Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00022/14.4BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/15/2020
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:HORÁRIO ESPECÍFICO DE TRABALHO; TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS; 40 HORAS.
Sumário:I – A Lei n.º 68/2013, de 29.08, aprovou o novo regime de duração do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas, aumentando as horas diárias e semanais, o que implicou a modificação, em concreto, dos diversos horários para todos e cada um dos serviços públicos abrangidos pelo âmbito de aplicação da lei mediante os inerentes actos e regulamentos administrativos.

II – De acordo com o artigo 135.º, n.º 2, do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas todas as alterações dos horários de trabalho (com excepção daquelas cuja duração não exceda uma semana) devem observar as seguintes formalidades, justificadas pelas possíveis repercussões das alterações em causa na esfera pessoal dos trabalhadores: ser fundamentadas e precedidas de consulta aos trabalhadores afectados, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais e ser afixadas no órgão ou serviço com antecedência de sete dias, ainda que vigore um regime de adaptabilidade.

III – As alterações efectivadas pelos serviços públicos em sede de adaptação da Lei “das 40 horas” aos respectivos trabalhadores não ficam fora do âmbito de aplicação daquele normativo.
(Retirado do acórdão deste Tribunal de 06.11.2015, no processo 6/14.2 AVR).*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:M., EM
Recorrido 1:SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL E REGIONAL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

M., EM ., veio interpor o presente recurso jurisdicional do saneador-sentença, de 27.03.2017, pelo qual foi julgada procedente a acção administrativa especial que lhe moveu o SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL E REGIONAL (STAL) e, em consequência, foi anulado o acto impugnado proferido pelo Director Executivo da Entidade Demandada, datado de 28.09.2013, que determinou a alteração do período normal de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço, em regime de cedência por interesse público, passando de 7 horas de trabalho diárias e 35 horas semanais, para um período normal de trabalho diário de 8 horas e 40 horas semanais.

Invocou, em síntese, e para tanto, que a decisão recorrida violou a imperatividade do artigo 2º da Lei nº 69/2013, de 29.08, determinada pelo artigo 10º do mesmo diploma legal, razão pela qual a Ré tinha de observar os procedimentos previstos no nº 2 do artigo 135.º do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas.
O Recorrido apresentou contra-alegações em que pugna pela manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu parecer.
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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1. Afigura-se inquestionável que a Lei 68/2013 de 29 de agosto é aplicável à recorrente jurisdicional e aos funcionários das empresas do sector empresarial local em regime de cedência de interesse público, ou seja, que mantenham um vínculo laboral de natureza pública, nas quais coexistem dois regimes jurídicos distintos para os respetivos trabalhadores – os que celebraram contratos de trabalho com as próprias empresas encontram-se submetidos a um vínculo laboral de natureza privada, sendo o seu regime o do contrato individual de trabalho previsto no Código do Trabalho; os que se encontram em regime de cedência de interesse público, e que verdadeiramente não são funcionários ou trabalhadores das empresas do sector empresarial local mas sim das suas entidades de origem (e por isso se diz que se encontram em regime de “cedência”) possuem um vínculo laboral de natureza pública, encontram-se submetidos ao RCTFP.

2. Tal Lei, de caráter imperativo, resulta da concreta e excecional situação económica e financeira que atravessa o Estado português, e dos compromissos por este assumidos no plano internacional, em matéria de redução estrutural e duradoura da despesa pública, condição imprescindível para a consolidação das finanças públicas, e para a convergência do regime laboral do sector público com as regras de trabalho do sector privado, permitindo aproximar o período normal de trabalho na Administração Pública em Portugal com a média das Administrações Públicas dos restantes Estados Membros da União Europeia, bem como com o período normal de trabalho do sector privado. Essencialmente, este diploma, fixa o período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas em oito horas por dia e quarenta horas por semana, sem prejuízo da existência de períodos normais de trabalho superiores, previstos em diploma próprio e prevalecendo sobre quaisquer leis especiais e instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.

3. Este regime jurídico relativo ao horário de trabalho diário e semanal dos trabalhadores em funções públicas possui um evidente caráter imperativo, é de aplicação imediata, passada que seja a vacatio legis do diploma e, no limite, poderia até ser aplicado de forma automática, dispensando qualquer ato de intermediação por parte de órgãos ou agentes da administração – como sustentou, aliás, a própria Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público.

4. Assim, o despacho impugnado limitou-se a ter como objeto a definição de uma data para a aplicação da Lei nº 68/2013 que veio introduzir uma alteração da duração do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas – o que, de resto, seria inclusivamente desnecessário pelo facto de o diploma em causa se mostrar diretamente aplicável sem intermediação administrativa.

5. O acto anulado, proferido pelo então Diretor Executivo da M., EM, de 28/09/2013, mediante o qual se estabeleceram novos horários de trabalho para os trabalhadores da referida recorrente jurisdicional em regime de contrato de trabalho em funções públicas limitou-se a determinar a aplicação dos períodos normais de trabalho legalmente definidos a partir de 28 de setembro de 2013, não tendo, portanto, o mesmo de observar os procedimentos previstos no nº 2 do artigo 135.º do RCTFP.

6. Nessa medida, o ato cuja anulação foi decretada pelo douto Tribunal a quo, no que podemos ter por involuntário erro de julgamento de direito, além de não violar nenhuma das disposições legais contidas no novo regime aprovado pela Lei 68/2013 de 29 de agosto, limitou-se a aplicá-lo, dando-lhe uma efetividade prática que a sua norma matriz já possuía. Donde, não se verificar nenhuma irregularidade procedimental ou material por parte da aqui recorrente e do seu, ao tempo, Diretor-Executivo na prolação do ato cuja impugnação foi pedida e decretada.
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II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

A) A Entidade Demandada é uma pessoa coletiva de direito público, sob a forma de entidade empresarial municipal, dotada de personalidade jurídica e autonomia administrativa, financeira e patrimonial, de capitais exclusivamente do Município de (...), que tem como escopo nuclear proporcionar a mobilidade dos cidadãos de (…) através do transporte coletivo rodoviário e fluvial.

B) A Entidade Demandada foi gerada por força da reestruturação dos Serviços Municipais de (...) ocorrida em 2005, que consistiu na extinção do Serviço de Transportes Urbanos dos Serviços Municipais de (...) e na entrega do sector das águas à Águas da Região de (...), SA.

C) Os funcionários do quadro de pessoal em regime de direito público dos Serviços Municipais de (...), afetos ao Serviço de Transportes Urbanos de (...), transitaram para a então recém criada M. sob o regime de requisição, segundo as normas do artigo 37º da Lei nº 58/98, de 18.08.

D) A transição no regime de requisição para M. dos funcionários do quadro de pessoal em regime de direito público dos Serviços Municipais de (...) afetos ao Serviço de Transportes Urbanos de (...), não alterou os direitos emergentes da relação jurídica de emprego que estes detinham com os Serviços Municipais de (...).

E) Os funcionários dos reestruturados Serviços Municipais de (...), que atualmente se encontram ao serviço da Entidade Demandada sob a figura da cedência por interesse público, mantiveram o mesmo regime de duração diária e semanal do trabalho de 35 horas semanais e 7 horas diárias.

F) Entre o Autor e a Entidade Demandada foi celebrado um Acordo de Empresa, publicado em 22.09.2009, no Boletim de Trabalho e Emprego nº 35.

G) Até à prolação do ato impugnado, os trabalhadores da Entidade Demandada, provindos do Município de (...) por cedência de interesse público, cumpriam horário semanal de 35 horas e diário de 7 horas.

H) Em 28.09.2013, a Entidade Demandada procedeu à aplicação da Lei nº 68/2013, de 29/08, aos seus trabalhadores que se encontram em regime de cedência por interesse público, procedendo à alteração do período normal de trabalho para 8 horas diárias e 40 (quarenta) horas semanais, conforme documento nº 1 junto pelo Autor com a sua petição inicial e único documento que integra o processo administrativo incorporado nos autos, documentos que dou aqui por integralmente reproduzidos.

I- O acto identificado na alínea anterior foi praticado unilateralmente pela Entidade Demandada e não foi precedido:

- de consulta/auscultação dos seus trabalhadores que se encontram em regime de cedência por interesse público;
- de auscultação da comissão sindical do Autor existente na Entidade Demandada
- da auscultação dos delegados sindicais do Autor, trabalhadores da Entidade Demandada, nem do membro da Direção Regional de Aveiro do Autor trabalhador da Ré (factos admitidos por acordo – ponto 68 da contestação).

J) As alterações de horário, introduzidas pelo ato identificado na alínea A) supra, não foram afixadas no serviço respetivo com 7 (sete) dias de antecedência relativamente ao respetivo início (factos admitidos por acordo – ponto 68 da contestação).
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III - Enquadramento jurídico. A imperatividade da Lei nº 68/2013, de 29.08.

A decisão recorrida anulou o acto proferido pelo Director Executivo da Entidade Demandada, datado de 28.09.2013, que determinou a alteração do período normal do horário de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço, em regime de cedência por interesse público, passando de 7 horas de trabalho diárias e 35 horas semanais, para um período normal de trabalho diário de 8 horas e 40 horas semanais, em aplicação da Lei n.º 68/2013, de 29.08, considerando verificado o vício de violação do disposto no artigo 135.º n.º 2 do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11.09, dado não ter sido precedido da consulta ou auscultação dos trabalhadores e das comissões sindicais, bem como da afixação das alterações de horário no serviço respectivo, com 7 dias de antecedência relativamente ao seu início.

O Recorrente insurge-se contra a referida decisão imputando-lhe erro de julgamento de direito, considerando imperativa a norma do artigo 2º da Lei nº 68/2013, por força do artigo 10º da mesma Lei, não havendo assim lugar ao cumprimento das formalidades indicadas no artigo 135º n.º 2 do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, sendo que, aliás, a lei não faz qualquer referência para a necessidade de observar tais procedimentos.

Vejamos.

A Lei n.º 68/2013, de 29.08 aprovou o novo regime de duração do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas, alterando, por via do aumento de horas diárias e semanais, o período normal de trabalho daqueles, o que implicou, em concreto, a modificação dos diversos horários de trabalho dos órgãos ou serviços abrangidos pelo âmbito de aplicação da lei, e respectivo funcionamento.

É o seguinte o teor dos artigos 2.º e 10.º da Lei n.º 68/2013, de 29.08:

“Artigo 2.º
Período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas

1 - O período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas é de oito horas por dia e quarenta horas por semana.
2 - Os horários específicos devem ser adaptados ao período normal de trabalho de referência referido no número anterior.
3 - O disposto no n.º 1 não prejudica a existência de períodos normais de trabalho superiores, previstos em diploma próprio.
(…)
Artigo 10.º
Prevalência
O disposto no artigo 2.º tem natureza imperativa e prevalece sobre quaisquer leis especiais e instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.”

Por sua vez estabelece o artigo 132.º da Lei n.º 59/2008, de 11.09, que aprovou o Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, sobre a epígrafe “Definição do horário de trabalho” o seguinte:

“(...)
2 - As comissões de trabalhadores ou, na sua falta, as comissões intersindicais, as comissões sindicais ou os delegados sindicais devem ser consultados previamente sobre a definição e a organização dos horários de trabalho.”

Determinando o artigo 135.º (Alteração do horário de trabalho) o seguinte:

“1 – Não podem ser unilateralmente alterados os horários individualmente acordados.

2 – Todas as alterações dos horários de trabalho devem ser fundamentadas e precedidas de consulta aos trabalhadores afectados, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais e ser afixadas no órgão ou serviço com antecedência de sete dias, ainda que vigore um regime de adaptabilidade.

3 – Exceptua-se do disposto no n.º 2 a alteração do horário de trabalho cuja duração não exceda uma semana, não podendo a entidade empregadora pública recorrer a este regime mais de três vezes por ano, desde que seja registada em livro próprio com a menção de que foi previamente informada e consultada a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão sindical ou intersindical ou os delegados sindicais.

4 – As alterações que impliquem acréscimo de despesas para os trabalhadores conferem o direito a compensação económica.”

Da interpretação conjugada dos normativos supra transcritos resulta que todas as alterações dos horários de trabalho devem ser fundamentadas e precedidas de consulta aos trabalhadores afectados, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais e ser afixadas no órgão ou serviço com antecedência de sete dias, ainda que vigore um regime de adaptabilidade, excepcionando-se apenas de tal regime as alterações cuja duração não exceda uma semana, o que não é o caso em apreciação.

Conforme se sustenta no acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte de 06.11.2015, no processo nº 6/14.2 AVR, o qual se sufraga integralmente:

“Prevê tal normação um conjunto de formalidades prévias, de cumprimento obrigatório (e não meramente disciplinador), para efeitos de legalidade das alterações de horários de trabalho, justificadas, desde logo, pelo facto do horário de trabalho definir e determinar a fronteira entre o tempo em que o trabalhador se encontra na disponibilidade da entidade empregadora e aquele em que o mesmo pode dispor de tempo para si e para a sua família, usando-o em prol da sua realização pessoal, nas vertentes do lazer, cultura, actividade associativa, e outras, e de, assim, tais alterações de horário terem (ou poderem ter), repercussões significativas na esfera pessoal dos trabalhadores (basta pensar que estão em causa designadamente, as horas de entrada e saída em cada período de trabalho, os períodos de descanso, o período de duração da hora do almoço, as plataformas, os horários flexíveis, etc.).

Pelo que importa assegurar que a entidade empregadora, ora Recorrente, não altere os horários dos seus trabalhadores de modo unilateral, realizando a prévia concertação de vontades e interesses, garantindo assim, para além da invocação das razões de facto e de direito que considera fundamentarem a pretendida alteração de horários, a consulta prévia dos trabalhadores afectados ou envolvidos, da comissão de trabalhadores ou, na sua falta, da comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais, bem como a afixação da referida alteração no órgão ou serviço respectivo com a antecedência de sete dias.

Sendo que, perante o enquadramento fáctico e jurídico que se deixa traçado, a imperatividade da Lei n.º 68/2013 e a sua prevalência sobre quaisquer leis especiais e instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, por referência ao disposto no artigo 2.º da mesma lei que estabelece o novo período normal de trabalho diário e semanal, não pode obstar à aplicabilidade do regime previsto no artigo 135.º em causa, já que aquelas características não chocam com o cumprimento do referido preceito (também ele dotado de imperatividade).

Com efeito, e sem prejuízo da alteração da Lei n.º 68/2013 ter sido precedida de audiência prévia da estrutura representativa dos trabalhadores, a normação ínsita no artigo 135.º não ressalva do seu regime, nem expressa nem tacitamente, a situação em causa, mas apenas as alterações de horários cuja duração não exceda uma semana, tendo a Lei n.º 68/2013 imposto o período de atendimento e a duração do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas, diário e semanal, e não os concretos horários, nas modalidades dos respectivos períodos de trabalho, para todos e cada um dos serviços públicos.

Assim, a referida lei não retirou espaço à mediação administrativa das entidades empregadoras para realizarem os ajustamentos das novas regras à realidade concreta dos respectivos serviços. O que, no caso, significa a obrigação de, entre o demais, cumprirem os procedimentos previstos no artigo 135.º do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas de forma a garantirem o prévio conhecimento pelos trabalhadores visados das repercussões das novas alterações de horários nas respectivas vidas, dando-lhes a possibilidade de serem consultados, per si ou mediante as respectivas estruturas representativas, sobre um conjunto de situações passíveis de concertação e de ajustamentos, em prol da conciliação dos novos horários de trabalho com a sua vida familiar e de cidadania.

Sintetizando: da interpretação do disposto no referenciado artigo 135.º, literal, racional e conforme à unidade do sistema jurídico, ressalta a exigibilidade de cumprimento pelos serviços públicos empregadores, prévio a qualquer alteração de horário de trabalho, de formalidades consideradas essenciais face às possíveis repercussões na esfera pessoal dos trabalhadores.

Em sentido coincidente, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo, de 20.02.2014, proferido no processo n.º 10816/14, bem como o Acórdão do mesmo Tribunal, de 06.03.2014, proferido no processo n.º 10828/14, disponível in www.dgsi.pt/jtca.nsf.

(…)
Por outro lado, tal regra jurídica visa actividades administrativas que, na verdade, têm sempre na sua base uma lei. Pelo que é juridicamente incorrecto ver aqui uma especialidade na Lei 68/2013, como se os "horários específicos de trabalho" anteriores a 2013 não assentassem todos também numa lei, seguida de regulamentos e ou actos administrativos concretizadores.

Está, pois, sim em causa, aqui, "apenas" o modo, formalmente legal ou formalmente ilegal, de fixação do "horário específico de trabalho", por um comando jurídico-administrativo, no âmbito do "horário normal de trabalho" definido em geral e há décadas pela lei para os trabalhadores do sector público da economia.

Portanto: sempre que um Serviço Público pretender alterar, por acto administrativo ou por norma administrativa, o horário específico de trabalho (vd. assim o artigo 126º do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas) dos seus funcionários, para cumprir as leis em vigor, esse Serviço deverá ouvir previamente os trabalhadores e a comissão de trabalhadores (ou as comissões sindicais). (...)».

Com os supra expostos fundamentos e conforme resulta do probatório (alíneas H), I) e J)), em 28.09/.2013, a Entidade Demandada procedeu à aplicação da Lei nº 68/2013, de 29.08, aos seus trabalhadores que se encontram em regime de cedência por interesse público, procedendo à alteração do período normal de trabalho para 8 horas diárias e 40 horas semanais, acto que foi praticado unilateralmente e não foi precedido de consulta ou auscultação dos seus trabalhadores que se encontram em regime de cedência por interesse público, de auscultação da comissão sindical do Autor existente na Entidade Demandada ou da auscultação dos delegados sindicais do Autor, trabalhadores da Entidade Demandada, nem do membro da Direção Regional de Aveiro do Autor trabalhador da Ré, assim como as alterações de horário não foram afixadas no serviço respetivo com 7 (sete) dias de antecedência relativamente ao respetivo início.

Apesar do disposto no artigo 2º da Lei nº 68/2013 ter natureza imperativa, na definição do horário de trabalho era obrigatório o cumprimento do estabelecido no citado artigo 135º, nº 2, do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas.

Em consequência, o acto impugnado foi bem anulado, nada havendo, pois, a opor à interpretação e aplicação da lei efectivada pelo tribunal a quo, não assistindo razão à Recorrente.
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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantém a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.
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Porto, 15.05.2013


Rogério Martins
Luís Migueis Garcia
Frederico Branco