Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00163/17.6BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/29/2017
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:RECLAMAÇÃO DAS DECISÕES DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL
ERRO DE JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
PRESSUPOSTOS PARA DISPENSA DE GARANTIA
Sumário:I Os pressupostos da isenção de prestação de garantia, estão previstos no art.º 52.º, nº. 4, da LGT, fica dependente de dois pressupostos alternativos: ou a (i) existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação da garantia ou (ii) a falta de meios económicos para a prestar. Porém, tal dispensa não depende apenas da verificação de um destes dois pressupostos, sendo necessário o preenchimento de um outro pressuposto cumulativo: que a insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado que pretende a isenção.
III. Sendo o processo de execução fiscal, um processo de natureza judicial, as regras aplicáveis em matéria de ónus da prova são as previstas no disposto no art.º. 342.º, e 344.º Código Civil e no art.º 74.º, nº. 1, da LGT, e é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois trata-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido.
IV. Apesar do art.º. 170.º do CPPT, aludir expressamente à prova documental tem a doutrina e a jurisprudência entendido que deve ser interpretado no sentido de não conter uma proibição absoluta, e em abstrato, do executado produzir prova testemunhal no incidente de isenção de prestação de garantia, sob pena de inconstitucionalidade, por violação do artigo 20.º, nº 1 da CRP, em conjugação com o princípio da proporcionalidade, o nº 3 do artigo 170.º do CPPT.
V. Tendo sido oferecida prova testemunhal para a demonstração da factualidade invocada no pedido de dispensa de prestação de garantia, com vista à comprovação dos requisitos de que depende a mesma, tendo o órgão da execução fiscal indeferido o pedido por falta de prova desses requisitos sem, contudo, proceder à sua produção, verifica-se a preterição de uma formalidade essencial à descoberta da verdade, que determina a anulação da decisão reclamada.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:V..., Lda.
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, AUTORIDADE TRIBUTÁRIA ADUANEIRA (ATA) interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Braga que julgou procedente a reclamação interposta, por V…, LDA nos termos do art.º 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, do ato do órgão da execução fiscal, que no processo de execução fiscal n.º 2348201501209833, (IRC de 2014) lhe indeferiu o pedido de constituição de garantia por penhor e ainda a dispensa de prestação de garantia.

Com a interposição do recurso, apresentou alegações e formulou as conclusões que se reproduzem:

“(…) A I. A questão sub judice respeita ao despacho proferido pelo Diretor de Finanças de Viana do Castelo, de indeferimento da garantia apresentada pela Reclamante no processo de execução fiscal [PEF], assim como do pedido de isenção de garantia e de suspensão do processo executivo, na parte que se prende com o juízo de desnecessidade de produção de prova testemunhal.
II. O Tribunal considerou que ao recusar a produção de prova testemunhal, os serviços da administração fiscal obstaculizaram à possibilidade de demonstração do primeiro dos requisitos, alternativos, previsto no artigo 52.º, n.º 4, da Lei Geral Tributária, de que depende a concessão do benefício requerido, considerando inviável a conclusão pela desnecessidade de produção de prova testemunhal; e quanto ao segundo requisito previsto no mesmo número, do referido artigo, entendeu o Tribunal que não é segura a conclusão pela desnecessidade da audição de testemunhas, por considerar que se verifica contradição na fundamentação aduzida pela administração fiscal no que se refere aos “créditos sobre clientes” revelados pelos elementos contabilísticos, donde resulta que “a própria administração fiscal apura, por si própria, um desfasamento entre os números revelados e a real capacidade económico-financeira da empresa, desfasamento sobre o qual não permite à executada fazer prova, por entender que os elementos contabilísticos, revelados por documentos, se bastam a si mesmos.”.
III. Inexiste, a nosso ver, qualquer contradição na fundamentação do despacho quanto aos “créditos sobre clientes”, na medida em que não se trata dos mesmos créditos – a administração refere-se, entre outros elementos, à existência de créditos sobre clientes no montante de € 961.896,92 [conta 211] enquanto facto que contraria a condição de manifesta falta de meios económicos para a requerida dispensa de prestação de garantia, que são créditos distintos dos créditos em mora sobre clientes de cobrança duvidosa [conta 217], no montante créditos esses já vencidos, que respeitam a clientes com sede no estrangeiro, e sem demonstração de instauração de processos judiciais tendentes à sua cobrança, que não foram aceites para efeitos de constituição de garantia;

IV. Na fundamentação do despacho reclamado, considerou-se desnecessária a inquirição das testemunhas indicadas pela Reclamante no requerimento apresentado para efeito de dispensa de prestação de garantia, por se entender que quer os elementos contabilísticos apresentados pela executada, quer os elementos existentes na base de dados da AT, se mostravam suficientes para a decisão do pedido.
V. Assim, por inadequada interpretação e valoração da factualidade relevante em que assentou o despacho reclamado, terá sido feito errado julgamento.

***
Termos em que, concedido provimento ao recurso, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e a reclamação ser julgada improcedente. (…)”

A recorrida não contra alegou.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no qual concluiu pela manutenção da sentença recorrida.

Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º4, do Código de Processo Civil), cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente, nos termos dos artigos 608, nº 2, 635º, nº 4 e 5 todos do CPC “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT, a questão que importa conhecer é a de saber se sentença incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao considerar ter sido preterido formalidade essencial à descoberta da verdade material nomeadamente a inquirição de testemunhas indicadas pela Recorrida.

3. JULGAMENTO DE FACTO.
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…)1 A\ Factos provados (com relevo para a decisão a proferir)
1. Por dívida relativa a IRC, referente ao ano de 2014, no valor de € 173.678,08, em 09.10.2015 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Viana do Castelo o processo de execução fiscal n.º 2348201501209833, em que figura como executada a ora reclamante – cf. docs. constantes de fls. 1 e 2 do processo de execução fiscal junto aos autos (“PEF”), cujo teor se dá por reproduzido.
2. Por requerimento remetido ao Serviço de Finanças em 15.11.2014 a executada solicitou o pagamento da dívida exequenda em prestações – cf. doc. constante de fls. 7 e ss. do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
3. Por despacho do Director de Finanças datado de 20.11.2015 foi deferido o pedido de pagamento em prestações referido em “2” – cf. doc. constante de fls. 21 e ss. do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
4. Por requerimento remetido ao Serviço de Finanças em 14.12.2015 a executada ofereceu garantia em vista da suspensão do processo de execução referido em “1” e solicitou, subsidiariamente, a “dispensa de prestação de garantia” – cf. doc. constante de fls. 27 e ss. do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
5. Do requerimento referido no ponto anterior consta, além do mais:
“(...) 28º
Face ao exposto, caso não seja aceite a constituição de penhor/hipoteca sobre os bens que constituem o seu estabelecimento comercial, constata-se que a Executada tem neste momento manifesta falta de meios económicos revelada pela falta de bens penhoráveis para pagamento/constituição de garantia da dívida exequenda e acrescidos.
29º
Sendo certo que essa insuficiência de bens penhoráveis não é da responsabilidade da Executada, mas sim da extraordinária e avassaladora situação de crise económica que, neste momento, afecta o mercado da construção civil e obras públicas em Portugal, Espanha e toda a Europa.
30º
Acresce que a Executada não tem condições de obter garantias bancárias ou seguros caução, face à política altamente restritiva a que os bancos estão hoje sujeitos e impedimentos de obter certidão de situação contributiva regularizada junto da AT.
31º
Apesar das dificuldades, importa salientar quem desde o início do ano, a Executada tem conseguido fazer pagamentos mensais idênticos ou até superiores às prestações agora admitidas, facto que prova quer a sua solvência e capacidade de cumprir com o plano aprovado, quer a sua boa vontade em cumprir o mesmo.
32º
Sendo certo que a não dispensa da prestação da garantia implica o indeferimento do pedido de pagamento em prestações e subsequente penhora dos seus créditos junto dos seus clientes, facto que minará a confiança destes na Executada, com repercussões muito negativas no seu bom nome e reputação.
33º
Tanto mais que, no estado actual do mercado da construção civil e obras públicas, a penhora de créditos é susceptível de provocar que os seus clientes resolvam os contratos celebrados com a Executada invocando justa causa, facto que a confirmar-se a poderá destruir, o que se pretende evitar.
34º
Mas acima de tudo, a não dispensa de prestação de garantia implica que a empresa não possa executar novos trabalhos de construção civil e obras públicas e seja expulsa das suas actuais obras.
35º
Com efeito, os seus clientes exigem periodicamente (quer para obras novas, quer para obras em execução) que a Executada faça prova que tem a sua situação regularizada perante a Administração Fiscal e a Segurança Social, através da apresentação das respectivas certidões de não dívida.
36º
Ora, caso a Executada não seja dispensada de apresentação de garantia, tal significará que se considerem automaticamente vencidas todas as prestações já deferidas por esse serviço e subsequente prosseguimento da tramitação do processo de execução fiscal.
37º
Consequentemente, nessa situação, a Executada continuará sem conseguir obter certidões de não dívida à AT.
38º
O que implicará não só que os seus actuais clientes possam rescindir os seus contratos que mantem com a Executada, como a impedirá de obter novos contratos para obras,
asfixiando-a financeiramente.
39º
Ou seja significará a insolvência da Executada.
40º
Sucede que a Executada, conforme se poderá verificar da sua IES, tem todas as condições para se manter no mercado e sobreviver de modo competitivo.
41º
Estando apenas a passar por uma fase temporária de falta de liquidez que, acredita, será rapidamente ultrapassada caso a AT aceite a garantia agora prestada ou, caso assim não o entenda, considere preenchidos os pressupostos para isenção de prestação de garantia.
(...)” – cf. doc. constante de fls. 27 do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
6. Em anexo ao requerimento referido em “4”, a Executada remeteu, para prova dos factos dele constantes, os seguintes documentos: “Mapa de depreciações e amortizações”; “Balancete acumulado em Agosto de 2015” e requerimento dirigido ao Director dos Serviços de Reembolso do IVA, com pedido de compensação de crédito de IVA – cf. docs. constantes de fls. 31 e ss. do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
7. Do requerimento referido em “4” consta ainda requerimento de produção de prova testemunhal, com indicação de 3 testemunhas e dos respectivos domicílios – cf. doc. de fls. 30 (verso) do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
8. Sobre informação e parecer dessa data, em 24.03.2016 foi proferido despacho pelo Director de Finanças com o seguinte teor:
“Nos termos e com os fundamentos constantes da presente informação que antecede este despacho INDEFIRO, quer os bens apresentados para efeitos de constituição de garantia quer a isenção da prestação da garantia. (...)” – cf. doc. constante de fls. 52 do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
9. Notificado do teor do despacho referido no ponto anterior, em 15.04.2016 a Executada apresentou junto dos serviços do réu “reclamação do acto/despacho de 24/03/2016” – cf. doc. constante de fls. 58 e ss. e 88 do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
10. Na sequência da apresentação da reclamação referida em “9”, em 06.06.2016 foi elaborada nova informação, da qual consta, além do mais, o seguinte:
“Em 15 de abril de 2016 a V… LDA (doravante V…) apresentou reclamação, nos termos do art.º 276.º e sgs., do CPPT, reagindo ao despacho proferido pelo Diretor de Finanças de Viana do Castelo em 24 de março de 2016, no âmbito do processo executivo 2348201501209833.
O objeto da presente reclamação consiste no despacho de indeferimento, quer dos bens apresentados para efeito de constituição de garantia, quer da isenção da prestação de garantia, proferido pelo Diretor de Finanças, tendo em vista a suspensão do processo de execução fiscal.
Alega a V..., em sua defesa, entre outros argumentos, a falta de inquirição das testemunhas arroladas, como prova testemunhal, para demonstração da factualidade invocada.
Segundo o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 19/02/2014, Proc. nº 096/14: “II - Apesar de não existir uma proibição absoluta de se apresentar e produzir prova testemunhal, o órgão de execução fiscal tem a liberdade de em cada caso concreto decidir se tal meio de prova é ou não necessário à decisão do incidente, devendo fundamentar sempre a sua decisão. III - Tendo sido oferecida prova testemunhal para demonstração da factualidade invocada no pedido de dispensa de prestação de garantia, com vista à comprovação dos requisitos de que depende essa dispensa, e tendo o órgão da execução fiscal indeferido o pedido por falta de prova desses requisitos sem, contudo, proceder à produção da prova testemunhal oferecida e sem explicar a razão por que entenda não ser necessário produzi-la, verifica-se a preterição de uma formalidade essencial á descoberta da verdade, que determina a anulação da decisão reclamada”.
Tendo em conta a jurisprudência supra transcrita, decorre padecer a decisão reclamada do alegado vicio de falta de fundamentação, pelo que se propõe a revogação do ato reclamado, consubstanciado no despacho, datado de 24 de março de 2016, proferido pelo Diretor de Finanças, no âmbito do processo executivo 2348201501209833.
Em face da revogação ora proposta, impõe-se proferir nova decisão sobre o pedido formulado pela V… Lda .
A) Do Pedido
Em 21 de dezembro de 2015, deu entrada nesta Divisão de Justiça Tributária, remetido pelo Serviço de Finanças de Viana do Castelo, a petição apresentada por V… LDA NIPC 5…, através da qual vem apresentar garantia e, subsidiariamente, a dispensa de prestação de garantia, tendo em vista a suspensão do processo executivo 2348201501209833, nos termos do disposto no artigo 169.º do CPPT.
Tal requerimento surge na sequência do pedido de pagamento em prestações, autorizado por despacho do Exmo Senhor Diretor de Finanças em 20 de novembro de 2015 e notificada a executada em 26 do mesmo mês.
B) Da competência para decidir o pedido
Atendendo ao valor da quantia exequenda (€ 144.731,74), a entidade competente para decidir é o órgão periférico regional, em virtude da dívida exequenda ultrapassar as 500 UCs (artigo 199.º nº 9 conjugado com o artigo 197.º nº 2, ambos do CPPT).
C) Da análise
Por despacho do Exmo Senhor Diretor de Finanças, exarado em 20 de novembro de 2015, foi autorizado o pagamento da dívida executiva, no montante de € 173.678,08 (QE) e acrescidos legais, no âmbito do processo executivo 2348201501209833, em 36 (trinta e seis) prestações mensais, iguais e sucessivas, nos termos do disposto no artigo 196.º nº3 alínea b) do CPPT e elaborado o plano prestacional 2015/473 com inicio de pagamento no mês de dezembro de 2015.
A V... foi notificada do plano prestacional elaborado e do montante a garantir de € 221.641,59. Verificando-se o pagamento das prestações referentes aos meses de Dezembro de 2015, janeiro, fevereiro, março, abril e maio de 2016, o valor em dívida ascende a € 151.916,65 e o valor a garantir nos termos do disposto no artigo 199.º do CPPT a € 189.895,81.
Em virtude do disposto no artigo 52.º nº 1 da LGT, o processo de execução fiscal suspende-se no caso de existir plano prestacional do tributo ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objeto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda.
Para que haja a suspensão é necessário, nos termos do nº 2 do artigo 52.º da LGT, garantia idónea nos termos da lei tributária e suficiente, pois o património deve constituir uma garantia real do crédito tributário, pelo disposto no nº 1 do artigo 50.º da LGT.
Para garantia e suspensão da execução fiscal a executada V... apresenta os seguintes bens:
- penhor sobre a totalidade dos bens, direitos e equipamentos que fazem parte do estabelecimento comercial;
- créditos em mora no montante de € 513.687,89;
- crédito de IVA no montante de € 66.071,31, conforme declaração de IVA apresentada em 10 de novembro de 2015, referente ao período de 2015/09.
(...)
Importa, assim, verificar a proposta da executada, devendo a análise incidir sobre dois aspetos fundamentais: a idoneidade da garantia e a existência de eventual obstáculo de natureza legal, ou outro.
(...)
O estabelecimento comercial, enquanto universalidade, engloba elementos corpóreos (mercadorias, utensílios, máquinas, mobiliário, etc) e elementos incorpóreos (firma, patentes, marcas, direito ao arrendamento, direito ao alvará, licenças, contratos, clientes, etc). Contudo, no caso em apreço, afigura-se que o estabelecimento comercial, enquanto tal, não é idóneo para garantir a efetiva cobrança dos créditos tributários.
De facto, a V... caracteriza-se pela atividade de cedência temporária de trabalhadores para ocupação por utilizadores, principalmente para o mercado da construção civil e obras públicas, o que significa que a atividade depende sobretudo dos contratos celebrados com os clientes, maioritariamente sediados em França, sendo absolutamente improvável, segundo as regras da experiência comum, que o estabelecimento possua algum valor em caso de necessidade, face a um eventual incumprimento do plano prestacional estabelecido e vigente.
De resto, da análise efetuada ao mapa de depreciações e amortizações, junto aos autos, verifica-se que o valor líquido do imobilizado reportado a 31 de dezembro de 2014 ascende apenas a € 8.739,03, donde o valor atual será ainda menor.
Por outro lado, da descrição dos ativos consta material de escritório (cadeiras, armários, secretárias, etc), computadores, ferramenta diversa e um veiculo automóvel marca ISUZU matrícula FQ com data de matricula em Portugal em 1995 e com início de utilização em 2012, tudo bens de reduzido valor que, no nosso entender, e em caso de incumprimento do devedor e da correspondente necessidade de executar a garantia, não se mostram capazes de conduzir à efetiva cobrança dos créditos garantidos, não se aferindo assim pela sua idoneidade.
Por outro lado, a executada oferece para garantia da dívida existente a constituição de penhor /hipoteca sobre a totalidade dos bens, direitos e equipamento que fazem parte do seu estabelecimento comercial, nela se incluindo os créditos em mora no montante de € 513.687,90, sem indicação de outros créditos existentes.
Alega a executada, nos pontos 15º e 17º da petição que tem a receber créditos no montante de € 513.687,89, créditos esses já vencidos e com processos judiciais já encetados tendo em vista a sua cobrança. No entanto, a executada não faz prova dos processos judiciais encetados, bem como, não identifica os tribunais nos quais correm termos.
Alega ainda a executada, no ponto 33º da petição, que a penhora de créditos é suscetível de provocar que os clientes resolvam os contratos consigo celebrados.
Em 17 de novembro de 2015, a executada V... solicitou compensação do crédito tributário de IVA nos termos do disposto no artigo 90.º do CPPT, crédito resultante de reembolso de IVA comunicado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 10 de novembro de 2015, aquando da apresentação da declaração periódica de IVA referente ao mês de setembro de 2015, no montante de € 66.071,31.
Consultados os elementos informáticos existentes, verifica-se que a executada solicitou reembolso de IVA no montante de € 67.325,31, apresentado em 10 de dezembro de 2015, aquando da apresentação da declaração periódica de IVA referente ao mês de outubro de 2015, e não setembro de 2015, indeferido por despacho de 05 de fevereiro de 2016.
Requer ainda a executada a dispensa parcial de prestação de garantia, relativamente ao valor que se mostrar não coberto pelas garantias oferecidas.
De facto, nos termos do artigo 52.º nº 4 da LGT, a Administração Tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou de manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.
O benefício da isenção fica assim dependente de dois pressupostos alternativos: ou a existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação da garantia ou a falta de meios económicos para a prestar. Porém, tal dispensa não depende apenas da verificação de um destes dois pressupostos, sendo necessário o preenchimento de um outro pressuposto cumulativo: que a insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado que pretende a isenção.
O primeiro pressuposto alternativo (existência de prejuízo irreparável) a que se refere o artigo 52.º nº 4 da LGT, como pressuposto da concessão de dispensa da prestação de garantia pela administração tributária, não foi provado, apenas foi "invocado".
A executada não fez prova, para efeitos de dispensa da prestação de garantia (cfr. artº 170.º nº 3 do CPPT) que, em resultado dos encargos financeiros impostos pela prestação de garantia, a mesma deixará de poder fazer face aos compromissos económico-financeiros de que depende a manutenção e desenvolvimento da atividade económica por si levada a cabo.
De facto, é a própria executada que admite, no ponto 31º da petição, que tem conseguido fazer pagamentos mensais idênticos ou até superiores às prestações autorizadas pelo órgão de execução fiscal.
A manifesta falta de meios económicos (segundo pressuposto alternativo) a que se refere o artigo 52.º nº 4, da LGT, como pressuposto da concessão de dispensa da prestação de garantia pela Administração Tributária, implicará forçosamente uma situação de carência económica da executada, de tal modo que este deixe de ter à sua disposição os meios financeiros necessários à satisfação das suas necessidades, sendo posta em causa a própria subsistência da executada.
A condição de manifesta falta de meios económicos descrita pela executada é contrariada pelos elementos contabilísticos que nos foram disponibilizados, concretamente o Balancete Acumulado respeitante a dezembro de 2015, uma vez que demonstra a existência de meios financeiros líquidos no montante de € 846.939,88, destacando-se o saldo devedor da conta Caixa (111) de € 561.388,54, o saldo devedor da conta Depósitos à Ordem (12) de € 211.463,57 e a existência de créditos sobre clientes no montante de € 961.896,92 (conta 211).
A executada caracteriza a situação em causa como sendo apenas uma fase temporária de falta de liquidez, o que não se enquadra na condição de manifesta falta de meios económicos, prevista na lei. Acresce, que tal falta de meios económicos é contrariada pelos elementos contabilísticos que nos foram disponibilizados, concretamente o Balancete Analítico respeitante a dezembro de 2015.
Não se verificando o primeiro e o segundo pressuposto alternativos, previstos no nº 4 do artigo 52.º da LGT, afigura-se-nos ficar prejudicada a análise do terceiro pressuposto (irresponsabilidade do executado pela situação de insuficiência / inexistência de bens), sendo certo que este pressuposto, cumulativo, no caso de sociedades apenas se deve considerar verificado nos casos em que a insuficiência ou inexistência do património não possa resultar da atuação empresarial, ou seja, apenas quando a dissipação dos bens esteja na absoluta indisponibilidade da empresa ou da administração que a representava ou representa.
Por fim, na petição apresentada pela V... são arroladas testemunhas, como prova testemunhal, para demonstração da factualidade invocada.
Tal como já referido anteriormente, segundo a jurisprudência do STA, não existe uma proibição absoluta de se apresentar e produzir prova testemunhal, no entanto, o órgão de execução fiscal tem a liberdade de em cada caso concreto decidir, fundamentadamente, se tal meio de prova é ou não necessário à decisão do incidente.
No caso concreto, afigura-se desnecessária a inquirição das testemunhas arroladas pela executada para o apuramento dos factos que interessam para a decisão, uma vez que, quer os elementos contabilísticos apresentados pela executada, quer os elementos existentes na base de dados da AT, se mostram suficientes para a decisão do pedido.
Importa salientar, neste âmbito, a expressa alusão à prova documental que é feita no nº 3 do artigo 170.º do CPPT, prova essa que foi devidamente analisada e permitiu concluir pela não verificação dos pressupostos de que depende a dispensa de prestação de garantia.
Assim, e considerando que:
- da análise efetuada ao mapa de depreciações e amortizações do ano de 2014, verifica-se que o valor contabilístico do equipamento que faz parte integrante do estabelecimento comercial da executada à data de 31 de dezembro de 2014, ascende apenas a € 8.739,03, sendo que, o respetivo valor de mercado será insignificante, segundo as regras da experiência comum.
- analisado o balancete acumulado e do período em dezembro de 2015, verifica-se a existência de créditos sobre clientes no montante de € 961.896,92 (conta 211) e meios financeiros liquidas no montante de € 772.852,11 (conta 111 Caixa no montante de € 561.388,54 e conta 12 Depósitos à Ordem no montante de € 211.463,57).
- os créditos em mora, já vencidos, no montante de € 513.687,89, oferecidos como garantia, respeitam a falta de pagamento de clientes com sede no estrangeiro, estão contabilizados como incobráveis e não há prova de terem sido encetados quaisquer processos judiciais tendo em conta a sua cobrança;
- o reembolso de IVA no montante de € 67.325,31, conforme declaração de IVA apresentada em 10 de novembro de 2015, referente ao período de 2015/09, foi indeferido por despacho de 05 de fevereiro de 2016;
- não se mostra preenchido qualquer um dos pressupostos alternativos constantes no nº 4 do artigo 52.º da LGT (prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis);
- não se mostra necessária a inquirição das testemunhas arroladas;
Afigura-se não estarem reunidas as condições necessárias para aceitação da garantia oferecida pela V..., bem como se afigura não estarem reunidos os pressupostos exigidos para a requerida dispensa de prestação de garantia, nos termos do disposto no artigo 52.º nº 4 da LGT. (...)” – cf. doc. constante de fls. 92 e ss. do PEF, cujo teor se dá por reproduzido.
11. Sobre a informação referida no ponto anterior foi emitido parecer de concordância e proferido despacho pelo Director de Finanças, datado de 06.06.2016, com o seguinte teor:
“Presente a informação antecedente, revogo o meu despacho anterior datado de 2016.03.24, atento o vício formal constatado, produzindo de imediato novo despacho.
Com base nos fundamentos e argumentos descritos na citada informação, os bens oferecidos não se apresentam idóneos para efeitos de garantir os direitos do credor Estado nem se encontram reunidos os requisitos que sustentam a dispensa de garantia (designadamente saldos de meios líquidos financeiros muito superiores aos valores da divida), pelo que indefiro [sic] ambas as pretensões.” – cf. doc. constante de fls. 91 do PEF, cujo teor se dá por reproduzido...(…)”

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A questão que cumpre apreciar e decidir, é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito ao considerar ter sido preterido formalidade essencial à descoberta da verdade material, nomeadamente a inquirição de testemunhas indicadas pela Recorrida.
Os pressupostos da isenção de prestação de garantia, estão previstos no art.º 52.º, nº. 4, da LGT, do qual decorre que a Administração Tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.
Assim, a isenção fica dependente de dois pressupostos alternativos: ou a (i) existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação da garantia ou (ii) a falta de meios económicos para a prestar. Porém, tal dispensa não depende apenas da verificação de um destes dois pressupostos, sendo necessário o preenchimento de um outro pressuposto cumulativo: que a insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado que pretende a isenção. (cfr. Acórdão do TCAN n.º 02077/12.7BEPRT de 21.03.2013).
O procedimento para o executado obter a dispensa da prestação da garantia está previsto no art.º. 170.º do CPPT, devendo ser precedido de pedido dirigido ao órgão da execução fiscal fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária nos termos do n.º 3 do citado normativo.
Sendo o processo de execução fiscal, um processo de natureza judicial, as regras aplicáveis em matéria de ónus da prova são as previstas no disposto no art.º. 342.º, e 344.º Código Civil e no art.º 74.º, nº. 1, da LGT, e é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois trata-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido.
Apesar do art.º. 170.º do CPPT, aludir expressamente à prova documental tem a doutrina e a jurisprudência entendido que deve ser interpretado no sentido de não conter uma proibição absoluta, e em abstrato, do executado produzir prova testemunhal no incidente de isenção de prestação de garantia, sob pena de inconstitucionalidade, por violação do artigo 20.º, nº 1 da CRP, em conjugação com o princípio da proporcionalidade, o nº 3 do artigo 170.º do CPPT.
Destacando-se o Acórdão da Secção do Contencioso Tributário, do STA de 19.02.2014, proferido no processo n.º 096/14, disponível em www.dgsi.pt., onde, se deixou sumariou que: (…)I - Sob pena de inconstitucionalidade, por violação do artigo 20º, nº 1 da CRP, em conjugação com o princípio da proporcionalidade, o nº 3 do artigo 170º do CPPT deve ser interpretado no sentido de não conter uma proibição absoluta, e em abstracto, do executado produzir prova testemunhal no incidente de isenção de prestação de garantia;
II - Apesar de não existir uma proibição absoluta de se apresentar e produzir prova testemunhal, o órgão de execução fiscal tem a liberdade de em cada caso concreto decidir se tal meio de prova é ou não necessário à decisão do incidente, devendo fundamentar sempre a sua decisão.
III- Tendo sido oferecida prova testemunhal para demonstração da factualidade invocada no pedido de dispensa de prestação de garantia, com vista à comprovação dos requisitos de que depende essa dispensa, e tendo o órgão da execução fiscal indeferido o pedido por falta de prova desses requisitos sem, contudo, proceder à produção da prova testemunhal oferecida e sem explicar a razão por que entendia não ser necessário produzi-la, verifica-se a preterição de uma formalidade essencial à descoberta da verdade, que determina a anulação da decisão reclamada. (…)” .
Importa agora analisar a factualidade que ressalta dos autos não perdendo de vista o que na sentença recorrida se ponderou a esse respeito.
A Recorrida requereu o pagamento da dívida exequenda no valor de € 173 678,08 em 36 prestações mensais, o que lhe foi deferido condicionada à prestação de garantia no valor de € 221 641.59.
A Recorrida veio apresentar como garantia a constituição de penhor sobre a totalidade dos seus bens, direitos e equipamentos que fazem parte do seu estabelecimento comercial nele se incluindo créditos no valor de € 513 687.89, e o credito de € 66 071,31 de IVA.
E subsidiariamente e, no caso de não ser aceite, requereu a dispensa da garantia por alegando prejuízo irreparável e manifesta falta de meios económicos.
Por despacho de 06.06.2016 do Diretor de Finanças foram indeferidos ambos os pedidos, por considerar inidónea a garantia oferecida (penhor) e por não se encontrar reunidos os requisitos que sustentam a dispensa de garantia, escorando-se em informação prestada com a mesma data.
A sentença recorrida entendeu que Administração Fiscal ao recusar a produção da prova testemunhal “obstaculizou à possibilidade de demonstração do primeiro dos requisitos, alternativos, de que nos termos da lei depende a concessão do benefício requerido.
Mostra-se, assim, inequivocamente inviável a conclusão pela desnecessidade de prova testemunhal, pois que, se bem que invocado, não foi facultada ao executado a demonstração da condição legalmente imposta para satisfação da sua pretensão.
No mais, também quanto ao segundo requisito não é segura a conclusão pela desnecessidade da audição de testemunhas.
Refere-se, nessa matéria, que a alegada falta de meios económicos é contrariada pelos elementos contabilísticos disponibilizados pela requerente, ora reclamante, e indica-se concretamente, como exemplo, a existência de créditos sobre clientes. Porém, em segmento anterior da informação, os mesmos “créditos sobre clientes” revelados pelos elementos contabilísticos, e que configuram para a Autoridade Tributária, neste plano, meios económicos ou bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda (cf. art. 52.º, n.º 4 da LGT) são reputados de inidóneos para efeitos de constituição de garantia, à vista da sua aparente incobrabilidade [cf. “10” do probatório].
Da contradição exposta decorre que a própria administração fiscal apura, por si própria, um desfasamento entre os números revelados e a real capacidade económico-financeira da empresa, desfasamento sobre o qual não permite à executada fazer prova, por entender que os elementos contabilísticos, revelados por documentos, se bastam em si mesmos.
De resto, a fundamentação aduzida em benefício da desnecessidade de produção de prova testemunhal revela justamente que aquela foi aferida à vista da existência de elementos contabilísticos – os quais, conforme entendimento da própria reclamada, não revelam, por si só, a real situação económica da reclamante, em termos de liquidez, solvabilidade ou capacidade financeira…)”
Pese embora o requerimento efetuado pela Recorrida não seja muito claro, a verdade é que para pedir a dispensa de garantia alegou factos que comportam existência de prejuízo irreparável (pontos 20.º 26.º 32.º, 33.º, 34.º a 39.º do requerimento) e de manifesta falta de meios económicos revelados pela insuficiência dos bens penhoráveis (pontos 9.º a 19.º, 23.º 27.º 28.º do requerimento) e que não teve culpa na situação de insuficiência / inexistência de bens (pontos 29.º 42.º do requerimento).
A Administração Fiscal na sua apreciação negou a constituição ainda que parcial de garantia por que considerou que face à analise efetuada ao mapa de depreciações e amortizações o valor liquido era de € 8 739,03 e da análise dos ativos constam moveis, nomeadamente material de escritório e ainda veiculo, tudo de reduzido valor, concluindo pela inidoneidade para garantir a dívida ainda que parcialmente.
Relativamente ao pedido de isenção de garantia refere que não foi provado o prejuízo irreparável, primeiro pressuposto alternativo exigido no n.º 4 do art.º 52.º da LGT, tendo somente sido invocado.
E realça que “A executada não fez prova, para efeitos de dispensa da prestação de garantia (cfr. artº 170.º nº 3 do CPPT) que, em resultado dos encargos financeiros impostos pela prestação de garantia, a mesma deixará de poder fazer face aos compromissos económico-financeiros de que depende a manutenção e desenvolvimento da atividade económica por si levada a cabo.(...). (sublinhado nosso).
Como bem referiu a sentença recorrida “A administração fiscal reconhece ter sido “invocado” pela executada o prejuízo irreparável que para si resultaria na prestação de garantia, mas conclui pela sua não demonstração. E, por outro lado, impede a produção de outros meios de prova, reputando-os de desnecessários.
Estes dados impõem, desde logo, sem grande margem para dúvidas, que ao recusar a produção de prova testemunhal, os serviços do réu obstaculizaram à possibilidade de demonstração do primeiro dos requisitos, alternativos, de que nos termos da lei depende a concessão do benefício requerido.(…)”.
Relativamente ao segundo pressuposto alternativo exigido, no n.º 4 do art.º 52.º da LGT, da manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para pagamento da dívida exequenda, a Administração Tributária considera que é contrariado pelos elementos contabilísticos, que demonstram “ a existência de meios financeiros líquidos no montante de € 846.939,88, destacando o saldo devedor da conta Caixa (111) de € 561.388,54 o saldo devedor da conta Depósitos à Ordem (12) de 211. 463,57 e a existência de créditos sobre a executada no montante de € 961.896,62, (conta 211) (…)”
E afinal em modo de conclusões refere que “ - analisado o balancete acumulado e do período em dezembro de 2015, verifica-se a existência de créditos sobre clientes no montante de € 961.896,92 (conta 211) e meios financeiros líquidos no montante de € 772.852,11 (conta 111 Caixa no montante de € 561.388,54 e conta 12 Depósitos à Ordem no montante de € 211.463,57).
- os créditos em mora, já vencidos, no montante de € 513.687,89, oferecidos como garantia, respeitam a falta de pagamento de clientes com sede no estrangeiro, estão contabilizados como incobráveis e não há prova de terem sido encetados quaisquer processos judiciais tendo em conta a sua cobrança”(destacado nosso).
Pese embora existam meios financeiros líquidos, verifica-se uma série de vicissitudes e de situações factuais que não são relevadas pelos documentos contabilísticos que podem demonstrar que existe manifesta falta de meios económicos, não sendo forçoso, como entende a Administração “a carência económica da executada de tal modo que este deixe de ter à sua disposição os meios financeiros necessários à satisfação das suas necessidades, sendo posta em causa a própria subsistência da executada.”
A Administração queda-se pura e simplesmente pela análise dos números contabilísticos revelados através Balancete Analítico respeitante ao dezembro de 2015, não valorizando nem ponderando outros factos, nomeadamente, encargos, prestações à segurança social e outros necessários ao exercício da atividade da Recorrida.
A Recorrente nas conclusões – III e IV - alega que a sentença labora em erro, uma vez que não existe, qualquer contradição na fundamentação do despacho quanto aos “créditos sobre clientes”, na medida em que não se trata dos mesmos créditos.
E que o despacho reclamado, considerou-se desnecessária a inquirição das testemunhas indicadas pela Reclamante para efeito de dispensa de prestação de garantia, por se entender que quer os elementos contabilísticos apresentados pela executada, quer os elementos existentes na base de dados da AT, se mostravam suficientes para a decisão do pedido.
Mas não tem razão a Recorrente, embora a sentença recorrida labore em vicio de raciocínio, refere que não foi dada possibilidade de demonstrar o prejuízo irreparável e, primeiro pressuposto previsto no n.º 4 do art.º 54.º da LGT e também relativamente ao segundo requisito considerando que não era segura a conclusão pela desnecessidade da prova testemunhal, pois os dados contabilísticos não revelam, a real situação económica da reclamante.
Porém no caso sub Júdice tendo sido oferecida prova testemunhal para a demonstração da factualidade invocada no pedido de dispensa de prestação de garantia, com vista à comprovação dos requisitos de que depende a mesma, tendo o órgão da execução fiscal indeferido o pedido por falta de prova desses requisitos sem, contudo, proceder à sua produção, verifica-se a preterição de uma formalidade essencial à descoberta da verdade, que determina a anulação da decisão reclamada.
Assim, não sendo dada possibilidade à Recorrida, de produzir prova testemunhal, com vista a demonstrar os pressupostos de que depende a dispensa de garantia o despacho reclamado não se pode manter na ordem jurídica.
Nesta conformidade a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento pelo que improcede as conclusões de recurso.

E assim formulamos as seguintes conclusões:
I Os pressupostos da isenção de prestação de garantia, estão previstos no art.º 52.º, nº. 4, da LGT, fica dependente de dois pressupostos alternativos: ou a (i) existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação da garantia ou (ii) a falta de meios económicos para a prestar. Porém, tal dispensa não depende apenas da verificação de um destes dois pressupostos, sendo necessário o preenchimento de um outro pressuposto cumulativo: que a insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado que pretende a isenção.
III. Sendo o processo de execução fiscal, um processo de natureza judicial, as regras aplicáveis em matéria de ónus da prova são as previstas no disposto no art.º. 342.º, e 344.º Código Civil e no art.º 74.º, nº. 1, da LGT, e é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois trata-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido.
IV. Apesar do art.º. 170.º do CPPT, aludir expressamente à prova documental tem a doutrina e a jurisprudência entendido que deve ser interpretado no sentido de não conter uma proibição absoluta, e em abstrato, do executado produzir prova testemunhal no incidente de isenção de prestação de garantia, sob pena de inconstitucionalidade, por violação do artigo 20.º, nº 1 da CRP, em conjugação com o princípio da proporcionalidade, o nº 3 do artigo 170.º do CPPT.
V. Tendo sido oferecida prova testemunhal para a demonstração da factualidade invocada no pedido de dispensa de prestação de garantia, com vista à comprovação dos requisitos de que depende a mesma, tendo o órgão da execução fiscal indeferido o pedido por falta de prova desses requisitos sem, contudo, proceder à sua produção, verifica-se a preterição de uma formalidade essencial à descoberta da verdade, que determina a anulação da decisão reclamada.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pala Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. n.º 2 do artigo 6.º, n.º 2, n.º 2 do art.º 7.º do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 30 de junho de 2017
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento