Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00215/14.4BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/23/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Paulo Moura
Descritores:PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. DOCUMENTO ESSENCIAL. EXCESSO DE PRONÚNCIA.
NOTIFICAÇÃO DAS LIQUIDAÇÕES NA SEQUÊNCIA DE AÇÃO DE INSPEÇÃO.
Sumário:I - Ocorre excesso de pronúncia se o tribunal conhece questão que, embora inicialmente suscitada pelas partes, tenha ficado resolvida antes da sentença final pelo próprio Tribunal, em recurso interlocutório ou em recurso final que não anule totalmente sentença anterior, quando se tenha decidido que aquela questão concreta ficava resolvida definitivamente no processo em determinado sentido.

II - Já o mesmo não se pode dizer quando haja uma anulação integral de uma primeira sentença proferida no processo, pois que se a sentença é totalmente anulada, o que nela havia sido decidido deixou de figurar na ordem jurídica.

III – Não ocorre violação do princípio do contraditório, se a junção de um documento não é notificado às partes, se o mesmo é manifestamente inócuo para os termos da causa e que nada influencie o mérito da ação.

IV - A notificação das liquidações emitidas na sequência de uma ação de inspeção, não tem que ser notificadas aos mandatários constituídos no procedimento de inspeção.
Recorrente:B., SA
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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B., S.A. recorre da sentença proferida no TAF de Penafiel que julgou totalmente improcedente a impugnação que dirigiu ao despacho de indeferimento proferido no recurso hierárquico interposto na sequência de reclamação graciosa em que visou as liquidações adicionais de IRC de 2010 e 2011 e respetivos juros compensatórios, nos montantes de, respetivamente, €87.257,60 e €158.770,60, no valor global de €246.028,20.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

Termos em que se formulam CONCLUSÕES:
I. Por falta de notificação a Mandatária legalmente constituída não atingiu os contornos e os motivos da liquidação adicional do IRC referente aos anos de 2010 e 2011 da impugnante, sendo, assim, impedida de defesa adequada;
II. Por na sentença de 22.02.2017, em que o tribunal a quo absolveu a Fazenda Pública da instância, ter ficado decidido que a notificação “...das liquidações realizadas apenas à própria impugnante, é ilegal por violação do referido art. 40.º do CPPT, a Impugnante delimitou os poderes de cognição do tribunal ad quem, por força do preceituado nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do CPC, como inelutavelmente se infere da CONCLUSÃO IV, das alegações de recurso apresentadas em 03.04.2017;
III. Por conseguinte, no fundo, o poder do tribunal ficou circunscrito à questão da decidida inimpugnabilidade das liquidações impugnadas – Cfr. CONCLUSÕES V A X – daí “... os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e mandar baixar os autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel para que aí seja julgada a impugnação judicial”;
IV. Nesse sentido, a definitividade da decisão tem efeito preclusivo intraprocessual, impedindo que nele ela seja contraditada ou repetida, também por força do disposto no artigo 625.º do CPC (casos julgados contraditórios);
V. Considerando a natureza jurídica da matéria versada, não poderia o tribunal a quo em nova sentença, sob pena de ficar afetada de nulidade quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento [art.º 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC] sequer contraditar que a notificação “...das liquidações realizadas apenas à própria impugnante, é ilegal por violação do referido art. 40.º do CPPT”, quanto mais, repetindo-a, decidir em sentido contrário;
VI. Por conseguinte, a nova sentença agora sob escrutínio ficou afetada de nulidade ao conhecer de questões de que não podia tomar conhecimento (artº.125, nº.1, do CPPT, no último segmento da norma), por excesso de pronuncia;
VII. Do “facto provado em V)” a Impugnante não foi notificada para exercer o contraditório, até porque este facto dado como provado sofreu uma alteração relativamente à sentença de 22 de fevereiro de 2017, que também insanavelmente infeta a sentença de nulidade;
VIII. “...a interpretação restritiva dada ao art.º 40.º, n.º 1 do Código de Processo e Procedimento Tributário, no sentido de que a constituição de mandatário durante o procedimento de inspecção não impõe que lhe seja notificado o acto de liquidação que se fundamenta na decisão final de tal procedimento enferma, pois, de vício de inconstitucionalidade - tese defendida, mas vencida, pela Exma. Colenda Juíza Conselheira Ana Paula Lobo plasmada no Acórdão do STA proferido em 03-05-2018, no processo n.º 0167/18, totalmente disponível in DGSI.
NESTES TERMOS E NOS MAIS QUE DOUTAMENTE SERÃO SUPRIDOS, DEVE O PRESENTE RECURSO PROCEDER E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A SENTENÇA ORA SOB RECURSO, COMO É DE
DIREITO E JUSTIÇA.

A Fazenda Pública não contra-alegou.

O Mmº Juiz proferiu despacho de sustentação da Sentença, defendendo que a mesma não incorre em qualquer nulidade.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se: (1) a sentença padece de nulidade por alegadamente conhecer questão que não devia; (2) se ocorre violação do princípio do contraditório em relação à junção de um documento, alegadamente essencial para o conhecimento da causa; e (3) se as liquidações podiam ter sido notificadas apenas ao contribuinte ou se também deviam ter sido notificadas aos mandatários.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:

3 – Fundamentação.
3.1 – De facto.
Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga provado:

A) As liquidações impugnadas tiveram origem no relatório de inspeção tributária que resultou da ordem de serviço n.º OI201202299 (fls. 14 e seguintes do PA).
B) Esta ordem de serviço teve origem no procedimento de inspeção credenciado pela ordem de serviço n.º OI201201386 (fls. 16 verso do PA).
C) Na sequência da ordem de serviço referida em B), a impugnante foi sujeita a um procedimento de inspeção relativo ao ano de 2008, credenciado pela ordem de serviço n.º OI201201809, no qual constitui como suas Ilustres mandatárias, as Ilustres Mandatárias ora constituídas neste processo de impugnação judicial (fls. 57 verso do PA, 33 e 74 e seguintes dos autos).
D) Em 14/9/2012 foi enviada à própria impugnante a carta-aviso e respetivo folheto anexo que foi rececionada em 17/9/2012 (fls. 16 verso e 47 do PA).
E) O procedimento de inspeção da ordem de serviço referida em A), iniciou-se em 8/11/2012, com a assinatura da ordem de serviço por Maria Alexandrina Fernandes, técnica oficial de contas da impugnante (fls. 16 e 49 do PA).
F) O âmbito dessa ação inspetiva foi alargado tendo sido notificada a própria impugnante, em 25/2/2013, no seu presidente do conselho de administração (fls. 16 e 49 do PA).
G) A impugnante foi notificada da prorrogação do prazo do procedimento de inspeção (fls. 16 verso do PA).
H) Os atos de inspeção foram concluídos em 14/6/2013, com o envio da nota de diligências para o domicílio fiscal da impugnante (fls. 16 verso do PA).
I) Por ofício de 10/7/2013 recebido em 11/7/2013, os Serviços de Inspeção Tributária remeteram o projeto de relatório da inspeção tributária à própria impugnante e para a sua sede (fls. 54 e seguintes e 425 e seguintes).
J) Em 24/7/2013, através do email de fls. 77 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido, a própria impugnante através do seu departamento financeiro requereu aos Serviços de Inspeção Tributária a notificação do projeto de relatório ao escritório de advogados P. & Associados, que a representa no âmbito do processo originado pela ordem de serviço n.º OI 201201809 (fls. 74 e seguintes dos autos, apesar de na informação de fls. 75 referir-se que este requerimento foi rececionado nos serviços da administração tributária em 10/07/2012, trata-se dum manifesto erro de escrita porquanto resulta claramente de fls. 77, que é reprodução do email de fls. 57 verso junto pela própria impugnante, e das restantes informações e documentos dos autos e do PA, que esse pedido da impugnante foi remetido em 24/07/2013, data que consta do próprio email da impugnante; além disso o projeto de relatório só foi notificado à impugnante por carta registada nesse dia, pelo que o email não podia ser do próprio dia do registo postal da notificação) (fls. 57 verso e 74 e seguintes dos autos).
K) Por ofício de 26/7/2013, de fls. 78 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido, que é reprodução do email de fls. 58, cujo teor aqui se dá por reproduzido, os Serviços de Inspeção Tributária informaram a impugnante que no âmbito do procedimento de inspeção com origem na ordem de serviço n.º OI201202299, não constituiu mandatário (fls. 74 e seguintes dos autos em particular fls. 78).
L) Nesse ofício os Serviços de Inspeção Tributária informaram a impugnante que consta uma procuração para representação no âmbito do procedimento de inspeção realizado ao abrigo da ordem de serviço n.º OI201201809, já terminado, procedimento de inspeção distinto realizado ao exercício/ano de 2008 (fls. 74 e seguintes dos autos em particular fls.78).
M) Em resposta a este ofício, a P. – P., Sociedade de Advogados, RL, remeteu aos Serviços de Inspeção Tributária, em 26/7/2013, o requerimento de fls. 19 e 20 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
N) Em resposta os Serviços de Inspeção Tributária prorrogaram o prazo para o exercício do direito de audição, tendo notificado a própria impugnante pelo ofício de 30/7/2013 de fls. 81 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
O) Este ofício foi igualmente comunicado àquela Sociedade de Advogados (fls. 81).
P) Por carta registada com aviso de receção de 5/8/2013, recebida nos Serviços de Inspeção Tributária a 6/8/2013, a impugnante remeteu o requerimento de fls. 82 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido (fls. 68 a 69 verso).
Q) A procuração forense aí referida é a procuração junta a fls. 53 do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
R) Os Serviços de Inspeção Tributária consideraram que a impugnante constituiu mandatário em 5/8/2013 (fls. 74 e seguintes).
S) As liquidações impugnadas de IRC de 2010 e 2011, de fls. 140 e 140 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, foram notificadas à própria impugnante pelo menos em 28/10/2013 e 29/10/2013, conforme anotação aí manuscrita e tinham como data limite de pagamento voluntário os dias 23/12/2013 e 26/12/2013 (fls. 138 a 141 dos autos e 421, 422 e 425 verso do PA).
T) As liquidações impugnadas de IRC de 2010 e 2011, de fls. 140 e 140 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, não foram notificadas às Ilustres Mandatária da impugnante (fls. 138 a 141).
U) As liquidações impugnadas respeitam a factos relativamente aos quais foi instaurado o inquérito criminal n.º 82/13.5 IDPRT, do DIAP dos Serviços do Ministério Público de Lousada, a correr termos no DIAP de Paços de Ferreira (fls. 94, 100 a 101 e 118).
V) Neste inquérito não foi proferido despacho final, estando suspenso desde 19/9/2016 até, pelo menos, 16/10/2020 (fls. 94, 100 a 101 e 118 dos autos, 84 verso a 84-A do PA e 790-795 do SITAF).
W) A impugnação judicial foi apresentada em 24/3/2014, segunda-feira (fls. 2).
X) O procedimento de inspeção referido em A) deu origem ao relatório da inspeção tributária junto de fls. 14 a 44 verso do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Y) A notificação referida em I) incluía a notificação da impugnante para no prazo de 15 dias exercer o direito de audição sobre o mesmo (fls. 54 e seguintes e 425 e seguintes).
Z) A impugnante não exerceu o direito de audição (fls. 44 verso do PA).
Para a decisão da causa, inexiste matéria de facto julgada não provada.
3.1.1 – Motivação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo na parte em que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos, bem como pelo depoimento da testemunha.
Cumpre apenas esclarecer a data em que foi remetido aos Serviços de Inspeção Tributária o email que consta alínea J).
No seu requerimento de fls. 56, a impugnante alega que o remeteu no dia 10/7/2013.
Porém, resulta do próprio do email que o mesmo foi remetido pelo departamento financeiro da impugnante aos Serviços de Inspeção Tributária em 24/7/2013. O dia 10/7/2013 é a data do ofício pelo qual os Serviços de Inspeção Tributária remeteram à própria impugnante o projeto do relatório da inspeção tributária e que está identificado nesse email em “Assunto”.
A impugnante não tem nenhuma razão quando alega que remeteu esse email em 10/7/2013 e não provou tal facto. Pelo contrário. O documento junto por si atesta que o email foi remetido aos Serviços de Inspeção Tributária em 24/7/2013. Apesar de na informação de fls. 75 referir-se que esse email foi rececionado nos serviços da administração tributária em 10/7/2013, trata-se dum manifesto erro de escrita porquanto resulta claramente de fls. 77, que é reprodução do email de fls. 57 verso junto pela própria impugnante, e das restantes informações e documentos dos autos e do PA, que esse pedido da impugnante foi remetido em 24/7/2013, data que consta do seu próprio email; além disso o projeto de relatório só foi notificado à impugnante por carta registada nesse dia, pelo que o email não podia ser do próprio dia do registo postal da notificação.
Acresce ainda que a impugnante impugnou a informação constante do parecer e informação dos serviços da administração tributária de fls. 74 e seguintes que consignou que Mais se informa que apenas em 05/08/2015 foi constituído mandatário no âmbito do procedimento realizado ao abrigo da Ordem de Serviço OI1201202299.
Porém, conforme melhor decorrerá da fundamentação de direito a impugnante não tem razão para impugnar essa afirmação.
Desde logo, porque a impugnação é dos documentos de prova e essa informação não é um documento de prova, é uma conclusão ou constatação da administração tributária.
Por outro lado, porque a validade jurídica dessa conclusão dos Serviços de Inspeção Tributária será apreciada e julgada na fundamentação de direito, ao apreciarem-se e julgarem-se os efeitos jurídicos dos documentos juntos os autos.
A restante matéria alegada pelas partes não foi julgada provada ou não provada por constituir conceito de direito, matéria conclusiva ou não relevar para a decisão da causa, designadamente por não constituírem factos essenciais para a decisão da causa.
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Apreciação jurídica do recurso.

Em primeiro lugar, a Impugnante, ora Recorrente, invoca que a sentença padece de nulidade por alegadamente conhecer questão que não devia.

Entende a Recorrente que na anterior sentença proferida nestes autos em 22/02/2017, ficou decidido que as notificações das liquidações efetuadas apenas à própria Impugnante, incorriam em ilegalidade, por isso não pode o tribunal voltar a apreciar esta questão.

Segundo o disposto no artigo 125.º, n.º 1 do CPPT (à semelhança do previsto no atual artigo 615º do NCPC), é nula a sentença quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”.

Ocorre excesso de pronúncia quando o tribunal aprecia e decide uma questão, isto é, um problema concreto, que não foi suscitada pelas partes nas respetivas peças processuais, com exceção das que sejam do conhecimento oficioso. Como refere Jorge Lopes de Sousa, in “Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado”, volume II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, p. 366, ocorre nulidade da sentença “Se o tribunal, apesar de se limitar a apreciar um pedido que foi formulado, exceder os seus poderes de cognição quanto à causa de pedir, violando a regra da identidade de causa de pedir e de causa de julgar”.

A referida nulidade reconduz-se, assim, a um incumprimento, por parte do julgador, do poder prescrito no artigo 608.º, n.º 2 do CPC, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão ou por excesso de pronúncia.

Também ocorrerá excesso de pronúncia se o tribunal conhece questão que, embora inicialmente suscitada pelas partes, tenha ficado resolvida antes da sentença final pelo próprio Tribunal, em recurso interlocutório ou em recurso final que não anule totalmente sentença anterior, quando se tenha decidido que aquela questão concreta ficava resolvida definitivamente no processo em determinado sentido.

Já o mesmo não se pode dizer quando haja uma anulação integral de uma primeira sentença proferida no processo, pois que se a sentença é totalmente anulada, o que nela havia sido decidido deixou de figurar na ordem jurídica.

Ora, conforme consta dos autos (págs. 217 do SITAF), efetivamente, em 22/02/2017, foi proferida uma Sentença que absolveu da instância a Fazenda Pública, por entender que as liquidações deviam ter sido notificadas ao mandatário da Impugnante, por isso eram ineficazes, pelo que ainda nem sequer se podia considerar iniciado o prazo para intentar impugnação judicial.

A Impugnante recorreu dessa Sentença, tendo o Supremo Tribunal Administrativo, por Acórdão proferido em 20 de abril de 2020, anulado essa Sentença, ordenando a baixa dos autos para ser julgada a impugnação.

Esse Acórdão do STA, refere a págs. 9 e 10, o seguinte:
«3.3. Na sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, aqui recorrida, ficou provado que os actos de liquidação a que se reporta o processo de execução fiscal onde foi deduzida oposição foram correctamente notificados ao contribuinte (v. ponto S da matéria de facto dada como provada), e ficou igualmente provado que aquelas liquidações não foram notificadas às mandatárias tributária (v. ponto T da matéria de facto dada como provada), tendo por essa razão concluído o Tribunal que aqueles actos de liquidação seriam ineficazes, o que fundamentou a sua decisão de julgar procedente a excepção dilatória da inimpugnabilidade do acto e, em consequência, absolver a Fazenda Pública da instância. Uma decisão que, pelas razões antes aduzidas, não pode manter-se.
Com efeito, uma vez que os actos de liquidação são eficazes por terem sido correctamente notificados ao contribuinte / sujeito passivo (a quem teriam sempre de ser notificados ex vi do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT) e não consubstanciando a falta de notificação dos mesmos ao mandatário tributário sequer uma irregularidade (porquanto aquela notificação, pelas razões que expusemos, embora fosse adequada, não se integra no âmbito de aplicação do n.º 1 do artigo 40.º do CPPT), dúvidas não restam de que a decisão recorrida não pode manter-se.
Conclusões
Assim, podemos concluir, relativamente à questão em apreço, que:
- Os actos de liquidação praticados no seguimento de um procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário são actos intrinsecamente ligados àquele procedimento, mas que gozam de autonomia jurídico-procedimental em relação ao mesmo, uma vez que o procedimento de inspecção tributária termina com a assinatura do relatório final da inspecção, onde são sistematizados os factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária, e o sancionamento superior das suas conclusões.
- A referida autonomia jurídico-procedimental daqueles actos de liquidação adicional determina que a sua eficácia, nos casos em que tenha sido constituído mandatário tributário no âmbito do procedimento de inspecção tributária, dependa apenas de notificação dos mesmos segundo a regra geral da notificação dos actos tributários do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, e não de notificação ao mandatário tributário nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT;
Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e mandar baixar os autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel para que aí seja julgada a impugnação judicial.».

Conforme se pode ler no mencionado Acórdão do STA, designadamente na parte acima transcrita, a primeira Sentença foi integralmente anulada, pois o Supremo entendeu que as liquidações não tinham de ser notificadas ao mandatário da Impugnante. Como consequência da desnecessidade da notificação das liquidações ao mandatário da Impugnante, o que havia sido decidido na Sentença sobre esse assunto, foi revogado pelo STA, pelo que não se pode jamais dizer que transitou em julgado a decisão da 1.ª instância que considerava ter ocorrido uma violação do artigo 40.º do CPPT.

Desta forma, a segunda Sentença podia e devia conhecer a Impugnação, segundo a causa de pedir e conforme o peticionado.

Tendo sido isso que efetivamente fez. Aliás, veja-se no Relatório da Sentença a colocação das questões a analisar, segundo o alegado pela Impugnante.
Assim, a Recorrente ao referir que a decisão sobre a não notificação das liquidações ao mandatário da Impugnante já ficou decidida na anterior Sentença, incorre num grave erro de perceção da realidade processual ou em ausência de esforço intelectual para percecionar a causa ou em querer compreendê-la.

Em face do exposto, conclui-se que a Sentença não incorre em qualquer nulidade por excesso de pronúncia.
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Em segundo lugar, invoca a Recorrente que ocorre violação do princípio do contraditório em relação à junção de um documento, supostamente essencial para o conhecimento da causa.

Trata-se do documento descrito na alínea V) da matéria de facto da seguinte forma: V) Neste inquérito não foi proferido despacho final, estando suspenso desde 19/9/2016 até, pelo menos, 16/10/2020 (fls. 94, 100 a 101 e 118 dos autos, 84 verso a 84-A do PA e 790-795 do SITAF).

Ora, o artigo 3.º, n.º 3, do CPC, aplicável ao contencioso tributário ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, dispõe:
«O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem».

Este preceito estabelece um princípio estruturante do processo que é o do contraditório, conforme é entendimento unânime da jurisprudência e da doutrina.

Estamos perante um princípio basilar do processo ao se assumir como uma garantia da participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de influírem em todos os elementos que se liguem ao objeto da causa (cfr. JOSÉ LEBRE DE FREITAS, in Introdução ao Processo Civil, Conceitos e Princípios Gerais à Luz do Código Revisto, Coimbra Editora, 1996, pág. 96.).

Sobre o princípio do contraditório escrevem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa no Código de Processo Civil anotado, vol. I, 2.ª ed., ano 2020, Almedina, em anotação ao artigo 3.º, a págs. 21 e 22 o seguinte:
«10. Ao princípio do contraditório subjaz a ideia de que repugnam ao nosso sistema processual civil decisões tomadas à revelia de algum dos interessados, regra que apenas sofre desvios quando outros interesses se sobreponham. Posto que a necessidade de observância do contraditório seja replicada em diversos preceitos avulsos, tal não diminui o relevo da sua enunciação como princípio geral que se impõe em todas as fases processuais, especialmente nos articulados e na apresentação e produção de meio de prova (art. 415.º).
(…)
14. Tal como o princípio do contraditório não deve obscurecer o objetivo da celeridade processual, também esta não pode conduzir a uma dispensa do contraditório sob pretexto da sua desnecessidade. Tal dispensa é prevista a título excecional, apenas se justificando quando a questão já tenha sido suficientemente discutida ou quando a falta de audição das partes não prejudique de modo algum o resultado final.».

Ora, o documento que não foi notificado à Recorrente, não comporta qualquer matéria sobre os termos desta causa, tratando-se antes de uma mera informação sobre o estado do processo de inquérito crime n.º 82/13.5IDPRT, a ser tramitado no DIAP. Por isso, não é passível de prejudicar o resultado final desta Impugnação, pois a tramitação daquele processo de inquérito em nada influencia os fundamentos desta causa.

Aliás, a própria Recorrente quando se reporta a tal documento, refere-se sempre à prescrição do procedimento penal, para o efeito aludindo ao artigo 21.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), e não passa disso. Nunca em momento algum logra explicar em que medida tal documento poderia ter levado a que a decisão tomada pudesse ter sido outra.

Refira-se, já agora, que é o processo penal tributário que está dependente do processo judicial tributário e não a inversa, pelo que o que quer que se passe naqueloutro processo é inócuo em relação a este.

Diga-se, por fim, que a informação prestada, nada mais acrescenta ao que está legalmente determinado no artigo 47.º do RGIT, ou seja, é a própria lei que impõe a suspensão do processo penal tributário, até que haja decisão na Impugnação judicial transitada em julgado.

Assim, com a não notificação do documento em apreço, não ficou colocada em causa, de forma alguma, o processo justo e equitativo, pois que o dito documento, em nada influencia o mérito da causa, uma vez que não se reporta ao facto tributário ou a algum dos fundamentos das liquidações.
Desta forma, a Sentença não incorreu em qualquer violação do princípio do contraditório, pelo que não incorre em qualquer nulidade.
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Em terceiro lugar, alega a Recorrente que as liquidações notificadas apenas ao sujeito passivo são ineficazes, uma vez que a lei tributaria impõe a notificação aos mandatários constituídos no procedimento.

Sobre esta questão já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo neste processo, conforme acima referido, pelo que a Sentença até não carecia de apreciar novamente a questão, mas como o fez, cumpre aqui dizer algo sobre o assunto.

Assim, o Acórdão do STA tirado neste processo em 20 de abril de 2020, é claro ao referir que a notificação das liquidações emitidas na sequência de uma ação de inspeção, não tem que ser notificadas aos mandatários constituídos no procedimento de inspeção. Veja-se o sumário deste Acórdão, que é o seguinte:
- Os actos de liquidação praticados no seguimento de um procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário são actos intrinsecamente ligados àquele procedimento, mas que gozam de autonomia jurídico-procedimental em relação ao mesmo, uma vez que o procedimento de inspecção tributária termina com a assinatura do relatório final da inspecção, onde são sistematizados os factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária, e o sancionamento superior das suas conclusões.
- A referida autonomia jurídico-procedimental daqueles actos de liquidação adicional determina que a sua eficácia, nos casos em que tenha sido constituído mandatário tributário no âmbito do procedimento de inspecção tributária, dependa apenas de notificação dos mesmos segundo a regra geral da notificação dos actos tributários do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, e não de notificação ao mandatário tributário nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT.

Sobre este assunto também já se pronunciou este Tribunal abundantemente, inclusive em Acórdão de que fomos Relator, bem como em outros arestos, com os quais concordamos.

Veja-se o Acórdão de em 3 de dezembro de 2020, proferido por este Tribunal Central Administrativo Norte no processo n.º 43/17.5BEPNF, que a dado passo refere:
«Vejamos, por último, o alegado pela Recorrente nas conclusões XIV. a XXIII. do recurso apresentado, nas quais, em síntese, reitera a argumentação avançada no seu articulado inicial, referindo que, nos termos do artigo 40º do CPPT, nos procedimentos tributários, as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário são feitas na pessoa deste, por carta registada, dirigida para o seu escritório, e que, não tendo a Administração Tributária notificado as Mandatárias da impugnante da fundamentação e liquidação adicional, com prazos e meios de defesa, foi a mesma impedida de atacar a liquidação adicional em crise, daí derivando a inexigibilidade da dívida, por ser ineficaz, impondo-se concluir pela ineficácia da notificação da liquidação somente efectuada na pessoa da impugnante.
Mais sustenta, em síntese, que o entendimento de que o procedimento de liquidação é autónomo do procedimento inspectivo que lhe deu origem e que, por isso, o mandato conferido neste último procedimento termina com a conclusão do procedimento de inspecção enferma de inconstitucionalidade, por representar uma interpretação restritiva do citado artigo 40º do CPPT, defendendo que as acções inspectivas são acções preparatórias da liquidação dos tributos, como uma fase do procedimento de liquidação de imposto, pelo que, ao serem constituídas mandatárias nesse procedimento, deveriam as mesmas ser notificadas da liquidação, nos termos do citado normativo.
Ora, subjacente a esta argumentação está uma premissa que, no caso vertente, como se deixou evidenciado, não se verifica – a de que foi constituído mandatário no procedimento de inspecção - sendo que, só no caso de se demonstrar essa constituição é que lograria pertinência enfrentar a questão de aferir da validade da notificação da liquidação impugnada efectuada à impugnante, ora Recorrente, sem que se tivesse procedido à notificação da liquidação às mandatárias constituídas no procedimento de inspecção.
Com efeito, conforme resulta da matéria de facto julgada não provada e da respectiva motivação, por nós confirmada, nos termos acima expostos, a impugnante não constituiu as Exmas. Advogadas identificadas nos autos como suas mandatárias no procedimento de inspecção que deu origem à liquidação aqui impugnada, pelo que, não havendo mandatário constituído, a liquidação não tinha de ser notificada a não ser, como foi, à própria impugnante (cfr. alínea L) supra), como bem decidiu a sentença recorrida.
Sempre se dirá, no entanto, em face da argumentação desenvolvida pela Recorrente nas conclusões do recurso sub judice, e porque a sentença também se pronunciou, ainda que em termos subsidiários, sobre as consequências de um eventual mandato a favor das Exmas. Advogadas no procedimento de inspecção (concluindo, por apelo a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, que cita, no sentido de que, mesmo nesse caso, a liquidação impugnada emitida na sequência desse procedimento inspectivo não tinha de ser notificada às Mandatárias constituídas), que a discussão em torno da validade da notificação da liquidação de imposto efectuada ao sujeito passivo sem que se tivesse procedido à notificação da mesma ao mandatário constituído no procedimento de inspecção subjacente não é nova e não vinha merecendo tratamento totalmente pacífico pelo Supremo Tribunal Administrativo, com bem se evidencia no seu recente Acórdão de 22 de Janeiro de 2020, proferido no Processo nº 0915/16.4BEBRG, integralmente disponível em www.dgsi.pt, por referência à extensa jurisprudência nele citada.

Ponderando essa circunstância, entendeu o Supremo Tribunal Administrativo, no referido Aresto, com relevância para a questão sub judice, e em síntese, o seguinte: i) o acto de liquidação adicional decorrente de procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário tem apenas, legalmente, de ser notificado ao contribuinte/sujeito passivo, por, entre o mais, se tratar de um acto que goza de autonomia jurídico-procedimental face ao procedimento tributário; ii) não sendo a notificação do mandatário tributário neste caso abrangida pelo disposto no nº 1 do artigo 40º do CPPT - em razão da autonomia jurídico-procedimental do acto de liquidação adicional - não se pode sequer afirmar que a sua falta consubstancie uma irregularidade por preterição de uma formalidade não essencial; iii) apenas a falta de notificação daquele acto de liquidação ao contribuinte/sujeito passivo determina, de acordo com a lei, nos termos do já mencionado nº 1 do artigo 36º do CPPT, a ineficácia do acto de liquidação.

O julgamento assim efectuado no citado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo veio, entretanto, a ser reiterado - no que se nos afigura ser um claro sinal daquele Alto Tribunal no sentido da pacificação da jurisprudência nesta matéria -, nos Acórdãos de 20 de Abril de 2020, proferidos nos Processos nºs 02509/14.0BEPRT e 0215/14.4BEPNF, ambos integralmente disponíveis em www.dgsi.pt, este último, de resto, em processo em que é a mesma a Recorrente, e no qual se considerou, em conclusões, que:
“I - Os actos de liquidação praticados no seguimento de um procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário são actos intrinsecamente ligados àquele procedimento, mas que gozam de autonomia jurídico-procedimental em relação ao mesmo, uma vez que o procedimento de inspecção tributária termina com a assinatura do relatório final da inspecção, onde são sistematizados os factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária, e o sancionamento superior das suas conclusões.
II - A referida autonomia jurídico-procedimental daqueles actos de liquidação adicional determina que a sua eficácia, nos casos em que tenha sido constituído mandatário tributário no âmbito do procedimento de inspecção tributária, dependa apenas de notificação dos mesmos segundo a regra geral da notificação dos actos tributários do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, e não de notificação ao mandatário tributário nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT. (sublinhado nosso)

E tal interpretação também não se afigura manifestamente inconstitucional (vício a que a Recorrente alude vagamente, sem concretizar), designadamente, por violação do princípio da proporcionalidade e do direito de defesa ínsitos nos artigos 18º, nº 2 e 20º, nºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa, porquanto aquele princípio tem de subordinar-se aos fins que lhe subjazem e interesses em presença. Assim, visando-se com a notificação obter o pagamento do imposto e assegurar a satisfação do direito de defesa, mediante acesso à tutela jurisdicional efectiva, num quadro de segurança jurídica, a notificação da liquidação efectuada directamente ao sujeito passivo satisfaz tal, adequadamente e na justa medida. (cfr., neste sentido, o citado Acórdão proferido no Processo nº 02509/14.0BEPRT).

Acolhendo o assim decidido, com perfeita adequação para dar resposta, ainda que desatendendo, à argumentação desenvolvida pela Recorrente a final das conclusões de recurso, conclui-se que o recurso também não pode proceder nessa parte.».


Também o Supremo Tribunal Administrativo, por Acórdão proferido em 20 de abril de 2020, neste mesmo processo, decidiu que as liquidações são emitidas após o fim do procedimento de inspeção, pelo que não tinham de ser notificadas aos mandatários constituídos no procedimento inspetivo. Consequentemente, anulou a Sentença, que agora a Impugnante invoca a seu favor, e ordenou a baixa dos autos para ser julgada a impugnação.

Esse Acórdão do STA, refere a págs. 9 e 10, o seguinte:
«3.3. Na sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, aqui recorrida, ficou provado que os actos de liquidação a que se reporta o processo de execução fiscal onde foi deduzida oposição foram correctamente notificados ao contribuinte (v. ponto S da matéria de facto dada como provada), e ficou igualmente provado que aquelas liquidações não foram notificadas às mandatárias tributária (v. ponto T da matéria de facto dada como provada), tendo por essa razão concluído o Tribunal que aqueles actos de liquidação seriam ineficazes, o que fundamentou a sua decisão de julgar procedente a excepção dilatória da inimpugnabilidade do acto e, em consequência, absolver a Fazenda Pública da instância. Uma decisão que, pelas razões antes aduzidas, não pode manter-se.
Com efeito, uma vez que os actos de liquidação são eficazes por terem sido correctamente notificados ao contribuinte / sujeito passivo (a quem teriam sempre de ser notificados ex vi do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT) e não consubstanciando a falta de notificação dos mesmos ao mandatário tributário sequer uma irregularidade (porquanto aquela notificação, pelas razões que expusemos, embora fosse adequada, não se integra no âmbito de aplicação do n.º 1 do artigo 40.º do CPPT), dúvidas não restam de que a decisão recorrida não pode manter-se.
Conclusões
Assim, podemos concluir, relativamente à questão em apreço, que:
- Os actos de liquidação praticados no seguimento de um procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário são actos intrinsecamente ligados àquele procedimento, mas que gozam de autonomia jurídico-procedimental em relação ao mesmo, uma vez que o procedimento de inspecção tributária termina com a assinatura do relatório final da inspecção, onde são sistematizados os factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária, e o sancionamento superior das suas conclusões.
- A referida autonomia jurídico-procedimental daqueles actos de liquidação adicional determina que a sua eficácia, nos casos em que tenha sido constituído mandatário tributário no âmbito do procedimento de inspecção tributária, dependa apenas de notificação dos mesmos segundo a regra geral da notificação dos actos tributários do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, e não de notificação ao mandatário tributário nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT;

Em face do exposto, o Recorrente também soçobra quanto a esta questão no pressente recurso.
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Face ao exposto, o recurso não merece provimento.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

I - Ocorre excesso de pronúncia se o tribunal conhece questão que, embora inicialmente suscitada pelas partes, tenha ficado resolvida antes da sentença final pelo próprio Tribunal, em recurso interlocutório ou em recurso final que não anule totalmente sentença anterior, quando se tenha decidido que aquela questão concreta ficava resolvida definitivamente no processo em determinado sentido.

II - Já o mesmo não se pode dizer quando haja uma anulação integral de uma primeira sentença proferida no processo, pois que se a sentença é totalmente anulada, o que nela havia sido decidido deixou de figurar na ordem jurídica.

III – Não ocorre violação do princípio do contraditório, se a junção de um documento não é notificado às partes, se o mesmo é manifestamente inócuo para os termos da causa e que nada influencie o mérito da ação.

IV - A notificação das liquidações emitidas na sequência de uma ação de inspeção, não tem que ser notificadas aos mandatários constituídos no procedimento de inspeção.
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Decisão

Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
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Porto, 23 de junho de 2021.

Paulo Moura
Cristina da Nova
Ana Paula Santos