Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02044/20.7BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/08/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:REVOGAÇÃO; ACTO DE DEFERIMENTO PARCIAL DE DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA;
AUTORIDADE DE CASO JULGADO, CASO JULGADO FORMAL;
IMPOSSIBILIDADE DA LIDE;
Sumário:I - O caso julgado material ocorre quando a decisão transitada recai sobre o mérito da causa, sendo que a definição dada à relação material controvertida tem força dentro e fora do processo.

II - Uma das vertentes do caso julgado é a autoridade do caso julgado, através da qual se obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão, impondo-se à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objecto de ambas as decisões.

III - Quando a decisão proferida recaia apenas sobre a relação processual, forma-se caso julgado formal, cuja força obrigatória é apenas circunscrita ao processo – valor intraprocessual do caso julgado formal.

IV - Uma decisão que julgou extinta a instância por impossibilidade/inutilidade superveniente da lide não forma caso julgado material, dado ser uma decisão de forma e, logo, não se pronunciou sobre a relação material controvertida.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Representação da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 26/11/2023, que julgou procedente a reclamação formulada por «AA», contribuinte n.º ...65, residente em ..., 29, 6340 ..., ..., Suíça, que tem como representante fiscal em Portugal “[SCom01...], S.A.”, NIPC ...97, com sede na Avenida ..., ..., ..., contra o acto da Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças ..., proferido em 11/02/2020 e notificado em 13/07/2020, que revogou despacho anterior, datado de 27/02/2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia, e indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal n.º .........................097, instaurado, em nome da devedora originária “[SCom02...]”, por dívida de IRC, do ano de 2010, e respetivos juros compensatórios, no valor total de €2.728.852,77.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
a) Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal apresentada, nos termos do disposto no artigo 276º do CPPT, contra o despacho da Diretora de Finanças Adjunta da Direção de Finanças ..., proferido em 11-02-2020 e notificado em 13-07-2020, que revogou despacho anterior, de 27-12-2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia e indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) nº..........................097, instaurado, em nome da devedora originária “[SCom02...]”, por dívida de IRC, do ano de 2010, e respetivos juros compensatórios, no valor de € 2.278.852,77.
b) Visa o presente recurso demonstrar o desacerto a que chegou a sentença recorrida por ter declarado a ilegalidade do despacho de revogação do ato de deferimento parcial do pedido de dispensa de garantia, por ter sido praticado muito para além do prazo legal de revogação previsto no artigo 277º do CPPT.
c) Para chegar a tal conclusão, e socorrendo-se da factualidade dada como assente no seu segmento IV – Fundamentação de facto, que aqui damos por plenamente reproduzida para todos os efeitos legais, o tribunal assentiu “que o ato reclamado, datado de 11-02-2020, revogou ato anterior, proferido em 27-02-2019, de deferimento parcial do pedido do Reclamante de dispensa de garantia, que foi objeto de reclamação, nos termos do artigo 276º do CPPT, em 21-03-2019, tendo sido praticado muito para além do prazo legal de revogação a que se reporta o artigo 277º do CPPT.”.
d) Consentindo que “(...)tendo sido ultrapassado o prazo legal de revogação do ato reclamado de 27-02-2019, impõe-se a anulação do ato reclamado nestes autos por violação daquele preceito, o que tem como efeito a manutenção daquele ato na ordem jurídica.”.
e) E nesse pressuposto não conheceu do demais invocado na petição inicial, ajuizando, assim, que “fica prejudicado o conhecimento do mais invocado na petição inicial, à luz do artigo 608º, nº 2 do CPC, ex vi do artigo 2º, alínea e), do CPPT.”.
f) Com a devida vénia, a Fazenda Pública não se pode conformar com tal sentido decisório, considerando existir erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito, resultante de uma errada apreciação e valoração da prova junta aos autos.
g) Atente-se desde logo, com a devida vénia, que o Tribunal labora em erro, ao assentir que o objeto da presente reclamação é o despacho da Diretora de Finanças Adjunta da Direção de Finanças ..., proferido em 11-02-2020 e notificado em 13-07-2020, que revogou despacho anterior, de 27-12-2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia e indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) nº..........................097.
h) Na verdade, o Tribunal deveria ter apreciado nestes autos o despacho proferido em 11-02-2020, respeitante ao indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) nº..........................097, uma vez que o despacho que revogou despacho anterior, de 27-12-2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia, não foi impugnado autonomamente, conforme já previamente decidido nos autos de reclamação judicial nº 1579/20.4BEPRT.
i) A douta sentença em sede de fundamentação da matéria de facto, considerou provado (pontos 15. e 16.) que em 27-12-2019, a Diretora de Finanças Adjunta da Direção de Finanças ... proferiu despacho de deferimento parcial do pedido de dispensa de garantia e que desse despacho em 21-03-2019, o reclamante apresentou reclamação judicial junto do Serviço de Finanças ... -1, que correu termos com o nº 1549/20.4BEPRT, no qual foi proferida sentença em 15-01-2021, transitada .em julgado, que julgou extinta a instância por impossibilidade e inutilidade da lide, sem, contudo, daí extrair as devidas consequências.
j) Na sentença proferida no Proc. nº 1579/20.4BEPRT o Tribunal ajuizou que o reclamante teria de apresentar reclamação judicial do ato de revogação do despacho proferido em 27-12-2019, no prazo de 10 dias contados da sua notificação, independentemente da reclamação do novo ato, neste caso de indeferimento do pedido de isenção de prestação de garantia, o que não fez.
k) Na referida sentença, o douto Tribunal levou ao probatório, e para o que aqui releva, os seguintes factos:
7. Por despacho do órgão de execução fiscal de 11.02.2020, foi revogado o despacho proferido em 27.02.2019 - cfr. fls. 28, sitaf;
8. O reclamante foi notificado, através do oficio de 3.07.2020 (registo CTT n.º RH4............56PT), da revogação do despacho reclamado e, ainda, se pretendia que a reclamação, ainda assim, subisse ao Tribunal ou se concordava com o arquivamento - cfr. fls. 39, sitaf;
9. Em 20.07.2020 o reclamante declarou que pretendia que a presente reclamação subisse ao Tribunal - cfr. fls. 57, sitaf;
10. Da decisão proferida em 11.02.2020, o reclamante apresentou reclamação que corre termos neste tribunal sob o número 2044/20 - sitaf.”.
l) Assim, concluindo, que tendo-se consolidado a revogação do referido despacho de deferimento parcial do pedido de dispensa de garantia, este desapareceu do ordenamento jurídico.
m) Considerando o decidido naqueles autos de reclamação judicial, e salvo o devido respeito, mal andou a douta sentença ao decidir pela ilegalidade do despacho de revogação do anterior despacho de deferimento parcial da dispensa de garantia, por ter sido praticado muito para além do prazo legal de revogação previsto no artigo 277º do CPPT.
n) Sendo que ao assim decidir, o douto Tribunal não só decidiu para além do pedido, como proferiu decisão que contraria de forma inequívoca aquela outra decisão proferida no processo nº 1579/20.4BEPRT e já transitada em julgado.
o) Senão vejamos, nos presentes autos o tribunal julgou ilegal o despacho de 11-12-2021, declarando a sua anulação, por ter sido ultrapassado o prazo legal de revogação do ato reclamado de 27-02-2019, o que tem como efeito a manutenção daquele ato na ordem jurídica, ao invés, na sentença proferida no Proc. nº 1549/20.4BEPRT o Tribunal decidiu que o despacho de revogação se consolidou na ordem jurídica, fazendo desaparecer o primitivo despacho de deferimento parcial.
p) E nessa medida ao assim decidir, errou o douto Tribunal, em clara violação da autoridade de caso julgado.
q) Resta, pois, concluir que mal andou o douto tribunal ao sentenciar que “ (...)tendo sido ultrapassado o prazo legal de revogação do ato reclamado de 27-02-2019, impõe-se a anulação do ato reclamado nestes autos por violação daquele preceito, o que tem como efeito a manutenção daquele ato na ordem jurídica.”.
r) E chegando a essa conclusão não ter conhecido do demais invocado, designadamente no que respeita aos vícios invocados pelo reclamante no que respeita ao despacho de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia praticado em 11-02­2020.
s) Pelo que, ressalvando-se sempre o devido respeito, a douta sentença recorrida não poderá deixar de ser revogada e substituída por acórdão que, reconheça a violação da autoridade do caso julgado, julgue improcedente a reclamação e mande baixar os autos para que conheça dos vícios invocados no que respeita ao despacho de indeferimento do pedido de dispensa de garantia proferido em 11-02-2020.
t) Mais requer esta Fazenda Pública, muito respeitosamente, a Vªs Exªs, ponderada a verificação dos seus pressupostos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no n.º 7 do art.º 6º do RCP, por estarmos perante a forma processual de reclamação do acto do órgão de execução fiscal, prevista no artigo 276º e ss do CPPT, aplicando-se a tabela II-A, cfr. acórdão recorrido e acórdão do STA de 24.07.2013, proc. 01221/13.
Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, com todas as legais consequências.”
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O Recorrido não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por violação da autoridade do caso julgado, ao eliminar da ordem jurídica o acto que revogou despacho anterior, datado de 27/02/2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia, e indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal n.º .........................097.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com interesse para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos, os quais seguem indicados por ordens lógica e cronológica:
1. Em 09.04.2014, foi instaurado, em nome da devedora originária “[SCom02...]”, NIPC ...94, o processo de execução fiscal n.º .........................097, a correr termos no Serviço de Finanças ... – 1, para cobrança coerciva de dívida de IRC, do ano de 2010, e respetivos juros compensatórios, no valor total de 2.728.852,77 €, com data limite de pagamento voluntário em 19.02.2014 – cf. fls. 1-3 do processo de execução fiscal.
2. O processo de execução fiscal foi instaurado por falta de pagamento voluntário da liquidação de IRC, do ano de 2010, e respetivos juros compensatórios, no valor total de 2.728.852,77 €, emitida em nome de “[SCom02...]”, remetida sob o registo postal RQ3............02PT, de 10.04.2014, que teve origem na ação inspetiva realizada pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ... a coberto das ordens de serviço n.ºs OI...........08 e OI..........09 – cf. fls. 202 e 298 e ss. do processo de execução fiscal.
3. Em 17.12.2018, a Chefe do Serviço de Finanças ... – 1 proferiu despacho de reversão do processo de execução fiscal contra o Reclamante, na qualidade de responsável subsidiário – cf. fls. 440-445 do processo de execução fiscal.
4. O Reclamante tem residência estrangeira na Suíça, sendo a sua representante fiscal em Portugal a “[SCom01...], S.A.”, com domicílio fiscal na Avenida ..., ..., ... ... – cf. fls. 454-455 do processo de execução fiscal.
5. Em 19.12.2018, o Serviço de Finanças ... – 1 remeteu ao Reclamante, através de carta registada com aviso de receção enviada para a morada “Av D Afonso Henriques – N 1196 – Salas ...02 e ...04 – ... ...”, citação, por reversão, para o processo de execução fiscal, tendo a carta de citação sido devolvida ao remetente – cf. fls. 431-434 e 466 do processo de execução fiscal.
6. Em 21.12.2018, foi emitido o mandado de citação n.º 36/2018 pela Chefe do Serviço de Finanças ... – 1, para notificação ao Reclamante, representado por “[SCom01...], S.A.”, com sede na Avenida ..., ..., do teor da citação aludida no ponto antecedente – cf. fls. 435 do processo de execução fiscal.
7. Em 21.12.2018, após o mandado n.º 36/2018, foi elaborada certidão de diligências pelo Serviço de Finanças ... – 1, de onde consta o seguinte:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]”
– cf. fls. 436 do processo de execução fiscal.
8. Em 21.12.2018, foi emitido o mandado de citação n.º 38/2018 pela Chefe do Serviço de Finanças ... – 1, para citar o Reclamante, representado por “[SCom01...], S.A.”, com sede na Avenida ..., ..., ..., na pessoa do Presidente do Conselho de Administração, «BB», com domicílio fiscal na Rua ..., ..., do teor da citação aludida no ponto 5 – cf. fls. 453 do processo de execução fiscal.
9. Em 21.12.2018, após o mandado n.º 38/2018, foi elaborada certificação de notificação com hora certa pelo Serviço de Finanças ... – 1, de onde consta o seguinte:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]”
– cf. fls. 456 e ss. do processo de execução fiscal.
10. Em 26.12.2018, com referência ao mandado n.º 38/2018, foi elaborada certificação de verificação pelo Serviço de Finanças ... – 1, de onde consta o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. fls. 459 e ss. do processo de execução fiscal.
11. Por ofício datado de 02.01.2019, enviado, em 03.01.2019, por carta registada, pelo Serviço de Finanças ... – 1 ao Reclamante, representado por “[SCom01...], S.A.”, para a morada “Av D Afonso Henriques – N 1196 – Salas ...02 e ...04 – ... ...”, foi o Reclamante notificado nos termos do artigo 233.º do CPC, de onde consta o seguinte:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]”
– cf. fls. 462 e ss. do processo de execução fiscal.
12. Em 04.01.2019, a “[SCom01...], S.A.”, por si e como representante fiscal do Reclamante residente na Suíça, apresentou requerimento ao Serviço de Finanças ... – 1, de onde consta o seguinte:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]”
– cf. documento n.º 3 junto aos autos com a petição inicial, a fls. 59-61 do SITAF.
13. Em 17.01.2019, o Reclamante apresentou oposição judicial ao processo de execução fiscal, que corre termos neste Tribunal sob o n.º de processo 523/19.8BEPRT – cf. fls. 472 e 544 do processo de execução fiscal.
14. Em 17.01.2019, o Reclamante apresentou, junto do Serviço de Finanças ... – 1, requerimento de dispensa da prestação de garantia, no âmbito do processo de execução fiscal, o que fez nos termos e com os seguintes fundamentos:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

(...)" - cf. fls. 473-478 do processo de execução fiscal.
15. Em 27.02.2019, a Diretora de Finanças Adjunta da Direção de Finanças ... proferiu despacho de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia aludido no ponto antecedente - cf. fls. 516-519 do processo de execução fiscal.
16. Em 21.03.2019, o Reclamante apresentou reclamação judicial do despacho aludido no ponto antecedente junto do Serviço de Finanças ... - 1, cujo processo correu termos neste Tribunal sob o n.º 1549/20.4BEPRT, no qual foi proferida sentença em 15.01.2021, já transitada em julgado, que julgou extinta a instância por impossibilidade e inutilidade supervenientes da lide - cf. fls. 531-532 do processo de execução fiscal e consulta do processo n.º 1549/20.4BEPRT no SITAF.
17. Em 11.02.2020, a Diretora de Finanças Adjunta da Direção de Finanças ... proferiu despacho de revogação do despacho de 27.02.2019 e de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia aludido no ponto 14, com base nos fundamentos constantes da seguinte informação anterior elaborada em 08.02.2020:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

(...)” – cf. documento n.º 1 junto aos autos com a petição inicial, a fls. 41-57 do SITAF, e fls. 630-635 do processo de execução fiscal.
18. Em 20.07.2020, foi apresentada a presente reclamação judicial do despacho aludido no ponto antecedente junto do Serviço de Finanças ... – 1 – cf. fls. 1 e ss. do SITAF e fls. 671 do processo de execução fiscal.
19. Consta de declaração emitida, em 17.02.2012, pelo Banco “Banco 1...” (Suíça) que, a partir de 31.12.2010, o Reclamante foi beneficiário efetivo de duas contas no “Banco 1...” e que essas contas tinham um saldo positivo de 5.012.913,00 € nessa data, contendo, em anexo, demonstração financeira a 31.12.2010 – cf. documentos juntos aos autos pelo Reclamante, a fls. 1458-1460 do SITAF.
20. Consta de declaração emitida, em 21.02.2012, pelo Banco “Banco 2...” (Suíça) que o Reclamante era o beneficiário efetivo de uma conta detida no “Banco 2...” e que, a 31.12.2010, a conta tinha um saldo total de 5.003.997,33 € – cf. documento junto aos autos pelo Reclamante, a fls. 1461 do SITAF.
21. Consta de “Declaração de Regularização Tributária”, datada de 24.02.2012, que figura como titular ou beneficiário efetivo o Reclamante, contribuinte n.º ...65, relativamente valor total de 5.012.922,60 €, no Banco “Banco 1...” na Suíça, documento entregue no Banco 3... em 07.03.2012, que menciona o montante de 375.969,19 € como tendo sido recebido a título de imposto liquidado – cf. documento n.º 4 junto aos autos com a petição inicial, a fls. 64-65 do SITAF.
22. Consta de “Declaração de Regularização Tributária”, datada de 24.02.2012, que figura como titular ou beneficiário efetivo o Reclamante, contribuinte n.º ...65, relativamente valor total de 5.003.997,33 €, no Banco “Banco 2...” na Suíça, documento entregue no Banco 3... em 29.02.2012, que menciona o montante de 375.299,80 € como tendo sido recebido a título de imposto liquidado – cf. documento n.º 4 junto aos autos com a petição inicial, a fls. 69-70 do SITAF.
23. Consta de declaração emitida, em 09.06.2016, pelo Banco “Banco 2...” (Suíça) que, à data de 31.12.2013, o Reclamante era o beneficiário efetivo de uma conta designada “... Inc.”, com o número de conta ...10, junto do “Banco 2...” – cf. documento junto aos autos pelo Reclamante, a fls. 1473 do SITAF.
24. Consta de documentação bancária informação relativa às contas bancárias detidas nos Bancos “Banco 1...”, “Banco 2...” e “Banco 4... Ltd” (Suíça) – cf. documentos juntos aos autos pelo Reclamante, a fls. 1458-1622 do SITAF.
25. Consta de instrumento público, assinado em 30.05.2007, lavrado com intervenção notarial, a designação e nomeação do Reclamante pela sociedade “[SCom03...] INC” (Ilhas Virgens Britânicas), a quem atribuiu direitos individuais de assinatura, na qualidade de procurador, designadamente, para abrir e movimentar contas bancárias – cf. documento junto aos autos pelo Reclamante, a fls. 1462-1463 do SITAF.
26. Consta de notificações de crédito relativas à conta W-...01 informação referente aos montantes recebidos por ordem de “[SCom02...]” (Panamá), sendo o Banco remetente “Banco 4... Ltd” (Suíça) – cf. documentos juntos aos autos pelo Reclamante, a fls. 1613-1622 do SITAF.
27. Consta de escrito denominado “[SCom01...] Mapa Férias ... 2018” informação relativa às férias de 2018 no âmbito da “[SCom01...], S.A.” – cf. documento n.º 2 junto aos autos com a petição inicial, a fls. 58 do SITAF.
28. Consta de declaração de rendimentos – IRS (modelo 3) apresentada pelo Reclamante à Autoridade Tributária e Aduaneira informação referente aos rendimentos declarados pelo mesmo relativamente ao ano de 2019 – cf. documento junto aos autos com a resposta, a fls. 1419-1427 do SITAF.
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Factos não provados
Não existem factos não provados com interesse para a decisão da causa.
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Motivação da decisão sobre a matéria de facto
O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base nos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, no processo de execução fiscal e, ainda, na consulta do processo n.º 1549/20.4BEPRT no SITAF por força do exercício de função jurisdicional, conforme referido a propósito de cada um dos pontos do probatório.
Assim, foi a análise crítica e conjugada dos referidos meios de prova que, à luz da experiência, sedimentou a convicção do Tribunal.
Foi aproveitada a prova testemunhal produzida no processo de reclamação tramitado neste Tribunal sob o n.º 2043/20.9BEPRT, no âmbito do qual as testemunhas arroladas pelo Reclamante no presente processo de reclamação foram inquiridas, em sede de audiência de produção de prova, à matéria de facto constante da petição inicial.
Os depoimentos prestados pelas testemunhas foram livremente apreciados pelo Tribunal, atendendo, para tanto, à razão de ciência evidenciada por cada uma, tendo sido valorados os depoimentos em função da convicção adquirida pelo Tribunal acerca da sua correspondência com a realidade e da sua relevância para a decisão a proferir.
Nessa conformidade, foram valorados os depoimentos no que tange a circunstâncias ou eventos que as testemunhas constataram por si mesmas e ponderados/valorados os depoimentos indiretos pela sua verosimilhança, convencimento que resultou dos mesmos e/ou sustentabilidade face à restante prova.
A testemunha «CC», contabilista certificado, afirmou conhecer o Reclamante desde 1998/1999, altura em que disse ter feito uma peritagem a uma contabilidade de uma sociedade de que aquele era o sócio minoritário, não se lembrando, porém, do nome dessa sociedade, dado que tal já ocorreu há muitos anos.
Referiu também que, quando foi constituída a “[SCom01...]”, o Reclamante contratou a testemunha como contabilista, no ano de 2000, sendo ainda hoje contabilista da “[SCom01...]”.
Prestou esclarecimentos sobre a matéria vertida nos artigos 132.º, 151.º, 155.º, 160.º, 161.º e 165.º da petição inicial apresentada no processo n.º 2043/20.9BEPRT.
Relativamente à testemunha «CC», o seu depoimento não contribuiu para a formação da convicção do Tribunal, porquanto, para além de não ter conseguido depor com detalhe e segurança suficientes quanto aos factos sobre os quais foi questionado, o seu depoimento mostrou-se irrelevante para a decisão e até algo confuso e duvidoso em alguns momentos quanto a certos factos controvertidos.
A testemunha procurou explicar, em suma, quais as relações existentes entre o Reclamante, a “[SCom01...]” e a “[SCom02...]” e os seus contornos e o impacto que uma penhora teria na imagem do Reclamante e da “[SCom01...]” e nos negócios da “[SCom01...]” no mercado.
O depoimento da testemunha afigurou-se impertinente para a decisão, pois, para lá do supra assinalado, a prova dos factos objetivos dependia, na sua base, de prova documental e o eventual prejuízo reputacional de uma penhora assenta numa mera opinião e não tem relevância para a dispensa de garantia, que constitui o objeto dos autos, visto que o prejuízo irreparável exigido pela lei prende-se com o atinente à prestação de garantia e não com o decorrente da concretização de penhora ou com a prática de qualquer ato de execução.
A testemunha «DD», bancária no Banco 3..., afirmou conhecer o Reclamante há cerca de 10 anos, em virtude da relação bancária que se estabeleceu com o mesmo enquanto cliente do Banco 3....
Prestou esclarecimentos sobre a matéria vertida nos artigos 105.º a 107.º, 110.º, 132.º e 134.º a 136.º da petição inicial apresentada no processo n.º 2043/20.9BEPRT, tendo, no decurso do seu depoimento, sido também confrontada com o documento n.º 5 de fls. 58 a 60, 63 e 64 desses autos.
Quanto à testemunha «DD», esta prestou um depoimento que não acrescentou nada face ao que já constava dos autos, tendo explicado o modo de funcionamento, em geral, do RERT III e confirmado que o Reclamante fez a regularização tributária em causa no processo através do Banco 3..., sendo que, quanto ao mais, assumiu não ter conhecimento dos factos.
Este depoimento não se revelou importante para a boa decisão da causa, na medida em que, para além do já referido e de a prova dos factos sobre os quais depôs depender de elementos documentais, o que está em causa é uma dívida fiscal da responsabilidade da “[SCom02...]”, sendo o Reclamante mero responsável subsidiário, pelo que a eventual regularização de património ou capitais que o Reclamante assumiu serem sua propriedade não releva em relação à dívida fiscal a pagar pela “[SCom02...]”.
Os depoimentos prestados pelas testemunhas foram, ainda, vagos e genéricos, evidenciando falta de concretização suficiente das declarações em termos factuais.
Em face disso, os depoimentos das testemunhas não foram determinantes para a formação da convicção do Tribunal quanto à matéria de facto sobre a qual incidiram, pelo que não foram dados como provados factos com base nesse meio de prova.”

2. O Direito

A Recorrente não se conforma com a anulação do acto reclamado, determinada na sentença recorrida, desde logo, sustentando que o tribunal “a quo” laborou em erro, ao assentir que o objecto da presente reclamação é o despacho da Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças ..., proferido em 11/02/2020 e notificado em 13/07/2020, que revogou despacho anterior, datado de 27/12/2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia, e indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º .........................097.
Defende a Recorrente que o tribunal recorrido deveria ter apreciado nestes autos o despacho proferido em 11/02/2020, respeitante ao indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º .........................097, uma vez que o despacho que revogou despacho anterior, de 27/12/2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia, não foi impugnado autonomamente, conforme já previamente decidido nos autos de reclamação judicial n.º 1549/20.4BEPRT.
Para identificar o acto reclamado nos presentes autos de reclamação de acto do órgão de execução fiscal, importa interpretar a respectiva petição de reclamação. Aí se afirma que a reclamação se refere a decisão proferida no PEF, que é junta aos autos através do documento n.º 1 (cópia integral da totalidade do acto), que o reclamante entendeu dar por integralmente reproduzido na reclamação. Trata-se, efectivamente, de despacho proferido em 11/02/2020, com dois segmentos: revogação do despacho reclamado proferido em 27/02/2019 e indeferimento do pedido de isenção de prestação de garantia. Nesta peça processual, são invocados vários vícios de que, alegadamente, enfermará o acto reclamado, sendo que o primeiro se refere à ilegal duplicação de actos de recusa da dispensa de prestação de garantia (único que foi apreciado no tribunal recorrido, gerador de procedência da reclamação, por violação do disposto no artigo 277.º, n.º 2 do CPPT, conforme alegado). Salientamos que o pedido formulado na reclamação se reconduz à “total anulação do acto reclamado”.
Ora, articulando o pedido com as causas de pedir, não podem restar dúvidas que a presente reclamação visa, integralmente, o acto proferido pela Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças ..., proferido em 11/02/2020 e notificado em 13/07/2020, que revogou despacho anterior, datado de 27/12/2019, de deferimento parcial do pedido de dispensa da prestação de garantia, e indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia formulado no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º .........................097.
Nestes termos, entendemos ter o tribunal recorrido realizado a interpretação que um normal declaratário faria da reclamação, sendo nossa convicção corresponder à intenção do reclamante, pelo que inexiste qualquer pronúncia do tribunal para além do pedido.
Por outro lado, a Recorrente sustenta que o tribunal recorrido proferiu decisão que contraria, de forma inequívoca, outra decisão proferida no processo n.º 1549/20.4BEPRT, já transitada em julgado, ao julgar pela ilegalidade do despacho de revogação do anterior despacho de deferimento parcial da dispensa de garantia, por ter sido praticado muito para além do prazo legal de revogação previsto no artigo 277.º do CPPT.
Invoca, portanto, a Recorrente, a autoridade de caso julgado, adveniente, em seu entender, do decidido nos autos de reclamação n.º 1549/20.4BEPRT.
Nos termos do artigo 619.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC):
“1 - Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º”.
Respeita a norma contida nesta disposição legal ao caso julgado material, que ocorre quando a decisão transitada recai sobre o mérito da causa - cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, Vol. V, p. 156. Assim, a definição dada à relação material controvertida tem força dentro e fora do processo – cfr. Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 1956, p. 285.
As exigências de segurança jurídica têm sido apontadas como fundamento primordial do caso julgado material, sendo um garante da tendencial imutabilidade das decisões transitadas em julgado, fundamental até em termos de manutenção da paz social – cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, Vol. III, p. 94, Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 1956, pp. 286 e 287, e Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, 1985, Coimbra Editora, Coimbra, p. 705.
O caso julgado material pode reflectir uma dupla função, negativa ou positiva – cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, Vol. III, p. 93. Assim, a função negativa do caso julgado material está inerente à exceção de caso julgado, consubstanciando-se no impedimento de a mesma causa ser apreciada pelo Tribunal numa nova ação. Já a função positiva respeita à chamada autoridade do caso julgado, através da qual se obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão – cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.11.2018 (Processo n.º 4263/16.1T8VCT.G1.S1) e de 27.02.2018 (Processo n.º 2472/05.8 TBSTR.E1).
Ou seja, a autoridade do caso julgado impõe à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objeto de ambas as decisões – cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26.02.2019 (Processo n.º 4043/10.8TBVLG.P1.S1), de 13.11.2018 (Processo n.º 4263/16.1T8VCT.G1.S1), e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 28.02.2019 (Processo n.º 2143/05.5BELSB).
Distinto do caso julgado material é o caso julgado formal, que encontra acolhimento no artigo 620.º do CPC, nos termos de cujo n.º 1 “[a]s sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo”. Assim, quando a decisão proferida recaia apenas sobre a relação processual, forma-se caso julgado formal, cuja força obrigatória é apenas circunscrita ao processo – valor intraprocessual do caso julgado formal - cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in Estudos sobre o novo Processo Civil, 2.ª Ed., Lex. Lisboa, 1997, pp. 569 e 570.
Daí que a estabilidade inerente à figura do caso julgado seja menos intensa em situações de caso julgado formal - cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, Vol. V, p. 157.
Aplicando estes conceitos ao caso dos autos, adiantamos que carece de qualquer sustentação o alegado pela Recorrente, desde logo em virtude de a decisão proferida no processo de reclamação n.º 1549/20.4BEPRT ter apenas formado caso julgado formal, que, como já referimos, tem efeitos exclusivamente intraprocessuais.
Note-se que, relativamente ao julgamento realizado nos presentes autos, quanto à ilegalidade da revogação do anterior acto de 27/02/2019, por ultrapassagem do prazo definido legalmente para esse efeito, a Recorrente nada disse, nunca pondo em causa que tal prazo, previsto do artigo 277.º, n.º 2 do CPPT, fosse peremptório.
Com efeito, a Recorrente limita-se a defender que foi posta em causa a decisão proferida no âmbito do processo n.º 1549/20.4BEPRT, que, no entender da Fazenda Pública, consolidou a parte revogatória do acto proferido em 11/02/2020, por não ter sido impugnada autonomamente; tendo sido fundamento para extinguir essa instância, por eliminação do acto de 27/02/2019 através da revogação operada pelo acto proferido em 11/02/2020.
Defende a Recorrente que o tribunal recorrido errou no seu julgamento, em clara violação da autoridade de caso julgado, dado que, nos presentes autos, o tribunal julgou ilegal o despacho de 11/02/2020, declarando a sua anulação, por ter sido ultrapassado o prazo legal de revogação do acto reclamado de 27/02/2019, o que tem como efeito a manutenção daquele acto na ordem jurídica, ao invés, na sentença proferida no processo n.º 1549/20.4BEPRT, o tribunal decidiu que o despacho de revogação se consolidou na ordem jurídica, fazendo desaparecer o primitivo despacho de deferimento parcial.
Ora, nos termos do artigo 277.º, alínea e) do CPC, a impossibilidade ou a inutilidade superveniente da lide é uma causa da extinção da instância e sucede quando “(…) a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida” – cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código Processo Civil Anotado, Vol. I, 3.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, p. 546.
Assim, uma decisão judicial que se pronuncie sobre a ocorrência da impossibilidade ou a inutilidade superveniente da lide é uma decisão de forma, na medida em que não é apreciada e decidida a relação material controvertida.
Alertamos, conforme consta da decisão prolatada no processo n.º 1549/20.4BEPRT, que não foi apreciado o acto aí reclamado, referindo-se, expressamente, não poder ser, tão-pouco, analisado, naquela sede, o acto revogatório praticado em 11/02/2020.
Como tal, tratando-se de situação de decisão relativamente à qual apenas se forma caso julgado formal, a sua eficácia é intraprocessual, nos termos já explanados anteriormente.
Logo, o alegado pela Recorrente não tem qualquer sustentação, não estando, de modo algum, coberta pela autoridade do caso julgado a eventual estabilidade no ordenamento jurídico do acto revogatório de 11/02/2020, que não foi objecto de qualquer apreciação de mérito no âmbito do processo n.º 1549/20.4BEPRT.
No mesmo sentido, em situação algo semelhante, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 05/06/2019, proferido no âmbito do processo n.º 161/09.3BEALM.
Face ao exposto, não assiste razão à Recorrente, não padecendo a sentença recorrida dos vícios que lhe são assacados.
Assim, urge negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

Importa, por último, realçar que o valor em que a parte decaiu e será condenada nas respectivas custas assenta na base tributável de €2.728.852,77 € (dois milhões, setecentos e vinte e oito mil, oitocentos e cinquenta e dois euros e setenta e sete cêntimos), valor esse que se apresenta superior a €275.000,00, montante a partir do qual passa a acrescer 1,5 UC, a final, por cada €25.000,00 ou fracção e que importa ponderar à luz do princípio da proporcionalidade aferido ao concreto serviço prestado.
Nesta instância, tudo ponderado e perante a possibilidade de graduação casuística e prudencial do montante da taxa de justiça devida a final, não perdendo de vista que deve existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2.º da CRP, atendendo ainda ao direito de acesso à justiça acolhido no artigo 20.º igualmente da CRP e as questões colocadas serem simples; alcançamos razões válidas e ponderosas para dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida a final, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP.
Na sequência do exposto, deverá a conta de custas a elaborar desconsiderar o remanescente da taxa de justiça.

Conclusões/Sumário

I - O caso julgado material ocorre quando a decisão transitada recai sobre o mérito da causa, sendo que a definição dada à relação material controvertida tem força dentro e fora do processo.
II - Uma das vertentes do caso julgado é a autoridade do caso julgado, através da qual se obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão, impondo-se à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objecto de ambas as decisões.
III - Quando a decisão proferida recaia apenas sobre a relação processual, forma-se caso julgado formal, cuja força obrigatória é apenas circunscrita ao processo – valor intraprocessual do caso julgado formal.
IV - Uma decisão que julgou extinta a instância por impossibilidade/inutilidade superveniente da lide não forma caso julgado material, dado ser uma decisão de forma e, logo, não se pronunciou sobre a relação material controvertida.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais; devendo a conta de custas a elaborar desconsiderar o remanescente da taxa de justiça.

Porto, 08 de Fevereiro de 2024

Ana Patrocínio
Maria do Rosário Pais
Cláudia Almeida