Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01936/22.3BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 04/13/2023 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Irene Isabel Gomes das Neves |
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Descritores: | RAC; REGIME EXTRAORDINÁRIO DE REGULARIZAÇÃO DAS DÍVIDAS; PRESCRIÇÃO. |
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Sumário: | I. Estando o processo de execução fiscal balizado pelo título executivo e funcionalizado à cobrança da dívida pelo mesmo titulada – cujo montante consta do próprio título executivo nos termos do artigo 163 º, n. º 1 alínea e) do CPPT – está fora do âmbito da discussão do processo de execução fiscal a pronúncia sobre a materialidade inerente à dívida exequenda, isto é, sobre a legalidade da dívida exequenda II. Não tendo o ora Recorrente efectuado o pagamento das coimas até 60 dias a contar da entrada em vigor do regime extraordinário de regularização das dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infraestrutura rodoviária [Lei n.º 51/2015, de 08.06, ou seja, até 30 de setembro de 2015 (cf. artigo 4º, nº 2 e 3 e artigo 10º], está-lhe vedado o poder usufruir dos benefícios previstos no âmbito daquele regime. III. A prescrição do procedimento de contraordenação pode ser conhecida oficiosamente no recurso de contraordenação interposto nos termos do art. 80.º do RGIT, já a prescrição da coima pode ser conhecida oficiosamente no âmbito do processo de oposição enquanto fundamento previsto na alínea d) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT por se subsumir na hipótese legal de “prescrição da dívida exequenda” ou em sede de reclamação ao abrigo do artigo 175º, do CPPT.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. «AA» (Recorrente) notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida no âmbito dos autos de reclamação de acto praticado por órgão de execução fiscal, a qual julgou totalmente improcedente a reclamação que deduziu contra o indeferimento do pedido de aplicação do Regime Excepcional de Regularização de Dívidas (Lei n.º 51/2015, de 08/06) às dívidas exequendas no âmbito dos processos executivos melhor identificados nos autos, inconformado vem dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando as seguintes conclusões: «1. Contra o recorrente correm 3 (três) processos de execução fiscal no Serviço de Finanças ..., com os números ...84 e seus apensos, ...49 e ...22. 2. Os processos de execução fiscal referidos no ponto anterior têm como fundamento a falta de pagamento de coimas. 3. As coimas têm origem na falta de pagamento de taxas de portagem. 4. Em 01.08.2015 entrou em vigor a Lei 51/2015 de 08 de junho, a qual veio alterar a Lei 25/2006 e aprovar o Regime Excecional de Regularização de Dívidas de Portagem (RERD). 5. O RERD dispõe de um regime jurídico mais favorável ao recorrente, pois prevê uma redução do montante das coimas aplicadas. 6. O recorrente preenche os requisitos de adesão ao RERD. 7. O recorrente, solicitou, em tempo, a adesão ao RERD. 8. A solicitação foi efetuada junto do serviço tributário competente, no caso, o Serviço de Finanças .... 9. O Serviço de Finanças ... foi o serviço tributário que instaurou os processos de contraordenação, bem como, é também o órgão de execução fiscal. 10. O Serviço de Finanças ... indeferiu o pedido de adesão ao RERD do recorrente, com fundamentação na falta de preenchimento dos pressupostos legais. 11. O recorrente lançou mão da reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT. 12. O tribunal a quo improcedeu a reclamação do recorrente, embora com fundamentação totalmente distinta do órgão de execução fiscal. 13. O tribunal a quo refere que, “estando o processo de execução fiscal balizado pelo título executivo e funcionalizado à cobrança da dívida pelo mesmo titulada (...) está fora do âmbito do processo de execução fiscal a discussão sobre a legalidade da dívida exequenda”. 14. Bem como, “nem o órgão de execução fiscal poderia deferir a pretensão formulada pelo reclamante nos termos de 2 dos factos provados, pois não tem competência para tanto...” 15. As coimas aplicadas ao recorrente ainda não se encontram executadas, isto é, pagas (nem voluntariamente, nem coercivamente), pois estão, precisamente, a serem objeto de cobrança coerciva. 16. No momento da entrada em vigor do RERD, as coimas aplicadas ao recorrente já tinham transitado em julgado, embora ainda não executadas. 17. Por tal facto, o RERD é diretamente aplicável ao caso concreto de acordo com o preceituado nos art.º 29.º n.º 4 da CRP e art.º 3.º n.º 2 do DL 433/82 ex vi art.º 3.º alínea b) do RGIT, ex vi art.º 18.º da Lei 25/2006 de 30 de junho. 18. O tribunal a quo emerge de uma errada interpretação jurídica, pois, por um lado, entende que não se deve proceder “a alterações substanciais da dívida exequenda”, e que, por outro, não vislumbra que o serviço tributário competente para apreciação e aplicação da lei mais favorável ao recorrente coincide com o órgão de execução fiscal. 19. A sentença do tribunal a quo deve ser totalmente revogada, ordenando-se a baixa dos autos ao mesmo para decisão do mérito da causa. 20. Ainda que se entenda que o Serviço de Finanças ... não seja o serviço tributário competente para apreciação do pedido efetuado de adesão ao RERD, sempre deverá ser a sentença do tribunal a quo REVOGADA e ordenado ao mesmo que a substitua por outra que ordene a baixa dos autos ao serviço tributário para efeitos de remessa oficiosa ao serviço tributário competente. 21. As coimas estão prescritas. 22. O prazo normal de prescrição acrescido de metade são 90 (noventa) meses, ou seja, 7 (sete) anos e meio, prazo que já foi ultrapassado. 23. A fixação das coimas foi em data anterior a 26.01.2015, data esta que correspondente à instauração dos processos executivos fiscais. * TERMOS EM QUE, nos melhores de Direito que V.Exas, dentro da mais alta sapiência jurídica, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser aceite, por tempestivo, e, a final, ser julgado totalmente procedente, por provado, devendo, por conseguinte, ser REVOGADA, a sentença proferida pelo tribunal a quo, ordenando-se a baixa dos autos à 1.ª instância para julgamento do mérito da causa. Caso assim se não entenda, Sempre deverá a sentença do tribunal a quo ser totalmente REVOGADA, ordenando-se a baixa dos autos ao serviço tributário para efeitos de remessa dos autos ao serviço tributário competente para apreciação do pedido de adesão ao RERD.» 1.2. A Recorrida Fazenda Pública, notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 1013 SITAF, no sentido da improcedência do recurso, no qual conclui:” (...) Resulta, em síntese, que aquando da entrada em vigor do regime excecional de regularização de dívidas os processos de contraordenação que estiveram na base da instauração dos referidos PEFs, os mesmos já se encontravam extintos. De facto, o ora recorrente poderia usufruir dos benefícios previstos no âmbito do respetivo regime especial, caso tivesse procedido ao pagamento, o que não sucedeu. Como igualmente, não efetuou o pagamento das coimas até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, de 08.06, ou seja, até 30 de setembro de 2015 (cf. artigo 4º, nº 2 e 3 e artigo 10º). Daí que, nesta parte, fenecam os argumentos usados pelo recorrente (...) não tendo sido a prescrição suscitada em sede própria e afastado o seu conhecimento oficioso nestes autos, somos de concluir que improcede, igualmente neste segmento, a sua invocação e apreciação por esta instância.” 1.4. Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo [cf. artigo 36.º, n.º 2, do CPTA, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea d) do CPPT, e artigo 278.º, n.º 3, do CPPT]. Questões a decidir: As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: (i) do erro de julgamento de facto e de direito e, da prescrição. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1.ª instância e respectiva fundamentação: «Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, dão-se como provados os seguintes factos: 1. Sobre a Reclamante foram instaurados o processo de execução fiscal n.º ...84, ...22 e ...49, nos quais se encontram em cobrança dívidas referentes a coimas e outros encargos de processos de contra-ordenação – cfr. processo de execução fiscal junto aos presentes e docs. de fls. 226 a 833 SITAF. 2. Em 19/07/2022 o Reclamante apresentou junto do órgão da execução fiscal dos processos referidos em 1 requerimento onde peticionava que lhe fosse aplicado o regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06 – cfr. doc. ... junto com petição de reclamação. 3. Por despacho da Chefe de Finanças ... de Gondomar-1, proferido em 17/08/2022, o requerimento referido em 2 foi indeferido – cfr. doc. 1 junto com a petição de reclamação. 4. O Reclamante foi notificado da decisão referida em 3 – cfr. doc. 1 junto com a petição de reclamação e informação do órgão de execução fiscal junta a fls. 839 SITAF. 5. A presente reclamação foi apresentada em 29/08/2022 – cfr. informação do órgão de execução fiscal junta a fls. 839 SITAF. Factos não provados Com relevância para a pronúncia a emitir nos presentes autos, inexistem factos que importe dar como não provados. Motivação da decisão sobre a matéria de facto A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes dos autos e no processo de execução fiscal apenso, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados, os quais não foram impugnados, merecendo a credibilidade do tribunal, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova.» 2.2. De direito As questões que ora cumprem apreciar são (i) a de saber se a sentença decidiu correctamente quando decidiu pela improcedência da reclamação deduzida pelo Executado ao abrigo do artigo 276.º e segs. do CPPT, no entendimento de que aquela incorre em erro de julgamento de direito ao considerar que ao ora Recorrente não assiste o direito a aderir ao regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, e bem assim a que no âmbito da execução se determine a adaptação dos processos de execução fiscal aqui em causa a versão da Lei n.º 25/2006, conferida pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, regime este mais favorável e, (ii) da prescrição das coimas, questão nova suscitada em sede de recurso. Vejamos. No âmbito de uma execução fiscal, para cobrança de dívidas referentes a coimas e outros encargos de processos de contraordenação, o executado suscitou junto do órgão de execução fiscal a aplicação do regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, ou o regime da Lei n.º 25/2006, que lhe fora conferido também pela Lei n.º 51/2015, de 08/06 e, subsidiariamente, a adaptação dos presentes processos executivos aqui em causa à nova versão da Lei n.º 25/2006, conferida pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, concretizada pela via do regime mais favorável instituído. Essas pretensões foram negadas, entendendo o órgão da execução fiscal, em suma, que: a) o mesmo teve a possibilidade de usufruir do Regime Excecional de Regularização de Dívidas de Portagem (RERD) aprovado pela Lei 51/2015 de 8 de junho, relativamente às coimas e outros encargos dos processos de contraordenação por falta de pagamento de taxas de portagem à BRISA, que se encontravam já em processo de execução fiscal, apesar de ter solicitado em 01.09.2015 as guias para pagamento dos processos executivos em causa, no valor de € 1.529,08, no valor de € 450,00 e no valor de € 385,00, o executado não efetuou o seu pagamento, perdendo assim a possibilidade de extinção dos processos executivos, nos termos da Lei 51/2015 de 8 de junho; b) quanto à aplicação da nova versão da Lei 25/2006 de 30 de junho, com a sua republicação referida no artigo 9º da Lei 51/2015 de 8 de junho, as alterações relativas à determinação da coima aplicável e custas processuais, serão de aplicar em sede de processo contraordenacional, inclusive, respeitando os limites máximos previstos no Regime Geral das Infrações Tributárias, a determinação da coima ocorre em sede de processo contraordenacional, de acordo com o Regime Geral das Infrações Tributárias, não havendo em sede de execução fiscal a possibilidade de discussão sobre a fixação das coimas. É contra este indeferimento, que o Executado veio apresentar a presente reclamação, deduzida ao abrigo do artigo 276.º e segs. do CPPT, na qual sustenta que, no seu entendimento, preenche todos os requisitos legais para adesão ao RERD, aprovado pela Lei 51/2015 de 08 de junho, ou que, no limite se deverá proceder à adaptação dos processos de execução fiscal à nova versão da Lei 25/2006 operada com a entrada em vigor da Lei 51/2015 de 8 de junho. Em 02.12.2022 foi proferida sentença que julgou “(...) a presente reclamação totalmente improcedente, com todas as consequências legais”. O Executado discordou da sentença e dela recorreu para este Tribunal Central. Se bem interpretamos a motivação do recurso, o Recorrente, desprezando ou, pelo menos, alheando-se da fundamentação aduzida na sentença, que não se esforça por rebater, reitera que o “ (...) RERD é diretamente aplicável ao caso concreto de acordo com o preceituado nos art.º 29.º n.º 4 da CRP e art.º 3.º n.º 2 do DL 433/82 ex vi art.º 3.º alínea b) do RGIT, ex vi art.º 18.º da Lei 25/2006 de 30 de junho”, pois que as coimas aplicadas ainda não se encontram executadas, isto é, pagas (nem voluntariamente, nem coercivamente), pois estão, precisamente, a serem objeto de cobrança coerciva, pelo que “O tribunal a quo emerge de uma errada interpretação jurídica, pois, por um lado, entende que não se deve proceder “a alterações substanciais da dívida exequenda”, e que, por outro, não vislumbra que o serviço tributário competente para apreciação e aplicação da lei mais favorável ao recorrente coincide com o órgão de execução fiscal.”. E, lança uma nova questão, alegando que “21. As coimas estão prescritas. / 22. O prazo normal de prescrição acrescido de metade são 90 (noventa) meses, ou seja, 7 (sete) anos e meio, prazo que já foi ultrapassado. / 23. A fixação das coimas foi em data anterior a 26.01.2015, data esta que correspondente à instauração dos processos executivos fiscais.”, cuja possibilidade de conhecimento por este Tribunal ad quem se aferirá. 2.2.1. Do erro de julgamento de direito A sentença recorrida julgou improcedente a reclamação, aduzindo, no segmento que compõe o thema decidendum deste Tribunal de recurso, a seguinte argumentação: « Como bem resulta de tudo quanto vimos expondo na presente pronúncia, é intuito do Reclamante com a presente reclamação que se determine a anulação do acto reclamado e que, a título principal, se conceda a adesão do Reclamante ao regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06 ou, a título subsidiário, se determine a adaptação dos processos de execução fiscal aqui em causa a versão da Lei n.º 25/2006 a qual lhe foi conferida pela Lei n.º 51/2015, de 08/06. A Fazenda Pública, por seu lado, sustenta que no presente caso não se encontram verificados os requisitos legalmente exigidos para que o Reclamante pudesse usufruir do regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06. Consequentemente, pugna pela improcedência da presente acção. Deste modo, temos que o objecto do presente processo se circunscreve em aferir se é ou não de anular o acto aqui sob reclamação. Consubstanciando como única questão a decidir a de saber se no presente caso é ou não de declarar que o ao Reclamante deverá ser aplicado o regime instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, quer quanto à regularização de dívidas, quer relativamente à versão da Lei n.º 25/2006 que aquele diploma legal lhe imprimiu. Vejamos. Importa desde já evidenciar que nos presentes autos estamos diante uma acção de reclamação de actos praticados pelo órgão da execução fiscal, consagrada e regulada pelos artigos 276º e seguintes. E temos que bem. Pois in casu temos que o Reclamante suscitou a questão de lhe ser aplicável o regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, ou o regime da Lei n.º 25/2006, que lhe fora conferido também pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, junto do órgão da execução fiscal onde correm os processos executivos referidos em 1 dos factos provados. Tendo sido no âmbito dos processos executivos referidos em 1 dos factos provados proferido o despacho que indeferiu a pretensão do Reclamante referida no parágrafo, o qual aqui se encontra sob reclamação. Pelo que outra solução não resta que não a de considerar que nos presentes autos estamos diante uma reclamação de um acto praticado pelo órgão da execução fiscal no âmbito de processos de execução fiscal, o qual afecta direitos e interesses legítimos do Reclamante. Donde, se verificam todos os requisitos estipulados no artigo 276º do CPPT para que os presentes autos corram sob a forma processual de reclamação de actos do órgão da execução fiscal. No entanto, coisa diferente, e independente da concreta fundamentação aduzida pelo órgão da execução fiscal para indeferir a pretensão do Reclamante aqui em apreciação, é saber se a concreta pretensão formulada pelo Reclamante quer no requerimento que dirigiu ao órgão da execução fiscal – constante de 2 dos factos provados – e que originou o acto aqui sob reclamação, poderia ser objecto de resposta distinta por parte do órgão da execução fiscal, que não a de indeferimento. E não poderia ser. Quer através do requerimento de fls. 2 dos factos provados, quer através da presente reclamação, o que o Reclamante efectivamente pretende é que seja aplicada às dívidas exequendas o regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, ou o regime da Lei n.º 25/2006, que lhe fora conferido também pela Lei n.º 51/2015, de 08/06. Isto porquanto as dívidas exequendas consubstanciam dívidas referentes a coimas e outros encargos de processos de contra-ordenação. Ora, conferido o artigo 1º da Lei n.º 51/2015, de 08/06, aquiesce-se que esse diploma legal procede à instituição de um regime extraordinário de regularização das dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infra-estrutura rodoviária (n.º 1) e empreende alterações à Lei n.º 25/2005, de 30/06, a qual consubstancia o regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infra-estruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem. Ora, no presente caso estamos no quadro de processos de execução fiscal através dos quais se empreende a cobrança coerciva de dívidas referentes a coimas e outros encargos de processos de contra-ordenação emergentes da utilização de infra-estruturas rodoviárias. Sendo que o processo de execução fiscal tem como base imprescindível o respectivo título executivo, o qual terá obrigatoriamente que mencionar a natureza, proveniência e montante da dívida a executar – cfr. artigo 163º, n.º 1 alínea e). Estando, por natureza, o processo de execução fiscal funcionalizado à cobrança coerciva das dívidas tributárias (exceptuando-se a especificidade do n.º 2 do artigo 148º do CPPT) entre as quais se incluem as coimas de índole tributária – cfr. artigo 148º, n.º 1, alínea c). Assim sendo, estando o processo de execução fiscal balizado pelo título executivo e funcionalizado à cobrança da dívida pelo mesmo titulada – cujo montante consta do próprio título executivo nos termos do artigo 163º, n.º 1 alínea e) – está fora do âmbito do processo de execução fiscal a pronúncia sobre a materialidade inerente à dívida exequenda, isto é, está fora do âmbito de pronúncia do processo de execução fiscal a discussão sobre a legalidade da dívida exequenda. Pelo que está vedada no processo de execução fiscal a discussão sobre a legalidade concreta da dívida exequenda, quer ab initio (isto é, relativamente à legalidade do acto tributário de onde emerge a dívida exequenda, com a excepção da norma da alínea h) do n.º 1 artigo 204º do CPPT, mas que não é manifestamente aplicável ao caso sub judice, e sempre teria de ser conhecida no âmbito de uma oposição à execução fiscal e não em sede de reclamação do acto do órgão da execução fiscal), quer na pendência do próprio processo executivo – exceptuando a questão da prescrição nos termos do artigo 175º do CPPT, mas aqui o que coloca é uma questão de inexigibilidade da dívida e não de ilegalidade da mesma. Consequentemente, enquanto o título executivo se mantiver na ordem jurídica, pois que o mesmo pode ser declarado nulo por efeito de decisão judicial que expurgue da ordem jurídica o acto de onde emerge a dívida que o mesmo titula, a dívida exequenda manter-se-á a mesma – com exclusão dos juros de mora que entretanto se vão vencendo – o processo de execução fiscal prosseguirá os seus termos a fim de cobrar a dívida exequenda. O princípio é: estabilizado que está o acto (ou respectivo instrumento jurídico) que conforma a dívida, a execução far-se-á nos seus termos. Assim, não se poderá no processo de execução fiscal, salvo norma legal que especialmente o determine, tratar de proceder a alterações substanciais da dívida exequenda. E tal não acontece no regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06. Pois, conferindo-se o referido diploma legal constata-se que existe uma única previsão de extinção automática do processo de execução fiscal instaurado para a cobrança das dívidas aí referidas, que é o do n.º 1 do artigo 4º, a qual se verifica nos casos em que se verifica “A subsistência até ao último dia do segundo mês anterior à publicação da presente lei de qualquer processo de execução fiscal que vise apenas a cobrança de juros e custas resultantes do não pagamento de taxas de portagem, encontrando-se regularizada a dívida associada, determina a extinção da execução da dívida, sem demais formalidades.”. O qual não é manifestamente o caso dos presentes autos, pois que no presente caso ainda se encontram em cobrança coerciva dívidas referentes a coimas. Todos os demais casos previstos na Lei n.º 51/2015, de 08/06, implicam, uma vez verificados os respectivos pressupostos, a redução de coima, redução esta, porquanto inexiste qualquer atribuição legal de competência para tanto, não pode nem ser efectuada no processo de execução fiscal, nem pelo órgão da execução fiscal. Consequentemente, por tudo quanto vai dito, nem o órgão da execução fiscal poderia deferir a pretensão formulada pelo Reclamante nos termos de 2 dos factos provados, pois não tem competência para tanto, nem no âmbito do processo de execução fiscal se poderá determinar a aplicação e/ou inclusão do Reclamante do/no regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06. Pelo que se improcede a pretensão principal aqui peticionada pelo Reclamante. E o mesmo será de declarar relativamente ao pedido subsidiário formulado pelo Reclamante na presente reclamação. Relembre-se que tal pedido subsidiário se consubstancia na adaptação dos presentes processos executivos aqui em causa à nova versão da Lei n.º 25/2006 que lhe foi conferida pela Lei n.º 51/2015, de 08/06. Sendo que tal pedido se concretiza, conferida a alegação mobilizada pelo Reclamante, na aplicação ao Reclamante do regime mais favorável instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, à Lei n.º 25/2006. Com efeito, também não poderá ser em sede ou no âmbito do processo de execução fiscal que se poderá conhecer e/ou reconhecer que o regime da Lei n.º 25/2006 instituído pela entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, de 08/06, será concretamente mais favorável ao Reclamante, ou se o mesmo lhe poderá ser aplicável, porquanto a mesma contende com as concretas coimas aplicadas ao Reclamante. Pelo que tal competência será do serviço tributário da área onde tiver sido praticada a infracção e respectivo dirigente nos termos dos artigos 67º, 76º e 52º do RGIT. (...) não poderá ser nem no âmbito do processo de execução fiscal que se poderá aferir se no caso das coimas de onde emergem as dívidas aqui exequendas, nem em sede de reclamação de actos do órgão da execução fiscal que se poderá determinar qual o regime contra-ordenacional mais favorável ao Reclamante.» (fim de transcrição) Concluindo, é para nós evidente que não assiste razão ao Recorrente, não só pelos motivos aduzidos na sentença, mas, também, pela argumentação enunciada pelo Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto no parecer acima mencionado aos quais, pela sua clareza e proficiência, se passa a acompanhar de perto. É que conforme ali se atesta está vedada no processo de execução fiscal a discussão sobre a legalidade concreta da dívida exequenda, quer ab initio (isto é, relativamente à legalidade do ato tributário de onde emerge a dívida exequenda, com a exceção da norma da alínea h) do n. º 1 artigo 204 º do CPPT, mas que não é manifestamente aplicável ao caso sub judice, e sempre teria de ser conhecida no âmbito de uma oposição à execução fiscal e não em sede de reclamação do acto do órgão da execução fiscal), quer na pendência do próprio processo executivo – exceptuando a questão da prescrição nos termos do artigo 175 º do CPPT como veremos, pois nesta sede o que se coloca é uma questão de inexigibilidade da dívida e não de ilegalidade da mesma. Consequentemente, enquanto o título executivo se mantiver na ordem jurídica, pois que o mesmo pode ser declarado nulo por efeito de decisão judicial que expurgue da ordem jurídica o acto de onde emerge a dívida que o mesmo titula, a dívida exequenda manter-se-á imutável – com exclusão dos juros de mora que, entretanto, se vão vencendo – o processo de execução fiscal prosseguirá os seus termos a fim de cobrar a dívida exequenda. O princípio é: estabilizado que está o acto (ou respetivo instrumento jurídico) que conforma a dívida, a execução far-se-á nos seus termos. Logo, não se poderá no processo de execução fiscal, salvo norma legal que especialmente o determine, tratar de proceder a alterações substanciais da dívida exequenda. Advém, em síntese, dos autos que aquando da entrada em vigor do regime excecional de regularização de dívidas os processos de contraordenação que estiveram na base da instauração dos referidos PEFs, já se encontravam extintos. Não descuramos, que em abstracto, o ora Recorrente poderia usufruir dos benefícios previstos no âmbito do respetivo regime especial, mas em concreto tal não é possível pois que estava dependente de ter procedido ao pagamento das coimas, o que não sucedeu. Pois, como se atesta nos autos, o Recorrente, não efetuou o pagamento das coimas até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, de 08.06, ou seja, até 30 de setembro de 2015 (cf. artigo 4º, nº 2 e 3 e artigo 10º), condição necessária de aplicação do respectivo regime especial. Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional nesta parte. 2.2.2. Da prescrição das coimas A prescrição da obrigação tributária constitui questão de natureza substantiva, de conhecimento oficioso em qualquer degrau de jurisdição, até ao trânsito em julgado da decisão final sobre o objecto da causa, constituindo, nomeadamente, fundamento de oposição à execução (cf. artigo 204º, nº1, al. d), do CPPT), substanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cf. artigo 175º, do CPPT). Pelo que, contrariamente ao preconizado pelo Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto, cumpre dela tomar conhecimento, se nada obstar. E, desde logo, se dirá que a prescrição de conhecimento oficioso a que se refere o artigo 175º, do CPPT, é a prescrição da dívida exequenda, podendo, naturalmente, quando a dívida exequenda respeite a coima, abranger a prescrição das coimas (cf. artigo 176º, nº.2, al. c), do CPPT; artigo 34º, do RGIT), que não a prescrição do procedimento contraordenacional, dado que este fica coberto pelo trânsito em julgado da respectiva decisão de aplicação da coima, conforme, in casu, se retira do objecto dos autos, sendo que a análise desta última forma de prescrição, do procedimento contraordenacional, porque adstrita à legalidade da respectiva dívida exequenda, não pode ser apreciada no processo de execução fiscal, conforme se depreende do artigo 204º, nº.1, al. i), do CPPT (acórdãos do STA, de 01.10.2008, in rec.408/08, de 11.05.2011, in rec.409/11; e, Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.219). Ora, compulsados os autos, verificamos que dele não consta o processo executivo integral, sendo o mesmo integrado tão só pelos requerimentos apresentados pelo Executado ao longo do processo, informações prestadas pelo Serviço de Finanças e pelo chefe de finanças, e bem assim, as respostas que recaíram sobre os mencionados requerimentos apresentados, nomeadamente o despacho alvo da Reclamação, e certidões das dívidas, desacompanhadas dos demais elementos que sabemos constarem do processo executivo, nomeadamente diligências de citação, penhora, pagamentos efectuados e outros. Sendo a prescrição, uma questão de conhecimento oficioso e tendo sido arguida, impõe-se, para bem decidir da mesma, que o Tribunal que se cumpra dela conhecer atenda não apenas aos factos que as partes trouxeram ao seu conhecimento, como a todos os elementos relevantes que, constando dos processos executivos, confirmem ou infirmem a pretensão deduzida (cf. Acórdão do TCAN, de 18.01.2012, proferido no âmbito do processo n.º 00670/08.1BEBRG.). E, neste segmento refira-se que as parte não apresentaram qualquer facto ou elemento que considerem relevantes para efeitos de contagem do prazo prescricional. Temos que, por serem necessários à apreciação da prescrição, impõe-se o apurar de vários factos que não constam da decisão da matéria de facto nem dos presentes autos, nomeadamente, a data da citação para a execução fiscal, actos realizados na mesma para efeitos de obter o pagamento coercivo das dividas, sua sequência cronológica de forma a ser possível aferir as circunstâncias próprias do processo executivo, mormente as suas paragens, atento o facto de no encontrarmos presentemente no ano de 2023 e os PEF.s terem sido instaurados em 26.01.2015 a dar como certo o que consta da informação prestada em 19.09.2022 junta aos autos. Como já referimos, compulsado os autos dele não consta o processo executivo, mas tão só enxertos correlacionados com o objecto da Reclamação apresentada, ou seja, inexistem elementos juntos aos autos que permitam ampliar a decisão da matéria de facto de modo a viabilizar a apreciação da questão suscitada na sua plena dimensão. A prova documental existente nos autos, assente em informações prestadas para além de poderem induzir em erro não permite ampliar a decisão da matéria de facto. A inexistência nos autos dos elementos indispensáveis a ampliação que se reputa de necessária ao conhecimento da suscitada prescrição impede que o mesmo se realize nesta sede. De todo o modo, esse resultado de não conhecimento da prescrição, não será definitivo, pois assiste ao Recorrente o direito de suscitar a questão em sede de execução, ou seja, sempre a mesma poderá ser invocada através de outro meio processual que a lei lhe faculta (a arguição perante o chefe do Serviço de Finanças, com a possibilidade de apresentação posterior da correspondente reclamação prevista no art. 276º do CPPT). Deste modo, não podendo, sem mais, lograr-se o julgamento da questão da prescrição ex novo suscitada, a este Tribunal ad quem, dela não se conhece e, no mais, cumpre validar a sentença recorrida no exactos termos do julgado. 2.3. Conclusões I. Estando o processo de execução fiscal balizado pelo título executivo e funcionalizado à cobrança da dívida pelo mesmo titulada – cujo montante consta do próprio título executivo nos termos do artigo 163 º, n. º 1 alínea e) do CPPT – está fora do âmbito da discussão do processo de execução fiscal a pronúncia sobre a materialidade inerente à dívida exequenda, isto é, sobre a legalidade da dívida exequenda II. Não tendo o ora Recorrente efectuado o pagamento das coimas até 60 dias a contar da entrada em vigor do regime extraordinário de regularização das dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infraestrutura rodoviária [Lei n.º 51/2015, de 08.06, ou seja, até 30 de setembro de 2015 (cf. artigo 4º, nº 2 e 3 e artigo 10º], está-lhe vedado o poder usufruir dos benefícios previstos no âmbito daquele regime. III. A prescrição do procedimento de contraordenação pode ser conhecida oficiosamente no recurso de contraordenação interposto nos termos do art. 80.º do RGIT, já a prescrição da coima pode ser conhecida oficiosamente no âmbito do processo de oposição enquanto fundamento previsto na alínea d) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT por se subsumir na hipótese legal de “prescrição da dívida exequenda” ou em sede de reclamação ao abrigo do artigo 175º, do CPPT. 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida e não conhecer da prescrição suscitada. Custas pela Recorrente. Porto, 13 de abril de 2023 Irene Isabel das Neves Ana Paula Santos Margarida Reis |