Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00037/12.7BECBR |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 12/15/2022 |
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Tribunal: | TAF de Coimbra |
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Relator: | Irene Isabel Gomes das Neves |
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Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA; ANÁLISE CRÍTICA DA PROVA; IMPOSTO DE SELO; VERBA N.º17.1.4 DA TGIS; CESSÃO DE CRÉDITOS; CONTA CORRENTE. |
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Sumário: | I. A omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr. artigo 608º, n.º 5 CPC e 125º, n.º 1 do CPPT). II. O dever de fundamentação da sentença abrange realidades distintas (mas conexas) que incluem a fixação dos factos provados e não provados, a respectiva fundamentação de direito e a explicitação das razões pelas quais o julgador considerou provado determinado facto. III. Apenas a falta absoluta de análise critica da prova fundamentação é causa de nulidade da sentença, mas já não a que decorre de uma análise medíocre, mas ainda assim inteligível, a qual a ocorrer se insere no âmbito do erro de julgamento de direito assacado. IV. A concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido. V. O facto tributário eleito para tributação em imposto de selo é, sempre, a concessão de crédito - prestação de valores monetários de uma parte a outra obrigando-se esta última a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro. VI. A verba nº.17, da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), sujeita a incidência de imposto de selo as operações financeiras tendo em conta a sua substância económica e desconsiderando a forma jurídica subjacente aos contratos. VII. A verba 17.1.4 da T.G.I.S., tributa a utilização de crédito sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou outra, de duração de utilização indeterminado ou indeterminável, é sujeito à taxa de 0,04% sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30. VIII. É o caso da utilização do crédito que decorre da concessão de crédito por prazo não determinado ou indeterminável, a incidência de imposto deriva de o sujeito favorecido com a operação de crédito beneficiar de um aumento de liquidez financeira num momento actual, sendo que a situação passiva colateral - o encargo ou dívida - se encontra disseminada num médio ou longo prazo (variando a taxa de tributação precisamente nessa função "pro rata temporis".* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública (Recorrente) notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, pela qual foi julgada totalmente procedente a impugnação judicial contra a liquidação do Imposto de Selo relativo ao ano de 2007, acrescida de juros, no valor global de € 15.059,89, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando as seguintes conclusões: «1 – Nos presentes autos vem a A. reagir contra o despacho de indeferimento parcial, proferido no processo de reclamação graciosa n.º ...86, que deduziu e, de forma mediata, contra a liquidação de Imposto do Selo relativa ao ano 2007, acrescida de juros, no valor global a pagar de 15.059,89 euros. 2 – A Mm.ª Juíza do Tribunal a quo julgou totalmente procedente a impugnação, nos autos identificados supra, determinando a anulação da supra referida liquidação; 3 – Com todo o respeito pela douta decisão, que é muito, entende esta Representação da Fazenda Pública (RFP) que existiu erro na apreciação da prova, bem como erro de interpretação e subsunção dos factos e do direito efetuada pelo Mm.ª Juíza, na análise efetuada, e que conduziu à decisão por tal procedência do pedido, pelos motivos que exporemos infra; 4 – Considera a Mm.ª Juíza, desde logo, que, “Compulsado o teor dos referidos documentos, denominados “Nota de Débito”, constata-se conterem os mesmos a determinação de um concreto prazo de pagamento – 30/60 dias – relativamente aos quais foram, inclusivamente, liquidados “juros de mora” [conforme “Factura nº ...33” identificada no mapa a que se alude em G) do probatório] sendo que, conforme vimos, tal circunstância é suficiente para obstar à qualificação como “conta corrente” dos registos contabilísticos respeitantes às operações subjacentes, irrelevando, nesta medida, a natureza (“financeira” ou outra) das mesmas operações; 5 – Ora, e salvo melhor opinião não pode a Fazenda Pública concordar com a posição defendida na sentença, desde logo porque tal posição encontra-se em contradição, não só com a conclusão a que chegaram os serviços de Inspeção tributária, mas igualmente com o alegado pela A.; 6 – Efetivamente, considerando, quer o relatado no relatório de inspeção tributária, quer as alegações efetuadas pela A., forçosamente se concluirá que, não obstante as referenciadas “Notas de Débito”, identificadas no mapa a que se alude em G) do probatório da referida sentença, conterem, de forma genérica, a indicação de “30 dias” ou “60 dias”, como “Condições de Pagamento”, não havia sido, efetivamente, convencionado ou acordado, entre as partes, qualquer prazo para a restituição ou pagamento dos valores constantes das referidas notas da débito, por parte da "F..., Lda."; 7 – Refira-se, neste âmbito, que a A. alega que tais movimentos não assumiam a natureza de empréstimo, defendendo não se tratar de um financiamento ou mútuo, antes imputando-os ao contrato promessa de compra e venda, e ao início de um pagamento de preço, sendo claro, assim, que, não obstante constar dos referidos documentos um prazo, de 30/60 dias, tal prazo nunca consubstanciou um efetivo prazo de pagamento ou restituição dos valores cedidos; 8 – Por sua vez, alega a A. que os juros liquidados resultam da penalização pelo incumprimento de "F..., Lda.", pelo facto de não ter cumprido a data para a formalização do negócio prometido, e não pelo não cumprimento do prazo de pagamento ou restituição das quantias constantes das notas de débito, pelo atraso ou incumprimento do prazo concedido para pagamento ou restituição dos valores cedidos; 9 – Assim sendo, e não obstante não se acompanhar a A. no alegado na PI, com a motivação melhor explanada no RIT e na contestação, não se vislumbra a possibilidade de se assumir um prazo de restituição ou reembolso dos valores, que, manifestamente, não foi convencionado entre as partes; 10 – Acresce ainda, que há determinados movimentos estritamente financeiros, efetuados a favor da "F..., Lda.", sendo notório, pela data em que os mesmos foram efetuados, que os mesmos não poderiam ter subjacente o alegado contrato promessa de compra e venda, revestindo estes, a natureza de financiamento; 11 – E assim sendo, é forçoso concluir que, para os documentos em causa não se encontrava previsto qualquer concreto prazo de pagamento, não obstante a menção 30 ou 60 dias, nas referidas notas de débito; 12 – Por outro lado, constata-se que a Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS) prevê, nas suas verbas 17.1.1 a 17.1.3, o Imposto de Selo a pagar para as várias situações em que está estabelecido um concreto prazo para a devolução de determinada soma previamente colocada à disposição de um beneficiário, sendo a verba 17.1.4 reservada a situações de créditos em conta corrente e outras em que não seja determinado ou determinável o prazo para a referida devolução; 13 – Assim sendo, e inexistindo nos autos qualquer convenção ou acordo relativamente ao prazo para a devolução dos valores monetários concedidos a título de empréstimo pela A. à sociedade "F..., Lda.", verificam-se todas as condições legais para sujeitar o empréstimo em causa nos autos à verba 17.1.4 da Tabela Geral do Código do Imposto de Selo; 14 – Por outro lado, constata-se, ainda, que a decisão pela procedência do pedido fundou-se, também, no facto de, com referência às notas de débito n.os ...30 e ...42, e aos movimentos da conta 26820005, não terem sido carreados para o procedimento inspetivo os respetivos documentos de suporte, nem se encontrando o respetivo teor evidenciado no probatório, concluindo a Mm.ª Juíza, assim, pela falta de elementos indiciários suficientes para sustentar a correção operada; 15 – Relativamente a estes documentos, refira-se, desde logo, que os movimentos, e correspetiva descrição, constantes da conta 26820005, relevados no extrato contabilístico adstrito a esta conta, não foram colocados em causa, no âmbito dos presentes autos, pela A., e consubstanciam-se em depósitos efetuados pela "A..., Lda.", nas contas à ordem da "F..., Lda.", e em pagamentos, nomeadamente, impostos que esta última tinha em dívida; 16 – E assim sendo, os respetivos documentos de suporte, pela concreta natureza dos mesmos, salvo superior entendimento, não são necessários para sustentar a correção operada; 17 – De facto, tais operações foram relevadas contabilisticamente, não foram objeto de contestação factual pela A.. Por sua vez, os Serviços de Inspeção Tributária constataram a existência de tais depósitos e pagamentos, não se vislumbrando em que medida a efetiva junção dos documentos de suporte destas especificas operações, relevam no enquadramento jurídico-tributário das operações em causa; 18 – O mesmo ocorre, relativamente às notas de débito n.º ...30 e ...42, refletidas nos movimentos da conta 22110026, que não foram colocadas em causa pela A., e relativamente às quais inexistem quaisquer indícios de que divirjam, de forma significativa, das demais notas de débitos cujas cópias constam dos autos; 19 – Aliás, considerando o teor das referidas notas de débitos afigura-se que bastaria a junção de uma, ou duas, a título exemplificativo, dada a similitude entre elas, não se vislumbrando a necessidade imperiosa da sua junção aos autos; 20 – Mas ainda que assim não se entendesse, não se vislumbra o fundamento pelo qual a douta sentença proferida pela Mm.ª Juíza do Tribunal a quo retira credibilidade a toda a fundamentação do ato impugnado, fundamentação essa alicerçada nos documentos existentes na contabilidade da impugnante, considerando que os valores apurados com recurso a estes movimentos e notas de débito se encontram perfeitamente circunscritos e identificados, sendo sempre possível a desconsideração destes específicos valores, nada obstando à consideração, para efeitos tributários, dos demais movimentos financeiros, que consubstanciam valores cedidos, a título de empréstimo, à "F..., Lda."; 21 – Pelo que será de concluir que tais movimentos financeiros consubstanciam a concessão de empréstimos, estando sujeito a Imposto de Selo, nos termos do disposto no artigo 1º, n.º 1 do CIS, e que aos referidos empréstimos seria de aplicar o valor constante da verba n.º 17.1.4 da Tabela Geral do CIS; 22 – Dessa forma, não padece a liquidação de qualquer vício ou ilegalidade, pelo que se deve manter na ordem jurídica; 23 – Entende a RFP, ainda, verificar-se a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia; 24 – De facto, constata-se que a sentença de que se recorre não se pronunciou sobre a questão da impugnação do “contrato promessa de compra e venda”, referenciado em N, da factualidade dada como provada, referindo, no segmento da sentença respeitante a “III.3.MOTIVAÇÃO”, que “O Tribunal formou a sua convicção, quanto aos factos provados, com base nos documentos constantes dos autos, acima identificados, os quais não foram impugnados.”; 25 – Ora, salvo melhor e superior entendimento, face ao teor da contestação então apresentada pela RFP, é indubitável que o documento referenciado no ponto N foi expressa e fundadamente impugnado pela RFP; 26 – De facto, a Fazenda Pública, na contestação então apresentada, impugnou expressamente o referido Contrato promessa de compra e venda, celebrado entre a A. e a "F..., Lda.", com fundamento no desconhecimento da veracidade da letra e assinatura, da efetiva data em que tal contrato produziu os seus efeitos, designadamente desconhecendo se o referido contrato se encontrava em vigor à data dos factos dos autos, impugnando o mesmo, nos termos do art.º 544º do Código de Processo Civil (CPC), dada a existência de fundada duvida sobra a sua genuidade; 27 – Não se ignora que a Mm.ª juiz, quando se reporta ao referido contrato promessa, no ponto O da secção relativa aos “FACTOS PROVADOS COM RELEVO PARA A DECISÃO DA CAUSA”, refere, meramente, a apresentação de tal contrato, no âmbito do processo de reclamação graciosa, limitando-se a citar extratos do mesmo; 28 – E sendo certo que, da mera reprodução do teor do referido contrato promessa, não se pode inferir que o Tribunal concorda com o seu teor ou que aceita como provado o neles consta, certo é, igualmente, que não se pode inferir o contrário, e que esta matéria foi expressamente considerada como relevante para a decisão em causa; 29 – O art.º 607º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi art.º 2º, alínea d), do CPPT, determina que “na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que forem decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos as presunções impostas pela lei ou por regras da experiência”; 30 – A omissão de pronúncia está relacionada com o dever que é imposto ao juiz pelo artigo 608.º, nº 2 do CPC, em que se prevê que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, salvo se aquelas que forem prejudicada pela solução dada a outra não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras; 31 – A nulidade por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras; 32 – Ora, considerando a matéria de facto levada ao probatório constatamos desde logo que a mesma não se encontra suficientemente fundamentada na sua valoração, não tendo a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo especificado a razões pelas quais valorou o facto dado como provado em N, desconsiderando, de forma completa a impugnação deste documento, efetuada pela RFP; 33 – Tal é especialmente gravoso, porque a RFP encontra-se, nesta fase, impossibilitada de analisar ou sindicar, com certeza e segurança, o quadro decisório em questão, proferido pela Mm.ª Juíza do Tribunal a quo; 34 – Efetivamente, e face ao teor da referida sentença, a ora recorrente vê-se impossibilitada de aferir se deve contestar a matéria de facto dada como provada, por considerar que o contrato referido em N não deve constar na matéria de facto dada como provada, por tal documento ter sido impugnado, e tal impugnação ter sido desconsiderada, e não ter sido objeto de pronuncia por parte do Tribunal a quo, se não deve constar do probatório, por não se vislumbrar em que medida tal factualidade relevou para a decisão proferida, ou se os factos constantes do referido contrato deverão ser matéria a acrescer nos factos dados como não provados; 35 – Refira-se, neste âmbito, que é indubitável que o julgamento da matéria de facto é um momento essencial, devendo o juiz pronunciar-se sobre a factualidade alegada e sobre a que lhe seja lícito conhecer oficiosamente e que se apresente relevante para a decisão, discriminando também a matéria provada da não provada e fundamentando as suas decisões, procedendo à apreciação crítica dos elementos de prova e especificando os fundamentos decisivos para a convicção formada; 36 – Ora, no caso, considerando a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo, que a factualidade dada como provada em N era relevante para a decisão proferir, e tendo o documento referido em N sido expressamente impugnado pela RFP, afigura-se que incumbia à Mm.ª Juíza do Tribunal a quo proceder a análise crítica dos meios de prova produzidos, especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto controvertida, o que não aconteceu na decisão de que ora se recorre; 37 – Assim sendo, afigura-se a existência de nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, ininteligibilidade, e falta absoluta de fundamentação; 38 – Por fim, recorre-se da douta sentença proferida pela Mm.ª Juíza do Tribunal a quo, na parte em que fixa o valor da causa em 15.059,89 euros, face ao valor da anulação operada na liquidação, e resultante do cumprimento da decisão proferida no âmbito do processo de reclamação graciosa, e, em especial, ao despacho judicial proferido em 2012-09-30, que fixou a esta impugnação o valor de € 9.719,07; Nestes termos e com o douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida e substituída por douto acórdão que conclua pela legalidade da liquidação impugnada, mantendo a mesma, assim se fazendo JUSTIÇA» 1.2. A Recorrida "A..., Lda.", notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 371 SITAF, no sentido da improcedência do recurso. 1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. Questões a decidir: As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: Se a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, ininteligibilidade e falta de fundamentação; Se a sentença incorre em erro na apreciação da prova e, subsequente erro na interpretação e subsunção dos factos e do direito. Questão prévia: do valor da acção A Recorrente insurge-se por via do presente recurso do segmento em que na sentença se fixa o valor da causa em 15.059,89€, argumentando que o valor da anulação operada na liquidação não é aquele. Efectivamente, decorre do cumprimento da decisão proferida no âmbito do processo de reclamação graciosa, a qual obteve deferimento parcial, a liquidação inicial e juros compensatórios foram parcialmente anulados, fixando-se o imposto em 8.488,44€ e os juros compensatórios em 1.230,63€, perfazendo o valor de 9.719.07€. Consciente dessa realidade e, em conformidade com a questão do valor da acção suscitada em sede de contestação, o tribunal a quo, por despacho datado de 24.09.2012, transitado em julgado, fixou o valor da acção em € 9.719,07, pelo que penas por lapso na sentença sob recurso se faz referência ao valor de 15.059,89€, que aqui se dá por não escrito, sendo o valor fixado por despacho de € 9.719,07 o valor atender. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação: «A) Os Serviços de Inspeção Tributária, da Direção de Finanças de ..., realizaram uma ação inspetiva à Impugnante respeitante aos anos de 2007 e 2008 (IRC e Imposto do Selo) – conforme documentos a folhas 77 a 90 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; B) No âmbito da ação inspetiva a que se alude em A) foi elaborado “Projecto de Relatório de Inspecção Tributária”, datado de 05.05.2011 – conforme documento a folhas 87 a 109 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; C) Os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de ... remeteram à Impugnante, no âmbito da ação inspetiva a que se alude em A), ofício datado de 05.05.2011, sob o assunto “Projecto Relatório da Inspecção Tributária – Artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT) e Artigo 60.º do (...) (RCPIT)” – conforme documentos a folhas 85 e 86 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; D) No âmbito da ação inspetiva a que se alude em A) foi elaborado “Relatório de Inspecção Tributária” (RIT), datado de 24.05.2011, do qual consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documentos a folhas 118 a 210 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; E) O RIT a que se alude em D) é integrado pelos anexos seguintes: «(...) [Imagem] (...)» – conforme documentos a folhas 139 a 210 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; F) Do documento denominado “contrato quadripartido celebrado em 2004.07.06”, sob o “Anexo VI” a que se alude em E) consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documento a folhas 159 a 168 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; G) Do documento denominado “Mapa de movimentos financeiros relevados na contabilidade da "F..., Lda." – conta 22110026”, sob o “Anexo VII” a que se alude em E) consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documento a folhas 169 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; H) O “Anexo VIII” a que se alude em E) é integrado por documentos denominados “Nota de Débito”, com os n.os ...96, ...05, ...06, ...21, ...26, ...32, ...34, ...38, ...44, ...48, ...49, ...51, ...54, ...58, ...08, ...08 e ...08, emitidos pela Impugnante em nome da “"F..., Lda."”, no qual se encontra aposta a expressão “Condições de Pagamento 30 dias” – conforme documentos a folhas 170 a 172, 174 a 182, 185, 186 e 196 a 198 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; I) O “Anexo VIII” a que se alude em E) é integrado por documento denominado “Nota de Débito Nº ...17”, emitido pela Impugnante em nome da “"F..., Lda."”, no qual se encontra aposta a expressão “Condições de Pagamento 60 dias” – conforme documento a folhas 173 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; J) A Direção de Finanças ... remeteu à Impugnante, ofício datado de 25.05.2011, sob o assunto “Notificação do Relatório de Inspecção Tributária (...)”, do qual consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documentos a folhas 110 a 112 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; K) A Autoridade Tributária emitiu em nome da Impugnante a liquidação de Imposto do Selo n.º ...51, respeitante ao ano 2007, acrescida de juros, da qual resultou um valor global a pagar de 15.059,89 euros – conforme documento a folhas 20 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; L) Em 03.11.2011 foi remetida ao Serviço de Finanças ... 1, “reclamação graciosa” em nome da Impugnante, contra a liquidação de Imposto do Selo a que se alude em K) – conforme documentos a folhas 4 a 34 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; M) A “reclamação graciosa” a que se alude em L) correu termos sob o processo n.º ...86, do Serviço de Finanças ... 1 – conforme documento a folhas 5 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; N) A Impugnante apresentou, no âmbito do processo a que se alude em M), documento denominado “Contrato Promessa de Compra e Venda”, datado de 06.07.2004, do qual consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documentos a folhas 19 e 22 a 24 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; O) A Impugnante apresentou, no âmbito do processo a que se alude em M), documento denominado “Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda Celebrado a 06.07.2004”, datado de 30.11.2005, do qual consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documentos a folhas 19 e 25 a 27 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; P) Em 28.11.2011 foi prestada, no âmbito do processo a que se alude em M), informação da Divisão de Inspecção Tributária I – Equipa 24, da Direção de Finanças ..., da qual consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documento a folhas 52 a 58 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; Q) Sobre a informação a que se alude em P) foi exarado despacho do chefe da Divisão de Justiça Tributária, datado de 28.11.2011, com o seguinte teor: «Confirmo o sentido que vem promovido do pedido da R. vir a ser parcialmente deferido nos termos, limites e fundamentos que vêm expressos na informação infra. Notifique-se nos termos e para os efeitos determinados no art. 60.º da LGT (...)» – conforme documento a folhas 52 a 58 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; R) A Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... remeteu à mandatária da Impugnante, no âmbito do processo a que se alude em M), ofício datado de 02.12.2011, do qual consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documentos a folhas 59 e 60 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; S) Em 15.12.2011 foi recebido na Direção de Finanças ..., no âmbito do processo a que se alude em M), requerimento em nome da Impugnante com vista a exercer o seu “Direito de audição” – conforme documento a folhas 61 a 68 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; T) A Divisão de Inspeção Tributária I – Equipa 24, da Direção de Finanças ... prestou, no âmbito do processo a que se alude em M), informação da qual consta conforme segue: «(...) (...)» – conforme documento a folhas 69 e 70 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; U) Sobre a informação a que se alude em T) foi exarado despacho do chefe da Divisão de Justiça Tributária, datado de 19.12.2011, com o seguinte teor: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documento a folhas 69 e 70 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; V) A Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... remeteu à mandatária da Impugnante, no âmbito do processo a que se alude em M), ofício datado de 26.12.2011, do qual consta conforme segue: «(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)» – conforme documentos a folhas 71 a 73 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; W) O ofício a que se alude em V) foi recebido em 29.12.2011 – conforme documentos a folhas 71 a 73 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; X) A petição inicial da Impugnação foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, por “fax”, em 13.01.2012 – conforme documentos a folhas 2 a 7 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido. * III.2. FACTOS NÃO PROVADOS Inexistem. * III.3. MOTIVAÇÃO O Tribunal formou a sua convicção, quanto aos factos provados, com base nos documentos constantes dos autos, acima identificados, os quais não foram impugnados.» 2.2. De direito A Recorrente (Fazenda Pública) insurge-se contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datada de 31.01.2022, pela qual foi julgada totalmente procedente a impugnação judicial contra a liquidação do Imposto de Selo relativo ao ano de 2007, acrescida de juros, no valor global de € 9.719,07. Liquidação essa, emitida na sequência de uma acção de inspecção realizada à contabilidade da Impugnante, no âmbito da qual a Administração Tributária constatou movimentos de carácter estritamente financeiro, maioritariamente realizados no âmbito de um contrato quadripartido celebrado em 2004.07.06, no qual a Recorrida, "A..., Lda."., cedeu à "F..., Lda."., um crédito que detinha sobre a firma "S..., SA." NIPC: 503......00, permitindo à "F..., Lda.". a liquidação parcial de uma dívida que tinha para com o seu fornecedor "S..., SA." e, bem assim, a cedência de quaisquer créditos futuros que venha a deter sobre a "S..., SA.". Concluindo, que a "A..., Lda." (recorrida) no decurso do exercício fiscal de 2007, apresenta um crédito de carácter meramente financeiro, sobre a firma "F..., Lda." (substanciado pelos saldos e movimentos contabilísticos constantes das contas 22110026 e 26820005), o qual assume a forma de conta corrente, na medida em que, não se encontra determinado para o mesmo o seu prazo de utilização. Movimentos estes, sujeitos a imposto de selo de acordo nos termos do n.º 1 do CIS, sendo aplicável a verba n.º 17. 1.4 da Tabela Geral do IS. A Recorrida alicerçou a sua Impugnação, invocando, em suma, que os movimentos contabilizados, “que a AT imputa ao citado contrato quadripartido, não assumem a natureza de empréstimo, aliás, nunca as partes contratantes entenderam aquela transacção como um mútuo ou como um financiamento” tendo, diversamente, “suporte em contrato promessa de compra e venda celebrado entre a impugnante e a sociedade "F..., Lda.".”. O tribunal a quo conhecendo da verificação dos pressupostos de facto e de direito da liquidação impugnada, considerou que “Compulsado o teor dos referidos documentos, denominados “Nota de Débito”, constata-se conterem os mesmos a determinação de um concreto prazo de pagamento – 30/60 dias – relativamente aos quais foram, inclusivamente, liquidados “juros de mora” [conforme “Factura nº ...33” identificada no mapa a que se alude em G) do probatório] sendo que, conforme vimos, tal circunstância é suficiente para obstar à qualificação como “conta corrente” dos registos contabilísticos respeitantes às operações subjacentes, irrelevando, nesta medida, a natureza (“financeira” ou outra) das mesmas operações./ No que tange às notas de débito n.os ...30 e ...42, identificadas no mapa a que se alude em G) do probatório, bem como, aos movimentos da conta 26820005 mencionada supra, não tendo sido carreados para o procedimento inspetivo os respetivos documentos de suporte, nem se encontrando o respetivo teor evidenciado no probatório, impõe-se concluir, quanto aos mesmos, pela falta de elementos indiciários suficientes para sustentar a correção operada./ Atento o sobredito, impõe-se concluir pela procedência da pretensão da Impugnante.”. A Recorrente (FP) insurge-se contra o assim decidido, invocando, no essencial, que a sentença recorrida enferma de (i) nulidade por omissão de pronúncia, ininteligibilidade e falta de fundamentação; (iv) erro na apreciação da prova produzida e, subsequente erro na interpretação e subsunção dos factos e do direito. Cumpre, pois, apreciar e decidir. 2.2.1. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia. A Recorrente vem arguir a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, sustentando que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a questão da impugnação do “contrato promessa de compra e venda”, referenciado em N), da factualidade dada como provada, referindo, no segmento da sentença respeitante a “III.3.MOTIVAÇÃO”, que “O Tribunal formou a sua convicção, quanto aos factos provados, com base nos documentos constantes dos autos, acima identificados, os quais não foram impugnados.”. Para assim concluir, sustenta a Recorrente que o Tribunal a quo face ao teor da contestação por si apresentada, o “contrato promessa compra e venda” foi expressa e fundadamente impugnado, com fundamento no desconhecimento da veracidade da letra e assinatura, da efetiva data em que tal contrato produziu os seus efeitos, designadamente desconhecendo se o referido contrato se encontrava em vigor à data dos factos dos autos, impugnando o mesmo, nos termos do art.º 544º do Código de Processo Civil (vide Conclusões 26. a 31.). Apreciando. Nos termos do disposto no artigo 125º nº 1 do CPPT, “Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.” A nulidade por omissão de pronúncia tem lugar apenas quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do Tribunal sobre questões que deveria conhecer, o que, de acordo com o disposto no artigo 608º, nº2 do CPC [aplicável ex vi artigo 2º, al. e) do CPPT], significa que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas, cuja decisão, esteja prejudicada pela solução dada a outras. Portanto, a apontada nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal “pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. No entanto, mesmo que entenda não dever conhecer de determinada questão, o tribunal deve indicar as razões por que não conhece dela, pois, tratando-se de uma questão suscitada, haverá omissão de pronúncia se nada disser sobre ela” (Vide, Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e comentado, volume II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 363). Neste sentido, entre muitos outros, podem ver-se os acórdãos do STA de 13.07.11 e de 20.09.11, proferidos nos recursos nºs 0574/11 e 0268/11, respectivamente. E, como se refere no Acórdão do STA proferido no âmbito do processo nº 01035/12, de 11.03.2015, “a nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixar de apreciar questão que devia conhecer (artigos 668.º, n.º 1, alínea d) e 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil revogado, aplicável no caso sub judice). (…) Numa correta abordagem da questão importa ainda ter presente, como também vem sublinhando de forma pacífica a jurisprudência, que esta obrigação não significa que o juiz tenha de conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes hajam produzido. Uma coisa são as questões submetidas ao Tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa para fazer valer o seu ponto de vista. / Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.” Em reforço deste entendimento, cumpre ainda destacar o expendido no Acórdão do STA de 12.06.2018 [processo n.º 0930/12.7BALSB] “(…) 24. Caraterizando a arguida nulidade de decisão temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2, CPC]. 25. Com efeito, o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos/pretensões pelas mesmas formulados, ressalvadas apenas as matérias ou pedidos/pretensões que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se haja tornado inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões. 26. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada a parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio (…)”. Munidos destes ensinamentos jurisprudências, em jeito de súmula, temos que: «O conceito de questões abrange tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem» (cfr. Jorge Lopes Sousa, CPPT Anotado, 6.º Ed., vol. II, p. 363). A este propósito, refere-se que «as questões que o tribunal deve apreciar e decidir são apenas aquelas que contendem directamente com a substanciação da causa de pedir, do pedido e das exceções, não se confundindo com as considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pela parte (e, portanto, quanto a estas últimas, o tribunal não só não tem de ser pronunciar, como nenhuma consequência daí advirá se o não fizer, nomeadamente, não configurando tal situação uma omissão de pronúncia)» (cfr. Helena Cabrita, in A sentença cível, Fundamentação de facto e de direito, Almedina, 2019, p. 235). «O conhecimento de todas as questões não significa que o tribunal tenha de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes e só a falta de conhecimento de questões constitui nulidade por omissão de pronúncia» (cfr. Jorge Lopes de Sousa, in ob cit, p.364). Cumpre conjugar estes doutos ensinamentos, com o disposto no artigo 608º, n.º 2 do CPC, no qual se prescreve que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”. Como ensinava Alberto dos Reis, “são na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” [in Código de Processo Civil Anotado, volume V, pág.143]. Ora, como se vê da sentença recorrida, o Tribunal sintetiza alegação da Impugnante nos seguintes termos: «[que] os movimentos contabilizados, “que a AT imputa ao citado contrato quadripartido, não assumem a natureza de empréstimo, aliás, nunca as partes contratantes entenderam aquela transacção como um mútuo ou como um financiamento” tendo, diversamente, “suporte em contrato promessa de compra e venda celebrado entre a impugnante e a sociedade "F..., Lda.".”». Recuperemos aqui, o discurso fundamentador que se segue «(...) a taxa prevista na verba 17.1.4 da TGIS tem o seu campo de aplicação restringido àquelas situações em que não seja possível determinar um momento certo em que haverá necessariamente lugar ao reembolso, só assim se justificando que o imposto, em tais casos, seja liquidado por aplicação de uma taxa média calculada mensalmente. No caso sujeito, conforme se aludiu supra, a Autoridade Tributária enquadrou na referida verba 17.1.4 da TGIS as situações subjacentes aos “saldos e movimentos contabilísticos constantes das contas 22110026 e 26820005” relativas à Impugnante, constantes da contabilidade da “"F..., Lda.".”. Ora, por referência à aludida conta 22110026 foram analisados e carreados para o procedimento inspetivo alguns documentos, os quais suportam movimentos contabilísticos “a débito” expressos na mesma conta, e aos quais se alude em G) a I) do probatório. Compulsado o teor dos referidos documentos, denominados “Nota de Débito”, constata-se conterem os mesmos a determinação de um concreto prazo de pagamento – 30/60 dias – relativamente aos quais foram, inclusivamente, liquidados “juros de mora” [conforme “Factura nº ...33” identificada no mapa a que se alude em G) do probatório] sendo que, conforme vimos, tal circunstância é suficiente para obstar à qualificação como “conta corrente” dos registos contabilísticos respeitantes às operações subjacentes, irrelevando, nesta medida, a natureza (“financeira” ou outra) das mesmas operações. No que tange às notas de débito n.os ...30 e ...42, identificadas no mapa a que se alude em G) do probatório, bem como, aos movimentos da conta 26820005 mencionada supra, não tendo sido carreados para o procedimento inspetivo os respetivos documentos de suporte, nem se encontrando o respetivo teor evidenciado no probatório, impõe-se concluir, quanto aos mesmos, pela falta de elementos indiciários suficientes para sustentar a correção operada. Atento o sobredito, impõe-se concluir pela procedência da pretensão da Impugnante, o que se decide.» Ora, a alegada impugnação assacada ao “contrato promessa de compra e venda”, cujo tratamento enquanto tal foi omisso na tese da Recorrente, não é sustentável. Pois que, perante o tratamento operado pelo Tribunal a quo, que conheceu dos fundamentos da liquidação, pela subsunção dos factos ao direito aplicável, considerou que não era aplicável à situação a verba 17.1.4 da TGIS, por conterem as “notas de debito” a determinação de um concreto prazo de pagamento e/ou pela falta de elementos indiciários suficientes para sustentar a correção operada, quedando-se por aí sem necessidade de apreciar a tese da Impugnante "A..., Lda." alicerçada no referenciado “contrato promessa de compra e venda” para afastar o carácter de mútuo aos movimentos contabilísticos em questão. Estamos, pois, perante uma questão que elencada pelo Tribunal a quo, sobre a qual não recaiu pronúncia expressa, por ser manifesto que a mesma se quedou por prejudicada. Improcede, pois, a alegada omissão de pronúncia quanto ao não conhecimento da impugnação do “Contrato promessa de compra e venda”, pois que o mérito sobre o referido Contrato não foi valorado, nem sobre ele recaiu qualquer pronúncia expressa do julgador que decidiu a questão a jusante sem entrar no ónus da prova que a Impugnante pretendia levar a cabo com o contrato em questão e, por osmose a impugnação que a Recorrente havia acometido o referido Contrato. 2.2.1.3. Da nulidade por ininteligibilidade e falta de fundamentação do julgamento de facto Em sede de nulidades, invoca ainda a Recorrente a nulidade da sentença por inintegibilidade e falta de fundamentação, mas se bem atentarmos às conclusões de recurso 32. a 36, o que decorre dos mesmos é a falta de análise critica da prova, porquanto segundo a FP “(da) matéria de facto levada ao probatório constatamos desde logo que a mesma não se encontra suficientemente fundamentada na sua valoração, não tendo a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo especificado a razões pelas quais valorou o facto dado como provado em N, desconsiderando, de forma completa a impugnação deste documento, efetuada pela RFP”, ora “(...) incumbia à Mm.ª Juíza do Tribunal a quo proceder a análise crítica dos meios de prova produzidos, especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto controvertida, o que não aconteceu na decisão de que ora se recorre”. Efectivamente, a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, nomeadamente a falta de análise critica da prova, nos termos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT constitui, entre outras, causa de nulidade da sentença. Nos termos do art. 123º, n.º 2 do CPPT, na sentença o juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões. Esta exigência deve ser complementada com aquela que decorre do disposto no art. 607º, n.º 4 do CPC segundo o qual na fundamentação da sentença o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer. O cumprimento do dever de fundamentação/motivação da sentença contribui «…para a sua eficácia, pela via da persuasão dos respectivos destinatários e da comunidade jurídica em geral, (ii) consinta às partes e aos tribunais de recurso, fazer reexame do processo lógico ou racional subjacente à decisão, e (iii) constitua um verdadeiro factor de legitimação do poder jurisdicional, contribuindo para a congruência entre o exercício desse poder e a base sobre a qual repousa: o dever de dizer o direito no caso concreto (iuris dicere), nessa medida se configurando como garantia do respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões» (Ac. do TRE de 13.05.2014, in proc. n.º 368/12.6GBLLE.E1). Seguindo Jorge Lopes de Sousa, in ob cit, volume II, 6ª ed., 2011, pp. 321, 322 e 357 «Relativamente à matéria de facto, esta nulidade abrange não só a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo n.º 2 do art.º 123º do CPPT, como a falta do exame crítico das provas, previsto no n.º 3 do art. 659º do CPC. Como vem entendendo uniformemente o STA só se verifica tal nulidade quando ocorra falta absoluta de fundamentação…. A fundamentação da sentença visa primacialmente impor ao juiz reflexão e apreciação crítica da coerência da decisão, permitir às partes impugnar a decisão com cabal conhecimento das razões que a motivaram e permitir ao tribunal de recurso apreciar a sua correcção ou incorrecção. Mas, à semelhança do que sucede com a fundamentação dos actos administrativos, a fundamentação da sentença tem também efeitos exteriores ao processo assegurando a transparência da actividade jurisdicional. Assim, a fundamentação de facto não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto. Nos casos em que os elementos probatórios tenham um valor objectivo (como sucede, na maior parte dos casos, com a prova documental) a revelação das razões por que se decidiu dar como provados determinados factos poderá ser atingida com a mera indicação dos respectivos meios de prova, sem prejuízo da necessidade de fazer uma apreciação crítica, quando for questionável o valor probatório de algum ou alguns documentos ou existirem documentos que apontam em sentidos contraditórios.» Procedendo ao exame crítico da prova, o juiz deve esclarecer quais foram os elementos probatórios que o levaram a decidir como decidiu e não de outra forma. Deve indicar os fundamentos suficientes para que através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado (Miguel Teixeira de Sousa in, Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 348). In casu, a prova dos autos é exclusivamente documental, na sentença sob recurso em cada um dos factos é feita a menção especifica do documento mediante a sua concreta identificação a que acresce a motivação global, não podemos, pois, falar de uma falta em absoluto de motivação que não tenha qualquer relação percetível com o julgado ou seja ininteligível, que não permita conhecer as razões pelas quais foi considerado provado determinado facto, aliás diga-se que a Recorrente se limita a lançar a pedra da falta de fundamentação critica directamente vocacionada para a questão que levantou em sede de nulidade por omissão de pronúncia, qual seja, a de que tendo sido levado o dito “Contrato promessa de compra e venda”, nomeadamente o seu conteúdo constante do item N) da matéria de facto dada como provada, não tendo ocorrido a análise critica que se impunha atenta a impugnação do documento em questão. Pasme-se, que apesar da sua indignação, é a própria Recorrente que avança em parte com a destrinça da falta de análise critica nas suas conclusões 27 e 28. É que, se por um lado, e como referimos em sede de aplicação do direito a sentença não chegou a estabelecer qualquer subsunção jurídica ou outra sobre o “Contrato de promessa de compra e venda”, a qual se quedou por prejudicada. Por outro lado, a Mm. ª juiz, quando se reporta ao referido contrato promessa, no item N), refere expressamente a apresentação de tal contrato, no âmbito do processo de reclamação graciosa, limitando-se a citar extratos do mesmo; e, quando alude ao “Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda Celebrado a 06.07.2004” mesmo no item O) refere o que corresponde aos documentos que constam dos autos, nomeadamente que pelo Impugnante foi junto tal documento, transcrevendo algumas cláusulas e, no mais, dando o seu teor do mesmo por reproduzido. Ora, da mera reprodução do teor de documentos juntos com essa especifica menção, não infere que o conteúdo do mesmo tenha sido dado como provado, mas tão só a sua junção e o seu teor. Em suma, estes dois vectores conjugados entre si, a que acresce o entendimento uniforme da doutrina e jurisprudência que apenas a falta absoluta de fundamentação é causa de nulidade da sentença, mas já não a que decorre de uma fundamentação quiçá “incompleta, errada, medíocre, insuficiente ou não convincente”, a qual apenas afecta o valor doutrinal e persuasivo da decisão e a submete ao risco de ser revogada ou alterada quando apreciada em sede de recurso, nomeadamente em sede de erro de apreciação da matéria de facto e de erro de julgamento de direito que vem assacados à sentença sob recurso e que, de imediato, nos propomos. Temos, pois, que improcede a nulidade invocada de falta de apreciação critica da prova, ou de ininteligibilidade e falta de fundamentação usando a terminologia da Recorrente. 2.2.3. Do erro de julgamento Em sede de exame do recurso, antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. artigo 639º, do CPC e artigo 282º, do CPPT). Aqui chegados, afastadas as nulidades assacadas à sentença sob recurso, cumpre conhecer dos erros de julgamento imputados sobre a apreciação que o Tribunal a quo estabeleceu, a saber, aferir se os movimentos financeiros em questão nos autos consubstanciam a concessão de empréstimos, e como tal sujeitos a Imposto de Selo, nos termos do disposto no artigo 1º, n.º 1 do CIS, sendo aplicável o valor constante da verba n.º 17.1.4 da Tabela Geral do CIS, contrariamente ao decidido em 1ª instância. Recapitulando, temos que o Tribunal a quo considerou que “Compulsado o teor dos referidos documentos, denominados “Nota de Débito”, constata-se conterem os mesmos a determinação de um concreto prazo de pagamento – 30/60 dias – relativamente aos quais foram, inclusivamente, liquidados “juros de mora” [conforme “Factura nº ...33” identificada no mapa a que se alude em G) do probatório] sendo que, conforme vimos, tal circunstância é suficiente para obstar à qualificação como “conta corrente” dos registos contabilísticos respeitantes às operações subjacentes, irrelevando, nesta medida, a natureza (“financeira” ou outra) das mesmas operações.”. Contrapõe a Recorrente que não obstante as referenciadas “Notas de Débito”, identificadas no mapa a que se alude em G) do probatório da referida sentença, conterem, de forma genérica, a indicação de “30 dias” ou “60 dias”, como “Condições de Pagamento”, não havia sido, efetivamente, convencionado ou acordado, entre as partes, qualquer prazo para a restituição ou pagamento dos valores constantes das referidas notas de débito, por parte da "F..., Lda.". Vejamos: A Tabela Geral do Imposto do Selo, nos seus primórdios previa a tributação das operações de concessão de crédito, separada em duas verbas distintas, a saber: a) na verba 1 – a abertura de crédito, que era definida como “a obrigação que alguém toma de fornecer a outrem, por meio de escrito particular ou de instrumento público ou ainda por correspondência, fundos, mercadorias ou noutros valores, quer seja para utilizar no País quer no estrangeiro”, e b) na verba 54 – o contrato de mútuo, cujo conceito decorre do artigo 1142.º do Código Civil, em que “mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade”. Pela Lei n.º 150/99, de 11 de setembro, com entrada em vigor no dia 1 de março de 2000, no seu artigo 1.º viria a ser aprovado «o Código do Imposto do Selo e a Tabela Geral [do Imposto do Selo] anexos, que substituem, respetivamente o Regulamento do Imposto do Selo, aprovado pelo Decreto n.º 12 700, de 20 de Novembro de 2926, e a Tabela Geral do Imposto do Selo, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 21916, de 28 de Novembro de 1932, e alterações posteriores.», passando-se a prever numa só verba – 17.1 – a concessão de crédito, precisamente aquela que nos ocupa. “É no domínio das operações financeiras, particularmente no crédito, que se operaram as mais relevantes inovações no novo Código do Imposto do Selo na reforma operada no ano de 2000. (…) o novo Código introduz duas inovações fundamentais relativamente ao anterior: Por um lado o imposto passa a incidir sobre as utilizações de crédito e não sobre a celebração dos contratos que lhes dão origem. Há que distinguir nesta matéria, como em qualquer contrato, entre a celebração e os efeitos que desse contrato resultam. Assim, uma coisa é a celebração do contrato de crédito e outra diferente é a efetiva utilização desse crédito pela pessoa a quem foi concedido. Enquanto no anterior sistema o imposto incidia no momento da celebração do contrato, o novo código manda aplicar o imposto apenas na data da utilização do crédito e à medida dessa utilização, ou seja, já não se tributa a celebração do contrato de crédito, mas a realização dos seus efeitos. Por outro lado, o tempo de duração da relação creditícia passa a ser determinante na determinação do imposto a pagar. Como veremos adiante, o tipo de taxa aplicável depende sempre do período temporal por que o crédito for concedido. (…) O legislador do CIS soube refletir no regime fiscal do crédito em Imposto do Selo a importância do fator tempo, fazendo depender dele o montante da taxa de imposto e, em alguns casos, a própria ocorrência do facto gerador”. (José Maria Fernandes Pires, in “Lições de Impostos Sobre o Património e do Selo”, 2015, 3ª edição) E, sobre o assunto Jorge Belchior Laires e Rui Pedro Martins, in Imposto do Selo Operações Financeira e de Garantia, Almedina, referem “Da norma de incidência retira-se a ideia central de que são tributadas as operações de concessão de crédito, das quais resulte uma utilização de crédito. No atual CIS, ao contrário do regime anterior, a tributação depende da efetiva utilização do crédito por parte da entidade financiada, não havendo tributação sobre a mera colocação de fundos à disposição do financiado. Assim, se as partes contratarem uma abertura de crédito até certo momento, de modo a que o financiado utilize os fundos à medida das suas necessidades, dessa mera colocação à disposição não surge qualquer tributação em Imposto do Selo. Apenas com a transferência dos fundos para a esfera patrimonial do financiado (a utilização do crédito) é que se completa o facto tributário. Uma empresa pode contratar com um banco uma linha de crédito, de modo a garantir que, em caso de necessidade, o banco se obriga a fornecer fundos até certo valor. Se a necessidade de financiamento não surgir, deste contrato nunca resultará uma obrigação de liquidação do imposto incidente sobre o crédito”. Em suma, com a reforma encetada ao Imposto de Selo em 2000, foi introduzida uma alteração à filosofia da tributação do crédito, que passou a recair sobre a sua utilização e já não sobre a celebração do respetivo negócio jurídico de concessão. E, em jeito de sinopse, destacam-se num primeiro momento dois princípios basilares relativamente à tributação das operações de crédito: (i) a tributação ocorre independentemente de haver documento escrito que titule a operação; (ii) a obrigação de imposto apenas nasce com a efetiva utilização de fundos. Para tanto, dispõem alínea g) do n.º 1 do artigo 5.º do Código do IS, que «A obrigação tributária considera-se constituída nas operações de crédito, no montante em que forem realizadas ou, se o crédito for utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outro meio em que o prazo não seja determinado nem determinável, no último dia de cada mês.». Temos portanto, que as operações de crédito são tributadas nos termos da verba 17.1 da TGIS, enunciando para o efeito a lei alguns tipos contratuais de concessão de crédito, como a cessão, o factoring, as operações de tesouraria, a abertura de crédito em conta corrente e o descoberto bancário, sendo que a enunciação é meramente exemplificativa, pois mais do que a forma do contrato que está na base da relação de crédito, o que está sujeito a imposto é a efetiva utilização do crédito pelo beneficiário, como é o exemplo dos suprimentos que embora sujeitos a IS, beneficiam de isenção nos termos da alínea i), n.º 7.º do CIS. E, como ensinam, António Santos Rocha e Eduardo José Martins Brás (in Tributação do Património - IMI - IMT e Imposto do Selo - Anotados e Comentados, Almedina): «g) Nas operações de crédito, a obrigação tributária considera-se constituída no momento em que foram realizadas, sem prejuízo das isenções consignadas no art. 7.º/1, e), g), h) e i). A presente alínea enquadra as operações financeiras previstas nas verbas 17.1 e 17.2 da tabela, quanto à utilização de crédito sob a forma de fundos, pelo que a obrigação tributária se haverá de considerar constituída no momento em que tais operações são contratualizadas. No que se refere à tributação do crédito, o legislador do CIS aprovado pela Lei 150/99, de 11/9, introduziu uma alteração profunda quanto ao momento da constituição da obrigação tributária em relação à Tabela Geral do Imposto do Selo aprovada pelo Decreto 21912, de 28/11/1932. Com efeito, fez deslocar a produção dos efeitos económicos e da capacidade contributiva dos agentes, do momento da contratualização do crédito, deixando de tributar o negócio jurídico da concessão, para o momento da sua utilização. Vai nesse mesmo sentido o entendimento da autoridade tributária quando esclarece “O que deve entender-se por “realização” da operação de crédito” [Circular 15/2000, de 5/7. “O momento da “realização” da operação de crédito, previsto na alínea g) do art. 13.º (atual 5.º) do Código é aquele em que o crédito é utilizado. É que a citada alínea g) refere-se não só às aberturas de crédito, como também aos mútuos, aos empréstimos bancários propriamente ditos e a outras formas de concessão de crédito. Utilizou-se um termo com sentido amplo, de molde a abranger não só os contratos reais, em que a entrega do crédito é elemento essencial do contrato, mas também todas as situações, em que a utilização do crédito é diferida para momento ou momentos posteriores à celebração do contrato. Em termos conclusivos, pode afirmar-se que a operação de crédito se realiza quando o crédito é utilizado.”» E, mais esclarecem, Jorge Belchior Laires e Rui Pedro Martins, no seu “Imposto do Selo Operações Financeira e de Garantia”, Almedina, que “A determinação (ou não) do prazo da operação de crédito não deverá aferir-se quanto ao contrato de crédito em si, porque este tem, em princípio, sempre um prazo estabelecido. A análise deve ser feita quanto ao período de utilização de crédito, considerando-se que o prazo se encontra determinado se estiver previamente fixado pelas partes o período que decorre entre a utilização e o reembolso.”. Munidos destes ensinamentos, volvemos aos autos. Prevê a verba 17 da TGIS, sob a epígrafe” Operações financeiras” que: «17.1 – Pela utilização de crédito, sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, em virtude da concessão de crédito a qualquer título exceto nos casos referidos na verba 17.2, incluindo a cessão de créditos, o factoring e as operações de tesouraria quando envolvam qualquer tipo de financiamento ao cessionário, aderente ou devedor, considerando-se, sempre, como nova concessão de crédito a prorrogação do prazo do contrato – sobre o respetivo valor, em função do prazo: 17.1.1 (...) 17.1.4 – Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30 (...) 0,04%» In casu, como é possível aferir do Relatório de Inspeção Tributária, junto aos presentes autos, e da matéria de facto dada como provada, nomeadamente dos itens U), P) e K), pela Recorrente (FP) foi que considerado que os movimentos financeiros em causa encontravam previsão na verba 17.1.4 da TGIS, por entender que o crédito concedido foi utilizado sob a forma de conta corrente entre a Recorrida/Impugnante e a "F..., Lda.", Ld.ª, não sendo o referido prazo de utilização determinado nem determinável. Ora, no que ao conceito de conta-corrente diz respeito, o mesmo ocorre quando duas pessoas (singulares ou colectivas) tendo de entregar valores uma à outra, se obrigam a transformar os seus créditos em artigos de "deve" e "haver", sendo apenas exigível o saldo final resultante da sua liquidação. Por sua vez os artigos 344.º e 350.º do Código Comercial estabelecem os efeitos do contrato de conta-corrente, a saber: a) A transferência da propriedade do crédito indicado em conta corrente para a pessoa que por ele se debita; b) A novação entre o creditado e o debitado da obrigação anterior, de que resultou o crédito em conta corrente; c) A compensação recíproca entre os contraentes até à concorrência dos respectivos créditos; d) A exigibilidade só do saldo resultante da conta corrente; e) O vencimento de juros das quantias creditadas em conta corrente a cargo do debitado desde o dia do efectivo recebimento; f) O lançamento em conta corrente de mercadoria ou títulos de crédito presume-se sempre feito com a cláusula "salva cobrança". Em suma, duas pessoas obrigam-se a inscrever em partidas de débito e crédito valores correspondentes a remessas de numerário ou de outras mercadorias que reciprocamente se façam. Todavia, as partes não se vinculam a fazer entregas de dinheiro ou de mercadorias, mas sim a converter os respectivos valores em artigos de deve e haver; por isso, os objectos do contrato são os lançamentos. No âmbito deste contrato, a nenhuma das partes assiste a faculdade de reclamar qualquer outro crédito de forma isolada, mas apenas o saldo que a conta apresentar, no final do contrato ou no termo do prazo convencionado. Por isso, o elemento fundamental do contrato não é a forma de contabilização dos créditos recíprocos, mas a estipulação prévia sobre a forma como uma parte pode reclamar da outra o saldo liquidado. "O contrato de conta corrente, regulado nos artigos 344º e seguintes do Código Comercial, pressupõe que as partes tenham convencionado proceder, entregando valores uma à outra e obrigando-se a transformar os seus créditos em artigos de "deve e haver", quanto aos créditos recíprocos e a só considerar exigível o saldo final, pelo que não existe tal contrato quando as partes adoptam o processo contabilístico de efectuar os lançamentos dos débitos e dos créditos resultantes das suas operações ou transacções com o consequente saldo credor ou devedor". (acórdão do STJ de 12.06.1986, in BMJ, pág. 358 – 558). Diferente, é o documento através do qual se formaliza de modo contabilístico a exteriorização de relações comerciais. O simples facto de uma pessoa singular ou colectiva elaborar uma conta corrente onde lança todos os movimentos a crédito e a débito que expressam as relações entre ele e outrem não significa que exista um contrato de conta corrente, na medida em que esse processo contabilístico de escrituração de transacções, em rubricas de "deve" e "haver", "débitos" e créditos" é comum a comerciantes e não comerciantes - o que não se confunde com a existência de uma convenção entre as partes no sentido de lançarem a débito e a crédito os valores que reciprocamente tenham que entregar uma à outra e de se exigir apenas o saldo final que se venha a apurar. Conforme decidiu o recente Acórdão da Relação do Porto, de 18.05.2004 (proc. 0421597, www.dgsi.pt), "Tal contrato [de conta-corrente] nada tem a ver com a conta corrente contabilística (que é tão só o processo de registo contabilístico de operações efectuadas a crédito e débito), pela qual se exprime numericamente o movimento ou resultado de qualquer operação ou transacção, que por sua vez se traduz num saldo credor ou devedor; por outras palavras, não se confunde com a forma técnica de o comerciante, sem intervenção do seu cliente ou fornecedor, registar numericamente o movimento das suas transacções, designadamente fornecimentos ou empréstimos e respectivas amortizações, ou seja, com a técnica de escrituração, através de descrições genéricas de lançamentos em forma de conta corrente, com que ele, unilateralmente, vai exprimindo o seu giro". No mesmo sentido, decidiu a Relação de Lisboa (Ac. RL, 15.04.1999, BMJ, 486, p. 357), "O registo de operações comerciais segundo a técnica contabilística de inserção de colunas de deve e haver, vulgarmente designado por conta corrente, constitui realidade essencialmente diversa do contrato de conta corrente a que se reporta o artigo 344º do Código Comercial".» Na verdade, este conceito denota uma realidade diferente da “forma de conta corrente” que é prevista na verba 17.1 da TGIS, a qual consiste na forma técnica contabilística de exprimir numericamente o movimento e resultado de qualquer operação ou transação, que por sua vez se traduz num saldo credor ou devedor. Sobre esta matéria, chamemos a colacção o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 03.12.2015, proferido no âmbito do processo n.º 06974/13, que quanto a esta matéria nos esclarece que: “(...) a verba nº.17, da Tabela Geral do Imposto de Selo (T.G.I.S.), sujeita a incidência de imposto de selo as operações financeiras tendo em conta a sua substância económica e desconsiderando a forma jurídica subjacente aos contratos, denotando-se uma preocupação crescente com o princípio da igualdade fiscal. O imposto sobre a utilização de crédito previsto na verba 17.1. da T.G.I.S. incide sobre todas as operações de natureza financeira, realizadas por qualquer entidade, e a qualquer título, de que resulte a disponibilização de crédito sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, abrangendo na sua incidência, quer os actos de tomada de fundos disponibilizados em território nacional a entidades aqui não domiciliadas, quer as operações desta natureza realizadas a favor de entidades aqui domiciliadas, ainda que o facto tributário - o saque dos fundos - se deva considerar localizado fora do território nacional. Já a verba 17.1.4 da T.G.I.S., supra exposta, tributa a utilização de crédito sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou outra, de duração de utilização indeterminado ou indeterminável, é sujeito à taxa de 0,04% sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30. No caso da utilização do crédito acordada por ou com a intermediação de uma instituição financeira não residente em Portugal, o imposto do selo deverá ser pago e constitui encargo da sociedade residente em Portugal no final de cada mês no caso de descoberto bancário ou de concessão de crédito por prazo não determinado ou indeterminável (cfr.artºs.4, 5, 23 e 44, do C.I.S.). Nesta verba, a incidência de imposto deriva do sujeito favorecido com a operação de crédito beneficiar de um aumento de liquidez financeira num momento actual, sendo que a situação passiva colateral - o encargo ou dívida - se encontra disseminada num médio ou longo prazo (variando a taxa de tributação precisamente nessa função "pro rata temporis"), considerando o legislador suficiente para efeitos de tributação esse “súbito enriquecimento aparente” resultante de uma disponibilidade monetária instantânea. Por força da amplitude da referida norma de incidência estarão, assim e necessariamente, sujeitos a este imposto, quer os excedentes de fundos disponibilizados pela entidade centralizadora às aderentes, quando do seu saque por parte destas, quer em sentido inverso, os excedentes por estas colocadas à disposição da entidade centralizadora de tesouraria, no momento em que sejam objecto de levantamento. As entidades responsáveis pela liquidação e entrega do imposto junto dos cofres do Estado serão sempre, em qualquer dos casos, as entidades domiciliadas em território nacional (cfr.Carlos Baptista Lobo, As operações financeiras no Imposto do Selo: Enquadramento Constitucional e Fiscal, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, ano 1, n.º1, Edições Almedina, 2008, pág.73 e seg.; José Fernando Abreu Rebouta, ob.cit., pág.16 e seg.). (...) [N]ão exige a verba 17.1.4, da T.G.I.S., cuja exegese supra se realizou, a prova da existência de um contrato de conta-corrente, como pressuposto da incidência do tributo. A conta-corrente comercial é um negócio típico e nominado (cfr.artº.344, do C. Comercial), a qual implica, antes de mais, uma obrigação, assumida pelas partes contratantes de manter uma determinada relação de negócios sob a forma contabilística de uma conta-corrente, a qual tem, ínsita, uma função de crédito: consoante o sentido do saldo e até ao encerramento da conta, as partes podem ficar, reciprocamente, na situação de credor e de devedor. Já a conta-corrente bancária constitui uma espécie de conta-corrente comercial que se integra, com outros elementos, num contrato mais vasto de abertura de conta, normalmente celebrado entre o banqueiro e o seu cliente. (cfr. António Menezes Cordeiro, Direito Bancário, 5ª. edição, 2014, Almedina, pág.552 e seg.).” E, sufraga o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14.03.2018, proferido no âmbito do processo n.º 0800/17, o entendimento sumariado, que aqui transcrevemos por reconduzir –se a uma síntese do todo do quanto supra se expôs, de que: «I - A concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido. II - O facto tributário eleito para tributação em imposto de selo é, sempre, a concessão de crédito - prestação de valores monetários de uma parte a outra obrigando-se esta última a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro-. III - A mera celebração do contrato de concessão de crédito nem sempre gera facto tributário do imposto. Quando a utilização do crédito for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que coincide com a data de celebração do contrato de concessão de crédito. IV - Quando a utilização do crédito não for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que não coincide com a data de celebração do contrato concessão de crédito.». Antes de mais, se dirá que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr. artigo 9º, do Código Civil; artigo 11º, da Lei Geral Tributária). Por outro lado, releve-se que as normas de incidência dos tributos bem como as que concedem isenções ou exclusões de tributação, devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia, tornando prevalente a certeza e a segurança na sua aplicação (cfr. Acórdãos do TCA Sul, de 02.10.2012, in proc.5320/12, de 12.12.2013, in proc.7073/13, de 27.03.2014, in proc.2912/09 e 10.09.2015, in proc.7066/13). A par de tudo o quanto já aqui foi dito, pese embora possam se suscitar dúvidas a respeito desta matéria, temos por nós que a taxa prevista na verba 17.1.4 tem o seu campo de aplicação delimitado àquelas outras situações em que, pelos próprios termos do contrato, não seja possível determinar um momento certo em que haverá necessariamente lugar ao reembolso, só assim se justificando que o imposto, em tais casos, seja liquidado por aplicação de uma taxa média calculada mensalmente. O tipo de taxa previsto na verba 17.1.4 aplica-se, por conseguinte, quando não se encontre previamente definido o prazo de utilização do crédito e não seja possível tributar por qualquer das regras estabelecidas nas verbas 17.1.1 a 17.1.3., por isso alusão no mesmo da utilização de crédito sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou outra, de duração indeterminada ou indeterminável. “A lei começa, pois, por elencar o crédito sob a forma de conta-corrente e o descoberto bancário como modalidades em que, em princípio, o prazo de utilização é indeterminado ou indeterminável. Dizemos “em princípio” porque a aferição dependerá sempre da análise de cada caso concreto, podendo concluir-se que, não obstante a forma adotada pelas partes, o prazo do crédito se encontra à partida determinado, não sendo por isso tributado nesta verba”. (Jorge Belchior Laires e Rui Pedro Martins, in ob.cit., sobre a verba 17.1.4 da TGIS). Posto isto, vejamos, então, das operações controvertidas nos presentes autos face aos itens F), D), da matéria dada como provada. - Analisados os movimentos relevados no extracto contabilístico adstrito à conta 22110026 (vide folhas 1 e 2 do Anexo III ao presente Relatório de Inspecção), constata-se a presença de duas realidades distintas. Por um lado, a existência de movimentos de natureza meramente comercial relacionados com a prestação de serviços administrativos e comerciais, os quais correspondem a todos os movimentos inferiores a € 1.000,00 relevados no referido extracto (...), por outro lado, a existência de movimentos de carácter estritamente financeiro, substanciados nos valores superiores a €1.000,00 relevados no referido extracto contabilístico; - Os movimentos de carácter estritamente financeiro, referidos na alínea anterior, encontram-se maioritariamente(...) realizados no âmbito de um contrato quadripartido celebrado em 2004.07.06, no qual o sujeito passivo "A..., Lda.", cedeu à "F..., Lda.", um crédito que detinha sobre a firma "S..., SA." NIPC: 503......00 permitindo que a "F..., Lda." efectua-se a liquidação parcial de uma dívida que tinha para com o seu fornecedor "S..., SA." (vide fotocópia do referido contrato relevada no Anexo VI ao presente Relatório de Inspecção); - Nesse mesmo contrato, o sujeito passivo "A..., Lda.", aceitou ainda ceder à firma "F..., Lda.", quaisquer créditos futuros que venha a deter sobre a "S..., SA." (conforme cláusula terceira do referido contrato); - Tendo em consideração que o extracto contabilístico adstrito à conta 22110026 (vide folhas 1 e 2 do Anexo III ao presente Relatório de Inspecção) apresenta movimentos com distinta natureza (comercial versus estritamente financeiro), procedeu-se ao levantamento exaustivo dos movimentos de carácter estritamente financeiro, relacionados exclusivamente com os valores monetários concedidos pela firma "A..., Lda.", a título de empréstimo, à firma "F..., Lda.", tendo esse procedimento resultado na identificação dos documentos relevados no quadro apresentado no Anexo VII ao presente Relatório de Inspecção. A este respeito vide ainda a título exemplificativo fotocópia de diversas notas de débito e notas de liquidação emitidas pela "A..., Lda.", as quais se encontram relevadas no Anexo VIII ao presente Relatório de Inspecção; - Analisados os movimentos relevados no extracto contabilístico adstrito à conta 26820005 (vide folhas 3 e 4 do Anexo III ao presente Relatório de Inspecção), constata-se a existência de movimentos de carácter estritamente financeiro, substanciados em depósitos efectuados pela "A..., Lda." nas contas à ordem da "F..., Lda." e em pagamentos, nomeadamente, de impostos que esta última tinha em dívida; Ora, perante estes factos, e em conformidade com o julgamento efectuado pela 1ª instância, cumpre tão só aferir da aplicação da Verba 17.1.4 da TGIS, ou seja, da subsunção daquelas operações à figura do crédito sob a forma de conta corrente, não sendo o respetivo prazo de utilização determinado, nem determinável. Sendo que AT considerou que relativamente aos movimentos financeiros elencados, considerou que não se encontra definido o seu prazo de restituição nem o correspondente serviço de dívida. O Tribunal a quo, conclui que o prazo de restituição está determinado com apoio exclusivo nos documentos, denominados “Nota de Débito”, as quais contêm a determinação de um concreto prazo de pagamento – 30/60 dias sendo que, conforme vimos, tal circunstância é suficiente para obstar à qualificação como “conta corrente” dos registos contabilísticos respeitantes às operações subjacentes, irrelevando, nesta medida, a natureza (“financeira” ou outra) das mesmas operações. Enfrentando este Tribunal ad quem a questão, somos de concluir que mal andou a sentença recorrida. É que, face às características apontadas no contrato quadripartido em apreço, é manifesto, que do mesmo consta um contrato de cedência de créditos detidos sobre a firma "S..., SA.", permitindo que a "F..., Lda.", efectuasse no momento da celebração do mesmo a liquidação parcial de uma dívida que tinha para com o seu fornecedor "S..., SA." e, bem assim, a cedência nos mesmos termos, de quaisquer créditos futuros que venha a Impugnante a deter sobre a "S..., SA.". Ora, do referido contrato, que está na base dos movimentos financeiros em causa nos autos e relevados contabilisticamente, [sendo que a tese avançada pela Impugnante de que os mesmos assentam em eventual “contrato promessa de compra e venda” não releva nesta sede por o julgado sobre ele não ter incindido], os mesmos têm o seu suporte no “contrato quadripartido celebrado em 2004.07.06” (item F) do probatório), do qual não consta qualquer prazo pré-determinado em que ocorrerão as operações de créditos futuros que venham a ocorrer, nomeadamente prazo para que verificada a existência de um débito por parte da "F..., Lda." para com a "S..., SA." se concretize a cedência, ou seja, a utilização do crédito e, por maioria de razão o seu reembolso. Atentos os movimentos financeiros existentes na contabilidade, entende este Tribunal ad quem que a presente operação, tida entre a Impugnante e a "F..., Lda.", tem enquadramento na verba 17.1.4 da TGIS, por se tratar de uma operação financeira sob a forma de conta corrente, não se mostrando determinado nem determinável o prazo de reembolso dos montantes contribuídos, contrariamente ao decidido pelo tribunal a quo. A menção existente nas notas de débito emitidas a “30 dias” e a “60 dias”, não detém a virtualidade que lhe foi dada, para efeitos de se considerar que aquele prazo nelas opostas desfigura o prazo indeterminável da cedência de crédito que decorre do clausulado do referido “contrato quadripartido”, as mesmas tão só assumem relevo de documento ou recibo contabilístico para efeitos de registo das operações, sendo que nas mesmas, em regra, é sempre aposta a data do vencimento. Efectivamente, no contrato a que se alude não decorre a definição de uma data específica para que se concretize a utilização das cedências e consequentemente dos reembolsos, na medida em que estes podem ocorrer em qualquer data que se situe dentro do lapso temporal que decorra entre o momento da utilização da cedência do crédito e aqueles que as partes considerarem para o reverter contabilisticamente, pelo que temos para nós que à liquidação da taxa correspondente as operações financeiras em causa sem prazo determinado ou determinável. Mais se diga, que a cláusula de utilização de crédito futuros inscrita no “contrato quadripartido” é uma cláusula com a natureza de estipulação condicional, que confere aos contraentes, neste caso ao utilizador do crédito uma mera faculdade de utilização do mesmo - que poderia mesmo em rigor nunca vir acontecer se a "F..., Lda." fosse detentora de liquidez para solver as suas obrigações para com a "S..., SA."-, e que, à partida, se reflete na relação contratual estabelecida entre as partes, mas tendo sido aquele “cedência crédito” efectivamente utilizado como releva a contabilidade, o mesmo tem reflexos no âmbito de incidência em sede de Imposto de Selo. Em regra, a taxa aplicável deverá corresponder ao prazo que medeie entre o momento do saque dos fundos disponibilizados e o momento em que, nos termos do contrato, deva ocorrer o reembolso. No entanto, essa regra só pode ser validamente implementada, em aplicação directa da norma de incidência objectiva, quando seja possível determinar previamente, com rigor, o prazo efectivo de utilização e seja possível fazer corresponder os movimentos financeiros que representem o desembolso e o respectivo reembolso (neste sentido, Luís Magalhães, “O Novo Código do Imposto do Selo. Principais reflexos no crédito”, in Fisco, n.º 88-89, maio-junho de 2008, Ano XI, pág. 22). Subsistindo uma dificuldade prática no apuramento da duração efectiva da utilização do crédito, é pois, impossível saber qual o prazo em que ocorre o débito na "F..., Lda." e esta utiliza a linha de crédito por cedência que lhe foi concedida pela Impugnante sobre esses mesmos débitos, é patente, que a taxa prevista na verba 17.1.4 tem aqui o seu campo de aplicação, pois dos próprios termos do contrato, não é possível determinar um momento certo em que haverá necessariamente lugar à utilização do crédito e o seu reembolso através dos competentes operações contabilísticas de “dever” e “haver”, justificando que o imposto, in casu, seja liquidado por aplicação de uma taxa média calculada mensalmente. O tipo de taxa previsto na verba 17.1.4 aplica-se, por conseguinte, quando não se encontre previamente definido o prazo de utilização do crédito e não seja possível tributar por qualquer das regras estabelecidas nas verbas 17.1.1 a 17.1.3. o que, manifestamente, se verifica no caso sub judice, mal andou a sentença que diferentemente considerou que das “notas de débito” emitidas e da omissão dos demais documentos de suporte contabilístico, seria de concluir pela existência de um prazo determinado o que afasta aplicação da verba 17.1.4 da TGIS. Somos, pois, de concluir pela procedência do recurso, o que determina a revogação da sentença recorrida e improcedência da Impugnação. 2.3. Conclusões I. A omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr. artigo 608º, n.º 5 CPC e 125º, n.º 1 do CPPT). II. O dever de fundamentação da sentença abrange realidades distintas (mas conexas) que incluem a fixação dos factos provados e não provados, a respectiva fundamentação de direito e a explicitação das razões pelas quais o julgador considerou provado determinado facto. III. Apenas a falta absoluta de análise critica da prova fundamentação é causa de nulidade da sentença, mas já não a que decorre de uma análise medíocre, mas ainda assim inteligível, a qual a ocorrer se insere no âmbito do erro de julgamento de direito assacado. IV. A concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido. V. O facto tributário eleito para tributação em imposto de selo é, sempre, a concessão de crédito - prestação de valores monetários de uma parte a outra obrigando-se esta última a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro. VI. A verba nº.17, da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), sujeita a incidência de imposto de selo as operações financeiras tendo em conta a sua substância económica e desconsiderando a forma jurídica subjacente aos contratos. VII. A verba 17.1.4 da T.G.I.S., tributa a utilização de crédito sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou outra, de duração de utilização indeterminado ou indeterminável, é sujeito à taxa de 0,04% sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30. VIII. É o caso da utilização do crédito que decorre da concessão de crédito por prazo não determinado ou indeterminável, a incidência de imposto deriva de o sujeito favorecido com a operação de crédito beneficiar de um aumento de liquidez financeira num momento actual, sendo que a situação passiva colateral - o encargo ou dívida - se encontra disseminada num médio ou longo prazo (variando a taxa de tributação precisamente nessa função "pro rata temporis"). 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e declarar a improcedência da Impugnação. Custas pela Recorrida, sendo que, nesta instância, as custas não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.. Porto, 15 de dezembro de 2022 Irene Isabel das Neves (Relatora) Ana Paula Santos (1.º Adjunta) Margarida Reis (2.ª Adjunta) |