Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01866/14.2BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/13/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA – TRABALHO IGUAL, SALÁRIO IGUAL – LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO PORTUGUÊS
Sumário:I- São elementos constitutivos do enriquecimento sem causa [artigo 473º do Código Civil] o (i) enriquecimento, o (ii) empobrecimento, o (iii) nexo causal entre um e outro e a (iv) falta de causa justificativa da declaração patrimonial verificada.

II- Existindo decisões materialmente administrativas formalizadas por escrito - aferidas nos termos que derivam dos artigos 120º e 122º do C.P.A - que legitimam a prestação das funções diversas das que integram o conteúdo funcional do Recorrente, resulta inviável a verificação do último requisito relativa à natureza subsidiária do enriquecimento sem causa.

III- Se, numa mesma organização, dois trabalhadores desempenham tarefas qualitativamente coincidentes e em idêntica quantidade, deve ser-lhes atribuída, por força do princípio constitucional a trabalho igual, salário igual, idêntica remuneração.

O Estado Português carece de legitimidade processual para intervir enquanto Réu no âmbito de litígios relativos a atos ou omissões praticados pelos respetivos órgãos dos seus ministérios dos quais derivem a formulação de pedidos indemnizatórios.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Recorrente:MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA e L.
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, L., e ESTADO PORTUGUES
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão: Negar provimento ao recurso principal, Conceder parcial provimento ao recurso subordinado.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I – RELATÓRIO
MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, com os sinais dos autos, vem interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto promanada no âmbito da Ação Administrativa Comum intentada por L. contra si e contra o ESTADO PORTUGUÊS e a PSP - POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA, todos também com os sinais dos autos, que julgou a presente ação parcialmente procedente, e consequentemente, condenou o Réu Ministério da Administração Interna (i) “(…) a reconhecer que, desde 09 de abril de 2012 até ao presente, a Autora tem desempenhado funções de Adjunto do Comandante da 2ª Divisão Policial do Comando Metropolitano do (...) (COMETPOR) (…)”; (ii) “(…) a reconhecer que as funções de Adjunto do Comandante da 2ª Divisão Policial do Comando Metropolitano do (...) (COMETPOR) integram-se no conteúdo funcional da categoria de Subintendente e são, por isso, da competência de Oficiais com a categoria de Subintendente (…)” e (iii) “(…) a pagar à Autora os diferenciais de remuneração e de Suplementos das Forças de Segurança, tendo subjacente a remuneração que lhe atribuiu a título de retribuição enquanto Comissário, e a que é legalmente devida pelo exercício de funções de Adjunto do Comandante, que apenas pode ser prosseguido por oficial com a categoria de Subintendente, desde 09 de abril de 2012, até à data em que proceder ao efetivo e integral pagamento, assim como os acréscimos proporcionais que sejam devidos em sede de subsídio de férias e de Natal [exceto quanto aos relativos ao ano de 2012, atenta a sua decretada suspensão, pelo disposto no artigo 21.° da Lei n.° 64- B/2011, de 30 de dezembro], quantias a que acrescem juros de mora, à taxa legal (…)”, mais absolvendo o Estado Português dos pedidos contra si formulados.
Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
1- O Réu MAI não impôs à Autora o desempenho das funções de Adjunto do Comando da 2ª Divisão Policial do Comando do (...), apenas a tendo nomeado verbalmente para tais funções e sem a sua oposição;
2- O Réu MAI nunca reconheceu, nem sequer implicitamente, no procedimento administrativo e na sua contestação, nem reconhece, que as funções prosseguidas pela Autora possam traduzir a ideia de que tais funções apenas podem ser prosseguidas por pessoal da categoria de subintendente ou graduado nesta categoria superior, em exclusividade.
3 - A posição do Réu MAI a este propósito, que resulta, aliás, da decisão administrativa e da letra e do espírito da sua contestação é somente que as funções de Adjunto da Divisão Policial do COMETPOR que a Autora desempenha se inscrevem no conteúdo funcional da categoria de subintendente, nos termos do Anexo I ao Estatuto do Pessoal Policial da PSP, aprovado pelo DL n.° 299/2009, de 14 de outubro (EPPSP), e nada mais do que isso, não cabendo aqui, de modo algum, o reconhecimento da exclusividade do exercício de tais funções por oficiais da categoria de subintendente.
4 - Foi isto e só isto que foi reconhecido e aceite pelo Réu, o que, diferentemente do decidido, não significa que tais funções apenas possam ser prosseguidas por elementos policiais com a categoria de subintendente.
5 - Com efeito, quer na decisão administrativa que assumiu, quer na sua contestação, é por demais evidente que o Réu nunca aceitou nem reconheceu que as funções exercidas pela Autora são exclusivas da categoria de subintendente, nem que o cargo de Adjunto do Comandante do COMETPOR, apenas pode ser desempenhado por oficial de polícia com a categoria de Subintendente, como decorre da douta sentença recorrida.
6 - As funções da Adjunto do Comandante do COMETPOR, exercidas pela Autora, inscrevem-se, na verdade, no conteúdo funcional da categoria de Subintendente, nos termos do Anexo I ao Estatuto do Pessoal Policial da PSP, aprovado pelo DL n.° 299/2009, de 14 de outubro (EPPSP).
7 - Contudo, a Autora não estava impedida de desempenhar funções de conteúdo funcional diferenciado da categoria de que era titular (Comissário), podendo exercer as funções da categoria superior de Subintendente naqueles termos, ou seja com a categoria de Comissário, dadas as circunstâncias excecionais do momento e que se mantêm atuais como é o caso, respeitando a legislação aplicável.
8 - As funções de coadjuvação do comando das subunidades, no caso, da 2ª Divisão Policial do Comando Metropolitano do (...), inerente às funções de adjunto, nos termos do n.° 1 do artigo 39.° da Lei n.° 53/2007 (de conteúdo funcional da categoria de subintendente) e a coadjuvação do comando de uma qualquer divisão de comando distrital (de conteúdo funcional da categoria de comissário), não se diferenciam substancialmente no que respeita ao elenco de competências, ou seja, são substancialmente afins.
9 - O exercício de funções por pessoal policial de categoria superior diferente, em situações de exceção não merece censura, não havendo a obrigatoriedade legal, imperativa, de recurso à figura da graduação (ou do recrutamento excecional), para que a Autora as possa exercer, na categoria de Comissário, ao contrário do que resulta da douta sentença recorrida.
10 - No caso dos autos, existe ainda uma exceção à regra geral do n.° 1 do artigo 42.° do DL 299/2009, decorrente das restrições orçamentais vividas no pais desde 2011 e a que a douta sentença recorrida não atendeu, por em seu entender, a interpretação do Réu não se configurar conforme à Constituição.
11 - Na situação de grave crise orçamental onde o país se encontra, desde 2011, inclusive com cortes salariais e de pensões, da generalidade da população portuguesa, não poderia o Réu deixar de cumprir a proibição de atos que consubstanciassem valorizações remuneratórias dos elementos policiais, nomeadamente da Autora, alterando o seu posicionamento remuneratório através da sua graduação na categoria de Subintendente ou remunerando-a por esta categoria sem a graduar.
12 - Entendeu o Réu e bem, que as normas dos n.° s 1 e 2, al, a) do artigo 24.° da Lei n.° 55-A/2010, configuram uma verdadeira exceção à regra do n.° 1 do artigo 42.° do DL n.° 299/2009, por via remuneratória, normas que foram mantidas nas leis do Orçamento do Estado para 2012, 2013, 2014 e 2015 (art.° 20.° n.° 1 da Lei n.° 64- B/2011, de 30 de dezembro, art.° 35.° da Lei n.° 66-B/2012, de 31 de dezembro e art.° 39.° da Lei n.° 83-C/2013, de 31 de dezembro e art.° 38.° da Lei n.° 82-B/2014, de 31 de dezembro).
13 - Na falta de provimento na categoria de subintendente, por razões de exceção previstas nas Leis do Orçamento, o exercício de funções pela Autora como adjunto do comando da 2.a Divisão Policial do Comando do (...) corresponde à situação de preenchimento temporário do cargo por falta do respetivo titular, que a doutrina qualifica como “causas de sapiência" e, que, por ausência de base legal, não confere o direito à remuneração da categoria superior.
14 - Enquanto se mantiver a situação de gravíssima crise orçamental, tem de interpretar-se o conjunto das normas dos n.° s 1 e 3 do art.° 42.° do DL n.° 299/2009 conjugadamente com as normas das sucessivas Leis do Orçamento que proíbem a prática de atos que consubstanciem valorizações remuneratórias, quando, como no caso dos autos, haja fundamento legal para que estas valorizações não ocorram.
15 - A Autora, não foi provida, nem nomeada legalmente (nem houve aceitação de nomeação) no cargo de Subintendente, pelo que não se verificaram os requisitos legais que permitissem remunerá-la pela categoria de subintendente pelo exercício de funções de Adjunto do Comando da 2ª Divisão Policial do Comando do (...).
16 - Os fundamentos que presidiram à não graduação da Autora, na categoria de Subintendente, configuram-se como exceção à regra geral do n.° 1 do artigo 42.° da do DL n.° 299/2009, por via da imposição das Leis do Orçamento, num quadro bem caracterizado de exceção por efeito das restrições decorrentes da gravíssima crise orçamental do país, desde 2011, e que ainda se mantêm.
17 - Daí que o exercício de funções pela Autora (em regra, de conteúdo funcional da categoria de subintendente, mas não exclusivas), na categoria de Comissário e a remuneração por esta categoria, são, também eles, fruto da situação de exceção devido à gravíssima crise orçamental do país.
18 - A interpretação prosseguida pelos Réus está conforme à Constituição, ao contrário da decisão jurisdicional que se configura, ela sim, em desconformidade com os normativos dos artigos 13.° e 59.°, n.° 1, al. a) da CRP em conjugação com o princípio da proporcionalidade.
19 - Com efeito, o princípio “para trabalho igual salário igual", inscrito no artigo 59.°, n.° 1, al. a) da CRP é conjugado pela doutrina e pela jurisprudência, com o princípio da igualdade do artigo 13.° da Constituição e, por isso, existe nesta confluência, essencialmente, a proibição de diferenciações injustificadas, que, no caso dos autos, não se verificam.
20 - A douta sentença recorrida extrapolou do caso da Autora para situações abstratas, hipoteticamente existentes, faltando-lhe o segundo elemento factual, material, de comparação, para que se pudesse decidir pela desigualdade de tratamento, como erradamente, a nosso ver, se decidiu.
21 - Quanto ao princípio da proporcionalidade, tem-se como adequado, necessário e na justa medida, remunerar a Autora pela categoria de Comissário, atentas as funções de coadjuvação do Comandante, afins em ambas as categorias, de Comissário e Subintendente, e considerando, além do mais, que as diferenças salariais não são significativas e muito longe de traduzirem a negação de garantias de uma existência condigna, como previsto na parte final da al. a) do n.° 1 do artigo 59.° da CRP.
22 - Não há qualquer enriquecimento dos Réus, nem consequente empobrecimento da Autora, pelo exercício funções de conteúdo funcional da categoria diferente da sua, considerando a legalidade da situação e a situação de exceção que o país vive.
23 - O Réu pagou e a Autora recebeu todos os vencimentos, suplementos e subsídios, legalmente devidos em conformidade com a sua categoria de Comissário, visto que, da conjugação das normas dos n.° s 1 e 3 do artigo 42.° do DL n.° 299/2009 e do n.° s 1 e 2, al. a) do artigo 24.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro e disposições correspondentes das leis do OE para 2012, 2013, 2014 e 2015, se deve concluir pela legalidade do exercício daquelas funções pela Autora na categoria de Comissário e, consequentemente, pelo pagamento das remunerações correspondentes a esta categoria, como foi feito.
24 - Ainda que, por mera hipótese, se considerasse haver enriquecimento do Réu à custa da Autora, sempre teria de considerar-se que existe causa justificativa que se traduz no facto de as leis do Orçamento do Estado para os anos de 2011 e segts., proibirem a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias.
25 - A Autora tinha e tem ao seu alcance, a impugnação dos atos de processamento e pagamento efetuados mensalmente (art.° 66.°, n.° 3 da Lei n.° 12-A/2008) cujos recibos são postos à sua disposição todos os meses no portal da PSP desde 2011 (www.portalsocial.psp.ptJ. bem como a ação de responsabilidade civil extracontratual (ou contratual) do Estado, que aliás tentou nos presentes autos, sem êxito, pelo que não tem lugar a aplicação do artigo 473.° do CC.
26 - Quanto aos juros, entende-se que, não havendo lugar ao pagamento da indemnização por enriquecimento sem causa, não são igualmente devidos quaisquer juros, sendo que, a julgar-se que são devidos, o que, de todo o modo não se concede, o seu pagamento apenas teria lugar relativamente às quantias vencidas até à data da citação, a partir dessa data, tendo em conta que não se verificam os pressupostos do artigo 480.° do CC.
27 - Assim, o tribunal não poderia ter decidido pela condenação do Réu com fundamento no seu enriquecimento sem causa justificativa, incorrendo, a sentença, a nosso ver, em erro de julgamento, violando:
- As normas dos n.° s 1 e 2, do artigo 42.° do DL n.° 299/2009, em conjugação com as normas dos n.°s 1 e 2, al. a) do artigo 24.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro, e as normas correspondentes das leis do Orçamento do Estado para 2012, 2013, 2014 e 2015 (art.° 20.° n.° 1 da Lei n.° 64-B/2011, de 30 de dezembro, art.° 35 ° da Lei n.° 66-B/2012, de 31 de dezembro e art.° 39.° da Lei n.° 83-C/2013, de 31 de dezembro e art.° 38.° da Lei n.° 82-B/2014, de 31 de dezembro);
- As normas dos artigos 13.° e 59.°, n.° 1, al. a) da CRP em conjugação com o princípio da proporcionalidade, na interpretação que foi feita;
- As normas do artigo 473.° e segts., do Código Civil (…)”.
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Notificada que foi para o efeito, a Recorrida L. produziu contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido quanto à procedência parcial da presente ação.
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Concomitantemente, L. deduziu RECURSO SUBORDINADO, para o que alegou, apresentando para o efeito as seguintes conclusões: “(…)
1. Ao contrário do decidido pelo Tribunal recorrido, o Réu Estado Português deveria ter sido condenado, em regime de solidariedade com o Réu Ministério da Administração Interna, a pagar a indemnização peticionada pela Autora.
2. Enquanto mero departamento governamental, o Ministério da Administração Interna carece também de personalidade jurídica e, por maioria de razão, de personalidade judiciária, tal como resulta do disposto no art. 11.°, n.° 2 do Cód. Proc. Civil.
3. Carecendo o MAI de personalidade judiciária, teria também de ser demandado através da pessoa coletiva da qual é parte integrante: o Estado Português.
4. Como tal, o Réu Estado Português também deverá ser condenado, solidariamente com o Ministério da Administração Interna, no pagamento da indemnização peticionada pela Autora.
5. Neste particular, a decisão recorrida violou o n.° 2 do art. 11.° do Cód. Civil.
6. A Autora, no articulado inicial, quantificou as quantias devidas pelos Réus e formulou um pedido de indemnização líquido.
7. Constando da petição inicial a liquidação da obrigação de indemnização, a Autora entende que os Réus deveria ter sido condenados a pagar quantia líquida, nos termos peticionados, ao invés de uma condenação ilíquida.
8. A indemnização ilíquida deverá manter-se apenas no que respeita aos salários vencidos após a entrada da ação, enquanto a Autora continuar a exercer funções de Adjunta de Divisão Policial de Comando Metropolitano.
9. Ao decidir como decidiu, condenando em indemnização ilíquida, o Tribunal recorrido violou o disposto no art. 556.°, n.° 1, al. b) do Cód. Proc. Civil (…)”
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Relativamente a este recurso subordinado, o Recorrido Ministério da Administração Interna produziu contra-alegações, que rematou da seguinte forma: “(…)
1ª - Tendo em conta os pedidos da Autora concretamente apreciados, a final, deveria o Estado a ser absolvido, como foi, por não ter sido interveniente na relação jurídica controvertida, subjacente ao pleito, o que, nesta fase processual se entende e aceita, nos termos da douta sentença.
2ª - É que, como também é defensável, não estamos perante uma ação de responsabilidade “pura” em que a legitimidade passiva pertence ao Estado, mas perante a responsabilidade pelo pagamento de quantias dependentes de um ato administrativo por parte da entidade administrativa (MAI) e, consequentemente, da sua responsabilidade.
3ª - É, aliás, curial que assim seja, considerando que, em última análise, acaba por ser o MAI/PSP a ser o responsável pelo pagamento, considerando que a PSP (MAI) dispõe de receitas próprias, nos termos do artigo 60.°, alínea d) da lei n.° 53/2007, de 31 de agosto, o que implica que seja a PSP (MAI) a inscrever no seu orçamento, verbas destinadas ao pagamento das despesas a que o Estado venha a ser condenado por sentenças transitadas em julgado ou por compensação de danos causados a terceiros, nos termos das disposições conjugadas das alíneas c) e d) do artigo 1.° e do n.° 1 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 74/70, de 2 de março, como, aliás, é prática habitual.
4ª - Nesta linha de raciocínio, não se nos afigura juridicamente aceitável impor a condenação solidária do MAI e do Estado, como pretende a Recorrente, uma vez que não estamos perante obrigações solidárias, no sentido caracterizado no artigo 512.° do Código Civil.
5ª - O que existe, nos presentes autos, caso a sentença transite em julgado em sentido favorável à Autora, é a responsabilização do MAI ou do Estado, alternativamente, sendo que a condenação de um importa necessariamente a absolvição do outro, pelo que a sentença não merecerá censura, a este propósito.
6ª - Quanto à questão do valor indemnizatório, tendo o pedido da Autora sido feito em termos de reclamação do pagamento dos diferenciais de remuneração, de suplemento e de subsídios, entre as categorias de comissário e de subintendente, como, aliás, também resulta da sentença, parece-nos indiferente os valores em causa, vencidos ou vincendos, serem ilíquidos ou líquidos, sendo que, no caso de valores ilíquidos, haverá que abater os descontos legais, daí resultando a equivalência entre ambos os valores.
7ª - Em qualquer caso, o valor a indemnizar há-de corresponder ao prejuízo efetivamente sofrido que, se bem ajuizamos, se traduz no valor ilíquido com dedução dos descontos legais ou no valor líquido sem essa dedução, por equivalência.
8ª - Assim, a douta sentença recorrida não merece censura, na parte ora recorrida e não viola qualquer preceito legal, designadamente os invocados pela Recorrente, devendo negar-se provimento ao recurso subordinado, com as legais consequências (…)”.
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Também o Recorrido Estado Português, representado pelo Digno Magistrado do M.P. junto do T.A.F. do Porto, contra-alegou o recurso subordinado deduzido por L., tendo concluído da seguinte forma: “(…)
1 - A Recorrente, que é oficial da PSP, propôs a presente ação contra o Estado Português, contra o MAI e contra a «PSP- Polícia de Segurança Pública», pedindo a sua condenação solidária é porque concebe ou entende que cada uma das referidas três entidades pode estar em juízo e, por isso, ser condenada no pedido, solidariamente ou não;
2- Ao vir dizer nas suas doutas alegações que a douta sentença, por ter condenado o MAI e absolvido o Estado Português, violou o art° 11°, n°2, do CPC, está , sem margem para dúvida a evidenciar incoerência e irrazoabilidade, mostrando-se, por isso, visto o disposto no art° 334° do CC, haver abuso da ação (ou do direito) na modalidade de «venire contra factum proprium», com as consequências legais daí decorrentes;
3- Inexiste violação do artº. 11, n°2, do CPC, pois o CPTA concedeu personalidade e legitimidade judiciárias para os Ministérios poderem estar em juízo, como é o caso, afastando as regras do processo civil , as quais apenas são aplicáveis nos processo administrativos apenas supletivamente e com as necessárias adaptações;
4 - Na verdade, a 2ª parte do n°2 do art° 10° do CPTA prevê uma exceção (ou «extensão de personalidade judiciária), respeitante precisamente à pessoa coletiva Estado, atribuindo personalidade judiciária aos ministérios, que devem ser os demandados, em vez do Estado, na generalidade das ações administrativas, quer especiais, quer comuns,
5- O que acontece quando a responsabilidade pelo pagamento das quantias peticionadas está intimamente relacionada e dependente da prática de um ato administrativo por parte da entidade administrativa demandada, que contende diretamente com a existência da obrigação de pagamento das quantias peticionadas, e, portanto, no presente caso, não poderia deixar de ser demandado o MAI na presente ação;
6- Assim, como se está perante uma exceção legal ao «critério da coincidência» plasmada no referido n°2 do art° 10° do CPTA deve improceder a alegada violação do art° 11°, n°2, do CPC, por esta regra geral não ser aplicável à presente situação;
7 - Não se pode verificar responsabilidade solidária entre o Réu Estado Português e o Réu MAI, pois, desde logo, a responsabilidade do MAI afasta necessariamente , dada a relação de alternatividade e exclusão , para além da improficuidade notória, a responsabilidade do Réu Estado,
8 - Pelo que, atendendo ainda, «mutatis mutandis» , ao referido pelo Réu MAI nas conclusões das suas doutas alegações de recurso, que com a devida vénia aqui se dão por reproduzidas, não se vislumbra razão ou fundamento legal para a condenação do Réu Estado Português, a título solidário ou não;
9- Acresce que só é possível deixar para liquidação a indemnização respeitante a danos relativamente aos quais, embora provada a sua existência, não existam elementos para fixar o montante;
10- A Recorrente, nas suas doutas alegações, não invoca violação do art° 609° do CPC mas do art° 569º do CPC, o que, por mais que cogite, não se compreende , pois não é minimamente entendível , desde logo, logicamente, que o tribunal «a quo» tenha ,ou possa ter, violado o normativo invocado;
11 - Não se mostram alegados factos ou referidas razões donde dimane que a condenação, objeto de recurso, tivesse de ser líquida, a menos que se pretendesse que sem os elementos factuais permissivos para determinar, com precisão e segurança, um exato “quantum” indemnizatório, se procedesse , outrossim, a essa condenação e, assim, «contra legem»;
12- E que a Recorrente nada diz, expende ou concretiza, acerca de factos ou razões, para alcançar a sua conclusão de haver elementos para a pretendida condenação ser líquida, pelo que essa conclusão mostra-se manca, encontrando-se o necessário silogismo judiciário falho das devidas premissas;
13- Por conseguinte, deve o recurso interposto pela A, ser rejeitado e confirmada nos seus precisos termos a douta decisão recorrida, assim se fazendo a acostumada Justiça (…)”.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão dos recursos interpostos, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional.
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir consistem em saber se a sentença recorrida, ao julgar nos termos e com o alcance explicitados no ponto I) do presente Acórdão, incorreu em:
(i) Recurso principal do Ministério da Administração Interna: Erro de julgamento de direito, por violação das (i) “(…) normas dos n.° s 1 e 2, do artigo 42.° do DL n.° 299/2009, em conjugação com as normas dos n.°s 1 e 2, al. a) do artigo 24.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro, e as normas correspondentes das leis do Orçamento do Estado para 2012, 2013, 2014 e 2015 (art.° 20.° n.° 1 da Lei n.° 64-B/2011, de 30 de dezembro, art.° 35 ° da Lei n.° 66-B/2012, de 31 de dezembro e art.° 39.° da Lei n.° 83-C/2013, de 31 de dezembro e art.° 38.° da Lei n.° 82-B/2014, de 31 de dezembro)(…)”; (ii) “(…) normas dos artigos 13.° e 59.°, n.° 1, al. a) da CRP em conjugação com o princípio da proporcionalidade, na interpretação que foi feita (…)” e das (iii) “(…) normas do artigo 473.° e segts., do Código Civil (…)”.
(ii) Recurso subordinado de L.: Erro de julgamento de direito, por ofensa do disposto no (i) n.° 2 do art. 11.° do Cód. Civil e no (ii) artigo 556.°, n.° 1, al. b) do Cód. Proc. Civil.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
O quadro fáctico apurado [positivo, negativo e respetiva motivação] na decisão judicial recorrida foi o seguinte: “(…)
1 - Precedendo despacho de 27 de fevereiro de 2008, do Diretor Nacional da PSP, publicado no Diário da República, 2ª série, de 26 de março de 2008, a Autora, que ocupava o posto de Subcomissário, foi promovida ao posto de Comissário, ficando posicionada no escalão 1 - índice 290 da tabela salarial em vigor - Cfr. doc. n.° 1, junto com a Petição inicial.
2 - No dia 02 de março de 2011, o Diretor Nacional da PSP em substituição, emitiu o Despacho n.° 2/GDN/2011, datado de 02 de março de 2011, que foi publicitado pela Ordem de Serviço n.° 11, pelo qual enunciou, entre o mais, a filosofia subjacente à definição dos critérios a ter em conta nas novas propostas de nomeação para o desempenho de funções correspondentes a categorias superiores, visando a contribuição para o esforço de contenção de despesa e de racionalização, decorrente, designadamente, do Plano de Estabilidade e Crescimento e da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2011, tendo ainda previsto a possibilidade de propostas de nomeação para o desempenho de funções correspondentes a categorias superiores, através do recurso às figuras de “recrutamento excecional” e da “graduação”, definindo objetivamente os critérios a que devem obedecer essas propostas - Cfr. doc. n.° 3 junto com a Contestação do Réu Ministério da Administração Interna;
3 - Na sequência do procedimento de colocação por oferecimento, a Autora foi colocada no Comando Metropolitano do (...), como Comissário , com efeitos a partir de 01 de abril de 2012 - facto admitido por acordo das partes; Cfr. ainda Ordem de serviço n. ° 061, de 26 de março de 2012, junta aos autos;
4 - No dia 09 de abril de 2012, a Autora foi colocada no Comando Metropolitano do (...) (COMETPOR), onde passou a desempenhar as funções de Adjunta do Comandante da 2ª Divisão Policial do COMETPOR, o que ainda prossegue na atualidade - facto admitido por acordo das partes; Cfr. ainda doc. n.° 2 junto com a Petição inicial;
5 - Não há nenhum despacho proferido a nomear a Autora como Adjunta do Comandante da 2ª Divisão do Comando Metropolitano do (...), e que o que houve foi uma decisão sumária/verbal do Comandante Metropolitano do Porto, Superintendente A., no dia em que a mesma se apresentou, na sequência da Ordem de Serviço n.° 61, em 02 de abril de 2012, dia em que estava presente o 2.° Comandante de então, Intendente Félix, e lhe foi comunicado que ia ser colocada na 2ª Divisão como Adjunta do Comandante da Divisão, o que a Autora aceitou, tendo aí começado a trabalhar, no dia 09 de abril de 2012 - facto admitido por acordo das partes;
6 - A Autora sabe o que tinha a fazer nessas funções, como Adjunta, porque isso é o que decorre do Despacho 20/GDN de 2009, do Gabinete do Diretor Nacional, e que até à data de hoje e desde então, continua a desempenhar as funções de Adjunta na mesma Divisão - facto admitido por acordo das partes;
7 - Por ofício datado de 04 de junho de 2012, o Comandante do Comando Metropolitano do (...) da PSP, propôs ao Diretor Nacional da PSP o recrutamento excecional da Autora - Cfr. doc. n.° 3, junto com a Petição inicial.
8 - Por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui se extrai parte desse ofício como segue:
“[...]
Assunto: NOMEAÇÃO DE ADJUNTOS DE DIVISÃO
Foram no pretérito dia 2 de abril transferidos para este Comando vários Comissários. Estas alterações obrigam à colocação dos mesmos em funções de Adjunto de Divisão Policial, quer por vacatura de alguns desses lugares motivados por passagem à situação de pré-aposentação, quer ainda por necessidades sentidas de rotação em outras Divisões.
A colocação deste pessoal nas funções de Adjunto é indispensável para o normal funcionamento das referidas Divisões e urgente, sob pena de poderem ficar comprometidos os objetivos traçados e ser diminuída a capacidade de comando das mesmas.
Assim, proponho a V. Ex.a que sejam recrutados excecionalmente os seguintes oficiais para as funções que se indicam:
[...]
. Comissário NM/144297 - L.. Adjunta da 2ª Divisão Policial do COMETPOR, com efeitos a 9 de abril de 2012.
[…]”
9 - Em 30 de janeiro de 2013 [respeitante ao período de 09 de abril de 2012 a 31 de dezembro de 2012], e em 30 de janeiro de 2014 [respeitante ao período de 01 de janeiro de 2013 a 31 de dezembro de 2013], a Autora foi objecto de avaliação de serviço, tendo exercido durante o período de avaliação as funções de Adjunto do Comandante da Divisão - Cfr. fls. constante dos autos;
10 - Na sequência de uma exposição escrita da Autora e de mais quatro oficiais, datada de 04 de março de 2013, dirigida ao Diretor Nacional da PSP, pela qual requeriam o seu recrutamento excecional para a categoria correspondente às funções que efectivamente desempenham, de Subintendente, foi proferida a informação n.° 3614/DARH/2014, de 20 de março de 2014, pelo Departamento de Recursos Humanos da DN/PSP, onde se concluiu que [entre os mais] a Autora não estava impedida de exercer as funções de Adjunto de Comandante de divisão, sobre a qual recaiu o despacho de concordância com essa informação, datado de 04 de abril de 2014, do Diretor Nacional Adjunto/UORH (Unidade Orgânica de Recursos Humanos) nele exarado, de cujo teor a Autora foi notificada em 29 de abril de 2014 - Cfr. docs. n.°s 4, 5, 6 e 7 juntos com a Contestação do Réu Ministério da Administração Interna;
11 - A Petição inicial que motiva os presentes autos foi remetida a este Tribunal [ao site SITAF], em 04 de agosto de 2014.
*

Fundamentação:
Os factos dados como assentes supra tiveram por base o acordo das partes em sede de audiência prévia, e bem assim, tendo subjacente o teor dos documentos constantes dos autos.
Com interesse para a decisão a proferir, nada mais se julgou provado, ou não provado.
(…)”.
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III.2 - DO DIREITO
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Assente a factualidade que antecede, cumpre, agora, apreciar as questões suscitadas nos recursos jurisdicionais em análise.
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I- Recurso principal do Réu
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Dos imputados erros de julgamento de direito, por violação das (i) “(…) normas dos n.° s 1 e 2, do artigo 42.° do DL n.° 299/2009, em conjugação com as normas dos n.°s 1 e 2, al. a) do artigo 24.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro, e as normas correspondentes das leis do Orçamento do Estado para 2012, 2013, 2014 e 2015 (art.° 20.° n.° 1 da Lei n.° 64-B/2011, de 30 de dezembro, art.° 35 ° da Lei n.° 66-B/2012, de 31 de dezembro e art.° 39.° da Lei n.° 83-C/2013, de 31 de dezembro e art.° 38.° da Lei n.° 82-B/2014, de 31 de dezembro)(…)”; (ii) “(…) normas dos artigos 13.° e 59.°, n.° 1, al. a) da CRP em conjugação com o princípio da proporcionalidade, na interpretação que foi feita (…)” e das (iii) “(…) normas do artigo 473.° e segts., do Código Civil (…)”.
*
A Autora intentou a presente ação peticionando o provimento do presente meio processual por forma a:
“(…)
a) declarar-se que, desde 9 de abril de 2012 até ao presente, a Autora tem desempenhado funções de Adjunta do Comandante da 2ª Divisão Policial do Comando Metropolitano do (...) (COMETPOR);
b) declarar-se que as funções descritas na precedente alínea do pedido integram-se no conteúdo funcional da categoria de Subintendente e são, por isso, da competência de Oficiais com a categoria de Subintendente;
c) declarar-se que, ao atribuir essas funções à Autora sem promover o seu recrutamento excecional para a categoria de Subintendente, os Réus violaram, entre outras, as disposições do art. 42.°, n.° 1 e 3 do Decreto-Lei n.° 299/2009;
d) em consequência, condenar-se os Réus a pagar à Autora € 12 234,42, acrescidos de juros moratórios, contados à taxa legal, desde 9 de abril de 2012 até efetivo e integral pagamento;
e) condenar-se os Réus a pagar à Autora a indemnização que, por força dos factos acima alegados, vier a ser fixada em decisão ulterior ou, seguindo outro entendimento, vier a ser liquidada em execução de sentença;
f) condenar os RR. a contabilizarem, para efeitos de tempo de serviço e progressão na carreira, o tempo de serviço prestado pela Autora, na categoria correspondente às funções efectivamente prestadas,
condenando-se os RR. no pagamento de custas e de procuradoria condigna.
(…)”.
O T.A.F. do Porto, como sabemos, julgou esta ação parcialmente procedente, tendo condenado o Réu Ministério da Administração Interna (i) “(…) a reconhecer que, desde 09 de abril de 2012 até ao presente, a Autora tem desempenhado funções de Adjunto do Comandante da 2ª Divisão Policial do Comando Metropolitano do (...) (COMETPOR) (…)”; (ii) “(…) a reconhecer que as funções de Adjunto do Comandante da 2ª Divisão Policial do Comando Metropolitano do (...) (COMETPOR) integram-se no conteúdo funcional da categoria de Subintendente e são, por isso, da competência de Oficiais com a categoria de Subintendente (…) e (iii) “(…) a pagar à Autora os diferenciais de remuneração e de Suplementos das Forças de Segurança, tendo subjacente a remuneração que lhe atribuiu a título de retribuição enquanto Comissário, e a que é legalmente devida pelo exercício de funções de Adjunto do Comandante, que apenas pode ser prosseguido por oficial com a categoria de Subintendente, desde 09 de abril de 2012, até à data em que proceder ao efetivo e integral pagamento, assim como os acréscimos proporcionais que sejam devidos em sede de subsídio de férias e de Natal [exceto quanto aos relativos ao ano de 2012, atenta a sua decretada suspensão, pelo disposto no artigo 21.° da Lei n.° 64- B/2011, de 30 de dezembro], quantias a que acrescem juros de mora, à taxa legal (…)”.
Perlustrando a fundamentação de direito vertida na decisão judicial recorrida, logo se constata, para o que o presente recurso releva, que o T.A.F. do Porto fundou o juízo de condenação do Réu Ministério da Administração Interna nos termos e com alcance supra explicitados sob o sobredito ponto (iii) no entendimento [aqui sintetizado] de que a Autora, não obstante Oficial de Polícia com a categoria de Comissário, tem vindo a exercer exclusivamente as funções de “Adjunta do Comandante de Divisão” desde abril de 2012, que se integram no conteúdo funcional da categoria de Subintendente, pelo que lhe assiste o direito à remuneração que é percebida pela categoria de Subintendente, sob pena de violação dos artigos 13 e 59º da CRP, que postulam os princípios da igualdade e do trabalho igual e salário igual, respetivamente, bem como de enriquecimento ilícito por parte da Administração.
A Recorrente não se conforma com esse entendimento, e, por conseguinte, vem deduzir o presente recurso com fundamento em erro de julgamento de direito, o que funda, no mais essencial, no duplo entendimento de que (i) a atuação por si prosseguida está conforme aos normativos dos artigos 13º e 59º, nº.1, alínea a) da CRP em conjugação do princípio da proporcionalidade, (ii) não ocorrendo enriquecimento sem justa causa, ou, quando assim não se entenda, que existe causa justificativa para o não pagamento da remuneração pretendida nos autos, traduzida na proibição da prática de quaisquer atos que consubstanciam valorizações remuneratórias prevista na Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2011.
Vejamos estas questões especificadamente.
Assim, e quanto ao enriquecimento sem causa, importa que se comece por sublinhar que são elementos constitutivos do enriquecimento sem causa [artigo 473º do Código Civil] o (i) enriquecimento, o (ii) empobrecimento, o (iii) nexo causal entre um e outro e a (iv) falta de causa justificativa da declaração patrimonial verificada.
Analisando agora a situação concreta dos autos, cabe notar que se mostra provado que a Autora possui a categoria de Comissária da PSP, mas que, desde abril de 2012, desempenha as funções de “Adjunta do Comandante da Divisão” por obediência a decisão sumária/verbal nesse sentido por parte do Comandante Metropolitano do Porto, Superintendente A..
Mais cabe notar que resulta demonstrado, em junho de 2012, o Comandante do Comando Metropolitano do (...) da PSP propôs ao Diretor Nacional da PSP o recrutamento excecional da Autora para a categoria de Subintendente correspondente à função que efectivamente desempenha de “Adjunta do Comandante da Divisão”, o que não foi atendido com base na informação n.° 3614/DARH/2014, de 20 de março de 2014, pelo Departamento de Recursos Humanos da DN/PSP, onde se concluiu que [entre o mais] a Autora não estava impedida de exercer as funções de Adjunto de Comandante de Divisão.
Cristalizada a realidade que antecede, é de manifesta evidência de que houve um empobrecimento por parte da Autora que despendeu o seu trabalho na execução das tarefas associadas à função de “Adjunta do Comandante da Divisão” em detrimento do trabalho correspondente à sua categoria profissional de Comissário.
Por seu lado, a Polícia de Segurança Pública aceitou a execução de tais tarefas por parte da Autora, todavia não lhe reconhecendo o direito de receber a remuneração correspondente à categoria de Subintendente, na qual se integra a função de “Adjunta do Comandante da Divisão”.
Ou seja, houve enriquecimento por parte do Réu à custa da prestação de trabalho da Autora.
Ora, este enriquecimento do Réu é uma consequência do empobrecimento por parte da Autora, uma vez que foi através da sua força de trabalho que a função de “Adjunta de Comandante de Divisão” tem vindo a ser executada.
Por conseguinte, mostram-se verificados os três primeiros requisitos para se poder qualificar a situação dos autos no âmbito do enriquecimento sem causa.
Idêntica conclusão, todavia, já não é atingível no que tange ao quarto requisito, já que, claramente, existe causa que justifique essa deslocação patrimonial.
De facto, resulta processualmente adquirido que a prestação de funções por parte da Autora como “Adjunta do Comandante da Divisão” teve na génese a obediência a uma decisão sumária/verbal nesse sentido por parte do Comandante Metropolitano do Porto, Superintendente A..
A partir da definição inovatória e voluntária [em relação às funções atinentes à categoria profissional de Comissário na qual estava investida a Autora] introduzida pela apontada decisão sumária/verbal do Comandante Metropolitano do Porto, estavam os subsequentes atos de processamentos de vencimento da Autora em condições de integrar o conceito de ato administrativo aferido nos termos que derivam dos artigos 120º e 122º do C.P.A, na versão vigente à data dos factos, sendo, por isso, os mesmos passíveis de serem impugnados contenciosamente.
Na perspetiva em apreço, é forçoso concluir que resulta inviável a verificação do último requisito relativa à natureza subsidiária do enriquecimento sem causa, claramente afirmada pelo legislador no artigo 474.º do Código Civil, que dispõe que “não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento”.
De facto, consubstanciando os atos de processamento de vencimento da Autora no período que desenvolveu a funções de “Adjunta do Comandante da Divisão verdadeiras decisões materialmente administrativas formalizadas por escrito - aferidas nos termos que derivam dos artigos 120º e 122º do C.P.A, na redação vigente à data –, sempre podia a Autora oportunamente ter sindicado contenciosamente a legalidade intrínseca dos mesmos.
E se assim é, não pode a Autora vir agora socorrer-se do instituto do enriquecimento sem causa, atenta a natureza subsidiária do mesmo.
Sendo assim, ressuma com evidência que a sentença recorrida, na parte que assim não o entendeu, enferma de erro de julgamento em análise.
Tal, porém, não importa qualquer alcance revogatório da decisão judicial recorrida, na medida em que o sentido decisório aposto na mesma mostra-se igualmente estribado no entendimento que a atuação do Réu descrita é desconforme ao disposto no artigos 13º e 59º da CRP, o qual entendemos ser de acolher integralmente no caso recursivo em análise.
Concretizando esta nossa convicção, diremos que o artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa, concretiza, no que diz respeito à retribuição do trabalho, visando garantir um justo e equitativo valor, o princípio da igualdade consignado no artigo 13.º do mesmo diploma.
O direito de igualdade reporta-se a uma igualdade material que exige se tome sempre em consideração a realidade social em que as pessoas vivem e se movimentam, e não a uma igualdade meramente formal, massificadora e uniformizadora, devendo, pois, tratar-se por igual o que é essencialmente igual e desigualmente o que é essencialmente desigual.
O que decorre do princípio para trabalho igual salário igual é a igualdade de retribuição para trabalho igual em natureza, quantidade e qualidade, e a proibição de diferenciação arbitrária [sem qualquer motivo objectivo] ou com base em categorias tidas como fatores de discriminação [sexo, raça, idade e outras] destituídas de fundamento material atendível, proibição que não contempla, naturalmente, a diferente remuneração de trabalhadores da mesma categoria profissional, na mesma empresa, quando a natureza, a qualidade e quantidade do trabalho não sejam equivalentes, atendendo, designadamente, ao zelo, eficiência e produtividade dos trabalhadores.
Ora, no caso concreto, não se alegando embora nenhum daqueles concretos fatores de discriminação, o acervo factual contém matéria que nos permite concluir pelo preenchimento de todos os pressupostos factuais exigidos.
Na verdade, provou-se que a Autora, aqui Recorrida, que possui a categoria profissional de “Comissário”, tem desempenhado desde abril de 2012, por indicação verbal do Réu e no interesse deste, e em detrimento das próprias funções correspondentes à categoria de Comissário, as funções de “Adjunta do Comandante da Divisão” que se integram na categoria profissional de “Subintendente”.
Porém, auferiu retribuição inferior à prevista para categoria profissional de “Subintendente”.
Ou seja, logrou a A. provar que, não obstante exercendo funções de categoria profissional superior [subintendente], vem sendo remunerada de forma diferente da de outro eventual polícia, a quem exercendo as funções de “Adjunto de Comandante”, por força da categoria profissional de “Subintendente”, corresponderia distinta [superior] remuneração.
Saliente-se que o Réu denegou a pretensão de recrutamento excecional recrutamento excecional da Autora para a categoria de “Subintendente” com base no entendimento de que esta não estaria impedida de exercer as funções de “Adjunto de Comandante de Divisão”.
Ora, perante a inviabilização da atribuição de categoria profissional de Subintendente com base na assunção de que a Autora não está impedida de exercer as funções de Adjunto de Comandante de Divisão, é pelo núcleo essencial de funções que se há de aferir a violação dos princípios que nos ocupam.
E nesse domínio, não sentimos hesitação em assumir que a Autora, aqui Recorrente, produz trabalho igual quanto à natureza, qualidade e quantidade ao trabalho prestado por qualquer polícia com a categoria profissional de “Subintendente” que exerça as funções de “Adjunto de Comandante”.
Outrossim é de relevar o facto da alegação produzida pelo Réu nada aportar de relevante no sentido de colocar em crise o sentido desta convicção, o que também contribuiu para a posição ora assumida por este Tribunal Superior no que diz respeita a esta matéria.
Donde concluímos que estamos perante uma clara violação do princípio constitucional de “para trabalho igual salário igual” perpetrada pela Réu/apelante face à Autora/apelada quando em comparação com os demais oficiais da PSP que, com a categoria profissional de “Subintendente”, exerçam as funções de “Adjunto de Comandante da Divisão”.
Nesta conformidade, está o Réu obrigado a pagar à Autora os diferenciais remuneratórios reclamados nos autos.
E a tal não obsta a proibição da prática de quaisquer atos que consubstanciam valorizações remuneratórias prevista na Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2011, já que esta não é em molde a suspender os direitos da Autora a serem-lhe pagos os montantes da remuneração correspondentes à categoria de Subintendente, que deixou de auferir, uma vez que, efetivamente, ela tem vindo a exercer funções que se mostram integradas em tal categoria profissional.
Ademais, e para que não subsistam quaisquer dúvidas, refira-se que a proibição de valorizações remuneratórias prevista na Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2011 apresenta como “destinatária confessa” a Administração e os atos administrativos por si praticados, o que não se confunde com a presente ação de reconhecimento de pretensões conexas com valorizações remuneratórias, cuja procedência judicial se impõe à Administração, independentemente do estatuído na Lei do Orçamento do Estado, por força do plasmado no nº. 2 do artigo 205º da CRP.
Pelo que não se pode deixar de concluir que bem andou o MMº Juiz a quo julgar em conformidade com o que se vem de expor, sendo, portanto, de manter a sentença recorrida.
Concludentemente, improcede o presente recurso principal.
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II- Recurso subordinado da Autora
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II.- Do imputado erro de julgamento de direito, por ofensa do disposto nos artigos n.° 2 do art. 11.° do Cód. Civil e artigo 556.°, n.° 1, al. b) do Cód. Proc. Civil.
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As questões decidendas que ora importa dissolver traduzem-se em determinar se Tribunal a quo, ao (i) absolver o Réu Estado Português dos pedidos formulados nos autos e, bem assim, ao (ii) condenar em indemnização ilíquida, incorreu em errada aplicação e interpretação do direito, por violação dos normativos supra elencados.
A resposta é parcialmente favorável às pretensões da Recorrente.
Na verdade, e com reporte para a primeira questão decidenda, importa que se comece por sublinhar que a legitimidade passiva, enquanto pressuposto processual, afere-se pela forma como o Autor configurou a sua causa de pedir e respetivo pedido [artigos 9.º, n.º 1, 2ª parte e 10.º, n.º 1, do CPTA e ainda o artigo 30.º, n.º 3, do CPC].
Assim, considerar-se-ão partes legítimas, os sujeitos da relação material controvertida tal como “desenhado” pelo Autor na sua petição inicial, independentemente da titularidade da posição jurídica substantiva [cfr. JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, in A Justiça Administrativa, 4ª edição, Almedina, pp. 257 e seguintes e MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA E RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, in Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Volume I, Almedina, pp. 154 e seguintes].
Por isso, embora constitua um pressuposto processual relativo às partes, a legitimidade processual não é uma condição de procedência da ação [cfr. entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 17 de novembro de 1996, proferido no processo n.º 038005 e de 1 de outubro de 1998, proferido no processo n.º 043423, ambos acessíveis em www.dgsi.pt] distinguindo-se, por isso, da legitimidade-condição ou material [cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12 de dezembro de 2002, proferido no processo n.º 0828/02, acessível em www.dgsi.pt].
Do que resulta que, para a sua aferição, relevará apenas a forma como o Autor configurou a sua pretensão, quer quanto ao objeto, quer quanto aos sujeitos da relação material controvertida, sendo, para este efeito, irrelevante se, a final, se vier a verificar que um daqueles sujeitos nunca teria, à luz do direito material, qualquer interesse em contradizer a sua pretensão.
Assim, regressando ao caso concreto, e depois de compulsado a substanciação configurada na sua petição inicial e respetivas pretensões, assinala-se, antes de mais, que os presentes autos respeitam a ação administrativa tendente (i) ao reconhecimento judicial de uma situação jurídica relativa à carreira profissional da Autora, e, bem assim, (ii) à condenação dos Réus ao (ii.1) pagamento das diferenças remuneratórias devidas e (ii.2) de indemnização por danos patrimoniais.
Perscrutando o libelo inicial, logo se constata que a “causa de pedir eleita” nos autos no tocante às pretensões jurisdicionais supra elencadas radicam numa alegada ilegal atuação da Polícia de Segurança Pública, traduzida, grosso modo, na falta de reconhecimento do direito da Autora de pagamento da retribuição devida pelas funções efetivamente exercidas de Subintendente, que originou os prejuízos monetários reclamados nos presentes autos.
O que serve para concluir que é ao Ministério da Administração Interna que a Autora pretende ver reconhecido o direito que invoca, e sobre cujos órgãos recairia, no caso, ser julgada procedente a presente ação, o dever de praticar os atos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos.
E o pedido indemnizatório formulado nos autos não altera a realidade atinente à legitimidade processual exclusiva do Ministério da Administração Interna para intervir nos autos como Réu.
De facto, como refere Esperança Mealha, in “Personalidade Judiciária e Legitimidade Passiva das Entidades Públicas”, Publicações Cedipre Online-2, http://www.cedipre.fd.uc.pt, Coimbra, novembro de 2010:
“(…) o problema põe-se quando seja cumulado um pedido para o qual tenha personalidade judiciária um ministério (ou um órgão), por força do disposto no artigo 10.º/2 e 4, com um pedido indemnizatório ou relativo a uma relação contratual, que teria que ser obrigatoriamente contestado pelo Ministério Público, em representação do Estado (11.º/2).
Por um lado, há quem defenda que, neste caso, a ação terá de ser intentada contra o ministério a cujo órgão seja imputável o ato (ou contra o próprio órgão, como vimos) e contra o Estado, representado pelo Ministério Público, cabendo a cada uma das entidades demandadas a contestação, respetivamente, do pedido de impugnação do ato e do pedido indemnizatório74.
Por outro lado, tem vingado o entendimento de que a regra da representação do Estado pelo Ministério Público, afirmada no artigo 11.º/2, “não se aplica em caso de cumulação de pedidos, se a um deles não corresponder tal representação (pelo menos, se for principal ou de natureza impugnatória) ”75.
Os casos paradigmáticos em que a cumulação de pedidos coloca este problema são a ação de impugnação ou de condenação à prática de ato devido na qual se cumule um pedido de indemnização com fundamento na ilicitude desse ato ou omissão (cumulação inicial de pedidos); ou a ação de impugnação de ato pré-contratual cujo objeto venha a ser alargado à impugnação do próprio contrato, nos termos do disposto no artigo 63.º/2 ou no artigo 102.º/4 CPTA (cumulação superveniente, no primeiro caso, no âmbito de uma ação administrativa especial e, no segundo, em sede de contencioso pré-contratual urgente).
Em casos como estes, os pedidos cumulados visam uma única esfera jurídica – a da pessoa coletiva Estado – e a questão resume-se a saber se a personalidade judiciária que, em geral, é atribuída aos seus ministérios (e órgãos administrativos) para se apresentarem em juízo a contraditar os referidos pedidos impugnatórios deve estender-se também ao pedido indemnizatório ou ao pedido sobre o contrato que com aqueles estão numa relação de conexão (e, em regra, de dependência, pois dependem da procedência do pedido principal).
A resposta deve ser positiva, desde logo porque não se afigura que estejamos no âmbito de aplicação da regra da representação orgânica do Estado pelo Ministério Público, uma vez que não pode dizer-se que estas ações “tenham por objeto relações contratuais e de responsabilidade”. Antes têm como objeto uma relação jurídico-administrativa mais ampla, em que apenas uma parte (em regra secundária ou dependente do sucesso da pretensão principal) assenta num contrato ou no instituto da responsabilidade civil (…)”.
Assim também o entendeu este Tribunal Central Administrativo Norte, com maior ou menor variação de fundamentação, designadamente, no aresto tirado no processo nº. 01682/07.8BEPRT, de 30.11.2016, que, em caso de contornos semelhantes, quanto a esta matéria, considerou o seguinte: (…)
Em síntese, a ação só deve ser dirigida diretamente contra a pessoa coletiva Estado Português, representado pelo Ministério Público, nos termos do Art. 11º, nº 2 do CPTA, nas situações que tenham por objeto relações contratuais ou em que se pretenda efetivar, a título principal, a responsabilidade solidária do Estado por atos ou omissões praticadas pelos seus órgãos.
Como se sumariou no Acórdão deste TCAN nº 02242/04.0BEPRT, de 22/02/2007 “Só nas ações de contratos ou nas ações de responsabilidade “pura” é que a legitimidade passiva pertence ao Estado, em todas as outras em que incumbe a um qualquer órgão da administração a prática de um ato administrativo que contende com os direitos dos particulares, como o caso dos autos, a legitimidade passiva pertence ao Ministério respetivo”.
De facto, no caso em apreço, a responsabilidade pelo pagamento das quantias peticionadas está intimamente relacionada e dependente da prática de um ato administrativo por parte da entidade administrativa/Ministério, pelo que não poderia deixar de ser demandado o Ministério da Educação na presente ação.
Assim, à luz da relação material controvertida, e perante o pedido formulado é manifesta a ilegitimidade passiva do Estado representado pelo Ministério Público, na presente ação.
Efetivamente, não cabe ao Réu Estado Português representado pelo Ministério Público, a prática de qualquer intervenção no que respeita às pretensões anulatórias do Autor, pelo que o pedido indemnizatório em apreço, por consequente do ato objeto de impugnação, não deveria ter sido ser formulado contra o Estado (…)”.

Reiterando esta linha jurisprudencial, tem-se, portanto, por assente, que o Estado Português carece de legitimidade processual para intervir enquanto Réu no âmbito de litígios relativos a atos ou omissões praticados pelos respetivos órgãos dos seus ministérios dos quais derivem a formulação de pedidos indemnizatórios.

Ora, esse é claramente o caso dos autos, pelo que falece inteiramente a objeção da Recorrente no domínio em apreço.
O mesmo, porém, já não se pode afirmar no que tange à segunda questão decidenda elencada no âmbito do presente recurso subordinado.
De facto, escrutinado os autos, logo se verifica que a Autora, no libelo inicial, quantificou os montantes remuneratórios que deveria ter auferido por força do exercício de funções atinentes à categoria profissional de Subintendente [cfr. artigos 56º a 66º do libelo inicial], na esteira do que formulou um pedido de condenação do Réu no pagamento da € 12,234,42 a título de diferenças remuneratórias devidas.
Mais se constata que o Réu não deduziu expressa oposição à alegação contida nos artigos 56º a 66º do libelo inicial relativa à quantificação das diferenças remuneratórias devidas.
Daí que, isto é, por terem sido elementos suficientes para se fixar, com precisão e segurança, o objecto ou a quantidade da condenação, e à míngua de expressa oposição à quantificação dos diferenciais remuneratórios devidos, impunha-se, em caso de procedência do pedido, que o[s] Réu[s] fosse[m] condenado[s] nos precisos termos e com o concreto alcance que vem peticionado no libelo inicial, o que não veio a suceder.
Procede, portanto, nesta parte, o recurso subordinado, impondo-se, por isso, a substituição da condenação ilíquida determinada na alínea a3) do dispositivo da sentença recorrida pela condenação do Réu Ministério da Administração da Interna no pagamento à Autora da quantia de € 12,234,42 acrescida de juros moratórios à taxa legal, sendo estes calculados desde a citação judicial até integral pagamento [cfr. artigo 480º do C.C].
Ao que se provirá no dispositivo.
* *
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em:
A) NEGAR PROVIMENTO ao recurso jurisdicional interposto pelo Ministério da Administração Interna, confirmando-se a sentença recorrida.
B) CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO ao recurso subordinado interposto por L., e, consequentemente, substituir a condenação ilíquida operada na alínea a3) do dispositivo da sentença recorrida pela condenação do Réu Ministério da Administração da Interna no pagamento à Autora da quantia de € 12,234,42 acrescida de juros moratórios à taxa legal, sendo estes calculados desde a citação judicial até integral pagamento [cfr. artigo 480º do C.C].
Custas a cargo do Recorrente no recurso principal interposto.
*
Custas a cargo da Recorrente e do Recorrente no recurso subordinado interposto, na proporção do decaimento, que se fixa em 50%.
* *
Porto, 13 de novembro de 2020


Ricardo de Oliveira e Sousa
João Beato
Helena Ribeiro