Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00034/15.0BUPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/23/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Moura
Descritores:MÉTODOS INDICIÁRIOS OU MÉTODOS INDIRETOS. FIXAÇÃO DA MATÉRIA COLETÁVEL. ÓNUS DA PROVA DO EXCESSO DA QUANTIFICAÇÃO.
Sumário:I - A aplicação dos métodos indiretos divide-se em dois momentos: o primeiro, a cargo da Administração Tributária, que é o da comprovação dos pressupostos para aplicação de métodos indiretos, o qual respondido no sentido afirmativo, permite passar ao segundo momento, que é do da fixação da matéria coletável, neste caso incumbindo ao contribuinte o ónus da prova do excesso da sua quantificação.

II – Quando a Administração Tributária estabeleça critérios para considerar que o contribuinte não obteve proveitos em determinadas situações, tais critérios também podem ser usados pelo tribunal para apurar se terá obtido ou não proveitos em situações idênticas.

III – Competindo ao contribuinte demonstrar o excesso de quantificação da matéria coletável, também lhe cumpre carrear para o processo todos os elementos de prova nesse sentido, pelo que não apresentando prova suficiente quanto ao alegado, não procede o excesso de quantificação.
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:J.
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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A FAZENDA PÚBLICA, interpõe recurso da sentença que julgou procedente a Impugnação deduzida por J. e esposa R. contra as liquidações de IRS e juros compensatórios dos anos de 1996 e 1997.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

Em conclusão:
a) Incide o presente recurso sobre, a aliás douta sentença, que julgou procedente a presente impugnação, com a consequente anulação das liquidações adicionais de IRS dos anos de 1996 e 1997, emitidas na sequência de procedimento inspetivo no qual foram realizadas correções com recurso à aplicação de métodos indiretos;
b) Se bem compreendemos a douta sentença, muito embora se tenha decidido em primeira linha que não se encontram preenchidos os pressupostos invocados pela Fazenda Pública para apurar o lucro tributável por métodos indiretos (erro nos pressupostos de facto) e na quantificação da matéria coletável, certo é que o Meritíssimo Juiz reconduziu tal questão ao vicio de falta de fundamentação do relatório de inspeção que recorreu a métodos indiretos para o cálculo da matéria tributável;
c) Entende, todavia, a Fazenda Pública que os vícios imputados à decisão de aplicação de métodos indiretos (erro nos pressupostos de facto e excesso na quantificação) não se reconduzem ao vício de falta de fundamentação, sendo vícios próprios nos termos da alínea a) do art.º 99º da LGT, que constituem vício de violação de lei, cuja prioridade de conhecimento é imposta pelo art.º 124º do CPPT, sendo que o vicio de falta de fundamentação consubstancia um vicio de forma, cujo conhecimento não assegura a mais eficaz tutela dos direitos em presença;
d) Acresce que e, salvo melhor entendimento, não será conciliável o conhecimento simultâneo dos vícios de erro nos pressupostos de facto para o recurso aos métodos indiretos e o excesso na quantificação, porquanto, acaso não se verifiquem os pressupostos para a tributação por métodos indiretos, não fará qualquer sentido conhecer do excesso na quantificação, por prejudicado nos termos do atual art.º 608º do CPC;
e) Ou seja, decidindo o Tribunal ser ilegítima a tributação por métodos indiretos decai a posição da Autoridade Tributária que atuou nesse sentido, não tendo fundamento algum a apreciação da adequação do critério de quantificação utilizado;
f) Independentemente do exposto, nenhum dos vícios imputados à liquidação impugnada se verifica, tendo a douta sentença recorrida incorrido em erro de julgamento sobre a matéria de facto ao não considerar verificados os pressupostos para o recurso à avaliação indireta e critério de quantificação utilizado, e aplicado, de forma incorreta, o direito à factualidade apurada;
g) Entende a Fazenda Pública que logrou provar os pressupostos legais do recurso à aplicação de métodos indiretos, em virtude da comprovada demonstração por parte da inspeção do desenvolvimento de uma atividade comercial sujeita a tributação, exercida pelo impugnante, nos exercidos fiscalizados, sem que o mesmo estivesse coletado para tal e nem tendo sido declarado qualquer proveito associado ao desempenho da atividade em questão;
h) Mais, realça-se que o impugnante, além de não se encontrar coletado pela atividade que efetivamente exercia (ou por qualquer outra), nem ter declarado quaisquer rendimentos provenientes do seu exercício, não possuía nenhum registo contabilístico das operações de comércio que realizava, pois que, os únicos elementos obtidos pela inspeção foram guias de remessa emitidas;
i) Do que se conclui que, tendo o impugnante desempenhado nos exercícios de 1996 e 1997 uma atividade de comércio sujeita a tributação e não se encontrando coletado para o seu exercício, não tendo declarado para efeitos fiscais qualquer valor de proveitos relativos ao desempenho da referida atividade e não tendo o impugnante escrita/contabilidade para o efeito, trata-se de situação que se reconduz à impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à determinação da matéria tributável, por inexistência de contabilidade, nos termos dos art.º 87º, b) e 88º, a), ambos da LGT;
j) Note-se que a inspeção apenas teve acesso a guias de remessa emitidas pelo impugnante nos exercidos fiscalizados (não havendo quaisquer registos contabilísticos), elementos manifestamente insuficientes, por si só, para tornar possível a determinação da matéria tributável através do recurso a métodos diretos;
k) Depois, as guias de remessa a que a inspeção teve acesso no decurso do procedimento inspetivo foram pedidas pelo próprio impugnante, que não em nome da “I. LDA” ou de qualquer outra sociedade comercial, não fazendo sentido algum pretender-se associar as guias de remessa em causa á atividade desempenhada pela “I. LDA”, da qual o impugnante não faz parte, cabendo antes dizer e ao contrário do afirmado na douta sentença que a AT levou, no caso, a sua atividade instrutória para além do que se lhe exigia;
l) Porquanto, facto objetivo, que releva para o caso e como tal deve ser valorado é a absoluta impossibilidade de a inspeção apurar a matéria tributável do impugnante através de métodos diretos, atendendo a que o sujeito passivo não se encontrava coletado, não declarou os rendimentos auferidos da atividade desempenhada e não possuía registos contabilísticos das operações tributáveis;
m) Atenta a situação relatada a Autoridade Tributária cumpriu com o seu ónus probatório quanto aos pressupostos do recurso à aplicação de métodos indiretos, não tendo demonstrado o impugnante o respetivo erro nos pressupostos de facto, limitando-se a referir que aqueles pressupostos não se verificam sem, contudo, provar factos que permitam questionar os dados carreados pela Administração Fiscal;
n) Sobre a quantificação, atente-se que, ou se mostram verificados os pressupostos para a tributação indireta e então cumprirá averiguar da pertinência do critério de quantificação utilizado, incumbindo ao sujeito passivo a demonstração do erro na quantificação, ou então não se verificam os pressupostos para a tributação indireta (por a AT não ter demonstrado os respetivos pressupostos), sendo ilegal a decisão de aplicação de métodos indiretos susceptível de anular todo o processado posterior;
o) Tendo a douta decisão recorrida decidido simultaneamente pelo erro nos pressupostos de tributação por métodos indiretos e pela errónea quantificação, a mesma padece, nos termos expostos, de contraditoriedade;
p) Na fase da qualificação incumbe à Autoridade Tributária o ónus de demonstrar a existência de inexatidões ou omissões na contabilidade do sujeito passivo e que tais irregularidades impossibilitam a comprovação direta e exata da matéria tributável – compete-lhe demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação com recurso a tais métodos; Feita essa prova, e ai entramos no campo da quantificação, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso no critério de quantificação, nos termos do n.º 3 do art.º 74º da LGT, havendo ainda que ter em conta o disposto no art.º 100º, nº. 2 do CPPT;
q) Entende a Fazenda Pública que não demonstrou o impugnante o excesso na quantificação, pelo que, não poderia o Meritíssimo Juiz considerar excessivo o critério de quantificação utilizado, razão porque nesta parte a douta decisão recorrida enferma de erro de julgamento;
r) Em suma, mostram-se verificados os pressupostos para o recurso aos métodos indiretos de tributação, a AT fundamentou o critério de quantificação utilizado, e, em contrapartida, o impugnante não demonstrou o erro ou excesso na quantificação, cfr. Acórdão do STA de 16.11.2011, processo nº. 0247/11;
s) Também não se verifica qualquer falta de fundamentação do recurso aos métodos indiretos, porquanto o contribuinte ficou na posse de todos os elementos de facto e de direito que conduziram à decisão, ou seja, foi-lhe dada nota do “itinerário cognoscitivo e valorativo” seguido para a tomada da decisão;
t) Concluindo, o Meritíssimo Juiz incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação da lei, mormente o disposto nos art.º 74º, nº. 3 da LGT e art.º 100º, nº. 2 do CPPT.

Nestes termos e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente com a consequente revogação da douta sentença recorrida, como será de, JUSTIÇA!

Os Recorridos contra-alegaram, concluindo da seguinte forma:

A. A mui douta sentença não enferma do erro de julgamento que lhe vem imputado.
B. Ao contrário do que a recorrida alega nas suas alegações, a AT não provou, como lhe competia, que o impugnante tenha desempenhado, nos anos em analise, uma actividade de comércio, que tenha auferido proveitos dessa actividade.
C. Face aos elementos de prova trazidos para os autos, na fase administrativa pelo aqui recorrido (que evidenciaram que, parte das guias de remessa tinham correspondência com facturas emitidas pela empresa I., - o que foi considerado pela fiscalização, conforme consta do relatório, sendo por isso até, mais do que, despropositado o alegado pela recorrida designadamente na conclusão K) do seu recurso) o único facto concreto e real (a emissão de guias de remessa) deixa de ser indicio suficientemente sólido para sustentar a existência do exercício de actividade e da obtenção de proveitos por parte do impugnante.
D. Impunha-se, perante tal circunstancialismo, efectivamente o recurso a diligências adicionais, por parte da AT, para verificar da existência e, na afirmativa, da extensão do facto tributário.
E. verificando-se tais dúvidas, suscitadas pela própria AT, e que resultam também da prova documental carreada para os autos pelo recorrido e não impugnada, é manifesto que não se encontra demonstrada a factualidade relevante, e, a que se encontra, é insuficiente, para determinar o recurso à avaliação indirecta.
F. Ocorre erro nos pressupostos de facto - o facto é duvidoso.
G. E nos pressupostos de direito, já que, é alegada que na insuficiência de clareza e as irregularidades detectadas, não permitem a quantificação directa e exacta da matéria tributável o que justifica, a aplicação de métodos indirectos, de acordo com o estabelecido na alínea e) do atr. 88º da LGT'. Ora, esta alínea é inexistente no referido artigo e diploma legal, o que equivale a falta de fundamentação legal.
H. H. Verifica-se existir fundada dúvida sobre a existência do facto tributário e, sem prescindir sobre a quantificação do facto tributário, nos termos do artº 100°, do CPPT, sendo fundamento de anulação dos actos de liquidação,

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de v. Exas., deverá ser considerado improcedente o recurso apresentado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública, e assim, confirmada a douta sentença recorrida que determinou a anulação dos actos de liquidação de irs impugnados.
Assim decidindo, mais uma vez será feita, a costumada e verdadeira
JUSTIÇA

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado procedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas.
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se a Sentença incorre em erro de julgamento por considerar verificados os pressupostos para a não aplicação dos métodos indiretos e respetiva falta de fundamentação; e caso assim seja, se ocorre ou não, excesso de quantificação da matéria coletável.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em face dos elementos existentes nos autos bem como do posicionamento assumido pelas partes, é a seguinte a matéria de facto apurada com relevância para a decisão das questões em causa nos presentes autos:

A. Com data de 15/06/2000, foi elaborado “Relatório de inspeção tributária”, por referência ao impugnante, com o seguinte teor: - cfr. fls. 153 a 157 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas como as demais que abaixo se referenciam:
“(...) 1 – CONCLUSÕES DA ACÇÃO INSPECTIVA
Da presente inspecção detectaram-se varias irregularidades, originando correcções por aplicação de métodos indirectos e correcções meramente aritméticas, conforme a seguir se discrimina:
1.1 - Exercício de 1995
1.1.1 - IRS
Correcções resultantes da aplicação de métodos indirectos - ............................... 746 088$00
1.2 - Exercício de 1996
1.2.1 - IRS
Correcções através da aplicação de métodos indirectos .................................... 4 772 544$00
Correcções através da aplicação de métodos directos ............................................ 66 435$00
1.2.2 - IVA
Correcções através da aplicação de métodos directos ............................................. 11294$00
1.3 - Exercício de 1997
1.3.1 -IRS
Correcções através da aplicação de métodos indirectos .................................... 8 699124$00
1.4 - Exercício de 1999
1.4.1 - IRS Correcções através da aplicação de métodos indirectos ...................... 525 401$00
1.2 - Rendimento Colectável para IRS
Das correcções referidas, fundamentadas nos capítulos seguintes e sintetizadas no mapa de projecto de conclusões do relatório que integra este capítulo, resulta o seguinte rendimento colectável para IRS.
Rend. ColectoAno de 1995Ano de 1996Ano de 1997Ano de 1999
Resultante deel. Apresentadas mod. 11 012 750$228410$2 252 000$
Acrescido por correcção746088$4 838 979$8 699 124$252 401$
Rendimento colect. Corrigido1 758 838$5 067 389$10 951 124$
II - Objectivos, âmbito e extensão da acção inspectiva
2.1 - Credencial e período em que decorreu a acção
Em cumprimento da Ordem de Serviço n.”25 309 de 18/02/2000, com o cód. PNA1T 32219, foi efectuada a presente inspeção ao sujeito passivo J., NIF(…), NIPC ((…))
A visita teve início em 23/02/2000 e deu-se por terminada em 11/05/2000.
2.2 - Motivo, âmbito e incidência temporal
A acção foi desencadeada pelo facto da Brigada Fiscal da GNR ter recolhido uma guia de remessa ao Sujo Passivo em 22/07/96 e o mesmo não se encontrar registado para efeitos de IVA e IRS.
O exame incidiu sobre a análise da situação tributária do suj. pas., nomeadamente em IRS e IVA relativamente aos exercícios de 1995 a 1998.
2.3 - Outras situações
o Suj. Pas, não se encontra cadastrado para efeitos de IRS e IVA, tendo sido nesta data emitido B. A. O. a enquadra-lo para efeitos de IVA, com a actividade de “ - Exploração Florestal”, CAE 2012.
Para efeitos de IRS foi nesta data levantado o competente auto de notícia pelo facto de não ter apresentado declaração de início de actividade.
Não possuía qualquer sistema de escrita, no entanto pelo menos desde 30 de Julho de 1990 que emite guias de remessa, sendo a 1ª detectada com o n.º 3.
O Sujo Pas. é genro dos sócios da firma I., , Lda com sede em (…), devido a dívidas dessa mesma firma foi-lhe vendido em hasta publica um camião de marca Volvo e com a matricula XX-XX-XX, tendo o mesmo sido adquirido pelo sujo pas. e continuado ao serviço dessa mesma firma.
As guias de remessa, segundo declarações do suj. passivo e sócio da firma I. serviam para a mercadoria poder circular na via publica, sendo posteriormente facturada, pelo menos alguma. em nome de I., Lda, sem que no entanto nessas facturas fosse mencionada a guia de remessa que acompanhou a mercadoria, tendo no entanto sido possível através da identificação do destinatário, mercadoria transportada, facturada e respectiva data estabelecer alguma relação entre algumas guias de remessa e facturas conforme se discrimina nos capítulos seguintes.
Em 27/12/93 foram mandados fazer mais 5 livros de guias de remessa do n.º 250 a 500, que começou a utilizar em 03/01/94 sendo a última processada em 19/02/2000 com o nº447.
Em 08/08/96 adquiriu 5 livros de facturas como n.º 1 a 250 e que com excepção da nº 1 não foram utilizados.
Com referência aos exercícios dos anos de 1995, 1996, 1997 e 1998 apresentou declaração de IRS só com rendimentos da Cat – A, mod. 1.
1.1.1. - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria colectável.
O Suj.. Pas. emitiu em 22/07/1996, uma factura com o n.º 001 em que o valor da mercadoria foi de 66 435$00 e IVA á taxa de 17% no valor de 11294$00, valor total da factura 77.729$00. sem que esse mesmo IVA tivesse dado entrada nos Cofres do Estado,
IV - Motivos e exposição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria colectável.
4.1 -Exercícios de 1995.
O Sujo Pas. emitiu guias de remessa do nº 304 à nº 328 , dessas mesmas guias de remessa não foi possível identificar as facturas correspondentes na firma I., , Ida das seguintes guias de remessa: Nº 304, 317, 327, no total de 3 guias de remessa.
4.2 - Exercício de 1996
Emitiu as guias de remessa de 3 livros pela ordem seguinte de datas nº 329 a 350, a 201, a 250 e 351 a 359, não foi possível identificar a correspondente facturação na firma I., Lda seguintes guias.de remessa nº 330, 331, 332, 333, 334, 335, 336, 337,338,340, 341, 345, 204, 207, 208, 209, 214, 218, 220, 221, 243,244,245,246, 247, 248, 357, 358, no total de 28 guias.
4.3 - Exercício de 1997
Emitiu guias de remessa de livros pela seguinte ordem de datas, nº 360 a 400 sendo esta última datada de 07/04/97 e depois passando para a guia nº 401 datada de 09/07/97 até á nº 431 datada de 01/09/97, sendo que as guias nº 432 e 433 não possuem qualquer data e a guia nº 434 é datada de 05/01/1999, pelo que se presume que as nº 432 e 433 sejam do ano de 1997, assim sendo a última guia de remessa processada em 1997 foi a nº 433.
Não sendo possível estabelecer qualquer relação de facturação com as seguintes guias de remessa: 364, 365, 368, 371, 372, 373, 375, 376, 377, 378, 380, 381, 382, 383, 384, 385, 386, 387, 388, 389, 392, 393, 394, 399, 400, 401, 405, 407, 410, 411, 412, 414, 419, 424, 426, 427, 428, 429, 430, 431, 432 e 433, no total de 42.
4.4 - Exercício de 1998
Não foram detectadas emissões de guias de remessa, pelo que se presume não ter havido qualquer movimento neste exercício.
4.5 - Exercício de 1999
Foram emitidas as guias de remessa n. º 434 a 445, não tendo sido localizada a correspondente facturação pela firma I., Ida das seguintes guias de remessa nºs 434,435,436,439,440,441, no total de 6.
4.4- Legislação em que se apoia as correcções a efectuar.
A insuficiência de clareza e as irregularidades detectadas, não permitem a quantificação directa e exacta da matéria tributável, o que justifica a aplicação de métodos indirectos, de acordo com o estabelecido na alínea e) do artº 88º da L.G.T.
V - Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos.
5.1 - Critérios
5.1.1-Ano de 1995
Foi possível estabelecer relação, com a colaboração dos gerentes da firma I. entre as seguintes guias de remessa emitidas, facturas processadas pela firma I. e valores constantes das respectivas facturas:
Nº das guiasFacturas processadas I.Valor das facturas
305 e 30841789270$
306415442850$
307, 309, 310, 311, 312, 313, 314, 315418824669$
316435170 100$
318, 319439424000$
320443323931$
321445462015$
322456~ 728400$
323464252000$
324467539251$
325469476306$
326476363678$
328482374838$
Nº de guias 22Nº de facturas 13Total 5471308$
Pelo que o valor médio de cada guia de remessa emitida e de 248 696$
O nº de guias de remessa em que não foi processada qualquer factura foi de 3 x o valor médio (248 696$ 00) = 746 088$00.
Ano de 1996
Nº guias remessaFacturas correspondenteValor da factura
21955150058$
22255344702$
223, 225, 226, 228,560821240$
224556164050$
229565112270$
230562368451$
231, 232567209854$
233568215756$
234, 235572133 797$
236570210350$
23758158401$
238, 240583188895$
239582170251
24158492904$
24258764 169$
249588226749$
25059]69525$
329504212 166$
339513333817$
342317355 571$
34351966416$
344522489676$
346,347527149672$
34853183210$
349529386702$
350532169376$
201533328563$
20254194507$
203, 205535124232$
206536271 685$
210, 211538150460$
212539361000$
21354194507$
21554762 116$
216, 217,548311 780$
351593337711$
352592173932$
35359554358$
354601184818$
355599511364$
356604214411$
359, 360611310281$
Nº guias 53Nº facturas 42Total 9033753$
A média facturada por cada guia emitida foi de 170 448$, não tendo sido possível estabelecer qualquer relação entre 28 guias de remessa emitidas e qualquer das facturas emitidas pela firma I., Lda, que se estimam no valor de 4 772 544$00 (170 448$ x 28)
Ano de 1997
Foram as seguintes guias de remessa emitidas e nas quais foi possível estabelecer relação com as facturas emitidas pela firma I.. Lda
Nº guia de remessaFactura correspondente emitida por I.Valor da factura
360611310281$
361, 362, 363615593861$
366618326 170$
36762367500$
369620259814$
370627248608$
37462854700$
379629370975$
390, 391645281697$
39565360250$
396, 397655527397$
402 403, 404655351975$
406656124717$
40866566 100$
409670208299$
413, 41667153000$
41767454000$
418673252 172$
420680489 185$
421681264794$
422, 423684824956$
425686216 100$
Total\ 29Total 226006551$
Média de volume de negócios por cada guia de remessa emitida 207 1228 em 44 guias de remessa que não foi possível estabelecer qualquer relação entre a facturação processada pela firma I., Lda pelo que se presume que não tenham sido emitidas quaisquer factura respeitante ao volume de negócios de 8 699124$00
Ano de 1998
Não foi detectada a emissão de qualquer guia de remessa em nome do Suj. Ras., pelo que se presume que não tenha havido qualquer movimento.
Ano de 1999
Relação das guias de remessa emitidas e correspondente facturação emitida pela firma I.. Lda
Nº guia emitidaNº factura correspondenteValor constante da factura
43788545900$
43889156376$
44290353900$
44392255825$
444933133 100$
445956180300$
Total 6Total 6Total 525401$
Media de volume de negócios por cada guia de remessa emitida 87 567800, sendo o total de volume de negócios omitido pelo sujeito passivo de 525 401$ (87 567$ x 6)
(...)
5.3 - Cálculos - Ano de 1996
5.2.1 - IRS
Ex. iniciaisComprasEx. finaisCECVVendas/Ser.Prestados
-$00-$00-$00-$004 772 544$
(...)
5.4 Cálculos - Ano de 1997
5.4.1 – IRS
Ex. iniciaisComprasEx. finaisCECVVendas/Ser.Prestados
-$00-$00-$00-$008 699 124$
(…)”
B. Da reunião da Comissão de revisão foi elaborada a ata n.º 69, com data de 02111/2000, da qual resulta, entre o mais que ...Perante o exposto, subsistem dúvidas quanto ao facto do reclamante não ter tido quaisquer proveitos, para além dos obtidos como trabalhador independente. Só com um exame à escrita à empresa I.; LDA é que as mesmas poderão ser sanadas. No entanto, foi proposto ao perito nomeado pelo contribuinte um acordo, baseado em: -Seguindo o raciocínio constante no relatório de inspeção e tendo em linha de conta as provas apresentadas na reclamação, aceitar que o reclamante não obteve qualquer proveito com o transporte de máquinas propriedade da empresa. Assim foram propostas os seguintes valores; CÁLCULOS: Aceitam-se as V.D. 874, 972, 488 e 492, logo faltam 2 ao preço médio de 148.527$00. O perito nomeado pelo contribuinte, não pode aceitar a proposta efetuada, pelas razões invocadas na reclamação apresentada...” - cfr. fls.108 a 110 dos autos.
C. Pelo ofício n.º 18457, de 10/11/2000, o impugnante marido foi notificado da decisão que fixou o seu rendimento coletável referente aos anos de 1996, 1997 e 1999 - cfr. fls. 93 e 94 dos autos.
D. Em nome do impugnante marido foi emitida a Guia de Remessa n.º 304, com data de 12/01/1995, referente a uma carga de lenha, cujo destinatário é M., Lda, cujo transporte foi efetuado pela viatura matrícula XX-XX-XX - cfr. fls. 14 dos autos.
E. Em 12/01/1995, a I., Lda emitiu a fatura n.º 394, referente ao fornecimento de lenha, cuja destinatária é M., Lda - cfr. fls. 15 dos autos.
F. O impugnante emitiu diversas Guias de remessa a que aludem os pontos 7 a 27 do relatório supra, bem assim os documentos a que aludem os mesmos pontos - cfr. fls. 16 a 90 dos autos.
G. A Administração tributária notificou o impugnante para as seguintes liquidações adicionais:
TRIBUTOANONº LIQUIDAÇÃOVALOR €DATA EMISSÃO
IRS199653335657843.888,2224/11/2000
IRS1997534356719813.827,2524/112000
- cfr. fls. 95 e 96 dos autos.
H. Com a apresentação da impugnação dos presentes autos, foi realizada penhora de prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de (…) do mosteiro sob o artigo 81, o que determinou a suspensão da execução da quantia exequenda operada através do processo executivo n.º 2658200101000420, instaurado em 02/04/2001, para o qual foi citado em 09/05/2001, não tendo os impugnante pago qualquer quantia - cf. fls. 168 a 174 dos autos.
I. A presente acção foi registada em 12/04/2001 - cfr. fls. 2 dos presentes autos.
III.1 – Factos não provados
Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos.
III.2 – Motivação da decisão de facto
O Tribunal formou a sua convicção relativamente a cada um dos factos dados como assentes tendo por base os documentos juntos aos autos, os quais não foram objecto de impugnação.
**
Apreciação jurídica do recurso.

Alega a Fazenda Pública que a Sentença decidiu que não estavam justificados os critérios para a utilização dos métodos indiretos, tendo o tribunal reconduzido tal questão ao vício de falta de fundamentação do relatório de inspeção que recorreu a métodos indiretos para cálculo da matéria tributável.

Mais refere que a Sentença incorreu em erro de julgamento por errada aplicação da lei, mormente o disposto nos artigos 74.º, n.º 3 da LGT e do artigo 100.º, n.º 2 do CPPT.
*

Por se entender necessário para apreciação da causa, procede-se, nos termos do artigo 662.º do Código de Processo Civil, ao aditamento oficioso à factualidade dada como assente, da seguinte matéria de facto:
J)
Da reunião da Comissão de Revisão da Matéria Tributável, foi lavrada a Ata n.º 69, com o seguinte teor:
Aos 02-11-2000, pelas 10H00 e nesta Direcção de Finanças, reuniram-se os peritos referidos no artº 92º da LGT (…), para efeitos de apreciação da reclamação interposta nos termos do artº 91º nº 1 da LGT, pelo contribuinte acima indicado, contra a(s) fixação(ães) efectuada(s) nos termos de:
󠆽 Artº 66º do CIRS, por aplicação de MI (…)
--------Aberta a reunião, o perito da Fazenda Pública deu conhecimento ao perito nomeado pelo contribuinte das conclusões retiradas na visita efectuada à empresa I. - , LDA, consubstanciadas no seguinte:--------------------------------
- A viatura Volvo matricula XX-XX-XX foi adquirida pelo reclamante em 17/11/1998, em resultado da venda judicial por meio de proposta em carta fechada à empresa N. (…). O pagamento foi efectuado com um cheque do sócio da I., LDA - Sr. S..-------------
- Alguns sócios da empresa N. (…), são os mesmos da I., LDA , ------
- Apesar da viatura ter sido penhorada e empresa referida, o Titulo de Registo de Propriedade encontra-se desde 1990 em nome de do J. ( ANEXO 2 ),---------
- A análise efectuada aos elementos contabilísticos da empresa I., LDA, não permitiu retirar conclusões significativas, nomeadamente: Não se conseguiu encontrar correspondência entre as facturas da I., LDA e as Guias de Remessa relativamente aos supostos transportes de madeiras para as instalações da empresa, ---------------------------------------------
- No que respeita aos custos com a viatura Volvo, também não foram encontrados mais do que os constantes na reclamação apresentada, Tais custos seriam: seguros, combustíveis, bem como grandes reparações no exercício de 1998, pois, de acordo com informações fornecidas pela D. N. (Sogra do reclamante e Sócia da I.), a viatura nesse ano esteve avariada,--
- Nos elementos de contabilidade foi encontrado o documento que constitui o ANEXO 3, referente a um pagamento - a título de reembolso de suprimentos - ao Sr. J.. ----------
-------- Perante o exposto, subsistem dúvidas quanto ao facto do reclamante não ter tido quaisquer proveitos, para além dos obtidos como trabalhador independente, Só com um exame à escrita à empresa I., LDA é que as mesmas poderão ser sanadas--------------------------
--------No entanto, foi proposto ao perito nomeado pelo contribuinte um acordo, baseado em:
- Seguindo o raciocínio constante no relatório de inspecção e tendo em linha de conta as provas apresentadas na reclamação, aceitar as correspondências entre as G.R. do reclamante e as F.T ou V.D. da I., LDA bem como aceitar que o reclamante não obteve qualquer proveito com o transporte de máquinas propriedade da empresa, --------------------------------
--------Assim, foram propostos os seguintes valores: ---------
** CÁLCULOS
Aceitam-se as VD. 874, 972, 488 e 492, logo faltam 2 ao preço médio de 148.527$00.
------- O perito nomeado pelo contribuinte, não pode aceitar a proposta efectuada, pelas razões invocadas na reclamação apresentada. Assim, repete e dá por integralmente transcrito o pedido formulado na reclamação do artigo 91º da Lei Geral Tributária. ----------------------
--------Nada mais havendo a tratar e não tendo havido acordo, foi lavrada a presente acta que vais ser assinada pelos intervenientes.
(Anexo)
** CÁLCULOS
1996
N.º GUIAS FT I. VALOR MÉDIA
53 42 9.033.753 170.448
358 GR 617 286.090
54 9.319.843 172.590
EM FALTA 18 3.106.614
1997
CORRECÇÃO INICIAL PROPOSTA
8.699.124$ 6.900.711$
** CÁLCULOS
……………………………………………………
1997
N.º GUIAS FT I. VALOR MÉDIA
29 22 6.006.551 207.122
364 616 72.500
368 619 354.350
387 638 713.725
388 638
392 384 249.948
393 651 35.050
400 650 241.899
424 685 60.750
428 698 288.144
429 701 537.285
430 711 110.250
432 716 1.085.725
41 9.756.177 237.956
EM FALTA 29 6.900.711

K)
Pelo Diretor de Finanças, em 06/11/2000, foi proferida a seguinte Decisão:
ACTA N.º 69
(…)
DECISÃO
(nº 6 do artº 92º LGT)
Nos termos do nº 6 do artº 92º da Lei Geral Tributária, cumpre ao órgão competente para a fixação da matéria tributável resolver, na falta de acordo entre os peritos.
Analisada a respectiva acta verifica-se o seguinte:
Relativamente aos anos em causa, verifica-se que não foi conseguido acordo. No entanto, pelo Perito da Administração Tributária, foram propostas correcções de acordo que quantificou na respectiva acta, propostas estas rejeitadas pelo Perito do Contribuinte c/ os fundamentos expressos na acta. Assim, considerando todos os elementos existentes, relatório da inspecção tributária, posição dos peritos,
Decido, por falta de elementos que, nesta fase, os ponham em causa, e nos termos do nº 6º do artº 92º da LGT, atendendo a posição/defesa do Perito da Administração Tributária:
1 - Anular/revogar a fixação do IRS/95;
2 - Refixar/apurar os valores dos restantes anos, da seguinte forma:
2.1 - IMPOSTO/ANO RENDIMENTO(s) LÍQUIDO REND.COLECTÁVEL
IRS/96 3.335.024$ 3.335.024$
IRS/97 9.152.711$ 9.152.711$
IRS/99 391.103$ 391.103$
Notifique-se
L)
No dia 01/03/1996, foi emitida a Venda a Dinheiro n.º 100.000015, pela empresa «U., Lda.», sita em (…), com o valor total líquido de Esc.: 83.078$00, a favor da «I. – , Lda.», sita em (…), com a seguinte descrição:
«Reparar transmissão bomba do carregador frontal.
Serviço torno – fazer aplicação de uma poly na bomba.
Total de mão de obra ***** 32,812.50
Aço normal (torno)
Anilha
Anilha
Porca 7/16
Anilha
Anilha
Parafuso 8M
Porca 8M
Parafuso 7/8
Porca 7/8
Porca 3/8
Apoio para bomba
Òleo LT
Material de limpeza
Total de materiais ****** 38,195.50 »
(fls. 28 do proc. físico, doc. 17-B da PI)
M)
No dia 06/03/1996, foi emitido um cheque do Banco Nacional Ultramarino pela «I. – , Lda.», no valor de Esc.: 83.079$00, a favor de «U., Lda.». (fls. 29 do proc. físico, doc. 17-A da PI)
N)
No dia 06/03/1996, foi emitida pelo Impugnante a Guia de Remessa n.º 345, com os seguintes dizeres: «Quant. 1. Designação: máquina industrial que vem da oficina de Vila Nova de Poiares. Local de Carga: Vila Nova de Poiares 10h00. Local de descarga: (…). Viatura XX-XX-XX». (fls. 27 do proc. físico. Doc. 16 da PI)
O)
A Venda a Dinheiro n.º 100.000015, referida em L) e emitida pela empresa «U., Lda.», a favor da «I. – , Lda.», encontra-se lançada na contabilidade desta última.
(fls. 30 do proc. físico. Doc. 17 da PI)
P)
No dia 24/08/1996, foi emitida pelo Impugnante a Guia de Remessa n.º 243, com os seguintes dizeres: «Quant. 1. Designação: máquina industrial transportá-la para o pinhal em (…). Local de Carga: (…) 8h15. Local de Descarga: (…). Viatura: XX-XX-XX». (fls. 36 do proc. físico, doc. 23 da PI)
Q)
No dia 27/08/1996, foi emitida pelo Impugnante a Guia de Remessa n.º 246, com os seguintes dizeres: «Quant. 1. Designação: máquina industrial transportá-la de Molelos para Vila Pouca. Local de Carga: Molelos 8h30. Local de Descarga: Vila Pouca. Viatura: XX-XX-XX». (fls. 37 do proc. físico, doc. 24 da PI)
R)
No dia 24 de agosto de 1996, M., residente em (…), emitiu o recibo n.º 133, onde declarou que recebeu da I. – , Lda., a quantia de quinhentos mil escudos, referente à venda «de meus pinheiros no lugar de …». (fls. 39 proc. físico, doc. 26 da PI)
S)
No dia 26 de junho de 1996, L., residente em (…), emitiu o recibo n.º 129, onde declarou que recebeu da I. – , Lda., a quantia de trezentos e oitenta escudos, referente à venda «de meus pinheiros e eucaliptos …». (fls. 38 proc. físico, doc. 25 da PI)
*
Apreciando.
Se bem interpretamos a alegação de recurso, a mesma estará a reportar-se ao seguinte segmento da Sentença (página 28): «Perante esta factualidade e atentos os comandos normativos contidos nos artigos 75.º, 81.º, 83.º, 87.º, 88.º e 90.º da LGT, bem assim nos artigos 38.º (atual 39.º) do CIRS e 52.º (atual 59.º) do CIRC, a Administração Tributária não demonstrou com clareza suficiente as razões pelas quais concluiu que o impugnante exercia uma atividade suscetível de tributação que a existir a determinação da matéria coletável não fosse passível de quantificação por métodos indiretos em bem assim que a sua quantificação é a que indica e não outra.
Desta forma se conclui que a AT não esgotou os meios de que poderia dispor para determinar a real situação tributária dos impugnantes, pelo que não cumpre a Fazenda Pública o ónus de prova que lhe incumbia para o efeito e em face do que não se encontra fundamentada a sua decisão de recurso a métodos indiretos para determinação da matéria coletável do impugnante, bem assim a sua quantificação.
Nestes termos e como nos presentes autos, os atos de liquidação adicionais de IRS têm por referência o resultado de uma proposta da inspeção tributária que recorreu a métodos indiciários para cálculo da matéria tributável que padece de vício por erro nos pressupostos de facto e na quantificação da matéria tributável, que carece de fundamentação, impondo se, por isso, determinar a sua anulação, bem assim dos correspondentes juros compensatórios.
Pelo exposto quer por não se encontrar preenchidos os pressupostos invocados pela Fazenda Pública para apurar o lucro tributável por métodos indiretos, quer por erro nos pressupostos quer por erro de quantificação é de anular as liquidações adicionais de IRS aqui impugnadas.
Fica prejudicado, em face da procedência do vício de falta de fundamentação do recurso aos métodos indiretos, o conhecimento dos demais vícios invocados - artigo 660.º, n.º 2 do CPC (atual 608.º), aplicável, ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT.».

A Sentença recorrida não é muito assertiva, pois analisa no mesmo momento a possibilidade de recurso aos métodos indiretos e a respetiva quantificação, assim como a fundamentação.

Não obstante alguma ou outra imprecisão, parece resultar que faz o enfoque na ausência da demonstração do recurso aos métodos indiretos, muito embora também refira não estar verificada a fundamentação da quantificação da matéria coletável (que melhor dito, seria ter o contribuinte logrado provar o excesso de quantificação da matéria coletável).

Conforme é sabido, a aplicação dos métodos indiretos (na ocasião a que os factos dos autos se reportam, eram designados como métodos indiciários), divide-se em dois momentos: o primeiro, a cargo da Administração Tributária, que é o da comprovação dos pressupostos para aplicação de métodos indiretos, o qual respondido no sentido afirmativo, permite passar ao segundo momento, que é do da fixação da matéria coletável, neste caso incumbindo ao contribuinte o ónus da prova do excesso da sua quantificação.

Tendo em conta que a Credencial para a inspeção data de 18/02/2000 e Relatório de Inspeção de 15/06/2000, ao caso é aplicável o regime da Lei Geral Tributária, não obstante os factos serem anteriores á sua vigência, na medida em que o assunto cai no âmbito da norma transitória do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro (diploma que aprova a Lei Geral Tributária), segundo a qual:
Artigo 3.º (Revisão da matéria tributável)
1 - O regime da revisão da matéria tributável previsto no presente diploma aplica-se apenas às reclamações apresentadas após a sua entrada em vigor.
2 - O contribuinte pode optar, até à entrada em vigor do novo Código de Processo Tributário, pelo regime de reclamação previsto nos artigos 84.º e seguintes do Código de Processo Tributário vigente.
Nada consta que o contribuinte tivesse efetuado a opção que refere o n.º 2 desta norma transitória, por isso ao caso é aplicável a Lei Geral Tributária (artigos 87.º a 90.º, 74.º e 77.º), bem como o Código do IRS (então artigo 38.º).

Assim, é à Administração tributária que compete apresentar os pressupostos para a realização da avaliação indireta, devendo fundamentar o recurso a tais métodos, cabendo ao contribuinte o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação – vide n.º 3 do artigo 74.º da LGT.

Os pressupostos para o recurso a métodos indiretos devem estar fundamentados, conforme determina o n.º 4 do artigo 77.º da Lei Geral Tributária:
“A decisão da tributação por métodos indiretos nos casos e com os fundamentos previstos na presente lei especificará os motivos de impossibilidade da comprovação e quantificação diretas e exatas da matéria tributável, ou descreverá o afastamento da matéria tributável do sujeito passivo dos indicadores objetivos da atividade base científica, e indicará os critérios utilizados na sua determinação.”

Neste sentido, veja-se o Acórdão, também deste TCA Norte de 09/03/2006, proferido no processo n.º 00153/04 (em www.dgsi.pt), cujo sumário é o seguinte:
1. Constitui, no presente, entendimento jurisprudencial unânime e uniforme o de que, em situações de utilização de métodos indiciários (hoje, avaliação indirecta da matéria tributável) na determinação do lucro tributável (matéria tributável), cabe à AT o ónus de prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos da sua actuação, isto é, “o ónus de provar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso aos métodos indiciários se tornou a única forma de calcular o imposto a liquidar, externando os elementos que a levaram a concluir nesse sentido, e incumbindo ao Tribunal analisar se ela enunciou factos objectivos e concretos, verificados, donde possa concluir-se pela existência dos pressupostos legais dos quais depende o apuramento do imposto pelo referido método”.

Ora, a Sentença referiu que na reunião da Comissão de Revisão da Matéria Coletável, a Administração Tributária, admitiu que sempre poderia fazer um exame à escrita da firma I., Lda., de modo a superar as dúvidas quando ao facto de o contribuinte não ter tido quaisquer proveitos, para além dos obtidos como trabalhador independente. Mais referiu, que foi proposto um acordo ao contribuinte, tendo em conta as provas apresentadas na sua reclamação, que era o aceitar que o Impugnante não teve qualquer proveito com o transporte de máquinas propriedade da empresa.
Analisando aquela Ata, com a acuidade que lhe é devida, conclui-se que a menção do exame à escrita da firma I., tem a ver antes com as referências efetuadas nos parágrafos anteriores sobre a relação do Impugnante com aquela firma. Assim, a Inspeção detetou uma série de negócios realizados pelo Impugnante, quer com a I., quer com outra sociedade (N.), sendo que em ambas os sócios são os mesmos, por coincidência sogros do Impugnante.
Conforme referido na Ata, o Impugnante adquiriu a viatura «XX-XX-XX» à empresa N., em execução fiscal ocorrida em 17/11/1998, através de um cheque emitido por um sócio da I., apesar da viatura se encontrar em nome do Impugnante desde 1990 (vide título de registo de propriedade a fls. 113 e 114 do proc. físico). Ora, isto levaria a pressupor que o Impugnante estaria em condições de embargar de terceiro, mas não, voltou a adquirir a viatura que estava registada em seu nome, com dinheiro da I..

Refere-se também na Ata que, analisados os documentos da contabilidade da I., não se pôde concluir haver qualquer correspondência entre as Guias de Remessa em nome do Impugnante e os alegados transportes de madeira para as instalações da empresa, ou seja, de mercadoria que seria da I. e não do Impugnante.

Diz-se, ainda, na Ata que, em relação aos custos incorridos com o camião, não foi encontrado na contabilidade da I. documentos que comprovassem ser esta empresa a suportar os custos com o mesmo, tais como seguros, combustíveis e reparações.

Mais refere a Ata que, na contabilidade da I. foi encontrado um documento referente ao pagamento ao Impugnante do que seria o reembolso de suprimentos.

É na sequência destes relatos, que na Ata se refere subsistirem dúvidas quanto ao facto de o Reclamante (portanto, o Impugnante) não ter tido quaisquer proveitos, para além dos obtidos como trabalhador independente.

Ou seja, a Administração Tributária não está a colocar em causa a obtenção de rendimentos por parte do Impugnante, mas a referir que para além dos rendimentos como trabalhador independente, o Impugnante ainda teria obtido outro tipo de rendimentos, situação apenas esclarecida com um exame à escrita da I..

Daqui resulta que, tendo em conta o tipo e forma de negócios efetuados pelo Impugnante, assim como o reembolso de suprimentos, legitimam o recurso a métodos indiciários, pelo que aquele segmento da Ata («subsistem dúvidas») contribui antes para fundamentar o recurso a métodos indiciários e não para lançar a dúvida sobre se o Impugnante teve ou não rendimentos.

Desta forma, quando a Sentença se socorre apenas da frase «subsistem dúvidas quanto ao facto de o reclamante não ter tido quaisquer proveitos», para concluir de imediato existirem dúvidas sobre o recurso a métodos indiretos (e até sobre o facto tributário), incorre em erro de julgamento, pois aquela frase não pode ser analisada isolada do demais que lhe antecede. Assim, conforme acima esclarecido, aquela referência não comporta uma dúvida que a Inspeção tenha sobre a matéria, mas antes uma motivação para a aplicação dos métodos indiretos.

Diga-se, que o Impugnante não logra esclarecer as questões colocadas na Ata da Comissão de Revisão, pelo que não infirma o recurso aos métodos indiciários, que se devem considerar justificados.

Para além do que fica exarado na ata, também o Relatório da Inspeção Tributária refere que não encontra correspondência entre algumas Guias de Remessa e as Faturas, situação que também legitima o recurso a métodos indiretos; muito embora aceite a correspondência entre algumas outras Guias de Remessa e algumas Faturas.

Verifica-se, ainda que existem Guias de Remessa emitidas sem menção de data e que o Impugnante tinha Guias de Remessa emitidas em seu nome, mas sem estar coletado; situações que também fundamentam o recurso a métodos indiretos.

Em face do exposto, conclui-se que está fundamentado o recurso aos métodos indiciários.

Aceite o recurso a métodos indiretos, cabe ao contribuinte comprovar o excesso da sua quantificação, pelo que passaremos à análise da factualidade pertinente.

Ora, a Administração Tributária, quer no Relatório da Inspeção, quer posteriormente no âmbito da Comissão de Revisão, aceita que algumas Guias de Remessa emitidas pelo Impugnante, não se refiram a trabalhos ou serviços prestados por ele.
Assim, no Relatório de Inspeção, no ponto «2.3 – Outras situações», diz-se:
As guias de remessa, segundo declarações do suj. passivo e sócio da firma I. serviam para a mercadoria poder circular na via publica, sendo posteriormente facturada, pelo menos alguma, em nome de I., Lda, sem que no entanto nessas facturas fosse mencionada a guia de remessa que acompanhou a mercadoria, tendo no entanto sido possível através da identificação do destinatário, mercadoria transportada, facturada e respectiva data estabelecer alguma relação entre algumas guias de remessa e facturas conforme se discrimina nos capítulos seguintes. [vide alínea A) da matéria de facto supra, pág. 8 da Sentença].

Por sua vez, na Ata da Comissão de Revisão, o Perito da Administração Tributária (que é como quem diz, a Administração Tributária, na medida em que o Diretor de Finanças sancionou o entendimento do Perito), aceitou as correspondências entre as Guias de Remessa emitidas pelo Impugnante e as Faturas ou as Vendas a Dinheiro emitidas pela «I., Lda.». Essa correspondência é efetuada em Anexo à Ata, conforme acima transcrito na matéria aditada.
Ou seja, a Administração Tributária aceita que nem todas as Guias emitidas pelo Impugnante correspondiam a trabalhos ou serviços prestados por ele, mas antes a serviços ou compras e vendas realizadas pela «I., Lda.».
O Impugnante afirma que os serviços constantes das Guias de Remessa eram efetuados ao serviço da «I., Lda.», empresa da qual era trabalhador dependente, pelo que, não obstante as Guias de Remessa estarem em seu nome, tal deveu-se ao facto de aquela empresa estar com dificuldades diante de alguns credores.
Ora, no seguimento do que acima foi aditado à matéria de facto, podemos verificar mais algumas correspondências entre as Guias de Remessa e Faturas ou transportes, trabalhos ou compras e vendas que não dizem respeito ao Impugnante, mas antes à «I., Lda.».
Vejamos o ano de 1996.
Assim, conforme dado por assente nas alíneas L), M), N) e O), o Impugnante emitiu a Guia de Remessa n.º 345, em 06/03/1996, relativa ao transporte de uma máquina industrial que vem da oficina de Vila Nova de Poiares. Local de Carga: Vila Nova de Poiares. Na mesma data foi emitido pela «I., Lda.» o cheque do Banco Nacional Ultramarino no valor de Esc.: 83.079$00, a favor de «U., Lda.». Por sua vez, esta última empresa, sita em Vila Nova de Poiares, havia emitido a Venda a Dinheiro n.º 100.000015, em 01/03/1996, no valor total de Esc.: 83.078$00, para ser paga pela «I., Lda.», a qual se deve considerar paga por esta, atento o cheque em apreço, bem como a nota de lançamento na sua contabilidade. Esta venda a dinheiro discrimina os trabalhos efetuados na máquina, destrinçando entre mão-de-obra e material aplicado. Ora, tendo em consideração todos estes elementos, ou seja, Venda a dinheiro emitida à «I., Lda.», cheque passado pela «I., Lda.», no exato montante da Venda a dinheiro, transporte de uma máquina que vem da oficina, sita na localidade onde foi carregada e lançamento do pagamento na contabilidade da «I., Lda.», permite-nos concluir que não se tratou de um trabalho ou transporte por conta do Impugnante, mas antes, como o mesmo alegou, da reparação de uma máquina da «I., Lda.». Desta forma, não tinha aquela Guia de Remessa de relevar para a matéria de facto tributável ao Impugnante.

Por seu turno, a matéria aditada sob as alíneas P), Q), R) e S), também permitem verificar que estava em causa o transporte de uma máquina para realizar trabalhos de corte de pinheiros para a «I., Lda.» e não um serviço prestado pelo Impugnante. Assim, verifica-se que no dia 24/08/1996, foi transportada uma máquina industrial de Vila Pouca para um pinhal sito em Molelos e que no dia 27/08/1996, foi realizado o transporte de regresso dessa máquina para Vila Pouca. Por sua vez, em 24/08/1996, M., residente em (…), emite um recibo onde refere que recebeu da «I., Lda.» a quantia de quinhentos mil escudos, referente à venda «de meus pinheiros no lugar de …». Também outro vendedor, residente, igualmente, em (…), declara que recebeu da I., determinada quantia pela venda de pinheiros e eucaliptos. Por aqui se conclui que a máquina esteve a trabalhar no corte de pinheiros em Molelos de 24 a 26 de agosto de 1996 e que tal trabalho era para a «I., Lda.». Assim, as Guias de Remessa nos. 243 e 246, de 24/08/1996 e 27/08/1996, também não podiam ter sido adicionadas à matéria tributável do Impugnante.
Analisemos, agora, o ano de 1997.

O Impugnante junta com a Petição Inicial algumas Guias de Remessa, em relação às quais se pode fazer uma correspondência com faturas emitidas pela «I., Lda.», mas essas situações acabaram já por ser reconhecidas na reunião da Comissão de Revisão, conforme se pode ver pela matéria de facto acima aditada sob a alínea J), onde consta a numeração das guias de Remessa e das correspondentes Faturas. É o caso das Guias de Remessa que tem emitida pela empresa a correspondente fatura, tais como as Guias e as Faturas a seguir referidas:
Guia 364 (fls. 45 do proc. físico, doc. 32 da PI) – Fatura 0616 (fls. 46, doc. 33 PI);
Guia 368 (fls. 47, doc. 34 da PI) – Fatura 0619 (fls. 48, doc. 35 PI);
Guia 387 (fls. 49, doc. 36 PI) – Fatura 0638 (fls. 50, doc. 37 PI);
Guia 392 (fls. 51, doc. 38 PI) – Fatura 384 (fls. 52, doc. 39 PI);
Guia 393 (fls. 53, doc. 40 PI) – Fatura 0651 (fls. 60, doc. 45 PI);
Guia 400 (fls. 56, doc. 41 da PI) – Fatura 0650 (fls. 57, doc. 42 PI);
Guia 424 (fls. 53, doc. 43 PI) – Fatura 0685 (fls. 59, doc. 44PI);
Guia 428 (não consta dos autos) – Fatura 0698 (fls. 0698);
Guia 429 (fls. 62, doc. 47 PI) – Fatura 0701 (fls. 63, doc. 48 PI);
Guia 430 (fls. 64, doc. 49 PI) – Fatura 0711 (fls. 65, doc. 50 PI); e
Guia 432 (fls. 66, doc. 51 PI) – Fatura 0716 (fls. 67, doc. 50 PI).

Portanto, esta documentação apresentada pelo Impugnante, é irrelevante para os termos da causa, uma vez que já lhe foi reconhecida no âmbito da Comissão de Revisão da Matéria Coletável.
Resta apreciar a demais documentação junta, mas apenas a referente ao ano de 1997, pois aqui estão apenas em causa os anos de 1996 (já acima decidido) e de 1997, sendo que o Impugnante junta documentação dos anos de 1995, 1999 e 2000, que não serão analisadas, por estarem fora do âmbito desta impugnação.
A fls. 68 do proc. físico (doc. 53 da PI) consta a Guia de Remessa n.º 365, emitida em nome de L., com a designação de «Quant. 20m – solus de eucalipto», com data de 20/01/1997, local de carga Pedraires, Local de descarga Vimioso. A fls. 69 do proc. físico (doc. 54 da PI) consta a Guia de Remessa n.º 394, emitida em nome de U., SA, com a designação de «Quant. 25m – eucalipto em casca», com data de 11/03/1997, local de carga Vila Pouca, Local de descarga Aveiro.

O Impugnante refere no artigo 35.º da Petição Inicial que estas Guias 365 e 394, respeitam ao empréstimo do veículo (camião) ao Sr. L., vizinho e amigo dos sócios da «I., Lda.». Ora, esta afirmação não resulta minimamente provada, pois que mais nenhum documento é apresentado como respeitante ao dito empréstimo, como seria natural, uma vez que se afigurava pertinente a emissão de uma declaração de empréstimo do veículo para os dias em causa. Para além disso, o referido L., estava arrolado como testemunha, sendo que na sequência do despacho judicial de fls. 175 do proc. físico, segundo o qual o Impugnante devia indicar os factos a que pretendia inquirir as testemunhas, sob pena de nada dizer o processo seguir os seus termos, sem inquirição de testemunhas. O Impugnante nada respondeu a este despacho, pelo que não foi realizada inquirição de testemunhas. Desta forma, não logra demonstrar o alegado a este título.

Alega o Impugnante nos artigos 32.º e 33.º da PI que as Guias 371, 375 e 389, referem-se a transporte de um trator com reboque e grua de S. Joanino para Tábua e regresso, por ser o local onde a «I.» comprou madeira, constando o recibo de doc. 27 da PI. Analisado o recibo em apreço (fls. 40 do proc. físico), no mesmo consta a data de 21 de fevereiro de 1995, pelo que está fora do âmbito desta Impugnação. Para além disso, não estão juntas aos autos as Guias de Remessa 371, 375 e 389, pelo que não é possível confirmar o alegado, com alguns dos demais recibos que junta e que e que até poderiam ser de algum vendedor de Tábua.
Alega o Impugnante no artigo 34.º da PI que as Guias de Remessa aí referidas correspondem a faturas ou vendas a dinheiro da «I., Lda.». Ora, conforme acima já referido na reunião da Comissão de Revisão foram admitidas estas guias por haver correspondência com faturas emitidas pela empresa. Só não foi reconhecida a Guia n.º 410, em nome da «I., Lda.», datada de 30/04/1997, com a descrição de: 9,780 Kg de rolos de pinho e 26 travessas para o caminho de ferro. Local de carga, Moitinhos e Local de descarga Vila Pouca. Ora, o Impugnante não junta qualquer fatura em relação a esta guia de Remessa, ao contrário que que faz com as demais referidas no artigo 34.º da PI. Aliás, neste artigo 34.º o Impugnante menciona treze Guias de Remessa e apenas doze Faturas, concluindo-se que falta a fatura que eventualmente corresponderia à Guia n.º 400. Sem a respetiva fatura, não se pode dar como provado o alegado pelo Impugnante.

Alega o impugnante no artigo 36.º da PI que as Guias nos. 372, 373, 375, 376, 377, 378, 380, 381, 382, 383, 384, 385, 386, 411, 414, 426 e 427, respeitam a transportes de madeira comprada em Tábua pela «I.» e cujo recibo consta de doc. 27 da PI (fls. 40 do proc. físico). Analisado o recibo em causa o mesmo contém a data de fevereiro de 1995, ano que aqui não está em causa, pelo é inócuo para os termos desta Impugnação.

No artigo 37.º da PI o Impugnante refere-se às Guias nos. 399, 412 e 419, só que estas referem-se ao ano de 1996, já acima tratado, pelo que não podem ser invocadas para o ano de 1997.

Por fim, alega o Impugnante no artigo 38.º da PI que as Guias nos. 401, 405, 407 e 431, respeitam a transporte de madeira para a sede da «I., Lda.», que tem os respetivos recibos sob os docs. 55 e 56 da PI (fls. 70 e 71 do proc. físico). Analisados os recibos em apreço, verifica-se que um tal Rui Real, declara ter recebido da «I., Lda.», nos dias 13/03/1997 e 03/04/1997, quantias referentes à venda de madeiras e a eucaliptos, em Tondela, tendo a indicação do número do cheque que foi emitido para esse pagamento.

Não constam dos autos as Guias nos. 401, 405, 407 e 431 para poder fazer o confronto de dizeres e datas, com os recibos invocados pelo Impugnante. No entanto temos a referência sobre a sua datação no Relatório da Inspeção Tributária, conforme se pode ver pela transcrição do mesmo acima que aqui se reproduz:
4.3 - Exercício de 1997
Emitiu guias de remessa de livros pela seguinte ordem de datas, nº 360 a 400 sendo esta última datada de 07/04/97 e depois passando para a guia nº 401 datada de 09/07/97 até á nº 431 datada de 01/09/97, (…).

Ora, as guias invocadas pelo Impugnante, são emitidas no intervalo de tempo entre o dia 09/07/1997 e o dia 01/09/1997. Sucede que os recibos que alegadamente estas guias dizem respeito foram emitidos em 12/03/1997 e 03/04/1997, pelo que, atenta a tão larga distância entre as datas, não é possível fazer a correspondência entre aquelas guias e os recibos em apreço. Desta forma, sem nada mais estar alegado sobre as diferenças temporais e sem mais explicação, nem qualquer outro tipo de prova, não logra o Impugnante demostrar o que alega.

Compete, ainda, apreciar a invocada não propriedade do camião.
O Impugnante junta com a Petição Inicial cinco recibos de reparação do veículo «XX-XX-XX», sendo que três datam do ano de 1996 e dois do ano de 1998. Portanto, em relação ao ano de 1997, nada se pode considerar provado contra o que consta no registo de propriedade, o qual indica que o veículo «XX-XX-XX», está registado como propriedade do Impugnante.

Por sua vez, no que concerne ao facto de o Impugnante referir que é trabalhador dependente da «I., Lda.», junta quatro folhas de remunerações dos anos de 1995, 1996, 1997 e 1998. Em relação ao ano de 1997, a folha refere-se ao mês de março. Em todo o caso, esta referência a trabalhador dependente não é suficiente, uma vez que, sempre poderia o Impugnante poder ter alguma atividade não dependente, pelo que aquela folha de remunerações por si só, não é suficiente para se poder concluir que o Impugnante não pudesse ter outras remunerações.

Em face do exposto, não prova o Impugnante o alegado excesso de quantificação da matéria coletável em relação ao ano de 1997.
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Considerado que a presente Impugnação Judicial foi intentada no ano de 2002, verifica-se que a Fazenda Pública está isenta de custas processuais, atenta a aplicação do regime legal em vigor à data da interposição desta ação.
Ou seja, estava em vigor o Regulamento das Custas dos Processos Tributários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/98, de 11 de fevereiro, que teve entrada em vigor no dia 12/02/1998 (artigo 10.º do diploma em apreço), em cuja alínea a) do n.º 1 do art.º 3.º foi consagrada a isenção subjetiva de custas do «Estado, incluindo os seus serviços e organismos, ainda que personalizados».

Esta isenção deixou de ter consagração legal com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro no art. 2.º do Código das Custas Judiciais, mas este diploma continha uma disposição transitória no seu art. 14.º, n.º 1, por força do qual as alterações ao Código das Custas Judiciais que introduziu apenas se aplicavam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor, que ocorreu em 01/01/2004, nos termos do disposto no n.º 1, do seu art. 16.º.

Por sua vez, nos termos do disposto no art. 27.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 34/2008 de 26 de fevereiro, que aprovou o Regulamento das Custas Processuais (RCP), quanto à respetiva aplicação no tempo, a Fazenda Pública continuou a beneficiar da referida isenção, o mesmo se verificando atualmente, após a entrada em vigor das alterações introduzidas ao RCP pela Lei n.º 7/2012 de 13 de fevereiro, a qual, no n.º 4 do respetivo art. 8.º, prevê que: “Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, (...), e a isenção aplicada não encontre correspondência na redação que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei, mantém-se em vigor no respetivo processo, a isenção de custas.”

Assim sendo, e embora responsável pelas custas, em face do seu total decaimento, a Fazenda Pública encontra-se isenta do respetivo pagamento, na 1.ª instância, e no presente recurso. Vide neste sentido o acórdão deste TCA Norte de 28/01/2021, proferido no processo n.º 00057/14.7BUPRT (em www.dgsi.pt).
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

I - A aplicação dos métodos indiretos divide-se em dois momentos: o primeiro, a cargo da Administração Tributária, que é o da comprovação dos pressupostos para aplicação de métodos indiretos, o qual respondido no sentido afirmativo, permite passar ao segundo momento, que é do da fixação da matéria coletável, neste caso incumbindo ao contribuinte o ónus da prova do excesso da sua quantificação.

II – Quando a Administração Tributária estabeleça critérios para considerar que o contribuinte não obteve proveitos em determinadas situações, tais critérios também podem ser usados pelo tribunal para apurar se terá obtido ou não proveitos em situações idênticas.

III – Competindo ao contribuinte demonstrar o excesso de quantificação da matéria coletável, também lhe cumpre carrear para o processo todos os elementos de prova nesse sentido, pelo que não apresentando prova suficiente quanto ao alegado, não procede o excesso de quantificação.
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Decisão

Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento parcial ao recurso e, em substituição, julgar a Impugnação parcialmente procedente, anulando a liquidação de IRS do ano de 1996 e mantendo a liquidação de IRS do ano de 1997.
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Sem custas, por delas estar isenta a Fazenda Pública, atenta a data da interposição da Impugnação; e custas pelo decaimento pelo Impugnante, que se fixam em 77,01%.
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Porto, 23 de junho de 2021.

Paulo Moura
Cristina da Nova
Ana Paula Santos