SCom01...] eram maioritariamente aproveitados na empresa nos anos de 2002 e 2003 tal como em 2004”;. “A actividade da recorrente gera desperdícios normais, no latão, como limalhas, jorra, pós em resultado do polimento, lamas residuais e associados em processos químicos (por galvanoplastia)”.
4ª Questão
A sentença recorrida erra no julgamento de direito ao dar como improcedente a alegação de falta de fundamentação, pois o acto impugnando padece efectivamente de falta de fundamentação, violando assim o artigo 77º da LGT?
5ª Questão
O acto impugnado padece de vício de violação da lei, quanto à mudança do rumo de tributação da tributação directa para a indirecta, conforme Art.°s 87°, n.° 1, al. b), e 88°, ambos da LGT e Art.° 90° do CIVA.
6ª Questão
A sentença recorrida incorreu em erro de direito violando os artigos 19º e 20º do CIVA ao confirmar a desconsideração, para dedução, do IVA suportado pela Impugnante nas aquisições de produtos ao fornecedor “[SCom02...]”, bem como nas aquisições de serviços prestados pelo advogado Dr. «AA» e ainda nas despesas com combustíveis sem indicação dos elementos referentes às viaturas e da empresa adquirente, despesas com combustíveis apresentadas pelos administradores e colaboradores a quem estava atribuído o cartão de abastecimento e despesas de reparações relativas às viaturas que não pertenciam ao activo imobilizado da recorrente?



III – Apreciação do Recurso
A decisão recorrida em matéria de facto é a seguinte:
«Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com interesse para a decisão da mesma:
1. A sociedade anónima “[SCom01...], S.A.” (doravante [SCom01...]), nipc ...05, com sede em ..., ..., dedica-se à actividade de fabricação de fechaduras, dobradiças e outras ferragens - CAE 028630 - Vol. l, fls. 4 do PA;
2. O seu objecto social é e sempre foi a indústria de ferragens para móveis e construção civil, sendo a sua gama de produtos composta pelos seguintes:
a) Puxadores de Porta e de Móvel;
b) Dobradiças;
c) Fechaduras;
d) Acessórios e toalheiros - Vol. l, fls. 4 do PA;
3. Para o fabrico da gama de produtos acima identificados, a [SCom01...] utiliza matérias-primas tais como o latão, o zamack, e o aço inoxidável - Vol. 1, fls. 4 do PA;
4. Em 01/02/2005, foi apresentada uma proposta de acção inspectiva externa à [SCom01...], com a seguinte motivação: “A empresa acima identificada faz parte do acompanhamento permanente e a presente proposta de acção inspectiva externa insere-se no âmbito do controlo ao sector das sucatas. Os motivos subjacentes à presente proposta são os seguintes:
1- Existência de vendas de sucata de latão (matéria-prima mais utilizada no processo de fabrico) nos anos de 2001 e 2002 aparentemente irrisórias face ao volume de negócios declarado pela empresa, conforme valores abaixo, quando comparados com dados recentemente obtidos em empresa recentemente visitada ([SCom03...], Lda.) (...)
A este aspecto junta-se o facto de ser do nosso conhecimento que os sócios da [SCom01...], SA têm efectuado grandes investimentos imobiliários (aquisição de terrenos) tudo levando a crer com dinheiros provenientes da venda de sucata. (...)
3- A empresa regista uma diminuição do volume de negócios de 2002 para 2003 de cerca de 9%, uma diminuição do resultado líquido de cerca de 73% e do resultado fiscal de cerca de 63% no mesmo período.
4- No âmbito do acompanhamento tem-se verificado a existência de divergências no VIES que convém serem analisadas” - Vol. 1, Fls. 96 do PA;
5. Em cumprimento da Ordem de Serviço n° ...42, datada de 30/06/2005, foi ordenada a realização de uma acção inspectiva externa de âmbito geral aos exercícios de 2002 a 2004 da aqui Impugnante - Vol. 1, fls. 95 do PA;
6. Através do ofício n° ...22, datado de 04/07/2005, foi a Impugnante informada que “a muito curto prazo, se deslocará (ão) à morada acima referenciada, técnico (s) dos Serviços de Inspecção Tributária. A visita do (s) técnico (s) tem como finalidade o cumprimento das correspondentes obrigações tributárias por parte de V. a(s) Ex. a(s) (...)” - Vol. l, fls. 99 do PA;
7. Em 21/11/2005, os Serviços de Inspecção Tributária (doravante designado SIT), remeteram à [SCom01...], na pessoa do seu administrador «BB», notificação para prestar esclarecimentos relativamente a:
“ 1(...) 2. Verifica-se que foram efectuados depósitos em numerário nos montantes de 157.000,006 em 2002, 128.000,006 em 2003 e 128.358,79 em 2004. Relativamente a este facto, justifique/identifique:
a) Qual a proveniência de cada montante depositado em numerário;
b) Caso respeitem a recebimentos de clientes, identifique os mesmos, nomeadamente indique a factura, venda a dinheiro ou documento equivalente respectivo;
c) Caso a proveniência seja outra, apresente documento comprovativo.
3. Verificou-se nos exercícios de 2002, 2003 e 2004 elevado número de cheques emitidos ao portador, aparentemente levantados para o caixa, sem que posteriormente haja a sua saída, pelo que foram os mesmos objecto de pedido de fotocópia frente e verso às instituições bancárias respectivas. (...)
a) Relativamente aos cheques ao portador que foram levantados ao balcão e partindo do princípio que os respectivos beneficiários não são as pessoas que levantaram as importâncias, queiram apresentar relação contendo a identificação completa dos beneficiários (nome completo e n.° de identificação fiscal) bem como dos valores recebidos e a que título os receberam, sob pena de não sendo justificada a utilização do dinheiro, tal ser considerado como despesa confidencial ou não documentada, nos termos do n. °1 do art. ° 81° do CIRC, e como tal sujeito a tributação autónoma à taxa de 50%;
4. Relativamente ao cheque n.°...68 do Banco 1..., de 2003-12-03, no valor del0.000,00€, emitido à ordem de «CC», depositado na conta n.° ...72 do Banco 1..., a que título foi o mesmo emitido ao administrador.” - Vol. 2, fls. 516 e 517 do PA;
8. Em 23/11/2005, a Inspectora Tributária credenciada requereu alguns elementos à [SCom01...], nomeadamente:
1) Fichas Técnicas dos Produtos de 2002, 2003 e 2004:
a) indicação custo unitário de cada componente;
b) indicação pesos líquidos dos componentes seleccionados;
c) indicação preços unitários de venda (em termos médios); d) indicação quantidades vendidas e produzidas de cada referência;
2) Listagem, por ano, dos produtos injectados em latão, contendo:
a) a referência;
b) designação;
c) quantidade produzida;
d) quantidade vendida;
e) peso líquido do produto;
f) preço custo da matéria-prima;
3) Quadro onde consta para cada ano: 2002, 2003 e 2004:
a) quantidade e valor inicial (Ex. Inicial);
b) compras (quantidade e valor);
c) quantidade e valor final (Ex. Final), de lingotes de latão;
4) Quantidade de alumínio adquirido em 2002, 2003 e 2004.
5) Matérias primas, em quantidade e valor, adquiridas em 2004.” -Fls. do PA;
9. Em 25/11/2005, o Director de Finanças ... proferiu despacho de prorrogação do prazo da acção inspectiva por mais 3 meses, tendo o mesmo sido notificado à Impugnante através do ofício n° ...89, datado de 12/01/2006 - Vol. 1, fls. 91 e 92 do PA;
10. Em 29/11/2005, a [SCom01...] prestou os esclarecimentos identificados no ponto 7, respondendo o seguinte:
1. (...) 2. - Quanto aos pontos 2., 3.e 4., na sociedade foi levantado dinheiro para o reforço do caixa, cfr. Pontos 3. e 4., e depois depositado cfr. ponto 2.
3 -Os valores recebidos em 3. e 4., são verbas de adiantamentos de salários (vales ao caixa) e à medida que foram recebidas, são depositadas.” - Vol. 2, fls. 518 do PA;
11. Em 14/12/2005, a Inspectora Tributária requereu ao Dr. «DD» que:
A fim de prosseguirmos a amostragem, precisamos dos seguintes elementos, alguns deles já solicitados no pedido de elementos efectuado em 23 de Novembro do corrente:
a) Indicar nas fichas técnicas dos produtos, o custo da matéria-prima de modo a podermos obter o custo unitário do produto, isto só em termos de matérias (matérias primas + componentes);
b) Relativamente aos produtos em que não foi possível fazer pesagem, por se encontrarem na posse dos clientes, como ficou combinado, se possível indique os pesos líquidos, bem como a valorização pretendida em a);
c) Relativamente às mercadorias que constam nas fichas técnicas pretendemos também do seu preço de custo;
d) Caso as mercadorias que foram seleccionadas e que constam das fichas técnicas não sejam representativas em termos de valor facturado, seleccione as mais representativas nos 3 anos (2002, 2003 e 2004), indicando os preços de custo e preços de venda unitários;
e) Relativamente ao inventário final de produtos acabados de 2001 e 2002, indique o valor das mercadorias indevidamente contabilizadas, à data, como produtos acabados;
f) Ficheiro contendo os artigos mais facturados nos anos em análise;
g) Os elementos solicitados nos pontos 2), 3), 4) e 5) do pedido escrito feito em 23 de Novembro de 2005.” fls. do PA;
12. Em 12/01/2006, a Impugnante apresentou os elementos anteriormente peticionados pela Inspectora Tributária, e já identificados em 11 - Anexo 41, do PA;
13. Em 20/01/2006, a Impugnante foi notificada na pessoa do seu Administrador «EE», para no dia 31/01/2006 apresentar os seguintes elementos:
“1. Relativamente à relação de artigos junta em anexo n.° 1 a esta notificação de que faz parte integrante, fotocópias devidamente autenticadas das fichas técnicas de cada artigo;
2. Disponibilização de um exemplar de cada artigo e dos meios técnicos humanos para se proceder à sua pesagem;
3. Relação das vendas de produtos (só produtos), dos anos 2002, 2003 e 2004, contendo N° Artigo, Nome, Quantidade e Valor.” - Anexo 34-A, fls. 2091 do PA;
14. Em 31/01/2006, o Administrador «FF» respondeu às questões da Inspectora Tributária, ficando a constar o seguinte no Auto de Declarações:
“2 - (...) Quanto ao latão referiu que há latão estampado e injectado. O latão estampado começa com a aquisição de cavilha, corte da mesma conforme a configuração da peça, segue-se a estampagem e a operação de aparar. Seguem-se posteriormente as várias mecanizações consoante a peça. Por fim os acabamentos polimentos e acabamentos finais, que são galvânicos ou a verniz. O latão injectado é adquirido em lingote e a outra parte é reciclada das aparas da estampagem (toda a apara é reciclada); a limalha da estampagem nem toda é reciclada. A limalha vendida corresponde exactamente à parte que não pode ser reciclada aqui na empresa. Relativamente ao zamack, é adquirido em lingote, é injectado em moldes, seguindo-se as operações de mecanização, depois é vibrado e polido e finalmente são feitos os acabamentos galvânicos. Nesta matéria-prima há um aproveitamento total, portanto não há criação de sucata. Os serviços de mecanização são efectuados em 80 a 90 % dos casos aqui na empresa. São raras as peças que vão fazer estes serviços fora. 3 - (...) Como já foi referido, toda a apara da estampagem de latão é reciclada, reentra no processo produtivo. A limalha de latão que não entra no processo produtivo é vendida. Actualmente é vendida à empresa [SCom04...], que a transporta nos seus camiões, em bidons ou avulso, neste último caso consoante as condições da caixa do veículo de transporte. Nos anos de 2002, 2003 e 2004, a limalha de latão era vendida aos [SCom05...], Lda. 3 - (...) Foi referido que as guias de remessa manuais de 2002 e 2003foram deitadas ao lixo, só tendo aparecido 3 guias de 2004 e que não é tirado talão de pesagem da balança. Referiu que as guias de remessa manuais relativamente à venda de sucata, são processadas pela parte comercial com base em informação (verbal ou escrita, não sabia ao certo) dada pelo funcionário Sr. «GG»” - Anexo 31, fls. 1950 do PA;

15. Em 02/02/2006, a Impugnante foi notificada na pessoa do Administrador «EE» para no dia 13/02/2006, apresentar os seguintes elementos e esclarecimentos:
“1. Esclarecimento por escrito, das situações em que eram utilizadas pela empresa ‘‘guias de remessa manuais”, nos anos de 2002, 2003 e 2004, já que dos elementos contabilísticos, nomeadamente vendas a dinheiro emitidas/contabilizadas nos anos em análise (2002, 2003 e 2004), consta a menção a um número de “guias de remessa manual”, conforme se demonstra no resumo em anexo I a esta notificação;
2. Fotocópias devidamente autenticadas (carimbo e assinatura da administração), dos livros de guias de remessa manuais processadas nos exercícios de 2002, 2003 e 2004. Caso não seja possível cumprir com o solicitado, solicita-se o esclarecimento por escrito sobre o não cumprimento do pedido formulado;
3. Fotocópias devidamente autenticadas de todas as guias “Modelo A - Guia de Acompanhamento de Resíduos”, processadas em nome da empresa [SCom01...], SA ” nos exercícios de 2002, 2003 e 2004, bem como os mapas de registo anual de resíduos dos mesmos anos;
4. Relativamente aos produtos injectados em latão nos exercícios de 2002 e 2003, queriam referir o motivo porque não possuem os registos da sua injecção nesses anos (data, quantidade, descrição de produto);
5. Relativamente à listagem de produtos injectados em latão facultada e respeitante ao ano de 2004, queiram esclarecer:
a) se os pesos (grs) indicados são pesos brutos ou pesos líquidos;
b) dado estarmos perante um P. V.F. (produto em via de fabrico) cujo código e descrição não corresponde ao código e descrição do produto final acabado destinado a venda, queiram esclarecer se há fichas técnicas destes P.V.F. e se é possível fazer a sua correspondência com o(s) produto(s) final(ais) correspondente(s). Se tal for possível solicita-se que na listagem dos produtos injectados em latão em 2004, seja indicada a(s) referência(s) desse(s) produto(s) acabado(s) e a respectiva descrição completa;
6. - Queiram ainda esclarecer por escrito se um determinado produto em latão, tanto pode ser produzido por estampagem como por injecção e se essa situação se verificou na v/ empresa, nos anos de 2002, 2003 e 2004;
7. - Percentualmente, qual o peso das vendas e produção (no total das vendas e da produção, respectivamente) de:
a) Produto latão:
a l) Estampado;
a 2) Injectado;
b) Produto zamack (injectado), nos anos em análise de 2002, 2003 e 2004.” — Anexo 33, fls. 1953 do PA;
12. Em 10/02/2006, a Impugnante apresentou resposta à notificação referindo que:
“1. As guias de remessa manuais eram utilizadas pontualmente quando o sistema informático estava indisponível ou quando não fosse possível de preparar a respectiva guia de remessa automática em tempo útil;
2. Não possuímos os livros de guias de remessa manuais.
3. Seguem no Anexo I as guias Mod. A e os mapas anuais de resíduos;
4. Não possuímos o registo dos produtos injectados em latão porque não o efectuávamos.
5.a) Os pesos indicados são pesos teóricos à saída da injecção, que se aproximam de pesos líquidos;
b) Não existem fichas técnicas dos produtos em vias de fabrico e do produto final, porquanto um mesmo componente pode fazer parte de n produtos;
6. Em função de razões técnicas, uma determinada percentagem de componentes tanto pode ser obtida por estampagem como por injecção;
7. Estimamos os seguintes pesos sobre as vendas de produtos acabados:
Ano 2002 - produto latão 89% [88%; 90%,]; produto zamack 11% [10%,; 12%]; Ano 2003 - produto latão 89% [88%,; 90%,]; produto zamack 11% [10%; 12%]; Ano 2004 - produto latão 88% [87%>; 89%]; produto zamack 7%, [6%; 8 %,].
Não conseguimos estimar as percentagens de produtos de latão estampados e injectados em função das vendas; todavia, com erro tolerável as percentagens de produtos produzidos em latão e zamack sobre o total produzido devem ser similares às percentagens acima indicadas para as vendas.” - Anexo 34 do PA;
17. A resposta da Impugnante a que alude o ponto anterior inclui ainda o referido anexo I onde constam alguns mapas anuais de resíduos relativamente aos anos de 2002, 2003 e 2004. No que concerne aos resíduos de Aparas e Limalhas:
AnoQuantidadeQuantidadeIdentificaçãoIdentificaçãoResponsável
Produzida noprevista paradodopelo
anoo ano seguintedestinatáriotransportadorpreenchiment
respeitante ao registoao do registode valorizaçãopara
valorização
0
200210,6 Ton.+/-12 Ton.[SCom05...][SCom05...]«II»
...
20034,9 Ton.+/- 5 Ton.[SCom05...][SCom05...]«JJ»
20044,9 Ton.+/- 5 Ton.«HH»[SCom05...]«JJ»
METAIS FERROSOS 2002 3,25 Ton.+/- 3 Ton.......«II»
20033,5 Ton.+/- 3 Ton.[SCom06...], Lda. ...[SCom06...], Lda. ...... «JJ»
20043,6 Ton.+/- 3 Ton.[SCom06...], Lda. ...[SCom06...], Lda. ...«JJ»
Anexo 34[SCom06...], Lda.[SCom06...], Lda.
do PA;

18. A acção inspectiva identificada no ponto 5 teve início em 18/7/2005 e terminou em 16/03/2006 - Vol. 1, fls. 93 a 95 do PA;
19. Através do Ofício n° ...32, datado de 17/03/2006, foi a Impugnante notificada para exercer o direito de audição sobre o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, datado de 17/3/2006, tendo sido aposta nesta notificação a seguinte menção do administrador «CC» ‘‘Recebi, hoje, dia 17/03/2006, o presente projecto de conclusões de relatório”, não tendo a [SCom01...] exercido dessa faculdade - Vol. 1, fls. 48 do PA;
20. Em resultado da acção inspectiva levada a cabo contra a [SCom01...], foi levantado o respectivo Auto de Notícia datado de 04/04/2006 - Vol. 1, fls. 41 a 47 do PA;
21. Em 06/04/2006, a AT emitiu o Relatório Final, homologado por despacho de 11/4/2006, e três Documentos de Correcção Único (DCU), com o n° ...20 (para o exercício de 2002), n° ...14 (para o exercício de 2003), e n° ...48 (para o exercício de 2004) - Vol. 1, fls. 174 a 191,194 a 211, e 214 a 229 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
22. Do Relatório Final consta, entre o mais, o seguinte:
(...) Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente
Aritméticas

III. 1. Em sede de IVA
III 1.1. Exercícios de 2002, 2003 e 2004
Nos exercícios objecto de análise detectou-se a contabilização de diversos custos essencialmente combustíveis - gasóleo - em que os documentos não cumprem o estabelecido no artigo 35.° do Código do IVA, não havendo indicação do nome nem número de identificação fiscal da [SCom01...], não sendo também indicada a matrícula da viatura. Acresce o facto de se ter concluído que foi prática da empresa proceder à substituição dos custos para os quais não possuía o respectivo documento válido de suporte [caso de parte dos honorários pagos a três médicos os quais foram documentados com elevado número de talões de combustível, entre outros] as razões que motivaram a correcção dos respectivos custos.
Detectou-se ainda a contabilização de diversas facturas emitidas pela empresa [SCom02...] Lda., ao longo dos anos de 2002 a 2004 à empresa [SCom01...].
Analisado o conteúdo de algumas dessas facturas, verificou-se de imediato estarmos perante facturação de artigos destinados especialmente a tratamento de águas das piscinas, suspeita que se veio a conformar, com a existência de algumas facturas contendo as seguintes menções:
- “Cliente: «EE»”, caso da factura n.° ...80 a que corresponde a guia de transporte n.°...78 de 28-08-2003;
- Cliente: Sr. «KK»”, caso da factura n. ° ...13 de 2003, a que corresponde a guia de transporte n.°...52 de 30/07/2003;
- Sr. «EE» - ...”, caso da factura n. ° ...73 de 2003.
- Piscina do Sr. «EE», caso da factura n. ° ...68 de 2004.
Esta última factura foi devolvida pela empresa [SCom01...] à [SCom02...] Ld.ª para esta a rectificar, tendo a [SCom02...] Ld.a emitido posteriormente factura, exactamente com o mesmo n. ° da factura inicialmente emitida (1) e a mesma data, mas sem a menção “Piscina do Sr. «EE»” (!)
Visitado o sujeito passivo [SCom02...] no dia 25-11/2005, foi possível falar com uma empregada da firma, D. «LL». Tendo sido questionada acerca da utilização de determinados artigos (cujas designações se obtiveram a partir das facturas emitidas à empresa [SCom01...]), a mesma informou, sem qualquer hesitação, tratarem-se de artigos/equipamentos destinados a piscinas.
Verificou-se, ainda a existência de facturas relativas a aquisição de bens e serviços que não concorrem para a realização de operações tributáveis, caso da apresentação de facturas relativas a materiais de construção (ano 2002) e relativas à aquisição de outros bens e serviços (porta em vidro, por exemplo) emitidas em nome da [SCom01...] e por ela contabilizadas, cujo IVA foi deduzido pela empresa e simultaneamente pago ao administrador que apresentou essa despesa (!), tratando-se de situações indiciadoras da apresentação de despesas falsas para comprovar saídas de dinheiro, servindo ao mesmo tempo para remunerar administradores.
Em 2004 foi considerado indevidamente deduzido IVA no montante de 1.786,00€, correspondente a um recibo verde emitido pelo advogado «AA», feito através do cheque n. ° ...82 do Banco 2... emitido pela [SCom01...], foi compensado por um depósito em 27-02-2004, de um cheque do Dr. «BB» (administrador da empresa), cheque este depositado na mesma conta do Banco 2... da [SCom01...] e cujo valor que corresponde ao valor ilíquido do recibo emitido por «AA», relativo a serviços de advocacia. Questionada a empresa acerca dos serviços prestados pelo advogado referido, foi-nos informado que o mesmo ajudou a resolver um caso da [SCom01...], não nos tendo sido referido qual. Atendendo a que a empresa tem advogados avençados (Dr. «MM» e Dr. «NN») e atendendo ainda à existência deste cheque emitido pelo Dr. «BB» à [SCom01...], é nossa convicção que os serviços de Advocacia foram prestados ao referido administrador e que o recibo foi emitido em nome da [SCom01...] para esta contabilizar o custo e deduzir o IVA.
O IVA indevidamente deduzido, face ao estabelecido no n.° 1 do artigo 20.° do CIVA, ascende aos seguintes montantes, por período:
Ano 2002: 875,20€
Ano 2003: 597,92€;
Ano 2004: 2285,53€.
(...)
IV. Aplicação de métodos indirectos
(...)
Como se verifica pelos cálculos anteriores, as vendas de produtos supostamente omitidas à contabilidade ascendem a valores muito elevados e irrealistas principalmente nos anos de 2002 e 2003, no nosso ponto de vista, mas permitindo verificar que:
- há erosão da margem bruta de 2002 para 2003 e 2004 [(que é real, devido à erosão dos preços de venda dos produtos, acompanhada de 2003 para 2004 pelo aumento dos preços de custo da matéria-prima (principalmente do latão)];
- as supostas vendas de produtos em 2004 atingiriam valores muito mais baixos que nos anos anteriores.
Este último facto leva-nos a crer que a empresa, terá a partir de determinada altura concluído que, face ao aumento de preço de custo da matéria-prima, de facto ganhava mais reciclando parte da sucata, do que a vendendo.
É nossa convicção que a reciclagem de sucata passou a ter expressão em 2004 e os dados fornecidos pela empresa (listagem de produtos injectados) apontam exactamente nesse sentido, tal como os da própria presunção de produto que em 2004 é muito mais baixa, levando a concluir que as margens declaradas pela empresa neste ano se aproximam das por nós obtidas com base nos consumos líquidos de matéria-prima.
Em face do que foi referido anteriormente, a nossa convicção é que na empresa o que existe são vendas omissas de sucata e não de produto. Repara-se que estamos perante sucata muito valiosa e que até há poucos anos este negócio passava completamente despercebido das autoridades fiscais. A partir do momento em que começou a ser conhecida a grande fraude no sector das sucatas, nomeadamente no âmbito do IVA, pela proliferação de facturação falsa dado que as compras efectuadas às empresas produtoras de sucata sem documento (saco azul das empresas) são substituídas por facturas emitidas por marginais com liquidação de IVA, permitindo aos seus utilizadores por via do exercício do direito à dedução, o reembolso deste imposto que nunca entrou nos cofres do Estado, houve a necessidade de controlar o circuito no seu início, isto é, nas firmas produtoras de sucata, concluindo-se após as análises efectuadas que a [SCom01...] é uma das empresas importantes neste circuito.
Corroborando o que acabamos de dizer, no âmbito dos cruzamentos efectuados, em que esteve sempre presente a coordenadora de equipa, sendo portanto também ela testemunha das afirmações proferidas por um dos sujeitos passivos ligados ao negócio da sucata, foi-nos referido que:
- a quantidade real de sucata efectivamente transaccionada pela [SCom01...] (entre outras) é no mínimo 3 a 4 vezes superior ao que é facturado, quando existe facturação;
- as empresas produtoras não querem facturar a sucata;
- compensa pagar multa por os camiões circularem com excesso de peso (de sucata), porque os ganhos da compra e venda de sucata sem documentos superam largamente esse custo.
Face a tudo o que foi exposto, concluímos que os valores declarados pelo sujeito passivo não refletem a sua exacta situação patrimonial, infringindo o artigo 20.° do CIRC pela omissão de proveitos e o artigo 109. ° do CIRC pela inexactidão dos valores declarados, propondo-se:
- o acréscimo à matéria colectável de cada ano auditado, do valor apurado a partir do cálculo das vendas de sucata omitidas;
- liquidação adicional de IVA correspondente às vendas de sucata omitidas em cada exercício, nos termos do artigo 84.° do CIVA Uma vez que se provou a impossibilidade de determinação por forma exacta dos valores omissos à contabilidade da empresa quer em sede de IRC quer em sede de IVA.
Assim, nos termos da al. b) do artigo 87.° e alínea a) do artigo 88. ° da Lei Geral Tributária (LGT), entendemos estarem reunidas as condições para aplicação dos métodos indirectos de determinação da matéria tributável aos exercícios de 2002, 2003 e 2004, conforme se encontra previsto nos artigos 52.° e 54.° do CIRC.
B.5.) Pagamento do IVA de determinadas facturas aos administradores da empresa
23. Em 11/4/2006 “o Director de Finanças tendo em conta os proveitos, custos e correcções constantes do presente documento e outros elementos” e através de aplicação de métodos indirectos fixou o lucro tributável da Impugnante para o exercício de 2002 em € 906.452,42 (alterando o lucro tributável declarado de € 326.683,80); para o exercício de 2003 em € 566.550,87 (alterando o lucro tributável declarado de € 121.289,60); e para o exercício de 2004, em € 517.878,66 (alterando o lucro tributável declarado de € 165.300,70) - Vol. 1, fls. 172, 192 e 212 do PA;
24. Em 12/04/2006, ao abrigo do disposto no art.° 239° do CPC (actual art.° 231° CPC) e no art.° 41.° do CPPT, os inspectores tributários deslocaram-se à sede da [SCom01...] para a notificarem do "Relatório Final (Entregue em cumprimento do disposto no Art° 77 da LGT e 61° do RCPIT), elaborado pelo Serviço de Inspecção Tributária (SIT), com data de 06/04/2006 composto por 101 fls.” e dos “Documentos de Fixação, relativo à cédula de IRC e IVA interligado com o(s) ano(s) de 2002/2003/2004”, uma vez que "o acto notificador emerge por no seio do Processo ter ocorrido: Recurso à aplicação de “métodos indirectos” e Correcções meramente aritméticas em IRC/ IVA/ exercícios de 2002/2003/2004”, tendo esta notificação sido feita na pessoa do Administrador «EE» - Vol. I, fls. 169 a 171 do PA;
25. Em 11/05/2006, a Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável, nos termos do art.° 91.° da LGT, do procedimento tributário “dos anos de 2002, 2003 e 2004 em IVA e IRC” - Vol. l, fls. 128 a 168 do PA;
26. Em 07/07/2006, foi realizado o debate contraditório (art.° 92, n° I LGT) entre o perito da AT e o perito indicado pelo contribuinte, e ao fim concluiu-se “NÃO HAVER ACORDO, entre os Peritos identificados em 1. Assim, o processo prosseguirá os trâmites subsequentes, nomeadamente o da imediata recolha da Resolução do Órgão Competente - Artigo 92°, número 6, da LGT. ” - Vol.1, Fls. 119 a 127 do PA;
27. Em 08/08/2006, foi realizado um Parecer relativamente ao pedido de revisão da matéria tributável apresentado pela ora Impugnante, concluindo o mesmo que “Face a tudo o antes descrito propomos que a RESOLUÇÃO que venha a ser assumida leve em linha de conta os valores que se vão seguir, a saber: (...) E.2 - Agravamento (Artigo 91.°, números 9 e 10, da Lei Geral Tributária) Inexistente, por a Reclamação do Contribuinte ter tido o mérito de levar à reformulação dos valores que vinham propostos, devido à existência de “(...) erros de cálculos no relatório de inspecção (...)” - Vol. l, fls. 104 a 114 do PA;
28. Em 11/08/2006, a Direcção de Finanças ... emitiu um termo de resolução (art.° 92.°, n° 6 da LGT), referindo que “Em concordância com o teor do PARECER, integrado por 22 folhas e 7 anexos, datado de 2006/08/08, RESOLVO: ALTERAR os valores inicialmente fixados, substituindo-os pelos que se assinalam de seguida:
Anos IRC IVA
Lucro Tributável Imposto em
(Euros) Falta (Euros)
2002845 441,3763 817,83
2003541 127,9750 815,94
2004463 751,3618 505,09


- Vol. l, Fls. 103 do PA;
29. Em sequência, a AT emitiu e notificou as liquidações de IVA e juros compensatórios ora impugnados.
30. Em 12/02/2007, por via postal, foi remetido ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu a petição inicial da presente Impugnação - fls. 1 e ss. do processo físico;

Mais se provou:
31. Pela sociedade “[SCom02...], Lda.” foram emitidos os seguintes documentos:
- Guia de transporte n.° ...86, da qual consta “Minorador PH...”.
- Guia de transporte n.° ...27, da qual consta “Anti algas extra...; Pastilhas Tricloro... Floculante em Cartucho...”
- Guia de transporte n.° ...29, da qual consta “Halobrom Pastilhas de Bromo...”
- Guia de transporte n.° ...40, da qual consta “Vara Telescópica..
- Guia de transporte n.° ...50, da qual consta “Minorador PH...”.
- Guia de transporte n.° ...52, da qual consta “Doseador Cloro Bromo... Cliente Sr. «KK»”
- Guia de transporte n.° ...27, da qual consta “Anti algas extra... Cliente «EE»”;
- Guia de transporte n.° ...73, da qual consta “Pastilhas Tricloro ...Anti algas extra... Halobrom Pastilhas de Bromo... Floculante em Cartucho... Sr. «EE» - ...”;
- Guia de transporte n.° ...14, da qual consta “Anti algas extra... Halobrom Pastilhas de Bromo... Floculante em Cartucho...”
- Guia de transporte n.° ...15, da qual consta “Pastilhas Tricloro ... Dicloro granulado.. .Cesto p/ skimmer astral... Parafuso.. .manómetro”;
- Guia de transporte n.° ...39, da qual consta “Anti algas extra...Dicloro granulado ... Floculante em Cartucho...
- Guia de transporte n.° ...68, da qual consta “Anti algas extra... Piscina Sr. «EE»”
- Guia de transporte n.° ...68, da qual consta “Anti algas extra...”
- Cfr. Anexo 8 do PA, pags. 938 e ss, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

32. Por «AA» foi emitido recibo em nome da ora Impugnante, no valor de € 9306,00. - Cfr. Anexo 8 do PA, pags. 938 e ss, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

33. No ano de 2002 foram emitidos vários cheques ao portador para a conta caixa da [SCom01...], no entanto, entre estes, existiam 20 cheques (cheques n° ...88, ...10, ...52, ...24, ...36, ...45, ...18, ...06, ...84, ...73, ...23, ...88, ...48, ...35, ...63, ...26, ...20, ...57, ...90, ...50) que na sua totalidade perfazem o valor de € 104.744,71, que não tinham documento comprovativo de despesa - Anexo 9 do PA;

34. No ano de 2003, existiam 42 cheques (cheques n° ...49, ...34, ...50, ...22, ...46, ...28, ...32, ...41, ...98, ...76, ...23, ...74, ...10, ...89, ...54, ...47, ...72, ...61, ...76, ...71, ...45, ...83, ...93, ...97, ...14, ...16, ...19, ...30, ...32, ...60, ...63, ...40, ...53, ...51, ...78, ...27, ...97, ...02, ...80, ...85, ...88, ...44 ) que na sua totalidade perfazem o valor de € 93.743,53, que não tinham documento comprovativo de despesa - Anexo 9 do PA;

35. No ano de 2004, existiam 33 cheques (cheques n° ...46, ...47, ...09, ...96, ...23, ...34, ...67, ...55, ...90, ...96, ...99, ...00, ...58, ...48, ...66, ...83, ...08, ...24, ...40, ...46, ...57, ...00, ...16, ...88, ...45, ...73, ...94 ;
...36; ...90; ...70; ...89; ...58; ...97) que na sua totalidade perfazem o valor de € 40.200,00, que não tinham documento comprovativo de despesa - Anexo 9 do PA;
36. A Impugnante pagou, a título de adiantamento de salários (vales ao caixa) no ano de 2002 o valor de € 7.382,34, em 2003 o valor de € 4.735,83, e em 2004 O valor de € 5.415,22 - Anexos 19 e 20, do PA;
A [SCom01...] emitiu pelo menos as seguintes Guias de Acompanhamento de Resíduos - Modelo A (doravante designado: GAR), relativamente a “Aparas e limalhas de metais não ferrosos:
GuiaN”DataQuantidade de resíduosTransportadorReceptorResponsável pela emissão da Guia
2002
...1324/09/2002[SCom05...], Lda.«OO»«JJ»
2003
...2330/06/03360 kg[SCom05...], Lda.[SCom08...], Lda.«JJ»
...1907/07/2003780 kg[SCom05...], Lda.[SCom08...], Lda.«JJ»
...1811/07/2003540 kg[SCom05...], Lda.[SCom08...], Lda.«JJ»
2004
...8511/05/20041900 kg...
[SCom07...]
...
[SCom07...]
«JJ»
...1708/06/2004460 kg[SCom05...], Lda.«OO»«JJ»
...1808/06/2004700 kg[SCom05...], Lda.«OO»«JJ»
...1914/06/2004700 kg[SCom05...], Lda.«OO»«JJ»
...0917/09/2004200 kg[SCom05...], Lda.[SCom09...], Lda.«JJ»
...1017/09/2004150 kg[SCom05...], Lda.[SCom09...], Lda.«JJ»
...2111/10/2004...
[SCom07...]
«OO»«JJ»
...2211/10/2004[SCom05...], Lda.«OO»«JJ»

- Anexos 26, 28, 29 e 30, Vol.2, do PA;
38. Com base na Ficha de Controlo Anual de Resíduos de 2003 (documento interno da [SCom01...]), verifica-se que a actividade da Impugnante gerou nesse ano 1840 kg de resíduos metais não ferrosos (920 kg em 23/06/2003 e 920 kg em 30/06/2003) - Anexo 27, fls. do PA;
39. No ano de 2002, a Impugnante emitiu 26 documentos de venda a dinheiro para a empresa “[SCom05...], Lda.”, sendo estas representativas de 10 627kg de sucata de latão, e do valor de € 16.638,83 - Vol.4, fls. do PA;
40. No ano de 2002, a empresa “[SCom05...], Lda. ” emitiu vários cheques à ordem da [SCom01...], entre os quais: Cheque n° ...78 no valor de € 456,83 (datado de 17/05/2002); Cheque n° ...41 no valor de € 1.859,36 (datado de 02/05/2002); Cheque n° ...49 no valor de € 424,77 (datado de 21/03/2002); Cheque n° ...46 no valor de € 296,03 (datado de 28/03/2002), o que perfaz um montante global de € 3.036,99 - Vol.I, fls. 230 a 232 do PA;
41. Em resposta ao ofício n.° ...39 (identificado no ponto 18) a DREC enviou aos SIT alguns elementos referentes à [SCom01...], destacando-se o seguinte:
“Ponto 6 - Complemento memória descritiva apresentada Anexo AN1.14
(...)
h) No que se refere à actividade de fundição injectada (...)
Relativamente à capacidade máxima diária instalada confirmamos o valor referido e enviado no Exercício EPER 2002 (fax de 2003/09/09), ou seja, o valor de 1,8 ton/dia.
Os valores apresentados no formulário PCIP (NA 1.14) dando indicação de uma capacidade de fundição injectada de latão e zamack de 60 a 130 toneladas são relativos à capacidade de injecção das máquinas e não a capacidade produtiva, daí não apresentarem uma unidade temporal.
Quanto ao valor referido de 3,936 ton/dia, que é a soma do consumo médio de varão de latão (3.512 kg), do lingote de zamak (234 kg) e do lingote de latão (190 kg), clarificamos que no processo de fundição injectada apenas consumimos lingote de latão e lingote de zamak. Nas prensas é que utilizamos a cavilha de latão como matéria prima.
Referimos ainda que este valor apresentado representa os consumos diários, e que o valor referido no Exercício EPER 2002 é a capacidade máxima. (...)” - Anexo n° 44, do PA;

42. Dos elementos enviados pela DREC aos SIT, consta ainda um formulário que comporta, para além de outras informações, o Quadro “QB4.2 - Resíduos Não Perigosos Gerados na Instalação e respectivas Operações de Gestão”, onde a Impugnante declarou que relativamente aos resíduos de aparas e limalhas de metais não ferrosos (120103) produz uma quantidade de 4,9 T/ano, sendo a totalidade deste resíduo sujeito a uma operação de valorização no exterior, pela empresa [SCom05...] (Responsável pelo Transporte e pela Operação) - Anexo n°44, do PA;

43. O processo produtivo da [SCom01...] manteve-se sempre o mesmo nos anos de 2002, 2003 e 2004 - depoimentos da 3ª, 4ª e 5ª testemunha;

A [SCom01...] dispunha das seguintes viaturas no seu Imobilizado:
(Cf. original.)
Anexo 43 do P.A.

Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.
Não se provaram designadamente, os seguintes factos:
45. Os desperdícios gerados no processo produtivo da [SCom01...] eram todos reaproveitados na empresa nos anos de 2002 e 2003.

46. Os serviços de advocacia prestados pelo Dr. «AA» foram-no à impugnante e não ao administrador Dr. «BB». - não há documentos juntos aos autos onde se verifique qualquer relação de mandato ou qualquer tipo de intervenção processual
47. O Dr. «AA» preparou a defesa numa acção interposta pelo Ministério do Ambiente à Impugnante, pretendendo embargar as novas construções que esta estava a fazer.
*
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos e do processo administrativo constam, bem como da inquirição das testemunhas, tudo conforme referido a propósito de cada um dos pontos do probatório.
As testemunhas foram ouvidas.
Quanto ao processo produtivo da [SCom01...] nos anos de 2002, 2003 e 2004, as testemunhas «PP», metalúrgico da [SCom01...] há 25 anos, e «QQ», responsável pela produção na [SCom01...] há 7 anos, declararam que o circuito do processo produtivo da empresa se manteve inalterado nos anos de 2002, 2003 e 2004. E que a empresa reciclava as sobras. Apenas «RR» defendeu que, quanto às aparas, nalguns casos eram recicladas e noutros eram vendidas.
Quanto a esta última parte, os depoimentos defendem, em geral, que os desperdícios gerados no processo produtivo são maioritariamente reintroduzidos novamente no circuito de produção da [SCom01...]. No entanto, não nos podemos bastar com os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas, dado que estas têm uma relação de dependência laboral e económica em relação à ora Impugnante e tendem naturalmente a ser permeáveis a eventuais pressões no sentido de serem parciais a favor dos interesses da entidade patronal.
Ora, para averiguar a veracidade dos factos não poderão deixar de ser tidos em conta os documentos constantes nos Autos.
Em auto de declarações subscrito por um dos administradores da sociedade ora Impugnante, «FF», foi declarado que “O latão injectado é adquirido em lingote e a outra parte é reciclada das aparas da estampagem”, “toda a apara da estampagem de latão é reciclada, reentra no processo produtivo”, e que “Relativamente ao zamac, é adquirido em lingote (...). Nesta matéria-prima há um aproveitamento total, portanto não há criação de sucata”
No entanto, ao contrário do que foi declarado pelas testemunhas e por este administrador, há documentos que apontam no sentido da existência de “sucata” de “metais não ferrosos”, incluindo o latão. De facto, num documento interno de controlo anual de resíduos de 2003 da [SCom01...] é possível constatar que a actividade da Impugnante gerou 1840 kg de metais não ferrosos.
Ademais, da contabilidade da Impugnante resulta que no exercício de 2002 emitiu 26 documentos de venda a dinheiro para a empresa “[SCom05...], Lda.”, representando estes documentos 10627 kg de sucata de latão, apurando o montante de € 16.638,38 e, para além disso, a Impugnante recebeu dessa empresa vários cheques no valor global de € 3.036,99.
Por fim, cumprirá fazer referência aos documentos que a DREC forneceu aos SIT, nomeadamente os formulários que a Impugnante já havia enviado a esta entidade. Num desses documentos consta que “Quanto ao valor referido de 3,936 ton/dia, que é a soma do consumo médio de varão de latão (3.512 kg), do lingote de zamac (234 kg) e do lingote de latão (190 kg), clarificamos que no processo de fundição injectada apenas consumimos lingote de latão e lingote de zamak. Nas prensas é que utilizamos a cavilha de latão como matéria prima.”. Noutro documento declara que produz 4,9 toneladas por ano de aparas e limalhas de metais não ferrosos, sendo a totalidade deste produto valorizada no exterior pela empresa “[SCom05...], Lda.’’
Em suma, os documentos acima mencionados revelam que há saída de quantidades significativas de desperdícios da [SCom01...], para a sua posterior valorização por empresas externas, o que contraria a tese da Impugnante.
Pese embora à data dos factos a [SCom01...] tivesse capacidade para proceder ao reaproveitamento dos seus desperdícios, resulta dos documentos junto aos Autos que nos anos em causa (2002,2003 e 2004) não fazia o reaproveitamento integral das aparas e limalhas dos metais não ferrosos.
De tudo o que foi apurado nos autos resulta por demais evidente que, apesar de a [SCom01...] ter os meios para reutilizar as aparas e as limalhas, a verdade é que vendeu esses desperdícios metálicos ferrosos e não ferrosos nos anos de 2002, 2003 e 2004, não sendo possível concretizar se a Impugnante terá reaproveitado alguma quota-parte, ou se de facto não houve qualquer reaproveitamento na sua empresa.
Logo, o Tribunal acompanha o entendimento da AT na parte em que defende que há omissão de vendas de sucata por parte da [SCom01...]., razão pela qual se dá como não provada a reintrodução dos desperdícios no processo produtivo.
Quanto às facturas emitidas pela “[SCom02...]”, com produtos destinados a piscinas, nenhuma das testemunhas teceu considerações relevantes. Apenas houve referência a que a “[SCom02...]” era o fornecedor normal para galvanoplastia e tratamento de águas residuais, efluentes industriais.
No que tange ao recibo emitido pelo Advogado «AA», as testemunhas não foram esclarecedoras. Depuseram de forma vaga e pouco credível. Ademais, não resulta dos autos nenhum documento que permita esclarecer a dúvida quanto aos serviços efectivamente prestados, e que seria muito fácil dissipar por parte da Impugnante.
Relativamente às facturas dos gastos em combustíveis, a testemunha «SS», [que trabalhou na [SCom01...] entre 1977 e 2009, como empregado de escritório, lançando facturas e processando salários, entre o mais], referiu que a empresa teria uma frota de cerca de 9 carros e que, normalmente, as facturas que lhe chegavam tinham matrícula. Caso não tivessem, eram conferidas pelo sector de compras.
Já «RR», Director Comercial da [SCom01...], referiu que há vários anos dispõe de cartão (frota) REPSOL. Caso não tivesse oportunidade de abastecer em qualquer bomba da REPSOL, abastecia noutro sítio e depois apresentava o recibo que, pedia em nome da [SCom01...], ao “Caixa”.
Por sua vez, «DD» referiu os utilizadores das viaturas da [SCom01...] tinham cartão de abastecimento numa rede de combustíveis, um “cartão frota”.
Havia casos em que o abastecimento da viatura era feito fora dessa rede, sem o referido cartão. Havia funcionários que pagavam e depois apresentavam os documentos comprovativos ao departamento de “Caixa”. A despesa era validada por alguém da Administração. Só assim era paga. Havia um “dossier” com uma folha genérica de descrição de despesas relativas ao serviço que iam fazer. Elaborava-se uma espécie de “boletim-itinerário.»

Visto o decidido em matéria de facto, há condições para nos debruçarmos sobre as questões acima enunciadas.

1ª questão
Existe omissão de pronúncia sobre factos alegados pela Impugnante, essenciais para a boa decisão da causa, porque visam obstar à prevalência de omissões de vendas de sucata, designadamente os factos alegados sob os artigos (93°, 103°, 105°, 106°, 111°, 182° e 204°), da petição inicial (impugnação)?

A) apreciação da questão
Dispõe o artigo 123º nº 2 do CPPT que a sentença discriminará, na sentença, a matéria de facto provada e a não provada.
O que é e não é a matéria de facto que tem de ser discriminada como provada ou não provada diz-no-lo o artigo 5º nº 2 do CPC, aplicável ex vi artigo 2º do CPPT: o Juiz deve atender, na sentença, aos factos alegados nos articulados, aos instrumentais desses, que resultem da instrução da causa e aos que sejam complemento ou concretização dos alegados e resultem da instrução da causa, desde que as partes tenham tido a possibilita de se pronunciar sobre os mesmos.
Resulta, ainda, dos nº 2 e 3 do artigo 607º do CPC, aplicável no processo tributário, nos termos do artigo 2º do CPPT, porque o artigo 123º º do CPPT não regula exaustivamente a estrutura da sentença, que a discriminação dos factos provados e não provados (atendíveis) integra a fundamentação da sentença em matéria de facto.
Assim sendo, a omissão de pronuncia sobre factos alegados e relevantes para a discussão da causa, em alguma das perspectivas em confronto, viola a conjugação dos artigos 123º nº 2 do CCPT e 5º nº 2 e 607º nºs 2 e 3 do CPC ex vi artigo 2º do CPPT.
Qual é sanção do direito para esta violação?
Não ignoramos o entendimento segundo o qual se trataria de um erro de julgamento de facto, por não se terem seleccionado todos os factos necessários, mas não nos revemos nessa qualificação, desde logo porque a quem omite o acto de julgar não se pode apontar erro de julgamento.
Dir-se-ia tratar-se, então, de uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia sobre uma ou mais questões de facto sobre que se imporia pronúncia, nulidade prevista no artigo 615º nº 1 alª d) do CPC, segundo o qual a sentença é nula “quando deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar”. Com efeito trata-se do silêncio do juiz sobre questões de facto colocadas pelas partes. Porém, o conceito de “questão” instalado na jurisprudência e na doutrina mais secundada prejudica este entendimento, pois entende-se por questão não qualquer facto individual a julgar provado ou assente, mas apenas um complexo fáctico-jurídico de que possa depender a decisão da causa.
Uma vez que a discriminação de todos os facto atendíveis nos termos do nº 2 do artigo 5º do CPC integra, conforme artigo 607º nº 4 do CPC e 123º nº 2 do CPPT, a fundamentação da sentença, então, a omissão sobre a prova ou não prova de facto atendíveis, mormente esses que indubitavelmente o eram porque alegados pelas partes e relevantes para uma eventual decisão da causa a seu contento, resulta numa violação do dever de fundamentar a sentença em matéria de facto e é sancionada como nulidade da sentença, nos termos do nº 1 do artigo 125º do CPPT segundo o qual é “causa de nulidade da sentença a não especificação doa fundamentos de facto e de direito da decisão”. Com efeito, omitir a pronúncia sobre facos relevantes, isto é, de cuja prova e não prova pode depender, ao menos num entendimento plausível, a decisão da causa resulta numa falta de especificação de ao menos parte dos fundamentos de facto da decisão.
Assim, temos vindo a entender que a falta de especificação como provados ou não provados, com a respectiva fundamentação, de factos atendíveis para a discussão da causa em alguma solução plausível desta constitui nulidade da sentença, nos termos do nº 1 do artigo 125º do CPPT, por falta parcial da fundamentação de facto da decisão. Cf. anotação ao artigo 125º do CPPT, no CPPT anotado, 6ª edição, II volume, pág. 360:
“8 - Omissão ou deficiência parcial na indicação da matéria de facto.
Como se deduz do que ficou referido, quanto à falta de indicação da matéria de facto provada ou deficiência, obscuridade ou contradição, a nulidade existirá mesmo que se trate de uma omissão ou deficiência parcial.”
Esta nulidade da sentença pode ser parcial, se não afectar o sentido do dispositivo e suprível nos termos dos artigos 662º nº 1 e ou 665º nº 1 do CPC.
Duas notas sobre o que não é silêncio da sentença em matéria de facto:
Quando da prova ou da não prova de um facto, devidamente fundamentada, resulta logicamente a não prova de outro, também ele alegado, o que sucede, verdadeiramente, é haver pronúncia, tácita, mas clara, e até fundamentada, pela não prova deste, não sendo, assim, indispensável, para cumprir com a artigo 123º do CPPT, uma expressa referência à sua não prova.
Por fim, tudo o que forem considerações gerais e abstractas ou juízos de valor, mesmo em matéria de facto, não é logicamente passível da decisão probatória, pois esta refere-se a factos concretos, mas apenas de um juízo de validade ou invalidade.
É nestes pressupostos que nos propomos apreciar a questão acima enunciada.
Os artigos da Petição que a Mª Juiz a quo teria ignorado rezavam assim:
93º - Pois, não é correcto calcular a percentagem de desperdício ponderada, utilizando como ponderador o valor de vendas, uma vez que estas dependem de critérios comerciais, que são distintos em função do produto, do mercado, do acabamento, da embalagem, etc.
103 - E de salientar também, que parte do latão consumido é transformada em pó (polimento), misturado em lamas residuais (vibração) e associado em processos químicos (galvanoplastia), processos estes que envolvem praticamente a totalidade dos nossos produtos.
105 - Conforme resulta do quadro acima, a percentagem de latão consumido na fundição ultrapassa em cerca de 5 p.p. o desperdício de latão gerado.
111 - Curiosamente e após o debate contraditório, do Art.° 92° da LGT (Doc. 75 Anexo), a frase exposta na pág. 72 do Relatório da Inspecção, demonstra-se incongruente e contraditória, pois o volume de vendas estimado em 2004, baixou para um limiar inferior ao dos depósitos em numerário

182 - Pois, no nosso entender não é correcto calcular a % de desperdício ponderada, utilizando como ponderador o valor de vendas, uma vez que estas dependem de critérios comerciais, que são distintos em função do produto, do mercado, do acabamento, da embalagem, etc.
204 - É ainda de salientar que existem quebras normais pois uma parte do latão consumido é transformado em pó (polimento), misturado em lamas residuais (vibração) e associado em processo químicos (galvanoplastia), processos estes que envolvem praticamente a totalidade dos nossos produtos e que não foram tidos em conta no Relatório da Inspecção.

Vejamos:
Os artigos 93º e 182º (substancial e quase literalmente iguais) não contêm a alegação de qualquer facto concreto, enunciam um juízo de valor em matéria de facto, uma proposição de facto que não se presta a ser provada, pois é uma conclusão que se tira indutivamente da experiência comum: o valor da venda de quaisquer mercadorias depende do mercado, do acabamento, da embalagem etc. Portanto, não tinha de ser discriminado como facto provado ou não provado.
A afirmação do artigo 103º, com excepção do segmento final (“processos estes que envolvem praticamente a totalidade dos nossos produtos”). é suficientemente positiva e densa para ser objecto de prova - e mostra-se relevante para a alegação em matéria de facto, da impugnante, de que não havia desperdício de latão susceptível de ser revendido. Como assim, devia ter sido objecto de pronúncia na sentença recorrida pelo que nesta parte é procedente a arguição do vício que subjaz à presente questão e da correspondente nulidade da sentença.
Com o artigo 105º da PI – também aqui um facto concreto, susceptível de prova, pretendia a Impugnante, como se vê lendo o artigo 104º da mesma peça, demonstrar, por esta outra via, que “a totalidade dos desperdícios de latão são reutilizados, não havendo justificação para a presunção de vendas de sucatas omitidas à Contabilidade”.
Assim sendo, impunha-se a discriminação deste facto como provado ou não provado.
O artigo 111º constitui uma conclusão sobre factos concretos que não enuncia (o valor estimado pela AT para as vendas em 2004, por um lado, e o valor dos depósitos em numerário em 2004, por outro.
Como assim, não era susceptível de um juízo de prova pelo que não tinha de ser discriminado como provado ou não provado.
O artigo 204º é redundante relativamente ao 103º, o que basta para que tão pouco se impusesse a sua discriminação com provado ou não provado.
Pelo exposto é apenas parcialmente positiva a resposta a esta questão, nos termos acabados de discriminar, daí decorrendo que a sentença é efectivamente nula, mas apenas na parte correspondente, uma vez que estas omissões na fundamentação de facto não afectam a inteligibilidade da demais fundamentação e do dispositivo da sentença recorrida.

B) De como se impõe conhecer da apelação apesar da nulidade da sentença.
Nos termos do artigo 665º nº 1 do CPC, “ainda que declare nula a decisão que põe tero ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação”.
Por outro lado, da conjugação dos termos dos nºs 1 e 2 c) do mesmo diploma resulta que o tribunal de recurso tem o poder de aditar à discriminação dos factos provados e não provados quaisquer factos atendíveis (cf. artigo 5º) para a decisão da causa.
É isso o que pressupõe e pretende a recorrente na alegação que subjaz à segunda questão acima enunciada, pelo que apreciaremos quaisquer aditamentos para suprimento da parcial nulidade acima reconhecida, a propósito da discussão da questão seguinte.

2ª Questão
Uma vez que a sua prova resultou da prova testemunhal alegada no corpo das alegações devem ser aditados à descriminação da matéria de facto provada os factos constantes dos artigos 93º, 103º, 105º, 111, 182º e 204º da Petição inicial, designadamente que:
a - o valor de venda depende de critérios comerciais distintos em função do produto, mercado, acabamento da embalagem, etc...
b - parte do latão consumido é transformado em pó (polimento) misturado em lamas residuais (vibração) e associado em processos químicos (galvanoplastia), processos estes que envolvem a quase totalidade dos produtos.
c - o volume de vendas estimado em 2004 baixou para limiar inferior aos dos depósitos em numerário. 

A proposição “a”, como já vimos é uma conclusão em matéria de facto, induzida a partir da a experiência comum, pelo que não carece nem deve ser seleccionada como facto provado. Como assim, no que lhe respeita é negativa a resposta à presente questão.
A proposição “c”, como também já vimos, constitui uma conclusão sobre factos concretos que não enuncia (o valor estimado pela AT para as vendas em 2004 e os depósitos em numerário no ano de 2004) pelo que tão pouco pode ser dada como provada.
Quanto à proposição “b”, considerando os depoimentos das testemunhas «TT» (chefe da secção de fundição da Recorrente) e «UU» (director da produção) apenas julgamos provado que na actividade industrial da Recorrente, do polimento do latão resultava que uma parte desta matéria prima se transformava num pó, que acabava misturado numas lamas residuais, que não eram nem são nem vendidas.
A prova deste facto, nestes termos, prejudica a prova de que o tal pó era ainda reaproveitado mediante qualquer processo químico.
Embora não tenha sido incluído nos factos que a Recorrente, na alegação subjacente a esta questão, pretende ver julgados provados, cumpre, para suprir a sobredita nulidade parcial da sentença, proferir decisão sobre se o faco contido no artigo 105º da Petição ficou, ou, não provado.
Recordemos, antes de mais, o artigo em causa:
“105. Conforme resulta do quadro acima, a percentagem de latão consumido na fundição ultrapassa em cerca de 5 p.p. o desperdício de latão gerado.”
Assim, segundo a Petição, a prova de tal facto decorreria do próprio Relatório da inspecção, designadamente do quadro que reproduziu no artigo 104º), o qual tem o seguinte teor:
“99. Por outro lado, para o ano 2004, é conhecida a quantidade de latão efectivamente consumida na fundição, bem como o consumo total de latão, conforma mapa seguinte, do Relatório da Inspecção:”
Ano 2004
1. Latão consumido na fundição - kq257.749
2. Total de latão consumido - kq1.024.004
3. % do total de latão consumido na fundição (1/2)25,2%


Ora, este quadro não inclui qualquer alusão a desperdícios de latão. As quantidades mencionadas referem-se ao latão consumido, isto é, transformado, mediante fundição, ao latão consumido mediante outros métodos de produção e à totalidade do latão consumido, isto é, transformado, pelo que nada daqui resulta quanto a quantidades de desperdício (de latão) gerado no ano de 2004.
Como assim, este facto tem de ser discriminado como não provado.

Tudo visto, decidimos alterar a decisão do Tribunal a quo em mateia de facto, nos termos do artigo 662º nº 1 do CPC, aditando-lhe, com a fundamentação acabada de expor:
O seguinte facto provado:
45º-A
Na actividade industrial da Recorrente, do polimento do latão resultava que uma parte desta matéria prima se transformava num pó que acabava misturado numas lamas residuais, que não eram reaproveitadas nem vendidas.
E o seguinte facto não provado:
48º
“Em 2004 a percentagem de latão consumido na fundição ultrapassou em cerca de 5 p.p. o desperdício de latão gerado.”

3ª Questão
Releva de erro de julgamento em matéria de facto a decisão de dar com não provados os factos 45 e 46 e 47 na discriminação da matéria de facto não provada, pois deviam ter sido julgados provados como provados pelos documentos sociais e depoimentos transcritos no corpo das alegações, sendo-o o artigo 45 com as alterações inerentes à seguinte reformulação:
Os desperdícios gerados no processo produtivo da [SCom01...] eram maioritariamente aproveitados na empresa nos anos de 2002 e 2003 tal como em 2004”;. “A actividade da recorrente gera desperdícios normais, no latão, como limalhas, jorra, pós em resultado do polimento, lamas residuais e associados em processos químicos (por galvanoplastia)”.

Como tem sido uniformemente julgado neste Tribunal, os princípios da oralidade e imediação e da livre apreciação da prova (artigos 590º a 606º e 607º nº 5 do CPC) implicam que o julgamento do recurso em matéria de facto, quanto à apreciação de provas que não sejam prova legal, não é um julgamento, ex novo, em que se possa fazer tábua rasa do julgamento do juiz da 1ª instância que, esse sim viu, ouviu e apreciou com imediação o depoimento de testemunhas e declarantes, antes deve ficar-se pela detecção do erros de julgamento revelados pelas “regras da experiência comum” ou logicamente demonstráveis.
Em coerência com este entendimento e para obviar à perplexidade de não haver um objecto concreto e definido para a crítica da decisão de facto, o artigo 640º do CPC, aqui aplicável ex vi artigo 281º do CPPT, faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, decisão que devia ter sido tomada e meios de prova determinantes, impondo-lhe inclusivamente, no caso da prova verbal gravada (com é o caso) sob pena de “imediata rejeição (…) do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (nº 2 alª a).
Percorridas as alegações e as conclusões do recurso verifica-se que o Recorrente não procede, nem numas nem noutras, à especificação dos meios de prova dos quais decorreria em seu entender, por força da lógica ou da experiência comum, haver erro manifesto da Juiz a qua no sentido de terem ficado provados, em vez de não provados, estes factos. A recorrente apenas transcreve longamente depoimentos de três testemunhas que incidiram, além do mais, sobre estas matérias, enuncia a sua discordância quanto à desvalorização dos mesmos pela Mª Juiz a qua e sua fundamentação, na parte relativa ao tratamento dos desperdícios, mas não destaca expressamente as passagens desses depoimentos e nem identifica os documentos constantes dos autos que em seu entender obrigariam a concluir pela prova destes factos julgados não provados.
Assim sendo, isto é, porque o Recorrente não cumpre com ónus decorrente do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 640º d CPC, o recurso vai rejeitado na parte concernente à presente questão, que, portanto, não será apreciada.

4ª Questão
A sentença recorrida erra no julgamento de direito ao dar como improcedente a alegação de falta de fundamentação, pois o acto impugnando padece efectivamente de falta de fundamentação, violando assim o artigo 77º da LGT?

Antes de mais importa recordar que in casu, uma vez que houve lugar ao procedimento de revisão de matéria tributável previsto no artigo 91º da LGT, ao menos na parte que releva do emprego das regras dos metidos indirectos, a fundamentação a sindicar das liquidações impugnadas, reside não no RIT em si mesmo, mas antes e apenas na decisão que lhe pôs termo, sem prejuízo de o RIT poder relevar enquanto fundamentação desta, se e na medida em que tiver sido objecto de remissão expressa, concreta e definida, ainda que mediata.
Assim, a alegação de falta de fundamentação tem que tomar-se como tendo por objecto aquela decisão.
Conforme resulta dos factos provados 27º e 28º, a fundamentação da decisão de fixação da matéria tributável por parte do Director de Finanças ..., nos termos do artigo 92º nº 6 da LGT, reside, por expressa remissão, no teor do parecer a que alude o artigo 27º, ali transcrito apenas numa mínima parte que constitui a conclusão, e que consta de fs. 104 a 112 do volume 1 do P.A. e também pode ver-se no conjunto de documentos que acompanharam a PI (fs. 200 e sgs).
Lido tal parecer verificamos que, conforme a conclusão transcrita na sentença, o relatório foi invocado e mantido em todo o seu teor no que respeita aos pressupostos do recurso a métodos indirectos, mas não já intacto no que respeita aos pressupostos da quantificação ali efectuada. Com efeito, embora diga que se trata apenas de erros de cálculo, o parecer reconhece erro material nos pressupostos da fixação das quantidades de desperdícios, quer quanto aos anos de 2002 e 2003, quer quanto ao de 2004, isto é, erros na fixação, por aproximação, desse factor determinante do cálculo da matéria tributável a adicionar.
Do anexo ao parecer com as correcções ao relatório convém transcrever o seguinte segmento:
“(…)
1. No relatório da inspecção, para o cálculo dos consumos da matéria-prima - Latão (cavilha e chapa), foram consideradas, para os anos de 2002 e 2003, as seguintes quantidades compradas:
2002 1.098.900 kg
2003 947.901 kg
Porém, no âmbito do procedimento inspectivo, estas quantidades foram fornecidas à Inspectora como sendo as “utilizadas” (consumidas) no processo produtivo. Assim, nos cálculos efectuados no relatório (anos de 2002 e 2003), em vez dos consumos indicados pelo contribuinte foram considerados outros.
2. Foi ainda cometido um erro aritmético relativamente ao exercício de 2004. Nos cálculos das quantidades de sucata de latão não fundida, o valor do desperdício de 15% gerado na injecção (38.662 toneladas) foi considerado em duplicado uma vez que os cálculos foram efectuados com base nos pesos líquidos.
Corrigindo estes valores obtivemos os seguintes valores de vendas omitidas:

Cálculos constantes do relatóriog
% Desperdício CavilhaKgs Cavilha Latão consumidosKqs Sucata geradosPr.Vd.médio Kg sucataVd. Estimadas sucaw
25,0%1.282.392320.598,001,33 €426.395,3í?€
Novos cálculos - após correcção das quantidades consumidas
25,0%1.098.900 274.725,001.33 €365.384,29 €


Com base nos novos valores obtidos as vendas de sucata omitidas em 2002 são as seguintes:
Ano de 2002
Vd. Estimadas sucataVendas declaradasVD omissas
- '
365.384,25 €14.093,47€^ 351.290,78€


3.2 ANO DE 2003
Cálculos constantes do relatório Q
D
% Desperdício CavilhaKqs Cavilha Latão consumidosKqs Sucata geradosPr.Vd.médio Kq sucataVd. Estimadas sucg
25,0%1.036.325259.081,251,15 €297.943?Ai€
Novos cálculos-após correcção das quantidades consumidas
25,0%947.901236.975,251,15 €272.5215,54 €


Com base nos novos valores obtidos as vendas de sucata omitidas em 200T'são as «seguintes:

Ano de 2003
Vd. Estimadas sucataVendas declaradasVD omissas—
272.521,54 €5.066,20€' 267.452,34 €


3.3 ANO DE 2004
Quanto ao ano de 2004, atendendo à listagem de produtos injectados fornecida pela empresa, os cálculos deveriam ter sido efectuados da seguinte forma:
DescriçãoValores (Kqs)
(1) Total Kgs consumidos nos produtos injectados em latão (pesos brutos)257.749
(2) Consumos lingote latão 2004 (Kas)46.018
(3)=(1)-(2) Diferença (peso bruto)211.731

Cálculo da quantidade de sucata gerada na matéria-prima latão, atendendo a que parte dela foi reciclada na própria empresa
DescriçãoValores (Kqs)
(1) Consumos cavilha latão 2004 (Kgs)977.986
(2) % Sucata gerada na estampagem obtida por amostragem25,00%
(3)=(1)x(2) Kgs sucata produzida244.497
(4) Sucata necessária para a injecção211.731
(5)=(3)-(4) Kgs de sucata latão não fundida32.766
DescriçãoValores
(1) Kqs de sucata latão (estampagem) não fundida32.766
(2) Desperdício de 15% gerado na injecção38.662
(3)=(1)+(2) Quantidade total de desperdício (estampagem + injecção)71.428
(4) Preço de venda sucata latão 20041,40 €
(5)=(3)x(4) Valor sucata latão não fundida nem inventariada99.999,2 €
(6) Vendas de sucata latão declaradas2.604,00 €
(7W5)-(6) Vendas de sucata omitidas97.395,20 €

O lucro tributável, após efectuadas as respectivas correcções, é o que de seguida se apresenta:
(…)”
A leitura do Relatório e destes parecer e anexo mostra-nos que são infirmados e corrigidas determinados pressupostos em que o Relatório baseou a sua estimativa da quantidade dos desperdícios geradas na actividade industrial da Recorrente, reconhecendo-se determinados erros de facto em que a Inspecção laborou, quer quanto a 2002 e 2003, quer quanto a 2004, mas são mantidos todo os restantes pressupostos, quer da decisão do recurso à avaliação indirecta, quer da quantificação da matéria tributável, enunciados no relatório.
Segundo se logra depreender do corpo das alegações, a falta de fundamentação residiria no Relatório da inspecção e consistiria no facto de se ter arredondado sem explicação, de 24,7 e 25,1 para 25% a estimativa de desperdícios e em se ter partido dos valores das vendas – variável consoante o mercado, acabamento e embalagem – para o cálculo destas percentagens, não do peso líquido dos produtos, bem como em não se perceber o porquê da exclusão e da inclusão de uns e outros na selecção para a amostragem.
Conferida a Petição inicial verificamos que aí o vício de falta de fundamentação dos actos impugnados reside em serem desconhecidas as razões por que, “do total de produtos sobre os quais foi feita a pesagem e pedida a respectiva ficha técnica, apenas parte deles foi utilizada nos cálculos” (artigo 73º da PI); em não ser “dada qualquer explicação sobre este facto” (artigo 178)
Diz-se ainda no artigo 121, que “era necessário referir e demonstrar as afirmações e outras eventuais indicações que permitissem convencer o destinatário e o douto tribunal da justiça da aplicação dos métodos indirectos”, no artigo 124, que “o Relatório da Inspecção não se baseia em critérios objectivos, mas somente em critérios subjectivos, palpites e "convicções" pessoais, que encerram apenas juízos conclusivos, enunciados de forma vaga e abstracta, que não permitem, ao destinatário, a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo da entidade decidente”; e no artigo 143º, que não existe “decisão expressa, a decidir mudar o rumo da tributação e as normas legais indicadas não prevêem os factos provados em clara violação do Art.° 77° (…) da LGT”.
Quanto a estas alegações a Mª Juiz a qua pronunciou-se em termos que só podem ter o aval deste colectivo atento o que já se disse supra sobre onde reside directa e imediatamente a fundamentação da decisão da avaliação indirecta, da quantificação da matéria tributável e, enfim, dos actos tributários impugnados. Passamos a citar a sentença recorrida:
“Do Relatório consta expressamente que a AT solicitou elementos relativos aos 20 artigos mais facturados e que posteriormente seleccionou mais alguns produtos e que a amostra se baseou em produtos pertencentes às famílias com mais representatividade no total das vendas declaradas, concluindo-se, nos termos do mapa de pág. 47/48 do Relatório, que estas são “puxadores de porta”, “dobradiças de latão /Anilhas para dobradiça de latão”, “Artigos especiais de latão” e “artigos especiais Zamac”.
Em seguida a AT procurou fazer a pesagem de cada um dos produtos dessas famílias.
Do Relatório consta também que por se encontrarem embalados e prontos a ser comercializados, mostrou-se ser inviável a pesagem de alguns produtos. Além disso, “Houve ainda um número reduzido de produtos cujos dados não foram tidos em conta, em virtude de os respectivos pesos líquidos incluírem componentes fabricados com mais do que um tipo de matéria prima ou incluírem um componente adquirido no exterior, sem possibilidade de aferir os respectivos pesos líquidos (...)”- pág. 48 do relatório.
Ou seja: de um posto de vista puramente formal, verifica-se que o relatório contém uma fundamentação suficiente, clara e congruente, relativa ao processo de escolha do universo da amostra, percebendo-se perfeitamente que esta é constituída pelas “famílias” de produtos “mais representativas” dos produtos vendidos pela Impugnante e pelos produtos cuja pesagem se mostrou viável.
Pelo que o vício imputado tem de improceder.
(…)
Quanto à alegada mudança de rumo da tributação, entende-se que a Impugnante pretende referir-se à decisão de aplicar métodos indirectos.
Essa decisão foi tomada no despacho de homologação do Relatório de inspecção, por remissão para os fundamentos deste. Será, pois, no Relatório de inspecção que a impugnante deve procurar e encontrar os fundamentos e critérios utilizados para a aplicação de métodos indirectos, sob pena de - inexistindo ali - se considerar que o procedimento é ilegal.
Para além disso, a Impugnante afirma que a fundamentação não pode ser feita por remissão, mas também aqui está errada, uma vez que “a lei permite a fundamentação por remissão, designadamente através de declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório de fiscalização tributária (n° 1 do artigo 77° da LGT).” - Ac. do STA de 23/04/2014, no processo n.° 01690/13, disponível em www.dgsi.pt.
Já quanto à alegação de falta de fundamentação para a estimativa da percentagem de desperdício em 25%, a apreciação da sentença recorrida foi a seguinte:
Alega também que a decisão final do Relatório de Inspecção não está suficientemente fundamentada por algumas razões, a saber não se apura onde a administração tributária foi alcançar o ponderador de desperdício de 25%, (...) quando os elementos apontam noutro sentido”, “não se se entende porque não iguala as produções de 2002 a 2004, quando o admite e “finalmente porque não pondera os desperdícios, erros e vícios amostrais
O referido ponderador de 25% refere-se apenas à sucata de latão (pág. 71 do relatório).
Do Relatório consta que com base nos dados obtidos na pesagem dos produtos que constituem a amostra acima referida a AT elaborou o anexo 36 (fls. 890 a 892 do PA), no qual calculou as percentagens de desperdício geradas em cada produto controlado ponderadas com o peso das vendas declaradas de cada produto no total das vendas da amostra, concluindo que, conforme quadro de pág. 49 do Relatório, estas percentagens rondam cerca de 25% para o latão em cavilha/chapa.
A AT acolheu a taxa arredondada de 25%.
Também aqui secundamos o apreciado e decidido.
Quanto ao arredondamento, ele explica-se a si mesmo no contexto em que do que se trata não é de quantificar exactamente a matéria tributável, mas sim de convencionar um valor presumidamente próximo da realidade, mas inexacto.
Quanto à explicação do modo como se chegou às percentagens objecto de arredondamento, o iter cognoscitivo e valorativo está tão explicito que a recorrente acaba por discutir precisamente a sua valia técnica.
Pelo exposto, é negativa a resposta esta questão.

5ª Questão
O acto impugnado padece de vício de violação da lei, quanto à mudança do rumo de tributação da tributação directa para a indirecta, conforme Art.°s 87°, n.° 1, al. b), e 88°, ambos da LGT e Art.° 90° do CIVA.

A Recorrente não explicita em ponto algum das conclusões ou do corpo das conclusões o que pretende significar com a conclusão que dita esta questão.
Note-se que desta feita, diversamente do que sucede na petição, já não vem alegada violação do artigo 77º da LGT (fundamentação do acto tributário)
Certo é que a Recorrente não alega o que entende por mudança de rumo da avaliação directa para a indirecta, sendo certo que o emprego das regras da avaliação directa é devido sempre e na medida do possível, mesmo quando se tenha de recorrer à avaliação indirecta (artigo 85º nº 2 da LGT).
Também não explicita, nem logramos cogitar como subentendido, em que é que o recurso às regras da avaliação directa e indirecta numa mesma avaliação da matéria tributável viola as normas legais invocadas.
A invocação desgarrada de normas não chega para se equacionar uma questão.
Como assim, a resposta a esta questão é negativa.

6ª Questão
A sentença recorrida incorreu em erro de direito violando os artigos 19º e 20º do CIVA ao confirmar a desconsideração, para dedução, do IVA suportado pela Impugnante nas aquisições de produtos ao fornecedor “[SCom02...]”, bem como nas aquisições de serviços prestados pelo advogado Dr. «AA» e ainda nas despesas com combustíveis sem indicação dos elementos referentes às viaturas e da empresa adquirente, despesas com combustíveis apresentadas pelos administradores e colaboradores a quem estava atribuído o cartão de abastecimento e despesas de reparações relativas às viaturas que não pertenciam ao activo imobilizado da recorrente?

A Decisão em matéria de facto, quanto a factos não provados, no que respeita às facturas do fornecedor “[SCom02...]” e do Dr «AA», dita a resposta negativa a esta questão quanto às facturas destes dois sujeitos passivos. Com efeito, uma vez que foi julgado não provado que os serviços facturados por um e outro tenham sido prestados à Impugnante e não a terceira pessoa, designadamente o seu administrador, fica prejudicada a dedutibilidade do IVA pela Impugnante por aplicação das próprias normas invocadas.
À reflexão teórica da Mª Juiz a qua sobre o que é e não é IVA dedutível e sobre quem tem o ónus da prova da ligação relevante da despesa facturada com a actividade do sujeito passivo, na qual plenamente nos revemos, acresce que, atentos os termos do artigo 75º nº 2 alª a) da LGT, uma vez verificada a necessidade de se recorrer a métodos indirectos por a contabilidade não espelhar nem permitir quantificar exactamente a matéria tributável, designadamente por haver omissões na contabilidade, o contribuinte perde o benefício da presunção de verdade das suas declarações e dos dados resultantes da sua escrita, passando a ser seu ónus a prova da veracidade de quaisquer factos em que pretenda basear o seu direito à dedução, seja de custos, seja de IVA suportado.
Assim, e uma vez que não se provou que os produtos e serviços da [SCom02...] e do Dr «AA», advogado, tivesse a mínima relação de utilidade com a actividade do sujeito passivo [SCom01...], bem andou a AT e bem andou a sentença recorrida ao desconsiderarem, para dedução, o IVA suportado conforme essas facturas.
Quanto às despesas com combustíveis sem indicação dos elementos referentes às viaturas e da empresa adquirente, despesas com combustíveis apresentadas pelos administradores e colaboradores a quem está atribuído o cartão de abastecimento e despesas de reparações relativas às viaturas que não pertenciam ao activo imobilizado, trata-se de despesas ilustradas em documentos que provam operações cujo IVA tanto pode ser susceptível de dedução como não, consoante tenham efectivamente sido feitas em ordem à prossecução da actividade do sujeito passivo que é a Recorrente.
Dos pressupostos de direito expostos na sentença recorrida e aqui reafirmados e acrescidos decorre que era do sujeito passivo o ónus de alegar e provar os factos que suprissem o objecto “ambíguo” destes documentos.
Na decisão em matéria de facto, tais factos concretos não estão discriminados como provados, desde logo porque não foram, sequer, alegados. Com efeito, nesta matéria a Impugnante limitou-se a sustentar a suficiência dos documentos, sem mais, para o efeito da dedução.
Com assim, é também negativa, em todas as frentes esta última questão.



Conclusão:
Da conjugação das respostada aqui dadas às questões apreciadas resulta a improcedência do recurso.

IV – Custas
As custas do presente recurso ficam a cargo da Recorrente (artigo 527º do CPC).

V- Dispositivo
Tudo visto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso.
Custas, pela Recorrente.

Porto, 23/11/2023

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Maria Celeste Gomes Oliveira
Maria da Conceição Pereira Soares