Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01430/.2BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/30/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM
PEDIDO DE PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO FUNDAMENTADA NO NÃO CUMPRIMENTO POR PARTE DO RÉU DO SEU DEVER LEGAL DE DECIDIR DENTRO DO PRAZO O PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA; MEDIDAS PREVENTIVAS; NOVO REGULAMENTO PDM
Sumário:I-No caso em concreto não se mostram verificados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, desde logo, porque não há qualquer ilícito susceptível de ser imputado ao Município;
I.1-a imposição legal de prazos para a tomada de decisões da Administração não tem como propósito proteger directamente os interesses económicos do particular, contrariamente ao que a Recorrente quer fazer crer;
I.2-concretamente, o RJUE coloca à disposição dos particulares mecanismos próprios de que estes podem e devem socorrer-se para combater a inércia da Administração;
I.3-na tese da Recorrente, não tendo o Município tomado decisão expressa sob o procedimento de informação prévia por si apresentado, deveria a mesma ter considerado a sua pretensão tacitamente deferida, nos termos do artº 111º/al. c) do RJUE e daí ter extraído as “consequências gerais”, ou seja, ter apresentado o competente pedido de licenciamento, no prazo de um ano a contar do deferimento tácito, como estipulado no nº 1 do artº 17º do RJUE, o que não fez.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:H...-Construções Norte, Lda.,
Recorrido 1:Município do Porto
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
H...-Construções Norte, Lda., com sede na Zona Industrial, Lote …, instaurou, contra o Município do Porto, acção administrativa comum, tendo em vista o pagamento de uma indemnização fundamentada no não cumprimento por parte do Réu do seu dever legal de decidir no prazo legal o pedido de informação prévia, assim como decorrente da publicação, quer das Medidas Preventivas, quer do novo Regulamento PDM do Porto, que veio restringir a possibilidade objectiva de a Autora aproveitar a capacidade edificativa do seu terreno, tendo efectuado os seguintes pedidos:
a) ser o Réu condenado a reconhecer o direito/situação jurídica subjectiva da Autora decorrente do deferimento tácito do seu pedido de informação prévia apresentado na Câmara Municipal do Porto em 23/11/2001, nos termos e para os efeitos do artº 3°, nºs 1 e 2, do Regulamento do novo PDM do Porto, iniciando-se a contagem do prazo de um ano previsto no artº 17°, nº 1, do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de dezembro, com o trânsito em julgado da decisão a proferir nesta acção;
b) ser o Réu condenado a reconhecer o direito/situação jurídica subjectiva da Autora decorrente do deferimento tácito das reclamações e/ou recurso hierárquico impróprio referidos nos artºs 8º e 10º desta petição, nos termos e para os efeitos do artº 3º, nºs 1 e 2, do Regulamento do novo PDM do Porto, iniciando-se a contagem do prazo de um ano previsto no artº 17º, nº 1, do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de dezembro, com o trânsito em julgado da decisão a proferir nesta acção; se assim não se entender,
c) deve o Réu ser condenado, nos termos do artº 143º, nº 3, do Decreto-Lei 380/99, de 22 de setembro, a pagar à Autora uma indemnização pelos danos decorrentes da perda da capacidade edificativa imposta pelo novo PDM do Porto face ao regime das Normas Provisórias, nos termos que ficaram calculados.
Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto foi julgada improcedente a acção.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
32. Concluindo, estão, de facto, preenchidos todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Recorrido que legitimam este pedido de indemnização, nos termos da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, e/ou do regime jurídico do Decreto-Lei nº 48.051, de 21 de Novembro de 1967:
i. O Recorrido não promoveu, em tempo legal, o regular andamento do procedimento do pedido de informação prévia da Recorrente nem decidiu esse pedido no prazo legal (esse pedido foi apresentado na Câmara Municipal do Porto em 01.04.2002, data do aditamento ao projecto inicial, e deveria ter sido decidido até 14.08.2002) – o facto (omissão);
b. Com essa sua actuação (omissão), o Recorrido ofendeu o direito da Recorrente a uma decisão no prazo legal, violando as normas do RJUE que estabelecem os prazos legais que devem ser observados no âmbito de um pedido de informação prévia referente a uma construção sujeita a licenciamento (art. 11º quanto ao saneamento e apreciação liminar; art. 19º relativo às consultas a entidades exteriores ao município; e art. 16º, nº 1, b. quanto à deliberação, todos do RJUE) – a ilicitude (ofensa de direitos de terceiro ou de disposições legais destinadas à protecção de interesses alheios – cfr. art. 9º, nº 1, da referida Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro);
c. Essa actuação (omissão) do Recorrido no cumprimento dos prazos legais e sem que nada o justificasse denota uma quebra de diligência e uma infracção à prudência comum (cfr. art. 10º, nº 1, da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro): ao Recorrido cabia, num prazo razoável (prazo legal), a prática e desenvolvimento de todas as diligências necessárias à decisão do pedido de informação prévia, agindo com a prudência normal e comum – a culpa (nexo de imputação ético-jurídica que, na forma de mera culpa, se traduz na censura dirigida ao autor do facto por não ter usado da diligência que teria usado o homem normal perante as circunstâncias do caso concreto ou, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual da Administração por facto ilícito, daquela que teria um funcionário ou agente típico);
d. O facto de o Recorrido não ter decidido, no prazo legal, o pedido de informação prévia da Recorrente determinou que entretanto entrassem em vigor as Medidas Preventivas que agravaram substancialmente a posição e direitos da Recorrente numa perspectiva material (capacidade edificativa: as Normas Provisórias determinavam um índice de construção de 2,2 e, em consequência das Medidas Preventivas, onde se acautelavam os parâmetros urbanísticos do novo PDM do Porto, resultou um índice de construção de 0,8, isto é, menos 17.566,05 m2 do que aquela solução das Normas Provisórias) e procedimental (pela exigência de consultas externas 'vinculativas'). Na verdade, como já se referiu e demonstrou, se o Recorrido tivesse cumprido os prazos legais e proferido uma decisão até 14.08.2002, não se colocariam quaisquer dúvidas quanto ao regime jurídico-urbanístico aplicável ao pedido de informação prévia da Recorrente, pois à data estavam em vigor as Normas Provisórias e não as Medidas Preventivas, que só foram publicadas dois anos depois daquelas – o dano (lesão de ordem patrimonial ou não patrimonial).
e. Pelo exposto, o dano sofrido pela Recorrente é imputável à actuação (omissão) ilícita do Recorrido, pois caso este tivesse cumprido os prazos legais a que estava obrigado, o pedido de informação prévia da Recorrente teria sido decidido no momento em que ainda estavam em vigor as Normas Provisórias e não as Medidas Preventivas – o nexo de causalidade entre a conduta e o dano (apurado segundo a teoria da causalidade adequada).
Deste modo, verificando-se todos os requisitos legais que fundamentam a responsabilidade civil extracontratual do Recorrido, deve este ser condenado, por não ter respeitado os prazos legalmente estabelecidos para a instrução/decisão do pedido de informação prévia, no pagamento de uma indemnização à Recorrente pelo valor de mercado da capacidade edificativa do seu terreno que o novo PDM do Porto veio restringir face ao permitido nas Normas Provisórias.
O valor dessa indemnização corresponde ao que ficou calculado no Ponto C3., nº 26.2 destas Alegações, por também aqui ser idêntica a medida do dano da Recorrente. Assim, uma indemnização, a este título, de € 6.587.268,75 (17.566,05 m2 x € 375,00/m2).
Nestes termos,
Deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a Sentença sub judice e, em consequência,
a. ser o Recorrido condenado a reconhecer o direito/situação jurídica subjectiva da Recorrente decorrente do deferimento tácito do seu pedido de informação prévia, nos termos e para os efeitos do artº 3º, nºs. 1 e 2, do Regulamento do novo PDM do Porto, iniciando-se a contagem do prazo de um ano previsto no artº 17º, nº 1, do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, com o transito em julgado da decisão a proferir nesta acção;
b. ser o Recorrido condenado a reconhecer o direito/situação jurídica subjectiva da Recorrente decorrente do deferimento tácito das reclamações e/ou recurso hierárquico impróprio referidos no Ponto C2. destas Alegações, nos termos e para os efeitos do artº 3º, nºs. 1 e 2, do Regulamento do novo PDM do Porto, iniciando-se a contagem do prazo de um ano previsto no artº 17º, nº 1, do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, com o transito em julgado da decisão a proferir nesta acção; se assim não se entender;
c. deve o Recorrido ser condenado, nos termos do artº 143º, nº 3, do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro, a pagar à Recorrente uma indemnização pelos danos decorrentes da perda da capacidade edificativa imposta pelo novo PDM do Porto face ao regime das Normas Provisórias, nos termos que ficaram calculados;
d. deve o Recorrido ser condenado, nos termos do regime da responsabilidade civil das entidades públicas, a pagar à Recorrente uma indemnização pelos danos decorrentes do desrespeito e incumprimento dos prazos legalmente estabelecidos para a instrução/decisão do pedido de informação prévia da Recorrente, nos termos que ficaram calculados.
Só assim será cumprido o Direito e feita Justiça.
O Município do Porto contra-alegou, concluindo que:
A. A sentença proferida pelo Tribunal a quo mostra-se, em si mesma, livre de qualquer erro ou mácula, pelo que não pode senão improceder totalmente o recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida.
B. As extensíssimas alegações da Recorrente não contêm uma só conclusão, circunstância que - como está bom de ver – viola frontalmente o disposto no artigo 690.º do CPC, razão pela qual deve ser dado imediato cumprimento ao disposto no artigo 690.º, n.ºs 4 e 5, do CPC, convidando-se a Recorrente a formular conclusões, sob pena de rejeição do recurso interposto.
C. A Recorrente aplica a um PIP que não foi ainda objecto de decisão a mesma doutrina que rege um PIP já reconhecidamente deferido, para sustentar que o prazo do deferimento tácito não é o da apresentação do aditamento de 01.04.2002, mas o da apresentação do PIP em 21.12.2001.
D. Ora, como bem referiu o Tribunal a quo, quando a Recorrente apresentou o aditamento, nenhuma decisão havia sido tomada quanto ao requerimento que primeiramente deu início ao PIP pelo que “ a Autora alterou, por sua iniciativa, as condições sobre as quais a informação prévia deveria ocorrer. […] Desta forma, a Autora faz, igualmente, reiniciar – ou mesmo iniciar – o decurso do prazo para eventual deferimento tácito (o que, aliás, a Autora refere nas suas peças processuais) ”.
E. É inteiramente desprovida de sentido o fundamento de nulidade da sentença alegado pela Recorrente.
F. É que, por um lado, nada obsta a que o Tribunal conclua na sentença não se encontrar “peticionado o eventual deferimento tácito do requerimento/aditamento deduzido a 01.04.2002”, já que mais não fez do que interpretar o pedido da Autora, sendo certo que, justamente, o juiz está vinculado pelo princípio do pedido (nos termos do n.º 1 do artigo 661.º do CPC, A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir), por outro lado, nos termos do disposto no artigo 664.º do CPC, o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, pelo que o facto de o Tribunal a quo se ter referido à circunstância de relevar, para efeitos de (eventual) deferimento tácito, a data da apresentação do aditamento não constitui, salvo o devido respeito, uma “decisão surpresa”.
G. O Tribunal a quo não teve qualquer necessidade de considerar a relevância da data da apresentação do aditamento parra concluir pela não verificação do deferimento tácito e pela improcedência de todos os pedidos.
H. O Tribunal a quo não estava, pois, de forma nenhuma obrigado a ouvir as partes sobre a circunstância de ter entendido “não se encontrar peticionado o eventual deferimento tácito do requerimento/aditamento deduzido a 01.04.2002”, desde logo porque, contrariamente ao que alega a Recorrente a sua pretensão não foi indeferida com fundamento naquela solução jurídica (sobre a qual, de resto, nem precisou de se debruçar para decidir sobre o caso dos autos).
I. Nenhuma razão assiste à Recorrente quando alega que o Parecer da CCDRN não era, no presente caso, obrigatório e vinculativo, pois que o instrumento urbanístico em vigor no momento que o Recorrido apreciou a pretensão da Autora, ora Recorrente, era as Medidas Preventivas, sendo que, nos termos das alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 3.º dessas Medidas Preventivas, a pretensão da autora encontrava-se sujeita ao “parecer vinculativo da Direcção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território – Norte”.
J. Ao contrário do que sustenta a Recorrente, no procedimento em causa, o Município do Porto não podia deixar de ouvir a DRAOT – Norte, pois, “a falta de um parecer vinculativo gera, também, insuprivelmente vício de forma (ou de procedimento) da decisão final(…)”(1)
K. Com efeito, o legislador ao redigir o RJUE deixou bem claro que a decisão final sobre um pedido de informação prévia não pode tomada sem que as entidades externas ao município sejam ouvidas – cfr. artigo 15.º do RJUE – e por isso, é que este diploma prevê que o deferimento tácito não possa formar-se sem que estas entidades se pronunciem ou tenham tido oportunidade de se pronunciarem – cfr. alínea b) e c) do n.º 1 do artigo 16.º do RJUE.
L. Por isso mesmo o RJUE prevê expressamente uma norma que permite ao requerente combater a “inércia” da entidade administrativa em causa, conferindo-lhe a possibilidade de promover ele próprio as consultas às entidades externas – cfr. n.º 2 do artigo 19.º aplicável ex vi do artigo 15.º do RJUE – sendo que esta norma que esta norma mais não faz do que reforçar o princípio já invocado de que o legislador do RJUE não quis que a decisão final venha a ser tomada sem que as entidades externas se pronunciem ou tenham tido a oportunidade de se pronunciarem.
M. E a Recorrente, sabendo disso, não usou da prerrogativa que lhe conferia o n.º 2 do artigo 19.º aplicável ex vi do artigo 15.º do RJUE, conformando-se com a forma como o procedimento tramitava.
N. Ainda que se conceda provimento a esta tese da Recorrente – o que não se concede e só por mera cautela de patrocínio se refere – sempre se dirá que continua a não lhe assistir qualquer direito que mereça tutela jurídica, porquanto a mesma não apresentou, conforme devia, o competente pedido de licenciamento dentro do prazo de um ano a contar da formação do deferimento tácito, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 17.º do RJUE - e como não o apresentou, o alegado deferimento tácito do pedido perdeu o seu carácter vinculativo.
O. A este propósito não se aceita – nem pode aceitar-se - que a Recorrente sustente que, tratando-se de um pedido de informação prévia (supostamente) deferido tacitamente não lhe é exigível apresentar o pedido de licenciamento dentro do mencionado prazo, pois que aceitar a tese da ora Recorrente equivale a fazer tábua rasa de um postulado do direito administrativo que prescreve que o deferimento tácito produz rigorosamente os mesmos efeitos que uma decisão expressa favorável.
P. Em ordem a assegurar a certeza e a segurança jurídica, como se já se disse, o legislador quis deixar definido que a vinculação da administração resultante do deferimento de um pedido de informação prévia existia apenas durante um determinado período bem delimitado no tempo, pelo que conceder provimento ao pedido da Recorrente equivale a considerar que fica nas mãos dos requerentes a gestão do mencionado prazo de um ano.
Q. No limite, A aceitação dessa tese equivaleria a criar um regime de favor do deferimento tácito em detrimento do deferimento através de decisão expressa, pois enquanto que os particulares que vissem a sua pretensão deferida por decisão expressa teriam um ano a contar da notificação do acto, os outros, se não lhes conviesse apresentar o pedido de licenciamento durante o período de um ano a contar da formação do deferimento tácito, poderiam sempre propor uma acção idêntica à da ora Recorrente com o intuito de ajustar o prazo legal às suas conveniências.
R. Nos presentes autos a Recorrente pretende ver reconhecido o deferimento tácito das pretensões deduzidas nestas impugnações nos termos previstos no n.º 2 do artigo 114.º do RJUE, o que, como reconheceu o Tribunal a quo, não poderá proceder.
S. No que respeita à impugnação do parecer realizada através da reclamação, dir-se-á que a mesma nunca poderia ser apresentada à Câmara Municipal, em virtude deste órgão municipal não ter qualquer poder para rever um parecer emitido por um organismo da Administração Central como é o caso da CCDR-N.
T. No que tange ao acto de homologação praticado pelo Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade refira-se que, estando em causa um parecer vinculativo como é o caso dos presentes autos, esta homologação é obrigatória, razão pela qual à “instância decisória” não resta outra possibilidade senão acatar o parecer emitido, pelo que a única forma válida e eficaz de impugnar o parecer e respectiva homologação seria fazê-lo junto das entidades que detêm o poder de rever o seu conteúdo.
U. Ainda que assim não se entenda, o certo é que o invocado deferimento tácito das impugnações administrativas da Recorrente, sempre se encontraria ferido de nulidade, isto porque, como já se referiu, em ordem a dar cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 3.º das Medidas Preventivas (em vigor à data – ao contrário que pretende a Recorrente) o Município encontrava-se legalmente obrigado a consultar a DRAOT – Norte que veio a emitir parecer desfavorável.
V. Não nos esqueçamos que estão em causa actos administrativos, pelo que só a acção administrativa especial de impugnação, no primeiro caso, e de condenação, no segundo, constituem os meios processuais idóneos a satisfazer a pretensão da Recorrente relativa ao alegado deferimento das impugnações administrativas.
W. O pedido indemnizatório formulado pela Recorrente, bem se vê, é totalmente descabido.
X. Com efeito, o requisito legal fundamental do direito de indemnização previsto no n.º 2 do artigo 143.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, é a existência de “possibilidades objectivas de aproveitamento do solo, preexistentes e juridicamente consolidadas” pelo que o direito de indemnização só existiria se a Recorrente tivesse apresentado o pedido de licenciamento dentro do prazo de um ano - O que, como a própria admite, não aconteceu.
Y. Por seu turno, o artigo 143.º do Decreto-Lei 380/99 prevê um direito de indemnização com fundamento na protecção da confiança dos proprietários na manutenção das previsões do plano o que, não sucede no caso em discussão nos autos porque restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo resultantes da revisão dos planos não ocorreram dentro do período de cinco anos após a entrada em vigor do plano e a Recorrente não dispunha de nenhum licenciamento prévio válido.
Z. Não está preenchido nenhum – reitera-se, nenhum - dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, desde logo, porque não há qualquer ilícito susceptível de ser imputado ao Município.
AA. A imposição legal de prazos para a tomada de decisões da Administração não tem como propósito proteger directamente os interesses económicos do particular já que o RJUE coloca à disposição dos particulares mecanismos próprios de que estes podem e devem recorrer-se para combater a inércia da Administração, o que a Recorrente manifestamente não fez.
BB. Caso assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio se concebe, sempre a inércia da Recorrente nos termos descritos constituí facto culposo a si imputável que, pela sua gravidade, excluiria o direito a qualquer indemnização, por força do art.º 570.º do Código Civil.
CC. Não existe nexo de causalidade entre a alegada falta de decisão no prazo legal e o suposto dano (perda de capacidade construtiva). O não cumprimento de prazos pela Administração não é por si só, em abstracto, causa provável (adequada) da perda da capacidade construtiva de terrenos.
DD. Acresce que, in casu, a eventual falta de uma decisão tempestiva do Município nunca poderia ter como consequência a perda da capacidade construtiva do terreno da Recorrente, pois, na verdade, só se poderia falar em perda de capacidade construtiva se a Recorrente possuísse um direito de edificabilidade efectivo, que não possui.
EE. De tudo o que vem dito resulta claro e inequívoco que não merece qualquer censura a sentença recorrida, pelo que deve ser negado provimento ao recurso interposto pela Autora, ora Recorrente.
Nestes termos, e nos que suprirão, julgando improcedente o presente recurso e mantendo na íntegra a sentença recorrida, será feita uma JUSTIÇA.

Do Recurso Subordinado:
A. Por dever de patrocínio, vem o presente recurso subordinado interposto do despacho saneador o Tribunal a quo que julgou improcedente a excepção da prescrição invocada pelo Município do Porto relativamente à ampliação do pedido/causa de pedir deduzida na réplica em que a ora Recorrida peticionou, a título subsidiário da indemnização peticionada ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 143.º do Decreto-Lei 380/99, uma indemnização pelo alegado incumprimento dos prazos legais da decisão do PIP – responsabilidade por facto ilícito.
B. O Tribunal a quo entendeu que o prazo de prescrição de um eventual direito de indemnização a que a ora Recorrida tivesse direito se contaria a partir da data da entrada em vigor do novo PDM do Porto, publicado em 03.02.2006.
C. Não pode o Recorrente concordar com este entendimento do Tribunal a quo.
D. A Recorrida fundamenta o seu alegado direito num suposto facto ilícito que, na sua perspectiva, terá ocorrido muito antes da entrada em vigor do aludido PDM.
E. A Recorrida fundamenta o pedido no alegado facto (omissão) da não decisão do pedido de informação prévia, pelo Recorrente, dentro do prazo legal, que entende ter terminado em 14.08.02.
F. O alegado facto (omissão) constitutivo de um potencial direito de indemnização ocorre, assim, na óptica da Recorrida, em 14.08.02.
G. É indiscutível que se esgotou o prazo de três anos de que a Recorrida dispunha para poder exercer qualquer pretensão indemnizatória, nos termos do art.º 498.º do Código Civil aplicável ex vi art.º 41.º, n.º 1.º do CPTA.
H. A Recorrida poderia ter exercido o seu virtual direito a uma indemnização, nos termos por si configurados, até 14.08.05, o que não aconteceu, pois só o fez em 23.10.2007.
I. O momento relevante para efeitos da contagem do prazo prescricional é aquele em que o lesado conhece os factos que lhe permitem qualificar determinado acto como gerador de responsabilidade.
J. Sem prescindir, quando muito e na melhor das hipóteses, segundo a linha de orientação seguida pelo Tribunal a quo, sempre o prazo de prescrição, deveria ser contado da data de publicação das Medidas Preventivas em 15.02.2002, as quais antecipavam as soluções a consagrar através da revisão do PDM, designadamente quanto à volumetria admitida para as operações urbanísticas (artigo 3.º, n.º 1, alínea a) das Medidas Preventivas).
K. Face ao exposto, deve o douto despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que considere a excepção da prescrição deduzida ser julgada provada e procedente, com as legais consequências.
Nestes termos, e nos que suprirão, julgando procedente o presente recurso e julgando de conformidade com as precedentes CONCLUSÕES, será feita ã JUSTIÇA!

A Autora ofereceu contra-alegação a este recurso subordinado, sem conclusões, terminando assim:
Deverá o presente recurso subordinado ser julgado improcedente, mantendo-se, na íntegra, o que foi decidido no Despacho Saneador recorrido a propósito da prescrição deste direito indemnizatório da Recorrida com fundamento no incumprimento pelo Recorrente dos prazos legais de decisão do pedido de informação prévia.
Só assim será cumprido o Direito e feita Justiça.

O MP, notificado nos termos e para os efeitos contidos no artº 146º nº 1 do CPTA, não emitiu qualquer parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
A) A Autora (anteriormente denominada P&M, Lda.) é proprietária de um lote de terreno sito na Rua da A... - PL, denominado L... 5 com a área de 21.049 m2, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial do Porto, sob a ficha n.º 655/1… freguesia do Bonfim, e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 1….
B) Em 21/12/2001, a Autora apresentou na Câmara Municipal do Porto um pedido de informação prévia para um projecto imobiliário a executar naquele terreno, o qual foi registado sob o n.º 3…, tendo sido atribuído o n.º de processo 4…/01.
C) O Regulamento do Plano Director Municipal do Porto (de 1993) foi publicado no Diário da República, II Série, n.º 27, de 02/02/1993, cujo teor aqui se tem por reproduzido.
D) A Resolução do Conselho de Ministros n.º 117/2000, de 20 de Julho, que aprovou “Normas Provisórias”, foi publicada no Diário da República, 1ª Série-B, n.º 206, de 06/09/2000.
E) A Resolução do Conselho de Ministros n.º 125/2002, que ratificou “Medidas Preventivas”, foi publicada no Diário da República n.º 238, de 15/10/2002.
F) Tendo em vista a caducidade destas medidas preventivas (cfr. Resolução do Conselho de Ministros n.º 127/2004, de 27/08/2004, publicada no Diário da República, I Série-B, de 04/09/2004: prazo de vigência até 06/09/2005), sem que o novo PDM do Porto tivesse entrado em vigor, em 05/09/2005, foi emitida a Circular Informativa n.º 3/05, pelo Senhor Vereador do Pelouro do Urbanismo, Mobilidade e Desenvolvimento Social, nos termos da qual se determinava o seguinte: “Todos os processos de informação prévia, de licenciamento e de autorização de operações urbanísticas continuarão a ser analisados em função da sua conformidade com o PDM em fase de ratificação”, tendo sido publicado o teor da deliberação da Câmara Municipal do Porto, de 13/09/2005, no Diário da República, II Série, n.º 185. Apêndice n.º 129, de 26/09/2005, (aviso n.º 6561-A/2005) -cfr. Docs. 17 e 18 juntos com a petição inicial, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
G) Em 01/04/2002, a Autora apresentou na Câmara Municipal do Porto um aditamento ao projecto inicial, com a substituição da memória descritiva das plantas topográficas e dos desenhos 1 a 5 - cfr. fls. 34 a 52 do processo administrativo apenso aos autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
H) Em 20/05/2002, o pedido de informação prévia apresentado foi objecto da informação técnica constante de fls. 55 e 56 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
I) Nesta sequência, o processo foi remetido à Divisão Municipal de Planeamento Estratégico, em 03/07/2002 - cfr. fls. 83 do processo administrativo apenso.
J) Em 05/03/2003, e conforme reunião realizada na Câmara Municipal, a Autora apresentou fotocópias da certidão da Conservatória do Registo Predial, da escritura Notarial, da Caderneta Predial, bem como um levantamento do terreno em causa – cfr. fls. 78 a 82 do processo administrativo apenso aos autos, cujo teor aqui se tem integramente reproduzido.
K) Em 28/03/2003, a Divisão Municipal de Planeamento Estratégico elaborou a informação constante de fls. 84 a 86 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integramente reproduzido.
L) Em 08/04/2003, foi consultada a Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território (DRAOT -N) para emissão de parecer.
M) Em 16/04/2003, em reunião conjunta realizada na DRAOT-N, com representante desta e da Câmara Municipal, foi decidido colher parecer da «Metro do Porto, S.A.» - cfr. Fls. 88 do processo administrativo apenso aos autos.
N) Em 18/07/2003, depois de notificada para o efeito em 01/07/2003, a Autora apresentou cópia do processo para apreciação pelo «Metro do Porto, S.A.» cfr. doc. 4 junto com a petição inicial e fls. 53, 104 e 105 do processo administrativo apenso.
O) Em 25/07/2003, a «Metro do Porto. S.A.» recebeu o pedido de emissão de parecer - fls. 106 e 107 do processo administrativo apenso.
P) Em 19/11/2003, a «Metro do Porto, S.A.» emitiu parecer favorável - cfr. fls. 111 do processo administrativo, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
Q) Em 03/02/2004, no âmbito do período de discussão pública do procedimento de revisão do PDM do Porto, a Autora requereu à Câmara Municipal do Porto que (i) a capacidade construtiva que era reconhecida aos terrenos da Autora pelo Regulamento do PDM original do Porto se mantivesse ou, no caso de não ser possível a manutenção dessa capacidade construtiva, que (ii) ficasse expressamente previsto no novo Regulamento do PDM que o mesmo só se aplicaria aos procedimento iniciados após a sua entrada em vigor, salvaguardando-se as situações constitutivas de direitos já existentes - cfr. doc. 5 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
R) Em 24/05/2004, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte emitiu parecer desfavorável - cf. fls. 112 a 117 do processo administrativo, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
S) Em 17/06/2004, a Autora foi notificada do teor dos dois pareceres emitidos – cfr. fls. 118 e 119 do processo administrativo e Docs. 6 e 7 juntos com a petição inicial.
T) Em 13/07/2004, a Autora apresentou na Câmara Municipal do Porto reclamação do teor do parecer emitido pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, solicitando, igualmente, o reconhecimento de deferimento tácito do pedido de informação prévia em apreço - cfr. Doc. 8 junto com a petição inicial e fls. 120 a 139 do processo administrativo, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido (art.º 8.º da PI).
U) Em 12/07/2004, foi apresentada na Câmara Municipal do Porto uma nova exposição dos factos e do direito que suportam a posição da Autora, no âmbito da discussão pública do PDM do Porto, requerendo-se (i) o reconhecimento do deferimento tácito do pedido de informação prévia apresentado, ou (ii) a alteração da classificação proposta para este terreno no projecto de revisão do PDM, ou (iii) que as soluções do nove PDM só fossem aplicadas aos procedimentos iniciados após a discussão pública do projecto de revisão deste Plano, salvaguardando-se a situação jurídica já consolidada da Autora. Esta exposição foi entregue pessoalmente na Câmara Municipal do Porto pela Autora - cfr. Doc. 9 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido (art.º 9.º PI).
V) Em 27/07/2004, a Autora apresentou recurso hierárquico impróprio do despacho do Vereador do Urbanismo e Mobilidade, que homologou, em 24/05/2004, o parecer da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte - cfr. fls. 140 a 153 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido (vide art.º 10.º PI).
W) Em 23/07/2004, a Câmara Municipal do Porto remeteu um ofício à Autora (OF/86/04/DMPU, de 23/07/2004 - Doc. 11 junto com a petição inicial e art.º 11.º da PI), onde se referia o seguinte:
1. Analisada a eventual alteração à Qualificação do Solo da proposta do PDM, concluímos não haver justificação para tal.
2. Contudo, as propostas do PDM não comprometem eventuais "direitos adquiridos na sequência de "actos administrativos válidos" nos termos do art. 3.º do regulamento. Quanto à validade dos actos referidos deverão ser esclarecidos em sede do respectivo processo de licenciamento”.
X) Em 29/01/2005, foi emitida informação desfavorável pela Divisão Municipal de Gestão Urbanística, face ao solicitado enquadramento da pretensão da Autora na proposta de Revisão do PDM - cfr. 156 do processo administrativo, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
Y) Em 21/12/2005, a Autora deu entrada na Câmara Municipal do Porto de um requerimento solicitando que fosse proferida decisão expressa sobre o pedido de informação prévia entregue - cfr. Doc. 12 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se em por integralmente reproduzido.
Z) Em 31/03/2006, foi emitido parecer jurídico acerca da reclamação e recurso hierárquico apresentados pela Autora em 13/07/2004 e 27/07/2004, respectivamente cfr. fls. 158 a 176 do processo administrativo apenso aos autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
AA) Em 30/06/2006, o Vereador do Pelouro do Urbanismos e Mobilidade determinou a notificação à autora do conteúdo deste parecer, para, querendo, sobre o mesmo se pronunciar no prazo de 10 dias úteis - cfr. fls. 176 do processo administrativo apenso aos autos.
BB) Em 14/07/2006, através do ofício da Câmara Municipal do Porto, n.º OF/2149/06/DMGUI, de 06/07/2006, foi enviado à Autora o parecer jurídico de 3 1/03/2006 e o teor do Despacho do Vereador do Urbanismo e Mobilidade de 30/06/2006 - cfr. Docs. 13 e 14 juntos com a petição inicial e fs. 178 e 179 do processo administrativo apenso.
CC) Em 08/09/2006, foi emitida informação desfavorável relativamente à pretensão da Autora pela Divisão Municipal de Gestão Urbanística - Gabinete de Apreciação de Projectos (GAP), cujo teor consta de fls. 184 do processo administrativo e aqui se tem por integralmente reproduzido.
DD) Em 11/09/2006, foi efectuada a apreciação final do pedido de informação prévia pelo Departamento de Gestão Urbanística e Fiscalização, tendo-se concluído pela emissão de informação desfavorável, conforme consta de fls. 186 e 187 do processo administrativo cujo teor aqui se em por integralmente reproduzido.
EE) Em 13/09/2006, o Director Municipal do Urbanismo determinou a notificação à autora desta proposta de decisão, nos termos do disposto nos artigos 100.º e 101.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) - cfr. fls. 188 do processo administrativo apenso aos autos.
FF) Em 04/01/2007, a Autora foi notificada do ofício n.º OF/2937/06/DMGUI, de 18/09/2006, nos termos do qual se informava que o pedido de informação prévia da Autora havia merecido parecer desfavorável, de acordo com os factos e fundamentos constantes da Informação Técnica n.º INF/6896/06/DMGUI e do Despacho do senhor Director Municipal do Urbanismo de 13/09/2006, concedendo-se o prazo de 10 dias úteis para que a Autora se pronunciasse quanto ao mesmo – cfr. Docs. 15 e 15-A junto com a petição inicial e fls. 189 e 190 do processo administrativo.
GG) Em m 18/01/2007, a Autora enviou para a Câmara Municipal do Porto a sua pronúncia sobre o referido parecer jurídico de 31/03/2006 e sobre o parecer desfavorável referido no ponto anterior - cfr. Doc. 16 junto com a petição inicial e fls. 232 a 287 do processo administrativo, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
HH) Em 28/03/2007, é emitido outro parecer jurídico pelos serviços do réu, tendo sido homologado pelo Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade, em 12/04/2007, no sentido do indeferimento da pretensão da Autora - cfr. fls. 292 a 313 do processo administrativo. cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
II) Em 14/05/2007, a autora foi notificada do teor da informação jurídica e do acto homologatório referenciado no ponto anterior - cf r. fls. 321 e 322 do processo administrativo apenso aos autos.
JJ) A Resolução do Conselho de Ministros n.º 19/2006, que ratificou o novo Plano Director Municipal do Município do Porto, foi publicada no Diário da República, I Série-B, de 03/02/2006, cujo teor aqui se tem por reproduzido.
KK) A Autora, até à presente data, não apresentou o correspondente pedido de licenciamento, nos termos do artigo 17.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro.
LL) A presente acção foi intentada no dia 19/06/2007 – cfr. registo dos CTT, (correios e do SITAF).
MM) O pedido de ampliação do pedido/causa de pedir foi deduzido pela autora em 16/10/2007 – cfr. registo por via telecópia junto aos presentes autos.
NN) Com a entrada em vigor do Regulamento do novo PDM do Porto, a autora apenas pode construir no lote de terreno em apreço 16.840 m2.
OO) Na versão original do mesmo PDM, a Autora estava habilitada a construir no mesmo local, pelo menos 27.447 m2.
PP) Na vigência das Normas Provisórias a área de construção no mesmo local correspondia a uma área de construção máxima de 34.406,05 m2, sendo 9.784,60 na parcela A, para instalação de Hotel e de 24.621,45 m2, na parcela B.
QQ) O valor de mercado líquido de m² de construção na zona em que se integra o terreno da autora é, em média, de € 375,00/m².

X
Em sede de motivação da matéria de facto o tribunal exarou que:
Os factos referidos nas alíneas A. a SSS. do probatório constituem factos que desde logo se consideraram assentes no despacho saneador.
Os factos referidos nas restantes alíneas foram considerados provados com base na fundamentação constante da decisão de resposta à Base Instrutória, proferida em 25 de Julho de 2006.
DE DIREITO
Do recurso principal -
Está posta em crise a sentença do TAF do Porto que, enfrentando as questões jurídicas, a saber: -o deferimento tácito do pedido de informação prévia; o deferimento tácito das impugnações administrativas; a indemnização devida pela perda da capacidade edificativa imposta pelo novo PDM do Porto; a indemnização devida pelo incumprimento dos prazos legais de decisão do pedido de informação prévia -, que fundamentam a pretensão da Autora, ora Recorrente, as desatendeu.
Na óptica da Recorrente, que não questiona a factualidade tida por assente, a decisão recorrida errou ao não considerar preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Recorrido pelos danos por si sofridos, seja pelo incumprimento dos prazos de decisão do pedido de informação prévia, seja pela diminuição da capacidade edificativa que o novo PDM do Porto veio prescrever para o terreno de que a Recorrente é proprietária.
A análise dos autos e o texto da sentença leva-nos, porém, a sufragar o entendimento nesta consagrado, como passaremos a expor.
Em 1º plano, dir-se-á que, se é certo que resulta da lei adjectiva e é uniformemente entendido quer pela doutrina quer pela jurisprudência que o objeto do recurso jurisdicional é definido pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matéria que nelas não tiver sido tratada, salvo se for de conhecimento oficioso, temos que, in casu, a Recorrente deu satisfação ao disposto no artigo 690º do CPC, embora de forma condensada, razão pela qual não se viu necessidade de dar cumprimento ao disposto no nº 4 deste preceito, conforme solicitado pelo aqui Recorrido; razões de celeridade processual também o desaconselham, dado que o processo já se arrasta há anos.
A questão nuclear a enfrentar consiste, pois, em saber se se verificam os pressupostos do direito indemnizatório da Recorrente com fundamento no incumprimento pelo Recorrido dos prazos legais de decisão do pedido de informação prévia.
Repete-se, cremos que não assiste razão à Recorrente.
Antes, atente-se no discurso jurídico fundamentador da sentença sob censura:
Cumpre analisar o pedido efectuado na Petição Inicial, bem como a sua posterior ampliação.

Em primeiro lugar, pretende a Autora que o Réu seja condenado a reconhecer o direito/situação jurídica subjectiva decorrente do deferimento tácito do seu pedido de informação prévia apresentado na Câmara Municipal do Porto em 23.11.2001 (data esta que se trata de lapso, sendo o requerimento inicial de pedido de informação prévia apresentado a 21/12/2001 – vide alínea B – da matéria de facto).

Sobre o deferimento tácito de uma pretensão efectuada por qualquer interessado funciona, em regra, o regime estabelecido no Código de Procedimento Administrativo (CPA) no artigo 108.º, ou seja, mostra-se necessário que decorra sempre o prazo de 90 dias (úteis – vide artigo 72.º do CPA).
Este prazo regra de 90 dias, não será aplicável se existir previsão normativa expressa de outro prazo.
No caso dos autos e atenta a redacção do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro (RJUE), na versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho, encontram-se estabelecidos outros prazos para que a administração pública tome uma decisão. Sendo que, na matéria em apreço poderá haver necessidade de serem tomadas várias decisões ou praticados vários actos trâmites ou administrativos até que se alcance um acto final que possa consubstanciar uma decisão sobre a temática em consideração.
À situação em apreço é aplicável o regime de deferimento tácito, em caso de silêncio por parte da administração, conforme o disposto na alínea c) do artigo 11.º do RJUE.
Considerando que o pedido de informação prévia efectuado a 21/12/2001, foi alterado/aditado no dia 01/04/2002, mediante apresentação na Câmara Municipal de um aditamento ao projecto inicial, com a substituição da memória descritiva das plantas topográficas e dos desenhos (alínea G) da matéria de facto); significa que a Autora alterou, por sua iniciativa, as condições sobre as quais a informação prévia deveria ocorrer. Assim, a Autora reinicia o procedimento em causa, porquanto este requerimento apresentado a 01/04/2002 é um aditamento ao que havia deduzido em 21/12/2001. Desta forma, a Autora faz, igualmente, reiniciar – ou mesmo iniciar - o decurso do prazo para eventual deferimento tácito (o que, aliás, a Autora refere nas suas peças processuais).
Sucede que não se encontra peticionado o eventual deferimento tácito do requerimento/aditamento deduzido a 01/04/2002.
Não obstante sempre se dirá algo sobre o assunto.
Ora, para eventual decurso de prazo conducente a produzir deferimento tácito, teria o seu início a 2 de Abril de 2002, sendo a partir desta data que se devem contar os prazos ao caso aplicáveis e em dias úteis (vide artigo 72.º do CPA).

Refere a Autora (no ponto 9 – vi das suas alegações jurídicas) que o deferimento tácito ocorreu a 14 de Agosto de 2002.

Sucede que, em 14/08/2002 já tinham sido aprovadas as Medias Preventivas, pela Assembleia Municipal do Porto, no dia 22 de Julho de 2002, conforme emerge do relatório da Resolução do Conselho de Ministros n.º 125/2002, publicada a 15/10/2002.
Ora, tendo sido aprovadas as Medidas Preventivas motivadas por revisão ou alteração do plano, fica este automaticamente suspenso (seja o próprio PDM, sejam as Normas Provisórias), conforme se conclui pelo disposto no artigo 107.º do Decreto-Lei n.º 380/99 (RJIGT).
Fazendo nossas as palavras insertas no Acórdão do STA de 22/01/2009, proferido no processo n.º 0720/08 (em www.dgsi.pt), que versa precisamente sobre o PDM do Porto em situação análoga à presente (ali tratava-se de uma licença), conclui-se que com o regime das medidas preventivas associado ao acto de suspensão dos procedimentos, qualquer decisão que viesse a ser tomada apenas o poderia ser com base já no novo PDM. Transcreve-se parte do Acórdão com interesse para a presente causa:
«Tendo as medidas preventivas, in casu, cessado a sua vigência a 06.09.2005, só então sendo possível, pelas razões apontadas, a entidade licenciadora determinar (o que, aliás, decorre do preceito legal) a suspensão dos procedimentos de concessão de licença, ao abrigo do disposto no art. 117º do RJIGT, temos que o prazo da suspensão do procedimento aqui em causa, nessa data iniciado, terminava a 06.02.2006, pelo que o novo PDM revisto entrou em vigor (04.02.2006) dentro dos 150 dias a que se reporta o nº 3 do art. 117º.
O pedido de licenciamento terá, assim, que ser decidido “de acordo com as novas regras urbanísticas em vigor”, nos termos do nº 2 do preceito.».

Desta forma, por impeditivo legal, não podia a Autora ter obtido o deferimento tácito na data que indica.

Para além disso, conforme acima ficou referido, o pedido de informação prévia apresentado a 21/12/2001, mostra-se prejudicado pelo aditamento que lhe foi efectuado a 01/04/2002, sendo que nesta data aquele ainda não se podia considerar tacitamente deferido, e, não existe pedido nesta acção para o deferimento do pedido iniciado a 01/04/2002.

Não obstante, sempre se referirá, ainda, em segundo lugar, que nos termos do disposto na alínea c) do artigo 111.º do RJUE, a considerar-se deferido um acto relativo ao pedido de informação prévia (PIP), isso implicava automaticamente a ocorrência das consequências legais gerais; ou seja, conforme refere o preceito, a pretensão beneficia de um deferimento tácito, com as consequências gerais.
Ora, as consequências gerais de o deferimento de um PIP, correspondem à necessidade subsequente de dar início a um outro tipo de procedimento. No caso o procedimento de Licença – vide artigos 18.º e seguintes do RJUE. Assim, mostrava-se necessário que a Autora tivesse apresentado dentro do prazo de um ano o respectivo pedido – vide artigo 17.º, n.º 1 do RJUE. O que não fez – vide alínea KK) da matéria de facto.

Por outro lado, ainda, compete referir que a Autora na contagem do seu prazo apenas soma prazos procedimentais, sem que os mesmos efectivamente tivessem tido no seu decurso, sido objecto de qualquer acto trâmite correspondente.
Significa isto que a ausência de pareceres, ou da solicitação de pareceres externos - pelo menos do parecer que, desde logo se vislumbrava necessário da CCDRN – só por si impede a formação de acto tácito de deferimento. É que não obstante a autarquia ter demorado a solicitar tal parecer, de forma a evitar eventual “veto de gaveta”, o legislador permitiu (e permite) que o particular se dirija directamente às entidades que devem emitir obrigatoriamente o parecer, munir-se do mesmo e apresentá-lo à autarquia. É o que resulta das disposições conjugadas dos artigos 15.º e 19.º do RJUE (redacção à data dos factos). O que, igualmente, a Autora não fez, pelo que, também por esta razão, não poderia nunca obter o deferimento tácito devido a ausência de parecer obrigatório e não suprimento dessa falta.

Face ao exposto, conclui-se não ter ocorrido deferimento tácito do pedido de informação prévia, e, a eventualmente a ter ocorrido, o mesmo caducaria por ausência de início do procedimento subsequente no prazo de um ano.
*

Em segundo lugar pretende a Autora que o Réu seja condenado a reconhecer o direito/situação jurídica subjectiva decorrente do deferimento tácito das reclamações e/ou recurso hierárquico impróprio referidos nos arts. 8.º e 10.º da petição inicial.

Sobre esta temática encontra-se vertida a matéria de facto sob as alíneas T), U) e V).
Ora, seguindo a jurisprudência do STA acima referida pode concluir-se que encontrando-se em vigor, à data dos factos ora em apareço (Julho de 2004 em diante) as medidas preventivas e posteriormente a suspensão de todos os procedimentos que não durou mais de 150 dias, mostrava-se juridicamente inviável o deferimento de qualquer pretensão urbanística.
Na parte final do dito Acórdão do STA de 22/01/2009, proferido no processo n.º 0720/08, escreveu-se o seguinte (cujo teor concordamos e seguimos):
«Tendo as medidas preventivas, in casu, cessado a sua vigência a 06.09.2005, só então sendo possível, pelas razões apontadas, a entidade licenciadora determinar (o que, aliás, decorre do preceito legal) a suspensão dos procedimentos de concessão de licença, ao abrigo do disposto no art. 117º do RJIGT, temos que o prazo da suspensão do procedimento aqui em causa, nessa data iniciado, terminava a 06.02.2006, pelo que o novo PDM revisto entrou em vigor (04.02.2006) dentro dos 150 dias a que se reporta o nº 3 do art. 117º.
O pedido de licenciamento terá, assim, que ser decidido “de acordo com as novas regras urbanísticas em vigor”, nos termos do nº 2 do preceito»
As novas regras urbanísticas em vigor correspondem ao PDM revisto em 2006, pelo que a Autora nunca poderia obter deferimento expresso ou táctico da sua pretensão.

Por outro lado, a Autora deixou incólume na ordem jurídica o acto de indeferimento do recurso hierárquico impróprio, sendo que não pode ser pela via da acção comum que se pode tentar obter um efeito que somente poderia ser obtido pelo recurso à acção administrativa especial, na qual se devia peticionar a anulação de tal acto.

Por outro lado, ainda, a Autora pretende obter um efeito jurídico correspondente à condenação à prática de acto devido sem se ter socorrido do meio próprio para o efeito, ou seja, da acção administrativa especial.
É que não basta peticionar o reconhecimento de uma situação, mister se torna que a administração seja obrigada a praticar um acto em substituição do acto negatório da pretensão (ou em execução de sentença).
*

Peticiona a Autora que o Réu seja condenado, nos termos do art. 143.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, a pagar-lhe uma indemnização pelos danos decorrentes da perda da capacidade edificativa imposta pelo novo PDM do Porto face ao regime das Normas Provisórias.

Conforme escreve o Prof. Doutor Fernando Alves Correia, no seu Manual de Direito do Urbanismo (Vol. I, Almedina, ed. 2001), a págs. 516 e seguintes, a indemnização apenas é devida quando, por um lado a revisão do plano ocorra antes de perfeitos cinco anos de vigência do anterior ou esteja consolidado um acto jurídico válido na esfera jurídica do interessado que não tenha sido objecto de caducidade.
Ora, por um lado, entre o PDM de 1993 e o início do procedimento do PDM actual decorreram mais de cinco anos (O PDM de 1993 foi publicado a 2 de Fevereiro de 1993 – DR 2ª série, n.º 27 e a elaboração da sua revisão foi aprovada pela Câmara Municipal a 26 de Maio de 1998 – vide preâmbulo da Resolução do Conselho de Ministros n.º 125/2002); e, por outro lado, a Autora não tem firmado na sua esfera jurídica qualquer acto administrativo em matéria urbanística, designadamente, a pretendida informação prévia (conforme acima se referiu a Autora nunca teve consolidado na ordem jurídica nenhum acto administrativo que lhe concedesse a capacidade edificativa que pretendia – ou sequer qualquer capacidade edificativa - nem se formou acto tácito nesse sentido, sendo que, sua eventual formação, teria caducado por inércia da Autora em iniciar o procedimento subsequente no prazo de um ano).

Desta forma, a Autora não logrou demonstrar os pressupostos de facto e de direito necessários para que pudesse preencher os requisitos do preceito por si invocado, pelo que não tem direito a qualquer indemnização.
*
Cumpre agora analisar o expendido no Articulado Superveniente, no qual a Autora efectua a ampliação do pedido e da causa de pedir, no sentido de ser indemnizada pelo incumprimento dos prazos legais relativamente ao pedido de informação prévia, designadamente do prazo que dispunha para obtenção de pareceres prévios, o que permitiu que entretanto entrassem em vigor as medidas preventivas.

No seguimento do que acima ficou referido, verifica-se que a Autora nunca teve deferimento tácito do pedido de informação prévia, nem o podia ter jamais em face da aplicação das medidas preventivas e posterior suspensão dos procedimentos até à vigência do novo PDM (suspensão essa que não durou mais de 150 dias).
Desta forma, não foi o alegado atraso no acolhimento de pareceres que impediu o deferimento tácito, porquanto, por um lado, a Autora podia ter suprido o retardamento na recolha de tais pareceres (conforme acima já melhor explicado), e, por outro lado, na data alegada para o deferimento tácito (que na contagem da Autora seguiu os prazos formais como se tivessem sido solicitados os pareceres), o mesmo nunca podia ocorrer por já terem sido aprovadas as medidas provisórias. Não foi o retardamento na recolha de pareceres que impediu a formação de acto tácito (eventualmente o aditamento ao pedido inicial efectuado a 01/04/2002, é que terá contribuído para que o prazo não pudesse ter decorrido desde 21/12/2001).

Por sua vez, qualquer acto que fosse praticado enfermaria de nulidade por não estar conforme as normas ao caso aplicáveis, o mesmo valendo para eventual deferimento tácito. Vide sobre o assunto o Acórdão do STA de 30/09/2009 proferido no processo n.º 0564/08 (em www.dsgi.pt), que embora referente a licenciamento, a respectiva jurisprudência vale para as situações de informação prévia, pelo que se transcreve a parte do sumário com interesse para o assunto aqui em apreço:
«I - O acto de deferimento tácito de pedido de licenciamento que viola normas do PDM aplicável é nulo, pelo que não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade, não sendo susceptível de revogação (arts. 134º e 139º, nº 1, al. a) do CPA)».
Face ao exposto, conclui-se não ter havido violação dos prazos procedimentais para decisão da informação prévia, uma vez que a mesma nunca poderia ser concedida.”
X
Vejamos:
A tese recursiva da Recorrente assenta no pressuposto de que o Pedido de Informação Prévia (PIP) apresentado em 21/12/2001 foi deferido tacitamente em 14/08/2002.
Começa a parte por afirmar que, contrariamente ao entendimento propugnado pelo Tribunal a quo, a data a partir da qual se deverá considerar ter começado a correr o prazo do deferimento tácito não é o da apresentação do aditamento de 01/04/2002, mas o da apresentação do PIP em 21/12/2001.
Mas, sem razão, conforme bem escalpelizado pela sentença em apreço, a cuja fundamentação nos associamos por inteiro.
Com efeito, a Recorrente aplica a um PIP que não foi ainda objecto de decisão a mesma doutrina que rege um PIP já reconhecidamente deferido.
Como referiu o Tribunal a quo, quando a Recorrente apresentou o aditamento (pelo qual se altera o projecto inicial, com substituição da memória descritiva das plantas topográficas e dos desenhos 1 a 5), nenhuma decisão havia sido tomada quanto ao requerimento que primeiramente deu início ao PIP pelo que a Autora alterou, por sua iniciativa, as condições sobre as quais a informação prévia deveria ocorrer. […] Desta forma, a Autora faz, igualmente, reiniciar - ou mesmo iniciar - o decurso do prazo para eventual deferimento tácito (o que, aliás, refere nas suas peças processuais).
É de resto sintomático que, justamente num dos Acórdãos citados pela ora Recorrente - o Acórdão do STA 0282/09, de 18/06/2009 - o Tribunal condicione a natureza acessória/complementar do aditamento ao PIP para efeito de deferimento tácito à circunstância de já existir um deferimento condicionado anterior do PIP (“Deferido condicionalmente um pedido de informação prévia, o aditamento por que o interessado apenas intente suprimir as condições não traduz um novo pedido daquele tipo, mas antes um requerimento «sui generis».)
A este respeito convém fazer um parêntesis para se desatender o fundamento de nulidade da sentença alegado pela Recorrente, embora deixado cair em sede de conclusões.
É que, por um lado, nada obsta a que o Tribunal conclua na sentença não se encontrar “peticionado o eventual deferimento tácito do requerimento/aditamento deduzido a 01/04/2002”, já que mais não fez do que interpretar o pedido da Autora, sendo certo que o juiz está vinculado pelo princípio do pedido (nos termos do nº 1 do artigo 661º do CPC, “A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”), e por outro lado, nos termos do disposto no artigo 664º do CPC, o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, pelo que o facto de o Tribunal a quo se ter referido à circunstância de relevar, para efeitos de (eventual) deferimento tácito, a data da apresentação do aditamento não constitui uma “decisão surpresa”.
Do teor da sentença resulta que não existiu qualquer surpresa na medida em que o Tribunal a quo não “colocou a discussão jurídica num plano diferente daquele em que a parte o havia feito - neste sentido, cfr. o Ac. da RL de 22/10/2008, no proc. 8758/2008-1); por outro lado, não existiu qualquer decisão, porquanto o Tribunal não se debruçou sequer sobre a questão em causa e - mais do que isso -, ao contrário do que sustenta a Recorrente, não fez assentar a decisão no entendimento à luz do qual se deveria considerar a data da apresentação do aditamento.
Pelo contrário: da leitura da decisão recorrida resulta que o Tribunal a quo refutou um por um, todos os argumentos apresentados pela Recorrente para fundamentar o deferimento tácito do PIP, e, sem qualquer necessidade de considerar a relevância da data da apresentação do aditamento, concluiu pela não verificação do deferimento tácito e pela improcedência de todos os pedidos, mormente porque não foi iniciado em tempo o pedido de licenciamento, nem obtido um parecer favorável da CCDR-N.
Logo, no caso em concreto, o Tribunal a quo não estava obrigado a ouvir as partes sobre a circunstância de ter entendido “não se encontrar peticionado o eventual deferimento tácito do requerimento/aditamento deduzido a 01/04/2002”.
Desde logo porque, contrariamente ao que alega a Recorrente, a sua pretensão não foi indeferida com fundamento naquela solução jurídica (sobre a qual, de resto, nem precisou de se debruçar para decidir sobre o caso dos autos) e, por outro lado, não assiste razão à Recorrente quando advoga que o Parecer da CCDR-N não era, no presente caso, obrigatório e vinculativo, pois, como bem observa o Recorrido, o instrumento urbanístico em vigor no momento que este apreciou a pretensão da Autora/Recorrente, era as Medidas Preventivas ratificadas pela Resolução do Conselho de Ministros nº 125/2002, publicada no Diário de República nº 238, de 15 de outubro de 2002.
Ora, nos termos das alíneas b) e c) do nº 2 do artigo 3º dessas Medidas Preventivas, a pretensão da Autora encontrava-se sujeita ao “parecer vinculativo da Direcção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território-Norte”.
Assim, tendo a pretensão da Recorrente merecido parecer desfavorável desta entidade - ponto R) do probatório -, outra solução não restava ao Município do Porto senão o seu indeferimento.
Segundo os ensinamentos de Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, em Código do Procedimento Administrativo, 2ª ed., Almedina, pág. 445, “A decisão procedimental contrária ao parecer vinculativo está afectada de ilegalidade insuprível (…)”
Ao contrário do que sustenta a Recorrente, no procedimento em causa, o Município do Porto não podia deixar de ouvir a DRAOT-Norte, pois, “a falta de um parecer vinculativo gera, também, insuprivelmente vício de forma (ou de procedimento) da decisão final(…)” - obra cit., pág. 445.
Este entendimento é, de resto, acolhido pelo nosso ordenamento jurídico que sanciona com a nulidade os actos praticados em procedimentos em que não foram ouvidas as entidades que devem emitir parecer vinculativo sobre a pretensão em apreciação - cfr. o nº 1 do artigo 133º do Código de Procedimento Administrativo e a alínea c) do artigo 68º(2) do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), publicado pelo DL 555/99, de 16 de dezembro e na doutrina, o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, de Maria José Castanheira Neves, Fernanda Paula Oliveira e Dulce Lopes, Almedina, págs. 348/349.
Aliás, o legislador, ao redigir o RJUE, deixou claro que a decisão final sobre um pedido de informação prévia não pode ser tomada sem que as entidades externas ao município sejam ouvidas - artigo 15º do RJUE(3).
Por isso, é que este diploma prevê que o deferimento tácito não possa formar-se sem que estas entidades se pronunciem ou tenham tido oportunidade de se pronunciarem - alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 16º(4) do mesmo diploma.
Deste modo, até estas entidades serem consultadas, o prazo fixado para a formação de deferimento tácito não começa a correr.
Por isso mesmo o RJUE prevê expressamente uma norma que permite ao requerente combater a “inércia” da entidade administrativa em causa, conferindo-lhe a possibilidade de promover ele próprio as consultas às entidades externas - nº 2 do artigo 19º ex vi artigo 15º do RJUE (redacção à data dos factos).
Assim não se acolhe a argumentação da Recorrente no sentido de que o entendimento do Tribunal a quoparece admitir a possibilidade de afastar a produção do deferimento tácito apenas porque o particular interessado não utilizou a prerrogativa que lhe é conferida por lei, requerendo directamente o parecer exigido à entidade administrativa competente, quando a fixação de prazos procedimentais na fase de consultas a entidades externas, em nome dos princípios da legalidade, do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos administrados, da boa-fé, da igualdade e da eficiência tem precisamente por objectivo proteger os administrados contra a inércia das entidades administrativas licenciadoras, e não puni-los pela sua conduta, tanto mais que a lei prevê uma faculdade, um direito, e não uma obrigação a cargo dos particulares [...]”.
É que esta norma mais não faz do que reforçar o princípio de que o legislador do RJUE não quis que a decisão final venha a ser tomada sem que as entidades externas se pronunciem ou tenham tido a oportunidade de se pronunciarem.
Logo, o Município/Recorrido, não podia prosseguir com o procedimento sem o parecer da CCDR-N; e, não tendo a ora Recorrente feito uso da prerrogativa que lhe conferia o nº 2 do falado artigo 19º, conformou-se com a forma como o procedimento tramitava.
De todo o modo, no caso, este parecer foi emitido dentro do prazo legalmente admitido, fixado no nº 8 do artigo 19º do RJUE e, em consequência, foi homologado por despacho do Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade de 24 de maio de 2004.
Este despacho também foi emitido dentro do prazo legalmente fixado para o Município proferir a sua decisão - cfr. nº 1 do artigo 16º do RJUE, pelo que, bem andou o Tribunal a quo ao concluir que não houve lugar à formação de qualquer deferimento tácito.
Acresce, no que ao alegado deferimento tácito diz respeito, que a Recorrente nunca retirou as necessárias consequências do PIP que, em seu entender, fora tacitamente deferido.
Como sublinha o Tribunal a quo, as consequências gerais de o deferimento tácito de um PIP, correspondem à necessidade subsequente de dar início a um outro procedimento. No caso o procedimento de Licença - vide artigos 18.º e seguintes do RJUE. Assim, mostrava-se necessário que a Autora tivesse apresentado dentro do prazo de um ano o respectivo pedido […]. O que não fez […].
Tal equivale a dizer que, mesmo a aceitar-se a argumentação da Recorrente, continuaria a não lhe assistir qualquer direito merecedor de tutela jurídica, porquanto a mesma não apresentou, conforme devia, o competente pedido de licenciamento dentro do prazo de um ano a contar da formação do deferimento tácito, nos termos previstos no nº 1 do artigo 17º do RJUE. E como não o apresentou, o alegado deferimento tácito do pedido sempre teria perdido o seu carácter vinculativo. Neste sentido, cfr. Maria José Castanheira Neves, Fernanda Paula Oliveira e Dulce Lopes, ob. cit. págs. 165/166 “a não apresentação do pedido de licenciamento (ou de autorização), bem como a sua não apresentação dentro do referido prazo funcionam como condições resolutivas, isto é, factos que, a verificarem-se implicam a perda de efeitos vinculativos (e constitutivos de direitos) da informação emitida.”
Deste modo, não tendo a Recorrente apresentado o pedido de licenciamento no prazo de um ano, o Município podia/devia, apreciar o pedido de licenciamento que a mesma viesse a apresentar ao abrigo das normas urbanísticas em vigor nessa data.
Ainda a este propósito não colhe a tese da Recorrente no sentido de que, tratando-se de um pedido de informação prévia (supostamente) deferido tacitamente, não lhe é exigível apresentar o pedido de licenciamento dentro do mencionado prazo, porque, em seu entender, “não é exigível aos administrados o ónus de apresentar e instruir o pedido de licenciamento no prazo de um ano a contar daquela data nos casos em que a própria Administração Pública, expressamente, não reconhece aquele deferimento tácito […]” e porque, entretanto, entrou em vigor um novo regime jurídico-urbanístico.
Ora, como bem advoga o aqui Recorrido, aceitar a tese da ora Recorrente equivaleria a fazer tábua rasa de um postulado do direito administrativo que prescreve que o deferimento tácito produz rigorosamente os mesmos efeitos que uma decisão expressa favorável. O que significa que a Recorrente teria de ter apresentado o seu pedido de licenciamento durante o período de um ano a contar da data em que, no seu entender, se formou o deferimento tácito, nos mesmíssimos termos e condições em que o deveria ter feito se a sua pretensão tivesse sido objecto de uma decisão expressa.
Foi este o entendimento consagrado pelo legislador aquando da redacção do RJUE e agora acolhido pelo Tribunal a quo.
No caso em concreto, a norma que prevê a formação do deferimento tácito dos pedidos de informação prévia é a alínea c) do artigo 111º do RJUE(5), a qual refere que a pretensão se considera tacitamente deferida “com as consequências gerais”.
Ora, as consequências gerais no caso do deferimento tácito de um pedido de informação prévia só podem ser a possibilidade para o requerente de apresentação, dentro do prazo de um ano, de um pedido de licenciamento para aproveitar o efeito vinculativo do acto de deferimento.
Além de que, em ordem a assegurar a certeza e a segurança jurídicas, o legislador quis deixar definido que a vinculação da administração resultante do deferimento de um pedido de informação prévia existia apenas durante um determinado período bem delimitado no tempo.
Conceder provimento ao pedido da Recorrente equivaleria a considerar que fica nas mãos dos requerentes a gestão do mencionado prazo de um ano, interpretação essa que não se enquadra na filosofia do diploma em causa.
Conforme ilustra o Recorrido, a aceitação dessa tese equivaleria a criar um regime de favor do deferimento tácito em detrimento do deferimento através de decisão expressa, pois enquanto que os particulares que vissem a sua pretensão deferida por decisão expressa teriam um ano a contar da notificação do acto, os outros, se não lhes conviesse apresentar o pedido de licenciamento durante o período de um ano a contar da formação do deferimento tácito, poderiam sempre propor uma acção idêntica à da ora Recorrente com o intuito de ajustar o prazo legal às suas conveniências.
E, assim sendo, forçoso é concluir que os pedidos da Recorrente referentes ao reconhecimento do deferimento tácito carecem de cabimento legal, razão pela qual foram, e bem, indeferidos.
Por outro lado, o facto de entretanto terem entrado em vigor as Medidas preventivas não impedia que a Recorrente fizesse valer o seu alegado direito, pois o artigo 5º daquelas medidas é claro ao estabelecer que não ficam abrangidos pelas mesmas “os actos administrativos válidos e eficazes constitutivos de direitos”, nos quais se incluem, obviamente, os PIP’s aprovados expressa ou tacitamente.
Em suma, e tal como concluiu o Tribunal a quo, não ocorreu deferimento tácito do pedido de informação prévia, e, a ter ocorrido, o mesmo caducaria por ausência de início de procedimento subsequente no prazo de um ano.
E o que dizer do alegado deferimento tácito das impugnações administrativas?
No que a este segmento diz respeito, entendeu-se na sentença que encontrando-se em vigor, à data dos factos ora em apreço (julho de 2004) as medidas preventivas e posteriormente a suspensão de todos os procedimentos que não durou mais de 150 dias, mostrava-se juridicamente inviável o deferimento de qualquer pretensão urbanística”, já que “As novas regras urbanísticas em vigor correspondem ao PDM revisto em 2006, pelo que a Autora nunca poderia obter deferimento expresso ou tácito da sua pretensão.
E, de facto, assim, é.
Com efeito, importa ter presente que através da reclamação administrativa apresentada, a Recorrente impugnou o parecer da DRAOT- Norte e os actos de homologação praticados pelo Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade e pelo Vice-Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N).
Esta reclamação foi apresentada à Câmara Municipal do Porto.
Por outro lado, pelo recurso hierárquico impróprio a Recorrente impugnou o despacho de homologação do parecer da DRAOT-Norte proferido pelo Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade, sendo que este recurso foi, igualmente, apresentado à Câmara Municipal do Porto.
Nos presentes autos a Recorrente pretende ver reconhecido o deferimento tácito das pretensões deduzidas nestas impugnações nos termos previstos no nº 2 do artigo 114º do RJUE(6), o que, como considerado pela sentença recorrida, não poderá proceder.
Desde logo, no que respeita à impugnação do parecer realizada através da reclamação, dir-se-á que a mesma nunca poderia ser apresentada à Câmara Municipal, em virtude deste órgão municipal não ter qualquer poder para rever um parecer emitido por um organismo da Administração Central como é o caso da CCDR-N. A apreciação deste tipo de pretensões encontra-se, por lei, atribuída à DRAOT-Norte (ou CCDR-N) nos termos previstos no nº 2 do artigo 3º das Medidas Preventivas, o que significa que a matéria em causa encontra-se fora do âmbito da competência dispositiva do Município, aqui Recorrido.
Por esse motivo, a reclamação do parecer elaborada pela Recorrente encontrava-se, ab initio, condenada ao fracasso.
É que, se é certo que o nº 1 do artigo 114º do RJUE permite a impugnação directa deste tipo de actos, não é menos verdade que a Recorrente não o impugnou perante a entidade que o podia rever.
E o que mesmo se diga da impugnação do acto do Vice-Presidente da CCDR-N que o homologa, pois que, no que tange ao acto de homologação praticado pelo Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade, estando em causa um parecer vinculativo como é o caso dos presentes autos, esta homologação é obrigatória, razão pela qual à “instância decisória” não resta(va) outra possibilidade senão acatar o parecer emitido - neste sentido, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco de Amorim, ob. cit. pág. 445.
Nesta medida, a única forma válida e eficaz de impugnar o parecer e respectiva homologação seria fazê-lo junto das entidades que detêm o poder de rever o seu conteúdo. Não o tendo feito, não pode ser reconhecido à Recorrente o efeito que pretende, descrito no ponto b) do pedido da petição inicial.
Mas, ainda que assim não fosse entendido, o certo é que o invocado deferimento tácito das impugnações administrativas da Recorrente, sempre se encontraria ferido de nulidade; isto porque, como já se referiu, em ordem a dar cumprimento ao disposto no nº 2 do artigo 3º das Medidas Preventivas (em vigor à data) o Município/Recorrido encontrava-se legalmente obrigado a consultar a DRAOT-Norte.
Ora, em resposta a esta consulta, esta entidade veio a emitir parecer desfavorável à pretensão da Recorrente.
Assim, por força do disposto nas alíneas a) e c) do artigo 68º do RJUE, uma decisão do Município, expressa ou tácita, contrária ao parecer emitido, estaria sempre ferida de nulidade.
A isto acresce, como sublinhou o Tribunal a quo, que a Autora deixou incólume na ordem jurídica o acto de indeferimento do recurso hierárquico impróprio, sendo que não pode ser pela via da acção comum que se pode tentar obter um efeito que somente poderia ser obtido pelo recurso à acção administrativa especial, na qual se devia peticionar a anulação de tal acto.
Por outro lado, ainda, a Autora pretende obter um efeito jurídico correspondente à condenação à prática de acto devido sem se ter socorrido de meio próprio para o efeito, ou seja, da acção administrativa especial.
É que não basta peticionar o reconhecimento de uma situação, mister se torna que a administração seja obrigada a praticar um acto em substituição do acto negatório da pretensão (ou em execução de sentença).
De facto, estando em causa actos administrativos, só a acção administrativa especial de impugnação, no primeiro caso, e de condenação, no segundo, constituem os meios processuais idóneos a satisfazer a pretensão da Recorrente.
Sobre esta matéria, e além do mais, alega a Recorrente que “já se havia produzido o deferimento tácito das impugnações administrativas […] não podendo o Tribunal recorrido invocar agora aquele acto expresso de indeferimento como ‘substitutivo’ do anterior acto tácito de deferimento. Caso contrário, estaríamos perante um acto revogatório de um acto constitutivo de direitos que […] não é livremente revogável, excepto se acompanhado de indemnização […]”.
Ora, neste particular, ainda que assim fosse, sempre a forma de processo adequada a impugnar esse “acto revogatório” seria a acção administrativa especial, a propor no prazo legal, razão pela qual, na sua ausência, não podia ter sido satisfeita a pretensão da parte.
É certo que, nas alegações, a Recorrente afirma que “Ainda que assistisse razão ao Tribunal recorrido, a verdade é que os termos de execução de uma determinada solução jurídica/pedido não podem justificar uma denegação de justiça”.
Ora, não pode acolher-se esta leitura, pois tal equivaleria a permitir que a Recorrente, que não lançou mão da competente acção administrativa especial - no prazo legal -, pudesse agora obter o mesmo efeito jurídico no prazo mais dilatado da acção administrativa comum - confira-se, a este propósito, o Acórdão do STA de 15/06/2004, aqui trazido pelo Recorrido, proferido na vigência da LPTA mas que, para o efeito, mantém a sua validade:
I-A acção para reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido é um meio processual complementar, destinado a ser utilizado nos casos em que o administrado não tenha ao seu alcance outro meio que lhe assegure tutela judicial efectiva.
II-Assim, não é o meio próprio a utilizar, no caso em que, praticado um acto administrativo, o recurso contencioso de anulação combinado com o dever de reconstituir a situação actual hipotética, que a sentença anulatória faz impender sobre a Administração, em execução do julgado, garante ao lesado uma tutela judicial sem lacunas.
Em face do exposto, é evidente que o pedido indemnizatório formulado pela Recorrente tem de ser desatendido.
De resto, como ensinam Mário Aroso e Carlos Cadilha, no seu Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos (Almedina, Coimbra, maio de 2010, pág. 255), “A possibilidade de invocação, pelo interessado, da ilegalidade de um acto administrativo relativamente ao qual já tenham decorrido os prazos de impugnação, no âmbito de uma acção administrativa comum, só pode, portanto, dirigir-se a obter efeitos jurídicos não coincidentes com os que resultariam da propositura de uma acção de impugnação.”
Com a leitura que temos vindo a fazer da hipótese vertente, a acção teria de improceder como concluído pelo Tribunal a quo.
Com efeito, o requisito legal fundamental do direito de indemnização previsto no nº 2 do artigo 143º do DL 380/99, de 22 de Setembro(7), é a existência de “possibilidades objectivas de aproveitamento do solo, preexistentes e juridicamente consolidadas”.
A propósito da aplicabilidade desta norma aos pedidos de informação prévia, veja-se Fernando Alves Correia, em Manual de Direito do Urbanismo, Vol. I, 2ª ed., Almedina, págs. 571/572, que se pronuncia no sentido da mesma se verificar quando o particular, “beneficia de um acto administrativo prévio favorável, por exemplo, uma informação prévia favorável sobre a viabilidade de realizar determinada operação urbanística e tendo apresentado, dentro do prazo de um ano a contar da notificação daquela, um pedido de licenciamento ou autorização da operação urbanística a que respeita - […] - a licença ou autorização não puder ser concedida, por ter, entretanto entrado em vigor um plano cujas disposições são incompatíveis com a realização da operação urbanística objecto de “informação prévia favorável…”.
No caso posto, o direito de indemnização só existiria se a Recorrente tivesse apresentado o pedido de licenciamento dentro do prazo de um ano, o que, já se viu (e a própria o admite), não aconteceu.
Logo, nenhuma censura merece a decisão recorrida quando afirma que a Autora não logrou demonstrar os pressupostos de facto e de direito necessários para que pudesse preencher os requisitos do preceito por si invocado, pelo que não tem direito a qualquer indemnização.
Sempre se dirá que o artigo 143º do DL 380/99, prevê um direito de indemnização com fundamento na protecção da confiança dos proprietários na manutenção das previsões do plano.
Sucede que, no caso dos autos, a Recorrente não pode arrogar-se a qualquer direito à protecção de confiança digna de tutela jurídica.
É que, da análise desta norma resulta que o direito de indemnização aí previsto depende da verificação cumulativa de dois requisitos:
a. as restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo resultantes da revisão dos planos ocorram dentro do período de cinco anos após a entrada em vigor do plano;
b. dessas restrições deve resultar a caducidade ou a alteração de um licenciamento prévio válido - Fernando Alves Correia, ob. cit. pág. 582.
Na hipótese vertente não se verifica este condicionalismo.
Com efeito, no que tange ao requisito referido em a) - e contrariamente ao defendido pela Recorrente - é manifesto que esse período de cinco anos há muito que tinha sido ultrapassado.
Ao invés do que (re)afirma, o plano urbanístico a ter em conta é o Plano Director Municipal (PDM) do Porto publicado em 1993 e não as Normas Provisórias, pois que as Normas Provisórias são normas urbanísticas transitórias, destinadas a vigorar por um curto período, sendo que o seu período de vigência encontrava-se à partida bem delimitado no tempo.
Isso mesmo resulta da sua denominação “Provisórias”, como se encontra estabelecido no seu preâmbulo em que as mesmas são apelidadas de “instrumento transitório”, como ressalta do clausulado da Resolução do Conselho de Ministros que as ratificou, que delimita previamente o seu período de vigência.
Desta forma, dada a sua transitoriedade, estas Normas não são susceptíveis de gerar um sentimento de confiança relativo à estabilidade das prescrições urbanísticas. Atendendo ao seu carácter fugaz, os particulares não podem sentir as suas expectativas defraudadas se, decorrido o seu período de vigência, o legislador vier a fixar normas urbanísticas que restrinjam as “possibilidades objectivas de aproveitamento do solo”.
Por isso, é em relação ao momento da entrada em vigor do PDM de 1993 que se inicia a contagem do período de cinco anos e não em relação à entrada em vigor das Normas Provisórias, conforme pretende a Autora/Recorrente.
No que respeita ao pressuposto aludido em b. o mesmo não se verifica já que a ora Recorrente não é titular de qualquer “licenciamento prévio válido”.
A este propósito, Fernando Alves Correia exclui: “Os danos resultantes da subtracção ou da diminuição de uma modalidade de utilização do solo conferida por um plano municipal, por efeito da alteração, revisão ou suspensão deste, ainda que estas ocorram dentro do prazo de cinco anos após a sua entrada em vigor, se o proprietário não for detentor de uma licença ou de uma autorização de uma operação urbanística prévia válida”.
Como já se disse, e repete-se, a Recorrente não era detentora de qualquer informação prévia válida e eficaz, razão pela qual a sua situação não é indemnizável, pelo que, também neste domínio, bem andou a decisão recorrida. Verifica-se que a Autora nunca teve deferimento tácito do pedido de informação prévia, nem o podia ter jamais em face da aplicação das medidas preventivas e posterior suspensão dos procedimentos até à vigência do novo PDM, sentenciou.
Em suma:
-não se mostram verificados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, desde logo, porque não há qualquer ilícito susceptível de ser imputado ao Município;
-a imposição legal de prazos para a tomada de decisões da Administração não tem como propósito proteger directamente os interesses económicos do particular, contrariamente ao que a Recorrente quer fazer crer;
-concretamente, o RJUE coloca à disposição dos particulares mecanismos próprios de que estes podem e devem socorrer-se para combater a inércia da Administração;
-mas, na tese da Recorrente, não tendo o Município tomado decisão expressa sob o procedimento de informação prévia por si apresentado, deveria a mesma ter considerado a sua pretensão tacitamente deferida, nos termos do artº 111º/al. c) do RJUE e daí ter extraído as “consequências gerais”, ou seja, ter apresentado o competente pedido de licenciamento, no prazo de um ano a contar do deferimento tácito, como estipulado no nº 1 do artº 17º do RJUE, o que também não fez;
-desatendem-se, pois, as conclusões da Recorrente, o que conduz à manutenção na ordem jurídica da sentença recorrida; é que, contrariamente ao invocado, fez correcta interpretação/aplicação da lei e do Direito aplicáveis;
-é que também não se mostram violados quaisquer comandos constitucionais, designadamente os indicados mas não densificados pela parte, no introito da sua peça processual (a Decisão recorrida assentou numa errada interpretação da lei e do Direito aplicável ao caso concreto, o que determinou um manifesto erro de julgamento quanto às diversas questões jurídicas submetidas à apreciação do Tribunal a quo, pelo que a mesma não pode sobreviver na ordem jurídica, sob pena de violação do direito fundamental da Recorrente à propriedade privada e dos direitos constitucionais dos administrados ao acesso à Justiça e ao Direito e a uma tutela jurisdicional efectiva (artºs 20º, 62º e 268º nºs 4 e 5, da Constituição);
-no que tange à violação dos citados princípios, não se mostra consubstanciada essa alegação, o que, desde logo, a faz soçobrar.
Em face do que se deixou dito, torna-se despicienda a análise do recurso subordinado apresentado pelo Réu/Recorrido.

DECISÃO
Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Notifique e DN.

Porto, 30/11/2016
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico Branco
Ass.: Rogério Martins
______________________________________
1
Cfr. os mesmos autores na obra citada, pág. 445.
2 Artigo 68.º
Nulidades

Sem prejuízo da possibilidade de atribuição de efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de atos nulos nos termos gerais de direito, bem como do disposto no artigo 70.º, são nulas as licenças, as autorizações de utilização e as decisões relativas a pedidos de informação prévia previstos no presente diploma que:
a) ….;
b)…..;
c) Não tenham sido precedidas de consulta das entidades cujos pareceres, autorizações ou aprovações sejam legalmente exigíveis, bem como quando não estejam em conformidade com esses pareceres, autorizações ou aprovações.

3 Artigo 15.º
Consultas no âmbito do procedimento de informação prévia

1 - No âmbito do procedimento de informação prévia há lugar a consultas externas, nos termos dos artigos 13.º a 13.º-B, às entidades cujos pareceres, autorizações ou aprovações condicionem, nos termos da lei, a informação a prestar, sempre que tal consulta seja exigível num eventual pedido de licenciamento ou com a apresentação de comunicação prévia.
4 Artigo 16.º
Deliberação

1 - A câmara municipal delibera sobre o pedido de informação prévia no prazo de 20 dias ou, no caso previsto no n.º 2 do artigo 14.º, no prazo de 30 dias contados a partir:
a) ….
b) Da data da receção do último dos pareceres, autorizações ou aprovações emitidos pelas entidades exteriores ao município, quando tenha havido lugar a consultas; ou ainda
c) Do termo do prazo para a receção dos pareceres, autorizações ou aprovações, sempre que alguma das entidades consultadas não se pronuncie até essa data.

5 Artigo 111.º
Silêncio da Administração

Decorridos os prazos fixados para a prática de qualquer ato especialmente regulado no presente diploma sem que o mesmo se mostre praticado, observa-se o seguinte:
a) ….;
b) ….;
c) Tratando-se de qualquer outro ato, considera-se tacitamente deferida a pretensão, com as consequências gerais.

6 Artigo 114.º
Impugnação administrativa

1 - Os pareceres expressos que sejam emitidos por órgãos da administração central no âmbito dos procedimentos regulados no presente diploma podem ser objeto de impugnação administrativa autónoma. (sublinhado nosso)
2 - A impugnação administrativa de quaisquer atos praticados ou pareceres emitidos nos termos do presente diploma deve ser decidida no prazo de 30 dias, findo o qual se considera deferida.

7 Da indemnização
Artigo 143.º
Dever de indemnização

1-…..
2 - São indemnizáveis as restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo, preexistentes e juridicamente consolidadas, que comportem uma restrição significativa na sua utilização de efeitos equivalentes a uma expropriação. (sublinhado nosso)