Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00183/19.6BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/16/2024
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:POSICIONAMENTO REMUNERATÓRIO;
IMPOSSIBILIDADE DE RECONSTITUIÇÃO DA SUA CARREIRA PROFISSIONAL EM TERMOS DE POSICIONAMENTO REMUNERATÓRIO;
Sumário:
O associado do Autor não tem direito a que o tempo de serviço prestado sob o regime de contrato de trabalho a termo resolutivo certo celebrado com a Entidade Demandada seja relevado no âmbito do desenvolvimento da relação jurídica de emprego público titulada por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional (STAL), em representação do seu associado «AA», instaurou acção administrativa contra a Freguesia ..., todos melhor identificados nos autos, pedindo a anulação do acto impugnado, consubstanciado no acto de 26/12/2018, bem como, a condenação da Entidade Demandada a:
- Reconhecer o direito do sócio do Autor à relevância do tempo de serviço na situação de contrato de trabalho a termo resolutivo certo, mais precisamente todo o tempo de serviço decorrido entre 2/6/2003 e 1/2/2012;
- Decretar a anulação administrativa dos actos e procedimentos administrativos que tenham sido proferidos pelos órgãos e entidades competentes da Ré, em ordem à aplicação ao sócio do Autor das normas do artigo 18º da Lei do Orçamento de Estado para 2018;
- Notificar o sócio do Autor dos pontos atribuídos desde 1/1/2004, bem como de que quanto aos anos ou ciclos avaliativos contemplados com a pontuação mínima, disporá de um prazo de cinco dias úteis para requerer o suprimento da avaliação em falta, não através da pontuação, mas por ponderação curricular;
- Proceder ao posicionamento remuneratório decorrente do procedimento da aplicação das normas do artigo 18º, da LOE/2018 no pressuposto da relevância do tempo de serviço anterior a 1/2/2012, concretamente desde 2/6/2003;
- Até ao termo do procedimento de aplicação das normas do artigo 18º da LOE/18 proceder, para já, ao posicionamento do sócio do Autor no pressuposto da reunião de um ponto por cada ano desde 2004, até 2012 inclusive, e dois por cada biénio deste ano em diante;
- Tendo em conta as regras do artigo 18º, nº 8, da LOE/2018 e dos artigos 2º e 3º do DL nº 29/2019, de 20/2, pagar ao sócio do Autor as diferenças salariais entre a retribuição efectivamente paga e a legalmente devida;
- Pagar juros de mora à taxa legal sobre as quantias antecedentes.
Por decisão proferida pelo TAF de Aveiro foi julgada improcedente a acção.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:
a) A Recorrida celebrou, em 23/06/2003, com o sócio do Recorrente, um contrato de trabalho a termo resolutivo certo ao abrigo da alínea d) do n.º 2 do artigo 18.º, do Decreto-Lei n.º 427/89, preceito que refere o seguinte: «...Aumento excepcional da actividade do serviço...» (cfr. ponto 1, da fundamentação de facto), celebrado pelo período de 6 meses (cfr. documento nº ... junto à p.i. não impugnado), com a cláusula de que não se convertia em caso algum em contrato sem termo (cfr. ponto 2 da fundamentação de facto);

b) O sócio do Recorrente manteve-se ao serviço da Recorrida à sombra deste contrato até 1/01/2012, data em que, na sequência de procedimento de recrutamento e seleção, foi celebrado entre ambos contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, com o mesmo escopo do contrato a termo resolutivo certo, isto é, para obter daquele a prestação da actividade de motorista de pesados;

c) Assim, de forma incontornável, está factualmente sustentado que o sócio do Recorrente esteve oito anos e meio a prestar a actividade de que a Recorrida necessitava, mediante um contrato de trabalho a termo resolutivo certo que visava suprir um aumento excepcional do serviço alegadamente verificado por 6 meses;

d) Se assim aconteceu, muito dificilmente se poderá negar a evidência de que as necessidades do posto de trabalho sujeito a procedimento de recrutamento e seleção, do qual resultou a celebração de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, com a mesma finalidade de obter do sócio do Recorrente a actividade de motorista de pesados, se faziam sentir ab initio, isto é, desde que foi celebrado o contrato ao abrigo do qual o sócio do Recorrente iniciou funções ao serviço da Recorrida em 23/06/2003;

e) Ou seja, a Recorrida foi tomando e apropriando-se, ao longo de todo aquele tempo, do trabalho do sócio do Recorrente, sem, todavia, assumir o encargo da edificação de um posto de trabalho a ser provido por contrato de trabalho por tempo indeterminado, o que a face da lei ordinária constituiu, desde o primeiro momento uma ilicitude pela utilização digamos, padecente de ectopia, da contratação a termo resolutivo certo para provimento de necessidades permanentes de serviço;

f) O princípio constitucional é, ainda, o da segurança no emprego constante do artigo 53.º da CRP, do qual deriva que a regra é a contratação por tempo indeterminado e a excepção a contratação a termo resolutivo;

g) Consequentemente, mais de oito anos e meio a fazer a exercer as mesmas funções espelha muito mais uma necessidade permanente do serviço de que uma necessidade transitória, limitada no tempo, jamais se podendo preconizar que o posto de trabalho, e as necessidades de serviço ao mesmo inerentes, só se passaram a verificar oito anos e meio após a primeira contratação a termo resolutivo certo;
h) Encontrando-se, à saciedade, demonstrado que a prorrogação de um título apresentado como destinado a um aumento excepcional da actividade sentido em 23/06/2003, perdurou ao longo de oito anos e meio;

i) Neste contexto, ao longo de oito anos e meio a Recorrida violou a lei a constituição e, a final, o direito comunitário em concreto o artigo 5.º do Acordo-Quadro anexo à Diretiva n.º 1999/70/CE do Conselho, de 28 de Junho de 1999, respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP;

j) Fez tábua rasa da proibição da conversão do contrato de trabalho a termo resolutivo certo em contrato de trabalho por tempo indeterminado, em qualquer caso, acompanhada de sancionamentos pela lei ordinária e interna para o caso da celebração de contratos a termo resolutivo fora das normas que a permitiam nomeadamente: artigo 18.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 427/89; 10.º, n.º 3, 92.º, n.º 3 do RCTFP e 63.º, n.º 1, da LTFP;

l) Apesar da proibição da conversão do contrato de trabalho a termo resolutivo certo em contrato de trabalho por tempo indeterminado, em qualquer caso, acompanhada de sancionamentos para o caso da celebração de contratos a termo resolutivo fora das normas que a permitiam nomeadamente: artigo 18.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 427/89; 10.º, n.º 3, 92.º, n.º 3 do RCTFP e 63.º, n.º 1, da LTFP

l) Violou as normas do artigo 53.º da CRP, ao manter o sócio do Recorrente sob contratação a termo para fins diversos desta forma de vinculação;

m) Pelo que, legitimar a recusa da relevância do tempo de serviço ao abrigo de uma forma de vinculação claramente desajustada conduziria a uma solução, não de direito, mas injusta e iníqua na medida em que, com todo o respeito salvaguardando as distâncias devidas, “o crime acabaria compensado”, isto é, a conduta ilícita da parte da Recorrida ao longo de todo aquele tempo de utilização abusiva da contratação a termo resolutivo certo, eximindo-se, desta forma ínvia, de assumir os encargos advenientes de um posto de trabalho correspondente a necessidades permanentes do serviço com os encargos inerentes ao desenvolvimento da carreira e categoria, constitui desde logo uma violação do princípio da legalidade e da justiça constante das normas do artigo 266.º, n.º 2, da CRP e dos artigos 3.º e 8.º do Código do Procedimento Administrativo;

n) Não havendo como ter por não aplicáveis as normas do artigo 11.º, da LTFP, 13.º da Lei n.º 112/2017;

o) Em última instância não anular o acto administrativo em causa nestes autos equivale a rasurar aquilo que o direito comunitário sanciona desde o início do milénio ou dar efeitos a uma conduta a todos os títulos ilícita;

p) Consequentemente, o espírito ou teleologia das normas dos artigos 13.º da Lei n.º 112/2017 e 11.º da LTFP e do direito comunitário, tem aqui campo para injungir condutas administrativas, no caso relevar o tempo de serviço de prestação de trabalho ao abrigo de contratação a termo resolutivo certo para efeitos de antiguidade na carreira e categoria;

o) Pelo que o douto aresto recorrido fez errado julgamento da questão apresentada em juízo, violando as normas da lei, da CRP e do Direito Comunitário invocadas nas conclusões antecedentes, nomeadamente artigos 11.º da LTFP, 13.º da Lei n.º 112/2017, 53.º e 266.º, n.º 2 da CRP, 3.º e 8.º do CPA e em derradeira instância 5.º do Acordo-Quadro anexo à Diretiva n.º 1999/70/CE do Conselho, de 28 de Junho de 1999, respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP.

Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente revogando-se a sentença recorrida cumprindo-se desta forma a lei e fazendo-se
JUSTIÇA
A Ré juntou contra-alegações, concluindo:

- As conclusões do recurso definem e delimitam o seu objecto.

- O objecto do presente recurso é a apreciação da relevância do tempo de serviço prestado pelo associado do Autor na situação de contrato de trabalho a termo resolutivo certo na contagem para o seu posicionamento remuneratório.

- O Recorrente não impugna a decisão sobre a matéria de facto. Assim, os factos provados são os que constam da douta sentença recorrida.

- A douta sentença recorrida contém uma fundamentação clara, coerente e desenvolvida da decisão final.

- Essa fundamentação está conforme à jurisprudência unânime que se tem pronunciado sobre esta questão.

- As conclusões de recurso invocam várias questões e contêm várias considerações de direito que não têm a ver com o objecto da acção nem com douta sentença recorrida.

- Não constitui objecto da acção a segurança no emprego.

- A questão em análise centra-se numa relação de trabalho em emprego
público e não no âmbito de uma relação de contrato individual de trabalho.

- A alteração do posicionamento remuneratório que o Recorrente pretende pressupunha a integração do seu associado numa carreira o que não acontecia uma vez que estava contratado a termo resolutivo.

10ª - A douta sentença recorrida fez correcta aplicação das disposições legais aplicáveis e não se verifica a existência de inconstitucionalidade de qualquer norma aplicável ao caso dos autos.

NESTES TERMOS, o recurso interposto deve ser julgado improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida.

A Senhora Procuradora Geral Adjunta notificada, ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
A este respondeu o Autor nos termos que aqui se dão por reproduzidos.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1) Em 23/06/2003, o associado do Autor celebrou com a Entidade Demandada “contrato de trabalho a termo certo”, ao abrigo da al. d) do nº 2 do artigo 18º do DL nº 427/89, de 7 de Dezembro, pelo período de seis meses, renovável por um novo período de tempo, com início em 23/06/2003, para o exercício de funções de motorista de pesados, por um período de trabalho de 35 horas semanais, mediante o pagamento da retribuição base mensal de 459,29 € correspondente ao vencimento da categoria de Motorista de Pesados, inserida na carreira profissional com o mesmo nome da Administração Local (índice 148 do escalão 1) – cfr. doc. nº ... junto com a PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
2) Do contrato referido no ponto anterior constam, nomeadamente, as seguintes cláusulas: “(...)
CLÁUSULA TERCEIRA
(...)
4 – O presente contrato de trabalho a termo certo não se converte, em caso algum, em
contrato sem termo.
CLÁUSULA QUARTA
1 – Este contrato não confere à Primeira Outorgante a qualidade de agente administrativo e
rege-se nos casos omissos pela legislação legal aplicável sobre contratos de trabalho a termo
certo, com as especialidades previstas no Decreto-Lei nº 427/89 de 7 de Dezembro e Decreto-Lei nº 184/89 de Junho, nos termos do nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 409/97 de 17 de Dezembro
(...)” – cfr. doc. nº ... junto com a PI;
3) Em 01/02/2012, entre a Entidade Demandada e o associado do Autor foi celebrado “contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado”, ao abrigo da Lei nº 59/2008, de 11 de Setembro, na sequência da selecção do trabalhador em procedimento concursal aberto para preenchimento de um posto de trabalho na categoria de assistente operacional, da carreira de assistente operacional (motorista de pesados), constando do aludido contrato, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, designadamente, as seguintes cláusulas:
“(...)
Primeira
(Início e duração)
O presente contrato de trabalho em funções públicas produz os seus efeitos a partir de um de Fevereiro de dois mil e doze, data em que o Trabalhador inicia a actividade, durando por tempo indeterminado.
O presente contrato fica sujeito a período experimental, com a duração máxima permitida pelo disposto no artigo 76º do RCTFP para a carreira e categoria do Trabalhador.
Segunda
(Actividade contratada)
1. Ao Segundo outorgante é atribuída a categoria de assistente operacional, da carreira de assistente operacional (motorista), sendo contratado para, sob a autoridade e direcção do Primeiro Outorgante, e sem prejuízo da autonomia técnica inerente à actividade contratada, exercer as funções próprias da categoria.
(...)
Quarta
(Período normal de trabalho)
1. O Segundo Outorgante fica sujeito ao período normal de trabalho diário e semanal de 7 e 35 horas, respectivamente, sendo o horário de trabalho definido pelo Primeiro Outorgante, dentro dos condicionalismos legais.
Quinta
(Remuneração)
1. A remuneração base do Segundo Outorgante é fixada nos termos do disposto no artigo 214º do RCTFP, sendo de € 485,00 correspondente à categoria de Assistente Operacional, 1ª posição remuneratória, nível remuneratório 1.
(...)” – cfr. doc. nº ... junto com a PI;
4) O associado do Autor manteve-se a trabalhar ao serviço da Entidade Demandada desde 23/06/2003 até 01/02/2012 – por acordo;
5) Em 28/11/2018, o Autor endereçou à Junta de Freguesia ... requerimento solicitando o posicionamento remuneratório do seu associado na 4ª posição remuneratória da categoria de assistente operacional da carreira de assistente operacional – por acordo;
6) Com data de 26/12/2018, o Presidente da Junta de Freguesia ... comunicou ao Autor o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)” – cfr. doc. nº ... junto com a PI.
DE DIREITO
Constitui entendimento unívoco da doutrina e obteve consagração legal o de que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia, dos casos que imponham o seu conhecimento oficioso.
Assim,
É objecto de recurso a sentença que julgou improcedente a acção proposta pelo Autor, aqui recorrente, absolvendo a Ré, aqui recorrida, do pedido.
No essencial o pedido do Autor era o reconhecimento ao seu associado «AA» à relevância do tempo de serviço na situação de contrato de trabalho a termo resolutivo certo e que esse tempo de serviço contasse para o seu posicionamento remuneratório.
As conclusões de recurso, como se disse, definem e delimitam o seu objecto, isto é, as questões que podem e devem ser apreciadas.
O Recorrente não põe em causa o probatório. Por esse motivo os factos a considerar para a decisão de direito são os que constam da sentença.
Quanto à questão de direito é indubitável que a sentença recorrida contém uma fundamentação clara, coerente e desenvolvida da decisão final.
Anote-se que o constante das conclusões sob as alíneas c), d), e), f) e g) não tem a ver com o objecto da acção.
O que está em causa na acção é a alteração do posicionamento remuneratório na carreira do associado do Recorrente e não a sua segurança no emprego (conclusão f)).
O art. 56º, n.º 6 da LGTFP refere expressamente que não são aplicáveis ao vínculo de trabalho em funções públicas a termo resolutivo as normas relativas a carreiras, mobilidade e colocação em situação de requalificação.
Não tem enquadramento nem suporte legal relevar o tempo de trabalho prestado ao abrigo de contrato de trabalho a termo resolutivo para efeitos de reposicionamento remuneratório após o ingresso na carreira com celebração de um contrato de trabalho por tempo indeterminado em funções públicas.
A alteração do posicionamento remuneratório que o Recorrente pretende pressupunha a integração do seu associado numa carreira, o que não acontece quando estamos perante uma contratação a termo.
As conclusões das als. h) a o) são considerações que não têm aplicação aos factos que foram provados.
Nos autos, repete-se, aprecia-se uma questão do regime de trabalho em funções públicas e ao mesmo não se aplicam as disposições do contrato individual de trabalho que o Recorrente invoca. A existência de vínculo de trabalho em funções públicas tem outras consequências para além do posicionamento remuneratório. Se não houver essa integração tais consequências não se podem produzir.
Em suma,
Retomando o caso concreto, forçoso será concluir que o associado do Autor não tem direito a que o tempo de serviço prestado sob o regime de contrato de trabalho a termo resolutivo certo celebrado com a Entidade Demandada, de 02/06/2003 a 01/02/2012, seja relevado no âmbito do desenvolvimento da relação jurídica de emprego público titulada por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, com a consequente reconstituição da sua carreira profissional em termos de posicionamento remuneratório. Não podendo, pois, proceder a pretensão do Autor, no sentido do seu associado vir reunindo tempo, desde 2004, para a mudança de posição remuneratória, nos termos do artº 113º, nºs 1, 2 e 7, da LVCR e do artº 18º, nºs 2 a 8, da Lei nº 114/2017, de 29/12, na medida em que vem fundada no direito à contagem do tempo de serviço prestado em momento anterior à integração do trabalhador na carreira de assistente operacional, o que não pode ser atendido.

Nesta conformidade, não padecendo a decisão da Entidade Demandada, com fundamento nas normas legais enunciadas pelo Autor, da invalidade que lhe vem imputada e não beneficiando o seu associado do alegado direito à contagem do tempo de serviço anteriormente prestado ao abrigo de contrato de trabalho a termo para efeitos de contabilização do tempo necessário à mudança de posição remuneratória, terá de improceder in totum a presente acção.

Com interesse para a apreciação da questão, avoca-se o Acórdão deste TCAN proferido em 14/10/2022, no processo nº 408/21.8BEPNF, cujo sumário reza assim:
“I-O SIADAP é aplicável a todos os trabalhadores ao serviço da Administração Pública, aplicando-se aos trabalhadores vinculados mediante contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo.
II-A avaliação do desempenho, assente em critérios que visam reconhecer o mérito do desempenho profissional de cada trabalhador, releva na carreira, designadamente para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório (art. 52.º, n.º 1, al. e) da LVCR e 91.º da LGTFP).
III- A alteração de posicionamento remuneratório pressupõe a integração do trabalhador numa carreira, o que não ocorre na contratação a termo (Art.º 56.º, n.º 6 da LGTFP).
IV-Nas situações em que os trabalhadores contratados a termo venham a celebrar contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, apenas relevam para alteração do posicionamento remuneratório, as avaliações obtidas na situação jurídico-funcional de contratados por tempo indeterminado.”.
Sucede, ainda que, no litígio submetido a apreciação, ou seja, a impugnação do ato da Recorrida consubstanciado no ato de 26/12/2018, emitido pelo Presidente da Junta de Freguesia ..., sob o assunto: “contagem de pontos e alteração de posicionamento remuneratório, «AA»”, não foi suscitada a questão da constitucionalidade, por violação do artigo 56.º da CRP, dos efeitos do contrato a termo resolutivo, assinado em 23/06/2003 entre o associado do Recorrente e a Junta de Freguesia ... e celebrado ao abrigo da al. d) do nº 2 do artigo 18º do DL nº 427/89, de 7 de Dezembro.
E também nunca foi questionada a aplicação, in casu, da regra do artigo 56.º, n.º 6 da LGTFP, sendo certo que se tal tivesse acontecido, teria determinado uma pronúncia do Tribunal recorrido sobre a conformidade com as regras específicas da Lei n.º 112/2017, de 29/12 que veio estabelecer o Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública-PREVPAP e com a CRP.
Não se enquadra o discurso recursivo com o princípio geral da aplicação das leis no tempo, consagrado no artigo 12.º, n.º 3 do Código Civil, isto é, como compaginar as regras do PREVPAP que se destinam a regularizar as relações de trabalho precárias, como seja, o contrato de trabalho de funções públicas a termo resolutivo com a situação jurídico-funcional de contratados por tempo indeterminado e esquecer a norma específica do artigo 56.º, n.º 6 da LGTFP.
Temos, pois, aqui, que o objeto do presente recurso se traduz numa questão nova que se considera subtraída à apreciação deste Tribunal ad quem.
É entendimento jurisprudencial pacífico que os recursos se destinam a reapreciar as questões decididas pelo tribunal recorrido, (cfr. artigo 627.º do CPC) visando a alteração do decidido e não podem ser um meio de introduzir questões novas, exceto as de conhecimento oficioso, seja de mérito, seja de natureza adjetiva e, assim obter decisões diferentes com base numa fundamentação que não podia ter sido considerada na instância recorrida.

Os recursos jurisdicionais visam a reapreciação de decisões de tribunais de grau hierárquico inferior, tendo em vista a sua alteração ou anulação por erro de facto ou de direito das mesmas, não sendo admissível no recurso o conhecimento de questões que não foram colocadas nem apreciadas na decisão recorrida e que não são de conhecimento oficioso - Acórdão do STA, de 26/09/2012, proc. 0708/12.

Os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova. Por isso, e em princípio, não se pode neles tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado - Acórdão do STA, de 13/11/2013, proc. 01460/13.

Em sede de recurso jurisdicional não pode ser conhecida questão nova, que o recorrente não tenha oportunamente alegado nos seus articulados, designadamente a invocação de um novo vício do ato impugnado, por essa matéria integrar matéria extemporaneamente invocada sobre a qual a sentença impugnada não se pronunciou, nem podia pronunciar-se - Acórdão do TCA Sul, proc.° 5786/09, de 3 de fevereiro.

O objectivo do recurso jurisdicional é a modificação da decisão impugnada, pelo que, não tendo esta conhecido de determinada questão por não ter sido oportunamente suscitada, não pode o Recorrente vir agora invocá-la perante este tribunal ad quem, porque o objecto do recurso são os vícios da decisão recorrida.

Como ensina Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2018, Almedina, pág. 119: “… os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. Seguindo a terminologia proposta por Teixeira de Sousa, podemos concluir que tradicionalmente temos seguido um modelo de reponderação que visa o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame que permita a repetição da instância no tribunal de recurso. Compreendem-se perfeitamente as razões que levaram a que o sistema tenha sido assim desenhado. A diversidade de graus de jurisdição determina que, em regra, os Tribunais Superiores apenas devem ser confrontados com questões que as partes discutiram nos momentos próprios.”.
Como sentenciado,
No emprego público, como bem nota o Apelante, não existe norma jurídica que permita fazer relevar o tempo de trabalho prestado ao abrigo de contrato de trabalho a termo resolutivo para efeitos de reposicionamento remuneratório após o ingresso na carreira com celebração de um contrato de trabalho por tempo indeterminado em funções públicas.
Nas situações em que os trabalhadores contratados a termo venham a celebrar contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, apenas relevam para alteração do posicionamento remuneratório, as avaliações obtidas na situação jurídico-funcional de contratados por tempo indeterminado, na ausência de norma legal que atribua, para efeitos de carreira, relevância ao tempo de serviço anteriormente prestado ao abrigo de um outro contrato de diferente natureza e atendendo a que, só a partir dessa data se podem os mesmos considerar integrados numa carreira, e, como tal, abrangidos pelas normas referentes à alteração do posicionamento remuneratório.
Revertendo ao caso sub judice, forçoso será concluir que o associado do Autor não tem direito a que o tempo de serviço prestado sob o regime de contrato de trabalho a termo resolutivo certo celebrado com a Entidade Demandada, de 02/06/2003 a 01/02/2012, seja relevado no âmbito do desenvolvimento da relação jurídica de emprego público titulada por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, com a consequente reconstituição da sua carreira profissional em termos de posicionamento remuneratório.
Não podendo, pois, proceder a pretensão do Autor, no sentido do seu associado vir reunindo tempo, desde 2004, para a mudança de posição remuneratória, nos termos do art. 113°, n°s 1, 2 e 7, da LVCR e do art. 18°, n°s 2 a 8, da Lei n° 114/2017, de 29/12, na medida em que vem fundada no direito à contagem do tempo de serviço prestado em momento anterior à integração do trabalhador na carreira de assistente operacional, o que não pode ser atendido, como se viu.
Nesta conformidade, não padecendo a decisão da Entidade Demandada, com fundamento nas normas legais enunciadas pelo Autor, da invalidade que lhe vem imputada e não beneficiando o seu associado do alegado direito à contagem do tempo de serviço anteriormente prestado ao abrigo de contrato de trabalho a termo para efeitos de contabilização do tempo necessário à mudança de posição remuneratória, será de improceder in totum a presente acção.
Ademais, a argumentação recursiva não é passível de demonstrar a existência de quaisquer vícios da sentença recorrida, sendo que dessa argumentação ressalta a invocação de questões jurídicas novas que não foram tratadas pelo Tribunal recorrido e, que, como tal, repete-se, não podem ser enfrentadas nesta sede.
De sublinhar ainda que se considera manifestamente insuficiente a alegação genérica de que a conduta da Ré, viola princípios com consagração constitucional ou Direito Comunitário, dada a omissão de substanciação fáctico-jurídica subjacente a esses putativos vícios.
Com efeito, o Autor não aduz quaisquer razões de facto e de direito em que se concretizam as referidas causas de invalidade. Nessa parte, por isso, a sua pretensão sempre estaria votada ao insucesso, por falta da exigível substanciação essencial da causa de pedir.
Improcedem as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente, sem prejuízo da isenção subjetiva de que beneficia - art.º 4.º, n.º 1, alínea h), do RCP -.
Notifique e DN.
Porto, 16/02/2024

Fernanda Brandão
Isabel Jovita
Rogério Martins