Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00359/16.8BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/17/2023
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA;
NÃO VERIFICAÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA;
INEXISTÊNCIA DE ERRO DE JULGAMENTO;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:

RELATÓRIO
«AA», Divorciada, NIF ...69, residente na Quinta ..., ..., ... ... ..., instaurou Ação Administrativa contra Estado Português, representado pelo D. Magistrado do MP, Delegação Regional do Centro do Ministério da Educação, representada pela sua Delegada, com morada na ... Coimbra, Direção Geral dos Estabelecimentos Escolares, com morada na ... Coimbra e Ministério da Educação, representado pelo seu Exm.º Ministro, na ... ..., peticionando que os RR. sejam solidariamente condenados:
a) a reconhecerem que o valor retido na pensão de reforma da A., no montante de 25.085,27€, para pagamento de uma dívida à Caixa Geral Aposentações foi por conta de uma dívida da Escola Profissional quando o processo de reversão ocorreu por ser dirigente da Cooperativa.
b) a reconhecerem que a cobrança contra a A. dos referidos 25.085,27€, decorreu contra entidade que não era devedora de qualquer quantia.
c) a reconhecerem que a ARCE – Escola Profissional é quem era a entidade devedora do valor cobrado.
d) a reconhecerem que a A. tem direito a ser reembolsada do valor de 25.085,27€.
e) a aceitarem o direito de regresso da A. quanto à quantia que lhe foi penhorada.
f) a devolverem à A. a quantia de € 25.085,27, acrescida de juros indemnizatórios no montante de, pelo menos, 4.000,00€.
g) a pagarem à A. os juros vincendos desde a citação até a integral reembolso, à taxa legal.
h) nas custas e procuradoria legais.

Por decisão proferida pelo TAF de Viseu foi julgada a acção improcedente e absolvidos os Réus dos pedidos.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
A) A SENTENÇA recorrida não apreciou todas as questões suscitadas pela Autora, sendo nula por esse motivo.
B) A Sentença recorrida não apreciou todos os pedidos formulados pela Autora, sendo nula também por esse motivo.
C) A recorrente foi executada por ser Directora de uma Entidade de que não deveria ter sido executada porque não era devedora de qualquer quantia à CGA.
D) Tendo a DREC assumido a obrigação de pagamento à CGA também deverá reembolsar a recorrente executada indevidamente e desapossada de valores que lhe foram cobrados e que a DREC tinha obrigação de pagar porque para tal o PRODEP lhe transferiu verbas
E) Porque a Cooperativa não era devedora de qualquer valor à CGA também os valores retidos à recorrente não deverão reverter à CGA.
F) Ocorreu no caso enriquecimento ilícito do Estado/DREC/ME ao apossar-se dos 25.000,00€ cobrados à recorrente, quando deveria ter sido pagos pela DREC ou quando a DREC recebeu do PRODEP os valores suficientes para pagamento à CGA.

Entende assim violadas as normas previstas nos artigos 608 nº 2, 615 nº 1 d) do CPC, Artº 592, 524 do CC, artº 41. Nº 2 da LGT e artº 473 e ss do CC

Assim e nos termos expostos, se pretende a procedência do presente Recurso, de modo a que seja proferida nova decisão que ordene a condenação das recorridas a reembolsar a Recorrente no valor reclamado.

Pede(m) respeitosamente deferimento
O Estado Português, representado pelo MP, apresentou contra-alegações, concluindo:
1. A sentença recorrida não padece da invocada nulidade, prevista no art. 615º, nº 1, alínea d), do CPC;
2. A recorrente não deu cumprimento às especificações que o art. 640º, nº 1, do CPC (ex vi o art. 140º, nº 3, do CPTA), exige, sob pena de rejeição, para o caso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
3. De todo o modo, a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida mostra-se plenamente consonante com a prova documental, designadamente, e tal como consta da respetiva fundamentação, com o “teor dos documentos juntos aos autos pelas partes, processo administrativo junto pelo Ministério da Educação, processos de execução fiscal ... processo nº 825/15.2BEVIS que correu termos neste TAF", e “pelo confronto das posições das partes assumidas nos respetivos articulados”;
4. E, da matéria de facto assim dada como provada, não se vislumbra que a Autora tenha qualquer direito de regresso sobre o R. Estado Português ou o direito a ser reembolsada, a qualquer título, pelo mesmo, designadamente, ao abrigo dos invocados arts. 592º e 524º, do Código Civil, e 41º, nº 2, da LGT (que a recorrente considera terem sido violados na sentença recorrida);
5. Sendo também evidente que, ao contrário do que a A. pretende sustentar, não houve qualquer enriquecimento ilícito do Estado Português/DREC/ME, que, manifestamente, não se apossou dos € 25.000 que foram cobrados à recorrente no âmbito da execução fiscal, como devedora subsidiária da executada, e, consequentemente, não se verificam os requisitos do instituto do enriquecimento sem causa consagrado no art. 473º, do Código Civil (preceito que a recorrente também invocou nesta sede);
6. Nos termos e pelas razões que acima se expenderam;
7. Mostrando-se, pois, totalmente desconformes com a realidade (v.g. a prova documental existente e com o que, em consonância, veio a ser dado como provado na sentença recorrida), as alegações insertas nas conclusões C) a F) do recurso;
8. Realçando-se que, ao contrário do que a A. pretende sustentar nesta ação e reiterar em sede de recurso, não houve qualquer erro da CGA ao requerer a instauração da execução fiscal contra a Associação Regional de Cultura e Ensino, Cooperativa de Responsabilidade Limitada, enquanto proprietária da ARCE - Escola Profissional de Viseu, estabelecimento de ensino privado cooperativo;
9. Sendo, portanto, a cooperativa executada - enquanto a pessoa coletiva proprietária da Escola - a devedora (principal, originária) das contribuições devidas à CGA, muito embora estas tivessem sido originadas no âmbito da atividade daquele seu estabelecimento;
10. Aliás, no âmbito da execução fiscal, a A. conformou-se com a reversão e subsequente penhora que nela foram determinadas e veio mesmo a aceitar expressamente, nos termos sobreditos, que “o pagamento em causa ocorreu enquanto devedora subsidiária da ARCE-Associação Regional de Cultura e Ensino CRL” e que “a intervenção da requerente como devedora subsidiária decorre de imperativo legal”; ´
11. Desta feita, a posição que a A. veio sustentar nesta ação e reiterar em sede de recurso, de ter ocorrido a alegada reversão ilegal (e consequente cobrança ilegal) “porque a devedor principal seria sempre a Escola e não a Cooperativa” e de que a “recorrente foi executada por ser Directora de uma Entidade que não deveria ter sido executada porque não era devedora de qualquer quantia à CGA”, mostra-se, ademais, em clara contradição com a que tinha assumido na execução fiscal;
12. Realçando-se ainda que resulta à evidência que, na sentença proferida no processo nº 825/15.2BEVISD, não foi referido - nem a ora A. tem - qualquer direito de regresso sobre o Estado/DREC/ME;
13. Pois, manifestamente, o Estado/DREC/ME não era o devedor original da relação tributária subjacente à execução fiscal e, portanto, o pagamento coercivo que a ora A. aí efetuou como responsável subsidiária desse devedor original (a Cooperativa executada) é-lhe totalmente alheio;
14. Por outro lado, é também manifesto que o Estado/DREC/ME não era, solidariamente com a ora A., responsável subsidiário da devedora original nos termos do disposto nos arts. 23º e 24º da LGT e 153º e 159º, do CPPT, e, portanto, em nada beneficiou do pagamento coercivo da A.;
15. Consequentemente, tal como foi considerado na sentença recorrida, qualquer direito que a A. possa ter, nos termos da lei civil (v.g. dos invocados arts. 592º e 524º, do Código Civil), a ser reembolsada, total ou parcialmente, do que pagou coercivamente na execução fiscal como responsável subsidiária apenas poderá ser exercido, na jurisdição comum (como é referido na sentença), contra a devedora original - a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL, caso porventura a mesma tenha alterado a situação patrimonial documentada no processo de execução fiscal - e/ou contra os demais condevedores subsidiários - os restantes diretores daquela;
16. Sendo certo que o R. Estado Português/DREC/ME não foi:
§ Nem o requerente da execução (que foi instaurada na sequência
e em consonância com solicitação da CGA, pessoa coletiva distinta do Estado) contra a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL e, portanto, a ter havido (
que não houve, como acima se expôs) qualquer alegado erro na identificação desta como devedora/executada, que pudesse ter subsequentemente determinado a “ilegal” reversão e cobrança contra a ora A., não lhe é imputável;

§ Nem o credor da execução fiscal (CGA) e consequente beneficiário das quantias nela cobradas coercivamente para pagamento da dívida exequenda;

§ Nem o devedor originário da dívida exequenda (a Cooperativa executada) e o consequente beneficiário da quantia que, em sua substituição, foi cobrada à ora A., como responsável subsidiário e executado revertido;

§ Nem condevedor subsidiário na execução fiscal (os demais diretores da executada), solidariamente com a ora A., e que, assim, possa ter beneficiado do pagamento coercivo por esta efetuado para além da sua eventual quota-parte;

17. Apenas interveio na execução fiscal uma única vez, para, em nome da devedora principal (Cooperativa executada), e como mero gestor das verbas do PRODEP que lhe eram devidas e entretanto haviam sido desbloqueadas face à absolvição criminal da Cooperativa e seus dirigentes, efetuar o pagamento da quantia exequenda que, à data, ainda remanescia em dívida nessa execução fiscal;
18. Tal como, de resto, sucedeu com o pagamento de outras dívidas existentes (à Segurança Social, a agente de execução, à CGD), que esgotaram o montante das verbas recebidas do PRODEP, nos termos constantes da informação da DREC de 12/12/2012 e despacho concordante de 26/12/2012, de fls. 5 e 6 do Processo Administrativo apenso;
19. Sem que, portanto, o R. Estado Português/DREC/ME tivesse assumido, em seu nome próprio, qualquer obrigação de pagamento da quantia exequenda;
20. Carecendo, pois, de total fundamento a alegação agora sustentada pela A. em sede de recurso de que “o direito de regresso pode ser exercido contra quem tinha a obrigação de pagar a título principal e segundo o que ficou apurado nos autos, é a DREC que tem a obrigação de pagar porque recebeu do PRODEP as verbas para o fazer”;
21. Não constando, de resto, daqueles autos de Processo Administrativo que a ora A. tivesse dirigido, oportunamente, antes de se ter esgotado o montante das verbas recebidas do PRODEP, qualquer pretensão à DREC para pagamento da quantia que, enquanto devedora subsidiária, lhe fora cobrada coercivamente nos autos de execução fiscal;
22. Em suma, e ao contrário do sustentado na conclusão F) do recurso, resulta à evidência dos autos que o R. Estado Português não se “apossou dos 25.000,00€ cobrados à recorrente”;
23. Sendo certo que não foi o destinatário e em nada beneficiou das quantias cobradas coercivamente à ora A. no âmbito execução fiscal;
24. E que em nada beneficiou das verbas do PRODEP, que se limitou, através da DREC, como mera gestora das mesmas, e em nome da respetiva devedora principal, a aplicar integralmente no pagamento das dívidas existentes;
25. Seja no pagamento da quantia que, à data, remanescia em dívida no âmbito da execução fiscal em causa;
26. Seja no pagamento de outras dívidas existentes, nos termos que se encontram documentados no respetivo processo administrativo;
27. E, portanto, não pode o Estado/DREC/ME reembolsar/devolver à A., seja a que título for, aquilo que não integrou no seu património e/ou de que não beneficiou;
28. Inexistindo, portanto, qualquer enriquecimento do Estado e, muito menos, ilegítimo;
29. Consequentemente, as pretensões formuladas na presente ação contra o R. Estado/DREC/ME carecem totalmente de fundamento.
30. Assim, e tal como foi decidido na sentença recorrida, não foi cometida qualquer ilegalidade pela Administração;
31. A sentença recorrida não violou qualquer norma legal, designadamente, as invocadas pela recorrente, devendo, pois, manter-se.

TERMOS EM QUE,
Deverá ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a sentença recorrida.

ASSIM,
farão, como sempre,

JUSTIÇA

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1) A A. foi Diretora da ARCE – Escola Profissional de Viseu até Setembro de 1998, data em que por efeito de instauração de Processo Criminal em que foi acusada de vários crimes enquanto Diretora da ARCE, suspendeu funções.
2) O cargo da A. foi desempenhado por inerência da Direção da ARCE-Cooperativa CRL e cessou por isso na mesma data.
3) Por efeito da Instauração dos processos criminais contra a Autora e demais Diretores da ARCE - EPV o PRODEP suspendeu os pagamentos devidos à Escola Profissional, tendo originado a falta de pagamento de parte das contribuições devidas à Caixa Geral de Aposentações, num montante aproximado aos 95.000,00 €.
4) Tendo a CGA instaurado Processo de Execução através do Serviço de Finanças ... contra a Cooperativa veio a ser a Autora a ser responsável pelo pagamento em causa por processo de Reversão.
5) No processo de execução fiscal foi proferido despacho, em 09/02/2004, a ordenar reversão, nos termos constantes de fls. 127 a 129 – fls. 64 a 137 e fls. 127 do autos nº 825/15.2BEVIS).
6) Foi-lhe penhorada coercivamente parte da sua pensão de Reforma até ao montante de 25.085,27 €, pagamento que foi efetuado por desconto direto na sua pensão, auferida através do CNP.
7) A Autora não deduziu à data qualquer oposição na execução fiscal.
8) O PRODEP, por efeito da Absolvição de todos os arguidos, libertou a verbas devidas à ARCE – EPV, a R. DREC, como gestora das verbas provenientes do PRODEP e devidas à ARCE EPV e liquidou o valor em divida à AT.
9) A reclamante/Autora pagou a dívida em obrigação subsidiária.
10) A A. apresentou em 18/09/2009, a reclamação de fls. 4 e segs. dos autos nº 825/15.2BEVIS, contra o ato que não reconhecera a nulidade do título executivo e determinara o prosseguimento da execução, e relativamente à qual veio a ser proferida sentença, em 24/09/2010, transitada em julgado, a julgar procedente a exceção da caducidade do exercício do direito de reclamar.
11) Em 06/12/2012, já depois da extinção da execução pelo pagamento (ocorrida em 15/02/2012 – v. fls. 163 dos autos nº 825/15.2BEVIS), a A. apresentou requerimento em que, invocando o disposto no art. 41º, nº 2, da LGT, 92º, nºs 1 e 2, do CPPT, 51º da LGT, 195º, nº 1, do CPPT, peticionou “o reconhecimento da sua qualidade de sub-rogado” e o prosseguimento dos autos de execução (contra a executada originária), com penhora do valor devido à requerente “em posse da DRE” – v. fls. 280 a 282 dos autos nº 825/15.2BEVIS;
12) Foi indeferida essa pretensão pelo órgão de execução fiscal, a A. apresentou, em 12/03/2013, reclamação contra esse ato de indeferimento, nos termos constantes de fls. 292 a 295 dos autos nº 825/15.2BEVIS.
13) A A. não apresentou qualquer “pedido de reembolso por Direito de Regresso sobre a DREC” no âmbito dos referidos autos nº 825/15.2BEVIS.
14) A DREC era mera gestora das verbas provenientes do PRODEP e devidas à ARCE-EPV – cfr. processo administrativo apenso, a fls. 15 a 19 e 37 a 42.
15) Uma vez libertadas essas verbas do PRODEP na sequência da absolvição criminal, a DREC procedeu, em 14/02/2012, em nome da devedora principal (Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL) ao pagamento da quantia ainda em dívida na execução fiscal – cfr. fls. 130 a 136, 140, 149 a 155 dos autos nº 825/15.2BEVIS.
16) A A. apresentou um requerimento para reconhecimento da sua qualidade de sub-rogada e do consequente prosseguimento da execução fiscal contra a devedora principal (a executada Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL), com a penhora dos bens desta na posse da DREC – v. fls. 280 a 282 (e fls. 292 a 295) dos autos nº 825/15.2BEVIS.
17) A sua posição processual veio a desmerecer atendimento, conforme decisão proferida no processo nº 825/15.2BEVIS, julgando-se a reclamação improcedente, mantendo-se, em consequência, o ato reclamado na ordem jurídica – cfr. fls. 337 a 341 do processo n.º 825/15.2BEVIS.

DE DIREITO
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o Tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Assim,
A Autora instaurou a presente Ação Administrativa peticionando que os RR. fossem solidariamente condenados a:
a) Reconhecerem que o valor retido na pensão de reforma da A., no montante de € 25.085,27, para pagamento de uma dívida à Caixa Geral Aposentações foi por conta de uma dívida da Escola Profissional quando o processo de reversão ocorreu por ser dirigente da Cooperativa;
b) Reconhecerem que a cobrança contra a A. dos referidos € 25.085,27 decorreu contra entidade que não era devedora de qualquer quantia;
c) Reconhecerem que a ARCE – Escola Profissional é quem era a entidade devedora do valor cobrado;
d) Reconhecerem que a A. tem direito a ser reembolsada do valor de € 25.085,27;
e) Aceitarem o direito de regresso da A. quanto à quantia que lhe foi penhorada;
f) Devolverem à A. a quantia de € 25.085,27, acrescida de juros indemnizatórios no montante de, pelo menos, € 4.000,00;
g) Pagarem à A. os juros vincendos desde a citação até a integral reembolso, à taxa legal.
Alegou, essencialmente, que foi diretora da ARCE - Escola Profissional de Viseu, cargo desempenhado por inerência da Direção da ARCE - Cooperativa, CRL; por efeito da instauração de processos criminais contra a A. e demais Diretores da ARCE-EPV, o PRODEP suspendeu os pagamentos à Escola Profissional, tendo originado a falta de pagamento de parte das contribuições devidas à Caixa Geral de Aposentações, num montante aproximado de € 95.000,00; tendo a CGA instaurado Processo de Execução através do Serviço de Finanças ... contra a Cooperativa (erradamente, por não ser a Entidade Empregadora mas sim a ARCE EPV), veio a A. a ser responsável pelo pagamento em causa por processo de reversão, tendo-lhe sido penhorada a sua pensão de reforma pela quantia de € 25.085,27; entretanto, porque o PRODEP, por efeito da absolvição criminal, libertou as verbas devidas à ARCE-EPV, a DREC, como gestora das verbas provenientes do PRODEP e devidas à ARCE-EPV, liquidou o valor ainda em dívida; a A. fez vários pedidos de reembolso dos valores coercivamente cobrados, mas a DREC não paga porque a AT não considera em dívida no sistema e não reembolsa a A. porque não foi ela que cobrou coercivamente a dívida.
Alegando ainda que, por isso, “apresentou pedido de reembolso por Direito de Regresso sobre a DREC”, tendo invocado o disposto no arts. 41°, n° 2, da LGT, 92°, nºs 1 e 2, do CPPT, 51º, da LGT, e 56º, do CPC (na anterior redação).
E que, “tendo a reclamante/Autora pago a dívida em obrigação subsidiária, assistir-lhe-ia o direito de suceder no crédito pago por si, relativamente ao devedor principal”; contudo, “a sua posição processual veio a desmerecer atendimento, conforme sentença proferida no processo n° 825/15.2BEVIS”, “sem contudo o direito ao reembolso das quantias indevidamente penhoradas e coercivamente retidas à A. tenha precludido”, “como de resto é “recomendado” pela sentença, ao reconhecer o direito de reembolso da A. a exercer na Jurisdição Comum”.
Pois que, segundo alega, o ato de cobrança dessa quantia à A, é um ato ilegal, “como ficou demonstrado pela posterior assunção pelo Estado da obrigação de pagamento da quantia exequenda” e também pelo facto, “intrínseco, de a devedora principal ser a Escola Profissional e não a Cooperativa”; e a A. “foi chamada à responsabilidade porque diretora da Cooperativa e não da Escola”.
Concluindo que, ocorrendo retenção indevida dos rendimentos da A., tem esta direito ao reembolso dos mesmos, mesmo que seja por efeito de enriquecimento sem causa do Estado à custa do empobrecimento da A.
Por sentença de 25/02/2019, o Tribunal a quo, julgando a ação improcedente, por não provada, absolveu os RR. dos pedidos formulados.
Considerou o Tribunal, designadamente, que da sentença proferida nos autos nº 825/15.2BEVIS não resulta que a A. tenha qualquer direito de regresso sobre o Estado/DREC/ME, porquanto o Estado/DREC/ME não era devedor original da relação tributária subjacente à execução fiscal e, portanto, o pagamento coercivo que a A. aí efetuou como responsável subsidiária desse devedor original, a Cooperativa executada, não lhe respeita.
Que, por outro lado, inexistem dúvidas em como o Estado/DREC/ME não era, solidariamente com a A., responsável subsidiário da devedora origina, nos termos do disposto nos arts. 23º e 24º da LGT e 153º e 159º, do CPPT, e, portanto, em nada beneficiou do pagamento coercivo da A.
E que, consequentemente, “qualquer direito que a A. possa ter, nos termos da lei civil, a ser reembolsada, total ou parcialmente, do que pagou coercivamente na execução fiscal com responsável subsidiária apenas poderá ser exercido, na jurisdição comum, contra a devedora original - a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL, caso porventura a mesma tenha alterado a situação patrimonial documentada no processo de execução fiscal - e/ou contra os demais condevedores subsidiários - os restantes diretores daquela.
Concluindo que, assim, “bem andou a administração, não tendo sido cometida qualquer ilegalidade, nem se vislumbrando que o Estado ou o Ministério da Educação e seus outros serviços, não tenham cumprido as obrigações contratuais e legais”.
Manifestando a sua discordância pelo assim decidido, veio a A. interpor o presente recurso, a “pugnar por decisão diferente da tomada, argumentando que os pressupostos da decisão recorrida não são os verdadeiros, nem os alegados, mas também que o Tribunal não se pronunciou sobre as questões que lhe estavam suscitadas”.
Pugnando pela procedência do recurso, “de modo a que seja proferida nova decisão que ordene a condenação das recorridas a reembolsar a Recorrente do valor reclamado”.
Já se deixaram assinaladas as Conclusões que, como é sabido, delimitam o objeto do recurso.
Vejamos,
Quanto às invocadas nulidades da sentença -
Segundo o artigo 615º do NCPC (artigo 668º CPC 1961), ex vi artigo 1º do CPTA, sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”,
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
2 -…. .
3 -….. .
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
Nos termos das alíneas b) e c) só ocorre nulidade quando falte a fundamentação (de facto/de direito devidamente especificada) ou quando a fundamentação da decisão aponta num sentido e a decisão em si siga caminho oposto, ou seja, as situações em que os fundamentos indicados pelo juiz deveriam conduzir logicamente a um resultado oposto ao que se contém na sentença ou agora, também quando a decisão seja ininteligível por alguma ambiguidade.

Dos incontáveis arestos dos tribunais superiores que reiteram a mesma doutrina jurisprudencial nesta matéria, retemos o Acórdão do Pleno da Secção do CA do Supremo Tribunal Administrativo, de 15/11/2012, proc. 0450/09, que sumariou: “(…) II - A estrutura da sentença está concebida no artº 659º do CPC, devendo a mesma começar por identificar as partes, o objecto do litígio (fixando as questões que que ao tribunal cumpre solucionar), os fundamentos (de facto e de direito) e concluindo com a decisão. Delineada a estrutura deste acto jurisdicional (por excelência), o desvio ao figurino gizado pelo legislador ocasiona uma patologia na formação e estruturação da decisão susceptível de a inquinar de nulidade (artº 668º nº 1 do CPC).

III - Um dos elementos estruturantes da sentença é a fundamentação. Esta tem duas funções: uma função endoprocessual e uma função extraprocessual. A função endoprocessual é aquela que desenvolve a motivação da sentença, entendido como requisito técnico da pronúncia jurisdicional, no interior do processo; a função extraprocessual da motivação está ligada com a natureza garantista da absoluta generalidade e na consequente impossibilidade de a entender como derrogável ad libitum pelo legislador ordinário (e muito menos como derrogável ad libitum pelo juiz ou pelas partes.

IV - A nulidade da sentença por falta de fundamentação só ocorre quando haja ausência absoluta de motivação, ou seja, total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que a decisão assenta. (…)”.

Já a nulidade da alínea c) pressupõe um vício real no raciocínio expresso na decisão, consubstanciado na circunstância de a fundamentação explicitada na mesma apontar num determinado sentido, e, por seu turno, a decisão que foi proferida seguir caminho oposto, ou, pelo menos, diferente, ou ainda não ser perceptível face à fundamentação invocada. Isto é, a fundamentação adoptada conduz logicamente a determinada conclusão e, a final, o juiz extrai outra, oposta ou divergente (de sentido contrário).
Não se confunde com o erro de julgamento, seja quanto à apreciação dos factos feita pelas instâncias, seja quanto às consequências jurídicas deles extraídas, por inadequada ter sido a sua subsunção à regra ou regras de direito pertinentes à situação concreta a julgar.
Trata-se, pois, de uma irregularidade lógico-formal e não lógico-jurídica.
Só releva, para este efeito, a contradição entre a decisão e os respectivos fundamentos e não eventuais contradições entre fundamentos de uma mesma decisão, por um lado, ou contradição entre decisões, fundamentadas ou não, por outro.
Ao não existir qualquer contradição lógica, não se verifica esta nulidade, porquanto ela reporta-se ao plano interno da sentença, a um vício lógico na construção da decisão, que só existirá se entre esta e os seus motivos houver falta de congruência, em termos tais, que os fundamentos invocados pelo tribunal devessem, naturalmente, conduzir a resultado oposto ao que chegou.
E a omissão de pronúncia está relacionada com o dever que o nº 1 do artº 95º do CPTA impõe ao juiz de decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
Nestes termos, a nulidade da decisão por omissão de pronúncia verificar-se-á quando exista (apenas quando exista) uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Este vício relaciona-se com o comando ínsito na 1ª parte do n.º 2 do artigo 608.º do CPC, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras - cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, vol. V, Coimbra 1984 (reimpressão) e os Acórdãos do STA de 03/07/2007, proc. 043/07, de 11/9/2007, proc. 059/07, de 10/09/2008, proc. 0812/07, de 28/10/2009, proc. 098/09 e de 17/03/2010, proc. 0964/09, entre tantos outros.

Questões, para este efeito, são, pois, as pretensões processuais formuladas pelas partes no processo que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer ato (processual), quando realmente debatidos entre as partes - v. Antunes Varela in RLJ, Ano 122.º, pág. 112 e Teixeira de Sousa in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220/221.

Por seu turno, a nulidade por excesso de pronúncia verifica-se quando na decisão se conhece de questão que não foi suscitada por qualquer uma das partes, nem pelo Ministério Público, e não é do conhecimento oficioso.

É a violação do dever de não conhecer questões não suscitadas pelas partes, em razão do princípio do dispositivo alicerçado na liberdade e autonomia das partes, que torna nula a sentença, por excesso de pronúncia.

Na jurisprudência, sobre esta temática, vide, entre outros, os Acórdãos deste TCAN, de 30/03/2006, proc. 00676/00 - Porto, de 23/04/2009, proc. 01892/06.5BEPRT-A e de 13/01/2011, proc. 01885/10.8BEPRT, dos quais retiramos as seguintes coordenadas:

Ocorre excesso de pronúncia quando o Tribunal conhece de questões de que não pode tomar conhecimento por utilizar um fundamento que excede a causa de pedir vazada na petição, ou por extravasar o elenco legal do conhecimento ex officio ou, ainda, por conhecer de pedido quantitativa ou qualitativamente distinto do formulado pela parte, isto é, conhece em quantidade superior ou objecto diverso do pedido.

A delimitação do âmbito sancionatório da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC exige que se distinga entre questões e fundamentos, dado que, se a lei sanciona com a nulidade o conhecimento de nova questão (porque não suscitada nem de conhecimento oficioso), ou a omissão de conhecimento de questão suscitada (ou de conhecimento oficioso), já não proíbe que o julgador decida o mérito da causa, ou questões parcelares nela suscitadas, baseando-se em fundamentos jurídicos novos;

Questões, para esse efeito sancionatório, repete-se, serão todas as pretensões formuladas pelas partes no processo, que requeiram a decisão do tribunal, bem como os pressupostos processuais de ordem geral, e os específicos de qualquer acto especial, quando debatidos entre elas.

Efectivamente, como corolário do princípio da disponibilidade objectiva (arts. 264.º, n.º 1 e 664.º 2.ª parte), a decisão é nula quando o tribunal conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (art. 668.º, n.º 1, al. d) 2.ª parte), ou seja, quando a decisão esteja viciada por excesso de pronúncia. Verifica-se este excesso sempre que o tribunal utiliza, como fundamento da decisão, matéria não alegada ou condena ou absolve num pedido não formulado, bem como quando conhece de matéria alegada ou pedido formulado em condições em que está impedido de o fazer.

Assim, somente haverá nulidade da decisão, por excesso de pronúncia, quando o juiz tiver conhecido de questões que as partes não submeteram à sua apreciação, de que não pudesse conhecer, exceto se forem de conhecimento oficioso.

Retomando o caso posto não existe qualquer nulidade, mormente por omissão de pronúncia da sentença recorrida.
Considera a Recorrente, sob as conclusões A) e B), que a sentença é nula por não ter apreciado todas as questões suscitadas nem todos os pedidos formulados, convocando a violação do disposto nos artigos 608º, nº 2, e 615º, alínea d), do CPC.
Argumentado, a esse propósito, que as questões relevantes expostas nos pedidos a), b) e c) eram de tal forma estruturantes e relevantes que deveriam ter sido objeto de decisão e não o foram, acrescentando que a “decisão recorrida foi apreciada apenas do ponto de vista do Direito de regresso, mas não do ponto de vista do direito ao reembolso por ter sido indevidamente retirado do património da Autora.
Carece de razão.
É certo que, nos termos do disposto no invocado artº 615º, nº 1, alínea d), do CPC, a sentença é nula quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
Contudo, como se disse, para efeito de aferição da ocorrência de nulidade da sentença por omissão ou por excesso de pronúncia deve distinguir-se entre «questões» e «fundamentos», restringindo essa nulidade apenas à omissão ou ao excesso de conhecimento das primeiras.
Considerando-se que questões, para tal efeito, são todas as pretensões formuladas pelas partes no processo, que requerem a decisão do tribunal, bem como os pressupostos processuais de ordem geral, e os específicos de um qualquer acto especial, quando debatidos entre elas.
Tendo presente esta distinção, e atento o teor da sentença proferida, particularmente o excerto acima transcrito e o respetivo dispositivo, afigura-se-nos evidente que, no presente caso, a decisão recorrida se pronunciou sobre todas pretensões formuladas pela A., apreciando e julgando improcedente a ação e absolvendo os RR. “dos pedidos formulados”.
Em suma,
Da decisão proferida não se verifica cometida qualquer nulidade, obscuridade ou deficiência, considerando que o Tribunal apreciou todas as questões e especificou os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, não existindo qualquer oposição entre a matéria provada e a fundamentação jurídica, nem qualquer omissão, tendo-se o Tribunal pronunciado sobre todas as questões que lhe cabia conhecer.
Desatende-se esta argumentação da Parte.
Da rejeição do presente recurso quanto à matéria de facto -
Segundo invocado pela Recorrente, no presente recurso pretende “pugnar por decisão diversa da tomada, argumentando que os pressupostos da decisão recorrida não são os verdadeiros, nem os alegados”.
Sustentando, para o efeito, que, “tendo sido proferida decisão sem necessidade de provas para além das documentais, os factos articulados haverão de ser dados como provados”, elencando seguidamente o articulado na petição inicial, v.g. sob os artigos 1º, 5º a 13º, 15º, 25º, 26º, 29º e 30º.
Do assim alegado e da demais argumentação vertida no recurso e nas respetivas conclusões, v.g. sob as alíneas C) a F), parece resultar que a A. pretenderá impugnar também a decisão relativa à matéria de facto.
Porém, a ser assim, verifica-se que a Autora não cumpriu o ónus de especificação que, para o efeito, e sob pena de rejeição, é imposto pelo artº 640º, nº 1, do CPC, ex vi o disposto no artº 140º, nº 3, do CPTA.
Com efeito, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição do recurso:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo (...), que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferia sobre as questões de facto impugnadas.
No caso posto resulta à evidência que a Recorrente não efetuou qualquer das indicadas especificações, pelo que tem de ser rejeitado o recurso no que concerne à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Do mérito -
De todo o modo, concordando-se inteiramente com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que, não padece de qualquer nulidade e que, ademais, ao julgar totalmente improcedente a ação, se mostra plenamente conforme aos factos dados como provados - e que emergem da identificada prova documental - e ao direito aplicável, ela será mantida na ordem jurídica.
Com efeito, a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida mostra-se plenamente consonante com a prova documental, designadamente, e tal como consta da respetiva fundamentação, com o “teor dos documentos juntos aos autos pelas partes, processo administrativo junto pelo Ministério da Educação, processos de execução fiscal ... processo nº 825/15.2BEVIS que correu termos neste TAF", e “pelo confronto das posições das partes assumidas nos respetivos articulados”.
E, da matéria de facto assim dada como provada, não se vislumbra que a Autora tenha qualquer direito de regresso sobre o R. Estado Português ou o direito a ser reembolsada, a qualquer título, pelo mesmo, designadamente, ao abrigo dos invocados artigos 592º e 524º, do Código Civil, e 41º, nº 2, da LGT (que a Recorrente considera terem sido violados na sentença recorrida).
Sendo também evidente que, ao contrário do que a A./Recorrente pretende sustentar, não houve qualquer enriquecimento ilícito do Estado Português/DREC/ME, que, manifestamente, não se apossou dos € 25.000 que foram cobrados à Recorrente no âmbito da execução fiscal, como devedora subsidiária da executada, e, consequentemente, não se verificam os requisitos do instituto do enriquecimento sem causa consagrado no artº 473º, do Código Civil (preceito que a Recorrente invocou nesta sede).
Em primeiro lugar, trata-se de um facto novo, que a Recorrente não invocou na primeira instância, que não pôde ser apreciado pela sentença recorrida e que, como tal, não pode ser invocado nesta sede.
Com efeito, os recursos jurisdicionais visam a reapreciação de decisões de tribunais de grau hierárquico inferior, tendo em vista a sua alteração ou anulação por erro de facto ou de direito das mesmas, não sendo admissível no recurso o conhecimento de questões que não foram colocadas nem apreciadas na decisão recorrida e que não são de conhecimento oficioso - Acórdão do STA, de 26/09/2012, proc. 0708/12.

Os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova. Por isso, e em princípio, não se pode neles tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado - Acórdão do STA, de 13/11/2013, proc. 01460/13.

Em sede de recurso jurisdicional não pode ser conhecida questão nova, que o recorrente não tenha oportunamente alegado nos seus articulados, designadamente a invocação de um novo vício do ato impugnado, por essa matéria integrar matéria extemporaneamente invocada sobre a qual a sentença impugnada não se pronunciou, nem podia pronunciar-se.

A função do recurso, repete-se, é a reapreciação da decisão recorrida e não proceder a um novo julgamento da causa pelo que o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que a ela não foram submetidos.
Como é jurisprudência uniforme, os recursos, nos termos do artigo 627º do CPC (ex vi artº 140º/3 do CPTA), são meios de impugnações judiciais e não meios de julgamento de questões novas. Ou seja, é função do recurso no nosso sistema jurídico, a reapreciação da decisão recorrida e não proceder a um novo julgamento da causa pelo que o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que não hajam sido formulados.
Como decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/03/2009, proferido no âmbito do processo nº 09P0308:
“I-É regra geral do regime dos recursos que estes não podem ter como objecto a decisão de questões novas, que não tenham sido especificamente tratadas na decisão de que se recorre, mas apenas a reapreciação, em outro grau, de questões decididas pela instância inferior. A reapreciação constitui um julgamento parcelar sobre a validade dos fundamentos da decisão recorrida, como remédio contra erros de julgamento, e não um julgamento sobre matéria nova que não tenha sido objecto da decisão de que se recorre.
II-O objecto e o conteúdo material da decisão recorrida constituem, por isso, o círculo que define também, como limite maior, o objecto de recurso e, consequentemente, os limites e o âmbito da intervenção e do julgamento (os poderes de cognição) do tribunal de recurso.
III-No recurso não podem, pois, ser suscitadas questões novas que não tenham sido submetidas e constituído objecto específico da decisão do tribunal a quo; pela mesma razão, também o tribunal ad quem não pode assumir competência para se pronunciar ex novo sobre matéria que não tenha sido objecto da decisão recorrida.”
Dito de outro modo, os recursos são instrumentais ao reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores e não servem para proferir decisões sobre matéria nova, isto é, que não tenha sido submetida à apreciação do tribunal de que se recorre.

O objectivo do recurso jurisdicional é a modificação da decisão impugnada, pelo que, não tendo esta conhecido de determinada questão por não ter sido oportunamente suscitada, não pode o Recorrente vir agora invocá-la perante este tribunal ad quem, porque o objecto do recurso são, reitera-se, os vícios da decisão recorrida.

No entanto sempre se dirá que, efectivamente dispõe o artº 473º do C. Civil:
“1.Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.
2.A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou”.
À luz deste normativo, para que exista enriquecimento sem causa é necessário que, cumulativamente se verifiquem os seguintes requisitos:
-que alguém obtenha um enriquecimento;
-que esse enriquecimento não tenha uma causa justificativa;
-e que seja obtido à custa de outrem (neste sentido Galvão Teles, Obrigações, 3ª edição, pág. 127); ou seja, a obrigação de restituir, fundada no injusto locupletamento à custa alheia, pressupõe que alguém obtenha um enriquecimento, sem causa justificativa, à custa de quem requer a restituição; e o requisito da ausência de causa justificativa opera positivamente, isto é, terá de ser alegado e provado de harmonia com o princípio geral estabelecido no artº 342º do C.Civil, não bastando, para esse efeito, segundo as regras do ónus da prova, que não se prove a existência de uma causa de atribuição, sendo necessário convencer o Tribunal da falta de causa (BMJ 460º, pág. 830), o que a Recorrente não logrou demonstrar.
Afigurando-se-nos manifesto que, e em face do que a própria A. alegou na petição inicial e da factualidade que emerge do processo administrativo apenso e dos processos de execução fiscal e de reclamação de atos o órgão de execução fiscal nº ...5... (mormente, à que foi dada como provada na sentença nestes proferida em 30/01/2016, a fls. 337 a 341), que parcialmente contraria a versão da petição inicial e que teria que ser atendida - como o foi - nos presentes autos, a presente ação teria que improceder.
Na verdade, a A. fez radicar primacialmente as pretensões formuladas na petição inicial no alegado facto de a execução fiscal ter sido erradamente instaurada pela Caixa Geral de Aposentações contra a ARCE - Cooperativa, CRL, quando a dívida àquela entidade era da ARCE-EPV, sendo, portanto, ilegal a reversão da execução contra a ora A. (porque nela foi chamada como diretora da Cooperativa e não da Escola, sendo esta última, e não aquela, a devedora principal) e, consequentemente, tendo ocorrido assim uma retenção indevida dos seus rendimentos, tem a A. direito ao seu reembolso.
Ora, o R. Estado Português (mormente, o Ministério da Educação e os organismos nele integrados, contra os quais foi também instaurada a presente ação) é totalmente alheio a esse alegado erro (que, de todo o modo, não se verificou) que terá estado subjacente à instauração da execução contra entidade que não seria a devedora principal e que, consequentemente, terá levado à ilegal reversão da execução contra a ora A. enquanto diretora a Cooperativa executada (e não da verdadeira devedora principal, a ARCE - Escola Profissional de Viseu).
Pois que, como resulta do que a própria A. alegou na petição inicial, designadamente no artigo 8º, a instauração da execução fiscal ocorreu por iniciativa/impulso da Caixa Geral de Aposentações (v. ponto 4) da matéria de facto dada como provada), limitando-se a AT, enquanto mero órgão de execução fiscal, a instaurá-la como requerido e a tramitá-la seguidamente de acordo com os preceitos legais aplicáveis (v. fls. 127 do autos nº 825/15.2BEVIS ).
Efetivamente, e como se vê do respetivo processo de execução fiscal, este foi instaurado pela AT a requerimento da Caixa Geral de Aposentações, que expressamente requereu a instauração de execução contra a Associação Regional de Cultura e Ensino, Cooperativa de Responsabilidade Limitada, enquanto proprietária da ARCE – Escola Profissional de Viseu, “estabelecimento de ensino particular”, para cobrança coerciva das contribuições devidas à CGA e das quais a cooperativa executada se constituíra devedora, nos termos aí explicitados, juntando, além do mais, como título executivo, a respetiva certidão de dívida - v. fls. 2 a 12.
Porém, a Caixa Geral de Aposentações é, ela própria, uma pessoa coletiva de direito público, distinta e autónoma da pessoa coletiva Estado, atualmente constituída como instituto público - v. Decreto-Lei nº 277/93, de 10/08, nº 84/2007 e 131/2012.
Assim, a ter havido um eventual erro na identificação da principal devedora (o que, porém, não sucedeu) e da consequente “ilegal” reversão da execução fiscal que assim foi instaurada pela AT com base naquele requerimento, apenas e tão-só poderia ser imputável àquela pessoa coletiva (CGA), e não ao R. Estado.
E, desta feita, nunca poderia o R. Estado/Ministério da Educação ser condenado a reconhecer as pretensões formuladas sob as alíneas sob as alíneas a) a c) do petitório; às quais é totalmente alheio, sendo evidente que o E. Estado/Ministério da Educação não é o verdadeiro sujeito da relação material controvertida que está subjacente a tais pretensões.
De facto, afigura-se-nos inequívoco que só a CGA, como sujeito ativo da execução fiscal e entidade credora dos valores que foram nela cobrados coercivamente na execução fiscal, poderia (se fosse caso disso) ser condenada a reconhecer que:
- o valor retido na pensão de reforma da A., no montante de € 25.085,27, para pagamento de uma dívida à Caixa Geral Aposentações foi por conta de uma dívida da Escola Profissional quando o processo de reversão ocorreu por ser dirigente da Cooperativa;
- a cobrança contra a A. dos referidos € 25.085,27 decorreu contra entidade que não era devedora de qualquer quantia;
- a ARCE - Escola Profissional é quem era a entidade devedora do valor cobrado.
Consequentemente, e uma vez que o R. Estado não figurava nessa execução fiscal como sujeito ativo/credor, também nunca poderia ser condenado, a que título fosse, a reconhecer o invocado direito da A. a ser reembolsada de qualquer quantia aí cobrada coercivamente e a devolver-lhe a indicada quantia de € 25.085,27. Pelo simples facto de que não foi o R. Estado, mas a CGA, o destinatário das quantias que nela foram cobradas coercivamente, fosse à entidade que nele figurava como devedora principal, fosse aos seus diretores (incluindo a A./Recorrente), na sequência do despacho de reversão, como responsáveis subsidiários; quantias essas que, como é óbvio, e resulta dos respetivos autos, se destinaram ao pagamento da quantia exequenda e, assim, à regularização das dívidas - àquela entidade - que haviam determinado a instauração da execução fiscal.
Desta feita, e naturalmente, nunca o R. Estado poderia ser condenado a devolver à A. aquilo que dela não recebeu, mas antes que esta, na veste de responsável subsidiária, pagou coercivamente a uma outra entidade credora (à CGA), dotada de personalidade jurídica e distinta da pessoa coletiva Estado.
De todo o modo, sempre se dirá que não houve qualquer erro da CGA ao requerer a instauração da execução fiscal contra a Associação Regional de Cultura e Ensino, Cooperativa de Responsabilidade Limitada, enquanto proprietária da ARCE - Escola Profissional de Viseu, estabelecimento de ensino privado cooperativo.
Qualidade esta que, de resto, resulta patenteada da documentação constante processo administrativo apenso, em que resulta pacífico que a ARCE-EPV, enquanto estabelecimento de ensino privado, foi criada em 29/09/89, através de um contrato-programa celebrado entre o ME e a cooperativa proprietária dessa Escola, a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL, ao abrigo do Decreto-Lei nº 26/89, de 21/01, ficando estabelecido nesse contrato-programa que o funcionamento da escola seria a suportar pelo FSE/PRODEP e negociado para cada ano letivo, a partir de 1990 (v. g. fls. 52, 141, 629 a 632);
Na sequência de irregularidades detetadas e da dedução de acusação criminal e subsequente pronúncia (entre outros, contra os diretores e contra a própria Cooperativa - v. fls. 241 e segs. do processo administrativo apenso), foram suspensos os fundos do PRODEP, tendo originado falta de pagamento das contribuições devidas à CGA - v. artigo 7º da petição inicial e processo administrativo apenso (v. ponto 3) da matéria de facto dada como provada).
Ora, a ARCE-EPV, enquanto estabelecimento de ensino privado cooperativo, não detinha naturalmente personalidade jurídica e judiciária, carecendo, portanto, de ser demandada/executada através da pessoa coletiva dela proprietária: a cooperativa Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL (v. o Decreto-Lei 26/89, de 21/01, v.g. nos seus arts. 2º, nº 3, e 5º; do Decreto-Lei nº 553/80, de 21/12; e o Decreto-Lei nº 321/88, sendo, portanto, a cooperativa executada, enquanto a pessoa coletiva proprietária da Escola, a devedora (principal, originária) das contribuições devidas à CGA, muito embora estas tivessem sido originadas no âmbito da atividade daquele seu estabelecimento.
E, consequentemente, a ora A., enquanto diretora da entidade que assim foi indicada pela CGA como devedora principal/originária (qualidade por si admitida no artigo 5º da petição inicial), constituía responsável subsidiária daquela, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 23º e 24º, da LGT, e 153º, nº 2, e 159º, do CPPT.
Tal como, em conformidade com aqueles preceitos legais, veio a ser considerado no processo de execução fiscal, no qual foi proferido despacho, em 09/02/2004, a ordenar reversão, nos termos constantes de fls. 127 a 129 – v. ainda fls. 64 a 137 (v. ainda fls. 127 do autos nº 825/15.2BEVIS) e pontos 4) a 7) e 9) da matéria de facto dada como provada.
Tal equivale a dizer que não houve a alegada reversão ilegal (e consequente cobrança ilegal) contra a ora A. “porque o devedor principal seria sempre a Escola e não a Cooperativa” - v. artigos 25º, 26º, 29º e 30º da petição inicial.
Note-se, aliás, que a ora Recorrente se conformou com essa reversão e com a subsequente penhora/cobrança, pois, que, tendo o direito de o fazer e tendo sido disso expressamente informada no âmbito da execução fiscal (como se pode ver das respetivas notificações no seu âmbito), não deduziu oportunamente qualquer impugnação nem oposição contra esses atos - v. ponto 7) da matéria de facto dada como provada.
Sendo totalmente irrelevante a ora invocada “falta de capacidade financeira” para o fazer (v. art. 27º da petição inicial), notória que é a existência do instituto do apoio judiciário.
A A. apenas apresentou ulteriormente, em 18/09/2009, a reclamação de fls. 4 e segs. dos autos nº 825/15.2BEVIS, contra o ato que não reconhecera a nulidade do título executivo e determinara o prosseguimento da execução, e relativamente à qual veio a ser proferida sentença, em 24/09/2010, transitada em julgado, a julgar procedente a exceção da caducidade do exercício do direito de reclamar - v. ponto 10 da matéria de facto dada como provada.
Diga-se, aliás, que, posteriormente, em 06/12/2012, já depois da extinção da execução pelo pagamento (ocorrida em 15/02/2012 - v. fls. 163 dos autos nº 825/15.2BEVIS), a ora A. apresentou requerimento em que, invocando o disposto nos artºs 41º, nº 2, da LGT, 92º, nºs 1 e 2, do CPPT, 51º da LGT, 195º, nº 1, do CPPT, peticionou “o reconhecimento da sua qualidade de sub-rogado” e o prosseguimento dos autos de execução (contra a executada originária), com penhora do valor devido à requerente “em posse da DRE” - v. fls. 280 a 282 dos autos nº 825/15.2BEVIS e pontos 11) e 16) da matéria de facto provada; aí aceitando expressamente, para o efeito, que “o pagamento em causa ocorreu enquanto devedora subsidiária da ARCE-Associação Regional de Cultura e Ensino CRL” e que “a intervenção da requerente como devedora subsidiária decorre de imperativo legal”.
E, tendo-lhe sido indeferida essa pretensão pelo órgão de execução fiscal, a ora A. apresentou, em 12/03/2013, reclamação contra esse ato de indeferimento, nos termos constantes de fls. 292 a 295 dos autos nº 825/15.2BEVIS - pontos 12) e 16) do probatório - em que igualmente aceitou que “o pagamento em causa ocorreu enquanto devedora subsidiária da ARCE-Associação Regional de Cultura e Ensino CRL” e que “a intervenção da requerente como devedora subsidiária decorre de imperativo legal”.
E em que, além dos preceitos legais anteriormente invocados, invocou ainda existência de sub-rogação nos termos do disposto nos artigos 592º e 593º, do Código Civil, e 56º, do CPC, sustentando que “tendo a reclamante pago a dívida em obrigação subsidiária, assiste-lhe o direito de suceder no crédito pago por si, relativamente ao devedor principal” e que “tendo a reclamante pago, mesmo que coercivamente, dívida tributária ou similar, por reversão do devedor principal, assiste-lhe o direito de fazer prosseguir contra a devedora principal, e a penhora bens conhecidos, que identificou nos autos”.
Temos assim que a ora Recorrente, em divergência com o que veio sustentar na presente ação e neste recurso, além de não ter impugnado o ato de reversão e de não ter deduzido oposição contra a penhora que lhe foi efetuada como executada revertida, aceitou expressamente na execução fiscal que a quantia que aí lhe foi cobrada coercivamente foi como responsável subsidiária da devedora principal aí executada, a Cooperativa, requerendo que lhe fosse reconhecida a sua qualidade de sub-rogada e que a execução prosseguisse contra a Cooperativa, como devedora principal/originária, para obter o ressarcimento da quantia que havia pago como devedora subsidiária daquela.
Desta feita, a posição que a A. veio sustentar na presente ação, e que ora reitera, em sede de recurso, mostra-se em clara contradição com a que assim tinha assumido na execução fiscal, consubstanciando um manifesto venire contra factum proprium.
Ademais, mesmo que porventura tivesse havido o alegado erro na instauração da execução fiscal (o que não sucedeu), não se logra descortinar que o mesmo tivesse, por qualquer forma, ofendido os seus direitos ou interesses legalmente protegidos, pois que, como ela própria alegou na petição inicial, além da qualidade de diretora da cooperativa Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL, era também, por inerência daquele cargo, diretora do estabelecimento de ensino ARCE-EPV - v. artigos 1º e 5º (v. pontos 1) e 2) da matéria de facto dada como provada).
O que significa que, mesmo que porventura tivesse sido executada a própria escola, sempre sucederia que a A., na falta de bens da daquela, seria também considerada como responsável subsidiária e, por consequência, executada por reversão, com os mesmos fundamentos e nos mesmos termos em que sucedeu na execução fiscal (v. os artigos 23º e 24º, da LGT, 153º, nº 2, e 159º, do CPPT), detendo, nesse caso, uma qualidade processual e substantiva igual à que teve na execução fiscal, com direitos e deveres exatamente iguais.
Aliás, e caso a execução tivesse sido instaurada contra a Escola, só os bens desta poderiam ser considerado para efeitos de penhora e do disposto no artº 153º, nº 2, do CPPT (e não todo o demais acervo patrimonial da Cooperativa, como sucedeu na execução fiscal), havendo, portanto, uma maior (ou, no mínimo, igual) possibilidade de a ora A., como responsável subsidiária, ser nela executada por reversão.
Não se vislumbrando, pois, que, a verificar-se o invocado erro (o que, repete-se, não se deteta), o simples facto alegado pela A. - de ter sido erradamente chamada à execução como Diretora da Cooperativa e não da Escola - afetasse qualquer posição juridicamente tutelada da ora Recorrente.
Por outro lado, como se infere da petição inicial (v.g. dos seus artigos 14º e segs.) e como resulta da expressa pretensão formulada sob a alínea e) do pedido (e ao contrário da distinção que pretende agora sustentar em sede de recurso), a A. pretendia efetivamente acionar na presente ação um pretenso direito de regresso contra o R. Estado/DREC/Ministério da Educação.
Porém, como já se referiu, não se logra compreender em que se fundaria, fáctica e juridicamente, esse direito de regresso contra o Estado/DREC/Ministério da Educação, cuja invocação se nos afigura, aliás, contraditória com a alegada errada instauração pela CGA da execução fiscal e com a consequente da ilegal reversão contra a A. “porque o devedor principal seria sempre a Escola Profissional e não a Cooperativa”, sendo certo que as únicas normas invocadas na petição inicial (v.g. os artºs 41º, nº 2, da LGT, 92º do CPPT, 51º, da LGT, 56º, do CPC) se reportam ao domínio da relação tributária, à qual o R. Estado Português/DREC/ME é completamente alheio, e à sub-rogação da A. nos direitos do credor (CGA) relativamente ao devedor principal (a Cooperativa executada).
Contrariamente ao alegado nos artigos 14º a 24° da petição inicial, a A. não apresentou qualquer “pedido de reembolso por Direito de Regresso sobre a DREC” no âmbito dos referidos autos n° 825/15.2BEVIS - v. ponto 13 da matéria de facto dada como provada.
Na verdade, e como a A. expressamente reconheceu na petição inicial (v. artigo 10º) e resulta do processo administrativo apenso (v.g. fls. 15 a 19 e 37 a 42), sendo dado como provado sob o ponto 14) da matéria de facto dada como provada, a DREC era mera gestora das verbas provenientes do PRODEP e devidas à ARCE-EPV;
E, portanto, foi nessa qualidade que, uma vez libertadas essas verbas do PRODEP na sequência da absolvição criminal, a DREC procedeu, em 14/02/2012, em nome da devedora principal (Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL) ao pagamento da quantia ainda em dívida na execução fiscal - v. ainda fls. 130 a 136, 140, 149 a 155 dos autos nº 825/15.2BEVIS e ponto 15) da matéria de facto dada como provada.
Sendo, pois, totalmente desconforme com a realidade a alegada “posterior assunção pelo Estado da obrigação de pagamento da quantia exequenda” - v. artigo 25º in fine da petição inicial e conclusão D) do presente recurso.
O que, de resto, a A. bem sabia, tanto assim que, ao contrário da alegada apresentação de “pedido de reembolso por Direito de Regresso sobre a DREC”, o que a A. realmente apresentou foi um requerimento para reconhecimento da sua qualidade de sub-rogada, ao abrigo das disposições que nele invocou e do consequente prosseguimento da execução fiscal contra a devedora principal (a executada Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL), com a penhora dos bens desta na posse da DREC - v. fls. 280 a 282 (e fls. 292 a 295) dos autos nº 825/15.2BEVIS (v. pontos 11), 12), 13) e 16) da matéria de facto dada como provada.
Por outro lado, em divergência com o que A. pretendeu fazer crer na petição inicial (v.g. artigos 14º, 22º a 24º), na sentença proferida nos autos nº 825/15.2BEVIS, não lhe foi reconhecido “o direito ao reembolso da A. a exercer na Jurisdição Comum” contra a DREC.
Acresce que a A. havia requerido no processo de execução fiscal o seu prosseguimento contra a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL, como devedora originária, para pagamento da quantia de € 25.085,27, que aí lhe tinha sido cobrada coercivamente como devedora subsidiária e executada revertida, invocando, para o efeito, a existência de sub-rogação nos termos do disposto no artº 41º, nº 2, da LGT.
Ora, na sentença em causa, que decidiu a reclamação da ora A. contra o ato do órgão de execução fiscal que lhe indeferira essa pretensão, foi decidido que a mesma “foi citada para o processo de execução fiscal, na qualidade de devedora subsidiária (...), pelo que não é terceiro relativamente ao processo de execução fiscal, estando excluída a hipótese de sub-rogação”, ao abrigo do inovado preceito legal - v. fls. 337 a 341 dos autos nº 825/15.2BEVIS. Aí acrescentando que:
“Todavia em todos os casos de responsabilidade tributária quer subsidiária ou solidária os responsáveis poderão exercer o seu direito de regresso em relação ao devedor original nos termos comuns da lei civil porque o direito de regresso não tem natureza tributária. Esse direito, como refere Soares Martinez (...) “só poderá se exercido pelo responsável subsidiário em tempo útil, se, e quando a situação patrimonial do devedor originário modificar pela positiva, pois, se não houver essa modificação não poderá haver o direito de regresso, por isso a lei fiscal não determina, nem faz alusão ao exercício do direito de regresso”.
A Reclamante, na sequência da penhora da sua conta bancária e de 1/3 da sua pensão, procedeu ao pagamento coercivo de dívida.
Ora, nos termos do artigo 524º, do C.C., o devedor que satisfizer o direito do credor para além do que lhe competir tem direito de regresso contra cada um dos condevedores na parte que a estes compete. Assim, a Reclamante tem sempre salvaguardada a possibilidade do exercício do direito de regresso contra o responsável subsidiário, a exercer na jurisdição comum.
Deste excerto da sentença resulta à evidência que não foi aí referido, nem a ora Recorrente tem, não tem qualquer direito de regresso sobre o Estado/DREC.
É que manifestamente, o Estado/DREC/ME não era o devedor original da relação tributária subjacente à execução fiscal e, portanto, o pagamento coercivo que a ora A. aí efetuou como responsável subsidiária desse devedor original (a Cooperativa executada) é-lhe totalmente alheio.
Por outro lado, é também manifesto que o Estado/DREC/ME não era, solidariamente com a ora A., responsável subsidiário da devedora original nos termos do disposto nos artigos 23º e 24º da LGT e 153º e 159º, do CPPT, e, portanto, em nada beneficiou do pagamento coercivo da A.
Consequentemente, qualquer direito que a A. possa ter, nos termos da lei civil, a ser reembolsada, total ou parcialmente, do que pagou coercivamente na execução fiscal como responsável subsidiária apenas poderá ser exercido, na jurisdição comum (como é referido na sentença), contra a devedora original - a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL, caso porventura a mesma tenha alterado a situação patrimonial documentada no processo de execução fiscal - e/ou contra os demais condevedores subsidiários - os restantes diretores daquela.
Em suma,
O R. Estado Português/ME não foi o requerente da execução contra a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL e, portanto, a ter havido (que, como já se disse, não houve) qualquer erro na identificação desta como devedora/executada, que pudesse ter subsequentemente determinado a “ilegal” reversão e cobrança contra a ora A., não lhe é imputável;
Carece, pois, de fundamento a alegação agora sustentada pela A. em sede de recurso de que “o direito de regresso pode ser exercido contra quem tinha a obrigação de pagar a título principal e segundo o que ficou apurado nos autos, é a DREC que tem a obrigação de pagar porque recebeu do PRODEP as verbas para o fazer”;
Não constando, de resto, desses autos de Processo Administrativo que a ora A. tivesse dirigido, oportunamente, antes de se ter esgotado o montante das verbas recebidas do PRODEP, qualquer pretensão à DREC para pagamento da quantia que, enquanto devedora subsidiária, lhe fora cobrada coercivamente nos autos de execução fiscal.
O R. Estado Português não se “apossou dos 25.000,00€ cobrados à recorrente”;
Sendo certo que não foi o destinatário e em nada beneficiou das quantias cobradas coercivamente à ora A. no âmbito execução fiscal;
E que em nada beneficiou das verbas do PRODEP, que se limitou, através da DREC, como mera gestora das mesmas, e em nome da respetiva devedora principal, a aplicar integralmente no pagamento das dívidas existentes, seja no pagamento da quantia que, à data, remanescia em dívida no âmbito da execução fiscal em causa, seja no pagamento de outras dívidas existentes, nos termos que se encontram documentados no respetivo processo administrativo.
Consequentemente, não pode o Estado/DREC/ME reembolsar/devolver à A., seja a que título for, aquilo que não integrou no seu património e/ou de que não beneficiou.
Inexistindo, portanto, qualquer enriquecimento do Estado e, muito menos, ilegítimo.
Consequentemente, as pretensões formuladas na presente ação contra o R.
Estado/DREC/ME carecem totalmente de fundamento.
Assim, e tal como foi decidido na sentença recorrida, não foi cometida qualquer ilegalidade pela Administração.
E qualquer direito que a A. possa ter, nos termos da lei civil, a ser reembolsada, total ou parcialmente, do que pagou na execução fiscal como responsável subsidiária apenas poderá ser exercido, na jurisdição comum, contra a devedora original - a Associação Regional de Cultura e Ensino, CRL - e/ou contra os demais condevedores subsidiários - os restantes diretores daquela.
A sentença recorrida não violou qualquer norma legal, designadamente, as invocadas pela Recorrente, pelo que será mantida integralmente.
Improcedem, pois, as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente.
Notifique e DN.
Porto, 17/11/2023

Fernanda Brandão
Nuno Coutinho
Rogério Martins