Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00275/07.4BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:07/07/2016
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Vital Lopes
Descritores:OPOSIÇÃO
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
CULPA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:1. O regime legal da responsabilidade subsidiária dos gerentes por dívidas fiscais do art.º13.º do CPT, faz recair sobre o gerente que exerceu funções durante o período em que se constituíram e/ou em que deviam ser pagas tais dívidas, a prova de que não teve culpa pela insuficiência do património social para satisfazer os créditos exequendos.
2. Não logra afastar a sua culpa na situação de insuficiência patrimonial da devedora originária o gerente/oponente que unicamente logra demonstrar que em período concomitante com o das dívidas se deparou com uma crescente quebra no volume de encomendas, mantendo-se inalterados os custos de laboração e que no mesmo período (década de 90) chegou a parar a laboração vários meses em cada ano, sem nada avançar quanto às razões que o levaram a prolongar a vida da empresa e a avolumar as suas dívidas não a apresentando de imediato a processo de recuperação ou falência ou que actos praticou em concreto para inverter a trajectória de descalabro financeiro a que a empresa chegou.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:A...
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO
A… recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a oposição à execução fiscal n.º3476199591010638 e apensos contra ele revertida e originariamente instaurada contra “F..., Lda.”, por dívidas à Segurança Social abrangendo o período de Outubro de 1995 a 1998.
O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo.

Na sequência do despacho de admissão, o Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões:
1ª – Vem o presente recurso interposto da, aliás, douta sentença de fls. …, que julgou improcedente a oposição por parte do Oponente A..., decidindo não ter o Recorrente ilidido a presunção legal de culpa prevista no n.º 1 do artigo 13º do C.P.P.
2ª – No mais, o despacho de reversão produzido pela Administração Tributária, não se encontrando fundamentado de forma minimamente capaz quanto às razões de facto e de direito, padece de vício gerador de nulidade, impedindo tal omissão que do probatório conste os factos susceptíveis de determinar a condenação do Recorrente.
3ª – A falta de fundamentação do despacho de reversão sempre comprometerá irreversivelmente a possibilidade do Tribunal sindicar a verificação dos pressupostos substantivos da responsabilidade subsidiária, na medida em que não chegaram a ser invocados.
4ª – Pelas razões alegadas, nomeadamente, pelo facto do art° 13° do C.P.T. apenas permitir que o responsável subsidiário responda por dívidas provenientes de contribuições e impostos, deve a reversão da execução contra o Recorrente, na parte respeitante a eventuais juros e demais acréscimos, bem como receitas parafiscais, ser julgada ilegal, pelos fundamentos vindos de invocar.
5ª – Atentos os factos apurados deve decidir-se que o Recorrente não teve culpa na insuficiência do património da devedora originária para solver a dívida exequenda, nem que a actuação do Recorrente foi causal da verificada insuficiência, não sendo portanto, sujeito de reversão do tributo.
6ª – Ao assim decidir e quanto à matéria objecto de reapreciação, foram violados, entre outros, o disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 204º e 153º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, artigo 13º do C.P.T. e art.ºs 487.º n.º2 e 799.º n.º2 do Código Civil, pelo que não pode a decisão manter-se.

Termos em que, pelo que vem de se expor e pelo muito que Vossas Excelências suprirão, deverá o presente recurso ser julgado provido, por legalmente fundado e, em consequência:
a) ser revogada a sentença recorrida, substituindo-se por outra que conheça do vício de falta de fundamentação do despacho de reversão, com as legais consequências ou, se assim não se entender,
b) ser revogada a sentença recorrida, substituindo-se por outra que julgue procedente a oposição do Recorrente, julgando-o parte ilegítima por ter logrado demonstrar que não foi por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente,
tudo a bem da JUSTIÇA!».

A Recorrida não apresentou contra-alegações.


A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se na ordem jurídica a sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente as questões que importa decidir reconduzem-se a saber se o despacho de reversão contém a fundamentação legal e se o oponente se pode considerar parte legítima na execução e, ainda, se este tribunal de recurso pode ser chamado a pronunciar-se sobre questões novas, ou seja, sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:

«Factos Provados:
1) O processo executivo foi instaurado em 06.04.2000, contra “F..., LDA”, respeitantes a contribuições em divida à Segurança Social de Outubro de 1995 a 1998 - cfr. mapa de fls. 64 do apenso.
2) As contribuições em divida foram apuradas em face das folhas de remunerações enviadas à segurança social pela primitiva executada - fls. 43 a 46 do apenso.
3) Em 30.05.2000, foi citada a executada originária - fls. 48 do apenso.
4) Realizadas as diligências necessárias, constatou-se, em 17.05.2000, que a executada originária não dispunha de bens susceptíveis de penhora, constatando-se que cessara a actividade, o que ocorreu em Dezembro de 1998 - cfr. fls. 49 do apenso e fls. 14 destes autos.
5) O Oponente foi notificado para efeitos de audição prévia em 25.11.2004 - fls. 55 e 56 do apenso.
6) Em 24.07.2006, o Oponente A… foi citado para o Processo Executivo - fls. 66 a 69 dos autos.
7) O Oponente A… é sócio da referida sociedade desde a sua constituição, em 27.12.1988 tendo adquirido, na mesma data, uma quota no valor de 200 000$00 - cfr. cópia da certidão emitida pela Conservatória do Registo Comercial de Guimarães constante dos autos.
8) A gerência ficou a cargo de ambos os sócios, o ora Oponente e D....
9) Em 19.12.1990, o sócio D... cessou as funções de gerência, por renúncia, cedendo, na mesma data, a quota que detinha a M….
10) Era o Oponente A… quem praticava, em nome da sociedade originária devedora, todos os actos e negócios inerentes à prossecução do abjecto social e ao cumprimento de todas as obrigações.
11) Era o Oponente quem, de facto, geria sozinho a sociedade originária devedora, desde o momento da constituição da sociedade e até ao seu encerramento.
12) A sociedade devedora trabalhava a feitio, e deparou-se desde meados da década de 90 com uma crescente quebra do número de encomendas, mantendo-se idênticos os custos de laboração.
13) Na década de 90, a sociedade chegou a parar a sua laboração durante vários meses em cada ano.
14) O Oponente é pessoa que vivia, e vive, com dificuldades
Factos não provados
Para além da matéria dada como provada, não se provou a demais matéria de facto que foi alegada.
*
Motivação da Matéria de Facto dada como assente
Os factos dados como provados resultam, por um lado, da análise dos documentos constantes do Processo de Execução Fiscal e dos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados pelas partes.
Foi também valorada a prova testemunhal oferecida pelo Oponente, a qual contribuiu para se terem dado como provados os factos constantes de 10) a 14) do probatório.
Para estes efeitos, considerou o Tribunal o depoimento prestado pela testemunha N…, pessoa que trabalhou na empresa desde 1992/1993 e até ao encerramento, por volta de 1998.
O depoimento revelou-se objectivo e desinteressado, tendo a testemunha respondido a tudo quanto lhe foi perguntado de maneira consistente e segura, revelando conhecimento directo dos factos a que respondeu, tendo o depoimento contribuído para se terem dado como provados os factos constantes de 10) a 14) da matéria assente.
Sobre esta matéria, referiu a testemunha que a empresa trabalhava a feitio, fazendo principalmente bainhas e luvas, utilizando na laboração cerca de 7 máquinas que já não eram novas, as quais foram posteriormente penhoradas e vendidas, servindo o dinheiro para pagar aos trabalhadores; referiu também que quando chegou à empresa, esta já se debatia com algumas dificuldades; mais disse que os salários dos trabalhadores foram sempre pagos a tempo e que o Oponente era bom patrão.
Considerou também o Tribunal, o depoimento prestado pela testemunha José Jorge Neto Teles, Técnico Oficial de Contas que, nessa qualidade prestou serviços à sociedade.
O depoimento, pela forma como foi prestado, revelou isenção e objectividade, tendo a testemunha respondido a quanto lhe foi perguntado com serenidade e de forma desinteressada, revelando conhecimento directo dos factos em causa atenta a relação profissional que manteve com a sociedade devedora. O depoimento mostrou-se relevante para ter sido dado como provada a matéria que foi ao probatório sob os n.ºs 10) a 14).
O seu depoimento contribuiu para a caracterização da actividade desenvolvida pela sociedade executada, tendo a testemunha referido que a sociedade pagava normalmente primeiro ao pessoal, a electricidade e a manutenção das máquinas, ficando para último o pagamento dos impostos; mais referiu que preveniu o oponente do não pagamento dos impostos, e que não foi solicitada a insolvência da sociedade, existindo a expectativa que a situação melhorasse; referiu ainda que a testemunha que o Oponente A… é pessoa que vivia e vive com dificuldades, tendo apenas ficado com as dívidas da empresa».

Ao abrigo do disposto no art.º662.º, n.º1, do CPC, adita-se ao probatório o seguintes factos, documentalmente provados como se indica:

15. Consta expressamente do despacho de reversão, a fls.66 do apenso instrutor, que se ordena o prosseguimento da reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, A…, após concretizada a audição prévia, mais se referindo expressamente a insuficiência de bens penhoráveis da executada sociedade “F..., Lda.”, bem como o montante e os períodos a que se refere a dívida revertida, conforme relação anexa ao despacho;

16. Já do projecto de despacho para audição prévia a que alude o despacho de reversão (consta a fls. 59 do apenso), constavam a identificação da executada originária, as dívidas e os períodos a que se reportavam, bem como os seguintes elementos: «Face aos elementos existentes, verifica-se não serem conhecidos bens penhoráveis neste concelho nem em qualquer outra parte, pertencentes à executada»; «Resulta ainda dos autos que, na data do prazo legal do pagamento das dívidas tributárias, exerciam funções de gerente de facto e/ou de direito na gerência/administração da executada, os seguintes gerentes/ administradores: 1.º – A… …»; Mais adiante, consta do projecto: «Assim, nos termos do n.º2 do art.23.º, alínea b) do n.º1 do art.24.º, da Lei Geral Tributária e n.º1 do art.º13.º do Código de Processo Tributário, é este gerente/ administrador subsidiariamente responsável em relação à executada…pelo pagamento das dívidas em causa, respeitante aos períodos da sua gerência/administração de facto, pelo que nos termos legais referidos, determino a preparação dos referidos processos para efeitos de reversão contra este responsável subsidiário».
4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

Invoca o Recorrente nulidade do despacho de reversão por falta de fundamentação.

Manifestamente, não tem razão.

Como se alcança do despacho de reversão, a fls.66 do apenso instrutor, dele consta expressamente que se ordena o prosseguimento da reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, A…, após concretizada a audição prévia, mais se referindo expressamente a insuficiência de bens penhoráveis da executada “F..., Lda.”, bem como o montante e os períodos a que se refere a dívida revertida (relação anexa ao despacho).

Já do projecto de despacho para audição prévia a que alude o despacho de reversão (consta a fls. 59 do apenso), constavam a identificação da executada originária, as dívidas e os períodos a que se reportavam, bem como os seguintes elementos: «Face aos elementos existentes, verifica-se não serem conhecidos bens penhoráveis neste concelho nem em qualquer outra parte, pertencentes à executada»; «Resulta ainda dos autos que, na data do prazo legal do pagamento das dívidas tributárias, exerciam funções de gerente de facto e/ou de direito na gerência/administração da executada, os seguintes gerentes/ administradores: 1.º – A… …»; Mais adiante, consta do projecto: «Assim, nos termos do n.º2 do art.23.º, alínea b) do n.º1 do art.24.º, da Lei Geral Tributária e n.º1 do art.º13.º do Código de Processo Tributário, é este gerente/ administrador subsidiariamente responsável em relação à executada…pelo pagamento das dívidas em causa, respeitante aos períodos da sua gerência/administração de facto, pelo que nos termos legais referidos, determino a preparação dos referidos processos para efeitos de reversão contra este responsável subsidiário».

Tendo em conta o enquadramento jurídico feito no projecto de despacho de reversão, relevam para a questão o n.º1 do art.º13.º do CPT e a alínea b) do n.º1 do art.º24.º da LGT.

O n.º1 do artigo 13.º do CPT, estabelece o seguinte: «Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas empresas e sociedades de responsabilidade limitada são subsidiariamente responsáveis em relação àquelas e solidariamente entre si por todas as contribuições e impostos relativos ao período do exercício do seu cargo, salvo se provarem que não foi por culpa sua que o património da empresa ou sociedade de responsabilidade limitada se tornou insuficiente para a satisfação dos créditos fiscais».

Por seu turno, o artigo 24.º da LGT estabelece o seguinte:
«1- Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento».

Assim, constituem pressupostos da reversão: (i) a fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal; (ii) a existência de responsabilidade subsidiária, de acordo com o n.º1 do artº13.º do CPT e alínea b) do n.º1 do art.º24º da LGT (a que releva para o caso).

Para efeitos desta responsabilidade exige-se o efectivo exercício da gerência, o que significa, de acordo com a jurisprudência uniforme dos tribunais tributários, que não pode ser responsabilizado aquele que apenas tiver exercido a gerência de direito, sem ter praticado actos materiais em que a gerência de uma empresa ou sociedade se traduz.

Porém, não é de exigir que a Administração tributária descreva ou prove no despacho de reversão os factos materiais em que se traduz o exercício da gerência, tal como resulta da doutrina do acórdão do STA de 31/10/2012, proferido no procº580/12 e cuja linha de entendimento tem sido acolhida em vários arestos daquele alto tribunal.

Deixou-se consignado no referido aresto, para além do mais, o seguinte: «É manifesto que não há no despacho de reversão cuja fundamentação é sindicada nos presentes autos a invocação de factos concretos nos quais a Administração tributária alicerce a alegação relativa ao efetivo exercício de funções por parte do ora recorrente, alegação esta que, embora constante do despacho de reversão, quase surge despercebida, resultando tão só da referência ao período da sua gerência ou a quando do seu exercício do cargo.
Por outro lado, resulta claramente do disposto no n.° 4 do artigo 23.° da Lei Geral Tributária (LGT) que: «A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação» (sublinhados nossos).
Ora, um dos pressupostos da responsabilidade tributária prevista no artigo 24.° da LGT é o exercício efetivo de funções no período de tempo a que respeita a dívida revertida, daí que não pode a Administração tributária deixar de alegar no próprio despacho de reversão que o efetivo exercício do cargo se verificou no período considerado.
Não nos parece porém, ao contrário do alegado, que seja necessário que do despacho de reversão constem os factos concretamente identificados nos quais a Administração tributária fundamenta a sua convicção relativa ao efetivo exercício de funções, pois que em causa não está uma acusação em matéria sancionatória e persistindo dúvida acerca do efetivo exercício de funções o “non liquet” não poderá deixar de ser valorado contra a Administração fiscal, que invoca o direito a responsabilizar o gerente, pois que inexiste presunção legal no sentido de que o gerente de direito exerça de facto as suas funções, daí que não possa seriamente defender-se que a não invocação no despacho de reversão de tais factos possa comprometer a defesa do responsável subsidiário».

Nesta linha de entendimento, é manifesto que resultando do despacho de reversão e do precedente projecto, o período a que respeita a dívida e a invocação expressa da gerência de facto do oponente embora não substanciada em factos concretos, a reversão se tem por suficientemente fundamentada.

Por outro lado, no que respeita à culpa, constava do regime de responsabilidade do art.º13.º do CPT uma presunção legal de culpa dos gerentes na insuficiência do património da sociedade para a satisfação dos créditos fiscais, a dispensar a Administração fiscal da alegação e prova de tal culpa; como consta do regime de responsabilidade previsto na alínea b) do n.º1 do art.º24.º da LGT, uma presunção legal de culpa dos gerentes na falta de pagamento ou entrega da prestação tributária também a dispensar a Administração fiscal da alegação e prova de tal culpa.

Assim, não constam, nem tinham de constar do acto de reversão as razões dessa culpa, que manifestamente não integram a fundamentação formal do acto de reversão, julgando-se, por todo o exposto, não verificado o invocado vício de forma por falta de fundamentação do despacho de reversão.

Improcede este segmento do recurso.

Insurge-se depois o Recorrente contra a sentença ao concluir, partindo da factualidade assente, que não ilidiu a presunção legal de culpa decorrente do n.º1 do art.º13.º do CPT.

Mais uma vez, não lhe assiste razão.

Em causa estão dívidas contributivas à Segurança Social de períodos de 1995 a 1998.

Assim, o regime de responsabilidade subsidiária, como bem entendeu a sentença, é o previsto no n.º1 do art.º13.º do CPT, aprovado pelo DL n.º154/91, de 23 de Abril (cf. art.º6.º do DL n.º398/98, de 17 de Dezembro), por ser esse o regime que vigorava à data de constituição das dívidas – nesse sentido pode ver-se o acórdão STA de 28-09-2006 tirado no proc.º0488/06: «I – As normas com base nas quais se determina a responsabilidade subsidiária, inclusivamente aquelas que determinam as condições da sua efectivação e o ónus da prova dos factos que lhe servem de suporte, devem considerar-se como normas de carácter substantivo, pois a sua aplicação tem reflexos materiais na esfera jurídica dos revertidos. II – Por isso, o CPT é aplicável para regular as condições da reversão contra os responsáveis subsidiários, bem como para estabelecer as regras do ónus da prova dos factos em que assenta a responsabilidade, relativamente a dívidas cujos períodos de constituição decorreram na sua vigência». E ainda o acórdão do mesmo alto tribunal de 29/06/2011, tirado no proc.º0368/11: «A responsabilidade subsidiária dos gerentes é regulada pela lei em vigor na data da verificação dos factos tributários geradores dessa responsabilidade, e não pela lei em vigor na data do despacho de reversão nem ao tempo do decurso do prazo de pagamento voluntário dos tributos».

A este propósito salienta-se que a referência também ao art.º24.º da LGT no despacho de reversão encontra explicação contextual na existência de dívidas de impostos cujo prazo de pagamento ocorrera já no domínio da LGT (cf. fls.62 do apenso).

Nos termos do n.º1 do artigo 13.º do CPT, «Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas empresas e sociedades de responsabilidade limitada são subsidiariamente responsáveis em relação àquelas e solidariamente entre si por todas as contribuições e impostos relativos ao período do exercício do seu cargo, salvo se provarem que não foi por culpa sua que o património da empresa ou sociedade de responsabilidade limitada se tornou insuficiente para a satisfação dos créditos fiscais».

Nesse regime de responsabilidade subsidiária, a lei onera com a presunção de culpa na insuficiência do património da empresa para satisfação dos créditos fiscais o gerente da devedora original.

Sendo uma presunção legal de culpa, ela só pode ser ilidida mediante a prova do contrário (art.º 350º/2 do Código Civil). Não basta a mera contraprova destinada a tornar duvidosa a sua culpa (art.º 346º do Código Civil) exigindo-se antes a demonstração de que a situação de insuficiência se ficou a dever exclusivamente a factores exógenos e que, no exercício da gerência, usou da diligência de um “bonus pater familiae” no sentido de prevenir e evitar essa situação (vd. acórdãos deste TCAN de 09-02-2012, tirado no proc.º00415/05.8BEBRG e de 06-04-2006, tirado no proc.º00021/02).

Tendo em conta o regime legal enunciado, importa agora apurar se o gerente/oponente logrou demonstrar ausência de culpa na insuficiência patrimonial da devedora originária para solver as dívidas fiscais.

Na sentença recorrida, ponderou-se, nomeadamente e a propósito, o seguinte:

«Como foi já referenciado, as dívidas em execução reportam-se a Contribuições para com a Segurança Social relativas aos trabalhadores da sociedade originária devedora, referentes aos anos de 1995 a 1998, altura em que a empresa terá encerrado.
Da instrução da causa, verifica-se que a sociedade já apresentava dificuldades desde meados de 1992/1993, dificuldades estas que se mantiveram e/ou agravaram nos anos seguintes e até ao fecho da actividade.
Nesse período, o Oponente foi consentindo no agravamento das dívidas para com o Estado, não apresentando a sociedade a qualquer medida de recuperação ou à falência, dando preferência ao pagamento dos trabalhadores e fornecedores, em detrimento do credor público.
E isto não obstante ter ser alertado e prevenido pelo Técnico Oficial de Contas.
Não se olvida que tal conduta terá porventura assentado na esperança de melhores dias que permitissem a recuperação da situação patrimonial da empresa, admitindo-se também que não terá existido uma situação de enriquecimento pessoal do gerente à custa do património da empresa.
E que, a segunda década de 90 foi também marcada pela crise/ajustamento do sector têxtil em resultado da liberalização dos mercados resultante da entrada em vigor dos Acordos celebrados no âmbito do G.A.T.T./O.M.C.,
Todavia, tal circunstancialismo, não se revela apto a preencher o critério de zelo que resulta do ordenamento jurídico, posto que ao gestor criterioso e diligente se exigiria, no plano objectivo, e em face do crescente passivo, que apresentasse a empresa à falência, e que diligenciasse pelo não aumento das dívidas das sociedades.
Nada disto resultou provado da instrução, resultando, ao invés, a persistência na manutenção da actividade, através do privilegiamento de alguns credores em prejuízo de outros, nomeadamente do Estado, situação em se persistiu, desde praticamente, o início dos anos 90 e até o encerramento definitivo da empresa.
Noutra vertente, não pode deixar de se ter presente a natureza das dívidas em execução; trata-se de contribuições para a Segurança Social, isto é, de importâncias da titularidade dos trabalhadores da empresa, que foram retidas dos salários dos mesmos, e que, juridicamente, apesar de não serem pertença da sociedade executada, esta se encontrava legalmente vinculada a entregar nos cofres do Estado, sob pena, inclusive, de incorrer em responsabilidade criminal (cfr. artº 27º-B do R.J.I.F.N.A. e o actual art.º 107º do R.G.I.T.).
E não entrega de tais quantias não pode deixar de se considerar desvaliosa relativamente ao ordenamento jurídico, não correspondendo ao comportamento que seria exigível a um gestor diligente, e posto que a sua entrega é inclusivamente objecto de coerção, mediante a ameaça de aplicação de sanção de natureza criminal, tudo o que reforça os deveres de apresentação da sociedade a processo de recuperação e/ou falência, por forma a prevenir o agravar da situação económica da empresa».

Concordamos com este modo de ver.

Na verdade, compulsado o probatório, dele não constam quaisquer factos que permitam afastar a culpa do gerente/oponente na situação de insuficiência patrimonial da devedora originária para solver as dívidas fiscais. As dificuldades económicas que a empresa experimentou pelo menos desde meados da década de 90, com uma crescente quebra no volume de encomendas (ponto 12 do probatório) e a circunstância de ter parado a laboração, por falta de encomendas (desenvolvia actividade na área das confecções a feitio), vários meses nos anos em causa (ponto 13), se por um lado e à falta de melhor explicação se compatibilizam mal com a manutenção da estrutura dos custos de laboração (afinal o que faz um gerente diligente e criterioso não é ajustar os custos de produção à realidade económica? o que fez, ou tentou a este respeito o oponente?), por outro, revelam que o gerente não agiu orientado para a protecção dos credores sociais, nomeadamente do Estado, apresentando de imediato a sociedade a processo de recuperação ou falência, antes deixando avolumar dívidas que aqueles credores inevitavelmente não veriam satisfeitas dada a progressiva erosão na solvabilidade da empresa e a depleção dos seus recursos com a manutenção de uma estrutura improdutiva de laboração (actuação evitável segundo parâmetros de boa gestão), acrescendo ainda que não pode deixar de merecer censura agravada, que a sentença também aponta, o facto de a empresa se ter apropriado em seu benefício de tributos retidos a trabalhadores, para além da mais que duvidosa bondade da opção pelo pagamento de outras despesas em detrimento das obrigações fiscais.

Acresce que, se o oponente praticou actos concretos visando inverter a trajectória de descalabro financeiro a que chegou a empresa, não o revelam os autos, nem o probatório.

No mais, diga-se, o oponente não impugnou eficazmente a decisão da matéria de facto, isto é, com observância do ónus imposto pelo art.º640.º do CPC (anterior 685.º-B) pelo que a factualidade que alega na motivação do recurso – renúncia à remuneração de gerente e suprimentos à sociedade com o propósito de manter os postos de trabalho – não estando vertida no probatório não pode ser relevada.

Concluímos, pois, que não há nos autos prova bastante que permita afastar a culpa do oponente na situação de insuficiência patrimonial da sociedade para solver as dívidas. E nada se demonstrando a tal respeito, deve ele responder pelas mesmas ao abrigo do disposto no n.º1 do art.º13.º do CPT, tornando-se parte legítima na execução pelas dívidas revertidas.

A sentença recorrida, que no mesmo sentido decidiu, não merece a censura que lhe vem dirigida.

Outrossim, alega o Recorrente que o regime de responsabilidade subsidiária do art.º13.º do CPT apenas prevê a responsabilização do gerente por dívidas de contribuições e impostos, que não de juros e outros acréscimos e dívidas parafiscais.

Trata de questão nova e, por isso, que não pode ser conhecida.

Como é jurisprudência pacífica do STA, reiterada em vários acórdãos, com excepção das que sejam de conhecimento oficioso, não pode em sede de recurso conhecer-se de questões novas, ou seja, de questões que não tenham sido objecto da sentença, pois os recursos jurisdicionais destinam-se a reapreciar as decisões proferidas pelos tribunais inferiores – visando anulá-las ou alterá-las com fundamento em vício de forma (nulidade) ou de fundo (erro de julgamento) – e não a decidir questões que, podendo e devendo ter sido suscitadas antes, o não foram.

Neste sentido, entre muitos outros, pode ver-se o recente acórdão do STA, de 27/01/2016 tirado no proc.º043/16, que contém vasta referência de jurisprudência.
Assim, não se conhece deste segmento do recurso.
O recurso não merece provimento.

5 - DECISÃO
Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo do Recorrente.
Porto, 07 de Julho de 2016
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro