Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03164/16.8BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/30/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA; RENOVAÇÃO
Sumário:
1 – Nos termos do Artº 85º da Lei dos Estrangeiros vigente não se exige que o cidadão estrangeiro esteja permanente e necessariamente em território Nacional para que seja mantida a sua autorização de residência.
Atentas as razões subjacentes ao cancelamento da autorização de residência, não tendo o aqui Recorrente sido objeto de decisão de afastamento coercivo do território nacional; não tendo prestado declarações falsas ou enganosas, nem apresentado documentos falsos ou falsificados, ou através da utilização de meios fraudulentos, nem tendo cometido atos criminosos graves nem existam indícios de que tencione cometer atos dessa natureza, não há razões que justifiquem a não renovação da autorização de residência anteriormente concedida, em decorrência do facto de no âmbito da sua relação contratual desportiva, ter sido emprestado a clube estrangeiro.
2 – Por outro lado, o artigo 85º, n.º 2, da Lei dos Estrangeiros é lapidar quando afirma que a autorização de residência apenas pode ser cancelada quando o interessado “sem razões atendíveis” se ausente do país.
3 – Não estando preenchidos os pressupostos para o cancelamento da autorização de residência (Artº 88º nº 2 da Lei nº 23/2007 – com as suas sucessivas alterações), por idêntica razão, não se vislumbram razões que obstem à sua renovação, pois que a ausência do território nacional resultou manifestamente de “razões atendíveis”, consequentes do cumprimento do seu contrato de natureza desportiva com clube português.
4 – Acresce que, tendo a sua mulher e filho, em resultado da sua relação de trabalho desportivo, vindo residir autorizadamente para Portugal, em habitação entretanto adquirida, mal se compreenderia que findo o empréstimo a clube estrangeiro, não pudesse o cidadão juntar-se à sua família, que aqui se fixou, exatamente em decorrência do seu contrato de trabalho desportivo, em face do deverá o SEF conceder-lhe a renovação da autorização de residência enquanto se mantiverem válidos os pressupostos que justificaram a originária concessão. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:AB
Recorrido 1:MAI/Serviço de Estrangeiros e Fronteiras - SEF
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a decisão recorrida
Julgar a acção procedente
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer pronunciando-se no sentido de dever "ser negado provimento ao recurso".
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
AB, no âmbito da Ação Administrativa intentada contra o MAI/Serviço de Estrangeiros e Fronteiras - SEF, tendente a impugnar Despacho da Direção Regional do Norte do SEF de 26/09/2016 que indeferiu o seu pedido de renovação da autorização de residência, inconformado com a Sentença proferida em 21 de junho de 2017, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, através da qual foi julgada “totalmente improcedente” a ação, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão.
Formulou o aqui Recorrente nas suas alegações de recurso, apresentadas em 28 de setembro de 2017, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 134v a 138 Procº físico).
O recorrente não se conforma com a sentença proferida, porquanto o Tribunal recorrido fez errada decisão e incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
O Recorrente não aceita, nem se conforma, que o tribunal tenha julgado irrelevante o pedido formulado pelo A. de declaração de nulidade do ato que indeferiu o pedido de renovação de autorização de residência, pois a par do pedido de declaração do deferimento tácito, e de condenação à prática do ato devido, o A. sustentou ilegalidades do ato impugnado – Despacho da Direção proferido pelo Exmª. Senhora Diretora Regional do Norte, com data de 2016/09/26, Referência Informação de Serviço n.º 55/2016/URAJ – designadamente a Nulidade do ato por se encontrarem preenchidos os pressupostos referentes às alínea a), b), c) e d), do n.º 2 do artigo 78º da Lei dos Estrangeiros, sendo que o ato impugnado ofenderia, como ofende, os artigos 78º, n.º 2, 85º, n.º 2, 88º, 98º, n.º 1 e 2, 120º e 123º, todos da Lei dos Estrangeiros, o art.º 2º da Portaria 1563/2007 de 11/12, e ainda os artigos 15º, n.º 1, 36º, 44º, 58º, 62º, 65º e 67º, todos da Constituição da República Portuguesa, o que determinaria a sua nulidade relativa – artigo 163º e ss. do CPA.
Não pode assim concordar o recorrente que o objeto da presente ação seja apenas a pretensão e não o ato de indeferimento que lhe está subjacente, até porque a validade do ato de indeferimento seria, como é, importante para averiguar da sua suscetibilidade para revogar o ato tácito entretanto formado.
Pelo que violou o Tribunal recorrido a correta interpretação e aplicação das alínea a), b), c) e d), do n.º 2 do artigo 78º da Lei dos Estrangeiros, dos artigos 78º, n.º 2, 85º, n.º 2, 88º, 98º, n.º 1 e 2, 120º e 123º, todos da Lei dos Estrangeiros, o art.º 2º da Portaria 1563/2007 de 11/12, e ainda os artigos 15º, n.º 1, 36º, 44º, 58º, 62º, 65º e 67º, todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda os artigos 163º e 71º do CPTA e 555º do CPC. Sem prescindir,
O recorrente também não concorda com o julgamento que foi feito relativamente à questão do deferimento tácito do ato administrativo.
Como consta dos autos e da factualidade dada como provada, o recorrente solicitou, em 17 de Novembro de 2015, a renovação de autorização da sua residência temporária, ao abrigo do disposto no n,º 2 do artigo 78º da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho, com pedido de reagrupamento familiar com a sua esposa FAD e o seu filho TSB, ambos de nacionalidade senegalesa, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 98º da Lei 23/2007 de 4 de Julho.
O recorrente foi notificado, com data de 15-12-2015, para efeitos de audiência prévia, sobre o seu pedido de renovação. – Cfr. Ponto J) dos Factos Provados
O recorrente exerceu o seu direito de audiência a 14-01-2016, tal como consta do processo Administrativo.
Em 26-09-2016 foi proferido despacho de indeferimento dos pedidos de renovação de autorização de residência e de reagrupamento familiar, sendo que em data não determinada o SEF notificou o Dr. NC deste despacho. – Cfr. Pontos de Facto L) e M), da matéria de Facto dada como provada.
10º Ora, dispõe o artigo 82º, n.º 2 da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho que: “o pedido de renovação de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 60 dias”, e completa o número 3 da citada disposição legal que “na falta de decisão no prazo previsto no número anterior, por causa não imputável ao requerente, o pedido entende-se como deferido, sendo a emissão do título de residência imediata”.
11º Ora, compulsados os autos, verifica-se que de 17-11-2015 a 15-12-2015, passaram 27 dias, e que de 14-01-2016 a 26-09-2016, passaram 252 dias.
12º Face ao exposto, o aludido prazo para o órgão próprio decidir, de 60 dias, já há muito que havia passado quando foi emitido o ato de indeferimento em 26-09-2016!
13º Pelo que, e é pacifica esta questão, ocorreu o deferimento tácito dos pedidos, ao abrigo do disposto nos artigos 82º, números 2 e 3 da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho, e ao abrigo do disposto no artigo 130º, n.º 1 do CPA, tendo sido formado um ato administrativo de concessão da renovação da autorização de residência do A., com concessão do direito de reagrupamento familiar.
14º E esse ato, tacitamente deferido, manteve-se, como se mantém, válido e eficaz, pois, como se sabe, o valor do silêncio da Administração Pública é o do deferimento tácito.
15º De acordo com a recente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA), o “ato tácito” no direito administrativo traduz-se em poder interpretar-se para certos efeitos e em certas circunstâncias previstas na lei a passividade ou o silêncio de um órgão administrativo como significando o deferimento ou indeferimento de uma pretensão formulada pelo interessado, quando a Administração tem a obrigação de se pronunciar, com vista a proteger o interessado contra uma tal passividade (STA, acórdão de 11.01.2005, processo nº 0560/04 e acórdão de 14.03.2006, processo nº 0762/05, ambos inwww.dgsi.pt).
16º O próprio R. confessou que não emitiu a decisão no prazo de 30 dias e confessou que ocorreu o deferimento tácito.
17º E havendo deferimento tácito não há que praticar mais nenhum ato de deferimento expresso, pois o deferimento tácito vale por si só, é um ato administrativo tout court.
18º E esse deferimento tácito mantém em vigor, pois a decisão proferida a 26/09/2016, no sentido do indeferimento do pedido, constitui um ato que nem sequer assumiu expressamente a revogação daquele deferimento tácito!
19º E de facto, no ato de indeferimento praticado a 26-09-2016 não consta qualquer esclarecimento quanto ao que determinaria a revogação do ato tácito, i.e. nada é dito quanto à formação de ato tácito e quanto à motivação da sua revogação!
20º Não podia o Tribunal a quo substituir-se à entidade administrativa e vir aferir qual o conteúdo do ato revogatório do deferimento tácito, quando, aliás, nem aprecia as nulidades arguidas pelo recorrente.
21º No máximo, o Tribunal a quo poderia sugerir que o R. repetisse o procedimento revogatório, pois que não fez de forma adequada, nem expressa, e não vir dizer que o R. revogou expressamente o ato tácito entretanto formado quando do conteúdo do ato de indeferimento não consta qualquer revogação expressão ao deferimento tácito!
22º Nem o ato de indeferimento é suscetível de revogar o ato tácito formado.
23º Ademais, no momento do deferimento tácito do pedido de renovação da autorização de residência a Administração praticou um ato válido, em consequência de imposição legal, pelo que tal ato não poderá jamais ser revogado ou cancelado – Cfr. artigo 167º, n.º 1, do Novo CPA.
24º Cumulativamente, e sem prescindir, é igualmente irrevogável o ato produzido, pois são irrevogáveis os atos administrativos válidos e constitutivos de direitos e interesses legalmente protegidos, por força do artigo 167º, n.º 1, do Novo CPA.
25º De facto, a concessão da renovação da autorização de residência, atenta a definitividade do ato administrativo, atribuiu ao impugnante um direito subjetivo novo.
26º Um direito que se conformou na ordem jurídica, cuja irrevogabilidade apenas poderia resultar da aplicação do artigo 167º, n.º 2, do Novo CPA, o que não se verifica in casu.
27º E, sem prescindir, mesmo que se admita que o ato de deferimento tácito pode ser revogado, o que não se concebe nem concede, e apenas por mera hipótese académica se alude, então deveria a Administração ter proferido ato revogatório expresso subsequente daquele ato tácito definitivamente consolidado na ordem jurídica e dentro do prazo do respetivo recurso contencioso.
28º E neste sentido já se pronunciou a jurisprudência, no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 18-06-2013, Processo N.º 351/11.9TBGMR-B.G1: “Mas a revogação dos atos administrativos, ainda que tácitos, só pode ocorrer dentro do prazo do respetivo recurso contencioso, sendo que tal prazo geral de recurso é de três meses”.
29º A Administração nunca veio revogar expressamente o ato tácito formado e consolidado na ordem jurídica, e mesmo que viesse, não o poderia fazer, face à irrevogabilidade dos atos administrativos constitutivos de direitos, e tal como supra exposto.
30º Face ao exposto, porque o aludido prazo para o órgão próprio decidir, de 30 dias, já há muito que sobreveio, ocorreu o deferimento tácito dos pedidos, ao abrigo do disposto nos artigos 82º, números 2 e 3 da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho, e ao abrigo do disposto no artigo 130º, n.º 1 do CPA, tendo sido formado um ato administrativo de concessão da renovação da autorização de residência do A., com concessão do direito de reagrupamento familiar, mantendo-se este ato, tacitamente deferido, válido e eficaz.
31º Neste conspecto, procedeu o Tribunal a quo a uma incorreta interpretação e aplicação dos artigos 82º, n.º 2 e 3 da Lei dos Estrangeiros e 130º, n.º 1, 167º, n.º 1 e n.º 2, todos do CPA. Sem prescindir,
32º O Tribunal a quo fez ainda incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto no que à pretensão material do recorrente diz respeito.
33º Como consta da matéria de facto, o recorrente possui Contrato de Trabalho com a F.C.P. SAD, e no ano de 2016 o recorrente teve remunerações pagas por esta sua entidade patronal, o recorrente permanece ainda em Portugal, pois vem cá regularmente, e o recorrente é proprietário de uma habitação sita em Leça da Palmeira, em Portugal.
34º Para a concessão da autorização, ou renovação, da autorização de residência não é necessário que haja uma permanência efetiva diária na morada apresentada, tendo até em conta a mobilidade do trabalhador.
35º Ademais, as remunerações pagas pela FCP SAD, no ano de 2015 e 2016, são devidamente tributadas em Portugal, em sede de IRS, sendo ainda alvo dos legais descontos para a S.S.
36º Aliás, não se percebe como pode o Tribunal a quo dizer que o recorrente não provou ter os meios de subsistência adequados, quando por via do Contrato de Trabalho, o recorrente aufere cerca de 40.000,00 € por mês, e quando o próprio Tribunal dá como provado que, por transação, o FCP se obrigou a pagar a quantia de 131.400,00 € emergente de créditos laborais devidos, sendo que esses créditos laborais são referentes aos anos de 2015 e 2016 e não 2017!
37º Basta uma retribuição mensal auferida pelo recorrente para se provar que o recorrente possui meios de subsistência superiores à média nacional.
38º O Tribunal recorrido violou, por erro de interpretação e aplicação, as alínea a), b), c) e d), do n.º 2 do artigo 78º da Lei dos Estrangeiros, e o artigo 85º da Lei dos Estrangeiros, com as alterações produzidas pela lei n.º 102/2017. Sem prescindir,
39º O Tribunal a quo também procede a uma incorreta interpretação e aplicação da lei quando diz que a alegada “residência do A. em território português” configura um “absurdo físico” em face dos contornos dos contratos de trabalho desportivos celebrados com os clubes estrangeiros.
40º Mesmo o recorrente não sendo omnipresente, hoje a lei não exige que o cidadão estrangeiro esteja permanentemente em TN para manter a residência.
41º E como se viu, o aqui recorrente possui passaporte válido, e vistos válidos, tendo sempre entrado e saído legalmente em Portugal.
42º Acresce que o artigo 85º, n.º 2, da Lei dos Estrangeiros diz que a autorização de residência apenas pode ser cancelada quando o interessado “sem razões atendíveis” se ausente do país.
43º Ora, as temporárias ausências do recorrente são justificadas com razões atendíveis.
44º É que, como foi alegado, o recorrente encontra-se apenas por algumas temporadas fora do território nacional, mas sempre no cumprimento das instruções da sua entidade patronal, pois pretendia a FCP SAD desenvolver as capacidades profissionais e desportivas do recorrente, valorizando-o, visando aliás a sua reintegração no plantel do FCP.
45º Não ignora a própria lei dos estrangeiros a possibilidade de haver motivos relevantes justificativos das ausências temporárias dos jogadores profissionais de futebol.
46º E daí que, diferentemente do que acontece com as situações previstas no n.º 1, do artigo 85º. verificadas as quais a autorização "é cancelada", nas situações previstas no n.º 2 a autorização "pode igualmente ser cancelada" mas apenas se não existirem “razões atendíveis”.
47º Com efeito, são razões atendíveis todas aquelas que, numa avaliação por padrões de razoabilidade, não indiciem um propósito de mudança de residência para outro país e que radiquem em razões válidas de índole familiar, pessoal ou profissional.
48º E nos termos da nova Lei não é cancelada a autorização de residência aos cidadãos que estejam ausentes por períodos superiores aos previstos no n.º 2, quando comprovem que durante a sua ausência do território nacional desenvolveram atividade profissional ou empresarial ou de natureza cultura ou social.
49º E o recorrente teve sempre a desenvolver atividade profissional também por conta e ordem da sua entidade patronal em Portugal, pois o recorrente apresentou um contrato de trabalho com a SAD do FCP até 2018, e provou que tem habitação própria em Portugal, sendo proprietário da mesma, e onde se mantêm a viver com a sua esposa e com o seu filho.
50º Face ao exposto, o tribunal recorrido ofendeu os artigos 78º, n.º 2, 85º, n.º 2, 88º, 98º, n.º 1 e 2, 120º e 123º, todos da Lei dos Estrangeiros com as alterações legais entretanto produzidas, e ainda os art.º 2º da Portaria 1563/2007 de 11/12, e ainda os artigos 15º, n.º 1, 36º, 44º, 58º, 62º, 65º e 67º, todos da Constituição da República Portuguesa.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, com a revogação da sentença proferida, substituindo-a por outra que acolha a alegação e conclusões supra expostas, com as legais consequências, assim se fazendo Justiça.

O aqui Recorrido/MAI-SEF veio apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 15 de novembro de 2017, sem que tenha apresentado conclusões (Cfr. fls. 144 a 151 Procº físico).
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O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido, por Despacho de 29 de novembro de 2017 (Cfr. Fls. 158 Procº físico).
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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 4 de janeiro de 2018 (Cfr. Fls. 165 Procº físico), veio a emitir Parecer em 11 de janeiro de 2018, pronunciando-se no sentido de dever “ser negado provimento ao recurso” (Cfr. Fls. 166 a 169 Procº físico).
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Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, assentando no alegado deferimento tácito do pedido de renovação da autorização de residência e numa suposta deficiente interpretação da “Lei dos Estrangeiros”

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada:
A) O Autor é cidadão estrangeiro, de nacionalidade senegalesa;
B) Tendo entrado em território nacional, beneficiou do direito de residência, sem interrupções, de 19.08.2010 a 19.08.2015;
C) Em 12 de fevereiro de 2014, celebrou com o FCP um contrato individual de trabalho com vista à prestação da atividade de futebolista do clube;
D) Ao referido contrato, com início em 01.02.2014, foi aposto o termo em 30.06.2018;
E) Na vigência do referido contrato, o Autor efetuou jogos pelo FCP, tendo depois sido cedido a título de empréstimo ao RV [Espanha], na época desportiva de 2014/2015, ao FB [Turquia], na época desportiva 2015/2016;
F) Em 3 de fevereiro de 2015, o A. adquiriu, por escritura de Compra e Venda, a fração autónoma designada pelas letras "FL" correspondente ao terceiro andar esquerdo, habitação 3.05, entrada E, com entrada pela Rua C…, e na cave menos um, lugar de estacionamento n.º 51 e compartimento de arrumos n.º 132;
G) Nessa habitação residem a esposa do Autor e o seu filho;
H) Em 17.11.2015, o A. apresentou nos serviços do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras [SEF, em diante], um pedido de renovação da autorização de residência de que era titular, com pedido de reagrupamento familiar com a sua esposa FAD e o seu filho TSB;
I) Para tal, fez instruir o seu requerimento de, entre outros documentos, com cópia dos contratos de trabalho desportivo celebrados com o RV, válido até 30 de junho de 2015, com o FB, válido até 30 de junho de 2016, e com o FCP, válido até 30.06.2018;
J) A 15.12.2015, o Autor foi notificado do projeto de indeferimento do pedido de renovação de autorização de residência, na sequência do que exerceu o seu direito de contraditório;
K) Em 13.09.2016, os serviços do Réu emitiram a informação de serviço nº. 55/2016/URAJ, propondo o indeferimento final dos pedidos formulados pelo Autor, em virtude de “(…) resultar inequívoco que o mesmo fixou residência fora de Portugal em agosto de 2014, primeiro no reino de Espanha, em Madrid, e depois, e desde julho de 2015, e até pelo menos até maio de 2017, na república da Turquia, não exercendo em Portugal qualquer atividade passível de enquadrar o pedido de renovação do título de residência de que dispunha, incumprindo com os requisito legais constantes do nº.2 do artigo 78º da Lei nº. 23/2007, de 04 de julho, em articulação com o disposto na alínea a) do nº. 2 do artigo 85º (…). Em conformidade, verifica-se também a manutenção do não cumprimento de pressupostos que informam o direito a reagrupar, em território nacional, a sua esposa e filho (…)”;
L) No dia 26.09.2016, foi proferido pela Diretora Regional do Norte do S.E.F. despacho concordante com a informação referida em K), consequentemente, indeferindo-se as pretensões do Autor [ato impugnado];
M) Em data não determinada, o SEF notificou o Dr. NC do despacho referido L);
N) Em 05.12.2016, o juiz titular do processo registado sob o nº. 22506/16.0 na instância Central do Tribunal da Comarca do Porto homologou a transação cuja cópia faz fls., 58 e seguintes dos autos [suporte físico], nos termos do qual, para o que ora nos interessa, o FCP obrigou-se a pagar até 31.01.2017 ao Autor a quantia de € 131,400,00 emergente de créditos laborais devidos.
O) Dá-se por reproduzido todo o teor dos documentos que integram os autos [inclusive o PA apenso].

IV – Do Direito
Peticionou originariamente o aqui Recorrente que “seja dado provimento ao presente meio processual por formar a ser declarado a ocorrência de deferimento tácito do pedido de renovação de autorização de residência do Autor, ou quando assim não se entenda, por forma a ser declarada a nulidade do despacho da Diretora Regional do Norte do SEF, datado de 29.09.2016, que indeferiu o pedido de renovação de residência formulado pelo Autor, bem como por forma a ser o Réu condenado na prático do ato administrativo devido de concessão da renovação da autorização de residência do Autor emitido em 08.08.2013, com atribuição do direito de reagrupamento familiar a FAD e TSB,”
Correspondentemente, o Tribunal a quo decidiu “a presente ação totalmente improcedente
Pela necessidade de ponderar o entendimento adotado pelo tribunal a quo, e por forma a permitir uma mais eficaz visualização do mesmo, infra se transcreverá o essencial do discurso fundamentador da decisão proferida em 1ª instância:
“(...) Ora, tratando-se de ato administrativo de conteúdo negativo que rejeita e denega a pretensão formulada pelo A. de renovação da autorização de residência, importa convocar o disposto nos art.ºs 66.º, n.º 2, e 71.º, n.º 1, ambos do CPTA, que determinam que “o objeto do processo é a pretensão do interessado e não o ato de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta diretamente da pronúncia condenatória”, sendo, por isso, irrelevantes os vícios imputados ao ato de indeferimento, pelo que ao Tribunal não compete apreciá-los com vista a eventual anulação ou declaração de nulidade do ato, sendo que a eliminação desses atos da ordem jurídica decorre da pronúncia condenatória de prática do ato devido.
(...)
Posto isto, julga-se irrelevante o pedido formulado pelo Autor de declaração de nulidade do ato que indeferiu o pedido de renovação de autorização de residência, passando a apreciar-se, de imediato, a pretensão formulada pelo Autor que corresponde à segunda questão decidenda, qual seja, a de saber se assiste ao Autor o direito a ver deferido o pedido de renovação da autorização de residência por si formulado, em virtude deste se encontrar tacitamente deferido, ou, alternativamente, por se mostrarem verificados os requisitos exigidos pela Lei n.º 23/2007, de 04/07, para a concessão de renovação de autorização de residência.
A este propósito, o Autor começa por alegar que o S.E.F. estava a obrigado a proferir decisão no prazo de um mês, o que não sucedeu, pelo que o pedido renovação da autorização de residência por si formulado deve considerar-se tacitamente deferido
Vejamos então.
Da matéria de facto assente resulta demonstrado que, em 17.11.2015, o Autor apresentou um pedido de renovação de autorização de residência com atribuição do direito de reagrupamento familiar a FAD e TSB.
Mais se apurou que, em 26.09.2016, o Réu veio a indeferir as suas pretensões, através de despacho da Diretora Regional do Norte do S.E.F.
De acordo com o preceituado no artigo 82º da Lei nº. 23/2007, de 4 de julho, [são deste normativo legal todos aos artigos referidos sem menção da Lei de origem]: “2 - O pedido de renovação de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 30 dias.”, sendo que “(...) Na falta de decisão no prazo previsto no número anterior, por causa não imputável ao requerente, o pedido entende-se como deferido, sendo a emissão do título de residência imediata” [cfr. nº. 3]
Do exposto resulta, pois, que quando foi proferida a decisão final de indeferimento expresso da pretensão deduzida pelo Autor já se havia formado ato tácito de deferimento da sua pretensão, uma vez que, até 12.01.2016 [30 dias úteis contados nos termos do artigo 72º do C.P.A.] não fora proferida nenhuma decisão expressa final sobre a sua pretensão.
Tal ocorrência mostra-se, aliás, expressamente reconhecida pelo Réu.
Sendo assim, tendo ocorrido uma situação de deferimento tácito, importa agora apurar se a decisão expressa de indeferimento é suscetível de revogar e de prevalecer sobre o deferimento tácito. Está-se em crer convictamente que sim.
Na verdade, o regime consagrado na Lei nº. 23/2007, de 04.07, introduz regras especiais face ao regime geral consagrado no Código de Procedimento Administrativo, porquanto neste se fixou, como regime regra, um prazo para prolação de decisão do procedimento administrativo de 90 dias e a presunção de incumprimento do dever de decisão caso não tenha sido proferida decisão naquele prazo [cfr. arts. 128.º e seguintes do CPA].
Todavia, da consagração pelo legislador na Lei nº. 23/2007, de 04.07, de um regime especial não resulta o afastamento das demais regras que disciplinam o procedimento administrativo em presença, mormente, as regras que preveem a possibilidade de prolação de ato expresso de indeferimento por parte da entidade administrativa sobre a pretensão formulada pelo interessado, revogando ou anulando, consoante o fundamento invocado, o deferimento tácito [cfr. arts. 165º e seguintes do CPA].
Neste domínio, esclareça-se que, com a entrada em vigor do novo C.P.A., aprovado pelo DL n.º 4/2015, de 07 de janeiro, foram introduzidas alterações ao regime de revogação dos atos administrativos anteriormente fixado no DL n.º 442/91, de 15 de novembro, sendo agora possível revogar atos administrativos [com fundamento em mérito, conveniente e oportunidade], ou anular os mesmos [com fundamento na sua invalidade], tudo nos termos e com o alcance que derivam dos artigos 165º e seguintes do CPA.
É certo que a formação de ato tácito de deferimento concederia ao Autor o direito que a aqui reclama, mas a prolação do ato expresso de que o mesmo impugna fez desaparecer da ordem jurídica o mencionado ato tácito.
E fê-lo desaparecer porque o ato tácito constitui uma manifestação de vontade presumida.
A lei, em determinadas circunstâncias, manda interpretar para certos efeitos a passividade ou o silêncio de um órgão administrativo como significando o deferimento ou o indeferimento do pedido sobre o qual tinha obrigação de se pronunciar.
Não obstante e, porque assim é, a manifestação expressa da vontade contrária à vontade presumida faz com que deixe de fazer sentido falar em vontade presumida, pelo que existindo vontade real expressa através de um ato administrativo deixa de haver vontade presumida.
Contudo a prolação de ato expresso não significa por si só que este seja legal e que, portanto, o ato tácito esteja definitivamente arredado da ordem jurídica.
Na verdade, a revogação ou a anulação dos atos administrativos, ainda que estes sejam tácitos, está sujeita à disciplina decorrente dos arts. 165.º e segs. do CPA supra enunciados, pelo que essa revogação ou anulação administrativa pode ser contenciosamente impugnada e desta impugnação pode resultar decisão judicial que anule o ato expresso revogatório ou anulatório, o que implicaria a repristinação do ato tácito.
Nessa medida, o ato revogatório ou anulatório só se consolida na ordem jurídica se não for judicialmente impugnado ou se, sendo-o, essa impugnação não tiver êxito.
Assim sendo, nada obsta a que o deferimento tácito seja oportunamente anulado administrativamente, nos precisos termos em que é permitida a anulação administrativa de qualquer outro ato administrativo constitutivo de direitos, ou seja, no prazo de um ano e com fundamento na sua invalidade [artigo 168º, nº. 2 do CPA].
No caso vertente, a anulação administrativa do ato tácito de deferimento ocorreu antes de ter decorrido um ano a contar da formação deste, e sendo o seu fundamento a constatação de que o Autor fixou “(…) residência fora de Portugal em agosto de 2014, primeiro no reino de Espanha, em Madrid, e depois, e desde julho de 2015, e até pelo menos até maio de 2017, na república da Turquia, não exercendo em Portugal qualquer atividade passível de enquadrar o pedido de renovação do título de residência de que dispunha, incumprindo com os requisito legais constantes do nº.2 do artigo 78º da Lei nº. 23/2007, de 04 de julho, em articulação com o disposto na alínea a) do nº. 2 do artigo 85º (…)”, desde já se adianta, conforme adiante se verá, que tal ato tácito de deferimento era ilegal.
Consequentemente, por via dessa anulação administrativa, deixou de vigorar na ordem jurídica o deferimento tácito em que o Autor fundava a sua pretensão, pelo que não se pode acompanhar a alegação do mesmo quanto à existência do invocado deferimento tácito.
Ultrapassada que está a questão da existência de um eventual ato de deferimento tácito do pedido de renovação da autorização de residência visado nos autos, importa agora apurar se se mostram verificados os requisitos exigidos pela Lei n.º 23/2007, de 04/07, para a concessão de renovação de autorização de residência, e, consequentemente, se assiste o direito ao Autor a obter a condenação do Réu na prática do ato administrativo devido de concessão da renovação da autorização de residência do Autor, com atribuição do direito de reagrupamento familiar a FAD e TSB. Vejamos então.
O pedido de renovação de autorização de residência, como vimos supra, foi indeferido em virtude do Autor ter fixado “(…) residência fora de Portugal em agosto de 2014, primeiro no reino de Espanha, em Madrid, e depois, e desde julho de 2015, e até pelo menos até maio de 2017, na república da Turquia, não exercendo em Portugal qualquer atividade passível de enquadrar o pedido de renovação do título de residência de que dispunha, incumprindo com os requisito legais constantes do nº. 2 do artigo 78º da Lei nº. 23/2007, de 04 de julho, em articulação com o disposto na alínea a) do nº. 2 do artigo 85º
(…)
Perscrutados os preceitos em causa, verifica-se que a renovação da autorização de residência temporária depende - nos termos em que importa para o caso vertente - da demonstração, por banda do interessado requerente, para além da residência habitual em solo português, da detenção de meios de subsistência em solo português.
Por esse último motivo, impõe o art.º 63º, n.ºs 1 e 2 do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de novembro, que o pedido de renovação de autorização de residência temporária deve ser acompanhado dos seguintes documentos: a) Passaporte ou outro documento de viagem válido; b) Comprovativo da posse de meios de subsistência, nos termos a definir na portaria a que se refere a alínea d) do n.º 1 do artigo 52.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho; c) Comprovativo de que dispõe de alojamento; d) Requerimento para consulta do registo criminal português pelo SEF [cfr. n.º 1].
Mais dispõe o n.º 2 do dito preceito que tal pedido é, ainda, instruído com informação necessária para verificação do cumprimento das obrigações fiscais e perante a segurança social, obtida nos termos do n.º 9 do artigo 212.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho.
A Portaria n.º 1563/2007, de 11 de dezembro, fixa os meios de subsistência de que devem dispor os cidadãos estrangeiros para a entrada e permanência em território nacional, mormente para efeitos de renovação de títulos de residência.
Assim, para efeitos desta portaria, considera-se “meios de subsistência” os recursos estáveis e regulares que sejam suficientes para as necessidades essenciais do cidadão estrangeiro e, quando seja o caso, da sua família, designadamente para alimentação, alojamento e cuidados de saúde e higiene [cfr. art.º 2.º, n.º 1].
O critério de determinação dos meios de subsistência é efetuado por referência à retribuição mínima mensal garantida nos termos do n.º 1 do artigo 266.º do Código do Trabalho, atenta a respetiva natureza e regularidade, líquida de quotizações para a segurança social [cfr. artigo 2.º, n.º 2 da citada portaria].
Em conformidade com o estatuído no art.º 5º da mesma Portaria, o requerente da renovação do título de residência deve demonstrar que dispõe dos citados meios de subsistência, especificamente através da apresentação de contrato de trabalho, promessa de contrato de trabalho, ou de contrato ou proposta escrita de contrato de prestação de serviços.
Finalmente, nos termos do artigo 7.º, n.º 1 da Portaria n.º 1563/2007, de 11 de dezembro, para efeitos de concessão ou renovação de autorização de residência temporária o requerente deve comprovar que mantém a disponibilidade ou a possibilidade de adquirir legalmente os referidos meios de subsistência.
Delineado o acervo normativo pertinente para dissolver o litígio posto, impõe-se examinar o caso concreto.
Neste contexto, releva salientar que o A. apresentou o pedido de renovação de autorização de residência em 26.09.2011, sendo que a anterior autorização de residência manteve-se válida até 19.08.2015.
O pedido de renovação de autorização de residência formulado pelo A. foi instruído com cópia dos contratos de trabalho desportivo celebrados com o RV, válido até 30 de junho de 2015, com o FB, válido até 30 de junho de 2016, e com o FCP, válido até 30.06.2018.
E do exame de tais elementos, retira-se claramente que, não obstante o vínculo contratual com o FCP válido até 30.06.2018, a remuneração dos contratos desportivos celebrados com clubes estrangeiros constituía obrigação desses mesmos clubes.
Retira-se ainda que, não obstante a titularidade de um imóvel adquirido na zona de Leça da Palmeira, a concretização dos referidos contratos de trabalho desportivos com clubes estrangeiros pressupõe a fixação de residência do Autor nesses mesmos países.
Ora, do cotejo dos elementos referenciados resulta, claramente, que, à data de formulação da pretensão em análise, o autor não dispunha de qualquer meio de subsistência proveniente de trabalho realizado em solo português.
É certo que ressalta dos autos a existência de um acordo de pagamento de créditos laborais em atraso, no valor de € 131, 400,00, por parte do FCP [cfr. 58 e seguintes dos autos físicos]. Todavia, essa quantia era pagável até 31.01.2017.
Neste domínio, desconhece-se [porque nem sequer foi alegado] quando foi efetivamente paga tal quantia.
Seja como for, o quadro fático supra emergente de tal acordo de pagamento nunca poderia ser levado em linha de consideração no âmbito do procedimento administrativo visado nos autos, por ser inexistente à data de prolação do ato impugnado.
Adicionalmente, é de ressaltar que, quanto ao ano de 2015, o A. não apresenta qualquer elemento capaz de demonstrar, sequer, que o mesmo auferiu algum tipo de remuneração ou angariou algum tipo de rendimento proveniente de trabalho realizado em solo português, pelo que, sendo que o ónus de alegação e prova a ele compete [cfr. art.º 342.º do Código Civil], se terá que concluir pela não verificação desta realidade.
Sendo assim, falece a posição do A. na demonstração de posse de meios de subsistência relevantes no período relevante para apreciação da sua pretensão.
Sendo os requisitos que derivam do disposto no nº.2 do artigo 78º do CPTA de natureza cumulativa, basta um para a pretensão do Autor não possa ser julgada procedente.
No entanto, sempre se dirá algo sobre a alegada “residência do Autor em território português”, que, em face dos contornos dos contratos de trabalho desportivos celebrados com os clubes estrangeiros, configura um absurdo físico.
Como vimos supra, a concretização dos referidos contratos de trabalho desportivos com clubes estrangeiros [Espanha e Turquia] assentava no pressuposto da fixação de residência do Autor nesses mesmos países.
Ora, não sendo o Autor omnipresente, era-lhe fisicamente impossível residir num daqueles Países e simultaneamente em Portugal.
Destarte, resta concluir que o A. não possuía residência em solo português no período em que se encontrou cedido aos clubes estrangeiros melhor descritos na alínea E) do probatório coligido nos autos, o que conduz à constatação, em bom rigor, nem no momento em que apresentou o pedido de renovação de autorização de permanência [17.11.2015], nem no momento em que o R. proferiu o ato de indeferimento [26.09.2016], o A. não demonstrou preencher o requisito plasmado no art.º 85, nº. 2, alínea a) da Lei dos Estrangeiros.
Pelo que o invocado ato de indeferimento proferido em 26.09.2016 não padece de qualquer ilegalidade, seja a título de violação de lei, seja a título de erro nos pressupostos.
Assim sendo, isto é, sendo válido o ato de indeferimento impugnado nos autos, então por maioria de razão não se mostram reunidos exigidos no artigo 98º da Lei 23/2007, de 04.07, necessários ao direito ao reagrupamento familiar, por falta de autorização de residência válida por parte do Autor.
Por tudo o exposto, mostra-se improcedente a pretensão do A. de reconhecimento de deferimento expresso ou tácito do seu pedido de renovação de autorização de residência, bem como igualmente improcedente a condenação do R. a renovar ao A. a autorização de residência requerida, com atribuição do direito de reagrupamento familiar a FAD e TSB.”
Vejamos:
Há desde logo um conjunto de pressupostos que não podem ser ignorados, a saber; o facto do aqui Recorrente, ter adquirido casa em Portugal, onde reside a sua mulher e o seu filho; ter um contrato de trabalho com a SAD do FCP; e só não estar a exercer a sua atividade profissional em solo nacional, em virtude de ter sido “emprestado” pela sua entidade patronal, a clubes estrangeiros
1 – A primeira questão suscitada pelo Recorrente, prende-se com a revogação expressa do ato de deferimento tácito.
Neste particular acompanha-se o entendimento adotado pelo tribunal a quo, pelo que, no essencial, para aí se remete, em função do já precedentemente transcrito.
Em qualquer caso, refira-se que no âmbito da reforma do CPA operada em 2015, refere o seu art° 129°, o seguinte:
“A falta, no prazo legal, de decisão final sobre pretensão dirigida a órgão administrativo competente constitui incumprimento do dever de decisão, conferindo ao interessado a possibilidade de utilizar os meios de tutela administrativa e jurisdicional adequados.”
Por outro lado, estabelece o art° 130° do CPA que:
“Existe deferimento tácito quando a lei ou regulamento determine que a ausência de notificação da decisão final sobre pretensão dirigida a órgão competente dentro do prazo legal tem o valor de deferimento”.
Assim, nos termos do novo CPA, a figura do deferimento tácito, com a natureza de verdadeiro ato administrativo passa a ocorrer apenas quando lei especial ou regulamento o determine expressamente (n°1 do artigo 130°) ou quando esteja em causa a prática de atos autorizativos na relação entre órgãos administrativos (n°4).
É certo que quando foi proferida a decisão final de indeferimento expresso da pretensão deduzida pelo recorrente já se havia formado ato tácito de deferimento da sua pretensão, uma vez que, até 12.01.2016 [30 dias úteis contados nos termos do artigo 72° do CPA] não fora proferida nenhuma decisão expressa final sobre a sua pretensão.
Em qualquer caso, a prolação do ato expresso em sentido divergente, fez desaparecer da ordem jurídica o mencionado ato tácito.
Efetivamente, a revogação ou a anulação dos atos administrativos, ainda que estes sejam tácitos, está sujeita à disciplina decorrente dos arts. 165.° e segs. do CPA, pelo que essa revogação ou anulação administrativa pode ser contenciosamente impugnada e desta impugnação pode resultar decisão judicial que anule o ato expresso revogatório ou anulatório, o que implicaria a repristinação do ato tácito.
No entanto, nada obsta a que o deferimento tácito seja anulado, nos precisos termos em que é permitida a anulação administrativa de qualquer outro ato constitutivo de direitos, no prazo de um ano e com fundamento na sua invalidade [artigo 168°, n°. 2 do CPA].
No caso em apreço, a anulação do ato tácito de deferimento ocorreu antes de ter decorrido um ano a contar da formação deste, sendo o seu fundamento o entendimento de que o recorrente fixou residência fora de Portugal em Agosto de 2014.
A anulação, em regra, tem efeitos ex tunc, destruindo os efeitos do ato desde o momento da sua prática (n.ºs 1 e 2 do artigo 165° e n.ºs 1 e 3 do art° 171° do CPA).
Deste modo, por força dessa anulação administrativa, deixou de vigorar na ordem jurídica o deferimento tácito em que o recorrente fundava a sua pretensão.
2 – Importa agora verificar se o Recorrente preenche os requisitos para que lhe possa ser deferida a renovação da autorização de residência.
Refere-se desde logo no artigo 85º da Lei dos Estrangeiros o seguinte:
“1 - A autorização de residência é cancelada sempre que:
a) O seu titular tenha sido objeto de uma decisão de afastamento coercivo ou de uma decisão de expulsão judicial do território nacional; ou
b) A autorização de residência tenha sido concedida com base em declarações falsas ou enganosas, documentos falsos ou falsificados, ou através da utilização de meios fraudulentos; ou
c) Em relação ao seu titular existam razões sérias para crer que cometeu atos criminosos graves ou existam indícios reais de que tenciona cometer atos dessa natureza, designadamente no território da União Europeia; ou
d) Por razões de ordem ou segurança públicas.
2 - Sem prejuízo da aplicação de disposições especiais, a autorização de residência pode igualmente ser cancelada quando o interessado, sem razões atendíveis, se ausente do País:
a) Sendo titular de uma autorização de residência temporária, seis meses consecutivos ou oito meses interpolados, no período total de validade da autorização;
b) Sendo titular de uma autorização de residência permanente, 24 meses seguidos ou, num período de três anos, 30 meses interpolados.
3 - A ausência para além dos limites previstos no número anterior deve ser justificada mediante pedido apresentado no SEF antes da saída do residente do território nacional ou, em casos excecionais, após a sua saída.
4 - Não é cancelada a autorização de residência aos cidadãos que estejam ausentes por períodos superiores aos previstos no n.º 2, quando comprovem que durante a sua ausência do território nacional desenvolveram atividade profissional ou empresarial ou de natureza cultura ou social.
5 - O cancelamento da autorização de residência deve ser notificado ao interessado e comunicado, por via eletrónica, ao ACIDI, I. P., e ao Conselho Consultivo com indicação dos fundamentos da decisão e implica a apreensão do correspondente título.
6 - É competente para o cancelamento o membro do Governo responsável pela área da administração interna, com a faculdade de delegação no diretor nacional do SEF.
7 - A decisão de cancelamento é suscetível de impugnação judicial, com efeito meramente devolutivo, perante os tribunais administrativos”.
Resulta do referido normativo que a lei não exige que o cidadão estrangeiro esteja permanente e necessariamente em território Nacional para que seja mantida a sua autorização de residência.
Atentas as razões subjacentes ao cancelamento da autorização de residência, é patente que o aqui Recorrente não foi objeto de decisão de afastamento coercivo do território nacional; não prestou declarações falsas ou enganosas, nem apresentou documentos falsos ou falsificados, ou através da utilização de meios fraudulentos, nem foram cometidos atos criminosos graves nem existam indícios de que tencione cometer atos dessa natureza
Acresce que o artigo 85º, n.º 2, da Lei dos Estrangeiros é lapidar quando afirma que a autorização de residência apenas pode ser cancelada quando o interessado “sem razões atendíveis” se ausente do país.
Se não estão preenchidos os pressupostos para o cancelamento da autorização de residência (Artº 88º nº 2 da Lei nº 23/2007 – com as suas sucessivas alterações), por idêntica razão, não se vislumbram razões que obstem à sua renovação, pois que a ausência do território nacional resultou manifestamente de “razões atendíveis”, consequentes do cumprimento do seu contrato com a SAD do FCP.
Por outro lado, e como se disse já, é incontornável que o aqui Recorrente, tem a sua mulher e filho a residir em Portugal, onde possui habitação própria, tendo contrato válido com o FCP até 30 de junho de 2018, só não se encontrando a exercer a sua atividade profissional em Portugal, em decorrência do facto da SAD do FCP, enquanto sua entidade patronal, o ter “emprestado” temporária e sucessivamente a clube espanhol e turco, pelo que a sua ausência de território nacional se mostra justificada.
Acresce ao referido que mal se compreenderia que o Recorrente não pudesse gozar do direito ao reagrupamento familiar, tanto mais que a residência em Portugal da mulher e filho resultou exatamente da sua fixação profissional em Território Nacional.
Poder-se-ia pois verificar a incongruência resultante do facto da mulher e o seu filho terem fixado residência em Portugal, por causa do exercício profissional do Recorrente, para depois, em resultado do facto deste ter, no cumprimento do seu contrato com o FCP, ido desemprenhar funções para países estrangeiros, se ver na contingência de não poder regressar para junto da sua família.
É pois manifesto que, mesmo que se entendesse que o aqui Recorrente não teria direito à renovação da sua autorização de residência, sempre teria direito ao reagrupamento familiar nos termos do artigo 98º da Lei dos Estrangeiros.
Em face de tudo quanto ficou supra expendido, deverá ser anulado o despacho objeto de impugnação da Diretora Regional Norte de 26/09/2016, mais devendo, em função do peticionado, ser o SEF condenado na prática do ato administrativo devido de concessão da autorização de residência do Recorrente, nos termos e para os efeitos dos artigos 78º, n.º 2, 85º, n.º 2, 88º, 98º, n.º 1 e 2, e 120º, da Lei dos Estrangeiros (Lei nº 23/2007 – com as suas sucessivas alterações introduzidas).
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, julgar procedente o Recurso, revogando-se a decisão Recorrida, mais se condenando o SEF na prática do ato concessão da autorização de residência ao Recorrente.
Custas pela Entidade Recorrida.
Porto, 30 de maio de 2018
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco
Ass. Rogério Martins
Ass. Luís Migueis Garcia