Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00913/20.3BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/10/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:GARANTIA DA EXECUTADA ORIGINÁRIA; GARANTIA DO RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO.
Sumário:I. Decorre da interpretação do n.º 1, 6 e 7 do art.º 169.º do CPPT a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do art.º 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, porém se a garantia prestada, ou os bens penhorados não garantirem a totalidade da dívida exequenda e o acrescido não se suspende a execução fiscal.

II. Em sede de oposição à execução fiscal, a garantia prestada pelo responsável subsidiário, somente responde pelo montante em dívida da sua responsabilidade, não podendo ser somada à prestada pelo executada originária com vista a suspensão da execução fiscal, pois tem finalidade diferentes. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:R.,
Recorrido 1:Fazenda Pública.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, R., Lda., NIPC nº (…), com sede na Rua (…), (…) interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Porto que julgou improcedente a reclamação interposta, nos termos do art.º 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, do ato de penhora de rendas, ao qual foi atribuído o número de pedido de penhora 318220200000000440, no montante de €1.163.722,68, praticado pelo órgão da execução fiscal.

Com a interposição do recurso, apresentou alegações e formulou as conclusões que se reproduzem: “(…)
1. A douta sentença recorrida julgou totalmente improcedente a presente reclamação apresentada contra o ato de PENHORA DAS RENDAS, ao qual foi atribuído o n.º de pedido de penhora 318220200000000440, no montante de € 1.163.722,68, praticado pelo órgão de execução fiscal;
2. Em primeiro lugar, entende a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito na interpretação dos artigos 18.º, 22.º, 23.º e 52.º da LGT e 169.º do CPPT, pois, ao invés do decidido impunha-se a conclusão de que os processos de execução fiscal se encontram suspensos tanto na esfera do revertido como na esfera da Recorrente;
3.ª As dívidas em apreço são dívidas da sociedade Recorrente, o que significa que foi a Recorrente que manifestou capacidade contributiva subjacente a tais dívidas e que o seu gerente apenas foi chamado para os processos de execução fiscal em virtude da sua insuficiência patrimonial da Recorrente.
4.ª Só porque no âmbito do processo de execução fiscal é permitida a cobrança de dívidas a um terceiro – que não o devedor originário – mediante aplicação do instituto da reversão, tal não significa que exista uma dupla manifestação de capacidade contributiva que permita uma duplicidade de cobranças perante a mesma dívida tributária, pelo contrário! O princípio da capacidade contributiva, constante dos artigos 103.º, 104.º e 13.º da CRP e ínsito nos artigos 18.º, 22.º e 23.º e da LGT, exige que as dívidas tributárias sejam da responsabilidade do sujeito que desencadeou o facto tributário, i.e., do sujeito sobre o qual impendeu a manifestação de riqueza sobre o qual incidirá o imposto;
5.ª É reconhecido entre a doutrina que “(…) estas técnicas de intermediação ou interposição de terceiros na satisfação dos créditos fiscais (…)” que visam «(…) lançar mão dos particulares para a realização do “interesse fiscal”, concretizado na percepção dos impostos em termos de simplicidade, comodidade, economia e segurança, pode afectar diversos princípios e preceitos constitucionais, designadamente os relativos aos direitos fundamentais, devendo, por isso, essa instrumentalização dos particulares na cobrança dos impostos ser rodeada de algumas cautelas» (JOSÉ CASALTA NABAIS, O dever fundamental de pagar impostos, 1998, Almedina, 492; sublinhado nosso);
6.ª É pacífico que nas situações de reversão a capacidade contributiva inerente ao imposto em dívida é una e pertence ao devedor originário e que a lei tributária mais não faz do que, verificadas determinadas circunstâncias, “estender” a responsabilidade pelo pagamento do imposto ao devedor subsidiário e, nessa medida, permitir que a administração tributária lhe exija o pagamento, sob determinadas circunstâncias;
7.ª Apesar de o benefício da excussão prévia estar previsto no âmbito do processo de execução fiscal (cf. artigo 23.º, n.º 2, da LGT e artigo 153.º, n.º 2, do CPPT), aquele encontra-se mitigado, pois tem sido aceite pela jurisprudência que é possível concretizar a reversão de dívidas tributárias antes do esgotamento efetivo do património do devedor originário;
8.ª Assim, contrariamente à sua ratio – cobrança efetiva de dívidas –, a reversão constitui na maioria das vezes um mecanismo de garantia preventiva para a cobrança da dívida, como sucedeu na situação em apreço, uma vez que a reversão foi efetuada contra o gerente da Reclamante com uma mera função de garantia e não com a função de cobrança efetiva da dívida, pois ainda não se verificavam os pressupostos necessários que permitissem tal cobrança efetiva, em virtude de a legalidade das dívidas subjacentes ainda estar a ser sindicada em sede judicial na esfera do devedor originário;
9.ª Sob pena de as reversões não poderem ser efetivadas se não após a efetiva venda dos bens executados e consequentemente pagamento de parte da dívida exequenda, terá de considerar-se que os processos de execução fiscal cuja dívida se encontra garantida se encontram suspensos, independentemente do sujeito que prestou a garantia. Caso contrário estar-se-ia a impor um esforço desajustado e desproporcionado ao devedor subsidiário, pois ao invés de concretizar a reversão nesse momento, com as demais consequências, deveria então aguardar-se pela efetiva venda e esgotamento do património do devedor originário, salvaguardando-se o património daquele. Neste contexto, não se afigura admissível a penhora de rendas ora ordenada pela administração tributária;
10.ª A concretização da reversão sem respeito pelo benefício da excussão prévia não encontra justificação legal sólida e evidencia muitas incongruências da legislação fiscal a este propósito, em concreto, na situação vertente não é admissível que após ter sido ordenada a penhora do imóvel da Recorrente, após a reversão no âmbito da qual o devedor subsidiário apresentou penhor de ações que garantiu a totalidade da dívida, a administração tributária tenha ordenado a penhora das rendas da Recorrente;
11.ª O artigo 169.º do CPPT não especifica nem o tipo de garantia, nem o sujeito que poderá prestar tal garantia, sendo certo que o único requisito que se exige é que o processo de execução fiscal tenha uma garantia idónea associada, tal como previsto nos artigos 195.º a 199.º do CPPT;
12.ª Acresce que, independentemente de pela mesma dívida estarem a responder dois sujeitos distintos, é reconhecido que a dívida em apreço é apenas uma, sendo igualmente apenas um o processo de execução fiscal, não tendo sido instaurado um novo processo de execução fiscal na esfera do devedor subsidiário, autónomo e independente;
13.ª Assim, se a dívida exequenda se encontra totalmente garantida, independentemente de quem prestou tais garantias, o respetivo processo de execução fiscal terá de considerar-se suspenso nos termos do artigo 169.º do CPPT;
14.ª No que concerne especificamente ao n.º 6 do artigo 169.º do CPPT, a disponibilização da informação relativa aos montantes da dívida exequenda e acrescido, bem como da garantia a prestar apenas sucede quando inexiste outra garantia legalmente constituída no âmbito do mesmo processo de execução fiscal, o que não se verifica no caso sub judice, pelo que incorreu o douto Tribunal em erro de julgamento na sua aplicação;
15.ª Conforme resulta do facto 4) dado como provado (cf. p. 6 da sentença recorrida), “Foi efetuado o penhor de 2.500.000 ações da sociedade M., SA, no valor de €1.904.096,80, efetuada na esfera do responsável subsidiário e gerente da sociedade M.(…)”, logo, foi prestada garantia no âmbito do processo de execução fiscal em apreço, pelo que existindo litígios judiciais tanto na esfera da Reclamante como na esfera do devedor subsidiário no âmbito dos quais se sindica a legalidade das dívidas exequendas, e tendo sido prestada garantia, o processo de execução fiscal encontra-se suspenso na esfera de ambos os sujeitos, pelo que a penhora ora efetuada é manifestamente ilegal;
16.ª Encontrando-se devidamente demonstrado o erro de julgamento da sentença recorrida e devendo a mesma ser revogada com as demais consequências legais;
17.ª Em segundo lugar, entende a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito na interpretação dos artigos 18.º, n.º 2, e 266.º da CRP, 55.º da LGT e 46.º e 199.º, n.os 10 e 11, do CPPT , pois, ao invés do decidido impunha-se a conclusão de que o ato de penhora das rendas é manifestamente violador do princípio da proporcionalidade;
18.ª Para alcançar tal conclusão importa ter em consideração que estando suspensos os autos de execução fiscal, não é aplicável o artigo 217.º do CPPT (que legitima a prossecução de atos de cobrança coerciva nas situações de insuficiência patrimonial), pois tal disposição legal apenas poderia ser aplicável na eventualidade de não existir qualquer garantia idónea associada aos processos de execução fiscal, o que não sucede nos presentes autos conforme decorre da matéria de facto da sentença recorrida;
19.ª Existindo uma dívida que ascendia a € 1.163.722,68, e, à sua ordem coexistiam duas garantias que perfazem o montante total de € 2.029.502,07, é inequívoco que a dívida exequenda se encontrava já totalmente garantida e, consequentemente, a penhora de rendas ora promovida é manifestamente desproporcional, pois não é admissível a manutenção de pluralidade de garantias que ultrapassem largamente o valor em dívida;
20.ª O entendimento da administração tributária de que é possível de duplicar garantias a constituir no mesmo processo de execução fiscal é manifestamente violadora do princípio da proporcionalidade, o qual justifica os n.os 10 e 11 do artigo 199.º do CPPT e se encontra consagrado nos artigos 55.º da LGT e 46.º do CPPT e, ainda, nos artigos 18.º, n.º 2, e 266.º ambos da CRP;
21.ª Efetivamente, os n.os 10 e 11 do artigo 199.º do CPPT impõem a ideia de proporcionalidade da garantia prestada visto que na eventualidade de diminuição do valor dos bens que constituem a garantia aquela deverá ser reforçada e se em caso de diminuição do valor da dívida a garantia deverá ser reduzida, é óbvio que a proporcionalidade entre dívida e garantia deverá ser mantida independentemente de quaisquer acontecimentos supervenientes;
22.ª Do mesmo modo, o artigo 55.º da LGT e o artigo 7.º do CPA determinam expressamente que a administração tributária deve exercer as suas atribuições de acordo com o princípio da proporcionalidade;
23.ª Pelo que em face da colisão do direito de arrecadação de receita da administração tributária e do direito à propriedade privada dos sujeitos passivos – nos quais se incluem devedores originários e devedores subsidiários – deverá prevalecer o direito à propriedade privada, em virtude da aplicação do princípio da proporcionalidade, que deverá moldar toda e qualquer a atuação da administração;
24.ª Acresce que, para além da lei ordinária, a própria CRP no artigo 266.º, n.º 2, da CRP prevê que no que concerne à prossecução do interesse público “Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé” (sublinhado nosso);
25.ª Apreciando a situação sub judice e considerando que para garantir uma dívida no montante de € 1.163.722,68 (contando com o acrescido), coexistindo duas garantias à sua ordem que perfazem o montante total de € 2.029.502,07, é manifesto que a dívida já se totalmente garantida e que a penhora de rendas ora promovida é manifestamente desproporcional, pelo que a interpretação segundo a qual os artigos 23.º e 24.º da LGT, e bem assim, o artigo 215.º do CPPT permitem a duplicação de garantias na esfera do devedor originário e na esfera do devedor subsidiário para a cobrança da mesma dívida, é manifestamente inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade consagrado nos artigos 18.º, n.º 2, e 266.º, n.º 2, da CRP;
26.ª Em face do exposto, é manifesto o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo, pelo que deverá a sentença recorrida ser revogada, com as demais consequências legais.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida e, nessa medida, a anulação do ato reclamado nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA! (…)”

A Recorrida não contra-alegou.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no qual considerou que a deveria a sentença ser mantida e negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º4, do Código de Processo Civil), cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente (cf. art.º 635.º, n.º 4, do CPC), as questões que importam conhecer são as de saber se sentença incorreu em erro de julgamento de direito (i) na interpretação dos artigos 18.º, 22.º, 23.º e 52.º da LGT e 169.º do CPPT, pois, ao invés do decidido impunha-se a conclusão de que os processos de execução fiscal se encontram suspensos tanto na esfera do revertido como na esfera da Recorrente; (ii) e na interpretação dos artigos 18.º, n.º 2, e 266.º da CRP, 55.º da LGT e 46.º e 199.º, n.os 10 e 11, do CPPT , pois, ao invés do decidido impunha-se a conclusão de que o ato de penhora das rendas é manifestamente violador do princípio da proporcionalidade.

3. JULGAMENTO DE FACTO.
É a seguinte a matéria de facto dada como provada e como não provada na 1ª instância e que aqui se reproduz ipsis verbis:
“(…)
1) Foi instaurado no Serviço de Finanças de (...) 2, o Processo de execução fiscal n.º 3182201001109375 e apensos 3182201001109421, 3182201001109561 e 3182201001115871 contra a sociedade R., LDA, NIPC nº (...), para cobrança coerciva de retenções de IRC do ano de 2006, 2007 e 2008 e IMT de 2004 no montante global de € 923.657,30 - cfr as certidões de dívida de fls 1 a 7 dos autos;

2) Por não ter sido efetuado o pagamento da dívida referida em 1) foi penhorado o imóvel inscrito na matriz sob o n.º 4487, fração I, da freguesia da (...), com um valor patrimonial tributário de €125.406,27 – cfr Documento nº 1 apresentado com a p.i ;

3) Foram apresentadas Impugnações contra as retenções de IRC do ano de 2006, 2007 e 2008 e IMT de 2004 pelo aqui Reclamante que correm termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal sob os números 368/11.3 BEPRT; 452/11.3 BEPRT; 491/11.4 BEPRT e 3555/10.8 BEPRT (este último com recurso pendente no Tribunal Central Administrativo Norte) – por consulta do SITAF;

4) Foi efetuado o penhor de 2.500.000 ações da sociedade M., SA, no valor de €1.904.096,80, efetuada na esfera do responsável subsidiário e gerente da sociedade M.- cfr despacho de 30-08-2016 da Diretora Adjunta de Finanças do Porto; cfr. Documento nº 2 e 3 junto com a petição inicial;

5) Dá-se por reproduzida a notificação efetuada ao Reclamante relativa à penhora de rendas que aqui se transcreve e se encontra a fls 9 dos autos:
“(…)
Notificação após penhora
Nº. de Processo Executivo: 3182201001109375 e Aps.
Fica por este meio notificado(a) da penhora de Rendas infra identificada, efetuada ao abrigo dos artigos 228.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 779.º do Código de Processo Civil (CPC), para pagamento da quantia exequenda e acrescido, exigidos no âmbito do processo de execução fiscal supra indicado que corre termos neste serviço.
Da penhora, ora notificada, poderá, querendo, apresentar reclamação para o Tribunal Administrativo e Fiscal (artigo 276.º do CPPT), no prazo de 10 dias (artigo 277.º do CPPT), contados da presente notificação.
A notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil (artigo 39.º n.º 1 do CPPT).
Se efetuada para o domicílio fiscal eletrónico, a presente notificação considera-se efetuada no décimo quinto (15.º) dia posterior ao primeiro dia útil seguinte ao registo da sua disponibilização no sistema de suporte ao serviço público de notificações eletrónicas associado à morada única digital ou na caixa postal eletrónica (artigos 38.º e 39.º n.º 10 do CPPT).
Poderá consultar a sua situação processual no Portal da Finanças (www.portaldasfinancas.gov.pt), na opção Tributários» Serviços» Execuções Fiscais» Consultar Dívidas Fiscais, e proceder à regularização da sua situação tributária através dos meios habituais de pagamento, mediante guia(s) a obter no Portal das Finanças na opção referida, ou em qualquer Serviço de Finanças.
Mais poderá, querendo, obter esclarecimentos adicionais junto de qualquer Serviço de Finanças, através do E-balcão, disponível no Portal das Finanças ou do número de telefone 217 206 707 (Centro de Atendimento Telefónico - CAT).
Identificação da Penhora
Tipo de Penhora: Rendas
Identificação do Bem:
Data da Penhora: 2020-01-17
N.º Pedido de Penhora: 318220200000000440
Valor Atribuído: €1.163.722,68
(…)”
- Documento nº 4 junto com a p.i;

6) Dá-se por reproduzida para todos os efeitos legais, transcrevendo-se em parte o teor da Informação prestada pelo OEF em 14-04-2020:
“(…)
3. Atendendo ao alegado, cumpre-me informar o seguinte:
- Foi proferido despacho pela Diretora de Finanças Adjunta da Direção de Finanças de (...), em 30.08.2016, determinando o deferimento do pedido formulado pelo executado M., no âmbito do processo de execução fiscal 3182201001109375 (e Aps.), condicionado à constituição de penhor (cf. documentos do objeto – doc. 3).
- Em resposta a requerimento da reclamante, esta foi informada, em 23.12.2019 (cf. documentos do objeto – doc. 4), de que:
*Os processos executivos não estão suspensos para o devedor principal.
*Os processos executivos apenas estão suspensos para o revertido “M.”, que apresentou a oposição judicial 1413/16.1BEPRT, acompanhada de garantia na forma de penhor.
*A emissão do pedido de penhora para a devedora originária não se tratou de qualquer erro informático, tanto mais que os processos executivos apenas estão suspensos para o revertido e não para a sociedade “R., Lda”.
- Remetida a petição inicial ao Núcleo de Representação da Fazenda Pública da Direção de Serviços da Justiça Tributária, para análise prévia (atendendo à designação daquele núcleo para intervir em representação da Fazenda Pública em processos de valor superior a 1 milhão de euros – Despacho 6615/2013 do Diretor Geral da AT), vem aquela unidade orgânica informar que “analisadas as questões suscitadas pela Reclamante, entende a Fazenda Pública não assistir razão à mesma, pelo que os autos deverão ser remetidos ao Tribunal, a fim de prosseguirem os termos processuais subsequentes.” – cf. documentos do objeto – doc. 5.
Em conclusão:
- Pelos motivos enunciados, será se manter o ato reclamado.
- Uma vez que tem aplicação o disposto no nº 3 do artº 278º do CPPT, a subida da reclamação deverá ser imediata.
(…)”

7) A informação que antecede foi objeto do seguinte despacho:
“(…)
Concordo, pelo que mantenho o ato reclamado. Remeta-se ao TAF Porto.
Por subdelegação de competências do Chefe do S. F. (…) 2
(…)”

- cfr fls 22 dos autos;

Factos não provados:

Inexistem outros factos, para além dos que foram dados como provados, que revelem interesse para a boa decisão da causa... (…)”

4. JULGAMENTO DE DIREITO
A primeira questão a resolver é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito na interpretação dos artigos 18.º, 22.º, 23.º e 52.º da LGT e 169.º do CPPT.
Entende a Recorrente que contrariamente ao decidido impunha-se a conclusão de que os processos de execução fiscal se encontram suspensos tanto na esfera do revertido como na esfera da Recorrente.
O Recorrente alega, em síntese, que o artigo 169.º do CPPT não especifica nem o tipo de garantia, nem o sujeito que poderá prestar tal garantia, sendo certo que o único requisito que se exige é que o processo de execução fiscal tenha uma garantia idónea associada, tal como previsto nos artigos 195.º a 199.º do CPPT.
Refere que, independentemente de, pela mesma dívida estarem a responder dois sujeitos distintos, é reconhecido que a dívida em apreço é apenas uma, sendo igualmente apenas um o processo de execução fiscal, não tendo sido instaurado um novo processo de execução fiscal na esfera do devedor subsidiário, autónomo e independente.
Assim, se a dívida exequenda se encontra totalmente garantida, independentemente de quem prestou tais garantias, o respetivo processo de execução fiscal terá de considerar-se suspenso nos termos do artigo 169.º do CPPT.
No que concerne especificamente ao n.º 6 do artigo 169.º do CPPT, a disponibilização da informação relativa aos montantes da dívida exequenda e acrescido, bem como da garantia a prestar apenas sucede quando inexiste outra garantia legalmente constituída no âmbito do mesmo processo de execução fiscal, o que não se verifica no caso sub judice.
Considera a Recorrente, que os processos de execução fiscal a que reporta a penhora reclamada se encontram suspensos, em virtude da penhora do imóvel inscrito na matriz sob o n.º 4487, fração I, da freguesia da (...), com um valor patrimonial tributário de €125.406,27, efetuada na esfera da Reclamante, e do penhor de 2.500.000 ações da sociedade M., SA, no valor de €1.904.096,80, efetuada na esfera do responsável subsidiário, que, em conjunto, perfazem €2.029.502,07, sendo manifesto que a dívida se encontra totalmente garantida e que a penhora das rendas, ora promovida, é manifestamente desproporcional.
A sentença recorrida, após análise do quadro legal, entendeu, em síntese, que “(…) Assim sendo e, ainda que exista uma única dívida tributária e uma única manifestação de capacidade contributiva, por concorrer uma responsabilidade subsidiária entre os dois responsáveis, as garantias terão de ter um tratamento distinto, não podendo ser cumuladas, contrariamente ao que sucederia caso o regime da responsabilidade entre os dois responsáveis fosse o da responsabilidade solidária.(…)”
O art.º 169. º do CPPT dispõe que “ 1 - A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem 90/436/CEE, de 23 de julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados-Membros, ou de convenção para evitar a dupla tributação, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que deve ser informado no processo pelo funcionário competente.
2 - A execução fica igualmente suspensa, desde que, após o termo do prazo de pagamento voluntário, seja prestada garantia antes da apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente, acompanhada de requerimento em que conste a natureza da dívida, o período a que respeita e a entidade que praticou o acto, bem como a indicação da intenção de apresentar meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda.
3 - O requerimento a que se refere o número anterior dá início a um procedimento, que é extinto se, no prazo legal, não for apresentado o correspondente meio processual e comunicado esse facto ao órgão competente para a execução.

4 – (…)

5 – (…)
6- Se não houver garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantirem a dívida exequenda e acrescido, é disponibilizado no portal das finanças na Internet, mediante acesso restrito ao executado, ou através do órgão da execução fiscal, a informação relativa aos montantes da dívida exequenda e acrescido, bem como da garantia a prestar, apenas se suspendendo a execução quando da sua efectiva prestação.
7 - Caso no prazo de 15 dias, a contar da apresentação de qualquer dos meios de reacção previstos neste artigo, não tenha sido apresentada garantia idónea ou requerida a sua dispensa, procede-se de imediato à penhora.

8 - Quando a garantia constituída nos termos do artigo 195.º, ou prestada nos termos do artigo 199.º, se tornar insuficiente é ordenada a notificação do executado dessa insuficiência e da obrigação de reforço ou prestação de nova garantia idónea no prazo de 15 dias, sob pena de ser levantada a suspensão da execução. (…)”
Decorre da interpretação do n.º 1, 6 e 7 do art.º 169.º do CPPT a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do art.º 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, porém se a garantia prestada, ou os bens penhorados não garantirem a totalidade da dívida exequenda e o acrescido não se suspende a execução fiscal.
Decorre da matéria de facto provada, e não impugnada nos pontos 1) a 4) que contra a Recorrente foi instaurado no Serviço de Finanças de (...) 2, o Processo de execução fiscal n.º 3182201001109375 e apensos 3182201001109421, 3182201001109561 e 3182201001115871 contra a Recorrente (R., Lda,), para cobrança coerciva de retenções de IRC do ano de 2006, 2007 e 2008 e IMT de 2004 no montante global de € 923.657,30.
Por não ter sido efetuado o pagamento da dívida foi penhorado o imóvel inscrito na matriz sob o n.º 4487, fração I, da freguesia da (...), com um valor patrimonial tributário de €125.406,27.
A Recorrente apresentou Impugnações contra as retenções de IRC do ano de 2006, 2007 e 2008 e IMT de 2004 que correm termos no Tribunal Administrativo e Fiscal sob os números 368/11.3 BEPRT; 452/11.3 BEPRT; 491/11.4 BEPRT e 3555/10.8 BEPRT.
Nesta conformidade, a penhora do imóvel não é suficiente para garantir a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, pelo que a execução fiscal, não se encontra suspensa na esfera da Recorrente, executada originária.
Assim, sendo a Administração Fiscal estava habilitada a prosseguir a execução fiscal, com vista à arrecadação da receita de impostos não entregues ao Estado.
Decorre do processo que a Recorrente, devedora originária, não tinha bens suficientes para solver as dívidas tributária o que habilitou a Administração Fiscal, a recorrer ao mecanismo do art.º 22.º e 23.º do LGT, ou seja, a reverter a dívida da executada originária contra o responsável subsidiário.
O n.º 2 do art.º 23.º da LGT faz depender a reversão da dívida, contra o responsável subsidiário, da fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal, sem prejuízo da excussão prévia.
Face à reversão da dívida pese embora se trate da mesma dívida, existe aqui alteração subjetiva da instância executiva, sendo desta feita contra o responsável subsidiário.
Decorre dos autos que a reversão foi efetuada contra o gerente M., o qual se veio opor à reversão através da oposição n.º 1413/16.1BEPRT e prestou garantia através do penhor de ações.
A responsabilidade da devedora originária é distinta do responsável subsidiário e cada um dos sujeitos passivos responde na medida da sua responsabilidade.
Assim sendo, o responsável subsidiário responde pela dívida através do seu património, e para tal, pode proceder ao pagamento da dívida ou pode discuti-la opondo-se, o que foi o caso.
Tal como na execução fiscal da devedora originária, para que a reversão não prossiga terá de prestar garantia, nos termos dos art.º 52.º da LGT e art.º 195.º do CPPT, caso contrário, a execução pode prosseguir agora sobre os seus bens.
Resulta da matéria assente que foi efetuado o penhor de 2.500.000 ações da sociedade M., SA, no valor de €1.904.096,80, efetuada na esfera do responsável subsidiário e gerente da sociedade M..
Assim sendo, em sede de oposição à execução fiscal, a garantia prestada pelo responsável subsidiário, somente responde pelo montante em dívida da sua responsabilidade, não podendo ser somada à prestada pelo executada originária com vista a suspensão da execução fiscal, pois tem finalidade diferentes.
Destarte, o raciocínio da Recorrente mostra-se viciado, uma vez que o património da Recorrente/Sociedade não se confunde com o património do responsável subsidiário, sendo sujeitos passivos diferentes e autónomos.
Acresce ainda referir que o executado por reversão, para além de não ser parte nos presentes autos da reclamação têm interesse que sejam encontrados ou penhorados bens da sociedade executada/aqui Reclamante, que sejam suficientes para o pagamento da dívida exequenda libertando o seu património dessa responsabilidade.
Nesta conformidade a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento de direito na interpretação dos artigos 18.º, 22.º, 23.º e 52.º da LGT e 169.º do CPPT.

A segunda questão que importa responde é a de saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito na interpretação dos artigos 18.º, n.º 2, e 266.º da CRP, 55.º da LGT e 46.º e 199.º, n.os 10 e 11, do CPPT , no entendimento que o ato de penhora das rendas é manifestamente violador do princípio da proporcionalidade.
A resposta a está questão é negativa e naturalmente dada pela fundamentação supra-referida.
Decorre da matéria de facto do ponto n.º 5) que os processos de execução fiscal contra a devedora originária, aqui Recorrente, não se encontravam suspensos, por que não estavam totalmente garantidos pela penhora do imóvel.
Como se disse não sendo permitido para garantir a dívida da devedora originária, aqui Recorrente, somar a garantia prestada pelo responsável subsidiário, a penhora de bens, e no caso em apreço das rendas, da executada originária era permitida.
Nesta conformidade não se vislumbra a inconstitucionalidade nem mesmo a violação do princípio da proporcionalidade.
Destarte improcede o recurso da Recorrente.

4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões:
I. Decorre da interpretação do n.º 1, 6 e 7 do art.º 169.º do CPPT a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do art.º 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, porém se a garantia prestada, ou os bens penhorados não garantirem a totalidade da dívida exequenda e o acrescido não se suspende a execução fiscal.
II. Em sede de oposição à execução fiscal, a garantia prestada pelo responsável subsidiário, somente responde pelo montante em dívida da sua responsabilidade, não podendo ser somada à prestada pelo executada originária com vista a suspensão da execução fiscal, pois tem finalidade diferentes.

5. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso, e manter a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente, com dispensa do remanescente da taxa devida nos termos do n.º 7 do art.º 6.º do Regulamento de Custas Processuais.

Porto, 10 de setembro de 2020


Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Cláudia Almeida
Paulo Moura