Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00596/09.1BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/12/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Vital Lopes
Descritores:REGIME ESPECIAL DE NEUTRALIDADE APLICÁVEL ÀS FUSÕES
ACTIVOS PROVISIONÁVEIS
CRÉDITO DE IMPOSTO POR DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL
MAJORAÇÃO DE CUSTOS COM DONATIVOS
Sumário:1. A regra de continuidade das provisões, prevista no n.º4 alínea c) do art.º68.º, do CIRC, que contém o regime especial de neutralidade fiscal aplicável às fusões, não vale para as provisões exclusivas, impostas por especiais razões prudenciais das entidades de supervisão a que se refere o n.º1 alínea d) do art.º34.º, do mesmo Código;
2. As despesas com crédito vencido, porque traduzem posições credoras das instituições financeiras resultantes de outras operações de natureza análoga ao crédito, são provisionáveis nos mesmos termos em que o é o crédito vencido a que se referem, ou seja, de acordo com as classes de risco previstas no n.º3 do Aviso3/95 do Banco de Portugal e não a 100%, ao menos não fazendo o impugnante prova de que tais despesas, pela sua própria natureza comportam uma maior intensidade de risco que as torna não provisionáveis nos termos escalonados do crédito vencido a que se referem.
3. Não há lugar à correcção do montante de imposto estrangeiro contabilizado como gasto quando não haja lugar a crédito de imposto por dupla tributação internacional por inexistência ou insuficiência de colecta (artigos 23.º, alínea f), 62.º, n.º1 e 85.º, do CIRC);
4. Só é de aceitar a majoração de custos contabilizados com atribuições pecuniárias feitas ao abrigo da Lei do Mecenato (DL 74/99, de 16 de Março) quando a documentação do custo não levante dúvidas, não esclarecidas pelo impugnante, sobre a natureza de donativos de tais atribuições;
5. Para efeitos do disposto no art.º14.º do DL n.º35/2005, de 17 de Fevereiro, as instituições de crédito que elaborem as suas contas de acordo com as NCA não estão obrigadas a manter contabilidade organizada de acordo com o PCSB.
6. Por conseguinte, não pode a aceitação fiscal das provisões contabilizadas restringir-se unicamente às constituídas de acordo com o PCSB, deixando de fora as constituídas de acordo com o regime provisional das NCA.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Banco... e Fazenda Pública
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Concedido parcial provimento ao recurso do Banco... e negado provimento ao recurso da FP
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO

Da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida pelo Banco ..., S.A., da liquidação de IRC relativa ao exercício de 2005, consubstanciada na Demonstração de Liquidação n.º20088500036787, de 10/10/2008, vêm interpor recurso quer o impugnante, quer a Fazenda Pública.

Ambos os recursos foram admitidos com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo.

No recurso interposto pelo impugnante, este termina as respectivas alegações formulando as seguintes: «Conclusões:
1. O presente recurso é deduzido contra a sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrente contra o ato tributário consubstanciado na liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.º 2008 8500036787, de 08.10.2008, na demonstração de compensação n.º 2008 00007060923, de 28.11.2008 e na nota de cobrança n.º 2008 00001498383, respeitante ao exercício de 2005, determinando a sua anulação no que concerne à correção referente a imparidades em imóveis desafetados (€ 1.885.600,81), e mantendo-o no que respeita às correções referentes a imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda (€ 47.247.512,71), a imparidades em investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos (€ 5.717.966,28), a provisões para crédito vencido (€ 578.596,48), ao crédito de imposto (€ 1.031.723,09) e a majoração de donativos (€ 4.600,00);
2. Ora, salvo o devido respeito, não pode proceder o entendimento proferido pelo Tribunal a quo na sentença recorrida, na parte em que determina a manutenção das correções acima referidas;
3. No que concerne à correção referente às imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda, considerou o Tribunal recorrido que a aludida correção se deveria manter, com fundamento no facto de as imparidades constituídas terem na sua origem lotes de ações provenientes de sociedades não financeirasincorporadas no ora Recorrente através de fusão que beneficiou do regime de neutralidade fiscal previsto nos artigos 68.º e seguintes do Código do IRC (atuais artigos 74.º e seguintes), às quais não era alegadamente aplicável o disposto no artigo 34.º, n.º 1, alínea d) do Código do IRC, pelo que não podem ser fiscalmente aceites como custo, sob pena de violação daquele regime, em particular do disposto no artigo 68.º, n.º 4, alínea c), do Código do IRC, na redação à data aplicável;
4. Adicionalmente, e no que concerne em particular, à imparidade associada à Corticeira ..., refere-se na sentença recorrida que “O justo valor dos activos financeiros disponíveis para venda num mercado de preço cotado (…) corresponde ao valor da cotação do título à data do reconhecimento da imparidade. Ou seja, ao contrário do pugnado pelo Impugnante não releva para efeitos de determinação do montante da imparidade o custo médio dos activos, mas sim o custo (histórico) de aquisição” (cf. página 58 da sentença recorrida), mantendo-se, assim, a correção efetuada com referência à aludida imparidade;
5. Por fim, acrescenta ainda o Tribunal recorrido que “(…) ainda que tenhamos já considerado que as correções às imparidades relativas à I... e à C..., SGPS se devam manter (…) as mesmas sempre subsistiriam porquanto considerando o seu custo de aquisição (€ 2,36 quanto à C... e € 4,325 quanto à I...) e o seu justo valor corrente – o valor da sua cotação (€ 3,02 quanto à C... e € 6,00 quanto à I...) -, é manifesto que não existia qualquer perda por imparidade que importasse reconhecer”, pelo que, e em suma, “(…) são de manter todas as correcções realizadas pela AT relativamente às imparidades em activos financeiros disponíveis para venda” (cf. página 58 da sentença recorrida);
6. Ora, não assiste razão ao Tribunal recorrido quando sustenta a manutenção desta correção, pois, nesta parte, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento;
7. Com efeito e desse logo, importa referir que a questão controvertida nos presentes autos consiste apenas em saber se a reconhecida dedutibilidade fiscal das imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda, regularmente constituídas nos termos dos Avisos n.ºs 3/95, 1/2005 e 3/2005, e na Instrução n.º 7/2005, todos do Banco de Portugal, e em virtude da adopção das NIC e das NCA na elaboração das suas contas individuais, pode ser afastada – como entendeu o Tribunal recorrido - por aquelas imparidades respeitarem a ações transferidas para o Impugnante, ora Recorrente, por via de uma operação de fusão que beneficiou do regime da neutralidade fiscal previsto no artigo 68.º do Código do IRC, na redação à data aplicável;
8. E a resposta só pode ser negativa;
9. Desde logo, a constituição daquelas imparidades foi única e exclusivamente motivada pela adopção das NIC e das NCA na elaboração das contas individuais do ora Recorrente, das quais passou, assim, a constar, para além das provisões, aquela realidade contabilística;
10. Com efeito, apesar de, para efeitos do disposto no Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal, o conceito de provisões abranger o conceito das imparidades, é certa e inequívoca a distinção entre provisões e imparidades, à qual também não é despicienda a circunstância de o legislador ter estabelecido regras específicas para a definição do conceito de imparidade – quais sejam, as que resultam da Instrução n.º 7/2005, do Banco de Portugal –, bem como a circunstância de, como já se adiantou, o n.º 1.º do Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal, englobar as imparidades no conceito de provisões apenas e exclusivamente nos termos e para os efeitos daquele Aviso;
11. Assim, não assiste razão ao Tribunal recorrido quando refere que “(…) as imparidades são «equiparadas» ou englobadas no conceito de provisões (…)” (cf. página 54 da sentença recorrida) e, com base em tal asserção, conclui pelo afastamento da dedutibilidade fiscal das imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda, pois que, insista-se, não só as provisões e as imparidades não se confundem entre si, como a admitir-se alguma equiparação, a mesma só poderia existir nos termos e para os efeitos do Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal;
12. Acresce, ainda, em benefício da distinção entre estas duas realidades, que o valor das provisões repostas e o valor das imparidades constituídas não é o mesmo, o que evidencia, uma vez mais, que não se trata de dar continuidade a provisões já constituídas, mas de, nos termos do referencial contabilístico aplicável, constituir uma nova realidade que obedece a regras próprias;
13. Assim, sendo por demais inequívoca a distinção entre os conceitos de provisão e de imparidade nos termos supra referenciados, bem como que inexiste continuidade entre o conceito de provisão e o conceito de imparidade, só pode concluir-se que não há qualquer violação do regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 68.º do Código do IRC, na redação à data aplicável;
14. Com efeito, sendo evidente que as provisões e as imparidades são realidades distintas, e que a “equiparação” das imparidades às provisões se aplica exclusivamente para efeitos do Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal, então só se pode concluir que as imparidades não se “equiparam”, nem se encontram abrangidas nas provisões a que se refere o artigo 68.º, n.º 4, alínea c), do Código do IRC, na redação à data aplicável;
15. E, se assim é, então é mais que evidente que, uma vez repostas as provisões, como foram, o regime da neutralidade fiscal que lhes estava subjacente cessou, de imediato, sem qualquer “transmissão” às imparidades que o contribuinte tenha, posteriormente, vindo a constituir;
16. Em face do exposto, é manifesto o erro em que incorre o Tribunal recorrido quando afirma, a este respeito, que “Se as provisões continuam a ser provisões, ainda que relativas a imparidades, então as mesmas mantêm, para efeitos fiscais, o regime das provisões da entidade de que os activos provêm (cf. art. 68.º, n.º 4, al. c) do CIRC)” (cf. página 54 da sentença recorrida);
17. Razão pela qual, resultando evidente que a sentença incorreu em erro de julgamento, a mesma deve ser anulada na parte ora em recurso, devendo, por conseguinte, ser julgada procedente a impugnação judicial;
18. Acresce ainda, sem prejuízo do exposto, que sendo a constituição das imparidades legalmente imposta pelo referencial contabilístico supra indicado, e não tendo havido qualquer intenção de manipulação de resultados fiscais, em momento algum se poderá invocar a violação do regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 68.º do Código do IRC, na redação à data aplicável;
19. Efetivamente, e apesar de o artigo 68.º do Código do IRC (atual artigo 74.º) se afigurar uma norma anti-abuso, pois tem como objectivo evitar que os sujeitos passivos recorram a formas jurídicas e reorganizações societárias com o intuito de obter vantagens fiscais que não concretizariam caso não tivessem realizado as respectivas operações de fusão, cisão ou entrada de ativos, não é possível sustentar a violação das suas disposições quando, como no caso sub judice, a alteração do referencial contabilístico e das suas finalidades resulta da iniciativa de entidades públicas com poderes para o efeito;
20. De igual modo, também não pode proceder o argumento invocado pelo Tribunal recorrido de que “É certo que a alteração do normativo contabilístico não resultou de vontade do Impugnante, mas nem por isso lhe podem ser atribuídos benefícios (…)” (cf. página 55 da sentença recorrida);
21. Quer esta afirmação do Tribunal recorrido, quer a que acima se transcreveu na conclusão 16.ª, revelam que, afinal, é inegável que o Recorrente não teve outra hipótese senão a de repor aquelas provisões e constituir imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda e que, com o devido respeito, o desacordo do Tribunal quanto ao entendimento propugnado pelo Recorrente reside antes na circunstância deste, alegadamente, obter “benefícios” por via da reclassificação contabilística efetuada;
22. Não obstante, não se trata de “benefícios”, mas sim da dedutibilidade fiscal de imparidades que não pode ser afastada apenas porque o Tribunal entende que a reclassificação contabilística efetuada - e imposta por lei - concede ao contribuinte um regime mais favorável do que o regime aplicável a provisões que este detinha no seu balanço e que foram, entretanto, repostas;
23. Assim, inexistindo qualquer violação do disposto no artigo 68.º do Código do IRC nos termos acima propugnados, não subsiste motivo para que as imparidades constituídas não sejam fiscalmente dedutíveis nos termos do artigo 34.º, n.º 1, alínea d), do Código do IRC;
24. Razão pela qual, também com este fundamento, resulta evidente o erro de julgamento em que incorreu a sentença recorrida, a qual deve ser anulada, nesta parte, e determinada a procedência da impugnação judicial apresentada;
25. Sem prejuízo do acima exposto, e mesmo que não procedesse o entendimento supra, o que apenas se admite por mero dever de patrocínio, sem conceder, sempre se dirá que, ainda assim, não assiste razão ao Tribunal recorrido quando afirma que “(…) em momento algum o legislador reconheceu que a alteração do referencial contabilístico de entidades como o Impugnante determinasse a cessação das obrigações que lhe eram impostas como requisito para beneficiar do regime da neutralidade fiscal (…)” (cf. página 55 da sentença recorrida);
26. Tal entendimento é manifestamente improcedente, na medida em que, ainda que não haja qualquer previsão expressa sobre a cessação do regime da neutralidade fiscal, é por demais evidente que as operações sub judice já não tinham enquadramento naquele regime, devendo, por conseguinte, aceitar-se a dedutibilidade fiscal das imparidades sub judice;
27. Com efeito, a situação sub judice não consubstancia, em concreto, uma alteração ao regime das provisões que foram transferidas para a sociedade beneficiária, isto é, não se trata de uma situação em que se confere às provisões transferidas um regime contabilístico e fiscal que as mesmas não detinham, mas da realização de duas operações para as quais o artigo 68.º do Código do IRC (atual artigo 74.º) não estabelece qualquer proibição: uma delas, em que se procede à anulação das provisões transferidas e uma outra em que, sem qualquer correspondência de montantes, se procede à constituição de imparidades em ativos financeiros para venda;
28. Efetivamente, muito embora o legislador tenha estabelecido uma obrigação de continuidade contabilística naquela norma, tal não significa que o legislador tenha pretendido que, para todo e qualquer efeito, a continuidade contabilística pós-fusão seja absoluta, permanecendo a sociedade beneficiária vinculada à manutenção no seu balanço das provisões transferidas pela sociedade fundida nos precisos e exatos termos em que tal transferência ocorreu;
29. O objetivo do legislador com a consagração daquela regra foi apenas o de que, no momento da entrada daqueles elementos patrimoniais na esfera da sociedade beneficiária, não se efetuassem alterações de valores ou de regime de provisionamento aplicável que colocassem em causa a neutralidade fiscal da operação, pelo que o intérprete não pode exigir a continuidade contabilística e fiscal para além do que é necessário para cumprir esse objetivo, sob pena de desvirtuar o próprio regime da neutralidade fiscal, tornando uma operação efetuada ao abrigo de tal regime mais onerosa para os sujeitos passivos, bem como de colocar em causa a própria fiabilidade da contabilidade, não permitindo, em nome de uma rigidez absoluta da contabilidade, que os elementos patrimoniais sejam apresentados de acordo com a sua substância e realidade económica;
30. Assim, e em face de todo o exposto, resulta evidente que não houve qualquer violação do regime da neutralidade fiscal;
31. Razão pela qual se deve anular a sentença recorrida, julgando-se procedente a impugnação judicial apresentada, na parte ora em recurso;
32. Sem prejuízo de todo o exposto, mesmo admitindo-se que, por mero dever de patrocínio, e sem conceder, haveria no caso sub judice a violação do regime da neutralidade fiscal, em momento algum a correção a efetuar com referência às imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda poderia ascender a € 47.247.512,71, correspondente ao saldo das imparidades no final do exercício de 2005, mas apenas ao montante correspondente às perdas (menos-valias latentes) transferidas por via da operação de fusão com referência àqueles ativos, qual seja, o valor de € 13.706.859,45, conforme resulta do Anexo 2 do relatório final de inspeção junto como doc. n.º 2 da p.i.;
33. Efetivamente, apenas relativamente a este último valor existirá, no limite, obrigação de continuidade contabilística e fiscal nos termos do regime da neutralidade fiscal previsto no artigo 68.º do Código do IRC, na redação à data aplicável;
34. Pelo que, também com este fundamento se impõe a anulação da sentença recorrida, determinando-se a procedência da impugnação judicial, nos termos acima indicados;
35. Por fim, e no que concerne à imparidade referente à Corticeira ..., em que a administração tributária procedeu a uma correção no valor de € 53.516,01, resultante da relevação, para efeitos de cálculo daquela imparidade, do custo histórico de aquisição do título à data do reconhecimento da imparidade, quando o Impugnante pugnara, ao invés, pela relevação do custo médio dos ativos, também não assiste razão ao Tribunal a quo, quando na sentença recorrida, adere ao entendimento propugnado por aquela;
36. É que, como decorre da legislação aplicável ao Recorrente e aprovada pelo Banco de Portugal, o critério de valorimetria do custo médio é imposto ao Recorrente, sendo, aliás, o critério que tem seguido em exercícios anteriores ao que aqui se controverte, sem qualquer correção por parte da administração tributária, pelo que sustentar a inadmissibilidade deste critério bule com o princípio da consistência que deve nortear o tratamento contabilístico e fiscal subjacente às imparidades sub judice;
37. Trata-se este de entendimento igualmente válido para defender que, no que concerne às imparidades associadas à I... e à C..., SGPS, também não assiste razão ao Tribunal recorrido quando afirmou que “(…) ainda que tenhamos já considerado que as correções às imparidades relativas à I... e à C..., SGPS se devam manter (…) as mesmas sempre subsistiriam porquanto considerando o seu custo de aquisição (€ 2,36 quanto à C... e € 4,325 quanto à I...) e o seu justo valor corrente – o valor da sua cotação (€ 3,02 quanto à C... e € 6,00 quanto à I...) -, é manifesto que não existia qualquer perda por imparidade que importasse reconhecer”, pelo que, e em suma, “(…) são de manter todas as correcções realizadas pela AT relativamente às imparidades em activos financeiros disponíveis para venda” (cf. página 58 da sentença recorrida);
38. Com efeito, também aqui assume relevância as considerações supra tecidas na conclusão 36.ª quanto à aplicação do critério de valorimetria do custo médio, que se dão aqui por reproduzidas, para todos os efeitos legais;
39. Pelo que, e em suma, é por demais evidente que se impõe a anulação da sentença recorrida, determinando-se a procedência da impugnação judicial, nos termos acima indicados;
40. No que se refere à correção relativa às imparidades em investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos, no montante de € 5.717.966,28, referente a uma imparidade associada às participações do Impugnante, ora Recorrente, na D... SGPS, e uma vez que os fundamentos que subjazeram à referida correção são idênticos aos que estão na origem da correção referente às imparidades de ativos financeiros disponíveis para venda, o Tribunal a quo deu por suficientes as considerações já efetuadas quanto a esta última correção;
41. Ora, não pode o Recorrente conformar-se com a decisão sub judice, nesta parte, pois a mesma enferma de erro de julgamento;
42. Também aqui a questão controvertida nos presentes autos consiste em saber, uma vez mais, se a reconhecida dedutibilidade fiscal das imparidades em investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos, regularmente constituídas nos termos dos Avisos n.ºs 3/95, 1/2005 e 3/2005, e na Instrução n.º 7/2005, todos do Banco de Portugal, e em virtude da adopção das NIC e das NCA na elaboração das suas contas individuais, pode ser afastada por aquelas terem na sua origem ações transferidas para o Impugnante, ora Recorrente, por via de uma operação de fusão que beneficiou do regime da neutralidade fiscal previsto no artigo 68.º do Código do IRC, na redação à data aplicável;
43. E a resposta só pode ser negativa;
44. Uma vez que os fundamentos de facto e de direito subjacentes a esta correção são os mesmos que se encontram subjacentes à correção referente às imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda, o Recorrente reproduz, para todos os efeitos legais, o teor das páginas 13 a 23 das presentes alegações de recurso, salvo no que concerne à parte daquelas páginas que, pela sua particularidade e como se depreenderá do seu sentido, é expressa e exclusivamente aplicável às imparidades aí indicadas, assim como o que se encontra reproduzido nas conclusões 3.ª a 34.ª supra (excepto a conclusão 12.ª);
45. Pelo que, também com este fundamento se impõe a anulação da sentença recorrida, determinando-se a procedência da impugnação judicial, nos termos acima indicados;
46. No que concerne à correção referente à provisão para crédito vencido, cuja desconsideração teve na sua origem a circunstância de, alegadamente, as despesas de crédito vencido não se enquadrarem no conceito de crédito para efeitos do n.º 3.º do Aviso 3/95, do Banco de Portugal, e para cuja manutenção invocou o Tribunal a quo que, apesar das mesmas serem aceites nos termos do n.º 6.º do mesmo Aviso, o Recorrente não demonstrou o seu enquadramento nas classes de risco previstas no n.º 3.º do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal, também não pode o Recorrente manifestamente concordar com o entendimento daquele Tribunal;
47. Isto porque, com efeito, recorrendo quer ao n.º 3 do Aviso n.º 3/95, quer ao n.º 6 do mesmo Aviso, conclui-se que as despesas de crédito vencido foram devidamente provisionadas, não subsistindo qualquer motivo para a manutenção da correção em apreço;
48. Não podendo, designadamente, ser invocado pelo Tribunal a quo, como fundamento para a manutenção da correção, a circunstância de o Recorrente não ter demonstrado o seu enquadramento nas classes de risco previstas no n.º 3.º do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal;
49. Com efeito, o conceito de “crédito”, em particular “crédito vencido”, em consonância com as regras prudenciais impostas pelo Banco de Portugal, deve ser entendido em sentido lato, por forma a criar uma base uniforme e segura de enquadramento da atividade das instituições bancárias;
50. Assim, o conceito de “crédito vencido” inclui o capital, os juros e as despesas incorridas com estes;
51. Embora existam Classes de Risco, nem sempre todos os riscos devem ser gradualmente provisionados;
52. Com efeito, o Banco de Portugal obriga os intermediários financeiros a registar certas despesas na conta #1581 pela sua totalidade, a qual não está subdividida em classes de risco, porque o risco de não recebimento destas despesas é mais elevado do que o risco associado ao crédito que as originou;
53. Assim, incorre em erro o Tribunal a quo ao pugnar pela interpretação meramente literal do conceito de “crédito vencido” constante do Aviso n.º 3/95 e da Instrução n.º 6/2005, ambos do Banco de Portugal, porquanto deveria ter considerado o elemento literal e os elementos lógicos, quais sejam, o elemento sistemático, o elemento histórico e o elemento teleológico essenciais à interpretação da lei e não cingir-se apenas ao elemento literal, através dos quais concluiria, inequivocamente, pela inserção das despesas de crédito vencido naquele conceito de crédito vencido previsto no Aviso n.º 3/95;
54. Pelo que, com este fundamento, é evidente que se impõe a anulação da sentença recorrida, na parte respetiva;
55. Sem prejuízo do exposto, sempre se dirá que, se impunha à administração tributária proceder à anulação do proveito respeitante à despesa em causa, porquanto é a solução que melhor se coaduna com os princípios da legalidade, da justiça, da igualdade e da proporcionalidade, previstos no artigo 266.º da CRP e no artigo 55.º da LGT, pelo que, não o tendo entendido, a sentença recorrida incorre, também, em erro de julgamento;
56. Acresce que, ainda que não se considere admissível a anulação do proveito nos termos supra expostos, sempre se impunha, atento o disposto no ponto 6.º do Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal, o registo das despesas naquela conta pelo seu valor integral, não se encontrando os montantes a registar naquela conta sujeitos a qualquer limite mínimo ou máximo, não procedendo assim o entendimento do Tribunal a quo segundo o qual haveria que demonstrar o enquadramento das despesas nas classes de risco previstas no n.º 3.º do Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal;
57. Sem prejuízo do exposto, e para o caso de não proceder o que acima se aduziu, sempre se dirá que, ainda assim, se impõe a anulação da sentença recorrida, na parte em que mantém a correção efetuada com fundamento no facto de o Recorrente não ter demonstrado o enquadramento daquelas despesas nas classes de risco;
58. Isto porque, o seu enquadramento naquelas classes de risco nunca foi controvertido pelos serviços de inspeção tributária;
59. Este enquadramento não era, de facto, controvertido, pois o fundamento para desconsiderar a provisão constituída pelo contribuinte estava, apenas, na circunstância de, alegadamente, as despesas relativas a crédito vencido não se enquadrarem no conceito de crédito para efeitos da constituição da provisão;
60. Deste modo, tendo o Tribunal a quo concluído que, nesta parte, não assistia razão aos serviços da administração tributária, e que as despesas relativas a crédito vencido são consideradas equiparadas a crédito vencido para efeitos da constituição da provisão, impunha-se-lhe que procedesse, de imediato e sem reserva, à anulação da correção efetuada;
61. Não o tendo feito, mas ao invés, tendo sustentado a manutenção da correção sub judice com fundamento na falta de demonstração pelo Recorrente do enquadramento daquelas despesas nas aludidas classes de risco, o Tribunal a quo incorre em excesso de pronúncia, pois que conhece de questão que não devia conhecer, nos termos do disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, pelo que a sentença só pode ser anulada, nesta parte;
62. No que respeita à correção referente a imposto retido no estrangeiro, o Tribunal Recorrido afirmou que a eliminação ou atenuação da dupla tributação internacional não passa pela dedutibilidade como custo fiscal do imposto suportado no país da fonte, só podendo ser eliminada ou atenuada ao nível da colecta, pois se assim não fosse estar-se-ia a admitir a dupla dedução do mesmo valor;
63. A decisão recorrida enferma, também aqui, de erro de julgamento ao considerar que, sendo deduzido da matéria tributável o imposto retido no estrangeiro, o resultado é equivalente ao da dedução à colecta do crédito de imposto quando é certo que a eliminação da dupla tributação internacional não ocorre pela mera circunstância de só o rendimento líquido formar parte da base tributável;
64. A questão controvertida é, outrossim, a de saber se, além da impossibilidade de eliminar a dupla tributação internacional dos rendimentos estrangeiros através da aplicação do método de imputação ordinária, existe alguma norma do Direito interno que imponha expressamente, naquelas situações, a tributação em IRC do próprio imposto estrangeiro;
65. O Tribunal recorrido tentou identificar uma norma de permissão de dedução do imposto no estrangeiro mas o que cumpria verificar era se estavam efetivamente preenchidos os pressupostos para o acionamento da exceção à dedutibilidade do custo;
66. O artigo 62.º do Código do IRC é uma norma interna ao ordenamento jurídico nacional que impõe um procedimento instrumental para aproveitamento do crédito de imposto por dupla tributação internacional e que, dada a sua natureza, não será aplicável quando este não exista;
67. Clarificando-se a natureza da correção extra-contabilística prevista no artigo 62.º do Código do IRC como estritamente instrumental à aplicação do crédito por dupla tributação e esclarecendo-se que a inaplicabilidade da norma não representa uma forma de contornar a impossibilidade de eliminação da dupla tributação internacional por inexistência de colecta, atinge-se a conclusão que o legislador tributário não determinou a sujeição em IRC do imposto estrangeiro;
68. Quando, na determinação da matéria colectável, sejam incluídos rendimentos que deem lugar a crédito de imposto por dupla tributação internacional, torna-se necessário proceder a um acréscimo extra-contabilístico, sob pena de o crédito de imposto estrangeiro concedido, abatido à colecta, se poder revelar superior ao imposto que seria suportado em Portugal pelos mesmos rendimentos;
69. Porém, quando não houver lugar a crédito de imposto por dupla tributação internacional então já nenhuma norma impõe que o imposto pago no estrangeiro forme parte da base tributável, sendo esta a interpretação correta face à epígrafe, à letra e à ratioo artigo 62.º do Código do IRC;
70. Tal interpretação resulta de uma articulação entre norma geral, a alínea f) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, prescrevendo a dedutibilidade dos “Encargos fiscais e parafiscais”, e norma excecional, artigo 62.º do mesmo Código;
71. As exceções à dedutibilidade dos custos constam de forma taxativa do Código do IRC, e, na situação vertente, nem o artigo 42.º do Código do IRC nem nenhuma outra norma determinam que o encargo fiscal no estrangeiro deva ser excluído do cômputo dos custos dedutíveis para efeitos fiscais;
72. Não havendo crédito de imposto a aplicar, não é possível a subsunção no artigo 62.º do Código do IRC nem existem as razões justificativas do desvio ao regime-regra pois não é necessário operacionalizar a aplicação de um crédito de imposto;
73. Da correta articulação entre os preceitos em causa não resulta que o imposto estrangeiro possa ser “abatido duas vezes”, pois tratando-se os artigos 23.º e 62.º do Código do IRC de norma geral e excecional são excludentes uma da outra na sua aplicação;
74. Conclui-se, assim, que o artigo 62.º do Código do IRC deverá ser interpretado no sentido de que só deverão existir correções de imposto quando houver lugar ao crédito de imposto por dupla tributação internacional, como aliás resulta quer do texto do artigo quer da sua própria epígrafe;
75. Se existisse uma norma interna que obrigasse a que o imposto suportado na fonte formasse parte da base tributável do imposto no Estado de residência nas situações de impossibilidade de eliminação da dupla tributação jurídica internacional através do método do crédito de imposto, sempre tal norma seria contrária à Convenção entre a República Portuguesa e a República de Moçambique para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento;
76. O normativo em causa – artigo 62.º do Código do IRC –, na acepção segundo a qual o imposto estrangeiro deve formar parte da base tributável do IRC ainda que não exista qualquer crédito de imposto por dupla tributação internacional, infringe igualmente o disposto no artigo 104.º, n.º 2, do Código do IRC, uma vez que as restrições ao princípio da tributação do rendimento real só se admitem quando em presença de razão justificativa;
77. Em suma, deve concluir-se pela ilegalidade da correção efectuada pela administração tributária, impondo-se a revogação da sentença recorrida também nesta parte;
78. No que concerne à correção referente a Benefícios fiscais – Majoração de Donativos também não pode o Recorrente manifestamente concordar com o entendimento do Tribunal a quo, porquanto a atribuição pelo Recorrente ao Club ... - Instituição de Utilidade Pública, do valor de € 23.000,00, configura um verdadeiro donativo, para efeitos do disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea d) e n.º 3 do Estatuto do Mecenato, e artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março, que aprovou o Estatuto do Mecenato;
79. Com efeito, considera-se donativo, para efeitos ficais, a quantia atribuída, em dinheiro ou em espécie, sem que daquela atribuição advenha qualquer contraprestação ou contrapartida;
80. Por sua vez, e conforme supra explicitado, considera-se patrocínio a quantia atribuída tendo em vista a obtenção de um benefício económico;
81. Efetivamente, inexistiu para o ora Recorrente qualquer contraprestação ou contrapartida decorrente da atribuição daquele montante ao Club ... - Instituição de Utilidade Pública, pelo que se está perante um verdadeiro donativo;
82. Em face do lapso de denominação empregue pelo ora Recorrente em documento interno, qual seja a referência a “patrocínio” ao invés de “donativo”, impunha-se que a administração tributária, atentas as prerrogativas de inspeção previstas no artigo 63.º da LGT e no artigo 29.º do RCPIT, bem como em cumprimento do princípio do inquisitório previsto no artigo 58.º da LGT, promovesse todas as diligências necessárias à verdadeira qualificação daquele montante, o que não sucedeu, razão pela qual, deve o ato tributário sub judice ser anulado, nesta parte, e por conseguinte a sentença recorrida;
83. Sem prejuízo do exposto, sempre se dirá que, o documento externo do Club ... - Instituição de Utilidade Pública, o qual contém a inscrição “donativo”, deverá prevalecer sobre o documento interno da ora Recorrente, porquanto beneficia de presunção de autenticidade;
84. Ainda que assim não se entenda, deverá neste âmbito prevalecer o critério económico e financeiro sobre o critério formal, uma vez que, o que se exige é que a quantia tenha sido de facto entregue ao donatário e que o sujeito passivo não tenha tido qualquer contrapartida, o que sucedeu no caso vertente, pelo que, atento o princípio da prevalência da substância sobre a forma, não poderá deixar de ser anulada a correção sub judice, e nessa medida a sentença recorrida.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida, na parte ora contestada, e, nessa medida, a liquidação adicional em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA».

Não foram apresentadas contra-alegações quanto a este recurso.


Por sua vez, no recurso interposto pela Fazenda Pública, esta conclui as suas alegações formulando as seguintes «Conclusões:

A. O presente recurso tem por objecto a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo, que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício económico de 2005, no montante de € 1.885.600,81, por haver concluído que o Impugnante constituiu as imparidades relativas a activos correntes não detidos para venda, em conformidade com o que lhe impôs a sua entidade de supervisão e, consequentemente, aceitar a sua dedutibilidade fiscal.
Ora,
B. Para sustentar a sua posição, o Tribunal a quo, na análise ao ponto a) Imparidades em activos financeiros disponíveis para venda (de referir que estas conclusões foram transpostas para a análise ao ponto c) objecto do presente recurso), refere que “as NCA vêm regular matérias, designadamente o regime de constituição de provisões – incluindo imparidades -, das instituições financeiras sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, relativamente às quais esta entidade prescreveu, expressamente o número 3.º, n.º 5 do Aviso 1/2005, não serem aplicáveis as NIC.
Assim,
C. O Impugnante, no exercício de 2005, tinha que elaborar as suas contas em base individual de acordo com as NIC (n.º 2 e 4.º, n.º 1, al. a) do Aviso 1/2005) pois que relativamente a elas, o BdP consagrou normas contabilísticas específicas a que designou NCA’s.
D. Deste modo, “Considerando que o Bdp regulou, especificamente, as matérias constantes do n.º 2 do n.º 3 do Aviso 1/2005, e porque a obrigatoriedade a que se refere o art.º 14.º do DL 35/2005 não pode prejudicar a competência do BdP, temos que considerar que os assuntos especificamente abordados pelo BdP (as NCA) estão excluídos do âmbito do art.º 14.º do DL 35/2005”.
E. “Assim, pelo menos no que se reporta às matérias regidas pelas NCA, e que inclui o regime de provisões e imparidades, não se impunha a obrigação, prevista no art.º 14.º do DL 35/2005 de o Impugnante, para efeitos fiscais, manter a contabilidade organizada de acordo com o PCSB”
F. Estas conclusões conduziram à decisão de se considerar que (…) as imparidades, porque englobadas no conceito de provisões, conforme número 1.º, n.º1, al. b) do Aviso 3/95 (na redacção do Aviso 3/2005), são fiscalmente dedutíveis nos termos do art.º 34.º, n.º 1, al. d) do CIRC.
Contudo,
G. Com o devido respeito que nos merece, que é muito, não pode a Fazenda Pública, conformar-se, com o doutamente decidido.
H. De facto, o DL n.º 35/2005, de 17 de Fevereiro, veio adequar, através do seu art.º 11.º, a legislação interna ao disposto no art.º 4.º do Regulamento (CE) n.º 1606/2002.

I. Por sua vez, o art.º 13.º veio ressalvar, expressamente, as competências do Banco de Portugal, do Instituto de Seguros de Portugal e da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários em matéria de regulação contabilística e de supervisão.
J. No preâmbulo do mesmo diploma, é referido que “tendo em vista a necessidade de acautelar os eventuais impactes em termos de receita fiscal decorrentes das NIC”, o legislador previu, no art.º 14.º, que “para efeitos fiscais, nomeadamente de apuramento do lucro tributável, as entidades que, nos termos do presente diploma, elaborem as contas individuais em conformidade com as NIC são obrigadas a manter a contabilidade organizada de acordo com a normalização contabilística nacional e demais disposições legais em vigor para o respectivo sector”.
K. Relativamente às entidades supervisionadas pelo BdP, foi emitido o Aviso n.º 1/2005 que visou, de facto e no essencial, permitir a aplicação das NIC na elaboração das contas individuais, com a introdução dos ajustamentos previstos no n.º 2.º.
L. Os números 2.º e 3.º do aviso supra referido, estabelecem um conjunto de normas específicas que, no número 2), alínea b) do n.º 5.º se designam como normas de contabilidade ajustadas (NCA).
M. Nos números 5.º e 6.º é feita uma clara distinção entre, por um lado, as NIC ou NCA e, por outro, as normas constantes da Instrução n.º 4/96 que adopta o Plano de Contas do Sector Bancário (PCSB).
N. Deste modo, e talqualmente consta da mencionada Informação 10/2006, julga-se que as contas individuais elaboradas de acordo com as NCA devem ser consideradas para efeitos da aplicação do disposto no art.º 14.º com “ contas individuais em conformidade com as Normas Internacionais de Contabilidade” e como tal, não satisfazem a ratio dessa norma através da qual o legislador pretendeu que, no que respeita às empresas submetidas à supervisão do Banco de Portugal, o lucro tributável continuasse a ser determinado com base nas demonstrações financeiras elaboradas em conformidade com o estabelecido pelo PCSB.
O. Mais acrescenta a citada informação que, embora as NCA não correspondam integralmente às NIC e, portanto, numa acepção purista e demasiado literal, pudesse considerar-se que as contas individuais elaboradas em conformidade com o Aviso n.º 1/2005 não se incluiriam no conceito de «contas elaboradas em conformidade com as NIC», na ausência das necessárias adaptações da lei fiscal, tal interpretação seria susceptível de gerar situações de desigualdade não apenas porque, contrariamente ao que se verifica para a generalidade das empresas, se aceitaria para efeitos fiscais as contas elaboradas pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal em conformidade com as NIC, ainda que numa versão ajustada, mas também porque, como se viu, não se verifica uma aplicação universal das NCA entre as próprias entidades sujeitas a essa supervisão”,
P. Concluindo que (…) as entidades que aplicam as NCA nas suas contas individuais deverão elaborar as suas demonstrações financeiras de acordo com o Plano de Contas do Sector Bancário para efeitos fiscais, nomeadamente de apuramento do lucro tributável.
Q. Em face da interpretação veiculada pelo CEF, a qual aderimos, nada há a apontar às correcções efectuadas pela AT, ou seja, a dedução ao lucro tributável efectuada pelo Impugnante do montante de € 1.885.600,81, a título de Imparidades em imóveis desafectados é indevida na medida em que, as contas individuais elaboradas de acordo com as NCA são, para efeitos do art.º 14.º do DL 35/2005, de 17.02, contas individuais elaboradas conforme as NIC,
R. então as entidades que apliquem as NCA nas suas contas individuais, para efeitos fiscais e de apuramento do lucro tributável devem elaborar as suas contas de acordo com o PCSB.
S. Consequentemente, as imparidades só serão fiscalmente aceites na medida em que o seriam as provisões no âmbito da al. d) do n.º 1 do art.º 34.º do CIRC, conjugado com o Aviso 3/95, do BdP, no âmbito do PCSB.
T. Não tendo o Impugnante efectuado qualquer provisão para imóveis desafectados, o montante deduzido no campo das variações patrimoniais negativas é indevido, tudo nos termos dos normativos referidos no ponto anterior.
U. Nesta medida, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento, pelo que deve ser revogada, considerando-se a impugnação totalmente improcedente.


Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências».

Contra-alegando, com pedido subsidiário de ampliação do recurso nos termos do art.º684.-A do CPC, o Recorrido apresentou as seguintes «Conclusões:

1. O presente recurso é deduzido pela Ilustre Representante da Fazenda contra a sentença que julgou parcialmente improcedente a impugnação judicial deduzida pelo ora Recorrido contra o ato tributário consubstanciado na liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º 2008 8500036787, de 08.10.2008, na demonstração de compensação n.º 2008 00007060923, de 28.11.2008 e na nota de cobrança n.º 2008 00001498383, respeitante ao exercício de 2005, determinando a sua anulação no que concerne à correção referente a imparidades em imóveis desafetados (€ 1.885.600,81), e mantendo-o no que respeita às correções referentes a imparidades em ativos financeiros disponíveis para venda (€ 47.247.512,71), a imparidades em investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos (€ 5.717.966,28), a provisões para crédito vencido (€ 578.596,48), ao crédito de imposto (€ 1.031.723,09) e a majoração de donativos (€ 4.600,00);
2. Considerou o Tribunal recorrido, no que concerne à correção referente a imóveis desafetados, que as contas individuais elaboradas de acordo com as Normas de Contabilidade Ajustadas (NCA) não devem ser consideradas, para efeitos do disposto no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 35/2005, contas elaboradas de acordo com as Normas Internacionais de Contabilidade (NIC), pelo que inexiste qualquer obrigação de adopção do Plano de Contas para o Sector Bancário (PCSB) e, sendo evidente que o conceito de imparidades se inclui no conceito de provisão para efeitos do Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal, as imparidades constituídas pelo Impugnante, ora Recorrido, são fiscalmente dedutíveis nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC, na redação à data aplicável;
3. Invoca a Ilustre Representante da Fazenda Pública nas suas alegações de recurso que a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento, na parte ora recorrida, uma vez que, de acordo com a Informação n.º 10/2006, do Centro de Estudos Fiscais (CEF), embora seja evidente que “(…) as NCA não correspondem integralmente às NIC (…)” (cf. artigo 26.º das alegações de recurso), a ausência dessa equiparação pode “(…) gerar situações de desigualdade (…)” (cf. artigo 26.º das alegações de recurso), motivo pelo qual se impõe, no entendimento da administração tributária, que “(…) as entidades que aplicam as NCA nas suas contas individuais deverão elaborar as suas demonstrações financeiras de acordo com o Plano de Contas do Sector Bancário para efeitos fiscais, nomeadamente de apuramento do lucro tributável”(cf. artigo 27.º das alegações de recurso);
4. Sucede que não assiste razão à Ilustre Representante da Fazenda Pública, devendo manter-se a douta sentença recorrida na parte sub judice;
5. Com efeito e desde logo, porquanto, como se depreende das alegações de recurso, a Ilustre Representante da Fazenda Pública não controverte as conclusões a que o Tribunal a quo logrou chegar, com base no regime legal aplicável, limitando-se a citar passagens da Informação n.º 10/2006, sem sustentar, como se lhe impunha, em que termos o Tribunal recorrido incorrera em erro ao afastar aquela Informação;
6. Não o tendo feito, é por demais evidente que o presente recurso só pode ser julgado improcedente, devendo manter-se, nesta parte, a sentença recorrida;
7. Admitindo-se, por mero dever de patrocínio, sem conceder, que a singela invocação da Informação n.º 10/2006 nos termos supra expostos seria susceptível de, em abstrato, colocar em causa a sentença recorrida, na parte sub judice, sempre se dirá que, ainda assim, o disposto na aludida Informação, porque desprovido de índole normativa, não conduz ao afastamento do disposto, a este respeito, na sentença recorrida, já que o Tribunal não está vinculado àquela Informação e a mesma não pode derrogar o regime contabilístico e fiscal legalmente estabelecido, como, aliás, tem vindo a ser defendido pela jurisprudência dos tribunais administrativos e fiscais de que são exemploos acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte e do Tribunal Central Administrativo Sul, datados de 11.10.2007 e de 23.04.2008, proferidos no âmbito dos processos n.ºs 796/05.3BEVIS e 2312/08, respetivamente;
8. Deste modo, bem andou o Tribunal recorrido quando reputou o entendimento da Informação n.º 10/2006 como ilegal e determinou a anulação da correção sub judice, pelo que, em face do exposto, resulta também evidente que o presente recurso deve ser julgado improcedente;
9. Ainda assim, e por mero dever de patrocínio, sem conceder, mesmo admitindo que não procede o acima exposto, sempre se conclui que o disposto na Informação n.º 10/2006 é insusceptível de pôr em causa o juízo que, nesta parte, subjaz à douta sentença recorrida, na medida em que o entendimento que decorre daquela Informação visa a prevenção de situações de pretensa desigualdade – as quais não surgem invocadas nem demonstradas no caso sub judice – que, a existirem, nunca poderiam conduzir a uma equiparação entre NIC e NCA que o legislador não estabeleceu, nem pretendeu;
10. Pelo que, também com este fundamento, se impõe que o presente recurso seja julgado improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida na parte ora em recurso;
11. Sem prejuízo do acima exposto, e não procedendo o entendimento supra aduzido, o que apenas por dever de patrocínio se admite, sem conceder, sempre se dirá que não assiste razão à Ilustre Representante da Fazenda Pública e que a sentença recorrida não padece de erro de julgamento, já que é por demais evidente que as NIC e as NCA são manifestamente distintas entre si, não podendo ser equiparadas;
12. Efetivamente, quer no que diz respeito ao objecto da sua aplicação, quer quanto aos destinatários, quer mesmo quanto às entidades que, legalmente, emitiram as respetivas normas, as NIC e NCA correspondem a referenciais contabilísticos distintos e autónomos;
13. Com efeito, tendo o Banco de Portugal, no âmbito das suas competências, procedido à criação de um sistema contabilístico autónomo destinado às contas individuais – as NCA-, e seguindo esse sistema contabilístico uma tramitação específica - ao nível do Banco de Portugal - totalmente distinta da tramitação que tornou as NIC obrigatórias - ao nível das instituições comunitárias -, é inaceitável a posição de que ambos os sistemas contabilísticos sejam equiparados entre si, como erradamente se sustenta na Informação n.º 10/2006;
14. Acresce que não só é inaceitável esta equiparação como, estando evidenciado que as instituições financeiras sob a égide do Banco de Portugal se encontram, nos termos do Aviso n.º 1/2005, obrigadas a elaborar as suas contas individuais de acordo com as NIC, mantendo-se, todavia, quanto às matérias especificamente reguladas no ponto 3.º do Aviso 1/2005 – nas quais se inclui o regime das provisões e das imparidades -, a aplicabilidade das NCA, sempre resulta evidente que as instituições financeiras não estão obrigadas a elaborar as contas individuais de acordo com as NIC para efeitos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 35/2005, mas para efeitos do Aviso n.º 1/2005, o que permite concluir, desde logo, que não é possível fazer a equiparação entre NIC e NCA pretendida pela Ilustre Representante da Fazenda Pública, como, aliás, bem determinou a sentença recorrida;
15. Assim, e em face de todo o exposto, é por demais evidente a ilegalidade do entendimento de que as contas individuais elaboradas de acordo com as NCA se devem considerar, para efeitos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 35/2005, contas elaboradas de acordo com as NIC, pelo que a sentença recorrida não padece de qualquer erro de julgamento, nesta parte, devendo manter-se e ser julgado improcedente o recurso deduzido pela Ilustre Representante da Fazenda Pública;
16. E nem sequer se invoque que a circunstância de o legislador ter estabelecido no n.º 2 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 35/2005, através da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que “(…) Ficam dispensadas da obrigação prevista no número anterior as entidades, sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, que estejam obrigadas a elaborar as suas contas individuais em conformidade com as normas de contabilidade ajustadas (NCA) (…) ”, permitiria concluir que, antes da introdução desta norma, as contas individuais elaboradas de acordo com as NCA deviam ser consideradas contas individuais elaboradas de acordo com as NIC, já que, por força do princípio da proibição de retroatividade das leis fiscais previsto no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), não é admissível imputar a tal alteração legislativa o sentido que acima se descreveu;
17. Motivo pelo qual, sempre se impõe a manutenção da sentença recorrida, na parte que ora releva, e a improcedência do recurso apresentado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública;
18. Isto sem prejuízo de as NCA, enquanto normas de contabilidade, terem por base, indiretamente, as próprias NIC, já que tal circunstância não inviabiliza a conclusão de que umas e outras sejam distintas;
19. Efetivamente, as NCA são “ajustadas” precisamente porque o Banco de Portugal entendeu que, em alguns aspectos específicos, as regras vigentes em Portugal deveriam possuir um diferente regime contabilístico, nalguns casos introduzindo um maior grau de objectividade, noutros regulando expressamente em sentido contrário às NIC, sendo que, de facto, um dos “aspectos específicos” em que em que as NCA divergem das NIC, é com referência às imparidades;
20. Em face do exposto, sempre fica amplamente demonstrado, uma vez mais, a improcedência do recurso apresentado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública;
21. Acresce que o entendimento da Ilustre Representante da Fazenda Pública incorre, ainda, em violação do disposto no artigo 17.º do Código do IRC, já que o apuramento do lucro tributável e organização contabilística de cada sujeito passivo, deverá, em primeira linha, obedecer às “(…) disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade (…)”, pelo que, desse modo, o Recorrido não poderia deixar de organizar a sua contabilidade atendendo às regras fixadas pelo seu órgão de supervisão, o Banco de Portugal, que define a normalização contabilística que deverá ser tomada em linha de conta pelas instituições bancárias sujeitas à sua supervisão;
22. Pelo que, em face do exposto, sempre resulta evidente que bem andou a sentença recorrida, devendo julgar-se improcedente o recurso apresentado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública;
23. Acresce, ainda, que, ao desconsiderar que a Informação n.º 10/2006 não é o único documento emitido a propósito desta temática, o recurso da Ilustre Representante da Fazenda Pública peca por omissão, já que aquela Informação, tratando-se de uma interpretação do CEF emitida num contexto entretanto ultrapassado, deve ser interpretada à luz de um conjunto significativo de outros dados relevantes posteriores à sua emissão;
24. Com efeito, tendo tomado conhecimento do conteúdo da posição da administração tributária constante da Informação n.º 10/2006, algumas Instituições Bancárias contactaram, em 16.01.2006, através da Associação Portuguesa de Bancos (APB), a administração tributária, para esclarecer se, de facto, era mesmo intenção desta obrigar a que, para efeitos fiscais, se aplicasse o PCSB;
25. Nesse âmbito, em 20.01.2006, e a requerimento do Exmo. Senhor Ministro das Finanças, realizou-se, nas instalações da administração tributária, uma reunião técnica, na qual estiveram presentes representantes do CEF, da administração tributária, do Banco de Portugal, entre outras, na qual as instituições financeiras presentes manifestaram a sua disponibilidade para ajustar, para efeitos fiscais, um conjunto significativo de matérias, seguindo critérios de “(…) materialidade, relevância, exequibilidade e legalidade (…)”,[na “(…) identificação das matérias/áreas em que fosse possível e razoável ajustar (…)” as NCA seguindo as regras do PCSB];
26. Tendo sido identificadas áreas relativamente às quais, com efeito, tal ajustamento não se afigurava possível, como, aliás, mereceu a concordância da administração tributária;
27. Em suma, tendo presente todo o acima exposto, é por demais evidente que continuar a sustentar o entendimento propugnado na Informação n.º 10/2006, ignorando todo os factos que sucederam em momento posterior à sua emissão, é manifestamente ilegal, razão pela qual, em face de todo o exposto, o recurso deve ser julgado improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida, na parte ora em recurso;
28. Por fim, e apenas por mero dever de patrocínio, para o caso de se conferir provimento ao recurso interposto pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública, sem conceder, sempre se impõe, nos termos supra expostos, a aceitação como custo fiscal das provisões para menos-valias latentes que seriam constituídas pelo Impugnante, ora Recorrido, caso as NCA não tivessem sido impostas pelo Banco de Portugal, já que, mesmo sendo adoptado o PCSB, como pretende a Ilustre Representante da Fazenda Pública, aquelas deveriam ser aceites;
29. Não procedendo este entendimento, o que apenas por dever de patrocínio se admite, sem conceder, impõe-se a aceitação como custo fiscal das restantes reintegrações que seriam registadas nos termos do Decreto-Regulamentar n.º 2/90 relativamente aos referidos imóveis e que não foram contempladas aquando do exercício do direito de audição, no valor de € 119.724,21;
30. Por último, tendo o Recorrido decaído no vício da falta de fundamentação invocado com referência à correção sub judice, requer-se, nos termos do n.º 1 do artigo 684.º-A do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, a título subsidiário e para o caso desse Ilustre Tribunal determinar a revogação da sentença recorrida nos termos propugnados pela Ilustre Representante da Fazenda Pública, que se conheça do vício da falta de fundamentação da correção sub judice;
31. Com efeito, atento o dever geral de fundamentação expressamente consignado no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, no artigo 77.º, n.º 2, da LGT, no artigo 62.º do RCPIT e nos artigos 124.º e 125.º do CPA, bem como a doutrina e jurisprudência dos tribunaia administrativos e fiscais uniformemente estabelecida a este respeito, não pode deixar de concluir-se que a correção sub judice não se encontra devidamente fundamentada, porquanto se baseia em informações e interpretações internas do CEF de normativos legais;
32. Efetivamente, se a administração tributária pretendia, sem mais, renunciar à aplicação, para efeitos fiscais, das instruções legais do Banco de Portugal (órgão de supervisão do ora Recorrido), instruções estas que são publicadas em Diário da República, ao abrigo de competências legais que lhe são atribuídas, quer pelo RGICSF, quer pelo Decreto-Lei n.º 35/2005, deveria tê-lo fundamentado, atendendo aos deveres supra expostos, dando assim ao Recorrido possibilidade de se defender conveniente;
33. Contudo, e como ficou amplamente demonstrado, os serviços de inspeção tributária limitaram-se a excluir a dedutibilidade das imparidades, sem terem sustentado, como se lhes impunha, em que medida se apoiava o afastamento daqueles diplomas legais;
34. Pelo que, em face de todo o exposto, resulta demonstrado a falta de fundamentação da correção sub judice, a qual deve, por esse motivo, ser anulada.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Venerando Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida, na parte ora em recurso, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA».
O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal exarou douto parecer final a fls.577 subscrevendo a posição do Ministério Público assumida na 1ª instância, na qual se concluíra pela improcedência da impugnação.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pelos Recorrentes (cf. artigos 684.º, n.º3 e 685.º-A, n.º1, do CPC), o objecto do recurso do impugnante consiste em indagar: (i) se a sentença recorrida enferma de nulidade por excesso de pronúncia na parte em que manteve a correcção referente à “provisão para crédito vencido” com fundamento no facto, nunca antes controvertido pela Administração tributária, de o impugnante/Recorrente, não ter demonstrado o enquadramento daquelas despesas com crédito vencido nas classes de risco previstas no n.º3 do Aviso n.º3/95, do Banco de Portugal; (ii) se a sentença incorreu em erro de julgamento na apreciação que fez da legalidade das correcções referentes a imparidades em activos financeiros disponíveis para venda (47.247.512,71€), a imparidades em investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos (5.717.966,28€), a provisões para crédito vencido (578.596,48€), ao crédito de imposto (1.031.723,09€) e a majoração de donativos (4.600,00€).

O objecto do recurso da Fazenda Pública reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento na apreciação que fez da legalidade das correcções referentes a “imparidades em imóveis desafectados” (1.885.600,81€), determinando a anulação da liquidação nessa parte.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:

«1. Em 30.5.2008 o Banco ... apresentou Declaração de Substituição Modelo 22 relativa ao exercício de 2005, cujo teor aqui se dá por reproduzido. – cfr. doc. de fls. 63 e ss. dos autos.
2. Entre 2007 e 2008, em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200700318, o Banco ..., S.A. foi objecto de acção inspectiva, ao exercício de 2005, pela Direcção de Serviços de Inspecção Tributária. – cfr. doc. de fls. s/n do p.a. apenso aos autos.
3. Por ofício remetido em 13.8.2008, o Banco ..., S.A. foi notificado para exercer o direito de audição ao Projecto relatório de inspecção elaborado no âmbito da acção inspectiva referida no ponto anterior e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. docs. de fls. s/n do p.a. apenso aos autos.
4. O Banco ..., S.A. exerceu o direito de audição ao Projecto relatório de inspecção elaborado no âmbito da acção inspectiva referida em 2. supra. – cfr. doc. de fls. 304 e ss. dos autos.
5. Em 5.9.2008 foi elaborado o Relatório de Inspecção Tributária do qual consta, entre o mais, o seguinte:
“[...]
Imagens omissas.

[...]
- cfr. doc. de fls. s/n do p.a. apenso aos autos.
6. Entre o mais constam dos Anexos ao Relatório de Inspecção Tributária referido no ponto anterior:
o Documento do Banco ... com a referencia 00507932, do qual consta “Creditar 23.000,000” e “Pagamento ao Club… referente ao Troféus e Patrocínio ... ao evento Rali… 2005”;
o Recibo n.º 0214, emitido pelo Club… em 26.7.2005 do qual consta que “recebemos do [...] Banco..., S.A. [...] a importância de vinte e três mil euros” correspondente a Donativo Rali… 2005”. – cfr. doc. de fls. 108 dos autos;
o Conteúdo da página de internet do “V International…– Madeira November 2002”, da qual consta “A magia do Bridge de alta competição, pela mão do Club… e com os patrocínios sempre essenciais do [...] Banco... [...]”;
o Conteúdo da página de internet da “L….com”, colocado em 20.6.2006, do qual consta, entre o mais, “A 47.º edição do Rali… [...] Patrocinadores satisfeitos [...] ...”;
o Conteúdo da página de internet da “ralismadeira.com”, colocado em 29.7.2008, do qual consta, entre o mais, “A Comissão Organizadora do Rali… assina amanha pelas 11 horas, com o banco ... o contrato de patrocínio relativo à edição número 49 da prova. Patrocinador do Vinho da Madeira, há vários anos [...]”.
- cfr. docs. de fls. s/n do p.a. apenso aos autos.
7. O Banco ... foi notificado do relatório referido no ponto anterior em 15.9.2008. - cfr. doc. de fls. s/n do p.a. apenso aos autos.
8. Na sequência do procedimento de inspecção referido nos pontos anteriores foram emitidas a Demonstração de Liquidação de IRC referente à Liquidação n.º 2008 8500036787 de 8.10.2008, na qual se apurou um valor a reembolsar de € 10.234.694,99, a Demonstração de Compensação n.º 2008 00007060923, de 28.11.2008 e Nota de Cobrança n.º 2008 00001498383 com o valor de € 14.095,74. – cfr. docs. de fls. 69 e ss. dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

Mais se provou que,
9. Em 26.7.2005 o Club… emitiu o recibo n.º 0214 do qual consta que “recebemos do [...] Banco..., S.A. [...] a importância de vinte e três mil euros” correspondente a Donativo Rali… 2005”. – cfr. doc. de fls. 108 dos autos.
10. Em Janeiro de 2006 o Centro de Estudos Fiscais (CEF) da Direcção Geral dos Impostos emitiu a Informação n.º 10/2006, da qual consta:
(imagens omissas)

- cfr. doc. de fls. 72 e ss. dos autos.
11. Na sequência de reunião realizada em 20.1.2006, sob o assunto “Normas de Contabilidade Ajustadas (NCA): Impacto para efeitos de tributação em IRC”, entre o Ministro das Finanças, representantes do Centro de Estudos Fiscais (CEF), da Direcção de Serviços de Inspecção Tributária, do Banco de Portugal, do Millennium BCP, do Banco Espírito Santo, do Banco BPI, da KPMG e Deloitte, foi elaborado o “Resumo da Reunião Técnica realizada em 20 de Janeiro de 2006”, com o seguinte teor:

(imagens omissas)
[...]
- cfr. doc. de fls. 82 e ss. dos autos.
12. Na sequência da reunião referida no ponto anterior o CEF elaborou Informação da qual consta, entre o mais:
(imagens omissas)
- cfr. doc. de fls. 96 e ss.

13. No âmbito do Plano de Contas do Sector Bancário os imóveis abrangidos pelo ponto III-1.1.1.5 do Relatório a que se refere o número 5 supra seriam objecto de reintegrações em conformidade com os documentos de fls. 99 a 106 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido».
E mais se deixou consignado na sentença:

«A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos e do p.a. apenso constam, tudo conforme referido a propósito de cada um dos pontos do probatório».


4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

Começando pela apreciação do recurso interposto pelo impugnante Banco, vejamos.

Ø Correcção de custos contabilizados com imparidades em activos financeiros disponíveis para venda

Na sentença recorrida concluiu-se pela manutenção desta correcção com fundamento no facto de as imparidades constituídas terem na sua origem lotes de acções provenientes de sociedades não financeiras [“Banco... SGPS, S.A.”, “D… – Investimentos Estratégicos, SGPS, S.A.” e ... V…, SGPS, S.A.”] incorporadas no Recorrente através de fusão que beneficiou do regime de neutralidade fiscal previsto no (então) art.º68.º do Código do IRC, às quais não era aplicável o disposto no art.º34.º, n.º1 alínea d), do mesmo Código, pelo que não podem ser fiscalmente aceites como custo, sob pena de violação do regime de neutralidade e, em particular, do disposto no art.º68.º, n.º4 alínea c), do Código do IRC.

No que em particular respeita à imparidade associada à Corticeira ..., a sentença manteve a correcção do custo no entendimento de que “O justo valor dos activos financeiros disponíveis para venda num mercado cotado (…) corresponde ao valor da cotação do título à data do reconhecimento da imparidade. Ou seja, ao contrário do pugnado pelo Impugnante não releva para efeitos de determinação do montante da imparidade o custo médio dos activos, mas sim o custo (histórico) de aquisição”.

Por fim e na linha do relatado em sede inspectiva, refere a sentença recorrida que “(…) ainda que tenhamos já considerado que as correcções às imparidades relativas à I… e à C… se devam manter (…) as mesmas sempre subsistiriam porquanto considerando o seu custo de aquisição (€2,36 quanto à C… e €4,325 quanto à I...) e o seu justo valor corrente – o valor da sua cotação (€3,02 quanto à C... e €6,00 quanto à I...) -, é manifesto que não existia qualquer perda por imparidade que importasse reconhecer”, concluindo ser de manter a correcção também por este acrescido fundamento.

É contra este modo de ver que o Recorrente se insurge sustentando, por um lado, que a dedutibilidade fiscal das imparidades em activos financeiros disponíveis para venda relativos a carteiras de acções oriundas de sociedades não financeiras, que foram transferidas para o seu património aquando da operação de fusão, não pode ser afastada pelo facto de ter beneficiado do regime de neutralidade fiscal previsto no art.º68.º, do Código do IRC; por outro, e no que em particular concerne aos títulos da Corticeira ..., I... e C..., SGPS, no cálculo do montante da imparidade deverá relevar o critério de valorimetria do custo médio dos activos e não o do custo histórico de aquisição dos títulos à data do reconhecimento da imparidade, como entendeu a Administração tributária e a sentença sufragou. Vejamos.

As operações de fusão podem seguir o regime geral das fusões ou beneficiar do regime especial de neutralidade fiscal aplicável às fusões, previsto no art.º68.º do Código do IRC.

O regime de neutralidade fiscal, permite que, na determinação dos lucros das sociedades fundidas, no caso da entrada de activos, não seja considerado qualquer resultado derivado da transferência dos elementos patrimoniais em consequência da fusão, nem sejam consideradas como proveitos ou ganhos, nos termos do n.º2 do art.º34.º, as provisões constituídas e aceites para efeitos fiscais que respeitem aos créditos, existências e obrigações e encargos objecto de transferência, com excepção das que respeitem a estabelecimentos estáveis situados fora do território português quando estes são transferidos para entidades não residentes.

A sociedade beneficiária, para efeitos fiscais, deverá inscrever na sua contabilidade os elementos patrimoniais objecto de transferência pelos mesmos valores que tinham nas sociedades fundidas antes da realização da operação de fusão (n.º3).

Ainda, a beneficiar do regime especial de neutralidade fiscal, o lucro tributável das sociedades beneficiárias, determina-se de acordo com o disposto art.º17.º, do Código do IRC, com os ajustamentos previstos no n.º4 do art.º68.º do mesmo Código.

Estabelece aquele n.º4 do art.º68.º, do Código do IRC: «Na determinação do lucro tributável da sociedade beneficiária deve ter-se em conta o seguinte:
a) O apuramento dos resultados respeitantes aos elementos patrimoniais transferidos é feito como se não tivesse havido fusão, cisão ou entrada de activos;
b) As reintegrações ou amortizações sobre os elementos do activo imobilizado transferidos são efectuadas de acordo com o regime que vinha sendo seguido nas sociedades fundidas, cindidas ou na sociedade contribuidora;
c) As provisões que foram transferidas têm, para efeitos fiscais, o regime que lhes era aplicável nas sociedades fundidas, cindidas ou na sociedade contribuidora».

Compreende-se que assim seja, uma vez que a ideia subjacente ao regime de neutralidade é a de que a sociedade beneficiária, ou nova sociedade, dará continuidade, com os decorrentes direitos e obrigações, à actividade exercida pelas sociedades intervenientes na operação de fusão.

Ora, esta ideia de continuidade da actividade com recurso aos activos transferidos justifica, a nosso ver, uma interpretação mais restritiva do que aquela assumida na sentença quanto ao tipo de provisões cujo regime aplicável nas sociedades fundidas a lei impõe seja continuado na sociedade beneficiária na determinação do lucro tributável.

Um primeiro critério interpretativo, no sentido restritivo propugnado, resulta do disposto no n.º1 do art.º68.º do Código do IRC, a que já acima fizemos referência.

Aí se dispõe que na determinação do lucro das sociedades fundidas, não é considerado qualquer resultado derivado da transferência dos elementos patrimoniais em consequência da fusão, nem são considerados como proveitos ou ganhos, nos termos do nº2 do art.º34.º, as provisões constituídas e aceites para efeitos fiscais que respeitem aos créditos, existências e obrigações e encargos objecto de transferência.

Estas provisões – que respeitam aos créditos, existências e obrigações e encargos – correspondem às provisões gerais previstas nas alíneas a), b) e c), do n.º1 do art.º34.º, do Código do IRC.

Provisões gerais, porquanto “…aplicáveis a todas as empresas, incluindo, obviamente as bancárias e petrolíferas, se nestas se verificarem as características próprias de cada um daqueles tipos” – vd. Vítor Faveiro, “O Estatuto do Contribuinte”, Coimbra Editora, 2002, pág.544.

Pois bem. Não fora o regime de neutralidade aplicável às fusões, decorrente do n.º1 do art.º68.º, do Código do IRC, na determinação do lucro tributável das sociedades fundidas, deveria haver lugar à reposição daquelas provisões gerais e as mesmas consideradas proveitos do exercício – art.º34.º, n.º2, do Código do IRC.

Tal não sucede, porém, por expressa determinação da lei, atento o regime de neutralidade fiscal, em que os eventos associados à constituição de tais provisões nas sociedade fundidas podem ainda vir a verificar-se na sociedade beneficiária por via da continuidade da actividade exercida com os decorrentes direitos e obrigações. Justifica-se, por isso, a subsistência dessas provisões gerais.

Já quanto às provisões exclusivas das sociedades previstas na alínea d) do n.º1 do art.º34.º, do Código do IRC, não se antevêem, na perspectiva da fusão neutral, razões válidas que imponham um tratamento fiscal continuado do regime das provisões. Nem é isso que, a nosso ver, decorre da lei e, nomeadamente, do disposto no n.º4 do art.º68.º, do Código do IRC, cuja interpretação deverá ser conjugada com a do n.º1 do mesmo preceito, daí decorrendo que a regra de continuidade contabilística e fiscal se reporte unicamente às provisões gerais “que respeitem aos créditos, existências e obrigações e encargos objecto de transferência”, previstas nas alíneas a), b) e c), do n.º1 do art.º34.º, do Código do IRC.

De resto não parece fazer muito sentido que a regra de continuidade contabilística e fiscal imposta pelo regime de neutralidade abranja também as provisões exclusivas das empresas, nomeadamente, as mencionadas na alínea d) do n.º1 do art.º34.º do Código do IRC, ou seja, as constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal e pelo Instituto de Seguros de Portugal às empresas submetidas à sua fiscalização.

Se em consequência de uma operação de reestruturação, títulos e valores mobiliários de uma empresa seguradora são transferidos para uma instituição bancária, as provisões ou reservas técnicas eventualmente constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Instituto de Seguros de Portugal para cobrir riscos da perda de valor da carteira (provisões exclusivas) deixam de justificar-se, devendo ser anuladas e constituídas outras de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal. O que não pode aceitar-se, mesmo no plano da fusão neutral é que determinada carteira de títulos, porventura muito representativa, se mantenha provisionada segundo a regra de continuidade, quando tais activos, transferidos para uma instituição bancária, mereçam regime provisional diverso imposto pela sua entidade de fiscalização segundo critérios prudenciais que, não se justificando do ponto de vista estritamente contabilístico e fiscal, assumem relevo na defesa e garantia dos interesses públicos inerentes ou decorrentes da actividade creditícia ou financeira que ao Banco de Portugal cumpre estatutariamente acautelar (vd. Vítor Faveiro, ob. cit., pág.543) e a que o Estado entendeu dar expressão fiscal.

Assim, estando apenas as provisões gerais, previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º1 do art.º34.º do Código do IRC sujeitas ao regime de continuidade no tratamento fiscal das provisões, todas as restantes que as sociedades fundidas tenham constituído (bem ou mal, não interessa agora), por referência aos activos objecto de transferência, devem ser repostas e levadas a proveitos (art.º34.º, n.º2 e 68.º, n.º1, do Código do IRC), ficando os activos transferidos sujeitos, sem quebra do regime de neutralidade, ao tratamento provisional da sociedade beneficiária ou nova sociedade.

Não houve, por conseguinte, violação do regime de neutralidade fiscal com as imparidades em activos disponíveis para venda constituídas pelo impugnante de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal, uma vez que, como sociedade beneficiária, não estava obrigada a manter ex vi da alínea c) do n.º4 do art.º68.º do Código do IRC, o regime provisional, de carácter não geral, que os activos transferidos tinham nas sociedades fundidas.

A sentença incorreu, pois, em erro de julgamento ao sufragar o entendimento da Administração tributária no sentido de que as provisões exclusivas constituídas por referência a activos financeiros transferidos tinham de manter na sociedade beneficiária o regime provisional que tinham nas sociedades fundidas, sob pena de violação do princípio da neutralidade fiscal aplicável às fusões, quando tal regra de continuidade do regime provisional apenas se reporta às provisões gerais.

Julga-se procedente este segmento do recurso do impugnante Banco.

Já quanto à correcção assente na divergência do critério de mensuração das imparidades associadas à Corticeira ..., I... e C..., SGPS, que o impugnante entende dever fazer-se pelo custo médio dos activos e não pelo custo histórico de aquisição, vejamos.

O Recorrente pugna pela relevação do custo médio do activo na mensuração da imparidade alegando sumariamente que “…como decorre da legislação aplicável ao Recorrente e aprovada pelo Banco de Portugal, o critério de valorimetria do custo médio é imposto ao Recorrente, sendo, aliás, o critério que tem seguido em exercícios anteriores ao que aqui se controverte, sem qualquer correcção por parte da administração tributária, pelo que sustentar a inadmissibilidade deste critério bule com o princípio da consistência que deve nortear o tratamento contabilístico e fiscal subjacente às imparidades sub judice”.

Constitui um princípio basilar da contabilidade o registo dos elementos patrimoniais pelo custo histórico, que corresponde ao valor pago pela sua aquisição expresso em moeda corrente.

Por outro lado, atendendo a que está em causa mensuração de imparidade prevista na alínea d) do n.º1 do art.34.º, do Código do IRC, o que de pertinente e a respeito resulta da Norma Internacional de Contabilidade 39cujo objectivo enunciado é o de “estabelecer princípios para reconhecer e mensurar activos financeiros, passivos financeiros e alguns contratos de compra ou venda de itens não financeiros” – a que se refere o n.º2 da Instrução n.º7/2005, do Banco de Portugal, é o seguinte:
«Activos Financeiros Disponíveis para Venda
67. Quando um declínio no justo valor de um activo financeiro disponível para venda tenha sido reconhecido directamente no capital próprio e houver prova objectiva de que o activo está com imparidade (ver parágrafo 59), a perda cumulativa que tinha sido reconhecida directamente no capital próprio deve ser removida do capital próprio e reconhecida nos resultados ainda que o activo financeiro não tenha sido desreconhecido.
68. A quantia da perda cumulativa que seja removida do capital próprio e reconhecida nos resultados segundo o parágrafo 67 deve ser a diferença entre o custo de aquisição (líquido de qualquer reembolso e amortização de capital) e o justo valor corrente, menos qualquer perda por imparidade resultante desse activo financeiro anteriormente reconhecido nos resultados.
(…)
AG72. O preço de mercado cotado apropriado para um activo detido ou um passivo a ser emitido é geralmente o preço de oferta de compra corrente e, para um activo a ser adquirido ou um passivo detido, o preço solicitado…» (sublinhados nossos).

Assim, tendo em conta que o Recorrente não especifica minimamente os factores de que decorrem as variações no custo histórico dos activos patrimoniais que pretenderia ver comtempladas na mensuração da imparidade, acompanhamos a sentença na conclusão a que chegou, com base na normação contabilística enunciada, de que na determinação do montante da imparidade releva o custo histórico de aquisição e não o custo médio dos activos.

Por outro lado, o princípio contabilístico da consistência, a que o Recorrente faz apelo, implica a manutenção das mesmas práticas contabilísticas de um exercício económico para outro, impedindo, portanto, que em cada um dos exercícios sejam aplicadas as práticas mais vantajosas para as empresas, designadamente, em termos fiscais.

Todavia, tal não impede que uma incorrecta contabilização do custo associado à imparidade possa ser ajustada para fins fiscais, ou para o reconhecimento fiscal da medida da imparidade expressa no balanço comercial.

Por este fundamento improcede o recurso.

Ø Imparidades em investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos

Em causa, está o montante de 5.717.966,28€ referente a uma imparidade associada às participações do impugnante, ora Recorrente, na D..., SGPS, corrigida pela Administração tributária porquanto e, por um lado, a participação financeira do impugnante na D..., SGPS veio transferida, no processo de fusão, a partir de uma entidade não financeira [Banco... SGPS, S.A.] que não pode aplicar o regime de provisionamento da alínea d) do n.º1 do art.º34.º do Código do IRC e, por outro, o processo de fusão foi efectuado ao abrigo do disposto no art.º68.º, n.º1 daquele Código, sendo que o regime de neutralidade impõe que se mantenha o regime de provisionamento da entidade não financeira e no regime de provisionamento de entidades não financeiras, não se aplica o art.º34.º, n.º1 alínea c) do Código do IRC, pelo que não são aceites fiscalmente as imparidades e/ou provisões associadas a participações financeiras.

A sentença recorrida manteve a correcção, deixando relevantemente consignado que: «…considerando que tais participações foram transferidas no âmbito do processo de fusão no qual o impugnante beneficiou do regime de neutralidade fiscal, que de acordo com o art.º68.º n.º4 alínea c), do CIRC as provisões “têm, para efeitos fiscais, o regime que lhes era aplicável nas sociedades fundidas, cindidas ou na sociedade contribuidora” e que no regime do Banco... SGPS, S.A., tais provisões não eram fiscalmente dedutíveis como custo, então, na esfera do impugnante, enquanto sociedade beneficiária do regime de neutralidade fiscal, também não podem ser aceites (porque mantêm o regime de não aceitação de tais provisões da sociedade fundida)».

Contra este modo de ver se insurge o Recorrente, retomando, no essencial, os argumentos expendidos a propósito da correcção referente a “imparidades em activos financeiros disponíveis para venda”.

Na apreciação que antes fizemos das correcções referentes a “imparidades em activos financeiros disponíveis para venda”, sustentamos o entendimento de que o regime de neutralidade decorrente do disposto no art.º68.º, n.º4 alínea c), do Código do IRC apenas impõe a continuidade das provisões gerais (as previstas nas alíneas a), b) e c), do n.º1 do art.º34.º, do Código do IRC), justificadas transversalmente pelo princípio contabilístico da prudência, e não também das provisões exclusivas que (bem ou mal, não interessa agora) tenham sido contabilizadas pela entidade não financeira fundida, no caso, o Banco... SGPS, S.A..

Não havendo no caso das provisões exclusivas, obrigação de continuidade do regime provisional, nada impede a contabilização da imparidade associada ao activo transferido de acordo com as determinações da entidade de supervisão da sociedade beneficiária, líquida da provisão contabilizada.

A sentença incorreu pois em erro de julgamento ao concluir pela não dedutibilidade fiscal da imparidade por violação do regime de neutralidade aplicável às fusões.

Procede também, pelas razões expostas, este segmento do recurso do impugnante.

Ø Provisão para crédito vencido

A Administração tributária corrigiu a provisão constituída para créditos vencidos no entendimento de que as despesas incorridas com o crédito e juros vencidos não eram provisionáveis de acordo com a disciplina contabilística imposta pelo Banco de Portugal e reconhecida fiscalmente nos termos da alínea d) do n.º1 do art.º34.º, do Código do IRC.

Escreveu-se, a propósito, no projecto de relatório (cf. pág.19 do RIT, de 05/09/2008, a fls. s/n do apenso instrutor):

«De acordo com o disposto na alínea a) do n.º2 do n.º1, conjugado com o n.º1 do n.º3 do Aviso 3/95, de 30/06, do BP, apenas são provisionáveis os créditos e juros vencidos enquadrados nas diferentes classes de risco.
Contudo, da análise efectuada aos diversos elementos apresentados pelo banco, verificou-se que este considerou como créditos elegíveis, o saldo da conta “1581 – Despesas de crédito vencido”, no montante de €2.194.256.69, tendo sido objecto de provisão à taxa de 100%. No entanto, não obstante este valor se encontrar relacionado com o crédito vencido, ele não consubstancia a natureza de crédito propriamente dito, pelo que não é possível o seu provisionamento. Por outro lado, o PCSB não prevê classes de risco para este tipo de despesas. De igual modo, em sede de NCA`s, apesar de não serem consideradas para efeitos de apuramento do lucro tributável, a situação não veio a sofrer qualquer alteração.
(…)»

Em sede de audição prévia no procedimento inspectivo, o impugnante e ora Recorrente veio sustentar, entre o mais, que “o disposto no Aviso 3/95 do Banco de Portugal deve ainda ser lide no sentido de impor o provisionamento, ainda que noutros termos, daquelas despesas”.

No relatório final, em sede de apreciação da resposta apresentada pelo impugnante/ Recorrente, deixou-se consignado o seguinte (cf. pág.72 e ss. do RIT, a fls. s/n do apenso instrutor):
«De facto, vem a requerente alegar que se depreende do n.º6 do citado Aviso que “…para efeitos do disposto nos números 3.º, 4.º e 7.º são equiparadas a crédito as posições credoras das instituições resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga”.
No entender do sujeito passivo, as despesas ora em crise incluem-se naquelas prestações de serviços e, por força do citado normativo, impor-se-ia a constituição da provisão para despesas nos mesmos termos em que teria de ser constituída para o crédito vencido, ou seja, de acordo comas classes de risco previstas no n.º3 do Aviso n.º3/95.
No entanto, o sujeito passivo tem consciência de que, se por um lado, o n.º6 do Aviso impõe a constituição de provisões, por outro lado e, por efeito da antiguidade das despesas em questão, a provisão a constituir na sua totalidade poderia não corresponder ao valor total das despesas, uma vez que nem todas seriam susceptíveis de ser enquadradas em classes de risco que conduziriam a um provisionamento integral do valor da despesa»

No segmento que agora importa trazer à colação, deixou-se consignado na sentença recorrida:
«In casu, estamos perante despesas de crédito vencido, isto é, despesas que resultam da actividade típica de concessão de crédito. Questiona-se se estas podem ser incluídas no disposto no n.º 6.º do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal, ou seja, se são “resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga”.
A actividade dos Bancos, definida no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), compreende, entre outras, as operações de recepção de depósitos ou outros fundos reembolsáveis, de crédito, incluindo concessão de garantias e outros compromissos, locação financeira e factoring, de pagamento, emissão e gestão de meios de pagamento, tais como cartões de crédito, cheques de viagem e cartas de crédito, participações em emissões e colocações de valores mobiliários e prestação de serviços correlativos, prestação de informações comerciais, prestação dos serviços e exercício das actividades de investimento a que se refere o artigo 199.º-A do RGICSF e outras operações análogas que a lei lhes não proíba.
Na sua actividade típica de concessão de crédito o que a instituição bancária faz é, em suma, celebrar contratos de mútuo oneroso (artigos 1142.º e 1145.º do Código Civil) - mútuo bancário, já que realizado por uma instituição de crédito -, não estando em causa, consequentemente, qualquer prestação de serviços (cf. art. 1154.º do CC). Não vindo demonstrado, ou sequer alegado, nos autos que as “despesas de crédito vencido” envolvem uma verdadeira prestação de serviços – uma obrigação do Banco proporcionar certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual – e de que a sua “relação” com a operação de crédito bancário é acessória ou indirecta (isto é, a operação de crédito não seria mais do que a oportunidade para serem prestados serviços ao cliente), então temos que concluir que aquelas despesas estão directamente relacionadas com a concessão de crédito. E sendo assim, não as podemos considerar como resultado de uma prestação de serviços.
No entanto, as despesas associadas à actividade de concessão de crédito poderão ser consideradas posições credoras resultantes de “operações de natureza análoga”. Com efeito, estando em causa operações de índole ou natureza contratual (prestação de serviços ou venda de activos), então a concessão de crédito (ou celebração de contratos de mútuo oneroso) - porque de natureza contratual - integra o conceito de operação de natureza contratual prevista no n.º 6.º do Aviso 3/95. Assim, as outras posições credoras, incluindo as “despesas de crédito vencido”, que resultem da actividade de concessão de crédito das instituições bancárias, não abrangidas pelo conceito de crédito vencido nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 3.º do Aviso 3/95, são equiparadas a crédito – cf. n.º 6.º do Aviso 3/95.
Esta equiparação das “despesas de crédito vencido” debitadas ao cliente, atento o facto de o serem para efeitos do disposto no n.º 3.º do Aviso 3/95, implica que o seu regime provisional será o disposto nesse n.º 3.º do Aviso 3/95, isto é, ficam tais despesas sujeitas ao regime de constituição de provisões do próprio crédito vencido.
Sendo assim, importava que o Impugnante constituísse as provisões no que respeita às despesas de crédito vencido, porque equiparadas a crédito, mediante o seu enquadramento nas classes de risco a que se refere o número 3.º, n.ºs 1 e 2.
O certo é que as despesas em causa foram provisionadas à taxa de 100%, tendo sustentado o Impugnante tratar-se de imposição do Banco de Portugal e por se entender que o seu risco de recebimento é mais elevado que o risco associado ao crédito que o originou.
E note-se que a AT pôs em causa esta taxa de provisões, afastando a possibilidade de todas as despesas poderem ser alvo de provisões a essa taxa, quando nota que o próprio sujeito admitiu que nem todas as despesas “seriam susceptíveis de ser enquadradas em classes de risco que conduziriam a um provisionamento integral do valor da despesa”.
Atendendo a que nos termos do referido Aviso, cuja disciplina é obrigatória para as entidades bancárias, as provisões em causa terão de ser constituídas em conformidade com as classes de risco em que se enquadrem, não podem as mesmas ser aceites quando se violem os limites legais impostos pelo Aviso n.°3/95.
Daí que, ainda que se aceite que tais despesas possam ser provisionadas porque decorrentes de operações análogas e, consequentemente, equiparadas a crédito, importava que o Impugnante demonstrasse ainda que obedeceu aos limites legais de que depende a dedução fiscal das provisões.
O certo é que, nestes autos, o Impugnante não fez tal prova. Com efeito, embora sustentando a admissibilidade da sua dedução por inclusão nas “prestações de serviço” e de acordo com as classes de risco previstas no n.º 3 do Aviso 3/95, não alegou nem provou que tais provisões tinham sido realizadas nos termos das classes de risco definidas no Aviso citado, isto é que todas (ou, pelo menos, algumas) eram susceptíveis de ser enquadradas em classes de risco que conduziriam a um provisionamento integral - a 100% - do valor da despesa.
Não tendo o Impugnante demonstrado que o provisionamento dos montantes em apreço a 100% obedeceu à disciplina definida pelo Banco de Portugal e, sobretudo, porque o referido Aviso 3/95 não permite a sua constituição nos moldes em que os mesmos foram provisionados, isto é, todos à taxa de 100%, sem obediência às classes de risco e respectivas percentagens de provisionamento, não pode este Tribunal proceder à anulação da correcção em causa.
Termos em que improcede, nesta parte, a presente impugnação, mantendo-se a correcção realizada pela AT no que se reporta ao montante de € 578.596,48 referente a provisões para créditos vencidos» (sublinhados nossos).

O Recorrente Banco assaca à sentença nulidade por excesso de pronúncia, porquanto, alega, tendo a correcção sido praticada pela Administração tributária com fundamento em que o conceito de crédito provisionável, de acordo com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal, não abrangia as despesas com o crédito vencido, a sentença, ao dissentir da interpretação da Administração tributária e concluir que, afinal, as despesas com crédito vencido eram equiparadas a crédito vencido e sujeitas ao mesmo regime provisional, outra coisa não poderia fazer que anular, sem mais, a correcção. Mas não foi isso que a sentença fez, antes aportando um novo fundamento para desconsiderar fiscalmente o montante provisionado da despesa com crédito vencido, qual o de que, “…ainda que se aceite que tais despesas possam ser provisionadas porque decorrentes de operações análogas e, consequentemente, equiparadas a crédito, importava que o Impugnante demonstrasse ainda que obedeceu aos limites legais de que depende a dedução fiscal das provisões. O certo é que, nestes autos, o Impugnante não fez tal prova”.

O vício de excesso de pronúncia – a que se alude na al. d) do nº 1 do artº668º do CPC -, susceptível de levar à nulidade da sentença, ocorre sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido, ou seja, ele ocorre sempre que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes (excluídas aquelas questões que são de conhecimento oficioso).

Como se salienta no Acórdão do STJ, de 06-12-2012, proferido no proc.º469/11.8TJPRT.P1.S1A, “A pronúncia indevida consiste em o juiz conhecer de questão de que não podia tomar conhecimento (2.ª parte da al. d) do n.º1 do art.º668.º do CPC), pelo que o seu excesso configura nulidade relacionada com a 2.ª parte do n.º 2 do art.º660.º do CPC, que proíbe ao juiz ocupar-se de questões que as partes não tenham suscitado, sendo estas questões os pontos de facto ou de direito relativos à causa de pedir e ao pedido, que centram o objecto do litígio. À luz do princípio do dispositivo, "há excesso de pronúncia sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido" (cfr., Ac. STJ de 6.2.92, Bol. 414.º - 413), resultando (...) limitação do juiz ao princípio do dispositivo, que exprime a liberdade com que as partes definem o objecto do litígio, não podendo o julgador condenar, além do pedido, nem considerar a causa de pedir que não tenha sido invocada".

Pois bem, descendo aos autos, o que se verifica é que pese embora a correcção da provisão das despesas com crédito vencido tenha sido desconsiderada por não integrar o conceito de crédito provisionável, [como se diz no projecto de conclusões, “…a verdade é que não obstante este valor se encontrar relacionado com o crédito vencido, ele não consubstancia a natureza de crédito propriamente dito, pelo que não é possível o seu provisionamento”], a verdade é que, no relatório final teceram-se as seguintes considerações, as quais não podem deixar de integrar a fundamentação do acto impugnado: «De facto, vem a requerente alegar que se depreende do n.º6 do citado Aviso que “…para efeitos do disposto nos números 3.º, 4.º e 7.º são equiparadas a crédito as posições credoras das instituições resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga”.
No entender do sujeito passivo, as despesas ora em crise incluem-se naquelas prestações de serviços e, por força do citado normativo, impor-se-ia a constituição da provisão para despesas nos mesmos termos em que teria de ser constituída para o crédito vencido, ou seja, de acordo comas classes de risco previstas no n.º3 do Aviso n.º3/95.
No entanto, o sujeito passivo tem consciência de que, se por um lado, o n.º6 do Aviso impõe a constituição de provisões, por outro lado e, por efeito da antiguidade das despesas em questão, a provisão a constituir na sua totalidade poderia não corresponder ao valor total das despesas, uma vez que nem todas seriam susceptíveis de ser enquadradas em classes de risco que conduziriam a um provisionamento integral do valor da despesa».

Como se vê, a Administração tributária afastou liminarmente a argumentação do impugnante/ Recorrente no sentido da equiparação a crédito, para efeitos provisionais, das posições credoras resultantes das prestações de serviços a que supostamente se reconduziriam as despesas provisionadas, por o impugnante ter constituído a provisão a 100%, sem qualquer demonstrada correspondência com as classes de risco a que se reportam os créditos vencidos.

A sentença não enquadrou as provisionadas despesas com crédito vencido como resultado de uma prestação de serviços, mas como despesas associadas à actividade de concessão de crédito, susceptíveis de serem consideradas posições credoras resultantes de “operações de natureza análoga”, equiparáveis para efeitos provisionais a créditos vencidos, mas igualmente concluiu pela sua desconsideração fiscal por indemonstrada referenciação às classes de risco previstas no n.º3 do Aviso n.º3/95 do Banco de Portugal, cumprindo lembrar que o impugnante provisionou tais despesas na sua totalidade.


Não houve, pois, qualquer pronúncia indevida em vista da fundamentação do acto externada no relatório final; apenas um diferente enquadramento jurídico da despesa provisionada na equiparação a crédito vencido provisionável, não como correspondendo a «posições credoras resultantes das prestações de serviços», mas sim a «posições credoras resultantes de “operações de natureza análoga”», em qualquer caso, insusceptível de aceitação como custo fiscal por indemonstrado o seu enquadramento nas classes de risco previstas no n.º3 do Aviso n.º3/95 e respectivas percentagens de provisionamento.

Improcede a arguida nulidade da sentença por excesso de pronúncia.

Questão diversa prende-se com o eventual erro de julgamento, também assacado à sentença nas conclusões do recurso.

Entende o Recorrente Banco que o conceito de crédito, em particular o de crédito vencido, de acordo com as regras prudenciais do Banco de Portugal, compreende o capital, os juros e as despesas incorridas com o crédito (estas, justamente, as controvertidas nos autos).

E que, muito embora assim seja, há riscos que não devem ser gradualmente provisionados, nomeadamente, os relativos a despesas com o crédito vencido “…porque o risco de recebimento destas despesas é mais elevado do que o risco associado ao crédito que as originou”.

Desde já se diga que o Recorrente não indica que regra prudencial da sua entidade reguladora e de supervisão, formalizada em Aviso, Instrução ou outro documento, suporta a afirmação de que os valores da despesa com crédito vencido devam ser integralmente provisionados, isto é, logo a 100% e, não escalonadamente, acompanhando a provisão gradual dos créditos a que se referem, de acordo com as classes de risco em que se integram estes créditos.

Como não explicita, clarifica ou demonstra minimamente a existência e a natureza dos encargos com crédito vencido que apresentam um risco de não recebimento mais elevado do que o risco associado ao crédito que as originou.

Decorre do disposto no n.º1 alínea d) do art.º34.º, do Código do IRC, a dedutibilidade das provisões constituídas obrigatoriamente, por força de uma imposição de carácter genérico e abstracto, pelas empresas sujeitas à supervisão do Banco de Portugal com excepção da provisão para riscos gerais de crédito.

Resulta do disposto no n.º1 do Aviso n.º3/95 (versão consolidada), do Banco de Portugal, que as instituições de crédito são obrigadas a constituir provisões para as finalidades previstas nas suas alíneas a) a i), e nomeadamente nos termos da alínea a), para risco específico de crédito”.

Estabelece o n.º2 do Aviso que “As provisões para risco específico de crédito devem ser constituídas para crédito vencido e para outros créditos de cobrança duvidosas”.

E o n.º3.º, do Aviso 3/95 dispõe:

«1 Para efeitos da constituição das provisões para crédito vencido, os vários tipos de crédito são enquadrados nas classes de risco indicadas no número seguinte, as quais reflectem o escalonamento dos créditos e dos juros vencidos em função do período decorrido após o respectivo vencimento ou o período decorrido após a data em que tenha sido formalmente apresentada ao devedor a exigência da sua liquidação.

2 - As classes de risco a que se refere o número precedente são as seguintes:
a) Classe I - até 3 meses;
b) Classe II - de 3 até 6 meses;
c) Classe III - de 6 até 9 meses;
d) Classe IV - de 9 até 12 meses;
e) Classe V - de 12 até 15 meses;
f) Classe VI - de 15 até 18 meses;
g) Classe VII - de 18 até 24 meses;
h) Classe VIII - de 24 até 30 meses;
i) Classe IX - de 30 até 36 meses;
j) Classe X - de 36 até 48 meses;
k) Classe XI - de 48 até 60 meses;
l) Classe XII - mais de 60 meses.
(…)
4 - Sem prejuízo do disposto no nº 3 do nº 5.º, as provisões para crédito vencido devem representar pelo menos as seguintes percentagens dos respectivos créditos, considerando as classes de risco indicadas no nº 2 deste número e a existência ou não de garantia, real ou pessoal, em conformidade com o nº 5, e avaliada nos termos do nº 6, ambos também deste número:

(…)».



Por outro lado, dispõe o n.º6 do mesmo Aviso:
«Sem prejuízo do número seguinte, para efeitos do disposto nos nºs 3.º, 4.º e 7.º, são equiparadas a crédito as posições credoras das instituições resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga».

O Banco de Portugal emitiu ainda a Instrução 6/2005, relativa a «crédito vencido», com entrada em vigor em 01/03/2005, na qual determinou o seguinte:

«1. Esta Instrução aplica-se às instituições que elaborem as suas demonstrações financeiras de acordo com o disposto nos nºs 2.º e 3.º do Aviso nº 1/2005 (NCA).
2.
1) Para efeitos da aplicação deste número, entende-se por créditos os valores definidos no ponto 1 do nº 3.º do Aviso nº 1/2005.
2) A aplicação dos critérios de constituição de provisões para crédito vencido, definidos no Aviso nº 3/95, obrigam ao enquadramento dos vários tipos de crédito nas classes de risco a seguir indicadas, que reflectem o escalonamento temporal dos créditos e juros vencidos em função do período decorrido após o respectivo vencimento, ou o período decorrido após a data em que tenha sido formalmente apresentada ao devedor a exigência da sua liquidação.
Classe I - até 3 meses
Classe II - de 3 até 6 meses
Classe III - de 6 até 9 meses
Classe IV - de 9 até 12 meses
Classe V - de 12 até 15 meses
Classe VI - de 15 até 18 meses
Classe VII - de 18 até 24 meses
Classe VIII - de 24 até 30 meses
Classe IX - de 30 até 36 meses
Classe X - de 36 até 48 meses
Classe XI - de 48 até 60 meses
Classe XII - mais de 60 meses
(…)».

Pois bem, não há no acervo normativo citado e pertinente qualquer disposição expressa a impor, por razões prudenciais, a constituição obrigatória de provisão para encargos com crédito vencido, nem aliás, o Recorrente, como acima dissemos, indica qual o documento normativo da entidade de supervisão que, a seu ver, suporta o entendimento que propugna.

É bom não confundir a relevância fiscal da provisão para encargos (previstos) com a aceitação do encargo (efectivo) como custo fiscal e por isso poderão haver regras próprias na contabilização desses encargos até para efeitos fiscais sem que tal imponha necessariamente a correspondente provisão, sequer na óptica da entidade de supervisão.

No entanto, dando isso por assente, a sentença, já em apreciação do fundamento invocado na petição inicial a título subsidiário (e segundo o qual, se imporia a constituição da provisão nos termos do n.º6 do Aviso 3/95 do Banco de Portugal por equiparação a crédito das posições credoras resultantes da prestação de serviços, nas quais se incluem as despesas referentes ao crédito e aos juros debitados a clientes – cf. art.º46.º a 51.º do articulado), foi mais longe e equiparou tais encargos a crédito por via do disposto no n.º6 do Aviso n.º3/95, segundo o qual,”…para efeitos do disposto nos nºs 3.º, 4.º e 7.º, são equiparadas a crédito as posições credoras das instituições resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga(os sublinhados em textos legais transcritos são sempre da nosso responsabilidade).

Seguindo o raciocínio da sentença na equiparação dos encargos a “operações de natureza análoga ao crédito” que as originou, então, deve seguir-se na sua contabilização, na falta de prova em contrário, o regime provisional do próprio crédito. E sendo este escalonado temporalmente de acordo com as classes de risco previstas no Aviso, então a provisão escalonada é aplicável “às operações de natureza análoga” em que foram enquadrados tais encargos.

De resto, salienta-se que a natureza e finalidade dos encargos com crédito vencido, que pretende provisionáveis, o Recorrente não o esclarece nos autos, de modo a que se pudesse apreciar a consistência do seu grau de previsibilidade ou efectividade relativamente ao crédito vencido que lhes deu causa e concluir sustentadamente por que tais encargos, atentas aquelas natureza e finalidade, nunca poderiam ser provisionáveis de harmonia com o fraccionamento previsto para o crédito de que emergem.

Por isso, a provisão dos encargos contabilizada a 100%, sem obediência às classes de risco e respectivas percentagens de provisionamento, não observa o disposto na disciplina normativa do Banco de Portugal, que é aquela que importa ter em conta na apreciação da legalidade das correcções levadas a efeito.

A sentença não incorreu, pois, em erro de julgamento na apreciação que fez da correcção em causa, improcedendo o recurso neste segmento.


Por último, se diga que a desconsideração fiscal do montante provisionado não implica a anulação do proveito respeitante à despesa sob pena da violação dos princípios constitucionais da legalidade, da justiça, da igualdade e da proporcionalidade plasmados no art.º266.º da Lei Fundamental.

Com efeito, uma coisa é a desconsideração, como custo, da provisão da despesa (art.º23.º, n.º1 alínea h), do Código do IRC); outra, bem diferente, a desconsideração como custo da despesa (indevidamente) provisionada (art.º23.º, n.º1 alínea c) do mesmo Código). Nem toda a despesa dedutível é provisionável.

Compreende-se que assim seja, pois “caso fossem aceites como custo fiscal a totalidade ou, pelo menos, a generalidade das provisões que a empresa decidiu constituir, estaria aberto caminho fácil para se evitar, ou pelo menos, adiar a tributação (para se conseguir uma redução artificial do lucro tributável, através da constituição de provisões excessivas)” – vd. Rui Duarte Morais, “Apontamentos ao IRC”, Almedina, a pág.120.

E assim de duas uma: ou a despesa indevidamente provisionada teve lugar na medida provisionada e deverá ser levada a custo no exercício da sua efectivação, segundo a regra de periodização do art.º18.º, do Código do IRC; ou a despesa prevista, antecipada (porque a provisão mais não é do que uma antecipação da despesa, ou do montante dela, segundo regras de prudência), não se vem, afinal, a concretizar e então nada há para levar a custo do exercício. Se a contabilização da provisão fosse reconhecida fiscalmente, nesta última situação, de falta de efectivação da despesa provisionada, haveria lugar a reversão da provisão, lançada contabilisticamente em proveitos.

Portanto, nada há para anular na conta de proveitos por via da desconsideração fiscal da provisão em causa, porque se está perante uma previsão de despesa e não perante uma despesa efectiva ou real.

Improcede também o recurso por este fundamento.

Ø Correcção referente a imposto retido no estrangeiro (imposto retido de dividendos não UE

A Administração tributária corrigiu o montante de 1.031.723,09€ contabilizado pelo impugnante numa conta de custos e correspondente a impostos retidos em Moçambique e Angola relativamente a dividendos distribuídos pelo BCI Moçambique e Banco de Fomento, SARL, respectivamente, no entendimento de que tais rendimentos obtidos no estrangeiro deveriam ser considerados, para efeitos de tributação, pelas respectivas importâncias ilíquidas, ainda que não haja lugar a crédito de imposto por inexistência ou insuficiência de colecta.
A sentença sufragou o entendimento da Administração tributária no sentido de que o rendimento obtido no estrangeiro deverá ser considerado pelo seu valor ilíquido, ainda que não haja lugar a crédito de imposto.

Contra este modo de ver se insurge o Recorrente, para quem a correcção do gasto contabilizado com o imposto a que foi sujeito no estrangeiro apenas se justificaria se tivesse havido utilização do mecanismo do crédito de imposto por dupla tributação internacional, o que não ocorreu por ter registado prejuízos fiscais no exercício em causa. Vejamos.

Sob a epígrafe “Correcções nos casos de crédito de imposto e retenção na fonte”, estabelece o art.º62.º do Código do IRC (redacção então vigente):
«1 – Na determinação da matéria colectável sujeita a imposto, quando houver rendimentos obtidos no estrangeiro que dêem lugar a crédito de imposto por dupla tributação internacional, nos termos do artigo 85.º, esses rendimentos devem ser considerados, para efeitos de tributação, pelas respectivas importâncias ilíquidas dos impostos sobre o rendimento pagos no estrangeiro.
2 – (…)»

Nos termos do nº1 do artº83º do CIRC, «A liquidação do IRC processar-se-á nos termos seguintes:
a) Quando a liquidação deva ser feita pelo contribuinte nas declarações a que se referem os artigos 112.º e 114.º, terá por base a matéria colectável que delas conste;
b) ….…..;
c) ….…..».

Estatui o seu nº2 que «Ao montante apurado nos termos da alínea a) do número anterior serão efectuadas as seguintes deduções, pela ordem indicada:
a) ……………….;
b) A correspondente à dupla tributação internacional;
c) ………………;
d) ………………;
e) ………………;
f) ………………».

Dispõe o artº85º, do CIRC:
«1 - A dedução a que se refere a alínea b) do nº2 do artigo 83º é apenas aplicável quando na matéria colectável tenham sido incluídos rendimentos obtidos no estrangeiro e corresponde à menor das seguintes importâncias:
a) Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;
b) Fracção do IRC, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos dos custos ou perdas directa ou indirectamente suportados para a sua obtenção».
2 – Quando existir convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efectuar nos termos do número anterior não pode ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos pela convenção.
3 – (…)»

É hoje, opinião geral, que o ónus da eliminação da dupla tributação incumbe basicamente ao país da residência. E como pode o país de residência proceder para esse efeito? Através do método de isenção – que consiste em isentar do imposto devido no país da residência os rendimentos de fonte estrangeira – e do método de imputação ou “tax credit - em que o rendimento de fonte estrangeira não é isento, de tal modo que o Estado da residência tributa o rendimento global do contribuinte, seja qual for a sua origem. Todavia, do montante do imposto assim apurado, deduz (credita) o imposto pago no país da fonte, desde que seja de natureza equivalente ao imposto pago no país da residência. O sistema de isenção considera o rendimento; o sistema de imputação, o imposto sobre o rendimento.
O método utilizado pode ser de imputação integral (se o Estado da residência deduz o montante total do imposto efectivamente pago no país de origem) ou ordinária. Neste último, a dedução, pelo Estado da residência, do montante do imposto efectivamente pago no país de origem encontra um limite máximo – o limite relativo à fracção do seu próprio imposto correspondente aos rendimentos provenientes do país da fonte.

«Note-se que o crédito de imposto estrangeiro representa um “rendimento adicional” tributável no país da residência, a acrescer ao rendimento que lhe deu origem. Numa linguagem expressiva, pode dizer-se que o tax credit é como que um crédito contra o Fisco utilizável como moeda de pagamento do imposto. Precisamente, porque representa um rendimento adicional, é necessário, antes de proceder à dedução, reajustar o rendimento bruto estrangeiro, acrescendo o seu valor à base de cálculo do imposto do país da residência».

«O método da imputação ordinária, directa e efectiva, foi o adoptado por Portugal através de norma interna, unilateral, no artigo 83.º, nº2 alínea b) e no artigo 85.º, do CIRC. A dedução correspondente à dupla tributação internacional apenas, porém, apenas aplicável quando na matéria colectável tenham sido incluídos rendimentos obtidos no estrangeiro e corresponderá à menor das seguintes importâncias: (i) imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro; (ii) fracção do imposto sobre o rendimento calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos dos custos ou perdas, directa ou indirectamente suportados para a sua obtenção».

Seguimos, no essencial, a lição de Alberto Xavier, “Direito Tributário Internacional”, Almedina, 2ª edição actualizada (2011), pág.741 e seguintes.

Como decorre dos segmentos normativos transcritos e dos considerandos doutrinais de Alberto Xavier, Portugal, no âmbito dos procedimentos unilaterais para prevenir a dupla tributação internacional adoptou o mecanismo do denominado crédito de imposto ou tax credit, o qual consiste, basicamente, em deduzir à colecta do IRC o montante de imposto pago no país da fonte, com o limite daquele que seria liquidado em território nacional.

Todavia, a dedução do imposto estrangeiro pago não tem lugar quando o sujeito passivo residente não apure qualquer colecta de imposto, como foi o caso do Recorrente, que no exercício em causa registou prejuízos fiscais.

Nestes casos, em que o rendimento de fonte estrangeira não dê lugar a crédito de imposto, não se impõe a correcção do montante de imposto estrangeiro registado como gasto. De facto é essa a leitura mais consentânea com uma interpretação literal do disposto no n.º1 do art.º62.º, do Código do IRC, contrariamente ao propugnado na sentença.

Acresce que, a regra da universalidade ou de base mundial, que a Administração tributária refere com relação à tributação dos rendimentos obtidos no estrangeiro por sujeitos passivos residentes em território nacional, não é incompatível com aquela interpretação, posto que os rendimentos de fonte estrangeira reduzem o montante do prejuízo fiscal reportável do sujeito passivo apurado no período de tributação em que os rendimentos obtidos no estrangeiro foram incluídos (líquidos) na determinação da matéria colectável, mas por outro lado previne-se que o montante de imposto pago no estrangeiro venha a integrar a base tributável do IRC do sujeito passivo residente, acrescendo ao próprio rendimento (líquido) de fonte estrangeira.

Tal como salienta o Recorrente, o disposto no n.º1 do art.º62.º do Código do IRC destina-se a operacionalizar o crédito de imposto enquanto mecanismo de eliminação de dupla tributação adoptado unilateralmente por Portugal na medida em que, o crédito de imposto representa, no dizer de Alberto Xavier, um rendimento adicional tributável no país de residência, a acrescer ao rendimento que lhe deu origem e, “porque representa um rendimento adicional, é necessário, antes da dedução, reajustar o rendimento bruto estrangeiro, acrescendo o seu valor à base de cálculo do país de residência”.

Concluindo, se o imposto a que o sujeito passivo foi sujeito no país da fonte foi registado como gasto, a importância correspondente deverá ser corrigida unicamente nos casos de crédito de imposto por dupla tributação internacional, tal não ocorrendo quando por inexistência de colecta, como foi o caso, não haja lugar a qualquer dedutibilidade.

Assim, a correcção do custo contabilizado correspondente ao imposto estrangeiro enferma de ilegalidade por violação do disposto no art.º23.º n.º1 alínea f) do Código do IRC, cuja aplicabilidade não é afastada pelo disposto no n.º1 do art.º62.º do mesmo Código, quando não haja lugar a crédito de imposto por dupla tributação, nos termos definidos no seu art.º85.º. O que significa que a sentença incorreu em erro de julgamento de direito, devendo se revogada nesta parte.

Ø Correcção relativa a Benefícios fiscais – Majoração de donativos.

No que concerne a esta correcção, o Recorrente não se conforma com o decidido na sentença recorrida porquanto, alega, contrariamente ao que nela foi entendido, a atribuição pecuniária por si efectuada ao Club ... – Instituição de Utilidade Pública, do montante de 23.000,00€ configura um verdadeiro donativo, para efeitos do disposto no art.º3.º, n.º1 alínea d) e n.º3 do Estatuto do Mecenato, e art.º1.º, n.º2 do Decreto-Lei n.º74/99, de 16 de Março, diploma que aprovou aquele Estatuto e não um patrocínio.

Para efeitos fiscais, as liberalidades não são consideradas como indispensáveis à realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto e para a manutenção da fonte produtora, e daí que não sejam consideradas custos nem variações patrimoniais negativas, a menos que a lei expressamente as qualifique de outro modo, como sucede relativamente a algumas liberalidades “de natureza social, cultural, ambiental, científica e desportiva”, que, por razões de política fiscal, a lei qualifica como custos.

Liberalidades que a lei expressamente qualifica como custo fiscal podem ver-se no próprio Código do IRC (art.º40.º) e em outros diplomas legais, nomeadamente, no Estatuto do Mecenato, aprovado pelo Decreto-Lei n.º74/99, de 16 de Março, de cujo art.º3.º, n.º1 alínea d), na redacção dada pelo art.º2.º da Lei n.º160/99, de 14 de Setembro e pelo art.º 2.º da Lei n.º26/2004, de 8 de Julho, decorria que são considerados custos ou perdas do exercício, até ao limite de 6/1000 do volume de vendas ou dos serviços prestados, os donativos atribuídos a pessoas colectivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva, as associações promotoras do desporto e as associações dotadas do estatuto de utilidade pública que tenham como objecto o fomento e a prática de actividades desportivas, com excepção das secções participantes em competições desportivas de natureza profissional.

De acordo com o n.º3 do mesmo art.º3.º do EM «Os donativos previstos nos números anteriores são levados a custos em valor correspondente a 120% do respectivo total ou a 130% quando atribuídos ao abrigo de contratos plurianuais celebrados para fins específicos que fixem os objectivos a prosseguir pelas entidades beneficiárias e os montantes a atribuir pelos sujeitos passivo».

O n.º2 do art.º1.º, do Decreto-Lei n.º74/99, dispunha que «Para os efeitos do disposto no presente diploma, apenas têm relevância fiscal os donativos em dinheiro ou em espécie concedidos sem contrapartidas que configurem obrigações de carácter pecuniário ou comercial às entidades públicas ou privadas nele previstas, cuja actividade consista predominantemente na realização de iniciativas nas áreas social, cultural, ambiental, desportiva e educacional».
A lei prevê unicamente a aceitação como custo fiscal majorado dos donativos, como se alcança dos preceitos citados.

Basicamente, considera-se donativo, para efeitos fiscais, a quantia atribuída, em dinheiro ou em espécie sem que daquela atribuição advenha qualquer contraprestação ou contrapartida.
O patrocínio está previsto como uma forma de publicidade visando a promoção do nome ou imagem da pessoa que participa no evento, bem com das suas actividades, bens ou serviços (cf. art.º24.º, do Cód. da Publicidade). Tem pois em vista a obtenção de um benefício económico, que exclui o animus donandi típico dos donativos.

Pois bem, a questão controvertida radica precisamente em saber se pode considerar-se donativo a atribuição pecuniária efectuada pelo Recorrente ao Club ..., ou antes, deverá tal atribuição ser qualificada como patrocínio.

A propósito desta correcção, com relevo, deixou-se consignado na sentença:

«A AT considerou tratar-se de um verdadeiro patrocínio, essencialmente, por tal resultar de um documento interno do Impugnante no qual tal valor foi tratado como tal - não relevando o recibo emitido pelo Club… -, porque entendeu existir uma relação de patrocínio entre as partes e porque o Impugnante não demonstrou não terem existido contrapartidas.
Antes de mais, não podemos atender ao argumento da existência de uma relação de patrocínio entre as partes. De facto, dos elementos recolhidos pela AT verifica-se que o conteúdo da página de internet do “V International… 2002”, se reporta a um torneio de brigde ocorrido no ano de 2002, e as demais páginas da internet constantes do Anexo ao Relatório de Inspecção referem-se ao patrocínio do Impugnante mas quanto a edições do Rali ...posteriores à do ano de 2005. Obviamente que tais elementos não poderão ser levados em conta como demonstrativos de que os montantes atribuídos ao Club ... em 2005 se traduziam num verdadeiro patrocínio, ou sequer que ponham em dúvida ter-se tratado de um verdadeiro donativo.
Questão diferente é já a existência de documentação interna do Impugnante na qual tal montante é tratado como um patrocínio.
Ora, não obstante existir um documento externo, ou melhor, o recibo emitido pelo próprio Club ... no qual consta tal montante como donativo e, sem prejuízo da validade que tal documento tem, o certo é que o documento do próprio sujeito passivo é susceptível de pôr em causa o carácter de donativo dos montantes atribuídos. Desde logo, porque o documento externo é o recibo emitido pelo próprio beneficiário e que sempre poderia, por acordo com o Impugnante, tê-lo emitido em tais moldes, e mais porque a divergência entre a documentação interna e externa sempre levantaria dúvidas pois que se impõe ao contribuinte a regularidade da documentação de suporte à sua contabilidade.
Assim, porque tais elementos são aptos a levantar dúvidas sobre a regularidade da contabilidade, era já ao Impugnante que cabia o ónus da prova de que ao conceder tais montantes não recebeu qualquer contrapartida.
Ora, o Impugnante ancorou-se no recibo/factura emitido e na existência de um lapso num documento interno sem, contudo, sequer demonstrar a realidade de tal lapso ou provar que efectivamente o valor em causa, conforme constava do recibo/factura, configurava um donativo. Reduziu a sua defesa a sustentar a necessidade de ter recebido contrapartidas, mas o certo é que não provou que não tivesse beneficiado de tais contrapartidas.
Porque era ao Impugnante que competia o ónus da prova de que os montantes atribuídos ao Club ... eram verdadeiros benefícios, é contra si que vai ser valorada a falta de prova (art. 342.º do CC).
Consequentemente, não existe motivo para anular a correcção efectuada pela AT de anulação da majoração ao valor concedido ao Club ..., improcedendo nesta parte a presente impugnação».

Nos termos do disposto no n.º1 do art.º75.º, da Lei Geral Tributária, «Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal».

Dispõe o n.º2 daquele preceito que cessa a presunção de veracidade, nomeadamente, nos termos da sua alínea a), quando “as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões”.

Ora, o próprio Recorrente consente que contabilizou a atribuição feita ao Club ... como patrocínio, muito embora aquela entidade beneficiária tenha emitido recibo de que consta tal atribuição como donativo.

Só que perante o erro ou inexactidão do lançamento do custo, ficou o Recorrente desprovido do escudo protector da presunção legal, e tal como se entendeu na sentença recorrida, a ele passou a competir, nos termos gerais de direito (cf. artigos 74.º, n.º1 da LGT e 341.º e 342.º, n.º1, do Código Civil), o ónus de demonstrar que, não obstante ter contabilizado a atribuição como patrocínio, essa atribuição consubstancia um verdadeiro donativo, nomeadamente carreando para os autos os pertinentes elementos extra-contabilisticos a partir dos quais fosse possível ao tribunal validar a tese da ausência de sinalagmaticidade da atribuição, típica dos patrocínios.

Ónus que manifestamente não cumpriu, não podendo a convicção do tribunal assentar unicamente da divergente contabilização da atribuição, ora como patrocínio por parte do impugnante, ora como donativo por parte da entidade beneficiária.

Por último, não colhe a tese da preterição do dever do inquisitório no apuramento da natureza da atribuição, previsto no art.º58.º da LGT, segundo o qual, A administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido”.

É que, se por um lado estão em causa elementos probatórios que o próprio Recorrente ou terá na sua posse (documentação relativa aos compromissos assumidos com a entidade beneficiária da atribuição) ou estará em melhor posição de fornecer, por outro, não se colhe dos autos que tenha requerido à Administração tributária diligência probatórias que aquela tenha desatendido.

A sentença recorrida não incorreu pois no erro de julgamento que lhe vem assacado, merecendo ser confirmada nesta parte.

Passemos agora, à apreciação do recurso interposto pela Fazenda Pública, no qual se insurge contra a anulação da correcção do montante de 1.885.600,81€, referente a “imparidade em imóveis desafectados”.

Entendeu-se na sentença recorrida que as imparidades relativas a activos correntes não detidos para venda foram constituídas pelo impugnante de acordo com o que lhe impôs a sua entidade de supervisão e, nessa medida, a imparidade é dedutível.

Assim se entendeu na sentença depois de muito sustentadamente ter rejeitado a tese da Administração tributária no sentido de que, para efeitos fiscais, o impugnante devia seguir o PCSB (Plano de Contas para o Sistema Bancário) e as imparidades só seriam aceites nos mesmos termos das provisões constituídas no âmbito da alínea d) do n.º1 do art.º34.º do Código do IRC, conjugado com o Aviso n.º3/95, no âmbito do referido PCSB, não relevando neste plano de contas as imparidades em causa, “constituídas para bens do imobilizado corpóreo que passaram para imóveis detidos para venda”, correspondendo o valor inicialmente corrigido de 1.987.838,27€ (alterado depois para 1.885.600,81€) ao diferencial “entre o valor líquido contabilístico dos imóveis (7.572.265,27€) e o montante total apurado pelo Banco nas avaliações efectuadas (5.584.427,00€)”.

A tese da Administração tributária, rejeitada na sentença, é agora retomada em sede recursiva pela Fazenda Pública.

Tal como se salienta na sentença, a argumentação primeira e transversal da Administração tributária é a de que a aceitação fiscal das imparidades constituídas dependia de as mesmas terem sido constituídas nos termos das provisões no âmbito do PCSB.

E, por conseguinte, a questão controvertida é esta: deveria o impugnante, ora Recorrido, manter a contabilidade organizada, para efeitos fiscais, de harmonia com o PCSB e a aceitação fiscal das imparidades ficar condicionada à sua constituição no âmbito das provisões do PCSB?

Nos termos do disposto no art.º14.º do Decreto-Lei n.º35/2005,de 17 de Fevereiro, «Para efeitos fiscais, nomeadamente de apuramento do lucro tributável, as entidades que, nos termos do presente diploma, elaborem as contas individuais em conformidade com as Normas Internacionais de Contabilidade são obrigadas a manter a contabilidade organizada de acordo com a normalização contabilística nacional e demais disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade».
O n.º2 do art.º13.º do mesmo Decreto-Lei determinava que: «O disposto no presente diploma não prejudica a competência do Banco de Portugal e do Instituto de Seguros de Portugal para definir:
a) As normas contabilísticas aplicáveis às contas individuais das entidades sujeitas à respectiva supervisão;
b) Os requisitos prudenciais aplicáveis às entidades sujeitas à respectiva supervisão».

No uso dessa competência legal, o Banco de Portugal, criou um normativo contabilístico autónomo, as designadas NCA (Normas de Contabilidade Ajustadas), que tomando embora por referência as NIC (Normas Internacionais de Contabilidade), lhe introduzem derrogações, as quais estão vertidas nos n.ºs 2 e 3 do Aviso n.º1/2005 e no Aviso n.º3/95 na versão consolidada do Aviso n.º3/2005, sendo que estes Avisos da entidade reguladora dispõem sobre matéria relativa ao regime das provisões e imparidades, ora em causa.

Os ajustamentos às NIC que as NCA (terminologia dada pelo n.º5 do Aviso n.º1/2005 do Banco de Portugal) introduzem, só podem ter assentado em razões de ordem contabilística e prudencial, como decorre do n.º2 do art.º13.º do Decreto-Lei n.º35/2005.

Ora, se uma entidade sujeita à supervisão do Banco de Portugal elabora as suas contas de acordo com as NCA, não está a fazê-lo, em bom rigor, de acordo com as NIC, está a fazê-lo de acordo com as NCA e de conformidade com critérios contabilísticos e prudenciais que se afastam das NIC, quer em termos de diferenças conceituais, quer no uso de outras valorimetrias (cf. n.º3, pontos 1 e 2 do Aviso 1/2005, do Banco de Portugal).


De resto, a Recorrente Fazenda Pública não avança qualquer argumento sólido que permita reconduzir as Normas de Contabilidade Ajustadas às Normas Internacionais de Contabilidade para efeitos do disposto no art.º14.º do Decreto-Lei n.º35/2005, quanto às entidades obrigadas a manter contabilidade organizada de acordo com o Plano de Contas para o Sistema Bancário (PCSB).

Não se reconduzindo, como é nosso entendimento, as NCA às NIC, o impugnante, que elaborou as contas de acordo com aquelas NCA não estava obrigado a apresentar as suas contas de acordo com o PCSB, de modo que a desconsideração da imparidade para imóveis desafectados com o fundamento em que tal imparidade não constava do PCSB – e só as previstas neste seriam fiscalmente aceites, nos termos do disposto na alínea d) do n.º1 do art.º34.º, do Código do IRC – não pode manter-se, deixando fora do perímetro de relevância fiscal provisões (aí se compreendendo as imparidades – cf. n.º1, ponto 1 do Aviso 3/95, na versão consolidada) constituídas de acordo com o determinado pelo Banco de Portugal na defesa do interesse público contra riscos específicos da actividade das instituições bancárias que lhe cabe acautelar.

O que significa que a sentença não incorreu no erro de julgamento que a Recorrente lhe imputa, merecendo ser confirmada.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo impugnante e revogar a sentença recorrida no segmento em que manteve a liquidação impugnada na parte assente em correcções de custos contabilizados com imparidades em activos financeiros; com imparidades em investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos; referente a imposto retido no estrangeiro (dividendos não EU), julgando a impugnação procedente quanto a essas correcções;
II. Confirmar a sentença recorrida, julgando improcedente a impugnação da liquidação na parte assente em correcções de imparidades associadas à Corticeira ..., I... e C..., SGPS; relativas a provisão para crédito vencido e a benefícios fiscais – majoração de donativos;
III. Negar provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública.

Fica prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário do impugnante de ampliação do âmbito do recurso.

Custas na proporção do decaimento em ambas as instâncias, sem redução do excesso, atenta a complexidade da causa.

Porto, 12 de Fevereiro de 2015
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro