Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00218/23.8BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/12/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:ATO DE EXCLUSÃO DE PROPOSTA;
LISTA DE PREÇOS UNITÁRIOS;
ESCLARECIMENTO E SUPRIMENTO DE PROPOSTA;
Sumário:
I . Na exata medida em que o preço contratual reflete o valor a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato [cfr. artigo 97º do CCP], imediatamente se conclui que a “lista de preços unitários” deve assegurar a completude dos trabalhos que integram o “objeto confesso” do contrato a celebrar, sob pena de desvirtuamento do preço final da proposta.

II. Apresentando-se distintivo que a Autora, aqui Recorrente, logrou apresentar a sua proposta com uma “lista de preço unitários” não atualizada relativamente ao novo mapa de quantidades retificado em sede esclarecimentos, deve assumir-se que a proposta apresentada não respeita o objeto do contrato a celebrar, sendo, portanto, de excluir à luz do disposto no artigo 70º, nº. 2, alínea a), ambos do CCP.

III. Tal desconformidade não pode ser objeto de “esclarecimentos” à luz da normação vertida no artigo 72º, nº. 2 do CCP, nem sequer de suprimento, por qualificar-se como uma patologia essencial, não suscetível de sanação [artigo 72º, nº. 3 do CCP].

IV- O princípio da concorrência, aferido na vertente da redução ao mínimo das situações de exclusões de proposta, só tem aplicação apenas nos casos de irregularidades formais, não essenciais e suscetíveis de suprimento.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte - Secção de Contencioso Administrativo, subsecção de Contratos Públicos:

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I – RELATÓRIO

1. A sociedade comercial [SCom01...], LDA., Autora nos presentes autos de AÇÃO de CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL em que é Réu o Município ..., vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 21.09.2023, que julgou a presente ação totalmente improcedente, e, consequência, absolveu o Réu e a Contra-interessada do pedido.

2. Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)

A) O presente recurso vem interposto da sentença proferida nos presentes autos, na parte em que o tribunal de 1ª instância decidiu o seguinte: “ a presente ação totalmente improcedente, e, em consequência, absolve-se a Entidade Demandada e a Contrainteressada do pedido. ”

B) Salvo o devido respeito, crê o Autor, com tal decisão, o Tribunal a quo faz uma interpretação distorcida relativamente ao enquadramento jurídico dos factos a juízo, bem ainda da doutrina dominante e da jurisprudência nacional e comunitária que não atendeu.

C) A autora na sua petição impugna o ato de revogação da decisão de contratar, do procedimento para “Requalificação do Espaço Público da Zona Histórica do ...” com conexão ao procedimento concursal lançado pelo recorrido enquanto entidade adjudicante, imputando-lhe os seguintes vícios: de forma por falta de fundamentação; de fundamento legal para a exclusão das propostas; violação dos princípios da contratação pública: princípios da legalidade, da concorrência, da prossecução do interesse público, da proporcionalidade e da tutela da confiança.

D) A contrainteressada “[SCom02...]” em sede de contestação sustentou que o ato impugnado não padece de qualquer vício, e, por conseguinte, a ação deveria improceder.

E) Contudo a autora em sede de impugnação administrativa sustentou, entre outros, que essa mesma contrainteressada, em sede de audiência prévia escrita, afirmou perentoriamente que a titular da proposta de preço mais baixo não era a sua (antes, da recorrente) - pelo que, deveria ser a proposta adjudicada)- tendo, à semelhança da contrainteressada, alertado para a existência de um erro de análise por parte do Júri.

F) A autora teve o cuidado de alertar o Tribunal a quo que o Júri ao decidir propor a revogação da decisão de contratar e a Entidade Demandada ter acompanhado, a mesma foi decretada, contendo tais vícios que colidem com os princípios basilares da atividade administrativa e, bem assim das regras da contratação pública - tendo apenas o Tribunal a quo, a propósito da pronúncia apresentada pela autora, acolhido nesta parte três § (o 2.° § por sinal incompleto no corpo da sentença).

G) A autora sustentou e reiterou que a deliberação do Júri do concurso em questão é frágil porquanto, os seus relatórios apresentam-se apenas com uma introdução mínima (com o preço base, a menção da fase procedimental), seguida da mesma fórmula repetitiva e vã em todos os relatórios.

H) A “falha” apontada à proposta da Autora não recai sobre qualquer atributo, termo ou condição e, deste modo, inexiste, impossibilidade de avaliar a sua proposta e nessa medida, não esteve bem o Tribunal a quo.

I) À proposta da autora não foi assacada a falta de qualquer dos documentos exigidos no programa de procedimento, razão pela qual, não se conforma com a decisão proferida, visto que a mesma padece de erro que determina a sua invalidade.

J) Isto porque, ao contrário do que resulta do ato impugnado, ao contrário do afirmado no 2.° Relatório Preliminar emitido pelo Júri, não existe qualquer desconformidade da proposta da autora com as peças do procedimento.

K) Mas, apenas na descrição das tarefas na Lista Unitária de Preços (fornecida em formato excel com os restantes elementos iniciais do procedimento pela Entidade Adjudicante) e a Lista Unitária de Preços Retificada (enviada posteriormente pela Entidade Adjudicante aos concorrentes como esclarecimento, e não como peça do procedimento, mas não em formato excel) - estando a proposta da Recorrente em conformidade com o Mapa de Quantidades.

L) Contudo, a este respeito, a Autora teve em atenção de esclarecer que “Tal discrepância nas descrições das tarefas tem uma motivação perfeitamente lógica e prática, atendendo ao alegado antes quanto ao desenvolvimento do procedimento, a Entidade Adjudicante lançou esclarecimentos, pelos quais Introduziu um Novo Mapa de Quantidades Retificado, mas fê-lo apenas em formato pdf. e não disponibilizou tal ficheiro em formato excel.”

M) Não tendo, além disso, sequer comunicado aos concorrentes a alteração que resultou do referido pedido de esclarecimentos, nem sequer publicado na plataforma Vortal!

N) Ora, mal andou o tribunal, quando invoca apenas artigos do CPA e CCP, pois dele não retira que o ato impugnado não se apresenta expresso; claro, coerente e completo, e que preterição da fundamentação do ato administrativo (no sentido de falta / ausência ou sua insuficiência) gera a sua invalidade.

O) O dever e o direito de fundamentação visa, além do mais, impor à administração que pondere muito bem antes de decidir (e ao Júri muito bem antes de propor).

P) Ou seja, sob pena de existir um desvio de poder quando o motivo principalmente determinante pelo qual o acto administrativo foi praticado não condisser ou não se compatibilizar com a prossecução do fim público eleito pela norma habilitante do exercício do poder discricionário;

Q) Desta forma, o tribunal a quo não esteve bem, ao julgar não verificado o vício de fundamentação; tal denota que não foi lida como deveria, salvo melhor respeito, a factualidade questionada naquela sede.

R) Não está em causa, ao contrário do que o tribunal a quo decidiu, estarmos perante uma omissão de apresentação do documento, antes, apresentação de um documento uma mera irregularidade suprível.

S) Razão pela qual a Recorrente não podia, nem devia, acatar uma decisão que assenta em erro de julgamento, porquanto, a sua proposta e do teor das propostas do Júri, não lhe foi assacada a falta de qualquer dos documentos exigidos no programa de procedimento!

T) A Recorrente reuniu todas as condições para ser adjudicada, tendo sido essa a primeira apreciação e concluiu (e bem) do Júri, não se compreendendo a conclusão pelo Tribunal a quo de que houve por parte desta a omissão de apresentação de documento.

U) É manifestamente desproporcional o entendimento trazido pelo Tribunal a quo, pelo que, não estaria vedado ao Júri do concurso pedir à Recorrente suprimento da omissão de que padecia o mapa de preços unitários.

V) Pelo que, a sentença ora recorrida deve ser revertida, no sentido de manter a adjudicação à proposta da Recorrente inicialmente graduada no 1° relatório preliminar, devendo ser julgada como procedente o vício de falta de fundamento da decisão impugnada.

W) Sempre se diga que não concorda a Recorrente ainda com a posição assumida pelo Tribunal a quo, na concordância com a exclusão da sua proposta na medida em que, tal circunstância, em qualquer procedimento concursal deve reduzir ao mínimo, uma vez que as causas de exclusão previstas na Lei - Código dos Contratos Públicos - devem, por cautela, estar sujeitas a uma interpretação restritiva, o que no presente concurso não se revela exceção.

X) As condições da proposta da Recorrente não são motivo de exclusão por simplesmente não violar aspetos da execução do contrato, ou seja, aqueles que digam respeito à execução do contrato, menos ainda afrontou o Programa de Procedimento.

Y) Julgamos, no caso destes autos, que a sentença exorbitou nas suas conclusões, porque tal não resultou da factualidade dada como provada ou do enquadramento legal no sentido e alcance da situação em juízo.

Z) Atento o disposto no artigo 94 n° 3 CPTA, na exposição dos fundamentos, a sentença deve discriminar os factos que julga provados e não provados, analisando criticamente as provas, e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.

AA) É assim, no entendimento do Recorrente, a decisão recorrida incorreu em flagrante erro de interpretação do Direito aplicável e dos termos em que assentou as suas conclusões.

BB) Com a redobrada atenção dispensada pelos Ilustres Desembargadores à questão acima expandida e a inversão do entendimento defendido pelo Tribunal a quo, e devem proceder os fundamentos invocados pela Recorrente tidos como determinantes da invalidade do acto impugnado,

CC) como proceder, também, o pedido de condenação da Entidade Demandada a adjudicar o procedimento para “Requalificação do Espaço Público da Zona Histórica do ...” à proposta apresentada pela Recorrente.

DD) Do que ficará infra exposto, não restará a V. Ex.as. senão aderir aos argumentos da Recorrente, para que, a final, seja proferido acórdão de reposição da legalidade e justiça (…)”.


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3. Notificado que foi para o efeito, o Recorrido produziu contra-alegações, que rematou da seguinte forma: “(...)

a) A recorrente, nas suas alegações de recurso, indica que a douta sentença recorrida, ao julgar a ação totalmente improcedente, e, em consequência, absolver o réu e a contrainteressada do pedido, interpretou de forma distorcida o enquadramento jurídico dos factos a juízo, entendendo que o ato administrativo praticado pela recorrida, que determinou que a revogação da decisão de contratar com a recorrente deveria ser anulado por existência de falta de fundamentação, de falta de fundamento para exclusão das propostas e de violação de princípio da contratação pública.

b) Ora, bem andou bem andou a sentença recorrida ao julgar totalmente improcedente a ação administrativa e ao absolver o réu e a contrainteressada do pedido, carecendo as alegações da recorrente de qualquer cabimento pelos motivos que adiante se passarão a expor.

Da falta de fundamentação

c) Refere a recorrente que o ato administrativo controvertido da recorrida padece de fundamentação, por apenas acolher o júri do procedimento, por unanimidade, o entendimento da reclamação apresentada pela contrainteressada no sentido de excluir a proposta da recorrente, uma vez que os atributos da proposta de preços apresentadas pela recorrente e restantes concorrentes não se encontrarem de acordo com o novo mapa de quantidades retificado, disponibilizado na plataforma Vortal.

d) Referindo que desconhecia o iter cognoscitivo do Júri e indicando que a falha apontada à proposta da autora não recai sobre qualquer atributo, termo ou condição, inexistindo impossibilidade de avaliar a sua proposta e alegando que o douto Tribunal não cuidou de confirmar se o Júri aplicou todos os poderes à sua disposição para expurgas os vícios que apontou à proposta de recorrente podia e devia ter aplicado todos os poderes à sua disposição para expurgar os vícios apontados à recorrente.

e) Como já referiu o recorrido na sua contestação, o 3.° relatório preliminar do júri, este é claro e sucinto ao expor os factos que levam à exclusão da autora: "...uma vez que alguns atributos da proposta de preços apresentada por estes concorrentes não se encontram de acordo com o novo mapa de quantidades retificado...”.

f) Foi a sentença recorrida cristalina na sua justificação pela improcedência da falta de fundamentação, quando na sua página 28 refere que “.se perante os elementos fornecidos pela Entidade adjudicante à ora A., podemos afirmar que se facultou fundamentação suficiente para lhe permitir uma opção consciente e esclarecida no momento em que impugna contenciosamente a decisão em crise, então, ficou a saber a A. qual o iter cognoscitivo percorrido e, consequentemente, que foi cumprido o dever de fundamentação” (negrito e sublinhado nosso).

g) Não havendo qualquer falta de fundamentação porque o Júri acolheu in totum a fundamentação da contrainteressada, que per se bem se fundamentou, assim como fundamentou que a proposta da recorrente não havia cumprido os requisitos do novo mapa de quantidades retificado, na estreita violação da alínea a) e c) do artigo 70.° do CCP.

h) Bem sabia a recorrente e bem sabe o recorrido que a sua proposta iria ao encontro com o mapa de quantidades inicial, mas assim não aconteceria já com o mapa de quantidades retificado, pelo que, se há uma retificação, bem sabia ou deveria saber a recorrente, tal como um homem médio o faria, que a proposta também teria de ser retificada para convergir numa análise positiva por parte do Júri.

i) Como bem referiu a douta sentença, se facultou a recorrente fundamentação suficiente para optar de forma consciente e esclarecida no momento em que impugna contenciosamente a decisão em crise, então também sabe a recorrente qual o âmago da fundamentação do Júri quando decidiu pela exclusão da proposta.

j) A recorrente sabe bem, ou deveria saber, que se se obsta a retificar a sua proposta, como o fez, o preço da mesma inaltera-se, a contrario de candidatos que procedem à retificação das suas propostas.

k) Se decidiu o Júri acolher a fundamentação da contrainteressada, foi no cumprimento da estrita legalidade constante da alínea a) e c) do artigo 70.° do CCP, legalidade essa que o Tribunal já se cumpriu apreciar.

l) Pelo que não existe qualquer falta de fundamentação, bem sabendo a recorrente que critérios não teriam sido preenchidos, comparando a sua proposta e os dois mapas, o inicial e o retificado, aos quais teve acesso e conhecia ou deveria conhecer do seu conteúdo.

Da falta de fundamento para exclusão das propostas

m) Alega a recorrente que a sua proposta não deveria ter sido excluída, uma vez que o CCP admite a retificação de erros ou lapsos constantes das peça do procedimento nos termos do n.° 3 do artigo 72.° do CCP.

n) Acontece que o n.° 3 do artigo 72.° do CCP não comporta qualquer intenção do legislador de dispor sobre o caso em apreço, porque a não apresentação da recorrente de um documento completo trata-se de uma formalidade essencial que, da forma como foi apresentado o mapa de quantidades retificado, apesar de se perceber que o preço final a pagar seria superior ao apresentado na proposta, a verdade é que, esse preço final não é sequer quantificável.

o) É que, nos termos do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.° 0172/21.0BEBRG de 27/01/2022, disponível in www.dgsi.pt, “O art. 72o n°3 está previsto precisamente para as situações que implicariam a exclusão do concurso mas que, por não se tratar de formalidade essencial, o legislador entendeu que se justificava o convite ao suprimento”. 

p) Segundo o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.° 764/19.8BELSB de 16/04/2020, disponível in www.dgsi.pt,

“i) Não são essenciais as formalidades que, embora preteridas, não tenham impedido a consecução do objetivo ou finalidade prevista pela lei ao exigi-las.

ii) De acordo com a teoria das formalidades relativamente essenciais, a inobservância de formalidades legais ou regulamentares pelo candidato a um concurso público só implica a exclusão da respetiva proposta quando a lei estabeleça tal sanção ou se não puder, no caso concreto, dar-se como assegurados os interesses ou valores que a formalidade preterida visava tutelar” (negrito e sublinhado nosso).

q) A lei dispõe expressamente na alínea a) e c) do artigo 70.° do CCP que se as propostas não cumprirem os requisitos plasmados, são excluídas, agindo bem o Júri ao excluir a proposta da recorrente, através da válida não aplicação do n.° 3 do artigo 72.° do CCP.

r) Pelo que não tinha o Júri que convidar a recorrente a suprir a irregularidade, por ser esta insuprível, andando bem a sentença quanto ao ponto esmiuçado.

Da violação de princípio da contratação pública

s) A recorrente, a ponto W) das suas conclusões, entende que as causas de exclusão previstas no CCP estão sujeitas a uma interpretação restritiva, indicando a ponto X) que as condições da recorrente não violam aspetos da execução do contrato.

t) Ora, é de total descabimento tal alegação de recorrente, uma vez que tanto o Júri como a douta decisão recorrida expressamente indicaram que a proposta da recorrente foi excluída por causa patente nas alíneas a) e c) do artigo 70.° do CCP.

u) É irrelevante qualquer alegação da recorrente no sentido de que as condições desta violam ou não aspetos da execução do contrato, uma vez que, encontrando-se com disposições omissas, violam o princípio da legalidade se forem acolhidas.

v) É que, ao contrário das pretensões da recorrente de fazer valer o seu incongruente direito à concorrência nos contratos públicos, encontrar-se-ia este em clara colisão com o princípio da legalidade, ambos patentes a n.° 1 do artigo 1.°-A do CCP.

w) Tendo em conta o instituto da colisão de direitos, o princípio da legalidade sempre se sobreporia ao princípio da concorrência, até porque a lei, neste caso o CCP, é disposto para fazer valer todos os princípios constantes do seu n.° 1 do artigo 1.°-A.

x) E, se a recorrente incumpriu as alíneas a) a c) do artigo 72.° do CCP, não pode agora vir invocar o princípio da concorrência para se sobrepor à lei e ao princípio da legalidade.

y) A sentença recorrida fez uma exímia interpretação da controvérsia gerada pela recorrente, na senda do princípio máximo da Administração que é a prossecução do interesse público, nomeadamente quanto à transparência e agilização e eficiência da máquina pública (…)”.


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4. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

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5. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito vertido no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.

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6. Cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

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II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR

7. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

8. Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir resume-se a saber se a decisão judicial recorrida, ao julgar nos termos e com o alcance descritos no ponto I) do presente Acórdão, “(…) incorreu em flagrante erro de interpretação do Direito aplicável e dos termos em que assentou as suas conclusões. (…)”.

9. É na resolução de tal questão que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.


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III – FUNDAMENTAÇÃO

III.1 – DE FACTO

A matéria de facto pertinente é a dada como provada na sentença «sub censura», a qual aqui damos por integralmente reproduzida, como decorre do art.º 663º, n.º 6, do CPC.


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IV- DO MÉRITO DA INSTÂNCIA DE RECURSO

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11. A Autora intentou a presente ação de contencioso pré-contratual, peticionando o provimento do presente meio processual por forma a ser (i) anulado “(…) o ato de revogação da decisão de contratar (…)”; (ii) “(...) admitida a proposta da autora e dos demais concorrentes excluídos com similares fundamentos (…)”; e (iii) “(…) o réu condenado a adjudicar o procedimento à autora, na medida em que a proposta da autora mereceu ser ordenada no 1.º lugar. (…)”.

12. Estribou tais pretensões jurisdicionais no entendimento - como se assinalou na sentença recorrida - de que “(…) o ato impugnado padece de vícios: vicio de forma por falta de fundamentação; falta de fundamento legal para a exclusão das propostas; violação dos princípios da contratação pública: princípios da legalidade, da concorrência, da prossecução do interesse público, da proporcionalidade e da tutela da confiança (…)”.

13. O Tribunal a quo, como sabemos, julgou improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual, consequentemente, absolvendo o Réu do pedido.

14. A ponderação de direito convocada para arrimar o juízo de improcedência das pretensões deduzidas pela Autora junto do T.A.F. do Porto foi, sobretudo, a seguinte: “(…)

A A. imputa ao acto impugnado vício de falta de fundamentação, pelo que cumpre chamar aqui à colação o quadro legal a respeito do dever de fundamentação dos actos administrativos [destaque nosso].

(…)

Conforme resulta do probatório, a entidade adjudicante, que aderiu integralmente à posição do júri do concurso, plasmada nos relatórios preliminares e no relatório final, decidiu excluir as propostas que inicialmente haviam sido admitidas, isto é, as propostas apresentadas pela ora Autora, pela [SCom03...] e pela [SCom04...] uma vez que a proposta de preços apresentadas por estas concorrentes não se encontravam de acordo com o novo mapa de quantidades retificado e disponibilizado na plataforma Vortal e fê-lo ao abrigo do disposto nas alíneas a) e c) do n°2 do art.° 70° do CCP, decisão que consta do 2° relatório preliminar, de que resulta a admissão de uma única proposta a apresentada pela [SCom02...].

Todavia, face à pronúncia da ora A. em sede de audiência prévia, na qual manifestou a discordância com a proposta de exclusão da sua proposta e a adjudicação à proposta apresentada pela [SCom02...], pronúncia com a qual o júri do concurso concordou, foi, em conformidade, decidido excluir, também, a proposta apresentada pela [SCom02...], com fundamento em que, alguns atributos da proposta de preços apresentada por este concorrente, também, não se encontravam de acordo com o novo mapa de quantidades retificado, disponibilizado na plataforma vortal.

Ora, ainda que a fundamentação que foi usada nos vários relatórios (preliminares e final) não prima pela clareza e não aponte os itens das várias propostas excluídas que se encontram em desacordo com o novo mapa de quantidades que terá sido disponibilizado pela plataforma Vortal, ainda assim, deles constam as razões que motivaram o Júri do Concurso a excluir quer a proposta da Autora quer as demais e que se reconduz, essencialmente, à desconformidade da proposta da Autora (e outras) com o Novo Mapa de Quantidades Retificado, o que permite dizer que foram cumpridos os requisitos mínimos do dever de fundamentação do acto praticado pela Entidade Demandada e aqui impugnado, o que terá permitido a tomada de posição da Autora sobre o projeto de decisão, expressa em sede de audiência prévia bem assim como em sede de impugnação administrativa e contenciosa, como se reflete no articulado inicial da presente ação.

Não podemos olvidar que, se perante os elementos fornecidos pela Entidade adjudicante à ora A., podemos afirmar que se facultou fundamentação suficiente para lhe permitir uma opção consciente e esclarecida no momento em que impugna contenciosamente a decisão em crise, então, ficou a saber a A. qual o iter cognoscitivo percorrido e, consequentemente, que foi cumprido o dever de fundamentação.

Nesta medida, improcede o imputado vício de falta de fundamentação (…)” [destaque nosso].

Quanto à falta de fundamento para a exclusão das propostas .

(…)

Vejamos se in casu estavam reunidos os pressupostos legais para excluir a proposta da A. (e Outras) ou se, como sustenta a A., ao abrigo do n°3 do art.° 72° devia ter sido formulado um pedido de suprimento da irregularidade da proposta que apresentou ao concurso e que, como admite, apresenta uma desconformidade com o novo mapa de quantidades retificado na sequência da apresentação de pedidos de esclarecimentos.

Essa possibilidade de dirigir um pedido de suprimento da irregularidade da proposta encontra-se prevista para as situações que implicariam a exclusão do concurso mas que, por não se tratar de formalidade essencial, se entendeu que se justificava o convite ao suprimento da irregularidade.

Como resulta assente, a proposta da A. (e de Outros) foi instruída com um quadro de preços unitários em termos idênticos ao Mapa de Quantidades patenteado a concurso, sem que constasse do mesmo a atualização que foi introduzida após a formulação de esclarecimentos em sede própria e que mereceu correção por parte da entidade adjudicante.

De acordo com o art.° 8 do Programa de Procedimento, a proposta dos concorrentes tinha que ser instruída com os seguintes documentos:

- Declaração do concorrente, elaborada em conformidade com o modelo constante do anexo I ao Código dos Contratos Públicos (CCP);

- Proposta de preço redigida de acordo com o modelo Anexo III;

Indicação dos preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes das habilitações contidas nos alvarás ou certificados de empreiteiro de obra publicas, ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção. I-P.

- Nota Justificativa do preço proposto;

- Cronograma financeiro, com resumo dos valores globais correspondentes à periodicidade definida para os pagamentos, subdividido pelas componentes da execução de trabalhos a que correspondam diferentes fórmulas de revisão de preços

- Plano de trabalhos, incluindo plano de mão-de-obra e plano de equipamento de acordo com o Caderno de Encargos.

- Memória descritiva e justificativa do modo de execução da obra;

- Lista de preços unitários, com o ordenamento dos mapas resumo de quantidades de trabalho.

Isto é, a proposta teria sempre que ser constituída pela lista de preços unitários por correspondência ao mapa de quantidade que, sendo retificado, como foi, após a formulação de pedidos de esclarecimentos, teria que ter uma adequada correspondência.

Não se verificando essa correspondência integral entre o mapa de preços unitários e o mapa de quantidades efetivamente definidor da obra a executar, ao contrário do entendimento da A., não há qualquer interpretação em desacordo com a previsão legal da entidade adjudicante quanto à efetiva verificação de causa de exclusão da proposta da A.

Note-se que o art. 146.°, n.° 2 al. d) do CCP prevê expressamente a exclusão das propostas que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos da clausula 8a do Programa de Procedimento, mais concretamente, lista de preços unitários (retificada como é óbvio) e do disposto no art. 57.°, n.° 1 al. c) e n.° 2 al. a) do CCP.

Não está, pois em causa, ao contrário do que a A. pretende fazer crer, uma mera irregularidade mas sim a própria omissão de apresentação do documento completo, que não configura, por isso, uma mera irregularidade suprível. Com efeito, contrariamente ao afirmado pela A. a falta de um documento completo e em conformidade com as alterações introduzidas e que integra a proposta, não configura uma mera irregularidade formal não essencial, mas antes um requisito essencial de que o concorrente se vincula a executar a prestação nos termos propostos, incluindo quanto aos preços unitários que devem compatibilizar-se com o mapa de quantidades e cuja preterição a lei comina com a exclusão da proposta. Consequentemente, e à luz do disposto no artigo 72° do CCP, no seu n° 3, sempre estaria vedado ao júri do concurso pedir à A. o suprimento da omissão de que padecia o mapa de preços unitários, por não se tratar de uma formalidade não essencial.

Efetivamente, como nota Pedro Gonçalves (in Direito dos Contratos Públicos, 4.a edição p. 887) '“irregularidades formais essenciais - causadas por preterição de formalidades essenciais - e, portanto, insupríveis ou insanáveis, serão, entre outras, as que se traduzem na apresentação de propostas [...] sem um documento relativa a um facto ou a uma qualidade que tinha de existir na data de apresentação da proposta [...]. Apesar de, nesses casos, ter subjacentes irregularidades ou vícios formais (vg. não entrega de um documento), a regularização teria o efeito de modificar ou de poder modificar as características substanciais da proposta. É neste juízo que se identifica a essencialidade da irregularidade. A regularização de uma proposta com irregularidades como essas violaria os princípios da transparência e da igualdade de tratamento dos concorrentes, e, nalguns casos, poderia até abrir porta à apresentação de uma proposta nova, diferente da apresentada no prazo disponível para esse efeito […]. Numa palavra, a irregularidade formal essencial é a que afeta uma proposta para a qual a lei prevê a exclusão e em que, para respeitar os princípios da igualdade dos concorrentes e da transparência, não é possível evitar este resultado.”

Considerando o exposto, é manifesto que a proposta da A., não contendo um documento nos exatos moldes em que era exigido e que definia a dimensão de trabalhos a executar, teria a mesma que ser excluída ao abrigo do art. 146.°, n.° 2 al. d) do CCP, não sendo admissível o suprimento da irregularidade nos termos do art. 72.°, n.° 3 do CCP.

Ora, em face da exclusão da proposta da Autora e das propostas que inicialmente haviam sido graduadas no 1° relatório preliminar e bem assim como a exclusão da proposta da ora Contra interessada, que havia sido graduada para efeitos de adjudicação no 2° relatório preliminar e, por conseguinte, que todas as propostas tinham sido excluídas, verificava-se a causa de não adjudicação constante da al. b) do n°1 do art.° 79° do CCP e, consequentemente, como está prevista, a extinção do procedimento concursal e “a revogação da decisão de contratar” que foi o que a entidade adjudicante fez, nos termos do disposto no art.° 80° do CCP.

Nesta medida, julga-se improcedente o suscitado vício de falta de fundamento da decisão impugnada [destaque nosso].

Quanto à violação de princípio da contratação pública [destaque nosso].

Sustenta a A. que a exclusão de propostas no procedimento concursal reduz a concorrência sendo que, as hipóteses de exclusão devem reduzir-se ao mínimo, às causas prevista na Lei e interpretar as normas de forma restritiva.

(…)

A exclusão de uma proposta reduz a concorrência. Logo as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas. Este mínimo necessário traduz-se precisamente em apenas permitir a exclusão nos casos expressos previstos na lei (tipificação dos casos de exclusão).

Sucede que, se como vimos, a proposta da A. não dava cumprimento integral às exigências legais e regulamentares, então, a questão da admissão da proposta fundada numa desejável admissão do maior número de propostas não era uma hipótese possível sob pena de violação de outro princípio igualmente estruturante da contratação pública como é o princípio da legalidade.

Na verdade, as condições da proposta são motivo de exclusão quando violem aspetos da execução do contrato, ou seja, aqueles que digam respeito à execução do contrato e que afrontem o Programa de Procedimento, como sucede no caso em apreço, sendo certo que o apelo que a A. faz ao princípio da concorrência, nos termos em que o faz, não se sobrepõe de forma alguma à circunstância de a proposta da A. e de Outros revelarem desconformidades não sanáveis em documento de apresentação obrigatória.

Ante o exposto, por não procederem os fundamentos invocados pela Autora tidos como determinantes da invalidade do acto impugnado, improcede, também, o pedido de condenação da Entidade Demandada a adjudicar o procedimento para “Requalificação do Espaço Público da Zona Histórica do ...” à proposta apresentada pela Autora (…)”.

15. Espraiada a fundamentação vertida na decisão judicial recorrida, e cotejando a motivação aduzida pela Recorrente no recurso jurisdicional, adiante-se, desde já, que o assim decidido é de manter.

16. Na verdade, e com reporte à invocada falta de fundamentação do ato impugnado, impera salientar que, como é jurisprudência pacífica, um ato estará suficientemente fundamentado sempre que um destinatário normal, colocado perante o ato em causa, possa ficar ciente do sentido da decisão nele prolatada e das razões que a sustentam, permitindo-lhe optar conscientemente entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação.

17. Descendo ao caso dos autos, temos que dimana da análise dos documentos juntos com o libelo inicial que, em sede do primeiro relatório preliminar, o júri concursal deliberou admitir a concurso as propostas apresentadas pela Autora, pela [SCom04...], S.A., pela [SCom03...], S.A., e pela [SCom02...], Lda., tendo ainda projetado adjudicar o procedimento concursal à proposta de preço mais baixo apresentado pela Autora.

18. Emerge ainda que, após reclamação apresentada pelo concorrente [SCom02...], Lda., foi elaborado o 2º Relatório Preliminar, no qual o júri deliberou projetar a exclusão das propostas apresentadas pela Autora, pela [SCom04...], S.A., e pela [SCom03...], S.A., “(…) uma vez que os atributos das propostas de preços apresentadas por estes concorrentes não se encontram de acordo com o novo mapa de quantidades retificado, disponibilizado na plataforma Vortal (…)”, tendo ainda projetado adjudicar o procedimento concursal ao concorrente [SCom02...], Lda.

19. Mais resulta que, após o exercício do direito de resposta por parte da Autora, foi elaborado o 3º Relatório Preliminar, no qual o júri deliberou projetar (i) a exclusão da proposta apresentada pela concorrente [SCom02...], Lda., e (ii) a revogação da decisão de contratação em face da ausência de propostas admissíveis, o que foi convertido em decisão final por deliberação da entidade adjudicante tomada em reunião camarária de 30.12.2022.

20. Conforme ressuma do que se vem de expor, a exclusão da proposta da Autora [e outras] mostra-se arrimada no entendimento da entidade decidente - plenamente suportada nos relatórios preliminar e final - de que “(…) os atributos das propostas de preços apresentadas (…) não se encontram de acordo com o novo mapa de quantidades retificado, disponibilizado na plataforma Vortal (…)”.

21. Pese embora esta fundamentação não seja modelar em termos de indicação das razões concretas que justificaram a exclusão da proposta da Autora, é de considerar suficiente a fundamentação do ato quando o seu destinatário demonstra bem ter compreendido os motivos determinantes daquele, dos quais se limita a discordar.

22. Ora, que a Autora, aqui Recorrente, ficou bem ciente do sentido da decisão da decisão de exclusão e das razões que a sustentam demonstra-o a eficácia da argumentação desenvolvida, quer (i) na sua resposta em sede de audiência prévia de interessados do segundo Relatório Preliminar, quer no (ii) no libelo inicial, aqui destacando-se o alegado nos artigos 64º e seguintes.

15. Realmente, cotejando os elementos em questão, assoma à evidência que a Autora, aqui Recorrente, bem compreendeu que a decisão de exclusão da sua proposta foi motivada pelo facto da mesma ter sido instruída com um lista de preços unitários em desconformidade com o mapa de quantidades retificado em sede de esclarecimentos nos termos e com o alcance aí explicitados.

16. E se assim é, então não existe justificação racional para, nestas condições de inoperância, considerar-se demonstrada a tese avançada pela Recorrente no que concerne à falta de fundamentação do ato impugnado.

17. Idêntica asserção é atingível no que tange à invocada falta de fundamento para a exclusão de propostas.

18. Com efeito, os presentes autos respeitam a ação administrativa de contencioso pré-contratual, envolvendo um procedimento concursal lançado Município ..., em 28.07.2022.

19. Quer isto tanto significar que o regime processual aplicável é o constante do Código dos Contratos Públicos, na redação dada pela Lei nº 30/2021, de 21 de maio, com a Retificação nº 25/2021, de 21 de julho 18ª versão], portanto, antes das alterações introduzidas pelo DL n.º 78/2022, de 07/11 [19º versão], e o que lhe sucedeu [D.L. nº. 54/2023, de 14.07].

20. É o seguinte o teor dos artigos 56º, 57º, 70º, e 146º do CPC, na redação aplicável aos autos: “(…)

Artigo 56.º

Noção de proposta

1 - A proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo.

2 - Para efeitos do presente Código, entende-se por atributo da proposta qualquer elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos.

Artigo 57.º

Documentos da proposta

1 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos:

a) Declaração do anexo i ao presente Código, do qual faz parte integrante;

b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;

c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento ou convite que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule;

d) (Revogada.)

2 - No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, a proposta deve ainda ser constituída por:

a) Uma lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução;

b) Um plano de trabalhos, tal como definido no artigo 361.º, quando o caderno de encargos seja integrado por um projeto de execução;

c) Um cronograma financeiro, quando o caderno de encargos seja integrado por um projeto de execução, contendo um resumo dos valores globais correspondentes à periodicidade definida para os pagamentos, subdividido pelas componentes da execução de trabalhos a que correspondam diferentes fórmulas de revisão de preços;

d) Um estudo prévio, nos casos previstos no n.º 3 do artigo 43.º, competindo a elaboração do projeto de execução ao adjudicatário.

3 - Integram também a proposta quaisquer outros documentos que o concorrente apresente por os considerar indispensáveis para os efeitos do disposto na parte final da alínea b) do n.º 1.

4 - Os documentos referidos nos nº. s 1 e 2 devem ser assinados pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.

5 - Quando a proposta seja apresentada por um agrupamento concorrente, os documentos referidos no n.º 1 devem ser assinados pelo representante comum dos membros que o integram, caso em que devem ser juntos à proposta os instrumentos de mandato emitidos por cada um dos seus membros ou, não existindo representante comum, devem ser assinados por todos os seus membros ou respetivos representantes.

6 - Nos procedimentos com publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia, é apresentado, em substituição da declaração do anexo i do presente Código, o Documento Europeu Único de Contratação Pública.

(…)

Artigo 70.º

Análise das propostas

1 - As propostas são analisadas em todos os seus atributos, representados pelos fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação, e termos ou condições.

2 - São excluídas as propostas cuja análise revele:

a) Que desrespeitam manifestamente o objeto do contrato a celebrar, ou que não apresentam algum dos atributos ou algum dos termos ou condições, nos termos, respetivamente, do disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 57.º;

b) Que apresentam algum dos atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 10 a 12 do artigo 49.º;

c) A impossibilidade de avaliação das mesmas em virtude da forma de apresentação de algum dos respetivos atributos;

d) Que o preço contratual seria superior ao preço base, sem prejuízo do disposto no n.º 6;

e) Um preço ou custo anormalmente baixo, cujos esclarecimentos justificativos não tenham sido apresentados ou não tenham sido considerados nos termos do disposto no artigo seguinte;

f) Que o contrato a celebrar implicaria a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares aplicáveis;

g) A existência de fortes indícios de atos, acordos, práticas ou informações suscetíveis de falsear as regras de concorrência.

3 - A exclusão de quaisquer propostas com fundamento no disposto na alínea e) do número anterior, bem como a existência de indícios de práticas restritivas do comércio, ainda que não tenham dado origem à exclusão da proposta, devem ser comunicadas à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica.

4 - A exclusão de quaisquer propostas com fundamento no disposto na alínea g) do n.º 2, bem como a existência de indícios de práticas restritivas da concorrência, ainda que não tenham dado origem à exclusão da proposta, devem ser comunicadas à Autoridade da Concorrência.

5 - A exclusão de quaisquer propostas com fundamento no disposto na alínea e) do n.º 2, devido ao facto do operador económico ter obtido um auxílio estatal e não poder provar que o mesmo é compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, deve ser comunicada à Autoridade da Concorrência e, quando o anúncio do respetivo procedimento tenha sido publicado no Jornal Oficial da União Europeia, também à Comissão Europeia.

6 - No caso de concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação em que todas as propostas tenham sido excluídas, o órgão competente para a decisão de contratar pode, excecionalmente e por motivos de interesse público devidamente fundamentados, adjudicar aquela que, de entre as propostas que apenas tenham sido excluídas com fundamento na alínea d) do n.º 2 e cujo preço não exceda em mais de 20/prct. o montante do preço base, seja ordenada em primeiro lugar, de acordo com o critério de adjudicação, desde que:

a) Essa possibilidade se encontre prevista no programa do procedimento e a modalidade do critério de adjudicação seja a referida na alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º;

b) O preço da proposta a adjudicar respeite os limites previstos no n.º 4 do artigo 47.º;

c) A decisão de autorização da despesa já habilite ou seja revista no sentido de habilitar a adjudicação por esse preço.

(…)

Artigo 146.º

Relatório preliminar

1 - Após a análise das propostas, a utilização de um leilão eletrónico e a aplicação do critério de adjudicação constante do programa do concurso, o júri elabora fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve propor a ordenação das mesmas.

2 - No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas:

a) Que tenham sido apresentadas depois do termo fixado para a sua apresentação;

b) Que sejam apresentadas por concorrentes em violação do disposto no n.º 2 do artigo 54.º;

c) Que sejam apresentadas por concorrentes relativamente aos quais ou, no caso de agrupamentos concorrentes, relativamente a qualquer dos seus membros, a entidade adjudicante tenha conhecimento que se verifica alguma das situações previstas no artigo 55.º;

d) Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 57.º;

e) Que não cumpram o disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 57.º ou nos n.ºs 1 e 2 do artigo 58.º;

f) Que sejam apresentadas como variantes quando estas não sejam admitidas pelo programa do concurso, ou em número superior ao número máximo por ele admitido;

g) Que sejam apresentadas como variantes quando não seja apresentada a proposta base;

h) Que sejam apresentadas como variantes quando seja proposta a exclusão da respetiva proposta base;

i) Que violem o disposto no n.º 7 do artigo 59.º;

j) (Revogada.)

l) Que não observem as formalidades do modo de apresentação das propostas fixadas nos termos do disposto no artigo 62.º;

m) Que sejam constituídas por documentos falsos ou nas quais os concorrentes prestem culposamente falsas declarações;

n) Que sejam apresentadas por concorrentes em violação do disposto nas regras referidas no n.º 4 do artigo 132.º, desde que o programa do concurso assim o preveja expressamente;

o) Cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º (…)”.

21. Volvendo ao caso dos autos, cabe notar que, de acordo com o artigo 8º do Programa de Procedimento, a proposta dos concorrentes tinha que ser instruída, de entre outros, com o documento “lista de preços unitários”.

22. Cabe ainda notar que, de harmonia com o artigo 13º do Programa de Procedimento, o critério de adjudicação escolhido fixado foi o da “proposta economicamente mais vantajosa” determinada pela modalidade de monofactor de avaliação do preço [cfr. artigo 4º do probatório coligido nos autos], o que significa isto que o preço foi o único elemento do contrato submetido à concorrência, já que, nos termos do artigo 56º, nº. 2 do CCP, “(…) entende-se por atributo da proposta qualquer elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos (…)”.

23. Sabe-se o preço contratual reflete o valor a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato [cfr. artigo 97º do CCP], de modo que a “lista de preços unitários” deve assegurar a completude dos trabalhos que integram o “objeto confesso” do contrato a celebrar, sob pena de desvirtuamento do preço final da proposta.

24. Apresentando-se distintivo que a Autora, aqui Recorrente, logrou apresentar a sua proposta com uma “lista de preço unitários” não atualizada relativamente ao novo mapa de quantidades retificado em sede esclarecimentos, deve concluir-se no sentido da existência de um fundamento de exclusão da sua proposta, nos termos do disposto no artigo 146º, nº. 2, alínea o) e do artigo 70º, nº. 2, alínea a), ambos do CCP.

25. Realmente, mercê da lista de preços unitários apresentada não assegurar a realização da completude dos trabalhos lançados a concurso, é de manifesta evidência que a proposta apresentada não respeita o objeto do contrato a celebrar, sendo, portanto, de excluir à luz da normação supra invocada.

26. A questão que se equaciona no imediato é a de saber se tal patologia procedimental é [ou não] suscetível de regularização procedimental, dessa forma evitando-se a exclusão da proposta da Autora.

27. Adiante-se, desde já, que a resposta é negativa.

28. De facto, estabelece o artigo 72º, n.ºs 1 a 3, do CCP, na redação aplicável aos autos, o seguinte: “(…)

1 - O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas.

2 - Os esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º

3 - O júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento (…)”.

29. Como se colhe inequivocamente do disposto no artigo 72º, nº. 2 do CCP, a faculdade de “prestação de esclarecimentos” não pode servir para contrariar os elementos constantes dos documentos que as constituem, nem alterar ou completar os respetivos atributos, nem visar suprir omissões que determinam a sua exclusão, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70º do CCP.

30. Logo, a irregularidade patenteada nos autos não podia ser objeto da prestação de esclarecimentos, por consubstanciar fundamento de exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70º do CCP.

31. De igual modo, e para que não subsistam quaisquer dúvidas, não podia ser objeto de suprimento.

32. De facto, o nº. 3 do artigo 72º do CCP, na redação aplicável, apenas permite o suprimento das “(…) das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento (…)”.

33. Contudo, esse não é o caso dos autos.

34. De facto, o preço constitui, no caso agora posto, o único atributo da proposta, pelo que, não podia o Júri solicitar esclarecimentos que pudessem conduzir à alteração do preço inicialmente indicado.

35. Efetivamente, o preço da proposta e respetiva indicação constitui um aspeto e uma formalidade absolutamente essenciais, cujas anomalias dão lugar, em regra, ou à retificação ou à exclusão, por constituírem, precisamente, um aspeto material crucial do conteúdo da proposta.

36. Na senda do que se expendeu no sobredito parágrafo 23) do presente aresto, não sentimos hesitação em assumir que a alteração da lista de preços unitários inicialmente apresentada conduz, invariavelmente, à alteração do preço final da proposta, de modo que deve qualificar-se a anomalia identificada nos autos [desconformidade da lista de preços unitários com o novo mapa de quantidades retificado em sede de esclarecimentos] como uma verdadeira patologia essencial e não suscetível de suprimento.

37. O que nos transporta para a evidência da inaplicabilidade do artigo 72º, nº. 3 do C.C.P ao caso versado.

38. Deste modo, fica abalada a consistência da proteção conferida pelo princípio da concorrência, aferida na vertente da redução ao mínimo das situações de exclusão das propostas apresentadas, já que esta garantia tem aplicação apenas nos casos de irregularidades formais, não essenciais e suscetíveis de suprimento, o que não é o caso dos autos.

39. Perante este quadro e tudo o quanto ante ficou exposto, entendemos ser forçosa a conclusão que a decisão judicial recorrida não merece qualquer reparo, mostrando-se certeiramente justificada.

40. Assim deriva, naturalmente, que se impõe negar provimento ao presente recurso, devendo ser confirmada a sentença recorrida.

41. Ao que se provirá no dispositivo.

* *

IV – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam em conferência os Juízes da Subsecção de Contratos Públicos da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso jurisdicional “sub judice”, e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique-se.


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Porto, 12 de janeiro de 2024,


Ricardo de Oliveira e Sousa

Luís Migueis Garcia - em substituição

Helena Maria Mesquita Ribeiro