Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00452/17.0BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/12/2019
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA, POR EXCESSO DE PRONÚNCIA; ARTIGO 615º, Nº.1, ALÍNEA D) DO CPC.
Sumário:
I- A nulidade de sentença por excesso de pronúncia ocorre quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.
II- Dentro destes parâmetros, não se deteta que a sentença recorrida tenha incorrido em excesso de pronúncia, uma vez que os Autores peticionaram a emissão de uma pronúncia condenatória dirigida ao pagamento de créditos laborais no montante de € 27.665,00, resultando natural que, para o Tribunal a quo proceder à apreciação e decisão da pretensão condenatória jurisdicional formulada pelos Autores nos presentes autos, sempre este teria que se debruçar sobre a verificação dos legais pressupostos de que depende o reconhecimento do direito à perceção dos créditos laborais reclamados nos autos. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:RDDC
Recorrido 1:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
NMPM, RDDC e AFPB, devidamente identificados nos autos, intentaram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel [doravante T.A.F. de Penafiel] a presente Ação Administrativa contra o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, peticionando o provimento do presente meio processual por forma a “(…) serem anulados os atos administrativos do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial constantes dos Despachos proferidos em 28 de dezembro de 2016, que indeferiram, por intempestivos, os requerimentos dos AA. para pagamento dos créditos emergentes dos seus contratos de trabalho, condenando-se o R. a deferir os requerimentos apresentados, por tempestivos, e, consequentemente, a proceder ao pagamento que lhes é devido, no montante global de € 27.665,00 (…)”.
O T.A.F. de Penafiel julgou esta ação parcialmente procedente, tendo anulado o ato impugnado nos autos, bem como condenado o Réu a apreciar os requerimentos apresentados pelos Autores, considerando-os tempestivos, e, nesse âmbito: (i) quanto ao requerimento do autor NMM, aferir sobre as condições de deferimento do montante pedido a título de indemnização; (ii) quanto ao requerimento do autor RC, aferir sobre as condições de deferimento do montante pedido a título de indemnização; (iii) quanto ao requerimento do autor AB, aferir sobre as condições de deferimento dos créditos pedidos, com exceção dos que dizem respeito aos vencimentos de julho e setembro de 2014, mais absolvendo o Réu do (i) pedido de pagamento ao autor NMM dos montantes referentes a vencimentos de julho a setembro de 2014, férias não gozadas, e proporcionais dos subsídios de férias e de Natal; (ii) do pedido de pagamento ao autor RC dos montantes referentes a vencimentos de julho a setembro de 2014 e a férias não gozadas; e do (iii) do pedido de pagamento ao autor AB dos montantes referentes a vencimentos de julho e agosto de 2014.
É desta sentença que RDDC vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL, para o que alegou, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso:
“(…)
1ª. O Meritíssimo Juiz a quo considerou questão central a dirimir a questão atinente à tempestividade da apresentação do requerimento do autor ao réu, para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho;
2ª. Contudo, não se limitou a apreciar a questão atinente à tempestividade do pedido do autor junto do réu - única questão controvertia que lhe foi colocada pelas partes - e viria a pronunciar-se sobre outra (nova) questão: a do preenchimento de outros pressupostos necessários ao deferimento das pretensões formuladas pelos autores perante a Administração.
3ª. Ora, tal questão nunca foi suscitada pelo réu que não impugnou ou questionou, quer na fase procedimental, quer na fase contenciosa, por qualquer forma, a existência dos créditos laborais invocados.
4ª. Não sendo questão controvertida entre as partes, dela o Meritíssimo Juiz a quo não devia conhecer, por extravasar o thema decidendum;
5ª. Ao fazê-lo, o Tribunal recorrido violou de forma flagrante o princípio do dispositivo.
6ª. Com efeito, o art. 609/1 do C.P.C. define e limita os termos da condenação a proferir, sendo vedado ao Juiz conhecer de questões não suscitadas pelas partes, não podendo extravasar, na sentença, os limites do pedido e, bem assim, "não podendo ocupar-se" senão das questões suscitadas pelas partes (art. 608/2);
7ª. A douta sentença a quo padece, pois, de manifesto vício de excesso de pronúncia, na parte em que absolveu o réu dos pedidos formulados e, bem assim, na parte em que condena o réu a “aferir sobre as condições de deferimento do montante pedido a título de indemnização".
8ª. Sendo, por isso, nula nos termos conjugados dos artigos 95°/1 do CPTA, 3°/3,608/2,609/1 e 615/1 al. d), do CPC, ex vi art. 1º do CPTA.
Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Ex.as doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, e em consequência ser julgada nula a douta sentença recorrida, na parte em que absolve o réu dos pedidos formulados e, bem assim, na parte em que condena o réu a “aferir sobre as condições de deferimento do montante pedido a título de indemnização"., nos termos conjugados dos artigos 95°/1 do CPTA, 3°/3,608/2,609/1 e 615/1 al. d), do CPC, ex vi art. 1° do CPTA.
(…)”.
*
Notificado que foi para o efeito, o Recorrido apresentou contra-alegações, que concluiu da seguinte forma:
“(…)
1. O regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial regulado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.04, impõe determinado requisitos, de cumprimento cumulativo, para que o Fundo de Garantia Salarial possa assegurar a um trabalhador o pagamento dos créditos requeridos.
2. Desde logo, um desses requisitos, impostos pela citada lei no art. 1º, é que o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente.
3. No presente caso, a ação de insolvência da entidade EPT LDA foi intentada no dia 20.03.2015.
4. Mas não são todos e quaisquer créditos que o Fundo de Garantia Salarial assegura, na medida em que o n.º 4, do art. 1º do citado decreto-lei, impõe que apenas é assegurado o pagamento de créditos vencidos nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou da entrada do requerimento do procedimento de conciliação, se for o caso.
5. Na presente situação, e de acordo com a legislação, o Fundo de Garantia Salarial assegura os créditos vencidos entre 20.03.2015 e 20.09.2014.
6. O contrato de trabalho dos Autores cessaram em 08.09.2014.
7. Portanto, não existem créditos vencidos dentro do período de referência.
8. Pelo que, não foram assegurados os créditos requeridos porque se encontravam vencidos fora do período de referência.
9. Apenas o Autor AFPB teve o seu pedido deferido parcialmente, uma vez que apresentou em acordo de revogação do contrato de trabalho que colocava os seus créditos parcialmente dentro do período de referência.
10. Nesse sentido foi cumprida pelo Fundo de garantia Salarial a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel.
Termos em que, deverá o presente recurso ser julgado improcedente.
(…)”.
*
O Tribunal a quo proferiu despacho de sustentação, a negar a existência de qualquer nulidade da decisão recorrida.
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O Ministério Público neste Tribunal não emitiu o parecer a que alude o nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, a única questão suscitada pelo Recorrente consiste em saber se a sentença recorrida de enferma de nulidade, por excesso de pronúncia.
III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos:
“(…)
1. Os autores foram trabalhadores da sociedade que girava sob a firma “EPT, Lda.”, NIPC 50…11 - cf. documentos de fls. 7, 19 e 30 do processo administrativo apenso aos autos;
2. Em 08.09.2014, o autor NM remeteu à sociedade “AMA Unipessoal, Lda.” missiva na qual se pode ler o seguinte: “(…) Ao abrigo do disposto nos artigos 394° e seguintes do Código do Trabalho, venho, por este meio, rescindir o meu contrato de trabalho, com justa causa, com efeitos imediatos, pelos seguintes fundamentos: 1° Falta de pagamento de salários relativos aos meses de julho e agosto de 2014; 2° Férias não gozadas (apenas me sendo concedidos ao longo destes 11 anos, 11 dias de férias em cada ano); 3 a Indemnização por antiguidade. (…)” - Cf. documento de fls. 164/165 do suporte físico dos autos;
3. Igualmente em 08.09.2014, o autor RC também remeteu à sociedade AMA Unipessoal, Lda.” missiva na qual se pode ler o seguinte: “(…) Ao abrigo do disposto nos artigos 394° e seguintes do Código do Trabalho, venho, por este meio, rescindir o meu contrato de trabalho, com justa causa, com efeitos imediatos, pelos seguintes fundamentos: 1° Falta de pagamento de salários relativos aos meses de julho e agosto de 2014; 2° Férias não gozadas (apenas me sendo concedidos ao longo destes 11 anos, 11 dias de férias em cada ano); 3a Indemnização por antiguidade. (…)” - Cf. documento de fls. 162/163 do suporte físico dos autos;
4. Em 30.09.2014, entre a referida “EPT, Lda.” e o autor AB foi firmado documento escrito intitulado “Confissão de dívida e acordo de pagamento”, podendo aí ler-se o seguinte: “(…) 1a Outorgante: EPT, Lda., NIPC 50…11, (...) Confessa-se devedor a 2° Outorgante: AFPB, NIF 22…37, (...) Da quantia de € 4.404,00 (quatro mil quatrocentos e quatro euros), relativa a compensação global pela cessação do contrato de trabalho. Declara a primeira que se obriga a pagar ao segundo o supra referido valor da seguinte forma: 1 - Em doze prestações mensais, iguais e sucessivas de €367,00 (trezentos e sessenta e sete euros) cada uma, vencendo-se a primeira no próximo dia 30/10/2014 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes. (…) 3 - A falta de pagamento de uma das prestações implica o imediato vencimento das restantes. (…)” - Cf. documento de fls. 166 do suporte físico dos autos;
5. Em 20.03.2015, o aqui autor RC apresentou junto do tribunal da Comarca de Porto Este, Instância de Amarante, petição inicial em que pedia a declaração de insolvência da EPT - cf. documento de fls. 143 a 161 do suporte físico dos autos;
6. Esta petição inicial deu origem ao processo que correu termos na Instância Central de Amarante, Secção de Comércio, J1, sob o número 414/15.1T8AMT, no âmbito do qual foi proferida sentença em 27.04.2015 que declarou a requerida insolvência - cf. documento de fls. 21 a 25 do suporte físico dos autos;
7. No âmbito desse processo, pelo administrador de insolvência então nomeado foi feito constar da relação de créditos reconhecidos: um crédito de € 15.250,02 a favor do autor AB; um crédito de € 17.687,58, a favor do autor NMM; e um crédito de € 7.865,00, a favor do autor RC - cf. documento de fls. 26 a 29 do suporte físico dos autos;
8. Em 02.09.2015 realizou-se assembleia de credores no âmbito do identificado processo - cf. documento de fls. 33 a 35 do suporte físico dos autos;
9. A lista elaborada pelo administrador de insolvência, acima referida, foi homologada por sentença proferida em 04.04.2016, no âmbito do aludido processo de insolvência, apenso A - cf. documento de fls. 30 a 32 do suporte físico dos autos;
10. Já antes, em 02.12.2015, os autores apresentaram junto do serviço de atendimento de Baião do centro distrital do Porto da Segurança Social requerimentos para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho pelo FGS - cf. documentos de fls. 36, 38 e 40 do suporte físico dos autos, e de fls. 1, 12 e 24 do processo administrativo apenso;
11. Do requerimento do autor NMM consta como data de admissão 01.07.2003, como data de cessação do contrato 08.09.2014, e como montante da retribuição base mensal ilíquida € 850,00, podendo ainda ler-se no quadro “4 - Situação que determina o pedido”:
“(…)
4 - Situação que determina o pedido
Tipo de crédito em dívidaPeríodo/mês/ano de referência Valor total- Por tipo de crédito
RetribuiçãoVencimentos julho a Set. 2014
5 anos de férias não gozadas
2.245,00
4.750,00
Subsídio de férias3 meses (em duodécimos)121,29
Subsídio de Natal3 meses (em duodécimos)121,29
Subsídio de Alimentação
Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho11 anos 11.450,00
Emergentes da violação do contrato de trabalho
TOTAL 17.687,58
(…)”
- Cf. documento de fls. 18 do processo administrativo apenso;
12. Do requerimento do autor RC consta como data de admissão 01.06.2012, como data de cessação do contrato 08.09.2014, e como montante da retribuição base mensal ilíquida € 850,00, podendo ainda ler-se no quadro “4 - Situação que determina o pedido”:
“(…)
4 - Situação que determina o pedido
Tipo de crédito em dívidaPeríodo/mês/ano dereferência Valor total - Por tipo de crédito
RetribuiçãoVencimentos julho a Set. 2014
Férias não gozadas
2.340,00
2.600,00
Subsídio de férias
Subsídio de Natal
Subsídio de Alimentação
Indemnização/compensaçãopor cessação de contrato de trabalho2.925,00
Emergentes da violação do contrato de trabalho
TOTAL7.865,00

(…)”
- Cf. documento de fls. 6 do processo administrativo apenso;
13. Do requerimento do autor AB consta como data de admissão 01.04.2012, como data de cessação do contrato 08.09.2014, e como montante da retribuição base mensal ilíquida € 1.500,00, podendo ainda ler-se no quadro “4 - Situação que determina o pedido”:
“(…)
4 - Situação que determina o pedido
Tipo de crédito em dívidaPeríodo/mês/ano dereferênciaValor total -Por tipo de crédito
RetribuiçãoVencimentos julho a Set. 2014
3 anos de férias não gozadas
4.500,00
4.500,00
Subsídio de férias3 meses (em duodécimos) 125,01
Subsídio de Natal3 meses (em duodécimos) 125,01
Subsídio de Alimentação
Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho 6.000,00
Emergentes da violação do contrato de trabalho
TOTAL 15.250,02
(…)”.
- Cf. documento de fls. 29 do processo administrativo apenso;
14. Estes requerimentos foram objeto de análise pelos serviços do FGS, que em 31.05.2016 elaborou informação na qual se pode ler nomeadamente, e para o que ao caso importa, o seguinte: “(…) 3- Os requerimentos não foram apresentados no prazo previsto no nº. 8 do artigo 2º do Anexo do Decreto-Lei nº. 59/2015, de 21 de abril, ma decorrência do que o FGS não assegura o pagamento dos créditos requeridos (…)” - Cf. documento de fls. 43 do processo administrativo apenso aos autos;
15. Sobre esta informação recaiu despacho de concordância do presidente do conselho de gestão do FGS em 31.05.2016 - cf. documento de fls. 44 do processo administrativo apenso aos autos;
16. Deste despacho foram os autores notificados por ofícios de 01.06.2016, bem como para, querendo, se pronunciarem sobre a proposta de indeferimento no prazo de 10 dias úteis, podendo ler-se nos ofícios em questão: “(…) O(s) fundamento(s) para o indeferimento é(são) o(s) seguinte(s): - O requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do nº. 8 do artigo 2º do Decreto-Lei nº. 59/2015, de 21 de abril (…)” - Cf. documentos de fls. 42, 43 e 44 do suporte físico dos autos;
17. Os autores responderam a estes ofícios, apresentando, separadamente, em 23.06.2016, requerimentos escritos pugnando pela tempestividade da apresentação dos requerimentos para pagamento dos créditos — cf. documentos de fls. 45 a 56 do suporte físico dos autos, e de fls. 8 a 11, 20 a 23 e 31 a 34 do processo administrativo apenso;
18. Após o que os serviços do FGS elaboraram nova informação, em 27.12.2016, podendo aí ler-se o seguinte:
“(…)
3 - O CD reanalisou o processo, tendo concluído pela improcedência do alegado.
Refere o mesmo que sem por em causa o alegado pelos requerentes em relação à certificação dos requerimentos, o certo é que o que se discute, e esteve na origem da nossa proposta inicial, não a instrução dos requerimentos ou a prescrição mas sim a caducidade, definindo-se esta como o exercício de um direito dentro de determinado prazo.
Ora, o exercício dos direitos dos requerentes, apresentação dos requerimentos, não foi exercido no prazo previsto no n° 8 do artigo 2o do Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo DL 59/2015, de 21/04, porque cessaram os contratos de trabalho em setembro e outubro de 2014 e apresentaram os requerimentos ao FGS em 02/12/2015. Em face destes elementos, o CD propõe a manutenção da intenção de indeferimento.
4.4. Da análise efetuada por este Núcleo da factualidade vertida na Informação do Centro Distrital e dos elementos constantes do Sistema Informático da Segurança Social (SISS), conclui-se igualmente que os argumentos aduzidos não são suscetíveis de alterar a proposta de decisão inicialmente comunicada, por falta de enquadramento legal que os legitime.
Melhor concretizando:
4.1. Dispõe o n.° 1, do artigo 3" do preâmbulo do DL n.° 59/2015, de 21/04, que “Ficam sujeitos ao novo regime do FGS (), os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor.”.
4.2. Em consonância com os elementos registados em SISS/FGS e tendo presente o novo regime do FGS, no âmbito do qual o requerimento foi entregue, o requerimento é extemporâneo, por ter sido entregue mais de um ano e um dia após a cessação do contrato de trabalho. Está em causa um prazo de caducidade e não de prescrição, como no regime anteriormente vigente, pelo que o direito de requerer o FGS caducou, de harmonia com a conjugação do disposto no preceito acima indicado com o nº. 8, do art. 2.o do Novo Regime do FGS, publicado em Anexo ao DL nº. 59/2015, de 21/04.
Contrariamente ao regime anterior, o prazo de caducidade não se suspende, interrompe ou altera pelas razões invocadas pelo/a requerente.
5. Face ao que antecede, subscreve-se o entendimento do Centro Distrital, propondo-se a manutenção do indeferimento, nos termos e com os fundamentos expostos. (…)” - Cf. documento de fls. 37/38 do processo administrativo apenso aos autos;
19. Sobre esta informação recaiu despacho de concordância do presidente do conselho de gestão do FGS em 28.12.2016 - cf. documento de fls. 39 do processo administrativo apenso aos autos;
20. O que foi comunicado aos autores por ofícios datados de 18.01.2017, nos quais se pode ler o seguinte: “(…) O(s) fundamento(s) para o indeferimento é(são) o(s) seguinte(s): - Atenta a resposta e analisada toda a factualidade verifica-se que não foram apresentados factos suscetíveis de alteração da decisão de indeferimento anteriormente proferida. - O requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.° 8 do art.° 2.º do Dec.- Lei n.° 59/2015, de 21 de abril. (…)” - Cf. documentos de fls. 57, 58 e 59 do suporte físico dos autos.
(…)”.
*
III.2 - DO DIREITO
Cumpre decidir, sendo que a única questão que se mostra controversa e objeto do presente recurso jurisdicional consiste em saber, como se viu supra, se a sentença recorrida enferma de nulidade, por excesso de pronúncia.
Efetivamente, o Recorrente sustenta que o Sr. Juiz a quo não se limitou a apreciar a questão atinente à tempestividade do pedido do autor junto do réu - única questão controvertia que lhe foi colocada pelas partes –, tendo-se pronunciado sobre outra [nova] questão: a do preenchimento de outros pressupostos necessários ao deferimento das pretensões formuladas pelos autores perante a Administração, consequentemente, padecendo a sentença a quo de manifesto vício de excesso de pronúncia, na parte em que absolveu o réu dos pedidos formulados e, bem assim, na parte em que condena o réu a “aferir sobre as condições de deferimento do montante pedido a título de indemnização.
Quid iuris?
Nos termos do n.º 1 do artigo 615º do CPC, é nula a sentença quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – alínea d), e quando condene em quantidade superior ao em objeto diverso do pedido – alínea e).
A nulidade da sentença por excesso de pronúncia constitui o reverso da emergente da omissão de pronúncia.
Verifica-se esta, quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.
Porém, conforme já dizia ALBERTO DOS REIS, haverá que não confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões.
"São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” [cf. Código de Processo Civil anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143].
Deste modo, apenas haverá nulidade da sentença por excesso de pronúncia, quando o julgador tiver conhecido de questões que aquelas não submeteram à sua apreciação [artigos 608.º, n.º 2, 609.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC].
Ora, o conceito de questões, para este efeito, deve ser naturalmente procurado na configuração que as partes deram ao litígio, levando em conta a causa de pedir, o pedido e as exceções invocadas pelo réu, o que vale por dizer que questões serão única e tão só as questões de fundo, isto é, aquelas que integram matéria decisória, tendo em conta a pretensão jurisdicional que se visa obter.
Volvendo ao caso concreto, temos que, os Autores, por intermédio da presente ação, pretendem obter a anulação dos “(…) atos administrativos do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial constantes dos Despachos proferidos em 28 de dezembro de 2016, que indeferiram, por intempestivos, os requerimentos dos AA. para pagamento dos créditos emergentes dos seus contratos de trabalho (…)”.
A par do pedido anulatório, os Autores formularam também um pedido de condenação do Réu “(…) a deferir os requerimentos apresentados, por tempestivos, e, consequentemente, a proceder ao pagamento que lhes é devido, no montante global de € 27.665,00 (…)”.
Assim, tendo presente o que se acaba de expender, considera-se que a sentença recorrida não violou as normas processuais citadas, uma vez que os Autores peticionaram [também] a emissão de uma pronúncia condenatória dirigida ao pagamento de créditos laborais no montante de € 27.665,00.
Deste modo, é natural que para o Tribunal a quo proceder à apreciação e decisão da pretensão condenatória jurisdicional formulada pelos Autores nos presentes autos, este teria que se debruçar sobre a verificação dos legais pressupostos de que depende o reconhecimento do direito à perceção dos créditos laborais reclamados nos autos.
E, se assim é, então nunca se poderia considerar que o Tribunal conheceu de questões que não foram suscitadas pelas partes ou que condenou o Réu em objeto diverso do que fora peticionado pelos Autores.
Por conseguinte, não ocorre o excesso de pronúncia invocado pelo Recorrente.
Concludentemente, deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e mantida a decisão judicial recorrida.
Ao que se provirá em sede de dispositivo.
* * *
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em negar provimento ao recurso jurisdicional “sub judice” e manter a decisão judicial recorrida.
Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário com que este litiga.
Registe e Notifique-se.
Porto, 12 de julho de 2019
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa
Ass. Luís Migueis Garcia
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco