Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00146/08.7BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/20/2023
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Carlos de Castro Fernandes
Descritores:IRC;
MÉTODOS INDIRETOS;
FALTA DE NOTIFICAÇÃO PARA CORREÇÃO DE ERROS E OMISSÕES DA CONTABILIDADE;
Sumário:
I - A possibilidade de suprimento, no prazo legal, contemplada na alínea a) do art. 88º da LGT, impõe-se em todas as situações ali previstas e não apenas nas situações de falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – [SCom01...], Lda. (Recorrente), melhor identificada nos autos veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, pela qual se negou provimento à impugnação que deduziu contra as liquidações de IRC dos exercícios de 2004 e 2005.

Na presente apelação a Recorrente apresenta as seguintes conclusões:
i) A recorrente não conhece o rácio da margem de comercialização mediana a nível nacional disponível na DGCI, ficando apenas sabedora que se trata de um rácio obtido com base em valores declarados por contribuintes à AT que exercem a mesma actividade da impugnante.
ii) É facilmente perceptível que a generalidade da população portuguesa não percebe minimamente que rácio é esse, de onde é que resultam as percentagens, como é que se faz o apuramento das mesmas, quem é são os sujeitos passivos que declararam, quantos é que foram objecto de inspecção tributária, etc., etc…
iii) Para além de não se encontrar qualquer justificação para a mobilização de tal critério na óptica da sua adequação, idoneidade, funcionalidade e, no plano da fundamentação de direito, habilitação legal, é incontornável, cremos, que o mesmo roça a total ininteligibilidade, seja quanto à sua origem, seja quanto aos valores tidos em conta.
iv) Trata-se, pois, de uma fundamentação oca, insuficiente e imperceptível, que se situa nos antípodas das exigências legais.
v) Mais se acrescenta que a improcedência do alegado não deixará de acarretar, em consequência da injunção constitucional tipificada no artigo 268.º, n.º 3, a aplicação de norma eivada de inconstitucionalidade, qual seja a do artigo 77.º, n.º 1 e 4, da LGT, interpretada no sentido de que, no caso da avaliação indirecta do rendimento, a fundamentação pode consubstanciar-se num discurso de cariz técnico e inacessível (imperceptível) a um destinatário normal.
vi) Acrescendo uma afirmação puramente gratuita e infundamentada: que no apuramento e ao utilizar esta margem de comercialização declarada por outros contribuintes com a mesma actividade, foi salvaguardada a consideração de quebras ou desperdícios, já que essa margem se encontra influenciada pela situação concreta desses contribuintes, incluindo as quebras de que são alvo! Mas onde é que tal realidade está espelhada no processo? Resulta dos tais rácios? Onde é que tal se encontra provado? Com que meios de prova? Será por conhecimento pessoal? Será por osmose? Mas como é que se sabe que esses putativos contribuintes declararam quebras? Só se for por adivinhação ou pelo facto do papel aceitar o que lá se coloca.
vii) A livre e íntima convicção de julgador não consiste num mero exercício discricionário de listagem da prova produzida e neste caso não resulta fundamentado nem provado no apuramento e com a utilização da margem de comercialização declarada por outros contribuintes com a mesma actividade, foi salvaguardada a consideração de quebras ou desperdícios.
viii) A validade técnica do critério exige que o universo dos factores-base de conformação do critério assumido pela administração seja idêntico ou próximo daquele a que a situação investigada se reporta, o que no caso se desconhece.
ix) No caso foi dado como assente que a facturação da impugnante para as grandes superfícies, nos anos de 2004 a 2005, representava entre 80 e 90% da facturação total, não se vislumbrando que o critério utilizado pela AT que foi o de calcular as vendas de mercadorias presumidas, as quais se basearam na aplicação ao CEV declarado pela impugnante da margem de comercialização mediana a nível nacional para o seu sector de actividade obtida pela consulta às bases de dados da AT contendo os dados declarados pelos contribuintes.
x) A impugnante desconhece se esses tais contribuintes também facturaram nos anos em causa 80% a 90% para as grandes superfícies ou mesmo se facturaram alguma percentagem mais próxima ou afastada.
xi) O facto de na contabilidade da impugnante não terem sido detectadas quaisquer referências a desperdícios não impede a sua ponderação no apuramento da matéria tributável por métodos indirectos, posto que este não está a ser efectuado directamente pela contabilidade, devendo a AT atender às especificidades próprias do contribuinte e da actividade que desenvolve, num esforço de aproximação à sua realidade, por forma a, tendencialmente, alcançar o seu rendimento real e efectivo, sendo inquestionável e notório que na actividade exercida pela impugnante existem sempre desperdícios, nem a AT os nega.
xii) Tendo presente a conclusão sobre a omissão de proveitos, impõe-se rematar que a injustificada desconsideração de todos aqueles factores é susceptível de influir no resultado obtido, em desfavor da impugnante, pois que se tivessem sido considerados, seguramente os valores apurados seriam substancialmente diversos, isto é, manifesta e claramente inferiores, o que necessariamente afecta a quantificação final alcançada pela AT, tornando-a errada, por excessiva.
xiii) Erra a sentença recorrida ao concluir que não estava a AT obrigada a proceder à notificação da contribuinte para regularizar as deficiências da sua contabilidade.
xiv) Com efeito, damos aqui por reproduzido o teor do Acórdão do STA de 3.12.2014, Processo n.º 262/13: “Embora a letra da alínea a) do artigo 88.º da LGT não seja inequívoca, pois tanto permite sustentar que a condição nela ínsita - “quando não supridas no prazo legal” – se aplica a todas as situações nela previstas (assim, ANTÓNIO LIMA GUERREIRO, Lei Geral Tributária Anotada, Rei dos Livros, 2000, pp. 371/372 – nota 3 ao artº. 88.º da LGT), como apenas às situações de falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução (como parecem entender DIOGO LEITE DE CAMPOS/BENJAMIM SILVA RODRIGUES/JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª ed., 2012, p. 765 – nota 2 ao art. 88.º da LGT), a interpretação acolhida na sentença recorrida - a mais abrangente -, é a que melhor se ajusta à natureza subsidiária, de ultima ratio, da avaliação indirecta (artigo 87.º, n.º 1 da LGT), atento a que o legislador prevê expressamente a notificação para regularização da situação tanto nas situações de inexistência de escrita como nas de atraso na execução desta e em ambos os casos “independentemente do procedimento para a aplicação da coima prevista nos números anteriores” (cfr. os artigos 120.º n.º 2 e 121.º, n.º 2 do RGIT)”.
Termina a Recorrente pedindo que seja julgado procedente o presente recurso, sendo revogada a sentença recorrida, julgando-se a impugnação procedente.
Notificada para o efeito a Representação da Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.
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Os autos foram com vista ao distinto magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, tendo este emitido parecer no sentido da improcedência dos presentes recursos (cf. fls. 481 e segs. dos autos – paginação do SITAF).
*
Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.

-/-


II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância:
1. A Impugnante exerce a actividade de “Comércio por grosso de fruta e de produtos hortícolas”, a que corresponde o CAE 051311, estando enquadrado no regime geral (contabilidade organizada) em sede de IRC e no regime normal trimestral em sede de IVA no ano de 2004 e normal mensal no ano de 2005, exercendo a actividade num armazém situado no Mercado Abastecedor ... (fls. 7 v.º do P.A., não impugnado);
2. Através da Ordem de Serviço n.º ...80, da Direcção de Finanças ..., foi efectuada uma inspecção à Impugnante, aos exercícios de 2004, 2005 e 2006 (fls. 2 a 4 do PA);
3. Em resultado da inspecção efectuada, foi elaborado um “Projecto de Relatório de Inspecção Tributária”, sancionado superiormente, que aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, designadamente, que foram efectuadas correcções à matéria tributável com recurso a métodos indirectos quanto ao IRC e IVA, para os anos de 2004 e 2005 (fls. 5 e ss. do PA em apenso);
4. Quanto às correcções com recurso a métodos indirectos, o projecto de relatório de inspecção tem, nomeadamente, o seguinte teor: “
IV. Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
Ao longo deste Capítulo, e em referência aos exercícios de 2004 e 2005, exporemos diversos factos e situações que, no seu conjunto, impossibilitam a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação das matérias tributáveis. Essas situações resultam de irregularidades na organização da contabilidade, situações tipificadas na alínea a) do art.° 88° da Lei Geral Tributária.

1. Análise das margens de comercialização das mercadorias – exercícios de 2004 e 2005
A maior parte das mercadorias comercializadas pelo sujeito passivo estão sujeitas a IVA à taxa de 5% (frutas e produtos hortícolas - bens constantes da Lista I anexa ao CIVA).
Residualmente a empresa comercializa produtos sujeitos a IVA à taxa de 12% (azeitonas, amendoins, etc.) e à taxa normal de imposto (frutos exóticos).
A margem bruta de comercialização sobre o CEV apresentada pela empresa foi de 19,09% em 2004, e de 15,49% em 2005.
Estas margens apresentam-se muito inferiores à mediana que, a nível nacional, corresponde ao sector de actividade em que a firma se insere, a qual é de 26,47% e de 26,48%, respectivamente nos exercícios de 2004 e de 2005.

2. Análise das compras (consumos) versus vendas das diversas mercadorias comercializadas pela empresa - exercícios de 2004 e 2005
No anterior ponto 1, evidenciou-se que as margens de comercialização apresentadas pela empresa nos exercícios de 2004 e 2005 são muito inferiores à mediana que a nível nacional corresponde ao sector de actividade da empresa, nestes exercícios.
Assim, a nossa análise centrou-se no confronto das compras e subsequentes consumos e sua comparação com as vendas efectuadas nestes exercícios.
Foi solicitado à empresa o fornecimento em suporte informático da totalidade da sua facturação dos exercícios de 2004 e 2005.
A empresa forneceu estes elementos, tendo para o efeito elementos da equipa I desta Direcção de Finanças visitado a empresa, de modo a tornar possível a sua recolha e leitura, após a sua passagem para formato Excel.
No que se refere ao exercício de 2005 a totalidade da facturação constava dos dados fornecidos, uma vez que o total de facturação constante no ficheiro "Diário de Movimentos" extraído dos dados fornecidos, coincidia com os valores registados na contabilidade.
Já no que se refere ao exercício de 2004 a totalidade da facturação constante do referido ficheiro "Diário de movimentos" não coincidia com os valores registados na contabilidade da empresa. Após análise desta divergência concluiu-se que na contabilidade constavam determinadas facturas e vendas a dinheiro que não se encontravam no referido ficheiro "Diário de Movimentos". A funcionária da empresa que opera o sistema informático informou que tal se ficou a dever a reconversão de ficheiros efectuada nesse exercício, constando no entanto os documentos em falta nas contas correntes dos respectivos clientes.
Assim, foi possível através do ficheiro "Diário de Movimentos" a recolha e agrupamento das vendas dos diversos tipos de mercadorias, embora no exercício de 2004 se tornasse necessário também analisar sistematicamente na contabilidade os documentos titulativos das vendas que se encontravam em falta de registo no ficheiro "Diário de Movimentos".
Foi também solicitado o suporte informático dos registos das compras das diversas mercadorias. A respectiva análise não foi conclusiva, uma vez que se verificou que nem todas as compras estavam registadas nesse ficheiro. Também se verificou a existência de registos de movimentos de regularização que não foi possível conferir com os registos da contabilidade.
Dada a impossibilidade de recolha e agrupamento das compras em suporte informático, por estes registos não se revelarem objectivamente consistentes e credíveis, optou-se por recolher manualmente da contabilidade as aquisições das mercadorias. Para isso foram seleccionados alguns produtos, tendo-se apurado para cada um deles, através dos registos contabilísticos, isto é, factura a factura, as respectivas quantidades adquiridas. Esta análise embora exequível, foi bastante morosa, dado o elevado número de registos de aquisições efectuadas em cada produto. Em anexo nº 3 fls. 1 a fls. 11 se apresenta o apuramento das quantidades compradas dos artigos seleccionados, nos exercícios de 2004 e 2005.
Após este apuramento confrontámos as quantidades compradas (e as consumidas, uma vez que se considerou a variação de stocks) com as quantidades vendidas constantes no ficheiro "Diário de Movimentos". O confronto efectuado encontra-se em análise constante do anexo nº 4 fls. 1 a fls. 2.
De salientar que os stocks de existências no final de cada ano são de valores muito diminutos, já que devido ao tipo de actividade exercida de comércio por grosso de frutas e produtos hortícolas a rotação de stocks é muito elevada.
De referir, que no ano de 2004, e no que se refere às quantidades vendidas, foram analisadas manualmente as facturas/vendas a dinheiro que não se encontravam no ficheiro "Diário de Movimentos" sendo estas somadas às quantidades constantes neste ficheiro.
Pela análise deste confronto verifica-se que, nos produtos seleccionados as quantidades compradas/consumidas são muito superiores às quantidades vendidas, como é o caso dos seguintes produtos:

2004
Meloa gália: compras 27.717,5 kgs; vendas 26.346,38 kgs (em falta 1.371,27 kgs.) Banana: compras 9.489,23 kgs; vendas 7.637 kgs (em falta 1.852,23 kgs)
Pêra rocha: compras 58.140,3 kgs; vendas 53.885,28 kgs (em falta 4.255,02kgs)

2005
Uva red globe: compras 27.984,40 kgs; vendas 26.048,8 kgs (em falta 1.935,6 kgs) Diospiros: compras 4.773,42 kgs ; vendas 2.045,9 kgs (em falta 2.727,52 kgs) Banana: compras 7.582,5 kgs; vendas 5.362,00 kgs (em falta 2.220,5 kgs)
Meloa gália: compras 32.311,3 kgs; vendas 29.279,76 kgs (em falta 3.031,54 kgs)
Verifica-se assim falta de registo de vendas de diversas mercadorias uma vez que o número de quilogramas consumidos (foi considerado no confronto o consumo = compras +/- variação de existências) é superior ao número de quilogramas vendidos.
Ora, como se sabe, uma das expressões fundamentais da contabilização e apuramento do CEVC é a seguinte:
CEVC= Stock inicial+Compras+/-Regularização de existências-Stock final
A empresa em questão não registou qualquer quebra de stock ou outros factores de regularização (com excepção de pequenas quantidades de ofertas de existências). Pela natureza da sua actividade, os seus stocks são diminutos.
Ora assim, as existências compradas, não se tendo registado regularizações, deveriam ter sido vendidas ou afectarem a variação de stocks.
Não foi isso que se detectou. As significativas divergências entre quantidades de produtos adquiridos e vendidos são um factor que mostra inequívoca irregularidade contabilística, com o seu correspondente reflexo no apuramento do resultado do exercício.
É pois clara que a contabilidade da empresa não reflecte a realidade das suas operações numa área tão sensível e decisiva como a relação compras - consumos - vendas.

CONCLUSÃO
Em face das irregularidades detectadas na organização da contabilidade, situações essas que, no seu conjunto, impossibilitam a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, de harmonia com as disposições do Capítulo III do CIRC, preenchem-se os pressupostos constantes do n° 1 do art.° 52° do CIRC, conjugado com o art.° 87° e a alínea a) do art.° 88°, ambos da Lei Geral Tributária, que conduzem à aplicação de Métodos Indirectos, na determinação das matérias tributáveis dos exercícios de 2004 e 2005.
Pelos mesmos motivos, e na sequência do atrás exposto, conclui-se que a empresa não organizou a sua escrita de forma a possibilitar à Administração Fiscal o apuramento, o controle e a fiscalização clara e inequívoca do Imposto sobre o Valor Acrescentado, tal como esta se encontra definida no art. 44° do CIVA. Assim, nos termos dos art.(s) 82° e 84°, nº 1 do referido diploma, com fundamento na carência de elementos, propõem-se a correcção das bases tributáveis declaradas pelo sujeito passivo nos exercícios de 2004 e 2005.

V – Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos.

1 - IRC
Em face dos fundamentos expostos no Capítulo IV deste relatório, iremos determinar os Resultados Tributáveis dos exercícios de 2004 e 2005, tendo em conta os critérios previstos na alínea a) do art.° 90° da Lei Geral Tributária.
Assim, temos, relativamente aos exercícios em análise:
A - Exercício de 2004
Cálculo das Vendas de Mercadorias Presumidas
Para o cálculo das vendas de mercadorias em falta iremos utilizar a margem de comercialização correspondente à mediana que a nível nacional corresponde ao sector de actividade em que a empresa se insere (CAE 051311), de 26,47%.
CEV declarado: 1.123.633,72 €
Vendas presumidas = 1,2647 * 1.123.633,72 €
= 1.421.059,57 €
Vendas a acrescer por Mét. Indirectos = V. M. Presumidas - V. M. Declaradas
= 1.421.059,57 € - 1.338.202,55 €
= 82.857,02 €
Determinação do Resultado Tributável a propor
Resultado Tributável = Resultado Tributável Declarado + Vendas
Mercadorias a acrescer por Métodos Indirectos
= 28.572,20 € + 82.857,02 €
= 111.429,22 €
O Resultado Tributável Proposto, referente ao volume de negócios presumido para o ano de 2004, é o Lucro Tributável Proposto, no valor de 111.429,22 €.
B- Exercício de 2005
Cálculo das Vendas de Mercadorias Presumidas
Para o cálculo das vendas de mercadorias em falta iremos utilizar a margem de comercialização correspondente à mediana que a nível nacional corresponde ao sector de actividade em que a empresa se insere (CAE 051311), de 26,48%.
CEV declarado: 1.291.934,59 €
Vendas presumidas = 1,2648 * 1.291.934,59 €
= 1.634.038,87 €
Vendas a acrescer por Mét. Indirectos = V. M. Presumidas - V. M. Declaradas
= 1.634.038,87 € - 1.492.103,37 €
= 141.935,50 €
Determinação do Resultado Tributável a propor
Resultado Tributável = Resultado Tributável Declarado + Vendas Mercadorias a acrescer por Métodos Indirectos
= 22.113,57 € +141.935,50 €
= 164.049,07 €
O Resultado Tributável Proposto, referente ao volume de negócios presumido para o ano de 2005, é o Lucro Tributável Proposto, no valor de 164.049,07 €.

2 – IVA
Em resultado da aplicação de Métodos Indirectos, na determinação das Vendas de Mercadorias Presumidas, conforme exposto no anterior Ponto 1, deste Capítulo, apurou-se IVA em falta nos montantes globais de 4.142,85 € e de 7.096,78 € em referência aos exercícios de 2004 e 2005, respectivamente.

- Exercício de 2004
Após determinação das bases de incidência, procedemos à determinação da liquidação adicional de IVA
MAPA I - LIQUIDAÇÃO ADICIONAL DE IVA - ANO 2004
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
*Uma vez que a base tributável declarada à taxa de 5% representa 98,5% do total da base tributável optou-se por considerar que a base tributável em falta é sujeita na sua totalidade a IVA à taxa de 5%.
A repartição do imposto por períodos, será efectuada em partes iguais pelos quatro períodos de imposto.
(…)
- Exercício de 2005
Uma vez determinadas as bases de incidência, procedemos à determinação da liquidação adicional de IVA.
MAPA I - LIQUIDAÇÃO ADICIONAL DE IVA- ANO 2005
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
*Uma vez que a base tributável declarada à taxa de 5% representa 96% do total da base tributável optou-se por considerar que a base tributável em falta é sujeita na sua totalidade a IVA à taxa de 5%.
A repartição do imposto por períodos, será efectuada mensalmente em partes iguais, conforme se discrimina no Quadro abaixo.
(…)
Nestes termos, o sujeito passivo não declarou, não liquidou nem apurou, nos termos do art.° 19° a 25° e 71°, e, consequentemente, não entregou nos Cofres do Estado, nem no prazo referido no nº 1 do art.º 40º, nem até à presente data, com observância do art.° 26°, todos do CIVA, o imposto devido pelas Vendas de Mercadorias Presumidas nos exercícios de 2004 e 2005, nos montantes globais de 4.142,75 € e 7.096,78 €, respectivamente. (…)” (fls. 5 e ss. do PA, em apenso);
5. Notificada do projecto que antecede, veio a Impugnante, em 30-04-2007 apresentar na Direcção de Finanças ..., um requerimento, consubstanciando o exercício do direito de audição, que aqui se dá por integralmente reproduzido, de teor idêntico ao da presente p.i. quanto à alegação da falta da pressupostos legais para os métodos indirectos, invocando, também, a falta de notificação para corrigir a contabilidade, bem como quanto às questões relativas às quantificação, e quanto à falta de fundamentação do critério de quantificação (fls. 24 e ss. do PA em apenso);
6. Em 11-05-2007 foi elaborado pelos Serviços de Inspecção da Direcção de Finanças ... o Relatório de Inspecção, sancionado superiormente, que aqui se dá por integralmente reproduzido, de teor idêntico ao projecto de relatório acima parcialmente transcrito, contendo a mais o ponto IX – “Direito de Audição”, com, nomeadamente, o seguinte teor: “O sujeito passivo foi notificado nos termos do artº 60° da LGT e artº 60° do RCPIT, para o exercício do direito de audição - ofício nº ...40, de 20.04.2007.
O sujeito passivo exerceu este direito, tendo o seu advogado enviado ofício que deu entrada nesta Direcção de Finanças, em 30.04.2007.
Pela sua análise conclui-se o seguinte:
1. O artigo 88° da LGT dispõe que “A impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorrecções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
a) Inexistência ou insuficiência dos elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;".
O sujeito passivo refere, no direito de audição, nos pontos 19°/20°/21° que a fiscalização efectuada ao utilizar como fundamento para a utilização de métodos indirectos o art° 87° e a alínea a) do art° 88°, ambos da LGT, não efectuou a notificação ao sujeito passivo para proceder à organização da contabilidade num prazo a designar pela administração tributária.
Ora, como é patente no relatório, os fundamentos utilizados para a avaliação indirecta da matéria tributável foram as irregularidades detectadas na contabilidade da empresa, face ao controle que foi efectuado em termos de quilogramas de produtos consumidos e vendidos. Isto é, em determinados produtos seleccionados a contabilidade revela determinadas quantidades de quilogramas consumidos quando as vendas de quilogramas dos mesmos produtos são de montante inferior. Saliente-se que as facturas de venda foram exaustivamente analisadas.
Ora não havendo mais facturas na contabilidade com vendas desses produtos ter-se-ia que notificar o contribuinte para apresentar as facturas de venda de produtos que não estavam registadas?
O contribuinte não foi notificado para apresentar essas (hipotéticas) facturas. No entanto, no presente direito de audição elas também não nos foram exibidas, pelo que se conclui que este não as têm para as apresentar.
A falta de quilogramas vendidos das mercadorias em relação ao consumo das mesmas demonstra inequivocamente irregularidades na contabilidade do sujeito passivo, pelo que nos termos do art° 87° e alínea a) do nº 1 do art° 88° da LGT tal constitui fundamento para a realização da avaliação indirecta.
Na verdade, o representante do contribuinte, no direito de audição, passa (deliberadamente?) ao lado de uma regra contabilístico-fiscal tão elementar no apuramento do resultado (a relação vendas-compras-consumos-variação de stocks) que toda a estrutura argumentativa parece esquecer o ponto fundamental sobre o qual a administração gostaria de ter obtido esclarecimentos: como se explica que em vários produtos, numa empresa onde não se contabilizaram quebras nem relevantes variações de stock, existam vendas significativamente inferiores às compras?! Em todos os produtos analisados no relatório de inspecção estamos em presença de discrepâncias de milhares de quilogramas! Se isto não são irregularidades graves na execução da contabilidade, então o que será que constituirá uma tal figura? Toda a argumentação até ao nº 11 do direito de audição parece esquecer este facto básico.
2. O sujeito passivo refere no nº 34 do direito de audição que os critérios previstos no nº 1 do art° 90° da LGT para determinação da matéria tributável por métodos indirectos têm em conta a situação específica do contribuinte, o que foi completamente ignorado pela fiscalização.
O critério escolhido pela inspecção para a determinação da matéria colectável por métodos indirectos foi a margem de lucro bruto sobre o CEVC correspondente à mediana que a nível nacional corresponde ao sector de actividade em que a empresa se insere. Este critério tem pleno enquadramento nos critérios previstos no artº 90º da LGT designadamente o previsto na alínea a) do seu nº 1, o qual dispõe que a determinação da matéria colectável por métodos indirectos poderá ter em conta os seguintes elementos:
"As margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos e serviços de terceiros;".
Por outro lado vem o sujeito passivo nos nºs. 40, 41 e 42 do direito de audição referir que o perito tributário não explicou a razão por que optou por esse critério em detrimento de outros.
O critério utilizado, que resulta do tratamento estatístico das declarações anuais e modelos 22 de IRC entregues pelos sujeitos passivos, têm em conta o universo regional (...) e nacional dos contribuintes pertencentes ao sector de actividade onde a empresa se insere, sendo este rácio determinado do seguinte modo:
(Volume de Negócios-Custo das Mercadorias e M. P. Consumidas)/(Volume de Negócios)*100
Este Rácio assume, no exercício de 2004, a percentagem de 20,93%, e em 2005 a percentagem de 20,94%, os quais se calculados em relação ao Custo das Mercadorias e das Matérias Consumidas, assumem a percentagem de 26,47% e de 26,48% respectivamente em 2004 e 2005. (2004: 100-20,93%=79,07%; 20,93%/79,07%=26,47%; 2005: 100-20,94%=79,06;20,94%/79,06% =26,48%).
A utilização deste rácio têm em conta os dados apresentados por um universo a nível nacional de 644 contribuintes em 2004, e de 657 contribuintes em 2005, razão pela qual se afigura como o mais adequado e o mais próximo da realidade, para o sector de actividade onde a empresa se insere. É assim um critério estribado na realidade concreta do sector, e não uma construção quantitativa pessoal do perito, que possivelmente enfermaria de maior subjectividade.
A partir do momento em que as irregularidades da contabilidade - provadas no relatório da inspecção e não contrariadas no direito de audição - fundamentam o recurso a métodos indirectos, o uso da mediana margem do sector coloca o contribuinte numa situação que é equivalente a dizer que metade das empresas do sector tem uma margem superior e a outra metade uma margem inferior. Julgamos que tal critério:
a) Não é arbitrário, pois resulta de um universo estatístico nacional;
b) Coloca o contribuinte num ponto intermédio, o que se pode considerar justo no plano da quantificação numa situação como a descrita.
A razão da utilização da mediana apresentada a nível nacional prende-se com o facto de esta (ao contrário da média, que pode ser muito afectada por valores extremos) resultar da divisão da amostra em duas partes, colocando a margem atribuída ao contribuinte num ponto intermédio, e eliminando assim o referido problema que decorre do uso da média.
3. O contribuinte no nº 48 do direito de audição refere que “a amostragem que a fiscalização realizou é, antes de mais, injustificada" e nos nºs 49 e 50 refere que a amostragem é injustificada por se tratar de uma amostragem efectuada não de acordo com o universo dos produtos comercializados pela requerente mas apenas com alguns desses produtos, razão porque o critério quantificativo não merece qualquer credibilidade.
Ora o que se verificou durante a inspecção foi que numa grande parte dos produtos comercializados a documentação de suporte aos registos contabilísticos era defeituosa (facturas preenchidas manualmente, com difícil ou mesmo impossível legibilidade de alguns valores).
Assim, e numa tentativa de verificação mais objectiva da realidade contabilístico-fiscal do contribuinte - que, desde logo, o não penalizasse pelo deficiente tipo de suporte documental de muitas das operações - a análise incidiu em produtos nos quais os documentos de suporte das relações entre compras e vendas apresentavam uma base documental mais clara e objectiva (v.g., facturação emitida por via informática), originando menor subjectividade de apreciação por parte da inspecção.
Ora se nestas se detectaram as irregularidades descritas no relatório, tal coloca em causa a organização contabilística da empresa, e o resultado fiscal declarado deixa de merecer aceitação, não restando outra alternativa que o recurso a métodos indirectos.
4. No nº 62 do direito de audição o contribuinte refere que a "fiscalização pura e simplesmente desprezou que o sector de actividade em causa é um sector muito específico dada a existência de quebras, facto que é público e notório", referindo no nº 63 do direito de audição que a fruta e os produtos hortícolas são de fácil depreciação.
Refere ainda no nº 63° que a fiscalização havia de estabelecer uma percentagem para quebras.
Em resposta a estes pontos refira-se que a empresa não contabilizou quaisquer quebras de mercadorias, conforme foi oportunamente referido no ponto IV do presente relatório.
Por outro lado, trata-se de empresa com uma elevada rotação de stocks, sendo o valor dos stocks no final de cada exercício económico de valores diminutos, o que nos leva a concluir que a existirem quebras estas terão valores muito reduzidos. Mas, repita-se, persiste o facto da sua não contabilização. Porque não se explica no direito de audição a razão de tal procedimento? Parece algo estranho existir um (suposto) custo efectivo que não foi contabilizado.
5. Nos pontos 65° e 66° do direito de audição o sujeito passivo refere que a facturação da empresa para grandes superfícies atinge, em 2004, 88% do total da facturação e, em 2005, 92,8% do total facturado. Questiona como é que a inspecção pode apurar por métodos indirectos proveitos em falta superiores às vendas fora das grandes superfícies.
No nº 66 questiona se a Administração Fiscal admite às grandes superfícies a compra de mercadoria sem a necessária facturação.
Relativamente a estes pontos basta referir que não consta do presente relatório a conclusão que as vendas em falta apuradas por métodos indirectos se destinam a clientes de grandes superfícies ou a clientes não grandes superfícies. O que se apurou foi a divergência entre valores de compras e vendas, não explicadas pelo contribuinte. E, nesta questão fulcral, também o direito de audição nada explica.
6. Finalmente, questiona o contribuinte nos números 67/68/69 que o critério utilizado não leva em conta a especificidade do negócio e a concorrência que existe neste, referindo que o rácio utilizado apresenta valores irreais e surrealistas, que mais nenhum contribuinte apresenta, o que prova o erro da fiscalização, ou no mínimo o excesso desta.
Sobre este ponto, não se prova no direito de audição a razão de tais afirmações. Elas limitam-se pois a generalidades teóricas que nada acrescentam ao problema. Em pontos anteriores já se explicou o que representa a mediana da margem sectorial.
Não vale a pena repetir o que aí se referiu. Tendo o critério usado acolhimento no artigo 90 da LGT, esperar-se-ia que no direito de audição se invocassem circunstâncias particulares da empresa que pudessem modificar o critério. Ora tal não se vislumbra no direito de audição.
7. Em suma, e como demonstrámos:
a) Face às irregularidades graves detectadas na contabilidade do sujeito passivo, o recurso a métodos indirectos tem justificação legal;
b) O uso da mediana da margem do sector tem também suporte legal na quantificação do imposto em falta;
c) O exposto no direito de audição não traz nada de novo que permita uma modificação das conclusões do relatório.” (fls. 40 e ss. do PA em apenso);
7. O relatório a que se refere o ponto anterior foi enviado ao Exmo. Mandatário da ora Impugnante com ofício n.º ...02, de 16-05-2007, através de carta registada com AR, assinado em 18-05-2007 (fls. 59 e 59 v.º do PA em apenso);
8. Em 23-05-2007 a ora Impugnante apresentou na Direcção de Finanças ... pedido de revisão da matéria colectável, nos termos do art. 91.º da LGT, pedido que aqui se dá por integralmente reproduzido, invocando, essencialmente, os mesmos fundamentos invocados nesta sede (fls. 85 a 103 do PA, em apenso);
9. Nos dias 11-06-2007, 29-06-2007 e 05-07-2007 reuniram na Direcção de Finanças ... os peritos da Fazenda Pública e do Contribuinte, o ora Mandatário da Impugnante, para os efeitos do art. 92.º da LGT, não tendo os mesmos chegado a acordo quanto à verificação dos “motivos e exposição dos factos que implicaram o recurso a métodos indirectos”, nem quanto à quantificação, sendo que o adiamento das reuniões se ficou a dever à tentativa, por parte do perito do Contribuinte, de obter junto deste comprovativos ou a “fundamentação” para a existência de quebras – o que não foi conseguido –, conforme Actas n.º 018-A/LGT, 018-C/LGT e 018-D/LGT, que aqui se dão por integralmente reproduzidas (fls. 108 a 111 v.º do PA);
10. A acta n.º ...8-D/LGT, que pôs fim ao debate entre os peritos, subscrita por ambos, tem, nomeadamente, o seguinte teor: “(…) Conforme ficou acordado em reuniões anteriores o perito do contribuinte iria diligenciar junto da empresa, no sentido de apresentar comprovativos da existência de quebras, que invoca na petição inicial, o que não foi conseguido.
Desta forma, não houve neste procedimento de inspecção, o estabelecimento de acordo, pelo que os peritos apresentaram as suas posições.
De acordo com perito do contribuinte, é manifesta no sector da actividade da reclamante, a existência de quebras e desperdícios, como aliás é de todos conhecido. A não merecer credibilidade a escrita da reclamante, como não mereceu, face à argumentação constante do relatório, a fiscalização deveria ter tido em conta a real situação e especificidade da actividade da reclamante, mormente na quantificação efectuada.
Deste modo, mesmo na impossibilidade de uma comprovação documental, por ora a reclamante, estima que o montante das quebras e desperdícios se cifra na ordem dos 15%, levando em consideração o universo dos produtos que comercializa.
Finalmente refere ainda que o critério quantificativo do relatório constante não oferece segurança e alguma certeza quanto à real, ainda que presumida, situação e dimensão da actividade da reclamante, de acordo com o disposto no artigo 90º da LGT.
Por parte do perito da Administração Tributária é considerado não haver credibilidade no valor apontado pelo perito da reclamante para quebras ou desperdícios, de15%, uma vez que não se encontra apoiado em qualquer documento.
Por outro lado, para além da empresa, não ter contabilizado quaisquer quebras ou desperdícios, o que contraria as disposições do artigo 17° do CIRC e do Plano Oficial de Contabilidade, a utilização da margem de lucro obtida através dos rácios da DGCI, pelas declarações de mais de 600 contribuintes, deste ramo de actividade, contempla e está influenciada necessariamente, por aqueles contribuintes, cuja contabilização das quebras e/ou dos desperdícios foi devidamente efectuada. Para além de que a utilização de uma mediana, sendo uma medida de localização do centro de distribuição dos dados, expurga as franjas de contribuintes que provocam uma maior distorção no valor obtido.
Desta forma, constituindo a base o contraditório a existência ou não de valores a considerar de quebras e desperdícios, e não apresentando o perito do contribuinte qualquer elemento que permita aferir da sua quantificação, por um lado, e que a utilização dos rácios da DGCI, se encontra influenciada, por essas quebras ou desperdícios, por outro, considera o perito da administração tributária, que subsistem os motivos que levaram à tributação por métodos indirectos nos termos constantes do exposto no capitulo IV do relatório de exame, bem como a manutenção dos valores quantificados, nos termos do capítulo V, quer em sede de IRC quer de IVA pelo que não havendo possibilidade de acordo, caberá ao Exmo. Senhor Director de Finanças, nos termos do nº 6 do artigo 92º, da LGT, resolver de acordo com o seu prudente juízo..(…)” (fls. 111 e 111 v.º do PA em apenso);
11. Em 04-12-2007 foi pelo Director de Finanças ... proferido o Despacho n.º....3/2007, que aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual tem, nomeadamente, o seguinte teor: “(…) Nos termos do n.º 6 do artigo 92.° da Lei Geral Tributária, na falta de acordo, o órgão competente para a fixação da matéria tributável resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos.
O n.º 15 do artigo 91.° da Lei Geral Tributária determina que é autuado um único procedimento de revisão, ainda que respeite a mais de um exercício ou tributo.
Assim, compete-nos decidir.
Analisados o relatório dos serviços de inspecção, o pedido de revisão do contribuinte e as posições tomadas por ambos os peritos, verifica-se a falta de idoneidade e organização dos registos contabilísticos do sujeito passivo, pela existência, neles, de irregularidades e omissões, tal como se encontra devidamente explicado ao longo do relatório, nomeadamente de folhas 6 a 10 e seus anexos:
As margens de comercialização apresentadas pela empresa nos exercícios de 2004 e 2005 são muito inferiores à mediana que a nível nacional corresponde ao sector de actividade da empresa;
Da análise efectuada ao suporte informático da totalidade da facturação da empresa verificou-se que no exercício de 2004 a totalidade da facturação constante do ficheiro "Diário de movimentos" não coincide com os valores registados na contabilidade da empresa;
Da análise ao suporte informático dos registos das compras das diversas mercadorias verificou-se que nem todas as compras estavam registadas, existindo registos demovimentos de regularização que não foi possível conferir com os registos da contabilidade;
Da análise efectuada manualmente - factura a factura - às aquisições de mercadorias dos produtos seleccionados pela inspecção tributária verifica-se que as quantidades compradas/consumidas são muito superiores às quantidades vendidas.
Tais factos foram demonstrados e provados no relatório da inspecção tributária que, nos termos do n.º 1 do artigo 76.° da LGT, “fazem fé, quando fundamentadas e se basear em critérios objectivos" - que é o caso presente - e que não foram afastados, objectiva e concretamente, ao longo do procedimento, pelo sujeito passivo e seu perito.
As situações acima referidas conduzem-nos à conclusão que, tal como consta no relatório a folhas 10, as "irregularidades detectadas na organização da contabilidade, situações essas que, no seu conjunto, impossibilitam a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, de harmonia com as disposições do Capítulo III do CIRC, preenchem-se os pressupostos constantes do n° 1 do art. ° 52º do CIRC, conjugado com o art. ° 87º e alínea a) do art. ° 88º ambos da Lei Geral Tributária, que conduzem à aplicação de Métodos Indirectos, na determinação das matérias tributáveis dos exercícios de 2004 e 2005.
Pelos mesmos motivos, e na sequência do atrás exposto, conclui-se que a empresa não organizou a sua escrita de forma a possibilitar à Administração Fiscal o apuramento, o controle e a fiscalização clara e inequívoca do Imposto sobre o Valor Acrescentado, tal como esta se encontra definida no art. 44° do CIVA".
Que, devido àquelas irregularidades e anomalias, a contabilidade do contribuinte não relevou todas as operações realizadas e os resultados efectivamente alcançados, nos exercícios inspeccionados, de acordo com o que dispõe a alínea b), do n.º 3, do art.º 17º do C.I.R.C. e, bem assim, necessariamente, a sua real situação patrimonial, de harmonia com o art.º 29° do C. Comercial.
Pelo que se encontram reunidas as condições para avaliação indirecta da matéria tributável, ora efectuada.
Justificada a determinação da matéria tributária por métodos indirectos, cabe, por sua vez, ao contribuinte, o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação, de acordo com o disposto no n.º 3, do art.º 74° da LGT.
Contudo, tal não se apresenta conseguido, pois os factos acima descritos, não foram rebatidos nem justificados, ao longo do procedimento de revisão, pelo contribuinte no pedido de revisão, nem pelo seu perito.
(…)
Perante estes elementos, e os factos descritos no relatório e seus anexos que interessava rebater, o contribuinte e o seu perito, nem no pedido de revisão, nem na reunião do procedimento, esclareceram ou adiantaram o que quer que fosse.
Sendo que todo o relatório se encontra bem elaborado, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, e que aquando do direito de audição o funcionário fez uma análise muito detalhada do exposto nos 72 números, transcreve-se aqui o mesmo, que consta de fls. 15 a 18 do relatório:
(…)
Tendo o funcionário da inspecção tributária rebatido o direito de audição e até levantado algumas questões que a administração fiscal gostava de ver respondidas, seria compreensível que o contribuinte, no pedido de procedimento do art.º 91 da LGT, respondesse a essas questões e fizesse prova dos erros cometidos na análise feita pela inspecção tributária ao direito de audição. No entanto, isso não se verificou, dado que o pedido de procedimento apresentado é a repetição completa dos 72 números constantes do direito de audição, como já se referiu.
Por outro lado, na primeira reunião em que estiveram presentes o perito do contribuinte e o perito da administração (a 12 de Junho de 2007) ficou acordado que o perito do contribuinte iria "diligenciar junto da empresa, da fundamentação para a existência de quebras", no entanto até ao fim do procedimento de revisão nunca apresentou quaisquer elementos.
Defende o perito do contribuinte que existem quebras e desperdícios no sector da actividade da reclamante e que
(…)
O perito da administração, e bem, considera
(…)
Ou seja, os factos e cálculos apresentados no relatório e supra enunciados, que fundamentaram a determinação do valor da matéria tributável, não foram, em concreto, postos em causa pelo perito do contribuinte, pelos motivos já expostos, não sendo feita uma análise taxativa de forma a provar, convenientemente, haver excesso na quantificação da matéria tributável determinada pela inspecção tributária, limitando-se a discordar dos critérios utilizados, e mantendo iguais todos os argumentos utilizados no direito de audição, sem todavia, justificar as irregularidades e omissões detectadas.
Ora, e de acordo com o estipulado na alínea a) do n° 2 do artigo 75.º da LGT, é afastada a presunção de verdadeira da contabilidade e declarações por impedir o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo. Se a contabilidade e escrita do sujeito passivo obedecerem às regras estabelecidas nas leis comercial e fiscal, presumem-se verdadeiras, no entanto, tal como consta em anotação ao referido artigo 75.º da LGT, comentada e anotada por Diogo Leite de Campos, e outros, 3.ª Edição da Vislis Editores, página 365, (…)
Como foi devidamente demonstrado no relatório da inspecção tributária, os elementos declarados e fornecidos à administração não merecem credibilidade, existindo, como consta na transcrição acima feita, "indícios fundados de que não reflectem a matéria tributável real", competindo então à administração fiscal o apuramento da matéria colectável com recurso à aplicação de métodos indirectos.
No entanto não se consegue apurar com exactidão qual o verdadeiro montante em falta, restando só à administração retirar as ilações, que constam do relatório aqui já referido e respectivos anexos, a partir de factos conhecidos para firmar um facto desconhecido, tal como estipula o artigo 349.° do Código Civil.
Logo, a inspecção tributária apurou os valores que considera reais para que seja tributado o rendimento real, sendo que, segundo José Xavier de Basto no artigo "O princípio da tributação do rendimento real e a Lei Geral Tributária" in Boletim do Conselho Distrital de Coimbra da Ordem dos Advogados, Ano VI n° 10, Março de 2001, a folha 23 (…)
Que as situações acima referidas conduzem-nos à conclusão de que a contabilidade do sujeito passivo, devido às irregularidades detectadas, mostra-se insuficiente e incapaz de revelar a realidade económica - resultados e património - da sua actividade.
Pela legalidade do uso do critério operado na quantificação, porquanto, se baseia na alínea a) no n. ° 1 do art. ° 90° da LGT.
Deste modo
Determina, o acima exposto, a nossa total adesão aos fundamentos e quantificação constantes do relatório da Inspecção tributável e seus anexos e às expendidas pelo perito da Administração Tributária - cujos cálculos e fundamentos aqui damos por integralmente reproduzidos - o que vale por não aceitarmos a pretensão do contribuinte, já que o mesmo não fez prova do excesso na quantificação da matéria tributável conforme lhe competia, nos termos do art. 74° n° 3 da L.G.T.
Pelo que
Assim, mantenho o valor inicialmente fixado de I.R.C, de € 111.429.22 (cento e onze mil quatrocentos e vinte e nove Euros e vinte e dois cêntimos), para o exercício de 2004 e de € 164.049,01 (cento e sessenta e quatro mil e quarenta e nove Euros e sete cêntimos), para o exercício de 2005; quanto ao valor, do I.V.A. considerado em falta no ano de 2004, é fixado o montante de € 4.142,85 (quatro mil cento e quarenta e dois Euros e oitenta e cinco cêntimos), e para o ano de 2005, de € 7.096,78 (sete mil e noventa e seis Euros e setenta e oito cêntimos).” (fls. 112 a 118 do PA em apenso);
12. Em 20-12-2007 foi emitida a liquidação de IRC do ano de 2005, com o n.º ...71, a qual, após estorno e acerto com a liquidação anterior e somados os juros compensatórios, cujos cálculos estão espelhados na “Demonstração de Acerto de Contas” n.º ...92, que aqui se dá por reproduzida, resultou no valor a pagar de € 39.711,59 e prazo limite de pagamento de 06-02-2008 (fls. 126 e 127 dos autos);
13. A “Demonstração de Liquidação de Juros”, recebida pela Impugnante, com o n.º ...86, tem o seguinte teor:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
“ (fls. 128 dos autos);
14. Em 08-02-2008 deu entrada no Tribunal a presente impugnação (fls. 1 dos autos);
Mais se provou que:
15. No sector de actividade da Impugnante existem quebras nas mercadorias (este facto não foi posto em causa pela FP, nem pela AT no procedimento de revisão, sendo que tal não foi considerado expressamente por falta de demonstração do valor pela Impugnante e em virtude do método de quantificação já conter esses valores; por outro lado, as testemunhas foram unânimes em dizer que tais quebras existiam, sendo que a primeira testemunha era funcionária administrativa da empresa nos anos em causa, tendo afirmado que as quebras existiam, dando exemplos de como ocorriam, e que não eram contabilizadas por não haver funcionários suficientes; a segunda testemunha, que trabalhou como motorista e nas cargas e descargas, embora não nos anos em apreciação, mas que demonstrou conhecimento directo desta situação da existência de quebras, o mesmo acontecendo com a terceira testemunha, empresário do mesmo ramo, que exemplificou o tipo de produtos mais perecíveis; a última testemunha, TOC da empresa, também afirmou a existência de quebras, sendo que atribuiu a falta de contabilização das mesmas à falta de funcionários. Estes depoimentos foram prestados de forma segura e objectiva, demonstrando conhecimento directo do facto em causa, razão pela qual, conjugados com o que se deixou dito relativamente ao procedimento de revisão, se deu este facto como provado);
16. A facturação da Impugnante para as grandes superfícies, nos anos de 2004 a 2005, representava entre 80 e 90% da facturação total (facto não contestado, nem pela FP nem no relatório de inspecção, e confirmado pelas primeira e última testemunhas, a primeira, funcionária administrativa da empresa e a última, seu TOC nos anos em causa, que afirmaram esta situação sem hesitações, tendo identificado concretamente algumas dessas grandes superfícies, sendo os depoimentos coincidentes nesta questão e prestados com conhecimento directo da mesma).
*
Na sentença recorrida considerou-se que inexistiam factos não provados com relevância para a decisão da presente questão.
*
No que diz respeito à motivação factual, escreveu-se na sentença recorrida que:
«A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame crítico dos documentos que constam dos autos, não impugnados, e do Processo Administrativo em apenso, bem como da prova testemunhal produzida, cuja relevância foi referida a propósito de cada ponto.»
*
Por se tratar de prava documental junta aos autos e não infirmada pelas partes, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 640.º do CPC ex vi art.º 281.º do CPPT, adita-se à matéria de facto o seguinte:
17. Na sequência da emissão do documento de correção único relativo ao IRC de 2004, foi emitida em nome da Impugnante (Recorrente) a respetiva liquidação relativa ao apontado ano – cf. docs. a fls. 122 a 124 do PA.

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III – Questões a decidir.

No presente recurso, cabe analisar e decidir as questões colocadas pela Recorrente quanto aos erros de julgamento invocados, designadamente quanto à incorreta interpretação e aplicação do disposto na alínea a) do artigo 88.º da LGT.

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IV – Do mérito do presente recurso
No presente recurso, a ora Apelante veio questionar o acerto da sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que negou provimento à impugnação que aquela intentou direcionada contra as liquidações adicionais de IRC dos anos de 2004 e 2005.
As liquidações supra referidas têm a sua génese inicial uma ação inspetiva levada a cabo pelos serviços da AT, na qual se concluiu pela aplicação de métodos indiretos para a fixação da matéria coletável em sede de IRC E IVA dos anos de 2004 e 2005, sendo que aqui estão unicamente em causa a fixação da matéria coletável de IRC dos apontados exercícios. relativamente aos exercícios de 2004 e 2005. Após o aludido procedimento inspetivo, teve lugar o procedimento de revisão da matéria coletável que culminou na decisão do Sr. Diretor de Finanças ..., a que se faz menção no n.º 11 da matéria de facto assente na sentença apelada.
A Apelante invoca, nomeadamente, que a sentença recorrida fez uma interpretação e aplicação desacertada do regime constante da alínea a) do n.º 1 do art.º 88.º da LGT. Assim, na parte que aqui nos interessa, dispõe a norma citada que:
Artigo 88.º
Impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável
A impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorrecções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;

Na situação presente, a aplicação de métodos indiretos foi implicitamente fundamentada, quer no relatório inspetivo, quer, sobretudo, na supra mencionada decisão do Sr. Diretor de Finanças ..., no disposto na alínea b) do art.º 87.º da LGT.
Ora, sobre esta questão, na sentença recorrida formulou-se o seguinte raciocínio:
“[…]
Feita esta delimitação, e tendo em conta os fundamentos do recurso a métodos indirectos, há que dizer que não tem razão a Impugnante quando defende que a AT deveria tê-la notificado previamente para regularizar a contabilidade nos termos do art. 88.º a) da LGT.
Com efeito, a notificação para regularizar a contabilidade justifica-se no caso de falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na organização ou execução da contabilidade, mas já não se justifica nos casos de inexistência de elementos da contabilidade. No caso concreto, foi detectada uma situação de omissão de vendas. Ora tal situação não é passível de correcção. Como os Serviços de Inspecção deixaram dito na resposta ao direito de audição (ponto IX do relatório de inspecção), “as facturas de venda foram exaustivamente analisadas. Ora não havendo mais facturas na contabilidade com vendas desses produtos ter-se-ia que notificar o contribuinte para apresentar as facturas de venda de produtos que não estavam registadas?”. Acresce que, como ali também ficou dito, se a Impugnante tivesse algum elemento justificativo das discrepâncias encontradas deveria tê-lo apresentado, nomeadamente, em sede de direito de audição ou no procedimento de revisão, o que não aconteceu.
Assim, improcede a questão da notificação para correcção da contabilidade.
[…]”
Assim, a propósito de uma questão semelhante à presente já teve se pronunciou o STA, no acórdão datado de 13.09.2017, proferido no recurso n.º 01316/2017 (in www.dgsi.pt). Assim, neste aresto, cujos fundamentos e conclusões entendemos serem transponíveis para a presente situação, relatou-se que:
“[…]
3.3. Esta questão atinente à interpretação do disposto na convocada al. a) do art. 88º da LGT (saber se apenas estão abrangidas as irregularidades na organização ou execução da contabilidade ou, também, as restantes situações ali enunciadas) foi já expressamente apreciada no acórdão desta Secção do STA, proferido em 03/12/2014, no proc. nº 01262/13, onde se concluiu que «[e]mbora a letra da alínea a) do artigo 88º da LGT não seja inequívoca, pois tanto permite sustentar que a condição nela ínsita - “quando não supridas no prazo legal” – se aplica a todas as situações nela previstas (assim, ANTÓNIO LIMA GUERREIRO, Lei Geral Tributária Anotada, Rei dos Livros, 2000, pp. 371/372 – nota 3 ao art. 88º da LGT), como apenas às situações de falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução (como parecem entender DIOGO LEITE DE CAMPOS/BENJAMIM SILVA RODRIGUES/JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4ª ed., 2012, p. 765 – nota 2 ao art. 88º da LGT), a interpretação acolhida na sentença recorrida - a mais abrangente -, é a que melhor se ajusta à natureza subsidiária, de ultima ratio, da avaliação indirecta (artigo 87º, nº 1 da LGT), atento a que o legislador prevê expressamente a notificação para regularização da situação tanto nas situações de inexistência de escrita como nas de atraso na execução desta e em ambos os casos “independentemente do procedimento para a aplicação da coima prevista nos números anteriores” (cfr. os artigos 120º nº 2 e 121º, nº 2 do RGIT).»
E na verdade assim é.
A possibilidade de o contribuinte suprir as deficiências da escrita, após notificação, evitando a utilização de métodos indirectos, decorre, no âmbito do IRS, do disposto nos nºs. 2 e 3 do art. 39° do CIRS e, em sede de IRC, do disposto nos nºs. 2 e 3 do art. 57º do CIRC e a tal possibilidade se referem, igualmente, os arts. 120º e 121º do RGIT, evidenciando-se «a preocupação do legislador em reservar a avaliação indirecta para aquelas situações irremediáveis em que já não é possível, como base na contabilidade ou nos elementos dos contribuintes, determinar o valor tributável real por avaliação directa» (LGT Comentada e anotada, Almedina, 2015, [José Maria Fernandes Pires (Coordenador), Gonçalo Bulcão, José Ramos Vidal e Maria João Menezes], Comentário nº 4 ao art. 88º, pp. 911 e 912.)
E, no caso, tendo a AT procedido à correcção, por métodos indirectos, da matéria tributável da impugnante, ao abrigo do disposto na al. b) do art. 87° e da al. a) do art. 88°, ambos da LGT, por irregularidades na organização ou execução da respectiva escrita, impunha-se, como diz a sentença recorrida, a prévia notificação daquela (cfr. o art. 52° do CIRC) para suprir a irregularidade.
E no que respeita aos demais argumentos (incluindo os de ordem contabilística) invocados pela recorrente, também eles não são susceptíveis de alterar a interpretação legal determinada na decisão recorrida, desde logo porque, como bem sublinha o MP, a serem válidos, teriam plena aplicação às situações que a recorrente também entende poderem ser supridas, acrescendo que enquanto não caducar o direito de liquidação dos tributos (art. 45° da LGT) a matéria tributável é sempre susceptível de ser alterada, quer através de correcções meramente aritméticas, quer através de métodos indirectos.
[…]”.
Seguindo a apontada linha decisora vejam-se, também, os acórdãos do STA de 18.11.2020 (processo n.º 02024/06.5BEPRT) e de 09.06.2021 (processo n.º. 02577/09.6BEPRT) (ambos em www.dgsi.pt).
Assim, perscrutada toda a prova documental existente nos autos, nela se incluindo o PA junto, constatámos que efetivamente não houve lugar à notificação prévia à aplicação de métodos indiretos prevista na alínea a) do artigo 88.º da LGT, o que constitui uma insuprível falta. Com efeito, na situação presente foi considerado que existiam irregularidades na organização da contabilidade, extraindo-se a existência da falta de registo contabilístico de vendas. Por isso, na falta dos citados registos, os serviços da AT deveriam ter dado cumprimento ao disposto na alínea a) do art.º 88.º da LGT, ou seja, deveria ter sido notificado previamente o contribuinte para a apresentação dos documentos em falta na sua contabilidade relativos a tais imputadas vendas não registadas. Com efeito, tais alegadas omissões foram qualificadas como irregularidades do registo contabilístico e, como tal, enquadráveis na estatuição da norma da LGT acima referenciada.
Por isso, entendemos que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento apontado pelo Recorrente, o que determina a sua revogação e consequente procedência da presente impugnação.
Deste modo, na procedência do erro de julgamento supra referido, queda-se prejudicado o eventual conhecimento das demais questões suscitadas no presente recurso.

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Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, formula-se o seguinte sumário:
I - A possibilidade de suprimento, no prazo legal, contemplada na alínea a) do art. 88º da LGT, impõe-se em todas as situações ali previstas e não apenas nas situações de falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução.

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V – Dispositivo
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em conceder provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, considerando-se a impugnação procedente com a consequente anulação das liquidações de IRC dos exercícios de 2004 e 2005 a que se faz alusão nos presentes autos.

Custas pela Recorrida em ambas as instâncias, não sendo nesta devida a taxa de justiça por não ter contra-alegado.


Porto, 20 de dezembro de 2023

Carlos A. M. de Castro Fernandes
Cristina da Nova
Margarida Reis