| Decisão Texto Integral: | "AA" e "BB", interpõem recurso da sentença que julgou improcedente a Reclamação dos Atos do Órgão de Execução Fiscal, que havia sido deduzida contra o despacho que que indeferiu o pedido de prestação de garantia sob a forma de penhor de quotas da sociedade de que são sócios.
Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
§ 3.º
CONCLUSÕES
A) O presente recurso tem por objeto a Sentença proferida pelo TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO (adiante, Tribunal a quo) no passado dia 20 de setembro de 2022, na qual se julgou improcedente a reclamação judicial apresentada pelos ora RECORRENTES contra o despacho que indeferiu o pedido de prestação de garantia sob a forma de penhor de quotas da sociedade "F...., Lda.”., apresentado para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º ...60.
B) Ora, sobressai do despacho reclamado que o valor de € 85.874,83 atribuído pela Autoridade Tributária à quota oferecida em penhor pelos RECORRENTES resulta, linearmente, da soma dos valores registados nas contas de capital próprio detalhadas no balancete geral entregue pelos RECORRENTES à Autoridade Tributária (€1.000,00 + €90.000,00 + €200,00 + € 80.549,65 = €171.749,65), seguido da sua divisão por 2 (€171.749,65 / 2 = €85.874,83) para corresponder ao valor da quota de 50% oferecida em penhor pelos RECORRENTES [cf. pontos 2 e 3 do probatório fixado na Sentença recorrida].
C) Sucede, porém, que o referido cálculo desconsiderou liminarmente, quer o valor dos proveitos já obtidos pela sociedade em causa no decurso do ano de 2020 (constantes das contas de proveitos detalhadas naquele mesmo balancete geral), quer, de forma ainda mais grave, o facto de a referida sociedade ser plena proprietária de imóveis no valor global de € 1.201.585,20, circunstância que deveria ter sido considerada na avaliação da garantia oferecida na medida em que a detenção indireta de tais imóveis seria suscetível de garantir todos os valores em causa no respetivo processo executivo.
D) Resulta do que antecede, por conseguinte, que o despacho reclamado, ao ter por fundamento a circunstância de a quota oferecida em penhor ter sido avaliada em – somente – €85.874,83, assentou em manifesto erro sobre os respetivos pressupostos, na medida em que no apuramento do referido valor foram indevidamente desconsiderados, quer os resultados correntes do exercício de 2020, quer o valor dos imóveis detidos pela sociedade, valor que seria, em qualquer circunstância, suficiente para garantir o processo executivo em causa.
E) O mesmo é dizer, de forma mais incisiva, que o despacho reclamado é ilegal por assentar em manifesto erro sobre os respetivos pressupostos, impondo-se, por este motivo, a sua anulação nos termos oportunamente peticionados ao Tribunal a quo.
F) Porém, apreciando a invocada ilegalidade, o Tribunal a quo veio validar o entendimento da Autoridade Tributária, tecendo, para o efeito, as seguintes considerações (cf. Sentença recorrida; os destacados são dos RECORRENTES): (i) «[D]ecorre da matéria provada que os Reclamantes não disponibilizaram o balancete geral de 2020 autenticado por contabilista certificado, o que impossibilitou a Autoridade Tributária de apoiar a sua decisão noutros elementos contabilísticos, além daquela Informação Empresarial Simplificada. Na verdade o princípio da cooperação consagrado no artigo 48°, n° 1 e 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário estabelece que a Autoridade Tributária esclarecerá os contribuintes sobre a necessidade de apresentação de declarações, que se revelem necessárias ao exercício dos seus direitos, e faz incidir sobre o contribuinte o dever de cooperação de boa-fé na instrução do procedimento, esclarecendo de modo completo e verdadeiro os factos de que tenha conhecimento e oferecendo os meios de prova a que tenha acesso»; (ii) «“In casu” os Reclamantes não cumpriram o dever de cooperação que sobre eles recaía, não se revelando suficiente a junção de um mero balancete geral, sem a competente certificação, para que a Autoridade Tributária pudesse vir a decidir em sentido diverso àquele que o fez. Deste modo, o acto reclamado não enferma de erro na apreciação quanto aos pressupostos de direito, nem quanto aos pressupostos de facto, pelo que improcede o vício de violação de lei»; e (iii) «A talhe de foice importa ainda salientar que a mera aquisição de dois imóveis com o valor estimado de € 1.201.585,20, que pode não corresponder à realidade, e necessariamente tem como contrapartida a saída do correspondente numerário ou a oneração da sociedade com um empréstimo equivalente, em nada altera a situação patrimonial da sociedade e a idoneidade da garantia oferecida. E o mesmo sucede com os alegados lucros que nem sequer pertencem na totalidade aos Reclamantes, e a qualquer altura podem ser distribuídos pelos sócios».
G) Sucede, contudo, que nenhuma das considerações do Tribunal a quo poderá, pelas razões de seguida enunciadas, ser atendida por VV. Excelências.
H) Quanto à relevância atribuída à não disponibilização de um «balancete geral de 2020 autenticado por contabilista certificado» por parte dos RECORRENTES, porque: (i) o balancete geral analítico (tal como facultado pelos RECORRENTES à Autoridade Tributária) consubstancia um mapa contabilístico voluntário – i.e., não obrigatório – que, nessa medida, não é autenticado ou certificado pelos respetivos técnicos de contas (contrariamente ao que sucede com o balanço anual, que consubstancia um mapa obrigatório que deve ser certificado, depositado junto da respetiva Conservatória do Registo Comercial e comunicado à Autoridade Tributária na Informação Empresarial Simplificada); (ii) não obstante, o balancete geral analítico constitui o mais completo de todos os mapas contabilísticos, na medida em que permite visualizar o valor total dos débitos e dos créditos de todas as contas da sociedade, juntamente com os saldos de cada uma delas (sejam devedores ou credores), permitindo a realização de um resumo financeiro detalhado e rigoroso que não é possível mediante análise do respetivo balanço certificado; e (iii) pelos motivos expostos, é o balancete geral, e não o balanço certificado, que costuma ser solicitado pelas instituições bancárias para a concessão ou renovação de empréstimos, e foi por esta precisa razão, de resto, que os RECORRENTES facultaram o balancete geral à Autoridade Tributária para efeitos de avaliação da sociedade em causa.
I) Quanto à alegada violação do princípio da colaboração por parte dos RECORRENTES, na medida em que, ao invés do que afirma o Tribunal a quo, deveria ter sido a Autoridade Tributária a notificar os RECORRENTES para promoverem a junção de documentos adicionais caso tivesse entendido ser necessário analisar outros elementos além dos já facultados pelos RECORRENTES (o mencionado balancete geral) e dos disponíveis nas suas bases de dados (os submetidos pela sociedade no âmbito da Informação Empresarial Simplificada exigida anualmente), o que não sucedeu.
J) Finalmente, quanto às considerações realizadas a talhe de foice pelo Tribunal a quo acerca dos imóveis detidos pela sociedade e dos lucros gerados no respetivo exercício, posto que:
(i) apesar de irrelevante para este efeito, o valor de mercado dos imóveis detidos pela sociedade é superior ao que se encontra registado na sua contabilidade, já que o valor registado corresponde ao custo histórico de aquisição de tais imóveis, o qual, consabidamente, desconsidera toda e qualquer valorização ocorrida em momento posterior;
(ii) o valor dos financiamentos contraídos pela sociedade e pendentes à data (no valor de € 755.232,27) consta do balancete geral entregue à Autoridade Tributária, sendo significativamente inferior ao valor dos respetivos imóveis (€ 1.201.585,20); e
(iii) a possibilidade de os lucros poderem ser distribuídos aos sócios coloca-se não só com os lucros do exercício, tal como sublinhado pelo Tribunal a quo, mas também (e sobretudo!) com os resultados transitados de € 80.549,65 que foram considerados pela Autoridade Tributária na avaliação realizada, o que demonstra a manifesta irrelevância desta observação (de facto, uma desvalorização subsequente da sociedade por via de uma putativa distribuição de lucros relevaria somente no momento dessa distribuição e no plano da reavaliação de uma garantia pendente).
K) Perante o que antecede impõe-se concluir, uma vez mais, que o despacho reclamado é ilegal por assentar em manifesto erro sobre os respetivos pressupostos, devendo o presente recurso ser considerado procedente e, em consequência, ser promovida a sua anulação (o que se peticiona a VV. Excelências).
NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS NÃO DEIXARÃO DE SUPRIR, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A SENTENÇA PROFERIDA PELO TRIBUNAL A QUO, SENDO, CONSEQUENTEMENTE, ANULADA A DECISÃO DE INDEFERIMENTO DA GARANTIA PROPOSTA PARA EFEITOS DE SUSPENSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo [cf. artigo 36.º, n.º 2, do CPTA, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, e artigo 278.º, n.º 3, do CPPT].
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.
As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se a sentença errou ao considerar como insuficiente a garantia pretendida prestar pelos Recorrentes, designadamente por não atender ao valor dos imóveis na avaliação da Quota.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
FUNDAMENTAÇÃO
FACTOS PROVADOS
1. A Autoridade Tributária, em 24/12/2020, instaurou contra "BB", Contribuinte Fiscal nº ..., e "AA", Contribuinte Fiscal nº ..., o Processo de Execução Fiscal nº ...60, que corre termos no Serviço de Finanças ... para cobrança de créditos de IRS referentes a 2018, no montante de € 51.518,00, a que acrescem juros e custas, conforme certidão de dívida nº ...44 de fls. 19 (verso) do processo físico.
2. Os Reclamantes, em 19/5/2020, deram conta que apresentaram Reclamação Graciosa dirigida aos actos de liquidação adicional de IRS e de juros compensatórios, e requereram a suspensão do Processo de Execução Fiscal nº ...60 mediante a prestação de garantia, tendo oferecido em penhor as quotas por eles detidas na sociedade comercial "F...., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ..., com sede na Rua ..., em ..., conforme requerimento de fls. 22 (verso) a 24 do processo físico.
3. A Directora de Finanças Adjunta do ....., por despacho de 8/7/2021, indeferiu o pedido de prestação de garantia referido em 2, com base em informação constante de fls. 34 do processo físico da qual se extracta: “Assim, de acordo com as alíneas a) a d), do n. 0 4 do art 0 199. 0-A do CPPT, para efeitos de cálculo da garantia, ao valor atribuído ao penhor (€85.874,83) haverá que subtrair o valor da garantia prestada no PEF ...04 no valor de €112.136,05 e o valor de €50.800,00, a título de créditos detidos pela sociedade sobre o executado.
Pelo que, o valor da garantia oferecida, para efeitos de suspensão do PEF ...60, apresenta o valor líquido de € 0,00 (€85.874,83 - €112.136,05 - €50.800,00).
Pelo que da garantia proposta pelo executado, considerando a existência de ónus incidentes sobre a referida quota, o valor líquido a considerar para os devidos efeitos é de €0,00, valor manifestamente insuficiente para fazer face à garantia necessária, na presente data, no PEF visado pelo pedido (€66.414,60).
D. Conclusão
Afigura-se, assim, não estarem reunidas as condições necessárias para a aceitação da garantia oferecida, por falta de idoneidade.”.
4. Na informação relativa à avaliação da quota oferecida como penhor, datada de 15/6/2021, que se encontra a fls. 36 (verso) do processo físico e se dá por reproduzida, consta que foi atribuído o valor de € 85.874,83 à quota em causa, em conformidade com a seguinte fundamentação: “Não tendo sido disponibilizado balanço mais recente autenticado pelo contabilista certificado, recorreu-se à última IES referente ao ano de 2019, pelo que a situação patrimonial/financeira poderá não ser a mesma atualmente”.
5. A Autoridade Tributária, em 26/7/2021, remeteu aos Reclamantes, mediante carta registada RH 7502 0151 ..., o ofício nº GPS2021..........35, datado de 22/7/2021, que consta a fls. 37 (verso) do processo físico, com vista à notificação do despacho e informação mencionados em 3.
6. A presente reclamação foi apresentada em 6/8/2021.
FACTOS NÃO PROVADOS
Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito.
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A convicção do Tribunal alicerçou-se na matéria alegada e não impugnada comprovada mediante análise crítica da prova documental junta aos autos referida no probatório em relação a cada facto, e outra de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respectiva alegação, nos termos do artigo 412º do Código de Processo Civil.
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Aditamento à matéria de facto
Por se considerar pertinente, ao abrigo do artigo 662.º do Código de Processo Civil, transcreve-se na íntegra o Despacho recorrido, desse modo, alterando-se o ponto 3 da matéria de facto, assim como se adita a avaliação realizada à quota detida pelo Reclamante, bem como o Despacho concordante com essa avaliação.
3. A Directora de Finanças Adjunta do ....., por despacho de 8/7/2021, indeferiu o pedido de prestação de garantia referido em 2, com base em informação constante de fls. 34 do processo físico, cujo conteúdo integral é o seguinte: (fls. 29 a 30 do PEF, a págs. 32 do SITAF):
Informação
A. Processo
1. Executado: "BB" / "AA"
2. NIF: .../ ...67
3. PEF: ...60
4. Serviço remetente: SF ...
5. Origem da dívida: IRS 2018
6. Valor instaurado: €51.518,00
B. Causa Suspensiva e Garantia. Apresentada
1. Causa suspensiva: Reclamação Graciosa SICAT n.º ...36, com data de apresentação em 2021-02-16
2. Tipo Garantia: Penhor da quota, representativa de 50% do capital, da sociedade "F...., Lda.”, NIPC ...
3. Valor da garantia apurada: €66,414,60 (simulação à data de 2021-06-28)
4. Valor atual em dívida: €52.945,72 (202'1-06-25)
C. Apreciação do Pedido
Em 2020-12-24, foi instaurado o PEF ...60 contra. "BB", NIF ... e "AA", NIF ..., por dividas de IRS, referentes ao ano de 2018, com a quantia exequenda de €51.518,00, a que acrescem juros e custas.
Em requerimento dirigido ao Chefe do SF de ..., de 2020-05-19, vem o executado, através de mandatário devidamente constituído, requerer a suspensão dos autos, ao abrigo do disposto do n.º 4, do art.º 103.º e do artigo 169.º, ambos do CPPT.
Para o efeito informa que foi apresentada Reclamação Graciosa contra os atos de liquidação adicional de IRS e de juros compensatórios relativos aos anos de 2018 e de 2019.
Assim, veio o Serviço de Finanças ..., através de comunicação GPS n.º ...58, de 2021-06-08, remeter para apreciação e decisão desta Divisão de Gestão da Divida Executiva, o requerimento apresentado pela executada, no qual oferece como garantia “(...) penhor. sobre a quota detida pelo Requerente "BB" representativa de 50% do capital da sociedade "F...., Lda.”., pessoa coletiva n.º ..., (...)”.
Juntamente, com o requerimento, remeteu a executada cópia de certidão permanente e balancete geral, de nov-2020, da sociedade "F...., Lda.”, NIPC...
Nos termos dos nºs 1 e 2 do art.º 52.º da Lei Geral Tributária (LGT) e do nº 1 do art.º 169º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) a execução suspende-se em virtude de pagamento em prestações, reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial desde que tenha sido constituída garantia nos termos do art.º 195.º ou prestada nos termos do art.º 199º, ambos do CPPT.
Em 2021-02-16, apresentou Reclamação Graciosa, à qual coube o n.º ...36, no SICAT, que se encontra na fase F400 – Notificação para Audição Prévia.
Concluindo-se, assim, pela existência de causa suspensiva.
A competência para apreciação do mesmo pertence ao órgão periférico regional, atendendo ao disposto do n.º 3 do artigo 150.º, 197.º e n.º 9 do art.º 199.º, todos do CPPT.
Da Garantia,
Na presente data (2021-06-28), o valor necessário para suspender o processo executivo em apreço cifra-se em €66.414,60.
Para a pretendida suspensão do processo executivo nos termos dos nºs 1 e 2 do art.º 52.º da LGT, e do art.º 199º do CPPT, o requerente oferece penhor da quota por si detida representativa de 50% do capital, na sociedade "F...., Lda.”., NIPC ....
Nos termos do n.º 2, do art.º 199.º do CPPT “A garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária, aplicando-se o disposto no artigo 195.º, com as necessárias adaptações”.
Dispõe o n.º 1 do artigo 199.º- A do CPPT que “Na avaliação da garantia, (...), deve atender-se ao valor dos bens ou do património do garante apurado nos termos dos artigos 13.º a 17.º do Código do Imposto do Selo “. Ao valor apurado deduzir-se-ão os montantes, quando aplicável, e sempre que afete a capacidade da garantia, de acordo com as alíneas a) a d), do n.º 4 do mesmo normativo legal.
De acordo com o n.º 1 e n.º 2, do artigo 15.º do CIS “1 - O valor das quotas ou partes em sociedades que não sejam por acções e o dos estabelecimentos comerciais, industriais ou agrícolas com contabilidade organizada determina-se pelo último balanço (...).
2 - Sendo o garante uma sociedade, o valor do seu património corresponde ao valor da totalidade dos títulos representativos do seu capital social determinado nos termos do artigo 15.º do Código do Imposto do Selo.”
A fim de se proceder à análise da garantia oferecida, no PEF supra indicado, constituída pela quota da sociedade "F...., Lda.”., NIPC ..., detida por "BB", solicitou-se a sua avaliação nos termos do artigo 15º do CIS, à Divisão Liquidação de Impostos – Património e Outros Impostos (DLIPI).
Em resposta ao solicitado, enviou, a DLIPI, a respetiva avaliação, tendo atribuído o valor de €85.874,83, à referida quota.
Consultada a Certidão Permanente da sociedade, verifica-se:
- A sociedade "F...., Lda.”., NIPC ..., com o Capital Social de €1.000,00, detida em 50% do seu capital, por "BB", NIF ....
- Sobre a quota oferecida não pendem registados quaisquer ónus ou encargos.
Juntamente com o presente requerimento remeteu o aqui executado balancete, da análise deste verificou-se que se encontra inscrito na conta “Outros devedores – Não c” e na respetiva subconta “278210003 "BB"” o valor de €50.800,00.
Foi, igualmente, oferecido o presente penhor da quota representativa de 50% do capital, na sociedade "F...., Lda.”., NIPC ..., para efeitos de garantia no PEF ...04.
Por Despacho da Sr.ª Diretora de Finanças ..., datado de 2021-02-12, tendo a garantia oferecida sido aceite, para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal (PEF ...04), com o valor da garantia a prestar de €112.136,05.
Para os efeitos tidos por convenientes, mais se informa que o referido penhor não se encontra devidamente registado da certidão permanente da respetiva sociedade.
Assim, de acordo com as alíneas a) a d), do n.º 4 do art.º 199.º-A do CPPT, para efeitos de cálculo da garantia, ao valor atribuído ao penhor (€85.87483) haverá que subtrair o valor da garantia prestada no PEF ...04 no valor de €112136,05 e o valor de €50.800,90, a título de créditos detidos pela sociedade sobre o executado.
Pelo que, o valor dá garantia oferecida, para efeitos de suspensão do PEF ...60, apresenta o valor líquido de €0,00 (€85.874,83 - €112,136,05 -€50.800,00).
Pelo que da garantia proposta pelo executado, considerando a existência de ónus incidentes sobre a referida quota, o valor líquido a considerar para os devidos efeitos é de €0,00, valor manifestamente insuficiente para fazer face à garantia necessária, na presente data, no PEF visado pelo pedido (€66.414,60).
D. Conclusão
Afigura-se, assim não estarem reunidas as condições necessárias para a aceitação da garantia oferecida, por falta de idoneidade.
Pelo que se propõe o indeferimento do pedido.
3 – A). A Quota foi avaliada pela Divisão Liquidação de Impostos – Património e Outros Impostos (DLIPI), nos termos do artigo 15.º do Código de Imposto de Selo, tendo-lhe atribuído o valor de € 85.874,83, com os seguintes fundamentos: (vide fls. 36/37 do PEF a págs. 32 do SITAF)
«(…)
FUNDAMENTAÇÃO DAS CORREÇÕES
Não tendo sido disponibilizado o balanço mais recente autenticado pelo contabilista certificado, recorreu-se à última IES referente ao ano de 2020, pelo que a situação patrimonial/financeira poderá não ser a mesma atualmente.
(…)
Do balanço de: 31/12/2019 (INTEGRA IES/DA)
SITUAÇÃO LÍQUIDA CORRIGIDA | VALORES CORRIGIDOS |
| 51 – Capital | 1.000,00 |
| 52 – Ações (Quotas) Próprias |  |
| 521 – Valor Nominal |  |
| 522 – Descontos e Prémios |  |
| 53 – Outros Instrumentos de Capital Próprio | 90.000,00 |
| 54 – Prémios de Emissão |  |
| 55 – Reservas | 200,00 |
| 56 – Resultados Transitados | 43.964,20 |
| 57 – Ajustamentos em Ativos Financeiros |  |
| 58 – Excedentes de Revalorização de Ativas Fixos |  |
| 59 – Outras Variações no Capital Próprio |  |
| 81 – Resultados Líquidos da Exercício | 36.585,45 |
| Total do Capital Próprio | 171.749,65 |
| ACRÉSCIMOS |  |
Aumentos da situação líquida por retificação de valores ativas e passivos
em contas de: |  |
| – Ativa Fixo Tangível |  |
| – Inventários e Ativos Biológicos |  |
| – Dívidas de Terceiros e Disponibilidades |  |
| – Acréscimos e Diferimentos. |  |
| – Provisões |  |
| – Resultados Atribuídos / Lucros Disponíveis |  |
| Subtotal | 0,00 |
| DEDUÇÕES |  |
| Diminuições da situação líquida por retificação de valores ativos e passivos em contas de: |  |
| – Ativo Fixo Tangível |  |
| – Inventários e Ativos Biológicos |  |
| – Dividas de Terceiros e Disponibilidades |  |
| – Lucros Antecipados |  |
| – Prejuízos Cobertos Anteriores à Data da Transmissão |  |
| Subtotal | 0,00 |
| SITUAÇÃO LÍQUIDA | 171.749,65 |
 |  |
| DETERMINAÇÃO DO VALOR DA PARTICIPAÇÃO TRANSMITIDA |  |
| 1. Situação Líquida Corrigida | 171.749,65 |
| 2. Capital Social | 1.000,00 |
| 3. Quotas Próprias – Valor Nominal |  |
| 4. Capital Abatido das Quotas Próprias (4 = 2 + 3) | 1.000,00 |
| 5. Valor Nominal da Quota Transmitida | 500,00 |
| 6. Valor da Participação Transmitida (6 = 5/4 x 1) | 85.874,83 |
3 – B). Em 16/06/2021, pela Diretora Adjunta da Direção de Finanças ..., foi proferido Despacho, por subdelegação de competências da Diretora de Finanças ..., concordante com a avaliação da Quota. (fls. 33 do PEF, a pág. 32 do SITAF)
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Apreciação jurídica do recurso.
Alegam os Recorrentes que a relevância dada pela sentença, à não disponibilização de um balancete geral do ano de 2020, não é suficiente para legitimar o indeferimento da garantia que se pretendia prestar.
Mais referem, que não pode proceder a alegada violação do princípio da colaboração por parte dos Recorrentes, na medida em que competia à Autoridade Tributária solicitar a junção de documentos adicionais, entendidos por necessários.
Invocam, ainda, que as considerações efetuadas sobre os imóveis detidos pela sociedade e dos lucros gerados no respetivo exercício, mostram-se irrelevantes para este efeito, sendo que o valor de mercado dos imóveis detidos pela sociedade é superior ao que se encontra registado na sua contabilidade; o valor dos financiamentos contraídos pela sociedade e pendentes à data, são inferiores ao valor dos respetivos imóveis; e que a possibilidade de os lucros poderem ser distribuídos aos sócios coloca-se não só com os lucros do exercício, mas também com os resultados transitados, que foram considerados pela Autoridade Tributária na avaliação realizada.
A sentença recorrida decidiu a questão da seguinte forma:
«No caso em dissídio, os Reclamantes invocaram a ilegalidade do despacho que não admitiu a garantia oferecida, traduzida no penhor da participação social que ambos detinham sobre uma sociedade comercial, na proporção de 50%, e assacam a esse despacho o vício de violação de lei por erro quanto aos seus pressupostos.
Os Reclamantes sustentam que na apreciação levada a cabo pela Autoridade Tributária foram indevidamente desconsiderados quer os resultados correntes do exercício de 2020, quer o valor dos imóveis detidos pela sociedade, valor que seria suficiente, segundo a sua versão, para garantir o presente processo executivo e que corresponde a € 1.201.585,20, que coincide com o Activo Fixo Tangível, conforme balancete geral do exercício de 2020 da sociedade comercial ¯"F...., Lda.”.‖, e que seguiu como documento anexo ao requerimento de constituição de garantia que formulou junto da Autoridade Tributária.
Trazendo unicamente à colação os fundamentos que a Autoridade Tributária enunciou no âmbito da avaliação da quota social, destaca-se que a quota em causa já tinha sido oferecida e aceite, enquanto tal, para garantir o crédito exequendo no âmbito de um outro processo de execução fiscal, o PEF nº ...04, pelo valor de € 112.136,05.
Por outro lado, expende como argumento adicional o facto de a sociedade referida deter créditos sobre o executado "BB" no valor de € 50.800,00.
Assim sendo, por aplicação do normativo do artigo 199º-A do Código de Procedimento e Processo Tributário, conjugado com o artigo 15º do Código de Imposto de Selo, a Autoridade Tributária avaliou a quota em € 85.874,83, conforme informação da Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Património e outros Impostos (cfr. ponto 4 do probatório).
Este valor foi obtido com base na Informação Empresarial Simplificada do ano de 2019, tendo o signatário da avaliação constante a fls. 36 e 37 do processo físico salientado que não foi disponibilizado balanço mais recente autenticado pelo contabilista certificado, o que determinou o recurso àquela informação.
Todavia, a este montante terão, ainda, de ser deduzidos os valores supra enunciados, conforme preconiza o artigo 199º, nº 4, do Código de Procedimento e Processo Tributário, por conseguinte, o valor de € 112.136,05, que se subsume à sua alínea a), por dizer respeito a “Garantias concedidas e outras obrigações extrapatrimoniais assumidas” e o valor de € 50.800,00, que respeita à alínea d) referente a “Quaisquer créditos sobre o executado‖.
Deste modo impõe-se a conclusão de que a quota oferecida como penhor não constitui uma garantia idónea a assegurar o crédito tributário em caso de ser necessário o seu acionamento na medida em que apresenta um valor líquido de €0,00, não sendo susceptível de assegurar o valor a que ascende a quantia exequenda no processo de execução fiscal em causa nos presentes autos, que corresponde a € 66.414,60.
Assim sendo, a actuação da Autoridade Tributária não merece censura na medida em que sustentou a sua decisão na dedução ao valor da quota dos valores acima referidos e da Informação Empresarial Simplificada que tinha ao seu dispor, tendo cumprido o disposto no artigo 199º-A, nº 4, do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Tal como salientado no relatório de avaliação da quota social, teve-se em conta a Informação Empresarial Simplificada do ano de 2019 porquanto não foi disponibilizado balanço mais recente autenticado pelo contabilista certificado, tendo reconhecido que a situação patrimonial/financeira poderia não ser a mesma actualmente (cfr. ponto 4 do probatório).
Contrapõem os Reclamantes, nesta sede, que no apuramento do valor da quota, oferecida como penhor, foram indevidamente desconsiderados quer os resultados correntes do exercício de 2020, quer o valor dos imóveis detidos pela sociedade, valor que seria suficiente para garantir o presente processo executivo.
Todavia, na apreciação que seja levada a cabo quanto aos fundamentos que estribaram a decisão da Autoridade Tributária apenas serão atendíveis aqueles que a entidade decisora efectivamente apresentou para indeferir a prestação de garantia e apenas estes. Por outras palavras, o tribunal deve limitar-se a sindicar a legalidade da decisão face aos pressupostos enunciados no acto, anulando-a por erro quanto aos pressupostos de facto ou quanto aos pressupostos de direito.
Neste sentido alinha o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 21/6/2018, no âmbito do Processo nº 31/18.4, pois refere: ¯ O Tribunal não pode conhecer da legalidade do ato a coberto de pressupostos que não estiveram na base da sua prática, sendo que apenas se poderão considerar como pressupostos do acto tributário aqueles que a Administração tributária (AT) fez constar da declaração fundamentadora que externou quando da prática do mesmo, não relevando outros eventuais fundamentos que não constem daquela declaração‖.
Na mesma linha de entendimento, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 7/12/2021, Processo nº 1489/21, decidiu que: “a formulação do juízo sobre a legalidade do ato, tem de quedar-se pela fundamentação contextual integrante do mesmo, estando o Tribunal impedido de valorar razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação.‖.
Destarte, a Autoridade Tributária formulou um juízo negativo acerca da idoneidade do penhor com base nos elementos que foram carreados ao procedimento pelos ora Reclamantes, tendo observado, como se lhe impunha por força da lei, a dedução de eventuais valores que se enquadrassem no elenco das alíneas previstas no artigo 199º-A, nº 4, do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Por outro lado, decorre da matéria provada que os Reclamantes não disponibilizaram o balancete geral de 2020 autenticado por contabilista certificado, o que impossibilitou a Autoridade Tributária de apoiar a sua decisão noutros elementos contabilísticos, além daquela Informação Empresarial Simplificada.
Na verdade o princípio da cooperação consagrado no artigo 48º, nº 1 e 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário estabelece que a Autoridade Tributária esclarecerá os contribuintes sobre a necessidade de apresentação de declarações, que se revelem necessárias ao exercício dos seus direitos, e faz incidir sobre o contribuinte o dever de cooperação de boa-fé na instrução do procedimento, esclarecendo de modo completo e verdadeiro os factos de que tenha conhecimento e oferecendo os meios de prova a que tenha acesso. O enunciado dever de colaboração recíproco encontra eco no artigo 59º da Lei Geral Tributária, mormente no nº 4, que reconhece que os contribuintes devem prestar os esclarecimentos que a Autoridade Tributária lhes solicitar sobre a sua situação tributária.
“In casu” os Reclamantes não cumpriram o dever de cooperação que sobre eles recaía, não se revelando suficiente a junção de um mero balancete geral, sem a competente certificação, para que a Autoridade Tributária pudesse vir a decidir em sentido diverso àquele que o fez.
Deste modo, o acto reclamado não enferma de erro na apreciação quanto aos pressupostos de direito, nem quanto aos pressupostos de facto, pelo que improcede o vício de violação de lei.
A talhe de foice importa ainda salientar que a mera aquisição de dois imóveis com o valor estimado de € 1.201.585,20, que pode não corresponder à realidade, e necessariamente tem como contrapartida a saída do correspondente numerário ou a oneração da sociedade com um empréstimo equivalente, em nada altera a situação patrimonial da sociedade e a idoneidade da garantia oferecida. E o mesmo sucede com os alegados lucros que nem sequer pertencem na totalidade aos Reclamantes, e a qualquer altura podem ser distribuídos pelos sócios.».
Apreciando.
Antes de mais citemos as normas aplicáveis à prestação e garantia, assim como a respeitante à avaliação de uma quota societária.
No que concerne à avaliação da garantia, estabelece o artigo 199.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o seguinte:
Artigo 199.º-A (Avaliação da garantia)
1 — Na avaliação da garantia, com exceção de garantia bancária, caução e seguro-caução, deve atender -se ao valor dos bens ou do património apurado nos termos dos artigos 13.º a 17.º do Código do Imposto do Selo.
2 — Sendo o garante uma sociedade, o valor do seu património corresponde ao valor da totalidade dos títulos representativos do seu capital social determinado nos termos do artigo 15.º do Código do Imposto do Selo.
3 — Sendo o garante uma pessoa singular, deve atender -se ao património desonerado e aos rendimentos suscetíveis de gerar meios para cumprir a obrigação.
4 — O valor determinado nos termos dos números anteriores deve ser deduzido dos seguintes montantes, quando aplicável e sempre que afete a capacidade da garantia:
a) Garantias concedidas e outras obrigações extrapatrimoniais assumidas;
b) Passivos contingentes;
c) Partes de capital do executado, detidas, direta ou indiretamente, na respetiva proporção;
d) Quaisquer créditos sobre o executado.
(Artigo aditado pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, com entrada em vigor em 1 de setembro de 2019)
Por sua vez, o Código de Imposto de Selo determina no artigo 15.º, o seguinte:
Artigo 15.º (Valor tributável de participações sociais, títulos de créditos e valores monetários)
1 - O valor das quotas ou partes em sociedades que não sejam por ações e o dos estabelecimentos comerciais, industriais ou agrícolas com contabilidade organizada determina-se pelo último balanço, ou pelo valor atribuído em partilha ou liquidação dessas sociedades, salvo se, não continuando as sociedades com o herdeiro, legatário ou donatário do sócio falecido ou doador, o valor das quotas ou partes tiver sido fixado no contrato social.
2 - Se o último balanço referido no número anterior precisar de ser corrigido, o valor do estabelecimento ou das quotas e partes sociais determinar-se-á pelo balanço resultante das correções feitas
Alegam os Recorrentes que a relevância dada pela sentença, à não disponibilização de um balancete geral do ano de 2020, não é suficiente para legitimar o indeferimento da garantia que se pretendia prestar.
Mais alegam, que não pode proceder a alegada violação do princípio da colaboração por parte dos Recorrentes, na medida em que competia à Autoridade Tributária solicitar a junção de documentos adicionais, entendidos por necessários.
A jurisprudência tirada sobre esta matéria indica que, não obstante ser ónus do Executado apresentar os elementos de prova necessários para demonstrar a idoneidade da garantia a prestar, a Autoridade Tributária não fica isenta de cumprir o dever de cooperação, como seja solicitar documentos ou esclarecimentos adicionais necessários para a tomada da decisão.
No caso concreto, os Reclamantes juntaram o Balancete Geral, mas ao que parece, a Autoridade Tributária carecia que o mesmo fosse autenticado por contabilista e reportar-se ao ano de 2020 – vide ponto 3-A, aditado à matéria de facto. Ora, tendo a parte junto o documento necessário para o efeito (ou seja, para a avaliação da quota) e a Autoridade Tributária dizer que não pode fazer uma melhor apreciação só porque esse mesmo documento não está autenticado por contabilista, é algo que viola o seu dever de colaboração para com os contribuintes.
Para além disso, se a Autoridade Tributária concluísse que o Balancete Geral não era suficiente ou estava desatualizado, então deveria solicitar mais elementos contabilísticos ou o Balancete atualizado.
Aliás, a Autoridade Tributária diz que se socorreu do IES (Informação Empresarial Simplificada), por sua iniciativa, pelo que não pode ao mesmo tempo dizer que era sobre o contribuinte que impendia todo o ónus de instruir o pedido com todos os elementos necessário, como o Balancete autenticado por contabilista.
Assim, tendo os interessados junto o Balancete Geral, que é o documento considerado necessário, nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Código de Imposto de Selo, para avaliar a Quota social, a Autoridade Tributária, se entendesse ser necessário que tal documento tinha de estar autenticado por contabilista, deveria tê- -lo solicitado, bem assim como pedir o Balanço atualizado.
Tem sido este o entendimento da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, assim como do Tribunal Central Administrativo Norte, conforme se pode ver, por exemplo, pelo Acórdão deste TCA Norte de 13/01/2022, proferido o processo n.º 00440/21.1BEVIS (em www.dgsi.pt), cujo sumário segue:
I. O art. 170º nº 3 do CPPT exige que com requerimento seja apresentada a prova que suporta o pedido de dispensa da prestação de garantia, pelo que, no caso de completa omissão de prova, a administração não está obrigada a chamar o requerente para a apresentar, seguindo-se o imediato indeferimento do pedido.
II. Já no caso de a parte ter cumprido, no momento próprio, o ónus de instrução, juntando os meios de prova que entendeu suficientes, sendo que parte substancial se consubstanciar em documentos que estejam na posse da administração tributária devidamente identificados, a administração deve, sob pena de violar o dever de colaboração e cooperação, no caso de entender que a sua actualidade os coloca em causa (decorrido um ano), convidar o requerente a juntar prova adicional ou complementar, isto é, convidá-lo a carrear para o procedimento os elementos de prova que considera ultrapassados pelo tempo ou em falta para o fim em vista.
A dado passo refere o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte:
«2. Do erro de julgamento de direito
(…)
O cerne da discórdia, cuja apreciação cumpre privilegiar, situa-se, pois, não na questão do ónus probatório, mas na questão da instrução do procedimento, mais concretamente na amplitude dos deveres de inquisição e de colaboração e cooperação entre a administração tributária e a executada/reclamante.
Vejamos.
Neste sentido já se pronunciou o STA no acórdão de 19.12.2012, proferido no âmbito do processo nº 1298/12, segundo o qual: «No que aos pressupostos da dispensa de prestação de garantia respeita, entendemos que a lei é clara na exigência que formula de que o pedido de dispensa, a dirigir ao órgão de execução fiscal, seja instruído com a prova documental necessária (cfr. o nº 3 do artigo 170º do CPPT), norma esta que, não devendo ser interpretada, sob pena de inconstitucionalidade, como uma restrição probatória (…), obriga a que, salvo casos excepcionais e devidamente justificados, os documentos indicados pelos requerentes para prova dos factos constitutivos do direito à dispensa da prestação de garantia sejam desde logo juntos ao requerimento em que é solicitada a dispensa.».
Convoquemos a este respeito o dissidindo no acórdãos deste TCAN de 15.10.2015, proferido no processo 879/15.1BEPRT, “Estamos pois, perante um “princípio de preclusão procedimental” dirigido ao executado que almeja obter a dispensa de prestação de garantia para alcançar suspensão da execução fiscal, na exacta medida em que define o momento procedimental em que o interessado deve alegar os factos que sustentam a sua pretensão e apresentar os respectivos meios de prova, colaborando, assim, com a administração fiscal no sentido de evidenciar que preenche os pressupostos que a lei faz depender a aplicação desse regime, sob pena de não resultando demonstrados o interessado perder a oportunidade de obter aquele benefício.
Ressalta deste princípio que o legislador fiscal visou conciliar quer interesses de eficiência, quer de celeridade, quer economia procedimental, prevenindo o eventual prolongar e/ou retardar de um procedimento que tem a sua génese na vontade e iniciativa do executado e que assume carácter célere e urgente, uma vez que ao requerimento se lhe segue, de imediato, a decisão, não prevendo a lei, sequer, actividade instrutória a desenvolver pelo órgão decisor, que decidirá de seguida, ponderando as razões de facto e de direito invocadas no requerimento e a prova que nele tiver sido oferecida, como se de um deferimento ou indeferimento liminar se tratasse.
Se atentarmos no curtíssimo prazo concedido ao órgão administrativo para a decisão do pedido (lembre-se, dez dias), conjugado com a obrigatoriedade de o executado apresentar simultaneamente o requerimento onde formula a pretensão, e a prova da factualidade ali alegada como sustentáculo do seu pedido, ressalta manifesta a natureza urgente deste procedimento, onde o factor tempo constitui um elemento determinante na finalidade pública que se visa prosseguir, ou seja, de obviar à ocultação ou dissipação de património susceptível de garantir a cobrabilidade da quantia exequenda e do acrescido, bem como, traduz uma opção legislativa clara no sentido de valorar negativamente a total inércia probatória do interessado e que, salvo sempre o devido respeito por opinião contrária, não comporta um ónus desproporcionado sobre o requerente, atenta a especifica natureza do procedimento m apreço e os fins que por ele são prosseguidos.
Assim, o indeferimento imediato do pedido de dispensa de prestação ou reforço de garantia por total ausência de requerimento probatório representa um sibi imputet que não se nos afigura excessivo, porquanto o requerente, por um lado não pode deixar de estar ciente, perante a claríssima letra da lei, do seu dever de iniciativa e de instrução, e, por outro, na medida em que é ele quem está em melhores condições( ou melhor, em situação privilegiada) para apresentar os meios de prova da factualidade por si alegada e em que alicerça a sua pretensão, a que acresce o dever de colaboração que Lei Geral Tributária estabelece nos seu art. 59º e que exige ao contribuinte, num manifesto sistema de “vasos comunicantes”, que este coopere activamente com a administração tributária, no sentido da descoberta da verdade, dever este que não pode deixar de ser lido em conjugação com a “regra mater” relativa ao ónus da prova, ou seja, impende sobre o interessado o ónus de invocar e demonstrar que se encontram reunidos os pressupostos para ser dispensado da prestação ou reforço de garantia, cabendo-lhe, assim, o dever de apresentar os meios de prova que permitam dar por verificados tais requisitos, sob pena de a sua inércia probatória e de o non liquet que daí resulta ter de ser resolvido contra si.
Contudo, todo o vertido supra não redunda na conclusão simplista de que a administração tributária não deva, ao abrigo do princípio do inquisitório e do dever de colaboração e de cooperação recíprocas com o contribuinte, solicitar quer os esclarecimentos que entenda essenciais à sua decisão, quer elementos de prova adicionais ou complementares.” (fim de transcrição)
Neste sentido, ressalte-se o teor da jurisprudência firmada pelo Supremo tribunal Administrativo promanado no processo nº. 718/14, datado de 03.09.2014, a qual sufragamos e esclarecedora desta temática: “O que não significa que a administração tributária não deva, ao abrigo do princípio do inquisitório e do dever de colaboração e de cooperação recíprocas com o contribuinte, solicitar-lhe esclarecimento de dúvidas e solicitar-lhe elementos de prova adicionais ou complementares. Todavia, tal dever deve ser interpretado em termos hábeis, pois a investigação oficiosa pressupõe, no mínimo, que tenham sido alegados factos e oferecidos meios de prova que não ditem o indeferimento liminar e imediato do pedido. Se o requerente omite completamente a apresentação de meios de prova no momento legalmente assinalado, não pode considerar-se que o órgão decisor se encontra obrigado a ir investigar os factos alegados ou a dirigir convite ao requerente para apresentar a prova que ele completamente omitiu.
(…) A observância dos princípios do inquisitório e da cooperação não implicam, pois, para a administração, o dever de se substituir ao contribuinte na articulação dos factos e na apresentação da prova que, nos termos da lei, a este compete invocar e apresentar num procedimento célere da sua estrita iniciativa; todavia, tal não significa que a administração não deva, à luz desses princípios, empenhar-se em criar condições para poder vir a proferir uma decisão de mérito, convidando o requerente a aperfeiçoar as deficiências formais do requerimento, isto é, as suas imprecisões e inexactidões, de lhe solicitar o esclarecimento de dúvidas, de lhe pedir meios de prova complementares caso considere que o requerimento se encontra deficientemente instruído e que necessita de prova adicional para a comprovação de factos essenciais, bem como de colher oficiosamente dados e informações susceptíveis de confirmar ou infirmar os factos alegados e os elementos documentais apresentados pelo requerente. Mas, como se disse, o exercício destes poderes de investigação pressupõe que a parte cumpriu minimamente o ónus que sobre ela prioritariamente recai de indicar tempestivamente as provas de que pretende socorrer-se, não podendo esses princípios configurar-se como uma forma de suprimento oficioso de comportamentos negligentes da parte.
(…) Para além disso, o dever de apresentação dos meios de prova juntamente com o requerimento inicial também claudicará no caso de a prova que o requerente pretende utilizar se consubstanciar em documentos que estejam na posse da administração tributária, bastando então, para que deles se possa prevalecer, que o requerente os identifique no seu requerimento (art. 74º, nº 2, da LGT), ou se, por razões fundamentadas, for impossível juntar a prova dentro do prazo de apresentação daquele requerimento.
Sufraga-se, assim, mais uma vez, o entendimento expresso no acórdão desta Secção no aludido processo nº 1298/12 (em que a presente Relatora interveio como Adjunta), no sentido de que a lei é clara na exigência que formula de que o pedido de dispensa de prestação de garantia seja instruído com a prova documental necessária, norma que obriga a que, salvo casos excepcionais e devidamente justificados, os documentos indicados pelo requerente para prova dos factos constitutivos do direito que invoca sejam juntos logo com o requerimento em que solicita essa dispensa. Mas mais se acrescenta que a completa omissão de requerimento probatório pelo requerente não implica para a administração o dever de suprimento oficioso da lacuna, conduzindo, antes, ao indeferimento imediato do pedido. Já no caso de a parte ter cumprido, no momento próprio, o ónus de instrução, juntando os meios de prova que entendeu suficientes, a administração deve, no caso de entender o contrário, isto é, de entender que faltam documentos que na sua perspectiva são essenciais, convidar o requerente a juntar prova adicional ou complementar, isto é, a carrear para o procedimento os elementos de prova que considera em falta para o fim em vista.
Entende-se ser esta a solução mais defensável do ponto de vista do regime jurídico do procedimento tributário, tendo em conta que cabe plenamente nos poderes/deveres da administração este tipo de diligência, de colher oficiosamente ou junto do contribuinte interessado (através de convite para a sua junção) a documentação adicional considerada essencial para a prova de um facto fundamental do núcleo complexo que integra a alegada causa de pedir da requerida dispensa de prestação de garantia. É precisamente nestes casos que os deveres que impendem simultaneamente sobre o contribuinte (ónus da prova dos factos constitutivos do direito a que se arroga) e a administração tributária (deveres inquisitórios, de colaboração e, em última análise, de cooperação procedimental) têm de ser adequadamente conjugados, nomeadamente nos termos previstos no art. 48º, nº 1, do CPPT, segundo o qual «A administração tributária esclarecerá os contribuintes e outros obrigados tributários sobre a necessidade de apresentação de declarações, reclamações e petições e a prática de quaisquer outros actos necessários ao exercício dos seus direitos, incluindo a correção dos erros ou omissões manifestas que se observem».
Tal é o também entendimento que se nos afigura mais adequado à observância dos princípios da eficiência e economia procedimental, do inquisitório e da colaboração que deve mediar as relações entre os sujeitos do procedimento, bem como da justiça material, sendo que a urgência do procedimento não é incompatível com o convite para o requerente juntar, num prazo razoavelmente curto fixado pelo órgão administrativo decisor, os meios de prova julgados necessários face à factualidade alegada. Se até no processo judicial o juiz está legalmente obrigado a promover oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção, colaborando activamente com as partes e convidando-as a carrear para o processo todos os documentos que considere essenciais [cfr. arts. 6º, 7º, e 590º, nºs 2 e 3) do actual CPC, e 114º do CPPT], por maioria de razão isso deve acontecer no procedimento tributário, sujeito a regras de simplicidade, celeridade e economia procedimental, traduzidas na prevalência de actuações desburocratizadas e nas quais prevalece o dever de investigação e de imparcialidade para o órgão decisor, que o obrigam a carrear (ou convidar a carrear) para o procedimento todos os elementos probatórios que se lhe afigurem necessários e úteis à descoberta da verdade material, mesmo que do ponto de vista estrito dos interesses patrimoniais da administração tributária isso lhe seja desfavorável.” (fim de transcrição)
É neste enquadramento legal e doutrinal que importa olhar para o caso em apreço.
Como se viu, a sociedade executada requereu o pedido de dispensa de prestação de garantia para obter a suspensão da execução fiscal, com o argumento de falta de meios económicos avocando os fundamentos por si aduzidos no requerimento de dispensa de garantia apresentado em 04.03.2020, nos autos do PEF n.º ...51 e aps., cujo respectivo teor, e documentos dá por integralmente reproduzidos no seu requerimento, acrescido de novos fundamentos aduzidos nos artigos 5 a 12º do seu requerimento.
Naquele outro requerimento de março de 2020, alegava que não dispunha de meios económicos suficientes para prestar garantia adequada, porquanto: - não é proprietária de quaisquer bens imóveis ou veículos automóveis; - as poucas receitas que obtém visam solver as despesas bancárias necessárias ao funcionamento do estabelecimento comercial; - dado os escassos recursos que aufere, para prosseguir a sua actividade recorreu a diversos financiamentos bancários, que se cifram em montante superior a € 100.000,00; - devido ao incumprimento do pagamento de um empréstimo foi executada judicialmente por uma entidade bancária, tendo celebrado um acordo de pagamento em prestações; - para além disso encontra-se a pagar em prestações importâncias, para cuja cobrança coerciva foram instaurados processos de execução fiscal; - sendo que entende que qualquer penhora fara ruir o já frágil equilíbrio económico financeiro da Executada; - os instrumentos musicais que dispõem visam a venda, donde, a penhora dos mesmos impossibilitaria a sua alienação; - por sua vez, o valor dos materiais que não se destinam à venda é reduzido.
Quanto a estes, o órgão da execução fiscal, apesar de não ter posto em causa que tais fundamentos foram avocados naquele outro PEF, o qual cumpre referir foi objecto de deferimento o pedido de dispensa de prestação de garantia, argumenta que não foram careados documentos actualizados que comprovem que continua efectivamente a suportar as ditas despesas com os financiamentos, ou sejam, considerando que aqueles documentos probatórios juntos em 2020 naquele outro PEF, não comprovam os mesmos no pedido agora formulado em 2021.
O seu pedido viria a ser indeferido, referindo o órgão decisor em síntese que “dúvidas não subsistem que a Executada não cumpriu o ónus que sobre si impende de provar que se encontram reunidos os pressupostos necessários ao deferimento do pedido de dispensa/isenção de garantia, porquanto, tal como resulta do supra exposto, a Executada:
- Não submeteu a declaração anual de informação contabilística e fiscal (IES) de 2019;
- Não enviou elementos contabilísticos (designadamente, balancete, mapa de amortizações/depreciações do ativo, demonstração de resultados, balanço) que evidenciem a manifesta falta de meios económicos para prestar garantia, nem o efetivo impacto da crise pandémica nos resultados da empresa;
- Não juntou comprovativos das despesas efetivamente suportadas, atualmente, com os financiamentos bancários e com os acordos de regularização de divida.
42. Donde, não tendo, a Requerente demonstrado a manifesta insuficiência de bens para garantir a divida exequenda, tal como lhe incumbia nos termos do plasmado no n.º 1 do artigo 74.º da LGT e no artigo 342.º do Código Civil (CC) e 170.º n.º 3 do CPPT, entendemos que não se encontram preenchidos os pressupostos necessários para a concessão da dispensa da garantia, previstos nos artigos 52.º n.º 4 da LGT e 170.º do CPPT.”
Ora, aplicando a doutrina acima enunciada, é manifesto que não se pode dizer que a requerente tenha omitido por completo a indicação de elementos de prova com o pedido de dispensa de garantia – pese embora eles não contemplem todos os factos alegados, quer por falta, quer por remissão, quer por insuficiência, certo é que a mesma foi considerada prova insuficiente e desactualizada para o fim em vista – cabia ao órgão decisor, nos seus deveres inquisitórios e de colaboração com a requerente, convidá-la a completar a prova apresentada, pela junção de documentação adicional actual para prova dos factos considerado essenciais para a requerida dispensa (manifesta insuficiência de bens), tendo em conta que tal pode ser rapidamente comprovado através de elementos extraídos quer da contabilidade da sociedade, quer através de elementos que comprovem os financiamentos e regularizações de dívidas em curso, enfim, uma prova que demonstre a sua situação contextualizada temporalmente no presente, à semelhança do que logrou efectuar em 2020 aquando do seu requerimento apresentado em 04.03.2020.
Aliás diga-se, que conforme indica o órgão decisor a situação da empresa será economicamente mais favorável, razão a que acresce indagar, atenta a actividade exercida e os dissabores causados pela situação pandémica vivenciada, permitir ao requerente o probatório do por si argumentado e remetido para anterior requerimento de modo simplista, mas por certo convicto da sua suficiência.
Deve, por isso, concluir-se que o órgão administrativo decisor tinha o dever de convidar a sociedade requerente a apresentar meios adicionais/complementares de prova para demonstração cabal da factualidade alegada, pelo menos exigir actualização dos elementos que o sujeito passivo em consciência considerava suficiente, e que não o tendo feito violou o dever de colaboração e de cooperação recíprocas com o contribuinte.».
Nosso caso concreto, resulta que, foi junto com o pedido de prestação de garantia de penhor de Quota social, o Balancete Geral, elemento considerado suficiente pelos Requerentes para o efeito de avaliação da Quota (aliás, tal como decorre do disposto nos artigos 199.º-A do CPPT e 15.º, n.º 1 do CIS).
A Autoridade Tributária considerou tal elemento poderia estar desatualizado e que não fora junto Balanço mais recente autenticado por contabilista, mas nada solicitou aos Requerentes.
Acolhendo a citada jurisprudência e aplicando-a ao caso concreto, resulta que a Autoridade Tributária, em cumprimento do princípio da cooperação e colaboração, deveria ter solicitado a autenticação do Balanço atualizado e eventuais outros documentos contabilísticos que entendesse necessários para avaliar a Quota dada em penhor. Ou seja, os Requerentes juntaram de imediato prova documental, pelo que não incumpriram o dever de juntar a prova necessária para o efeito pretendido. Se a Autoridade Tributária entendia que o Balancete Geral devia estar atualizado e autenticado, deveria tê-lo solicitado, assim como mais algum elemento da contabilidade, que fosse considerado relevante.
Assim, relativamente a este assunto, a razão está do lado dos Recorrentes.
*
Alega, ainda, os recorrentes que as considerações efetuadas na sentença sobre os imóveis detidos pela sociedade e dos lucros gerados no respetivo exercício, mostram-se irrelevantes para este efeito, sendo que o valor de mercado dos imóveis detidos pela sociedade é superior ao que se encontra registado na sua contabilidade; que o valor dos financiamentos contraídos pela sociedade e pendentes à data, são inferiores ao valor dos respetivos imóveis.
Mais alegam que a possibilidade de os lucros poderem ser distribuídos aos sócios coloca-se não só com os lucros do exercício, mas também com os resultados transitados, que foram considerados pela Autoridade Tributária na avaliação realizada.
Começando por este último aspeto, compete chamar à colação a anotação efetuada pelo Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, no Código de Procedimento e de Processo Tributário – anotado e comentado, volume III, 6.ª edição, 2011, Áreas Editora, a pág. 623, onde refere o seguinte: «5 – Penhora das quotas em sociedades (…)
A penhora das quotas em sociedades abrange os direitos patrimoniais e ela inerentes, com ressalva do direito a lucros já atribuídos por deliberação dos sócios à data da penhora e sem prejuízo da penhora deste crédito, continuando o direito de voto a ser exercido pelo titular da quota penhorada (art. 239.º, n.º 1, do CSC).».
Relativamente a este aspeto competia aos Recorrentes demostrarem que não existia deliberação a atribuir os lucros (juntando as atas da sociedade, por exemplo), pelo que tudo o que os mesmos alegam ou o que possa ser dito sobre o assunto, não passarão de meras conjeturas.
Desta forma, a alegação em apreço não pode ser atendida.
No que concerne à invocação de que o valor de mercado dos imóveis detidos pela sociedade é superior ao que se encontra registado na sua contabilidade e que o valor dos financiamentos contraídos pela sociedade e pendentes à data, são inferiores ao valor dos respetivos imóveis, compete referir que têm os Recorrente, em parte, razão.
O n.º 1 do artigo 15.º do Código do Imposto de Selo determina que a avaliação se faz pelo último Balanço, sendo que do Balanço constam imóveis, com determinados valores, os quais conjuntamente perfazem mais de um milhão de euros.
Cremos não restarem dúvidas que os imóveis entram como elemento na avaliação de uma Quota de uma sociedade comercial, conforme resulta do disposto no n.º 1 do artigo 1021.º do Código Civil, bem como tem sido entendimento doutrinal e jurisprudencial, conforme se pode ver, pelo que consta no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02/12/2015, proferido no processo n.º 01458/15; nos Acórdãos da Relação do Porto de 25/10/2005, proferido no processo n.º 0422142 e de 02/07/2012, tirado no processo n.º 1753/05.5TBESP.P1; assim como da Relação de Guimarães de 02/06/2021, proferido no processo n.º 1836/17.9T8VRL.G1 (todos em www.dgsi.pt).
O valor do imóvel no Balanço deve corresponder ao valor da compra, deduzido das depreciações do imóvel, eventualmente acrescido de melhorias significativas, pelo que o valor do Balanço não corresponde ao valor de mercado, nem ao Valor Patrimonial Tributário (VPT).
Se o valor a levar em consideração é o do Balanço, o de mercado ou o VPT (como sugere o n.º 2 do artigo 31.º do Código de Imposto de Selo, quando refere: «2 – Os imóveis são considerados no ativo do balanço pelo valor patrimonial tributário.»), é questão que agora não compete responder, mas apenas dizer que os imóveis também concorrem para a avaliação de uma Quota da sociedade.
Ora, segundo se percebe da ficha de avaliação da Quota (acima aditada à matéria de facto, sob ponto 3-A), o imobilizado corpóreo, ou conforme agora se diz, o Ativo Fixo Tangível, encontra-se a zeros. Ou seja, na avaliação da Quota, verifica-se que foram levados em consideração Acréscimos e Deduções, sendo que se deteta, que em ambas as situações, foi considerado o «Ativo Fixo Tangível» pelo valor de 0,00 (Zero).
Daqui conclui-se que os imóveis não foram levados em consideração na avaliação da Quota societária em apreço, seja como acréscimo, seja como dedução.
Se o resultado final é igual ou diferente não se sabe, o que se sabe é que não foi tido em consideração um ativo da sociedade que concorre para a avaliação da Quota (sem prejuízo de poderem também concorrerem ónus ou encargos existentes sobre os imóveis; portanto podendo deduzir ao respetivo valor).
Assim, por desconsideração de um elemento relevante na avaliação da Quota da sociedade, o Despacho recorrido não pode manter-se na ordem jurídica.
Do exposto resulta que o despacho recorrido enferma de erro nos pressupostos de facto e de direito, pelo que deve ser anulado.
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No concerne às custas deste recurso, atenta a procedência do recurso, a revogação da sentença e ao facto de a Recorrida não ter contra-alegado, ficam as custas a cargo desta, sem prejuízo de não ser devida taxa de justiça nesta instância de recurso, por não ter contra-alegado – vide artigos 527.º, nos. 1 e 2 e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil e Acórdão deste TCA Norte de 30/09/2021, processo n.º 00378/06.2BECBR, disponível em www.dgsi.pt.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
I - Tendo os interessados na prestação de garantia junto o documento considerado necessário para avaliar a Quota social, caso a Autoridade Tributária entendesse ser necessário que tal documento tinha de estar autenticado por contabilista, deveria tê- -lo solicitado, bem assim como solicitar documentos atualizados.
II - Os imóveis entram como elemento na avaliação de uma Quota de uma sociedade comercial.
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Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e anular o Despacho impugnado.
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Custas a cargo da Recorrida, não sendo devida taxa de justiça nesta instância de recurso, por não ter contra-alegado.
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Porto, 2 de fevereiro de 2023.
Paulo Moura
Irene Isabel das Neves – em substituição
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