Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00224/13.0BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/18/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CESSAÇÃO DE CARGO DIRIGENTE; CONTAGEM DE TEMPO; REPOSICIONAMENTO REMUNERATÓRIO; ARTIGO 24.º DA LEI 55-A/2010.
Sumário:1-O exercício continuado de cargos dirigentes por períodos de três anos, em comissão de serviço, em substituição ou em gestão corrente, confere ao respetivo titular o direito à alteração para a ou as posições remuneratórias imediatamente seguintes da respetiva categoria de origem, correspondendo uma alteração a cada período ( art.º 29.º da Lei n.º2/2004, de 15/01, alterada pelas Leis n.º 51/2005, de 30.08 e 64-A/2008, de 31.12).

2-O artigo 24 da Lei n.º 55-A/2010, de 31.12 estabeleceu um regime de natureza imperativa proibitivo da prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias e outros acréscimos remuneratórios dos titulares dos cargos e da generalidade dos órgãos e trabalhadores da Administração Pública.

3- O dirigente da administração local que viu cessadas essas suas funções e que apenas completou o módulo de três anos na posição remuneratória 4.3, nível 25, em fevereiro de 2011, não pode ver contabilizado como tempo de serviço para efeitos de mudança de posição remuneratória, o período de tempo que decorreu entre 01 de janeiro de 2011 e fevereiro de 2011, por a tal obstar o disposto no n.º9 do artigo 24.º da Lei n.º 55-A/2010.

4- O artigo 24.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31.12, não é inconstitucional quando proíbe a prática de atos que consubstanciem revalorizações remuneratórias, como as alterações de posicionamento remuneratório, na medida em não fere nenhum direito adquirido, nem a tutela da segurança na vertente da proteção da confiança.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:F.
Recorrido 1:Município de (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam os Juízes Desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO

1.1. F., residente na Quinta (…) propôs a presente ação administrativa especial contra o Município de (...), com sede na Rua (…), pedindo a condenação do Réu a deferir o pedido que formulou de ser posicionado na 7.ª posição remuneratória, nível 35 (€2.232,32), desde fevereiro de 2011, três (3) anos volvidos desde a sua primeira nomeação do cargo de chefe de divisão, fixando-se um prazo não inferior a 10 dias para cumprimento de tal dever.
Para tanto, alegou, em síntese, que iniciou a sua categoria de Técnico Superior Principal em 25/05/2007, tendo em 1/2/2008, sido integrado no cargo de chefe de divisão em regime de substituição, logo com a categoria de Técnico Superior Assessor, e nela posicionado na posição remuneratória 6.1, nível 32, a que correspondia a remuneração mensal de €2 094,01, em 1/01/2009;
Em 5-08-2008 tomou posse no cargo de chefe de divisão, pelo período de 3 anos, tendo terminado em 4-08-2011, comissão que lhe foi renovada em 05-08-2011, pelo período de 3 anos, e que agora foi cessada.
Sustenta que terminada a comissão de serviço em que se achava investido, deve ser integrado na posição remuneratória correspondente à categoria de assessor (7ª posição- € 2 231,32) porque a 6ª posição (€ 2 025,35) era inferior ao vencimento de assessor (€ 2 094,01);
Ademais, pretende ser indemnizado pelo período de tempo que decorre desde a cessação da comissão de serviço até ao termo para que foi nomeado (4-08-2014), pela diferença salarial entre o cargo de origem e o de dirigente cessado, se houver diferença.
Nesse sentido, alega que o artigo 29.º da Lei n.º 2/2004 de 15/1, na redação da Lei nº 64-A/2008 de 31-12, determinou que o exercício continuado de cargos dirigentes por períodos de três anos, em comissão de serviço, em substituição ou em gestão corrente, conferia ao respetivo titular o direito à alteração para a ou as posições remuneratórias imediatamente seguintes, da respetiva categoria de origem, correspondendo uma alteração a cada período, pelo que, apesar desse preceito legal ter sido revogado pelo artigo 25º nº 2 da L. nº 3-B/10, que entrou em vigor em 29/4/2010, o nº3 deste mesmo artigo 25º manteve-o em vigor para as comissões de serviço que se encontrassem em curso, até à data do seu termo, razão pela qual tem direito ao referido posicionamento.
A seu ver, a entrada em vigor da Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro, cujo artigo 24º vem “congelar - quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal, não pode, de per si “apagar” os efeitos que se produziram na lei anterior, pelo que deve a ação ser julgada procedente.
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1.2. Citado, o Réu contestou, alegando não estarem verificados os pressupostos para a ação de condenação à prática de ato devido, pugnando pela absolvição da instância, ou caso assim se não entenda, pela improcedência da presente ação, por não provada.
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1.3. Foi junto aos autos o processo administrativo, e notificados todos os intervenientes nos termos dos artigos 84.º e 85.º do CPTA.
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1.4. O autor respondeu à matéria de exceção conforme consta de fls. 65 e ss. (processo físico), concluindo como na petição inicial.
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1.5. Proferiu-se despacho saneador, em que se fixou o valor da ação, julgou-se improcedente a exceção invocada, dispensou-se a realização de outras diligências instrutórias e ordenou-se a notificação das partes para alegarem, querendo, o que ambas fizeram.
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1.6. O TAF de Aveiro proferiu decisão que julgou a ação improcedente, constando da mesma o seguinte segmento decisório:
«Decisão:
Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal em julgar improcedente a presente ação administrativa especial e, em consequência, absolvendo-se a entidade demandada dos pedidos formulado pelo Autor.
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Custas a cargo do Autor, nos termos do art. 6.º, n.º 1 do RCP.»
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1.7. Inconformado com o assim decidido, o autor interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida, apresentando as seguintes conclusões:
«1. No âmbito dos presentes autos discute-se a validade/invalidade do indeferimento do pedido do A./Recorrente, no sentido de que cessada a sua comissão de serviço, deve ser posicionado na 7.ª posição remuneratória, nível 35 (€2.232,32) desde Fevereiro de 2011, 3 anos volvidos desde a sua primeira nomeação do cargo do chefe de divisão
2. O Tribunal a quo, chamando à colação o disposto no art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010 de 31/12, a qual entrou em vigor em 01-01-2011, entendeu que o período de tempo de serviço prestado em 2011 não é contado para efeitos de promoção e progressão, em todas as carreiras, cargos e, ou categorias, incluindo as integradas em corpos especiais, bem como para efeitos de mudanças de posições remuneratória ou categoria nos casos em que estas apenas dependam do decurso determinado período de prestação de serviço legalmente estabelecido para o efeito.
3. A justificação é que, atenta a matéria de facto dada como provada, à data em que o ora Recorrente completou os três anos na posição remuneratória 4.3, nível 25 (Fevereiro de 2011) já não relevava, desde 01-01-2011 o tempo de serviço para efeitos de mudança de posição remuneratória, a qual se mostra vedada, cessada que se mostra a sua comissão de serviço, é forçoso concluir que não reúne os requisitos exigidos para dever ser integrado na 7.ª posição remuneratória, nível 35 (€2.231,32).
4. Entende o Recorrente que há uma contradição insanável entre a matéria de facto dada como provada e a aplicação de direito.
5. Efetivamente, com a publicação da Lei do Orçamento de Estado de 2010 (Lei n.º 3-B, de 28 de Abril), pelo n.º 2 do art.º 25 é revogado o artigo 29.º da Lei nº 2/2004, de 15 de Janeiro, alterada pelas Leis n. 51/2005, de 30 de Agosto, e 64-A/2008, de 31 de Dezembro.
6. Contudo o n.º 3 do referido art.º 25.º prevê que disposto no artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, alterada pelas Leis n.º 51/2005, de 30 de Agosto, e 64-A/2008, de 31 de Dezembro, mantém-se aplicável aos titulares dos cargos dirigentes atualmente designados, ainda que em substituição ou em gestão corrente, até ao fim do respetivo prazo, nele não incluindo eventuais renovações posteriores.
7. O n.º 3 do referido artigo mais não é do que um regime transitório, previsto, precisamente para cumprimento do princípio constitucional da proteção da confiança dos cidadãos.
8. Como resulta da matéria de facto dada como provada, desde 01-02-2008 que o ora Recorrente foi nomeado para as funções de Chefe de Divisão, tendo cumprido três períodos de comissão de serviço: Um primeiro período de 01/02/2008 a 04/08/2011; um segundo período de 05/08/2008 a 04/08/2011 e um terceiro período de 05/08/2011 a 31/12/2012 – Veja-se pontos 4), 6) e 7) da matéria de facto dada como provada.
9. Ou seja, à data da entrada em vigor da lei do orçamento de estado para 2010, altura em que foi vedado o direito à alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem, estava em curso já o período que decorreu de 05-08-2008 a 04-08-2011.
10. Pelo que ao caso dos autos mantém-se aplicável o art.º 29.º da Lei n.º 2/2004, por aplicação do regime transitório previsto no n.º 3 do art.º 25 da Lei n.º 3-B, de 28 de Abril.
11. Mas vejamos cronologicamente a situação profissional – comissão de serviço do ora Recorrente:
12. Quando tomou posse como Cargo Dirigente em 01.02.2008, ao abrigo da Lei n.º 2/2004, de 15.01, e de acordo com o n.º 1, 2, 4 e 6 do artigo 29.º tinha direito, findo os 3 anos de Chefia, ao provimento em categoria superior.
13. O n.º 4 do art.º 90.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27.02, no que se refere a Conversão das comissões de serviço diz “Os atuais trabalhadores nomeados em comissão de serviço em outras situações transitam para a modalidade de comissão de serviço com o conteúdo decorrente da presente lei.”
14. Apesar deste preceito legal ter sido revogado pelo artigo 25.º n.º 2 da L. n.º 3-8/10, que entrou em vigor em 29/4/2010, o n.º3 deste mesmo artigo 25.º manteve-o em vigor para as comissões de serviço que se encontrassem em curso, até à data do seu termo, a comissão de serviço deste trabalhador que existia, à data da entrada em vigor daquela Lei n.º 3-8/10, cessou em 4/8/2011, ainda que tivesse sido objeto de renovação;
15. Ou seja, qualquer trabalhador que à data da entrada em vigor da referida lei (29 de abril 2010) estivesse no exercício de cargo de dirigente mantinha o direito de ao fim de 3 anos nesse cargo o direito a alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem, por se efetivar só nessa data.
16. Pretendeu o legislador respeitar os efeitos jurídicos já produzidos, e salvaguardar os efeitos jurídicos a produzir dos cargos dirigentes que em 29 abril estavam designados.
17. Este número 3 em análise refere ainda “até ao fim do respetivo prazo, nele não incluindo eventuais renovações posteriores”.
18. Não deixa dúvidas, que o escopo do legislador foi, de quando terminar a comissão de serviço de cargo de dirigente, se faça a análise temporal se houve ou não 3 anos de comissão de serviço.
19. Aplica-se ainda o artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, alterada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto e 64 -A/2008, de 31 de Dezembro.
20. Se não, o trabalhador perde direito à alteração da posição remuneratória, em virtude do artigo 29.ºda lei n.º2/2004 ter sido revogado.
21. É de concluir que, em face das disposições legais que vêm de enumerar-se, o mesmo trabalhador tem direito, cessada que se mostra a sua comissão de serviço, a ser posicionado na 7.ª posição remuneratória, nível 35 (€ 2 231,32), desde fevereiro de 2011, 3 anos volvidos desde a sua primeira nomeação do cargo de chefe de divisão.
22. Sucede que, importa chamar à colação o disposto na parte final do n.º 4 do artigo 24.º da Lei. nº 55-A 12010 de 31112, que “São vedadas as promoções, independente da respetiva modalidade, ainda que os interessados já reúnam as condições exigíveis para o efeito a data da entrada em vigor da presente Lei, exceto se, nos termos legais gerais aplicáveis até aquela data, tais promoções devessem obrigatoriamente ter ocorrido em data anterior aquela.”, pelo que o reposicionamento legal na carreira tem efeitos desde 01/02/2008 ( data de inicio da Comissão de Serviço).
23. Mesmo apesar da entrada em vigor de um novo Orçamento de Estado - Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro, cujo artigo 24.º vem “congelar – quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal – os seus preceitos não podem, de per si “apagar” os efeitos que se produziram na lei anterior.
24. O Estado de Direito agrega os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos cidadãos, e estes consagrados na Constituição da República Portuguesa, representam axiologicamente a segurança que qualquer cidadão tem que ter necessariamente para conformar de forma responsável a sua vida em sociedade.
25. Todo o cidadão cria expetativas de vida (social, profissional, etc ...) exigindo do Estado a elaboração de leis claras e densas e que as mesmas não violem a confiança que nas mesmas depositou. Ou seja, tem que a haver previsibilidade na segurança jurídica que, fundamentalmente se reconduz às exigências de certeza e calculabilidade, por parte dos cidadãos, em relação aos efeitos jurídicos das normas.
26. É comum na doutrina portuguesa, apontar como subprincípios do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, a proibição de pré-efeitos das leis e a proibição de leis retroativas.
27. Pegando neste último subprincípio, qualquer cidadão cria subjetivamente uma dimensão que lhe legitima a garantia da confiança na permanência das respetivas situações jurídicas plasmadas numa determinada lei.
28. E, qualquer Estado de Direito tem o dever de procurar a durabilidade e a permanência das leis no tempo, no sentido de garantir na ordem a paz jurídico-social.
29. Portanto, isso implica “à partida” uma proibição da retroatividade das leis, mas tal não signifique a total e absoluta impossibilidade de retroatividade das leis.
30. Com efeito, uma técnica legislativa é quando a lei não pode ter eficácia imediata diz-se que existe a necessidade de direito transitório.
31. Além disso, de acordo com o n.º 1 do artigo 12.º do Código Civil (Aplicação das leis no tempo. Princípio Geral): A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
32. Toda a lei tem uma exigência de adequação, de necessidade e proporcionalidade.
33. Ora, a aplicar-se o artigo “congelatório” do Orçamento de Estado 2011, seria uma medida “desmedida”, desajustada e excessiva de desproporcionalidade em relação às expetativas dos resultados verificados no trabalhador.
34. O fim que Orçamento de Estado 2005 pretende atingir não fica beliscado, por o trabalhador ver os seus direitos reconhecidos, pois o contrário seria uma clara violação do princípio material da proibição do excesso.
35. Conclui-se no sentido de dever ser deferido o pedido do A. no sentido de ser posicionado na 7.ª posição remuneratória nível 35 (€2.231,32) desde Fevereiro de 2011, anos volvidos desde a primeira nomeação do cargo de chefe de divisão, data em que se efetivou o período de 3 anos desde a nomeação com direitos adquiridos de ser reposicionado na antiga carreira como Técnico Superior Assessor, a qual em 01-01-2009, deveria ter sido convertida de acordo com a nova Lei na Posição Remuneratória 6.1 e nível 32.
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1.8. O apelado não contra-alegou.
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1.9. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público emitiu parecer, pugnando pela improcedência da apelação.
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1.10. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.2. Assentes nas enunciadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem resumem-se a saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento quanto à matéria de direito decorrente:
(i) da violação do disposto nos artigos 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro e 25.º, n.º 3, da Lei n.º 3-6/2010, de 28 de abril;
(ii) da inconstitucionalidade da interpretação efetuada sobre o art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010, por afronta ao princípio constitucional da proteção da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito Democrático, plasmado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO
3.1. A 1.ª Instância deu como provados os seguintes factos:
«1) O A. foi admitido pela Câmara Municipal de (...) através de Contrato a Termo Certo, desde 01/03/2000 até 09/04/2001.
2) Posteriormente celebrou um Contrato Administrativo de provimento, desde 10/04/2001 até 09/07/2001.
3) Vindo depois a ter a seguinte carreira profissional no quadro de pessoa da R. assim discriminado:
I. Técnico Superior de 2ª Classe, desde 10/07/2001 até 09/10/2003
II. Técnico Superior de 1ª Classe, desde 10/10/2003 até 24/05/2007
III. Técnico Superior Principal, desde 25/05/2007.
4) Por nomeação veio ainda a desempenhar as seguintes funções de dirigente:
a. -Nomeado como Chefe de Divisão em Regime de Substituição, desde 01/02/2008 até 04/08/2008;
b. -Nomeado como Chefe de Divisão em Comissão de Serviço, desde 05/08/2008 até 04/08/2011, (logo na Ex categoria de Assessor desde 01/02/2008, face ao exercício de funções em cargo de Dirigente de forma ininterrupta até ao fim da Comissão de Serviço);
c. -Chefe de Divisão em Comissão de serviço desde 05/08/2011 até 31/12/2012, data em que foi exonerado do cargo por despacho da Presidência da C. M. Tabuaço.
5) Em 1/2/2008, foi integrado no cargo de chefe de divisão em regime de substituição, logo com a categoria de Técnico Superior Assessor, e nela posicionado na posição remuneratória 6.1, nível 32, a que correspondia a remuneração mensal de € €2 094,01, em 1/01/2009.
6) Em 5-08-2008 tomou posse no cargo de chefe de divisão, pelo período de 3 anos, tendo terminado em 4-08-2011.
7) Em 05-08-2011 foi-lhe renovada a comissão de serviço, pelo período de 3 anos, que veio a cessar.
8) O A. viu cessar por despacho de 28 de Dezembro de 2012 e publicado em 1 de Fevereiro de 2013, a comissão de serviço no cargo de direção intermédia de 2º grau divisão deste Município em que se encontrava investido por Publicação em Diário da Republica de 1/02/2013, por Despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de (...) de 28/12/2012.
9) O A. formulou o pedido à Entidade demandada em 11/03/2012 – cfr. doc. 1 de fls. 65 e ss dos autos.
10) O mesmo tinha sucedido por requerimento em 19/01/2012 - cfr.doc. 2 de fls. 65 e ss dos autos.
11) O A. foi notificado em 06/03/2013 do parecer emitido pelo consultor jurídico da Câmara de Tabuaço, para o exercício do direito de audiência prévia- cfr. doc. 3 de fls. 65 e ss dos autos.
12) O A. exerceu o direito de audiência, juntando um parecer por si solicitado - cfr. docs. 4 e 5 de fls. 65 e ss dos autos.
13) Em 27/03/2014 foi emitido parecer sobre o reposicionamento na carreira do A pela CCDR-N – cfr. fls. 144 dos autos.
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III.B.DE DIREITO
b.1 Da violação do disposto nos artigos 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro e 25.º, n.º 3, da Lei n.º 3-6/2010, de 28 de abril.
3.2.O Autor, ora Apelante, moveu a presente ação de condenação à prática de ato devido contra o Apelado, pretendendo obter a sua condenação a posicioná-lo na 7.ª posição remuneratória, nível 35 (€2.232,32), desde fevereiro de 2011, data em que se completou o período de 3 anos desde a sua nomeação em comissão de serviço para o exercício de funções dirigentes.
3.2.1.O Tribunal a quo julgou a ação improcedente, no essencial, por considerar que não obstante o regime legal decorrente do art.º 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro e 25.º, n.º 3, da Lei n.º 3-6/2010, de 28 de abril, por força do disposto no art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010 de 31/12, que entrou em vigor no dia 01 de janeiro de 2011, o período de tempo de serviço prestado a partir de 01 de janeiro de 2011, tal como decidiu a Administração, não podia ser considerado para os efeitos pretendidos pelo apelante. Por conseguinte, atendendo ao facto de o apelante apenas ter completado os três anos na posição remuneratória 4.3, nível 25, em fevereiro de 2011, ou seja, não tendo aquele módulo de tempo de três anos no exercício de funções dirigentes decorrido antes do dia 01 de janeiro de 2011, julgou não estarem reunidos os requisitos exigidos para que o apelante fosse reposicionado em termos remuneratórios.
3.2.2.O Apelante não se conforma com a decisão assim proferida, pretendendo a sua revogação e substituição por outra que entenda ser-lhe aplicável o art.º 29.º da Lei n.º 2/2004, por força do regime transitório previsto no n.º 3 do art.º 25 da Lei n.º 3-B, de 28 de Abril, sob pena de violação do princípio constitucional da Proteção da Confiança ínsito no princípio do Estado de Direito Democrático plasmado no art.º 2.º da Constituição, e que, nessa conformidade, se condene o apelado a deferir o seu pedido no sentido de ser posicionado na 7.ª posição remuneratória nível 35 (€2.231,32) desde fevereiro de 2011, data em que se efetivou o primeiro período de 3 anos desde a sua nomeação para o exercício de funções dirigentes, com direitos adquiridos de ser reposicionado na antiga carreira como Técnico Superior Assessor, a qual em 01-01-2009, deveria ter sido convertida de acordo com a nova Lei, na Posição Remuneratória 6.1 e nível 32.
De acordo com a sua tese, quando tomou posse no cargo dirigente, em 01.02.2008, ao abrigo da Lei n.º 2/2004, de 15.01, e de acordo com o n.º 1, 2, 4 e 6 do artigo 29.º tinha direito, findo os 3 anos de Chefia, ao provimento em categoria superior. Assim, atendendo a que no momento da entrada em vigor da lei do orçamento de estado para 2010, que vedou o direito à alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem, estava em curso o período de exercício de funções dirigentes que decorreu de 01.02.2008 a 04-08-2011, era-lhe aplicável o regime do art.º 29.º da Lei n.º 2/2004, por força do regime transitório previsto no n.º 3 do art.º 25 da Lei n.º 3-B, de 28 de Abril, pelo que lhe assistia o direito ao reposicionamento remuneratório, uma vez cessadas as funções dirigentes, a contar do momento em que tivesse completado os 3 anos no exercício de funções dirigentes, ou seja, desde fevereiro de 2011, tinha o direito adquirido de ser reposicionado na antiga carreira como Técnico Superior Assessor, a qual em 01-01-2009, deveria ter sido convertida de acordo com a nova Lei na posição remuneratória 6.1 e nível 32.
Vejamos.
3.2.3. Conforme se extrai dos factos apurados, o apelante, em 25/05/2007 passou a deter a categoria de técnico superior principal, tendo sido nomeado em comissão de serviço para exercer as funções de chefe de divisão, em regime de substituição, entre 01/02/2008 a 04/08/2008, e nomeado chefe de divisão de 05/08/2008 a 04/08/2011, comissão que foi renovada em 05/08/2011, vindo a ser exonerado em 31/12/2012, por despacho do Presidente da C. M. Tabuaço.
Precise-se que com a entrada em vigor da Lei 12-A/2008, conhecida como Lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações (LCVR) operou-se uma profunda transformação nos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas (art.º 1.º, n.º 1), passando a referida lei a definir também o regime jurídico – funcional aplicável a cada modalidade de constituição da relação de emprego público (art.º 1.º, n.º2). Quanto ao seu âmbito subjetivo, a LVCR é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas independentemente da modalidade de vinculação e de constituição da relação jurídica de emprego público, ao abrigo da qual exercem as respetivas funções (art.º 2, n.º1).
A LVCR foi adaptada à Administração Local pelo Decreto-Lei nº 209/2009, de 3 de setembro, e por força do disposto no art.º 95.º, n.º1, al. a) os trabalhadores que, como o apelante, se encontravam integrados nas carreiras de técnico superior de regime geral transitaram para a carreira geral de técnico superior, tendo aquelas sido extintas pelo DL n.º 121/2008, de 11/07 (publicado ao abrigo do n.º3 do art.º 95 da LVCR), de modo que, desde 01 de janeiro de 2009, a carreira geral de técnico superior passou a ter apenas a categoria de “Técnico Superior” , ou seja passou a ser uma carreira unicategorial, que se desenvolve por 14 posições remuneratórias e 57 níveis remuneratórios. O novo sistema de carreiras extinguiu o anterior regime de carreiras (vide nº 1 do art.º 1º do D. L. nº 121/2008, de 11/7) com efeitos a 01/01/2009, data em que os trabalhadores desta e de outras carreiras foram posicionados no nível e posição remuneratória correspondente à carreira, categoria e escalão que detinham no anterior sistema.

A respeito do reposicionamento remuneratório, dispunha o artigo 104.º da Lei 12-A/2008, o seguinte: «1 – Na transição para as novas carreiras e categoria, os trabalhadores são reposicionados na posição remuneratória a que corresponda nível remuneratório cujo montante pecuniário seja idêntico ao montante pecuniário correspondente à remuneração base a que atualmente têm direito, ou a que teriam por aplicação da alínea b) do n.º 1 do artigo 112.º, nela incluindo adicionais e diferenciais de integração eventualmente devidos.
2 – Em caso de falta de identidade, os trabalhadores são reposicionados na posição remuneratória, automaticamente criada, de nível remuneratório não inferior ao da primeira posição da categoria para a qual transitam cujo montante pecuniário seja idêntico ao montante pecuniário correspondente à remuneração base a que atualmente têm direito, ou que teriam por aplicação da alínea b) do n.º 1 do artigo 112.º.
3 – No caso previsto no número anterior, os trabalhadores, até ulterior alteração do posicionamento remuneratório, da categoria ou da carreira, mantêm o direito à remuneração base que vêm, ou viriam, auferindo, a qual é objeto de alteração em idêntica proporção à que resulte da aplicação do n.º 4 do artigo 68.º. 4 – (Revogado).
5 – No caso previsto no n.º 2, quando, em momento ulterior, os trabalhadores devam alterar a sua posição remuneratória na categoria, e da alteração para a posição seguinte resultasse um acréscimo remuneratório inferior a um montante pecuniário fixado na portaria referida no n.º 2 do artigo 68.º, aquela alteração tem lugar para a posição que se siga a esta, quando a haja.
6 – O montante pecuniário referido no número anterior pode ser alterado na sequência da negociação prevista no n.º 4 do artigo 68.º».
No que se refere à conversão das comissões de serviço, o n.º 4 do art.º 90.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27.02, estabeleceu que “Os atuais trabalhadores nomeados em comissão de serviço em outras situações transitam para a modalidade de comissão de serviço com o conteúdo decorrente da presente lei.”
3.2.4. No caso, tendo o apelante sido provido na categoria de “Técnico Superior Principal” em 25/05/2007, segundo as regras do anterior sistema de carreiras teria direito a ser promovido à categoria de “Técnico Superior Assessor”, em 24/5/2010 (vide artº 4º do D.L. nº 404-A/98, de 18/12), o que sucederia se aquele sistema estivesse em vigor em 2010.
Pretende o apelante que em 01/01/2009, de acordo com a LVCR, devia ter sido reposicionado na antiga carreira como “Técnico Superior Assessor”, na posição remuneratória 6.1 e nível 32.
Mas sem razão, uma vez que a 01/01/2009, a categoria que o apelante detinha era a de técnico superior principal, pelo que, só se tivesse preenchido o módulo de tempo necessário ao abrigo da anterior legislação para ser promovido à categoria de técnico superior assessor, é que a 01/01/2009, lhe assistia o direito a ser colocado na nova tabela remuneratória numa posição remuneratória correspondente ao vencimento dessa categoria. Porém, como supra se disse, o módulo de tempo necessário para que o apelante pudesse ser promovido àquela categoria de técnico superior assessor, ao abrigo da anterior legislação e caso aquela se mantivesse vigente, só se completaria a 24/05/2010, pelo que não tem razão o apelante quando sustenta diferente entendimento.
3.2.5. No período que decorreu entre 01.02.2008 e 31.12.2012, o apelante exerceu funções dirigentes na Câmara Municipal de (...). O estatuto do pessoal dirigente em vigor, à data, constava da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, aplicável à administração local ex vi art.º 1.º, n.º 1, do DL n.º 93/2004, de 20 de abril, alterado e republicado em anexo ao DL n.º 104/2006, de 7 de junho.
Dispunha o art.º 29.º da referida Lei, na sua versão originária, que:
«1 - O tempo de serviço prestado no exercício de cargos dirigentes conta, para todos os efeitos legais, como prestado no lugar de origem, designadamente para promoção e progressão na carreira e na categoria em que o funcionário se encontra integrado.
2 - Quando o tempo de serviço prestado em funções dirigentes corresponda ao módulo de tempo necessário à promoção na carreira, o funcionário tem direito, findo o exercício de funções dirigentes, ao provimento em categoria superior com dispensa de concurso, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado naquelas funções.
3 - A aplicação do disposto no número anterior aos titulares de cargos dirigentes integrados em corpos especiais ou em carreiras de regime especial depende da verificação de todos os requisitos fixados nas respetivas leis reguladoras para o acesso na carreira.
4 - O tempo de serviço prestado em regime de substituição e de gestão corrente, nos termos da presente lei, conta para efeitos do disposto no n.º 2.
5 - No caso de ter ocorrido mudança de categoria ou de carreira na pendência do exercício do cargo dirigente, para efeitos do cômputo do tempo de serviço referido no n.º 2 não releva o tempo prestado em funções dirigentes que tenha sido contado no procedimento que gerou a mudança de categoria ou de carreira.
6 - Os funcionários que beneficiem do disposto no n.º 2 têm direito à remuneração pela nova categoria e escalão desde a data da cessação do exercício de funções dirigentes.»
Entretanto, o diploma relativo ao estatuto do pessoal dirigente foi alterado pela LOE n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, passando o art.º 29.º, agora sob a epígrafe «Direito à alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem» a dispor do seguinte modo:
«1 - O exercício continuado de cargos dirigentes por períodos de três anos, em comissão de serviço, em substituição ou em gestão corrente, confere ao respetivo titular o direito à alteração para a ou as posições remuneratórias imediatamente seguintes da respetiva categoria de origem, correspondendo uma alteração a cada período.
2 - A aplicação do disposto no número anterior a dirigentes integrados em carreiras especiais depende da verificação de outros requisitos, fixados na lei especial que estruture a respetiva carreira, que não sejam relacionados com o tempo de permanência nas posições remuneratórias e ou com a avaliação do desempenho correspondente.
3 - Quando, no decurso do exercício do cargo dirigente, ocorra uma alteração do posicionamento remuneratório na categoria de origem em função da reunião dos requisitos previstos para o efeito na lei geral, ou alteração de categoria ou de carreira, para efeitos de cômputo dos períodos referidos no n.º 1, releva apenas, sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tempo de exercício subsequente a tais alterações.
4 - Quando a alteração de categoria ou de carreira pressuponha a reunião de requisito relativo a tempo de serviço, no cômputo dos períodos referidos no n.º 1, só não releva o tempo de exercício de cargos dirigentes que tenha sido tomado em consideração no procedimento que gerou aquela alteração.
5 - O direito à alteração de posicionamento remuneratório é reconhecido, a requerimento do interessado, por despacho do dirigente máximo do órgão ou do serviço de origem, precedido de confirmação dos respetivos pressupostos pela secretaria - geral ou pelo departamento ministerial competente em matéria de recursos humanos.
6 - A remuneração pelo novo posicionamento remuneratório tem lugar desde a data da cessação do exercício do cargo dirigente
Em sede de direito transitório e visando regular a sucessão de aplicação temporal das diferentes redações, o art.º 29º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, estabeleceu o seguinte regime:
3 - O disposto na anterior redação dos artigos 29.º e 30.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de agosto, é tomado em consideração para efeitos do reposicionamento remuneratório do dirigente na categoria, nos termos do artigo 104.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, quando ainda não fosse titular da categoria superior da respetiva carreira.
4 - O tempo de exercício de cargo dirigente que não possa ser tomado em consideração, nos termos do número anterior, por razão diferente da de o dirigente ser titular da categoria superior da respetiva carreira, é contado para efeitos do disposto no artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, alterada pela presente lei.
[…]
9 - Sem prejuízo do disposto nos n. os 7 e 8, as alterações ora efetuadas às normas estatutárias do pessoal dirigente não se aplicam às comissões de serviço que se encontrem em curso, as quais se mantêm nos seus precisos termos, designadamente no que respeita à remuneração.

10 - O disposto no presente artigo prevalece sobre quaisquer leis especiais.”
Acontece que por força do disposto no art.º 25.º, n.º2 da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, que aprovou o Orçamento de Estado para 2010, o artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterado pelas Leis n.º 51/2005, de 30 de agosto, e 64-A/2008, de 31 de dezembro, foi revogado.

No entanto, importa ter em conta o disposto no n.º3 do art.º 25.º da citada LOE para 2010, que em ordem à salvaguarda de situações existentes, assegurou que «[o] disposto no artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pelas Leis n.ºs 51/2005, de 30 de agosto, e 64-A/2008, de 31 de dezembro, [se mantinha] aplicável aos titulares dos cargos dirigentes [então] designados, ainda que em substituição ou em gestão corrente, até ao fim do respetivo prazo, nele não incluindo eventuais renovações posteriores».
Assim, por força do n.º3 do art.º 25.º da citada Lei, o regime prescrito no artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, alterada pelas Leis n.º 51/2005, de 30 de Agosto, e 64-A/2008, de 31 de dezembro, manteve-se aplicável aos titulares dos cargos dirigentes designados, ainda que em substituição ou em gestão corrente, até ao fim do respetivo prazo, nele não se incluindo eventuais renovações posteriores, tratando-se, por conseguinte, de um regime transitório.
Assim, resulta do disposto no art.º 29.º da Lei n.º2/2004, de 15/01, alterada pelas Leis n.º 51/2005, de 30.08 e 64-A/2008, de 31.12, que o exercício continuado de cargos dirigentes por períodos de três anos, em comissão de serviço, em substituição ou em gestão corrente, confere ao respetivo titular o direito à alteração para a ou as posições remuneratórias imediatamente seguintes da respetiva categoria de origem, correspondendo uma alteração a cada período.

3.2.6.No caso em análise, se atendêssemos exclusivamente ao regime decorrente do art.º 29º da Lei n.º 2/2004 de 15/01, tendo em conta que o apelante completou o primeiro período de 3 anos de exercício ininterrupto de funções dirigentes no dia 31 de janeiro de 2011, no âmbito de uma comissão de serviço que existia à data da entrada em vigor da citada Lei nº 3-B/10 de 28/04, que então estava em curso e que foi objeto de renovação, cessado o exercício de funções dirigentes, teria direito a ser posicionado na 5ª posição remuneratória, nível 27 (€ 1.819,38), desde fevereiro de 2011, ou seja, desde o momento em que completou o módulo de tempo de serviço de 3 anos no exercício de funções dirigentes a contar da sua primeira nomeação no cargo de chefe de divisão.
Porém, não pode deixar de se atender ao disposto na Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, que aprovou o orçamento de Estado para 2011 ( lei de valor reforçado) e que entrou em vigor no dia 01 de janeiro de 2011, em cujo artigo 24.º, sob a epígrafe “Proibição de valorizações remuneratórias”, se estabeleceu que:
«1- É vedada a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do Artigo 19.º.
2 - O disposto no número anterior abrange as valorizações e outros acréscimos remuneratórios, designadamente os resultantes dos seguintes atos:
a) Alterações de posicionamento remuneratório, progressões, promoções, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos;
(…)
4- São vedadas as promoções, independentemente da respetiva modalidade, ainda que os interessados já reúnam as condições exigíveis para o efeito à data da entrada em vigor da presente lei, exceto se, nos termos legais gerais aplicáveis até àquela data, tais promoções devessem obrigatoriamente ter ocorrido em data anterior àquela.
(…)
9- O tempo de serviço prestado em 2011 pelo pessoal referido no n.º 1 não é contado para efeitos de promoção e progressão, em todas as carreiras, cargos e, ou, categorias, incluindo as integradas em corpos especiais, bem como para efeitos de mudanças de posição remuneratória ou categoria nos casos em que estas apenas dependam do decurso de determinado período de prestação de serviço legalmente estabelecido para o efeito
(…)».
Por força do disposto na citada norma da Lei nº 55-A/2010, de 31/12, passou a ser proibida a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias e outros acréscimos remuneratórios dos titulares dos cargos e demais pessoal identificado no nº 9 do artigo 19º ( a generalidade dos órgãos e trabalhadores da Administração Pública), entre os quais, se incluem os cargos dirigentes da administração local ( vide alínea p)).
Trata-se de um regime legal a que foi atribuída natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas legais ou convencionais, especiais ou excecionais, que disponham diferentemente, não podendo ser afastado ou modificado pelas mesmas, (n.º 16 do art.º 24º da Lei 55-A/2010), e que comina com nulidade os atos praticados em violação do disposto nesse normativo ( cfr. n.º 14º do art.º 24º da Lei 55- A/2010), ou seja, que comina com a mais grave das invalidades quaisquer atos que traduzam alterações de posicionamento remuneratório, progressões, promoções, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos.
O n.º 9 do art.º 24.º dessa Lei determinou que o tempo de serviço prestado em 2011 não é contado para efeitos de promoção e progressão, em todas as carreiras, cargos e, ou, categorias, incluindo as integradas em corpos especiais, bem como para efeitos de mudanças de posição remuneratória ou categoria nos casos em que estas apenas dependam do decurso de determinado período de prestação de serviço legalmente estabelecido para o efeito.
A respeito desta norma, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15.05.2019, prolatado no processo n.º 12917/17.9T8.LSB.L1.S1, em cujo sumário se afirma que:
“I - Nas Leis dos Orçamentos do Estado de 2011 a 2016, foi vedada a prática de quaisquer factos que consubstanciassem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal nelas identificado, bem como se impôs, imperativamente, que o tempo de serviço prestado durante esse período, não é contado para efeitos de promoção e progressão, em todas as carreiras, cargos e ou categorias, também para efeitos de mudanças de posição remuneratória ou categoria nos casos em que estas apenas dependam do decurso de determinado período de prestação de serviço.
II - As mencionadas medidas proibitivas, tendo sido aplicadas aos trabalhadores das empresas públicas de capital exclusiva ou maioritariamente público, das entidades públicas empresariais e das que integram o sector empresarial regional e municipal, foi aplicada, também, aos trabalhadores com contrato individual de trabalho ao serviço da “AA, S. A.”
Na situação vertente, resultando demonstrado que o apelante apenas completou 3 anos na posição remuneratória 4.3, nível 25, em fevereiro de 2011, em virtude do regime legal imperativo previsto no art.º 24.º, n.º 9 da Lei 55-A/2010, o período de tempo que decorreu entre 01 de janeiro de 2011 e fevereiro de 2011 não pode ser contabilizado para o preenchimento do módulo de tempo de três anos necessário como tempo de serviço para efeitos de mudança de posição remuneratória. E sendo assim, ao apelante não assiste o direito que reivindica.
Note-se que estas proibições se mantiveram em vigor nos anos seguintes: (i) no ano de 2012 por efeito do artº. 20º da Lei nº 64-B/2011 de 30/12; (ii) no ano de 2013 por efeito do artº. 35º da Lei nº 66-B/2012 de 31/12; (iii) no ano de 2014 por efeito do artº. 39º da Lei nº 83-C/2013 de 31/12; no corrente ano de 2015 por efeito do artº. 38º da Lei nº 82-B/2014 de 31/12; no ano de 2016, por efeito do art.º 18.º da Lei nº 7-A/2016, de 30.03 e no ano de 2017, por efeito do art.º 19.º da Lei n.º 42/2016, de 28.12.
Diferente seria a situação do apelante se o referido módulo de tempo de três anos se tivesse completado em momento anterior ao dia 01 de janeiro de 2011, caso em que, essa situação teria “enquadramento propício na exceção prevista no nº4 do artigo 24º da Lei 55-A/2010” Cfr. Parecer da Provedoria de Justiça, respeitante a trabalhadores integrados na Carreira Docente, a que se alude nos Ac. do TCAN, de 04.12.15, proc.00352/12.0BEAVR e de 08.01.2016, proc. n.º 00960/12.9BEAVR., onde se estabelece que “São vedadas as promoções, independentemente da respetiva modalidade, ainda que os interessados já reúnam as condições exigíveis para o efeito à data da entrada em vigor da presente lei, exceto se, nos termos legais gerais aplicáveis até àquela data, tais promoções devessem obrigatoriamente ter ocorrido em data anterior àquela” , onde, não se incluem as situações relativas a progressões.
Porém na situação em equação, o apelante não completou o módulo de tempo de três anos antes do dia 01 de janeiro de 2011, pelo que, por força do disposto no art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010, não pode beneficiar do direito ao reposicionamento remuneratório a que teria direito por aplicação estrita do regime prescrito no artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, alterada pelas Leis n.º 51/2005, de 30 de Agosto, e 64-A/2008, de 31 de dezembro e mantida em vigor nos termos do n.º3 do art.º 25.º Lei nº 3-B/10 de 28/04.

Por conseguinte, como bem concluiu o Tribunal a quo, o apelante, não reúne os requisitos exigidos para ver alterada a sua posição remuneratória na referida data.
Termos em que soçobram os invocados fundamentos de recurso.
*
b.2. Da inconstitucionalidade da interpretação efetuada sobre o art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010, por afronta ao princípio constitucional da segurança e da proteção da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito Democrático, plasmado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa.
3.3. O apelante sustenta (vide conclusões 23.ª a 34.ª) que apesar da entrada em vigor da Lei 55-A/2010, de 31 de dezembro, cujo artigo 24.º vem “congelar” quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal, os seus preceitos não podem, de per si “apagar” os efeitos que se produziram na lei anterior, o que violaria os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos cidadãos, consagrados na Constituição da República Portuguesa, adiantando que o princípio da segurança e da proteção da confiança têm como subprincípios a proibição de pré-efeitos das leis e a proibição de leis retroativas.
Acrescenta que de acordo com o n.º 1 do artigo 12.º do Código Civil, a lei só dispõe para o futuro pelo que, ainda que lhe seja atribuída eficácia retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular. Daí que, aplicar-se o artigo “congelatório” do Orçamento de Estado 2011, seria uma medida “desmedida”, desajustada e excessiva de desproporcionalidade em relação às expetativas dos resultados verificados no trabalhador.
Mas sem razão
Como se sabe, por força do “Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF)” celebrado, em 2011, entre as autoridades portuguesas, a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional (FMI), foi necessário implementar certas medidas, conhecidas como «medidas de austeridade», cujos efeitos se fizeram sentir durante vários anos, de modo que, como vimos, nas Leis Orçamentais de 2011 a 2017, foi vedada a prática de quaisquer factos que consubstanciassem valorizações remuneratórias do pessoal nelas identificado, nomeadamente, as alterações ao posicionamento remuneratório, progressões, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos. Nesse sentido, determinou-se no n.º9 do art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010 e nas correspondentes normas das Leis Orçamentais seguintes, que o tempo de serviço prestado durante esse período, não é contado para efeitos de promoção e progressão, em todas as carreiras, cargos e ou categorias, incluindo as integradas em corpos especiais, bem como para efeitos de mudanças de posição remuneratória ou categoria nos casos em que estas apenas dependam do decurso de determinado período de prestação de serviço legalmente estabelecido para o efeito. Essas normas, também como já se referiu, estabeleceram um regime imperativo, prevalecendo sobre quaisquer outras normas legais ou convencionais, em contrário, não podendo ser afastado ou modificado pelas mesmas.
Contrariamente ao entendimento do apelante, a interpretação que a 1.ª Instância fez do artigo 24.º da citada Lei, não incorpora nenhuma violação ao princípio da segurança jurídica na vertente da proteção da confiança ínsito no principio do Estado de Direito Democrático ( artigo 2.º da Lei Fundamental).
A propósito do artigo 1.º, n.º 1, da Lei n.º 43/2005, de 29 de agosto, em que também se estipula que determinado período temporal não contava para efeitos de progressão, em todas as carreiras, cargos e categorias, incluindo as integradas em corpos especiais, dos funcionários públicos, e que, tem inegáveis semelhanças com a situação em equação, o Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 12/2012, de 12 de janeiro de 2012, escreveu o seguinte:
(…) b) Princípio da segurança jurídica na vertente da confiança:
«O Tribunal já afirmou que a lei pode suspender uma atualização salarial sem que ocorra violação do princípio da confiança. Diz o Acórdão n.º 237/98 (publicado no Diário da República, IIª Série, de 17-06-1998):
“Ao invés do que salientam os ora recorridos e a decisão judicial aqui sob recurso, a Lei nº 63/90 não afetou quaisquer "direitos adquiridos". Com efeito, não houve nenhum retrocesso remuneratório, apenas se suspendeu uma esperada atualização, ou seja, apenas se impediu um progresso.
(…)
Não implicando as normas dos nºs 1 e 2 do artigo 1º da Lei nº 63/90 uma lesão de um "direito" dos beneficiários do aumento de 56% em 1990 que não tiveram aumentos de 18% e 14,4% acima da atualização dos vencimentos da função pública, em 1991 e 1992, respetivamente, não colidem eles com o princípio constitucional da "proteção da confiança" (e isto é assim, mesmo sem considerar que os efeitos negativos da suspensão de uma tal atualização de remuneração foram minorados em relação aos magistrados judiciais e aos magistrados do Ministério Público, primeiro pelo nº 2 do artigo 1º da Lei nº 63/90 e, a partir de 1 de janeiro de 1993, pelo aditado nº 3 do artigo 1º da mesma lei).
O que acaba de dizer-se é seguramente subscrito por quem votou o Acórdão nº 303/90, acima citado. A idêntica conclusão chegará também, e até por maioria de razão, quem dissentiu da decisão tomada neste aresto. De facto, também no caso aqui sub judicio, o aumento de vencimentos que a norma veio suspender não se havia ainda subjetivado, uma vez que a norma que previu aqueles aumentos ainda não se tinha tornado efetiva. E, por isso, as expectativas dos magistrados à perceção de um vencimento mais elevado não tinham uma consistência tal que a sua suspensão deva considerar-se intolerável.
E a isto acresce que houve fundadas razões para a decisão legislativa de suspensão desses aumentos - razões que têm a ver com o alarme provocado pelo aumento dos vencimentos dos titulares de cargos políticos, anteriormente aludido.
Eis, pois, as razões pelas quais as normas questionadas no presente recurso, na dimensão assinalada, não infringem o princípio da "proteção da confiança", ínsito no princípio do "Estado de direito democrático", consagrado nos artigos 2º e 9º, alínea b), da Lei Fundamental”.

No já citado Acórdão n.º 4/2003, o Tribunal afirmou:
“Pese embora seja possível afirmar, segundo os dados da experiência histórica, a existência, no domínio da função pública, de uma certa estabilidade/imutabilidade do vínculo laboral estabelecido, senão mesmo da existência, até, de uma certa expectativa no sentido do seu desenvolvimento que é próprio de um esquema geral de progressão nas carreiras, tal como nela está comummente estabelecido, não se segue daí que esses vínculos laborais possam ficar imunes, ex natura ou por qual razão especial, às contingências financeiras supervenientes, mormente no que toca à dificuldade da administração não poder suportar os gastos normais do funcionamento dos serviços, entre eles se contando os relativos trabalhadores, ou à necessidade sentida pelo legislador de proceder a uma melhor adequação dos serviços na perspetiva de uma melhor e atual pacificação das necessidades demandadas pelos interesses públicos que lhe cabe primacialmente definir e prosseguir. Num domínio altamente sensível às vicissitudes da realidade económico-financeira, sob a qual os direitos pretensamente atingidos se movem, e onde se cruzam, com sentidos por vezes divergentes as expectativas das suas carreiras, mesmo no aspeto remuneratório, e a necessidade sentida pelo legislador de procurar salvaguardar, por outros meios organizatórios ou até materiais, a realização do interesse público que lhe cabe determinar, não será possível vislumbrar a constituição de uma expectativa materialmente fundada não só da manutenção das suas previsões anteriores sobre o provável andamento das suas carreiras como mesmo das situações já alcançadas em função do direito em vigor”.

Em suma, pelas razões expostas, o n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 43/2005 não viola o princípio da segurança jurídica, na vertente de proteção da confiança.
Também no Acórdão n.º 396/2011, de 21/09/2011, proferido no processo n.º 72/11, no qual o Tribunal Constitucional se pronunciou e decidiu sobre as aí arguidas inconstitucionalidades da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, veiculou jurisprudência de cuja consideração resulta não assistir razão ao apelante quando sustenta a inconstitucionalidade da interpretação efetuada pelo Tribunal a quo relativamente ao art.º 24.º da citada Lei. Nesse acórdão, o Tribunal Constitucional decidiu não declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 19.º, 20.º e 21.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro e, pese embora não se tenha pronunciado expressamente sobre o artigo 24.º, aqui em crise, certo é que a fundamentação ai expressa, quanto aos acima citados preceitos do mesmo diploma, é inteiramente aplicável ao caso vertente.
Pode ler-se nesse acórdão o seguinte: “É sabido que a atuação, em combate ao défice, pelo lado da receita (privilegiadamente fiscal), ou, antes, pelo lado da despesa (bem como a combinação adequada dos dois tipos de medidas e a seleção das que, de entre eles, merecem primazia) foi (e continua a ser) objeto de intenso debate político e económico.
(...) Não cabe, evidentemente, ao Tribunal Constitucional intrometer-se nesse debate, apreciando a maior ou menor bondade, deste ponto de vista, das medidas implementadas. O que lhe compete é ajuizar se as soluções impugnadas são arbitrárias, por sobrecarregarem gratuita e injustificadamente uma certa categoria de cidadãos.
Não pode afirmar-se que tal seja o caso. O não prescindir-se de uma redução de vencimentos, no quadro de distintas medidas articuladas de consolidação orçamental, que incluem também aumentos fiscais e outros cortes de despesas públicas, apoia-se numa racionalidade coerente com uma estratégia de atuação cuja definição cabe ainda dentro da margem de livre conformação política do legislador.
Intentando-se, até por força de compromissos com instâncias europeias e internacionais, conseguir resultados a curto prazo, foi entendido que, pelo lado da despesa, só a diminuição de vencimentos garantia eficácia certa e imediata, sendo, nessa medida, indispensável. Não havendo razões de evidência em sentido contrário, e dentro de “limites do sacrifício”, que a transitoriedade e os montantes das reduções ainda salvaguardam, é de aceitar que essa seja uma forma legítima e necessária, dentro do contexto vigente, de reduzir o peso da despesa do Estado, com a finalidade de reequilíbrio orçamental. Em vista deste fim, quem recebe por verbas públicas não está em posição de igualdade com os restantes cidadãos, pelo que o sacrifício adicional que é exigido a essa categoria de pessoas vinculada que ela está, é oportuno lembrá-lo, à prossecução do interesse público – não consubstancia um tratamento injustificadamente desigual. (...)”.
Entretanto, o Tribunal Constitucional foi chamado a pronunciar-se sobre o próprio artigo 24.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31.12, embora a propósito da questão de saber se o mesmo constituía impedimento legal para a concretização, no ano de 2011, da transição para a categoria de professor auxiliar, pela aplicação do regime transitório da carreira dos docentes de ensino universitário com a categoria de assistentes que adquiram o grau de doutor, nos termos e no cumprimento dos requisitos previstos e regulados no Decreto-Lei n.º 205/2009, de 31 de Agosto, alterado pela Lei n.º 8/2010, de 13 de Maio, bem como dos reposicionamentos remuneratórios decorrentes da transição, o que fez através do Acórdão n.º 364/2015, proferido em 9 de julho de 2015, no processo n.º 253/15.
Nesse acórdão, o Tribunal Constitucional decidiu não julgar inconstitucional aquela norma do artigo 24.º, n.º 1, da Lei n.º 55-A/2010, quando interpretada no sentido de impedir que, ocorrendo a transição de um docente para a categoria de professor auxiliar em virtude da aquisição do grau de doutor, nos termos do regime transitório fixado Decreto-Lei n.º 205/2009, de 31 de Agosto, alterado pela Lei n.º 8/2010, de 13 de Maio, que alterou o Estatuto da Carreira Docente Universitária se proceda concomitantemente ao correspondente reposicionamento remuneratório. Essa jurisprudência tem plena aplicação na situação vertente, podendo ler-se nesse Acórdão que “(…), a eventual protecção da confiança dos professores - decorrente do princípio do Estado de Direito” (artigo 2º da CRP) –, apesar de abalada, (…) não se afigura comprometida, de modo desproporcionado, em função do interesse público na garantia da redução de um défice orçamental que implicou evidentes dificuldades de financiamento e, principalmente, atenta a natureza intrinsecamente transitória das soluções normativas adoptadas – recorde-se, a esse propósito, que a Lei do Orçamento é de natureza intrinsecamente anual».
Reportando-se aos Acórdãos n.ºs 396/2011 e 613/2011, o Tribunal Constitucional afirma inovadoramente que “ (…) a adopção de certas medidas conjunturais de política financeira de combate a uma situação de emergência corresponde a uma opção do legislador devidamente legitimado pelo princípio democrático que não viola o princípio da confiança ínsito na ideia de Estado de direito. Nessas medidas incluem-se, designadamente, reduções remuneratórias e, no que agora importa, proibições de valorizações remuneratórias como a que decorre do artigo 24.º, n.º 1, da LOE 2011. Na verdade, como se considerou no Acórdão n.º 237/2014, não tendo este Tribunal, reunido em Plenário, considerado inconstitucional a redução do quantum remuneratório definida pelo artigo 19.º da LEO 2011, «também não será inconstitucional impedir o seu aumento. Conclui-se, desta forma, que a não inconstitucionalidade da vedação de valorizações remuneratórias, nos termos do artigo 24.º, «decorre de um argumento de maioria de razão”. Acrescenta que «(…) a mera diferença de direitos resultantes da sucessão de regimes legais do tempo não convoca a dimensão de censura assacável ao princípio da igualdade. Deste parâmetro apenas resulta a proibição de tratamentos diferenciados sincrónicos e não diacrónicos, sob pena de inadmissível cerceamento da liberdade de conformação do legislador, enquanto espaço autónomo do poder legislativo configurado pela própria Constituição. Deste modo conclui-se que, tal como sucedeu no Acórdão n.º 317/2013, na medida em que a nenhum professor com maior antiguidade será atribuída remuneração inferior à de professores de menor antiguidade, o artigo 24.º, n.º 1, da LOE 2011, interpretado no sentido de, por força da aplicação da proibição nele estatuída de valorizações remuneratórias, determinar, em caso transição para a categoria de professor auxiliar pela aquisição do grau de doutor, nos termos decorrentes do artigo 11.º do Estatuto da Carreira Docente Universitária, a impossibilidade de se proceder concomitantemente ao correspondente reposicionamento remuneratório, não viola o princípio da igualdade».
No mesmo sentido, já se pronunciou este TCAN, como é exemplo o Ac. 19/06/2015, proferido no processo n.º 02013/13.3BEBRG, no qual se refere que: “(...) Nem todos os direitos referentes ao trabalho são direitos, liberdades e garantias sujeitos ao regime do artigo 18.º da Constituição, e mesmo perante um direito dessa natureza, o legislador ordinário não está impedido, verificadas certas circunstâncias especiais, de impor restrições ao seu conteúdo, desde que se mostre salvaguardado o limite que contende coma proteção da dignidade da pessoa humana. IV. Os condicionamentos emergentes da situação de emergência financeira do país e a pressão das metas orçamentais impostas pela troika, são realidades que, impondo-se ao legislador ordinário, não podem ser desconsideradas pelo julgador. (...)” .
Ainda com interesse para a situação em análise, embora por referência à questão da não inconstitucionalidade da medida de congelamento de pensões, este TCAN firmou jurisprudência no sentido de que “(...) 4 – Os artigos 19.º e 68.º n.º 2 da Lei 55­A2010 de 31/12 não são inconstitucionais por violação dos princípios constitucionais da igualdade e da confiança. 5 – Os referidos preceitos não violam o princípio da igualdade que consiste na proibição do livre arbítrio constituindo um limite externo de liberdade ao poder de conformação de decisão dos poderes públicos, já que a redução de vencimentos de quem recebe por verbas públicas e que por isso não está na mesma situação dos restantes cidadãos não é arbitrária, mas antes inserida num conjunto mais vasto de medidas de consolidação orçamental de controle da despesa por força de compromissos com instâncias estrangeiras cabe dentro da margem de livre conformação politica do legislador. (...)” Cfr. Acs. do TCAN, de 10/10/2014, processos n.ºs 00250/11.4BECBR e 01094/11.98EPRT;.
Decorre dos citados acórdãos do Tribunal Constitucional e demais jurisprudência que tem sido veiculada pelos tribunais superiores desta jurisdição Cfr. Ac. do TCAS, de 16.04.2015, proc. n.º 11886/15; de 16.12.2015, proc. n.º 12602/15 e de 23.05.2019, proc. n.º 506/12.9BELSB;, que são perfeitamente transponíveis para o caso em apreço, que o regime decorrente do art.º 24.º da referida Lei não é inconstitucional, não fere nenhum direito adquirido, nem a tutela da confiança, pelo que nenhuma razão assiste ao apelante quando pretende que a aplicação do citado preceito ao seu caso, impedindo o seu reposicionamento remuneratório com efeitos a fevereiro de 2011, seria uma medida “desmedida”, desajustada e excessiva de desproporcionalidade em relação às expetativas dos resultados verificados no trabalhador.
Termos em que improcedem os invocados fundamentos de recurso.
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IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal, em negar provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
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Custas pelo apelante.
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Notifique.
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Porto, 18 de dezembro de 2020.


Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Alexandra Alendouro