Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00451/18.4BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/28/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:ATRASO NA JUSTIÇA; “ATRASO DO ATRASO”; PRAZO RAZOÁVEL
Sumário:1 – A apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso.

2 - No que respeita ao dano moral indemnizável por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, a jurisprudência nacional tem reiteradamente afirmado que resulta um dano moral da violação do direito à obtenção em prazo razoável da decisão judicial que regule definitivamente o caso submetido a juízo, dano esse que é de presumir, embora se admita prova em contrário.

3 - A existência ou não de um prazo excessivo na decisão de um processo judicial deve ser aferida caso a caso tendo em conta os critérios definidos pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem:
1º - a complexidade do processo;
2º - o comportamento das partes;
3º - a atuação das autoridades competentes no processo; e
4º - a importância do objeto do litígio para o interessado.

4 - Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Tendo em linha de conta a culpa do Estado na propiciação da situação que determinou os controvertidos atrasos e as condições que o determinaram, e as suas emergentes consequências, e a intensidade e a natureza dos danos sofridos no período da intervenção no processo, justifica-se que o quantum indemnizatório fixado para os danos não patrimoniais atente nessas circunstâncias, de modo equitativo.

5 - No caso vertente, considerando que o dano moral a reparar é mitigado relativamente a outras situações (está aqui em causa um mero processo pelo “atraso do atraso”), que os interesses em jogo não são de especial relevância (não podem ser colocados no mesmo plano dos danos decorrentes, por exemplo, do atraso na regulação de um poder paternal) e que o atraso declarado do processo foi de 7 anos, afigura-se equitativo fixar a indemnização em €400/ano, num total de 2.800€. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:J.J.F.A. e Estado Português
Recorrido 1:Estado Português e J.J.F.A.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao Recurso independente do Autor e Julgar parcialmente procedente o Recurso subordinado
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
J.J.F.A., devidamente identificado nos autos, no âmbito da ação administrativa, intentada contra o Estado Português representado pelo Ministério Público, peticionou:
“1. A Declaração de que o réu violou o artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem bem como o artigo 20º, nºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa no seu segmento “direito a uma decisão em prazo razoável”.
2. A Condenação do réu a pagar ao autor:
a) Uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a quinze mil e novecentos euros pela duração do processo 1446/06.6BEVIS.
b) Juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
(...)”
Inconformado com a Sentença proferida em 28 de agosto de 2019, no TAF de Viseu, na qual a ação foi julgada “parcialmente procedente”, mais se condenando o Estado no pagamento de uma indemnização de 4.200€, acrescida de juros de mora, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, em 3 de setembro de 2019.
Formula o aqui Recorrente/J. A. nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões:
“1. O autor não deu causa a nenhum atraso do processo nem utilizou nenhum expediente para atrasar o processo.
2. A CULPA DA DURAÇÃO É DO ESTADO e da PGR que têm de cumprir as suas obrigações com diligência.
3. O tribunal não fixou o valor que menciona como atribuído pelo TEDH, entre €1.000 e €1.500 por cada ano.
4. E desconsidera que se trata de processo em que se queixava de um processo alvo que já era moroso sobre outro moroso.
5. Assim, o de família durou 7 anos, o do TAF alvo, sobre a morosidade do anterior durou mais de 11. E isso não foi considerado nesta presente sentença.
6. O tribunal faz a conta a 7 anos, mas o processo durou mais de 11 anos, e já era sobre processo que se queixava da morosidade do anterior, que, por sua vez, se queixava da morosidade de outro anterior…
7. Pelo raciocínio do tribunal a conta seria 11 anos, vezes 600 euros, e daria seis mil e seis centos, 6.600€, valor que não se aceita.
8. A indemnização é fixada pela duração total do processo atrasado e não pelos anos em que houve efetivo atraso.
9. Varia entre 1.000 a 1.500€ por ano de duração do processo (e não por ano de atraso).
10. O montante global será aumentado de 2.000€ nos processos sobre a morosidade da justiça.
11. A indemnização de 600€ por ano é demasiado baixa pois trata-se de processo em que se queixava da morosidade do anterior, que, por sua vez, se queixava da morosidade de outro anterior…
12. A sentença faz considerandos sobre o salário mínimo esquecendo que em Portugal, como é público, os portugueses pagam de impostos 22%, VINTE E DOIS POR CENTO, acima da média europeia.
13. O tribunal omitiu e ignorou que por causa do primeiro processo em Oliveira de Azeméis já havia outra condenação de Portugal por demora da justiça e sobre os mesmos factos.
14. Ou seja, relativamente à demora o autor recebeu 3.500 fixados pelo TEDH mais 4.000 euros fixados pelo TCAN, num total de 7.500€, o que para 7 anos que demorou esse processo, como diz a sentença, por ano recebeu uma indemnização de 1.071€ e não 571 ou 400 como diz a sentença.
15. Os processos por demora da justiça, como era o caso, devem ser especialmente céleres.
16. A sentença, pelo que atrás consta, viola os critérios do TEDH e tem múltiplos erros de raciocínio.
17. Se os tribunais condenassem exemplarmente o Estado, este punha-lhe meios à disposição para serem céleres.
18. O direito à justiça em prazo razoável é um direito fundamental previsto no artigo 20 da CRP e como tal deve ser indemnizado.
19. Deve condenar-se o Estado a pagar uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a quinze mil e novecentos euros pela duração do processo 1446/06.6BEVIS.
20. Assim se revogando a sentença, que violou o artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a jurisprudência do TEDH, disposição que deveria ser interpretada no sentido das conclusões anteriores. JUSTIÇA!

O Estado Português/Ministério Público veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso e Recurso Subordinado em 22 de novembro de 2019, tendo aí concluído:
“1. Não se concorda com o decidido sob a alínea B) do segmento decisório da sentença, que condenou o Réu Estado Português a pagar ao Autor a quantia de €4.200 a título de indemnização por danos não patrimoniais pela demora da Ação Administrativa Comum nº 1446/06.6BEVIS, e, por isso, e na sequência da notificação do recurso interposto pelo Autor, se interpõe o presente recurso subordinado;
2. Em primeiro lugar, considera-se que os danos sofridos pelo Autor, nos termos que se encontram provados sob os artigos 55º a 59º dos factos dados como assentes na sentença, se e enquanto causalmente provocados pelo facto ilícito em causa na presente ação (violação do direito a uma decisão em prazo razoável no âmbito do processo nº 1446/06.6BEVIS), e nos termos e com os fundamentos acima expostos, nem sequer seriam, pela sua gravidade, merecedores da tutela do direito, nos termos do disposto no art. 496º, nº 1, do Código Civil;
3. Efetivamente, e em conformidade com a jurisprudência acima invocada, considera-se que os factos assim dados como provados na sentença são manifestamente insuficientes para que esses danos se possam qualificar como graves, para efeitos do indicado normativo legal;
4. Desde logo, que, sob pena de violação do necessário nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano, só poderão ser atendidos para esse efeito os danos causalmente provocados pelo facto ilícito em causa neste processo, ou seja, os que sejam resultantes da violação do direito a uma decisão em prazo razoável no âmbito do processo nº 1446/06.6BEVIS;
5. E, por isso, é de excluir qualquer relevância ao facto dado como provado sob o ponto 58), pois que, como ficou a constar expressamente da fundamentação da sentença, não se provou que “a hipertensão tenha sido causada pela demora no processo em análise”:
6. Além disso, dos factos dados como provados sob os pontos 55) a 57), decorre que os danos aí referidos advieram dos processos (no plural) que o Autor tinha a tramitar e da sua demora;
7. E não apenas, e especificamente, da tramitação e demora do processo nº 1446/06.6BEVIS, o único que integra a causa de pedir na presente ação;
8. Pelo que, e sob pena de violação do nexo de causalidade entre o facto ilícito erigido em causa de pedir nesta ação, também não poderão ser atendidos os danos que, indiscriminadamente, nos termos constantes dos pontos 55) a 57), foram causados ao Autor pela tramitação e demora dos processos;
9. Apenas sob o ponto 59) da matéria de facto dada como provada, ficou especificamente provado que “o autor sentiu-se revoltado com a duração do processo” objeto desta ação;
10. Porém, este singelo facto é manifestamente insuficiente para que se possa considerar que o dano nele em causa reveste gravidade merecedora da tutela do direito para efeitos do disposto no art. 496º, nº 1, do Código Civil;
11. Mas mesmo que porventura se pudessem relevar nos presentes autos os demais danos que, indiscriminadamente, advieram ao Autor da tramitação e demora dos processos, e não apenas do processo nº 1446/06.6BEVIS aqui em causa (o que não se concede), o certo é que, ainda assim, as realidades que constam provadas sob os pontos 56) e 57) também não denotam uma amplitude e intensidade suscetível de integrar o conceito de gravidade exigido pelo art. 496º, nº 1, do Código Civil;
12. Considerando-se, na verdade, em consonância com a jurisprudência acima citada, que a “situação de incerteza”, a “ansiedade, angústia, incerteza e aborrecimentos, por nunca saber qual o desfecho dos processos”, o sentimento de frustração pela ineficácia do sistema e o facto de “por causa das demoras dos processos e de tudo isso, o autor teve insónias, noites em branco, mostrando-se incomodado, irritado e ansioso”, no seu todo, não poderão ser qualificadas como graves para efeitos daquele normativo legal;
13. E, muito menos, para efeitos de serem indemnizados no âmbito desta ação, em que está unicamente em causa a demora de um único processo (o nº 1446/06.6BEVIS), dos vários que o Autor tinha a tramitar;
14. Sem que tenha ficado demonstrada a específica contribuição da demora deste processo para os danos provados na sentença;
15. Em suma, considera-se que não ficaram demonstrados danos especificamente causados pela demora do processo objeto desta ação (1446/06.6BEVIS) que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito;
16. E a esta conclusão não obsta a jurisprudência do TEDH invocada pelo Autor e a jurisprudência nacional, referida na sentença, conforme com a aquela;
17. Pois que se é certo que o TEDH considera que o ponto de partida das jurisdições nacionais deverá ser o da presunção, ainda que ilidível, de que a duração excessiva de um processo ocasiona um dano moral (comum);
18. Também é certo que o mesmo TEDH admite que “em determinados casos, a duração de um processo não gera senão um dano moral mínimo, ou sequer qualquer dano moral. O juiz nacional deverá então justificar a sua decisão motivando-a suficientemente” – v. o acórdão no caso Castro c. Portugal, citado pelo Autor no artigo 66º da petição inicial;
19. Aliás, casos há em que o próprio TEDH considerou que a mera declaração de que houve violação do art. 6º, nº 1, da CEDH, “constitui em si reparação razoável suficiente pelo dano moral eventualmente sofrido pelo requerente” – v. acórdão no caso Ferreira Alves c. Portugal (nº 3), que se encontra juntos aos autos nº 1446/06.6BEVIS;
20. Ora, ao nível do direito interno, as referidas situações de dano moral mínimo ou de inexistência de qualquer dano moral são suscetíveis de se integrar na previsão do art. 496º, nº 1, do Código Civil, que afasta a indemnização por danos não patrimoniais nos casos em que, a falta ou pequena gravidade dos mesmos, não os faça merecedores da tutela do direito;
21. O que precisamente ocorre na situação em apreço e, como tal, considera-se que não deveria ter sido arbitrada qualquer indemnização ao Autor na presente ação;
22. Em segundo lugar, e caso assim se não entenda (o que não se concede), sempre se considera que o montante da indemnização fixado se revela excessivo;
23. Pois que se discorda decidido na sentença a esse propósito, quer quanto ao número de anos que nela foram considerados como de atraso do processo (7 anos), quer quanto ao valor €600 que foi arbitrado por cada um dos anos de demora;
24. Desde logo, que, ao contrário da tese do Autor, concorda-se com a decisão recorrida quando faz reportar a indemnização, não à duração total do processo (11 anos), mas à demora/atraso do processo;
25. Na verdade, não podemos esquecer que, nos termos do disposto no art. 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, bem como o art. 20º, nºs 1 e 4, da CRP, e no art. 12º, do regime anexo à Lei 67/2007, o que está em causa nos presentes autos é a responsabilidade civil extracontratual do Estado por a violação do “direito a uma decisão em prazo razoável”;
26. E, portanto, esse facto ilícito só existe quando é ultrapassado esse prazo razoável e, logicamente, o direito de indemnização decorrente desse facto ilícito só existe se e a partir do momento em que esse prazo razoável não é respeitado e, portanto, passa a haver atraso/demora na decisão do processo;
27. Assim, importa em primeiro lugar, determinar qual seria, no presente caso, o prazo razoável para a decisão do processo nº 1446/06.6BEVIS, para depois se apurar o período temporal que se reputa como sendo de atraso/demora, enquanto o único relevante para aquele efeito;
28. Tendo-se em conta, para esse efeito, e como tem sido jurisprudência pacífica, a apreciação e integração desse conceito (decisão em prazo razoável) constitui um processo de avaliação que tem que ser aferido em concreto, e não em abstrato, e que tem que considerar todas as coordenadas do caso;
29. Atendendo aos critérios que vêm sendo enunciados jurisprudencialmente: a complexidade da causa, o comportamento do requerente e das autoridades competentes, bem como o interesse da causa (enjeu du litige) para os requerentes;
30. Excluindo-se, conforme a jurisprudência acima enunciada, o tempo de atraso injustificado que tenha ficado a dever-se à atuação à atuação da parte que pede a indemnização; e
31. Tendo-se “como razoável o prazo de 3 anos como duração média de um processo na primeira instância, para a generalidade das matérias, e de 4 a 6 anos para duração global da lide, ou seja, quando haja recurso para os Tribunais Superiores”;
32. No caso dos autos, há considerar, designadamente, e como emerge da factualidade dada como provada na sentença e do que documentalmente consta do processo nº 1446/06.6BEVIS, e nos termos que se explicitaram supra, que se dão por reproduzidos, que:
- este processo foi objeto de tramitação e decisão nas três instâncias (TAF de Viseu, TCAN e STA);
- se revelou de tramitação e decisão complexa, tendo, aliás, sido objeto de decisões divergentes na 1ª e na 2ª instância;
- o próprio Autor deduziu pretensões, mormente, de índole probatória que, em grande medida, contribuíram também para a duração do processo;
- os interesses em jogo para o requerente não se mostravam de particular relevância, já que estava em causa a mera atribuição de uma indemnização decorrente de responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso na justiça, não se revestindo, pois, de particular importância e/ou consequências para a vida pessoal ou profissional do Autor;
33. Em face de tudo o que se expôs nas presentes alegações, e tendo presente a citada jurisprudência do Ac. do TCAN de 07/07/2017, considera-se que a duração global da lide, nas três instâncias, deverá razoavelmente situar-se, pelo menos, em 5 anos.
34. Devendo ainda excluir-se, nos termos do citado Ac. do STA de 09/10/2008, proc. nº 019/08, a demora dos autos que, nos termos sobreditos, ficou a dever-se a conduta do próprio Autor, designadamente, aos períodos temporais em que o processo aguardou e/ou foi tramitado com vista à junção de documentos por ele requerida e que, porém, o mesmo podia/devia ter juntado e/ou, no caso da jurisprudência do TEDH, se limitado a referenciar;
35. E que, no global, não será inferior a 2 anos – v.g. pontos 5), 10); 11) a 13); pontos 18), 20), 23), 26) a 29); pontos 39), 41) a 47);
36. Assim, da duração global do processo (11 anos), deverão descontar-se, pelo menos, os indicados 5 anos de duração razoável da lide nas três instâncias e os referidos 2 anos de demora atribuíveis à conduta do próprio Autor:
37. Considerando, pois, que a violação do direito do A. a uma decisão em prazo razoável corresponderá no presente caso a uma demora/atraso que, no máximo, deverá contabilizar-se em 4 anos (11-5=7-2=4) e não nos 7 anos que foram considerados na sentença;
38. Para além disso, considera-se que o montante fixado, de €600 por cada ano de atraso, é também excessivo;
39. Na verdade, não se vê razão para, fazendo apelo ao salário mínimo em Portugal, se divergir da jurisprudência do Ac. do TCAN de 06/05/2016, proc. 01358/07.6BEVIS, cujas considerações são plenamente aplicáveis ao caso dos presentes autos e que, de resto, foi salientada, de forma concordante, na sentença, segundo a qual foi considerado como equitativo o valor de € 400 por cada ano de demora excessiva;
40. Para além disso, e de todo o modo, o valor indemnizatório aqui fixado a título de danos não patrimoniais pela duração do processo nº 1446/06.6BEVIS (€4.200) mostra-se desproporcionado face ao próprio valor da indemnização (€4.000) que, a esse título, lhe foi arbitrada naquele processo nº 1446/06.6BEVIS;
41. Tanto mais que naquele processo estava em causa a indemnização pela demora excessiva de um processo de alteração de regulação do exercício do poder paternal, em que, como é referido no acórdão do TCAN nele proferido (e que fixou aquela indemnização), “estão em causa vivências íntimas, profundas inalienáveis, sobretudo quando se exprimem num conflito interpessoal insanável, existe uma intensidade emocional agravada que torna a morosidade da justiça muito mais difícil de suportar pelos seus destinatários”;
42. Enquanto neste processo está apenas em causa uma indemnização pela demora do próprio processo nº 1446/06.6BEVIS (ou seja, está aqui em causa um mero processo pelo atraso do atraso);
43. E que, além disso, a indemnização daqueles autos já foi fixada em termos atuais, ou seja, atendendo à situação do A. à data da prolação da decisão que a fixou, em 03/11/2017, tendo já, e desse modo, sido dada relevância ao tempo decorrido até então;
44. Sem esquecer ainda que a própria conduta processual do A. contribuiu também para a demora daqueles autos, nos termos acima referidos;
45. E que, portanto, sempre essa conduta teria que ser considerada para a fixação do eventual montante indemnizatório, de modo a excluí-lo ou, pelo menos, a diminuí-lo significativamente – v. art. 494º, ex vi o art. 496º, nº 3, do Código Civil; art. 570º, do Código Civil, e art. 4º, do regime anexo à Lei nº 67/07, de 31/12;
46. Ao que acresce ainda o facto de os danos não patrimoniais que emergem da factualidade dada como provada na sentença (v. pontos 55) a 57) e 59)) se revestirem de pequena gravidade;
47. E de, além disso, e com exceção do ponto 59), terem sido causalmente provocados, não especificamente pela demora do processo que constitui a causa de pedir nesta ação, mas globalmente pelas demoras dos processos que o autor tinha a tramitar;
48. Não podendo, porém, ser valorados/indemnizados nesta ação, por não estarem compreendidos na respetiva causa de pedir, quaisquer danos que não sejam os especificamente resultantes da demora do processo nº 1446/06.6BEVIS
49. A sentença recorrida, ao considerar verificada a existência de danos não patrimoniais causalmente provocados pela demora/atraso do processo nº 1446/06.6BEVIS que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito, condenando o R. Estado Português no pagamento de uma indemnização, violou o disposto no art. 496º, nº 1, do Código Civil, e nos arts. 7º e 12º, do Regime de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado em anexo à Lei nº 67/2007, de 31/12;
50. De todo modo, e sem conceder, sempre o montante indemnizatório fixado na sentença a esse título se mostra excessivo, nos termos sobreditos, em violação do disposto nos art. 496º, nº 3, 494º, 570º, do Código Civil, e arts. 4º, 7º e 12º, do Regime de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado em anexo à Lei nº 67/2007, de 31/12.
Termos em que, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida na parte em que condenou o Réu Estado Português no pagamento ao Autor de uma indemnização a título de danos não patrimoniais, absolvendo-o desse pedido.
Caso assim se não entenda, sempre deverá esse montante indemnizatório ser excluído ou, pelo menos, substancialmente reduzido. Assim, farão V. Exªs, como sempre, Justiça
Em 8 de janeiro de 2020 veio o Autor apresentar Contra-alegações de Recurso, relativamente ao Recurso Subordinado apresentado pelo Estado Português:
“1. Os danos sofridos pelo autor merecem tutela jurídica geral e especial ao quadrado.
2. Em primeiro lugar porque nos termos da jurisprudência do TEDH e nacional os danos resultantes da demora da justiça presumem-se; e são indemnizáveis.
3. E em segundo lugar porque o autor teve os danos especiais constantes da prova.
4. E em terceiro por se tratar de demora da justiça num processo anterior, conforme jurisprudência europeia.
5. O Estado pretende tirar partido dum lapso de escrita, “processos” no plural.
Mas, lapso é lapso.
6. Vê-se que o MP só leu jurisprudência do antigamente e nem leu a do TEDH que cita sem tirar as consequências.
7. O MP não leu sequer o acórdão do STA publicado na internet e que consta da PI, como outros sobre a presunção de dano:
8. E não leu o acórdão Castro c. Portugal, embora o cite várias vezes.
9. Assim, é absolutamente desconforme com a lei e jurisprudência o alegado pelo Estado bem como as suas conclusões.
10. Assim, o Estado, através do MP, comporta-se de má-fé, pelo que desde já se requer essa condenação, em multa e indemnização condigna ao autor, até pelo tempo que lhe faz perder.
11. A indemnização é fixada pela duração total do processo atrasado e não pelos anos em que houve efetivo atraso.
12. No acórdão Castro c. Portugal o TEDH fixou por 9 anos de duração 9.500 euros a título de danos morais. (sic)
13. Se dividirmos 9.500 euros por 9 anos, temos 1.055,55 euros (mil cinquenta e cinco…euros) por ano
14. E contou todos os anos desde o princípio até ao fim, nada sendo descontado, ao contrário do que diz a sentença e o MP.
15. E não se tratava de uma ação por morosidade da justiça que deve ser especialmente célere.
16. Logo, a sentença fixou uma indemnização desconforme com a jurisprudência do TEDH.
17. É mais uma razão para condenar o Estado como litigante de má-fé.
18. As decisões divergentes no processo são culpa do Estado que não forma os juízes.
19. Diz o TEDH que esse processo deveria ser especialmente célere e não demorar 11/12 anos.
20. A Procuradoria-Geral da República é do Estado, que tem de cumprir as suas obrigações com diligência.
21. Não é o autor que tem de ser punido por ela não ter os acórdãos traduzidos ou não ter tradutores. Sibi imputat.
22. Se o acórdão não estava traduzido, deveria está-lo, segundo as recomendações do Conselho da Europa.
23. E é a própria PGR que confessa que há recomendações para os traduzir conforme carta, doc anexo, da própria PGR e tal como o diz o MP no artigo 89.
24. Se o Estado não cumpre as recomendações internacionais, não pode tirar ilações contra os cidadãos, mas deveria autopunir-se e não punir os cidadãos.
25. Assim, nem a sentença nem o Estado têm razão.
26. E ainda: só as traduções da PGR fazem fé!
27. É mais uma razão para condenar o Estado como litigante de má-fé!
28. Os juízes são obrigados a saber a lei e a conhecer as convenções internacionais e a jurisprudência europeia. Se não sabem, a culpa não é do autor, mas do Estado. É para isso que há juízes especializados e tribunais administrativos!
29. E ainda quanto à má-fé no processo anterior-alvo: O Procurador que suscitou a questão da má-fé do autor é que deveria ser punido como litigante de má-fé por suscitar uma questão em que sabia que não tinha razão, em que não tinha conhecimentos, e que foi por isso que foi ele o causador, que fez avolumar o processo com peças e documentos.
30. O autor limitou-se a defender-se da acusação.
31. Outra vez, a culpa é do Estado que agiu de forma incompetente e desconhecedor do processo!
32. O artigo 20º, nº 4, da CRP garante que as decisões judiciais sejam proferidas em prazo razoável. Trata-se de direito fundamental.
33. A indemnização de 600 € por ano é demasiado baixa processo pois trata-se de processo em que se queixava da morosidade do anterior, que, por sua vez, se queixava da morosidade de outro anterior…
34. Quanto aos Critérios de avaliação das indemnizações já vimos o acórdão Castro em que a indemnização fixada foi de mais de 1000 euros por ano, e num processo normal, sem ser de morosidade da justiça.
35. As alegações do MP, pelo que atrás consta, violam os critérios do TEDH
36. Pelo que devem ser todas rejeitadas.
37. Considerando-se nomeadamente que o prazo a ter em conta é o da duração total do processo, conforme estabeleceu o acórdão Castro c. Portugal.
38. O Estado deve ser condenado como litigante de má-fé em multa e condigna indemnização a pagar ao autor.
39. O autor não deu causa a nenhum atraso do processo nem utilizou nenhum expediente para atrasar o processo.
40. A CULPA DA DURAÇÃO É DO ESTADO e da PGR que têm de cumprir as suas obrigações com diligência.
41. O tribunal não fixou o valor que menciona como atribuído pelo TEDH, entre € 1000 e € 1500 por cada ano.
42. E desconsidera que se trata de processo em que se queixava de um processo alvo que já era moroso sobre outro moroso.
43. Assim, o de família duros 7 anos, o do TAF alvo, sobre a morosidade do anterior durou mais de 11. E isso não foi considerado na sentença.
44. O tribunal faz a conta a 7 anos, mas o processo durou mais de 11 anos, e já era morosidade do anterior, que, por sua vez, se queixava da morosidade de outro anterior…
45. Pelo raciocínio do tribunal a conta seria 11 anos, vezes 600 euros, e daria seis mil e seis centos, 6.600€, valor que não se aceita.
46. A indemnização é fixada pela duração total do processo atrasado e não pelos anos em que houve efetivo atraso.
47. Varia entre 1000 a 1500€ por ano de duração do processo (e não por ano de atraso).
48. O montante global será aumentado de 2.000 EUR nos processos sobre a morosidade da justiça.
49. A indemnização de 600 € por ano é demasiado baixa pois trata-se de processo em que se queixava da morosidade do anterior, que, por sua vez, se queixava da morosidade de outro anterior…
50. A sentença faz considerandos sobre o salário mínimo esquecendo que em Portugal, como é público, os portugueses pagam de impostos 22%, VINTE E DOIS POR CENTO, acima da média europeia.
51. O tribunal omitiu e ignorou que por causa do primeiro processo em Oliveira de Azeméis já havia outra condenação de Portugal por demora da justiça e sobre os mesmos factos.
52. Ou seja, relativamente à demora, o autor recebeu POR CAUSA DO PROCESSO DE OLIVEIRA DE AZEMÉIS, 3500€ fixados pelo TEDH mais 4000€ fixados pelo TCAN, num total de 7.500€, o que para 7 anos que demorou esse processo, por ano recebeu uma indemnização de 1.071 euros e não 571 ou 400 como diz a sentença.
53. Os processos por demora da justiça, como era o caso, devem ser especialmente céleres.
54. A sentença, pelo que atrás consta, viola os s critérios do TEDH e tem múltiplos erros de raciocínio.
55. Se os tribunais condenassem exemplarmente o Estado, este punha-lhe meios à disposição para serem céleres.
56. O direito à justiça em prazo razoável é um direito fundamental previsto no artigo 20 da CRP e como tal deve ser indemnizado.
57. Deve condenar-se o Estado a pagar uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a quinze mil e novecentos euros pela duração do processo 1446/06.6BEVIS.
58. Assim se revogando a sentença, que violou o artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a jurisprudência do TEDH, disposição que deveria ser interpretada no sentido das conclusões anteriores. JUSTIÇA!”
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
As principais questões a apreciar resultam, designadamente, da necessidade de verificar os suscitados atrasos de justiça, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada, a qual aqui se reproduz:
“1) O autor é advogado inscrito na Ordem dos Advogados desde 31/03/1978, cédula 1331 C, cédula profissional – cfr. doc 1 junto com a petição inicial.
2) No dia 22/09/2006 o autor intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu uma ação declarativa administrativa comum sob a forma ordinária contra o Estado português, sobre responsabilidade civil extracontratual do Estado nos termos do artº 4º, nº 1, alínea g), do ETAF (funcionamento da administração da justiça), ação que correu sob o nº 1446/06.6BEVIS, por violação da sua obrigação de proferir uma decisão jurisdicional em prazo razoável, em violação, nomeadamente, do artº 6º, nº 1 e 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e, consequentemente, na condenação do Estado português no pagamento de uma indemnização ao autor por danos não patrimoniais ou morais e nas despesas e honorários a advogado nesse processo no tribunal administrativo;
3) O pedido era o seguinte:
“Nestes termos e nos demais de direito, deve a presente ação ser julgada procedente, por provada e, em consequência, deve:
1. declarar-se que o Estado Português violou o artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o artigo 20º, nºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa no seu segmento “direito a uma decisão em prazo razoável”;
2. declarar-se que o Estado Português violou o artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem no seu segmento direito à vida familiar do autor, como consequência da duração irrazoável do processo e independentemente disso;
3. condenar-se o Estado Português a pagar ao autor:
a) uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a quinze mil euros;
b) juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a citação até efetivo pagamento sobre quinze mil euros;
c) despesas de abertura de dossier, despesas administrativas e de expediente, taxas de justiça pagas pelo requerente, despesas de certidões, todas as despesas de tradução de documentos e quaisquer outras;
d) e honorários a advogado neste processo nos Tribunais Administrativos, conforme artigos 28º a 31º, mas nunca inferiores a cinco mil euros;
e) juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a citação até efetivo pagamento sobre as quantias referidas em c), d), f) e g);
f) a todas as verbas atrás referidas devem acrescer quaisquer quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado;
g) deve ainda ser condenado em custas e demais encargos legais, como o reembolso de taxas de justiça inicial e subsequente e preparos para despesas e quaisquer outras pagas pelo autor.
4) Foi paga a taxa de justiça no montante de 133,50€.
5) Com a petição inicial, em que o A. requereu a final que, para prova dos factos por si alegados, o Réu juntasse o Processo nº 3/2004 – Apenso E, do 2º Juízo Cível do Tribunal de Oliveira de Azeméis, em que aquele era parte.
6) Em 17/10/2006 o réu-Estado requereu a prorrogação por 30 dias do prazo para contestar.
7) Por despacho de 18/10/2006 o tribunal concedeu a prorrogação do prazo requerida pelo réu-Estado;
8) Em 27/11/2006 o Estado português apresentou a sua Contestação, pedindo a improcedência da ação e consequente absolvição do réu-Estado dos pedidos formulados pelo autor e ainda a condenação como litigante de má-fé do ora autor.
9) Em 15/12/2006 o autor respondeu ao pedido de condenação como litigante de má-fé, à exceção de abuso de direito e à exceção de que, alegadamente, o processo se atrasou por culpa do autor, ora requerente, formulado pelo réu-Estado na sua Contestação, concluindo a resposta como na petição inicial, requerendo ainda ao tribunal a condenação do réu-Estado como litigante de má-fé em multa, indemnização, nas despesas e honorários condignos à mandatária do autor, ora requerente.
10) Com a resposta que o mesmo apresentou em 15/12/2006 ao “pedido de condenação como litigante de má-fé, à exceção de abuso de direito e à exceção de que o processo se atrasou por culpa do autor”, em que, a final, requereu que fosse ordenado ao R. Estado que juntasse “certidão de todo o processo 3/94/F, de Oliveira de Azeméis”, e bem assim que juntasse “todo o dossier a que corresponde a queixa contra o Estado no Tribunal Europeu e atrás referida, decisão já proferida, bem como o acórdão que venha a ser proferido”.
11) Em 27/06/2007 e, portanto, antes do despacho de12/12/2007, a Mmª Juiz titular do processo proferiu o seguinte despacho: “Atento o facto de o Autor solicitar na parte final do requerimento apresentado em 15/10/06 a junção de documentos já ordenada no processo nº 1635/06.6BEVIS, aguardem os autos até o identificado processo me seja concluso”.
12) Em 12/12/2007 foi proferido o despacho referenciado a determinar que se aguardassem os que elementos documentais em falta, nos seguintes termos: “Considerando a ligação deste processo com o processo nº 1635/06.6BEVIS e o facto de neste último processo ter-se oficiado, por solicitação do Autor, o Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis pra juntar aos autos cópia dos documentos ainda em falta, aguardem os autos até que tais documentos sejam enviados”.
13) Ficando, assim, os autos a aguardar a junção da prova documental requerida pelo A., até que, em 08/09/2008, foi aberta conclusão com a informação de que fora apensada ao processo nº 1635/06.3BEVIS a certidão mencionada naquele despacho de 12/12/2007.
14) Por despacho de 29/09/2009, o tribunal ordenou que se oficiasse o Tribunal da Comarca de Oliveira de Azeméis juntasse aos autos os originais da ação principais e apensos.
15) Por despacho de 17/02/2010 o tribunal elaborou o despacho saneador.
16) Em 26/02/2010 o autor reclamou da Matéria assente e da Base instrutória.
17) Em 28/10/2010 juntou aos autos o seu requerimento de prova.
18) No seu requerimento probatório apresentado em 01/03/2010, o A., para além de prova testemunhal, e atualizando o pedido que anteriormente já havia efetuado a esse propósito (no articulado de 15/12/2006), requereu também que fosse ordenado ao Estado Português que “junte o dossier, decisões do TEDH e o respetivo acórdão, bem como do documento donde consta a data do trânsito relativamente à queixa do autor contra o Estado no Tribunal Europeu nº 25053/05”, reportando-se ao caso Ferreira Alves c. Portugal (nº 3), queixa, 25053/05, com acórdão proferido em 21/06/2007.
19) Em 02/03/2010 foi notificado do requerimento de prova do réu-Estado.
20) Para além de ter apresentado o requerimento probatório em 01/03/2010, veio, posteriormente, por duas vezes, em 21/05/2010 e em 27/07/2010, alterá-lo/aditá-lo, dando origem a subsequentes notificações ao R., a despachos a apreciá-los e respetivas notificações às partes.
21) Em 08/03/2010 foi notificado da apensação aos autos do Processo nº 1038/93 (Processo de Divórcio) pelo Tribunal da Comarca de Oliveira de Azeméis.
22) Em 01/03/2010, apresentou reclamação da matéria assente e da base instrutória, que veio a ser indeferida por despacho de 11/05/2010 e no qual apenas foi atendida a requerida retificação de um lapso de escrita.
23) Nesse mesmo despacho, foi ainda determinada a notificação do A. para, em 10 dias, e designadamente, especificar a que quesitos concretos pretendia que os documentos juntos, aí referenciados, fizessem prova.
24) Nesse despacho de 11/05/2010 foi ainda designado o dia 29/09/2010 para a realização da audiência de julgamento.
25) Foi paga a taxa de justiça no montante de 137,70€;
26) Em 21/05/2010 o autor juntou aos autos um aditamento ao requerimento de prova, onde requereu, nomeadamente, que o réu-Estado juntasse aos autos um acórdão do TEDH, traduzido em língua portuguesa, que condenou o Estado português por violação da justiça em prazo razoável, bem como todo o dossier correspondente às 2 queixas no TEDH que deram origem a esse acórdão do TEDH.
27) Por despacho de 26/05/2010 foi admitido o aditamento ao requerimento de prova e fixada definitivamente a data de julgamento para o dia 29/09/2010.
28) O Ministério Público, em representação do R., efetuou uma panóplia de diligências para concretizar essa junção, nos termos descritos nos requerimentos de 04/06/2010 e de 14/07/2010, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
29) Em 21/06/2010 o autor foi notificado da junção aos autos pelo réu-Estado da tradução em língua portuguesa de dois acórdãos do TEDH e, ainda, a documentação referente às queixas que a eles deram origem.
30) Foi realizada a audiência de julgamento em 29/09/2010.
31) Por despacho de 02/11/2010, o Mmo. Juiz titular do processo justificou o facto de dar sem efeito a data marcada para a leitura dos quesitos e o seu agendamento para o dia 05/11/2010 por motivos de saúde, nos termos que dele constam, que se dão por reproduzidos.
32) O mesmo sucedendo no despacho de 05/11/2010, que igualmente se dá por reproduzido.
33) E já antes, no seu despacho de 26/10/2010, o Mmo. Juiz titular do processo justificara o facto de dar sem efeito a data que primitivamente havia designado para o efeito por não lhe ter “sido possível dar as respostas aos quesitos no dia de hoje o que sucedeu em virtude de acumulação de serviço, nomeadamente inúmeras diligências em sala, com audiências de julgamento e inquirição de testemunhas, e ainda, pelo facto de haver necessidade de consultar exaustivamente os processos apensos constituídos por muitos volumes”.
34) Em 10/11/2010 o requerente foi notificado de diligências complementares.
25) Em 23/03/2011 o Autor foi notificado da Resposta à matéria de facto.
36) A sentença foi proferida em 11/12/2015, julgando-se a presente ação improcedente, por não provada, e, em consequência, absolvendo-se o Réu Estado Português, dos pedidos formulados pelo Autor, J.J.F.A..
37) Em 11/01/2016, o autor interpôs recurso.
38) Pagando a taxa de justiça de 153€.
39) Nas alegações de recurso apresentadas em 11/01/2016, o A., para além de juntar acórdãos do TCAN, requereu também, a final, que o R. Estado Português juntasse aos autos, em português, o acórdão Affaire F.S.P c. Portugal e o acórdão Affaire V.M.N. c. Portugal “que devem ser pedidos à PDG como de costume. Esta, por força da Convenção, está obrigada a traduzi-los oficialmente”.
40) O Estado contra-alegou em 09/03/2016.
41) Após as contra-alegações apresentadas em 09/03/2016, verificou-se uma específica tramitação do processo com vista a apreciar e satisfazer tal pretensão.
42) Prolação de despacho em 19/04/2016 a determinar a notificação do R. para se pronunciar sobre esse requerimento do A.;
43) Pronúncia do Ministério Público, em 27/04/2016, em representação do R., a informar que, de momento, não lhe é possível juntar os referidos Acórdãos e a respetiva tradução, carecendo de ser solicitados à Procuradoria-Geral da República e a requerer prazo não inferior a 90 dias para dar satisfação ao requerido;
44) Prolação de despacho em 03/05//2016, a conceder o prazo de 45 dias, com a possibilidade de ser requerida prorrogação, se não for suficiente;
45) Apresentação, em 31/05/2016, de cópia da tradução do acórdão do caso Valada Neves c. Portugal, com o esclarecimento de não ser possível juntar o outro acórdão solicitado pelo A., “dado o mesmo não ter sido traduzido, nem se prevê que o seja, conforme informação da Procuradoria-Geral da República”, segundo a qual o “acórdão proferido no caso Santos Pardal contra Portugal, (…) não foi traduzido nem se prevê que o seja, pelo menos nos próximos tempos. De facto, contrariamente ao que é invocado pela parte, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem não estabeleceu qualquer obrigação para que os Estados-membros traduzam os acórdãos do TEDH, cujas línguas oficiais são o francês e o inglês. Apenas existem recomendações do Conselho da Europa (que não são obrigatórias) no sentido de serem traduzidas ou elaboradas sínteses, designadamente dos casos mais relevantes para efeitos de divulgação e assimilação na comunidade jurídica”.
46) Prolação de despacho em 12/07/2016, a determinar a notificação do A. para se pronunciar quanto ao facto de não ter sido junto um dos acórdãos que o mesmo havia solicitado e se, “assim, se conforma ou não com aquela não junção pelas razões apresentadas e, consequentemente, se prescinde ou não dessa junção”.
47) Apresentação, em 14/07/2016, de requerimento do A. a “informar que prescinde da tradução do acórdão “Santos Pardal c. Portugal pois os tribunais são obrigados a conhecer a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sob pena de responsabilidade civil extracontratual”.
48) O processo subiu ao TCAN após despacho do tribunal de primeira instância de 06/06/2017.
49) O TCAN proferiu acórdão em 03/11/2017, concedendo parcial provimento ao recurso, com o seguinte segmento decisório:
50) Em 13/11/2017 o autor interpôs recurso para o STA.
51) Pagando a taxa de justiça de 153€.
52) O Estado contra-alegou em 06/02/2018.
53) Por acórdão de 22/03/2018, o STA não admitiu o recurso.
54) O processo de inquérito decorrente da participação disciplinar apresentada pelo A. contra o Mm.º Juiz titular do processo, Dr. J. M., foi arquivado, por deliberação do CSTAF de 12/11/2018 – conforme informação prestada pelo Mm.º Juiz Presidente, em ofício junto como doc. nº 1 com a contestação.
55) O autor tinha a tramitar outros processos.
56) O autor manteve-se numa situação de incerteza durante vários anos, causando-lhe ansiedade, angústia, incerteza, preocupações e aborrecimentos, por nunca saber qual o desfecho dos processos.
57) O autor sentiu-se e sente-se frustrado pela ineficácia do sistema na defesa dos seus interesses;
57) Por causa das demoras dos processos e de tudo isso, o autor teve insónias, noites em branco, mostrando-se incomodado, irritado e ansioso.
58) O autor sofre de hipertensão, há cerca de 10 anos, tomando para a hipertensão o medicamento NEBIVOLOL.
59) O autor sentiu-se revoltado com a duração do processo.
60) O autor não constituiu mandatário judicial.

IV – Do Direito
No que ao discurso fundamentador concerne, expendeu-se no Tribunal a quo, e no que aqui releva, designadamente o seguinte:
“Quanto ao facto não existem dúvidas, que estamos perante um ato ou comportamento humano omissivo dominado ou dominável pela vontade.
Quanto à ilicitude importa aferir das normas violadas.
A este propósito veja-se o Acórdão de 30/03/2006 do TCA- Norte em que foi Relator o Juiz Desembargador Carlos Luís Medeiros de Carvalho, que se transcreve parte:
“Na verdade, no que tange à apreciação e integração do conceito de justiça em “prazo razoável” ou de obtenção de decisão em “prazo razoável” temos que se trata dum processo de avaliação a ter de ser aferido “in concreto” e nunca em abstrato, pelo que, nessa tarefa, nunca nos poderemos socorrer única e exclusivamente do que deriva das regras legais que definem o prazo ou os sucessivos prazos para a prática e prolação dos atos processuais pelos vários intervenientes.
Nessa medida, a apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida, no caso vertente (uma ação cível declarativa), a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso (incluindo a junto do Tribunal Constitucional) e ainda a fase executiva.
Para tal tarefa de avaliação e de ponderação afigura-se-nos adequado e útil fazer apelo à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) quanto à metodologia para avaliar a razoabilidade da duração dum processo [cfr. Dr. Luís Guilherme Catarino in: ob. cit., págs. 393 e segs.; Dr.ª Isabel Fonseca em “A garantia do prazo razoável: o juiz de Estrasburgo e o juiz nacional” in: CJA n.º 44, págs. 43 e segs, em especial, págs. 58 a 60].
Tal jurisprudência, inicialmente, serviu-se apenas de três critérios:
1º) O da complexidade do processo;
2º) O do comportamento das partes; e
3º) O da atuação das autoridades competentes no processo.
Mais recentemente aquela jurisprudência acrescentou um outro critério (4º) que se prende com o assunto do processo e ao significado que ele pode ter para o requerente (“l’ enjeu du litige”), sendo que todos estes critérios são valorados e aferidos em concreto atendendo “às circunstâncias da causa”.
Chamando aqui à colação aquela jurisprudência do Tribunal de Estrasburgo para a definição ou integração de cada um destes critérios temos que quanto ao primeiro critério se analisam tanto as circunstâncias de facto como o enquadramento jurídico do processo [mormente, número de pessoas/partes envolvidas na ação; tipo de peças processuais, nomeadamente, articulados; produção de prova e que tipos de prova foram produzidos, incluindo a pericial ou a realização de prova com recurso a cartas precatórias/rogatórias, ou que envolvam investigações de âmbito ou dimensão internacional; sentença (as dificuldades da aplicação do direito ao caso concreto, dúvidas sobre as questões jurídicas em discussão ou própria natureza complexa do litígio); número de jurisdições envolvidas por via de recursos; elaboração da conta].
É assim que o número e a complexidade das questões de facto, a dificuldade das questões de direito, o volume do processo, a quantidade de provas a produzir, devem ser tomadas em conta no cômputo do prazo, sendo que não haverá que levar em conta quanto à complexidade da causa quando o atraso respeite a um ato ou uma fase processual em que ela não tenha incidência.
Já quanto ao segundo critério a avaliação do comportamento das partes atende não só ao uso do processo para o exercício ou efetivação de direitos como à utilização de mecanismos processuais (afere-se, nomeadamente, o uso de expedientes ou certas faculdades que obstam ao regular andamento do processo, v.g., a constante substituição do advogado, a demora na entrega de peças processuais, a recusa em aceitar as vias de instrução oral, o abuso de vias de impugnação e recurso sempre que a atitude das partes se revele abusiva e dilatória). Daí que o TEDH exige que o queixoso, aqui A., tenha tido uma “diligência normal” no decurso do processo, não lhe sendo imputável a demora decorrente do exercício de direitos ou poderes processuais, como o de recorrer ou de suscitar incidentes. Relativamente ao terceiro critério atende-se não apenas aos comportamentos das autoridades judiciárias no processo mas também ao comportamento dos órgãos do poder executivo e legislativo, exigindo-se, assim, que o direito ao processo equitativo se concretize com reformas legislativas ao nível das leis de processo e com reformas estruturais, mormente, com reforço dos meios humanos e materiais.
A este propósito o TEDH tem considerado que a invocação de excesso de zelo para a realização de prova, a “lacuna na sua ordem jurídica”, a “complexidade da sua estrutura judiciária”, a doença temporária do pessoal do tribunal, a falta de meios e de recursos, uma recessão económica, uma crise política temporária ou a insuficiência provisória de meios e recursos no tribunal, não podem servir como razão suficiente para desculpar o Estado pelos períodos de tempo em que os processos estão parados traduzindo-se em situação de demora excessiva do processo o que constituiria infração ao art. 6.º da CEDH porquanto face à ratificação desta Convenção pelos Estados estes comprometem-se a organizar os respetivos sistemas judiciários de molde a darem cumprimento aos ditames decorrentes daquele art. 6.º.
Também a justificação do atraso na prolação de decisão judicial com base no volume de trabalho não tem merecido aceitação pois se pode afastar a responsabilidade pessoal dos juízes não afasta a responsabilidade dos Estados.
Assim, para efeitos de avaliar se houve violação do direito à justiça em “prazo razoável” a conduta negligente ou omissiva do juiz é equivalente à inércia do tribunal ou de qualquer autoridade dependente do tribunal em que corre o processo. Nessa medida, quer estejamos perante atuação ou omissão de juiz, quer estejamos face a ausência de juiz, de falta de juízes por não haverem sido formados ou por má gestão dos respetivos quadros face ao volume de serviço do tribunal (deficiente definição dos quadros), quer, ainda, quando haja grande volume de serviço e não haja um adequado quadro de funcionários judiciais, o Estado responderá civilmente pela desorganização do aparelho judicial.
Por fim quanto ao quarto critério analisa-se ou afere-se a natureza do litígio, assunto objeto de apreciação e tipo de consequências que dele resultam para a vida pessoal ou profissional das pessoas ou sujeitos envolvidos, mormente, a importância que a decisão tem para as partes.
Este último critério tem desempenhado ou assumido um papel cada vez mais relevante, a ponto de ser utilizado na apreciação da razoabilidade da duração dos processos em que se discutem certos direitos, mormente, em áreas como as da assistência social, as do emprego, as dos sinistros rodoviários ou ainda as relativas ao estado civil das pessoas (sua regularização).”
Ora, no caso vertente, atenta a matéria que resulta provada, considerando a data da entrada do processo e o seu terminus, dúvidas inexistem em como se ultrapassam qualquer consideração de prazo razoável exigido pelo art. 6.º § 1 da CEDH.
Quanto à complexidade da causa, verifica-se que a mesma pode ter incidência no âmbito do processo, todavia, não poderia ser de 11 anos.
No que diz respeito ao comportamento das partes, houve alguns expedientes, recursos que demoram a ação
Relativamente à atuação das autoridades competentes no processo, exige-se aos órgãos do poder legislativo e executivo que o direito ao processo equitativo se concretize com reformas legislativas estruturais ao nível dos meios técnicos, materiais e humanos ao serviço da justiça.
Como melhor se infere da matéria dada por provada, resulta verificado o requisito da ilicitude.
No que concerne ao requisito culpa o mesmo tem-se por verificado uma vez que o Réu atuou com culpa pois ficou bem patente o deficiente ou o ineficiente funcionamento do aparelho judiciário que permitiu que o processo durasse mais de 10 anos.
Relativamente ao Dano, como se refere no Acórdão do TCA- Norte citado:
“Como decorre do n.º 1 do art. 564.º do aludido Código o dever de indemnizar em matéria de “danos patrimoniais” compreende não só o prejuízo causado, ou seja, os “danos emergentes” (“prejuízo causado nos bens ou nos direitos já existentes na titularidade do lesado à data da lesão” - cfr. Prof. A. Varela in: “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 10ª edição, pág. 599), como também os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, ou seja, os “lucros cessantes” (“benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão” - cfr. Prof. A. Varela in: ob. cit., pág. 599) sendo que nos termos do n.º 2 daquele mesmo normativo na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; e se não forem determináveis a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior.
Mas na fixação da indemnização deve atender-se não só aos danos patrimoniais mas, também, aos “danos não patrimoniais”, sendo que quanto a estes últimos importa ainda atender ao regime legal que decorre do art. 496.º do C. Civil.
Decorre deste preceito que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (n.º 1), sendo o montante fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º, isto é, tomando em consideração o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (n.º 3).
Na caracterização deste tipo de danos poderá partir-se do axioma que estabelece que tal prejuízo é o sofrimento psicossomático experimentado pelo lesado, ou pessoas que tenham direito a indemnização por esse tipo de dano à luz dos normativos próprios. Os danos não patrimoniais traduzem-se nas lesões que não implicam diretamente consequências patrimoniais imediatamente valoráveis em termos económicos, lesões essas que abarcam as dores físicas e o sofrimento psicológico, um injusto turbamento de ânimo na vítima ou nas pessoas supra aludidas.
Segundo Prof. C. Mota Pinto (in: "Teoria Geral do Direito Civil", 3ª Ed., pág. 115) os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis; não podem ser reintegrados mesmo por equivalente. Mas é possível, em certa medida contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas da utilização. Não se trata, portanto, de atribuir ao lesado um "preço de dor" ou um "preço de sangue", mas de proporcionar uma satisfação em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir mesmo interesses de ordem ideal.
Resulta, assim, que o julgador, para a decisão a proferir no que respeita à valoração pecuniária dos danos não patrimoniais, em cumprimento do normativo legal que o manda julgar e harmonia com a equidade, deverá atender aos fatores expressamente referidos na lei e, bem assim, a outras circunstâncias que emergem da factualidade provada. Tudo com o objetivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofreu.
A lei não enuncia ou enumera quais os danos não patrimoniais indemnizáveis antes confiando aos tribunais, ao julgador, o encargo ou tal tarefa à luz do que se disciplina no citado art. 496.º, n.º 1 do C. Civil”.
Ora, no caso vertente verifica-se o requisito do dano não patrimonial.
A questão mais melindrosa será a obrigação ou não de indemnizar por danos não patrimoniais.
A possibilidade de a mera ofensa de um direito fundamental ser geradora da obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais, é imposta pelo próprio artigo 22.º da CRP, que, ao estabelecer que «o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por ações ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem», admite a possibilidade de indemnização por tais violações independentemente de prejuízos (danos materiais).
A questão foi exaustivamente analisada no Acórdão do STA de 09/10/2008, em que foi Relator o Juiz Conselheiro Rosendo José, no âmbito do Processo n.º 0319/08, e que se transcreve em parte: “… Grande parte dos casos colocados no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, apesar de se atestar que ocorreu violação do art. 6.º, § 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, por ser excedido o «prazo razoável», entendeu-se não haver lugar a indemnização por danos morais decorrentes dessa violação, por o prejuízo moral invocado ter outra causa, o que significa, assim, que a indemnização por danos morais decorrentes não é automática, dependendo da existência de nexo de causalidade entre o atraso e os danos morais que se consideram provados.
O STA já se pronunciou sobre a questão no Acórdão de 28.11.07, rec. P.308/07, a propósito da densificação do conceito de danos morais indemnizáveis para efeitos do artº 6º da CEDH, o seguinte:
… Reconhecida a importância da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, devemos, então, porque interessa ao caso sujeito, ter em conta a posição dessa instância europeia quanto a danos morais, por falta de decisão em prazo razoável, que encontramos assim resumida no ponto 94. do acórdão nº 62361, de 29 de Março de 2006 (caso Riccardi Pizzati c. Itália):
(i) O Tribunal considera que o dano não patrimonial é a consequência normal, ainda que não automática, da violação do direito a uma decisão em prazo razoável e presume-se como existente, sem necessidade de dele fazer prova, sempre que a violação tenha sido objetivamente constatada;
(ii) (ii) O Tribunal considera, também, que esta forte presunção é ilidível, havendo casos em que a duração excessiva do processo provoca apenas um dano moral mínimo ou, até, nenhum dano moral, sendo que, então o juiz nacional deverá justificar a sua decisão, motivando-a suficientemente.
Quanto ao modo de reparação, constatada a violação, por não ser já possível, pelo direito interno do Estado proceder à reintegração natural, o Tribunal, nos termos previstos no artº 41º da Convenção fixará uma indemnização razoável, quando houver um prejuízo moral e um nexo de causalidade entre a violação e esse prejuízo.
Por vezes o Tribunal entende que a constatação da violação é bastante para reparar o dano moral (vide Ireneu Barreto, “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Anotada, p. 300; acórdão de 26 de Junho de 1991, processo nº 12369/86, no caso Letellier c. França; acórdão de 21 de Abril de 2005, processo nº 3028/03, no caso Basoukou c. Grécia)
No caso em apreço, o tribunal a quo considerou que foi violado o direito dos autores à decisão da sua causa em prazo razoável e, a par disso, deu como provados os seguintes danos: “enquanto durou a ação os autores mantiveram-se numa situação de incerteza durante anos, nomeadamente no que tange à planificação das decisões a tomar, não puderam organizar-se e os factos em causa originaram-lhes ansiedade, depressão, angústia, incerteza, preocupações e aborrecimentos”.
Deste modo, tendo sido alegados danos específicos, que estão assentes por prova direta, não há lugar, no caso em análise, a discutir se o tribunal a quo haveria ou não de considerar, por presunção, a existência de danos não patrimoniais. Na verdade, onde houver prova direta não deve julgar-se por mera presunção (cf. artº 349º CCivil e Antunes Varela, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., p. 501).
(…)
… a jurisprudência do TEDH, relativamente aos danos morais suportados pelas vítimas de violação da Convenção, não restringe a dignidade indemnizatória aos de especial gravidade e, em casos similares, de ofensa ao direito a uma decisão em prazo razoável, tem entendido que a constatação da violação não é bastante para reparar o dano moral (vide, por exemplo: acórdão de 21 de Março de 2002, processo nº 46462/99, no caso F… c. Portugal; acórdão de 29 de Abril de 2004, processo nº 58617/00, proferido no caso G… c. Portugal). Razão pela qual, estando em causa uma violação do art. 6º § 1º da Convenção e a sua reparação, em primeira linha, ao abrigo do princípio da subsidiariedade, pelo Estado Português, a norma do art. 496º/1 do C. Civil haverá de interpretar-se e aplicar-se de molde a produzir efeitos conformes com os princípios da Convenção, tal como são interpretados pela jurisprudência do TEDH (vide ponto 80. do acórdão de 29 de Março de 2006, proferido no processo nº 64890/01, no caso Apicella c. Itália).»
Ora, assim sendo, a violação do direito a uma decisão em prazo razoável, consagrado no artº 20º, nº 4 da CRP e no artº 6º, nº1 da CEDH, não confere direito automático a uma indemnização, independentemente da existência de danos, isto sem prejuízo de existir uma presunção natural, ilidível, de dano moral, sempre que essa violação tiver sido objetivamente constatada.
A violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável constitui, sem dúvida, violação do direito fundamental a uma tutela judicial efetiva, nos termos dos já citados artº 20º, nº 4 da CRP e artº 6º, nº 1 da CEDH, mas, em primeiro lugar há que demonstrar essa violação e, portanto, o facto ilícito e culposo, pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado aqui em causa, o que incumbe aos AA, nos termos do artº 487º, nº 1 do CC. Só depois de objetivamente provada essa violação, é que funciona a presunção natural ou judicial de dano moral, de que dessa violação resulta um dano moral para o interessado naquela decisão judicial, presunção que, todavia, pode ser ilidida por mera contraprova.
… Assim, recaindo sobre o lesado o ónus da prova dos requisitos da responsabilidade civil extracontratual (art. 487.º, n.º 1, do Código Civil), a dúvida criada, mediante contraprova, sobre os factos alegados pelos AA para demonstrar a existência do dano moral presumido deve ser valorada processualmente contra aqueles, considerando não provado esse requisito da obrigação de indemnizar.
… Quanto a “terem sofrido de forte ansiedade” ou os danos superiores aos comuns destas situações os A.A. não têm razão, porque não tendo feito a prova que lhes competia para beneficiar desses factos não podem invocar a presunção.
A questão coloca-se quanto àquele dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêm as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo. A existência deste dano é um facto da vida, conhecido de todos.
Como resulta do artº 514º do CPC, factos notórios são aqueles que são do conhecimento geral e, por isso, não carecem de prova, nem de alegação. A este dano que todos sabemos que existe acrescem, evidentemente os danos que os AA consigam provar relativos à situação concreta. Mas, a falta de prova do dano excedente do comum não retira a existência deste último, nem é prova em contrário (ou seja prova de que em concreto não houve dano, ou que havendo-o, não é indemnizável por ser devido a causas diferentes do atraso irrazoável na administração da justiça).
Questão diferente é saber se o dano comum resultante do atraso na administração da justiça assume gravidade tal que justifique a reparação face ao preceito legal do art.º 496.º do CCiv. que determina a indemnização dos «danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito». Sobre este ponto se pronunciou o Ac. deste STA de 28.11.07; P. 0308/07, cujo sumário refere: “Na densificação dos conceitos da Convenção, entre os quais os de prazo razoável de decisão, indemnização razoável e danos morais indemnizáveis, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem desempenhará seguramente um papel de relevo”.
É sabido e foi acima explicitado em que termos tal jurisprudência tem admitido generalizadamente a relevância do dano moral decorrente do atraso na administração da justiça mesmo quando se trata do dano comum notoriamente conhecido, sem mais caracterização ou prova. Na linha de entendimento do Ac. acabado de citar, que se adota aqui e que correspondem à aplicação da doutrina que dimana da Jurisprudência do TEDH, o dano não patrimonial das pessoas lesadas pela falta de decisão em prazo razoável merece a tutela do direito mesmo que não se efetue uma específica prova de ter causado grande sofrimento ou sensível alteração da vida ou de comportamentos, depressão ou outra situação clinicamente caracterizável como de sofrimento psicológico e moral.”
(...)
Ora, como resulta da matéria provada o Autor manteve-se numa situação de incerteza durante vários anos, causando-lhe ansiedade, angústia, incerteza, preocupações e aborrecimentos, por nunca saber qual o desfecho dos processos.
O autor sentiu-se e sente-se frustrado pela ineficácia do sistema na defesa dos seus interesses.
Por causa das demoras dos processos e de tudo isso, o autor teve insónias, noites em branco, mostrando-se incomodado, irritado e ansioso.
No que respeita ao nexo da causalidade adequado e sem necessidade de qualquer outra argumentação, por ser evidente, esse nexo decorrente do atraso da tramitação do processo e os danos invocados, considera-se verificado esse requisito.
Porém, a determinação das indemnizações por danos morais é sempre controversa e árdua, posto que o montante delas deve ser fixado equitativamente (o art. 496.º, n.º 3 do CC). Mas não se trata de uma atividade arbitrária, havendo que ponderar a gravidade dos danos, os fins gerais e especiais a que se inclinam as indemnizações daquele tipo e a prática jurisprudencial em situações similares – cfr. Ac do STA de 08/11/2007.
No caso vertente não podemos esquecer que o Autor levou largos anos para ver decidida a ação que era também ela por não ser feita célere justiça e por lhe dizer diretamente respeito.
Porém, deveremos atender ao que já foi decidido a nível nacional, salientando, o decidido no Ac. do TCAN de 06/05/2016, no âmbito do proc. 01358/07.6BEVIS, em que veio a ser considerado como equitativo o valor de €400 por cada ano de demora excessiva (e não de pendência dos autos).
Aí se considerando, por um lado, é preciso cuidar “de determinar qual o prazo de duração da ação que reputaria razoável, para depois apurar o período de duração que reputava excessivo”.
E, por outro lado, que: “Tal valor/ano (€400) não se afigura insuficiente, considerando que os danos correspondem apenas ao que é normal nestas situações e os interesses em jogo são de natureza patrimonial (direito de propriedade). O valor fixado também é conforme ao padrão estabelecido pelo TEDH, o que se extrai do caso Musci c. Itália (P. 64699/01) variável entre €1000 e €1500 por cada ano de demora do processo, mas sem esquecer que se trata de uma “mera base de partida suscetível de ser aumentada ou diminuída, de acordo com os danos concretos, a importância dos interesses em jogo e o comportamento do requerente eventualmente justificativo da demora” (cfr. Isabel Celeste Fonseca, “Violação do prazo razoável e reparação do dano …”, em anotação ao citado Acórdão do STA de 09.10.2008, P. 0319/80, CJA 72, 46, n. 18)”.
Aliás, e como aí também se referiu, “não são escassos os casos em que o TEDH atribuiu indemnizações de valor bastante inferior àquela grelha, como evidenciam os arestos citados na sentença recorrida (retirados do referido artigo de Isabel Celeste Fonseca, pág. 41, n 9)”.
Também, não podemos esquecer o nível de vida que existe em Portugal em contrabalanço como a maioria dos países da União Europeia em que o salário mínimo é superior a 1.000€ e em Portugal é de 600€.
No caso vertente, considerando que o dano moral a reparar não excede o comum destas situações, que os interesses em jogo não são de especial relevância (não podem ser colocados no mesmo plano dos danos decorrentes, por exemplo, do atraso na regulação de um poder paternal, no âmbito do processo n.º 1446/06.6BEVIS e que a demora global desse processo, que consideramos ser de 7 anos, atendendo à complexidade e a conduta do autor que permitiu uma tramitação, em certos momentos processuais mais demorada (veja-se a matéria provada).
Acresce que a fixação de indemnização nesse processo foi fixada em termos atuais, ou seja atendendo à situação do autor, à data da prolação da decisão que a fixou, isto é, em 03/11/2017.
Pelo que, afigura-se equitativa a indemnização a fixar em 600 euros por cada ano de atraso (7 anos de atrasox600€), perfazendo, assim a quantia de 4.200€.
Deste modo, a título de danos morais, considerando a matéria provada e os princípios que norteiam o quantum indemnizatório, como justa na quantia de 4.200€.
No que concerne ao pedido de condenação do réu a pagar os honorários a advogado neste processo nos Tribunais Administrativos em quantia a fixar equitativamente, caso o autor constitua mandatário, considerando que o autor não constituiu mandatário, os mesmos não são devidos.
Quanto aos juros de mora, o A. peticionou ainda juros de mora à taxa legal, a acrescer ao valor da quantia peticionada na alínea a) a título de danos não patrimoniais, desde a citação até integral pagamento.
Porém, como se decidiu no Ac. do TCAN de 05/07/2012, proc. 02767/06.3BEPRT, fazendo apelo ao Ac. Uniformizador de Jurisprudência do STJ nº 4/2002, “a indemnização por danos morais é, por natureza, calculada em termos atuais; daí que os respetivos juros sejam contados desde a sentença da primeira instância e não desde a citação, face ao disposto nos arts. 566º, nº 2, 805º, nº 3, e 806º, do CC.”

Vejamos:
Importa analisar a questão controvertida em temos globais, em face do que as questões colocadas, quer no Recurso independente, quer no Recurso subordinado, serão tratadas em conjunto, uma vez que ambos questionam predominantemente o quantitativo da indemnização fixada, no recurso independente, entendendo-se ser esse valor insuficiente e no recurso subordinado, considerando-se essa valor excessivo.

Com efeito, entende o então Autor que foi violado o art. 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, bem como o art. 20º, nº 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, no que respeita ao “direito a uma decisão em prazo razoável”, tendo peticionado, em síntese, a atribuição de uma indemnização por danos não patrimoniais nunca inferior a €15.900 pela duração do processo nº 1446/06.6BEVIS.

O Tribunal a quo veio a julgar a ação parcialmente procedente, tendo atribuído uma indemnização de €4.200, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data da prolação da sentença, pela duração da referida Ação nº 1446/06.6BEVIS, processo já de atraso da justiça, correspondente a €600 por cada ano de demora excessiva, e não de pendência dos autos.

Considerou assim o tribunal a quo, que a demora (não a duração) do processo se cifrou em 7 anos, o que aqui de ratifica, uma vez que o que está em causa, não é a duração do Processo, mas antes a sua duração excessiva, o que sempre determina que se afira singelamente o período de tramitação do mesmo que tenha ultrapassado o período normal, aceitável e razoável.

É incontornável que a decisão proferida no Processo exatamente por atraso na Justiça nº 1446/06.6BEVIS foi excessiva, ainda que o atraso se tenha centrado predominantemente em 1ª Instância, o que se compreende, pela sua exorbitante pendência processual

Em qualquer caso, estão aqui em causa os danos causalmente provocados pelo facto ilícito, resultante da violação do direito a uma decisão em prazo razoável do processo nº 1446/06.6BEVIS, e não quaisquer outros invocados.

De facto, independentemente de quaisquer questões colaterais e dilatórias que poderão ter agravado o atraso verificado na tramitação do processo, mal se compreende que um processo exatamente por atraso da justiça tenha uma duração de cerca de 11 anos, ainda que se admita que a premência e natureza de uma decisão no âmbito da regulamentação do Poder paternal, como era o originário processo, e uma decisão relativa a um atraso da justiça, é na esfera jurídica do seu destinatário, manifestamente diversa, sendo esta mitigadamente indemnizável.

Como se sumariou no Acórdão do STA de 05/07/2018:
I - Constatada uma violação do art. 6.º, § 1.º, da CEDH, relativamente ao direito à emissão de uma decisão judicial em prazo razoável, existe e opera, em favor da vítima daquela violação da Convenção, uma forte presunção natural da verificação de um relevante dano psicológico e moral comum, de natureza não patrimonial, sofrido por todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo em tempo razoável.
II - Àquela vítima impenderá um ónus de alegação e de prova dos danos não patrimoniais que excedam aquele dano comum e se mostrem relativos à sua específica situação concreta.
III - Tal presunção é, todavia, ilidível pelo demandado, impendendo sobre este o ónus de alegação e de prova em concreto da inexistência daquele dano e do afastamento do automatismo entre a violação constatada da Convenção e aquele dano.
IV - O demandante, para poder beneficiar da operatividade e aplicação daquela presunção, carecerá apenas de alegar e demonstrar a existência de uma violação objetivamente constatada da Convenção, nisso radicando o seu ónus de alegação e prova, que, uma vez satisfeito, conduz a que se presuma como existente o dano psicológico e moral comum, sem necessidade de que dele por si seja feita a sua prova.”

Como se afirmou já, refira-se que se acompanha o raciocínio determinante de ter sido entendido em 1ª instância, ser de 7 anos o atraso da justiça verificado, atentas as vicissitudes processuais e procedimentais verificadas, importando agora encontrar o quantitativo anual indemnizável decorrente desse atraso.
Com efeito, é pacífico, por força do disposto no artigo 22.º da Constituição, que o Estado é civilmente responsável pelos danos decorrentes da violação do direito à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável, consagrado no artigo 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH, ratificada por Portugal em 1978) e no artigo 20.º/4 da CRP (desde a revisão constitucional de 1997).

Como se sintetiza no Acórdão do STA, de 27.11.2013, P. 0144/13, convocando jurisprudência reiterada do mesmo Supremo Tribunal, o Estado será responsabilizado por atraso na justiça quando “da factualidade apurada resultar que o processo que fundamenta aquele pedido foi julgado para além do «prazo razoável», que esse atraso se ficou a dever a culpa dos serviços do Estado, que daí decorreram danos para a Autora e que existe uma relação direta entre essa demora e os prejuízos cujo ressarcimento se peticiona.”

Além disso, como salientado pelo Supremo Tribunal Administrativo (cfr., entre outros, o Acórdão do STA, de 28.11.2007, P. 308/07), a apreciação destes pressupostos implica a densificação de conceitos como o de “prazo razoável”, de “indemnização razoável” e de “danos morais indemnizáveis”, a qual não pode deixar de implicar uma interpretação do direito interno em conformidade com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), sob pena de “divergência entre a aplicação tida por apropriada na ordem nacional e a interpretação dada pelo Tribunal de Estrasburgo” (cfr. Acórdão citado).

O referido implica a adoção de uma “metodologia dialogante, que tem subjacente a ´relação fisiológica´ existente entre a jurisdição nacional e a europeia” (nas palavras de Isabel Celeste Fonseca,Violação do prazo razoável e reparação do dano: quantas novidades mamma mia! - Anotação ao Ac. do STA, de 9.10.2008, P. 319/08”, CJA, 72, 28-46,39).

No que concerne ao montante do valor indemnizatório, estando em causa danos morais estes devem ser atribuídos segundo regras da equidade, tendo sempre em atenção a situação concreta dos autos.

O montante dos danos não patrimoniais deve ser calculado, não arbitrariamente, mas atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização (artigo 496º n.º 3), aos padrões de indemnização geralmente adotados na jurisprudência, às flutuações da moeda (João de Matos Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol I, 10º edição pág 607). A indemnização, refere ainda este Autor, reveste uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar; no plano civilística e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente.

No que se refere à jurisprudência, muito vasta nesta matéria, cita-se o Acórdão do STA proc. n.º 0197/15, de 22-04-2015, no qual se sumariou que:
I - A indemnização por danos não patrimoniais visa compensar de forma justa, satisfatória e equilibrada aqueles que foram forçados a suportar desgostos e sofrimentos causados por factos ilícitos de outrem por forma, a que se sintam compensados por terem sido sujeitos a tais sofrimentos.
II - Todavia, só podem ser indemnizados os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito e, atenta a impossibilidade da sua quantificação, o seu montante tem de ser fixado equitativamente pelo Tribunal tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (art.ºs 496.º e 494.º do CC).
III - Sendo certo que a gravidade desses danos deve ser medida por um padrão tanto quanto possível objetivo e não à luz de fatores subjetivos.

Objetivando e como tem sido reiteradamente salientado, “a determinação da razoabilidade da duração do processo é feita casuisticamente e mediante uma análise global ou de conjunto do mesmo” (Acórdão do STA, de 10.09.2014, P. 090/12 que segue de perto anterior Acórdão do STA, de 09.10.2008, P. 0319/08).
Como se sintetiza no Acórdão deste TCAN, de 05.07.2012, P. 02767/06.3BEPRT: “A existência ou não de um prazo excessivo na decisão de um processo judicial deve ser aferida caso a caso tendo em conta os critérios definidos pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem: 1º - a complexidade do processo; 2º - o comportamento das partes; 3º - a atuação das autoridades competentes no processo; e 4º - a importância do objeto do litígio para o interessado”.

Ainda quanto aos critérios para determinar a razoabilidade duração do processo, sumariou-se no Acórdão do STA, de 09.10.2008, P. 0319/08, perfilhando-se jurisprudência do TEDH:
“(...) II – Nessa apreciação haverá que considerar todas as coordenadas do caso, como a duração média daquela espécie, a complexidade e ocorrências especiais, os incidentes suscitados, entre outros fatores, e que excluir o tempo de atraso injustificado que tenha ficado a dever-se à atuação da parte que pede a indemnização.
III – Se globalmente se houver de considerar excedido o prazo razoável de modo manifesto ou indiscutível não há lugar a apreciar se foram cumpridos os prazos processuais relativos a cada ato, porque mesmo quando se concluísse pelo respetivo cumprimento não se infirmaria a conclusão obtida, antes deveria concluir-se que os meios de resolução daquele conflito pela justiça estadual não são adequados e estruturados devidamente, o que envolve também responsabilidade do Estado por deficiência da organização.
IV – Se o prazo for de considerar razoável, sem margem de dúvida, também não importará que num ato, ou mesmo mais, tenha havido ligeiro atraso sem influência no resultado.
V – No caso de se suscitarem dúvidas quanto a concluir que foi ultrapassado, ou não, o prazo razoável, um caminho consiste em analisar o cumprimento dos prazos processuais em cada ato da sequência que o compõe (embora não seja elemento exclusivo a ter em conta)”.

A “duração razoável” de um processo tem sido entendida à luz da jurisprudência do TEDH como correspondendo à “duração média em 1.ª instância” que deve corresponder a 3 anos ou a dois anos e sete meses, nas causas laborais e relativas a pessoas (v. Isabel Celeste Fonseca, ob. cit., 46).

Por outro lado, em jurisprudência mais recente deste TCAN sumariou-se no Processo nº 1684/13.5BEPRT, de 7 de Julho de 2017, o seguinte:
“I- A apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso.
II- Tem-se como razoável o prazo de 3 anos como duração média de um processo na primeira instância, para a generalidade das matérias, e de 4 a 6 anos para a duração global da lide, ou seja, quando haja recurso para os Tribunas Superiores.”

Em face do que precede, mostra-se que na situação em apreciação, a duração do processo se revela globalmente excedido, pois que o prazo razoável ou duração média do processo está excedido.

Para este efeito não pode deixar de se atender à duração total do processo (no sentido de que a observância do prazo razoável terá de ser avaliada em relação a toda a duração do processo (v. Carlos Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, 2.ª ed., 2011,248).

Assim, mostra-se verificada a ilicitude, traduzida num atraso na decisão do processo judicial que viola o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, garantido pelos artigos 20.º/4 da CRP e 6.º/1 da CEDH.

Importa ainda apreciar o pressuposto da culpa, ou seja, o juízo de censura que, sendo imputável ao serviço de justiça em si mesmo considerado, equivale ao conceito de “culpa do serviço”. Em concreto, trata-se de saber se a demora excessiva do processo é devida a um funcionamento deficiente dos serviços de justiça do Estado português ou se o atraso do processo terá sido causado pela mera atuação conflituosa das partes.

Resulta dos factos dados como provados, uma sucessão de diligências que terá contribuído para o atraso verificado, o que não obsta a que se ratifique o declarado atraso de 7 anos na tramitação processual, pois que importa predominante e primariamente determinar qual o prazo de duração da ação que reputaria razoável, para depois apurar o período de duração que reputava excessivo.

Assim, e em decorrência do declarado atraso de 7 anos que, como se disse, aqui se ratificará, o Estado não adotou as medidas suficientes para garantir uma justiça em “prazo razoável”.

Como referem Carlos Fernandes Cadilha, ob. cit., 246; e João Aveiro Pereira, a responsabilidade civil por atos jurisdicionais, 2001, 198, deve atender sobretudo à “unidade do Estado”, sendo-lhe “indiferente que o atraso tenha sido provocado pelos órgãos da Administração, do poder legislativo ou do poder judiciário”.

Independentemente da questão de saber a quem incumbe o ónus de provar se o Estado adotou, ou não, as medidas adequadas para garantir uma justiça em prazo razoável (cfr. Acórdão do STA, de 01.03.2011, P. 0336/10), conclui-se que quando se mostre excedido o prazo razoável de decisão do processo é ao Estado, que devia garantir tal prazo, “que incumbe alegar e provar qualquer causa justificativa do excesso verificado, já que tal constitui matéria de exceção, cujo ónus de alegação e prova cabe ao Réu, nos termos gerais (cf. art. 342.º, n.º 2 do CC)”.

O certo é que no caso vertente ficou provada uma atuação da administração da justiça do Estado ilícita e culposa, porque a morosidade processual verificada foi, em boa medida, decorrente da sua atuação, pelo menos, a título de culpa leve.

Mesmo considerando os reconhecidos e declarados 7 anos de atraso, entende-se que o valor peticionado de 15.900€ se mostra manifestamente excessivo.

Com efeito, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Tendo em linha de conta a culpa do Estado na propiciação da situação que determinou os controvertidos atrasos e as condições que o determinaram, e as suas emergentes consequências, e a intensidade e a natureza dos danos sofridos no período da intervenção no processo, justifica-se que o quantum indemnizatório fixado para os danos não patrimoniais atente nessas circunstâncias, de modo equitativo.

Em concordância com o entendimento que dimana da jurisprudência do TEDH, a jurisprudência administrativa portuguesa tem admitido generalizadamente a relevância do dano moral decorrente do atraso na justiça, mesmo quando se trata do dano comum notoriamente conhecido, sem mais caraterização ou prova (neste sentido v., entre outros, o citado Acórdão do STA, de 09.10.2008, P. 0319/08).

Tal dano não patrimonial “merece a tutela do direito mesmo que não se efetue uma específica prova de ter causado grande sofrimento ou sensível alteração da vida ou de comportamentos, depressão ou outra situação clinicamente caraterizável como de sofrimento psicológico e moral” (idem).

Este dano não patrimonial é um dano presumido, um dano moral in re ipsa “necessariamente ínsito no dano decorrente da violação do direito à prolação de sentença em prazo razoável” (Isabel Celeste Fonseca, ob. cit., 46).

Aqui chegados, entende-se como razoável e adequado o entendimento adotado no acórdão deste TCAN nº 01358/07.6BEVIS, de 06/05/2016, não se vislumbrando razões para introduzir complementarmente o salário mínimo como medida corretora do quantum indemnizatório anual, decorrente do atraso da justiça.

Com efeito, no que respeita ao dano moral indemnizável por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, a jurisprudência nacional e, nomeadamente, o Supremo Tribunal Administrativo, acolhendo jurisprudência do TEDH, tem reiteradamente afirmado que resulta um dano moral da violação do direito à obtenção em prazo razoável da decisão judicial que regule definitivamente o caso submetido a juízo, dano esse que é de presumir, embora se admita prova em contrário.

O dano moral constitui o “dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo” (cfr. Ac. do STA de 09.10.2008, P. 0319/08). A este dano (que todos sabemos que existe e que corresponde a um facto notório que não carece de alegação nem se prova – artigo 412.º do CPC) acrescem os danos que os autores consigam provar relativos à situação concreta (Acórdão do STA citado).

No caso em apreço, o tribunal recorrido considerou ocorrer demora excessiva de 7 anos na ação destinada exatamente a avaliar o atraso da justiça em anterior processo de fixação do poder paternal.

Para determinar a indemnização devida pelos danos morais decorrentes dessa demora, foram convocados os padrões fixados na jurisprudência nacional e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), considerando equitativo o valor de €600 por cada ano de atraso, concluindo ser devido um valor total de 4.200€.

Do exposto resulta que a sentença recorrida tomou em consideração, no cômputo da indemnização, a duração do processo onde se verificou a demora excessiva discutida nos autos.

Como se resume no Acórdão do TCAN de 02.07.2015, P. 02089/09.8BEPRT, a quantificação do dano não patrimonial, a efetuar de acordo com a equidade, tem que atender, nomeadamente, ao período de morosidade do processo e aos danos verificados, considerando apenas o dano comum quando o A. não consegue fazer prova de prejuízo não patrimonial superior.

No caso em apreço, ficou provado que o Autor, aqui Recorrente, em consequência da demora na decisão do processo em causa nos autos, não pôde prever a data em que terminaria; mantendo-se numa situação de incerteza, tendo sentido, designadamente, incerteza na planificação das decisões a tomar.

Em qualquer caso, atenta a natureza do atraso, entende-se como razoável e adequado, tal como fixado no referido Acórdão deste TCAN nº 01358/07.6BEVIS, de 06/05/2016, fixar a indemnização em 400€ por cada um dos 7 anos de atraso declarado, por se entender ser o valor razoavelmente adequado, atento o padrão estabelecido pelo TEDH, que se extrai do caso Musci c. Itália (P. 64699/01) variável entre €1.000 e €1.500 por cada ano de demora do processo, mas sem esquecer que se trata de uma “mera base de partida, suscetível de ser aumentada ou diminuída, de acordo com os danos concretos, a importância dos interesses em jogo e o comportamento do requerente eventualmente justificativo da demora” (cfr. Isabel Celeste Fonseca, “Violação do prazo razoável e reparação do dano...”, em anotação ao citado Acórdão do STA de 09.10.2008, P. 0319/80, CJA 72, 46, n.18).

Aliás, não são escassos os casos em que o TEDH atribuiu indemnizações de valor bastante inferior àquela grelha, como evidenciam os arestos citados na sentença recorrida.

O valor indemnizatório aqui em discussão para uma duração global do processo de 11 anos, e para um atraso declarado de 7 anos, está também em consonância com o padrão que, na linha da orientação do TEDH, tem sido fixado na jurisprudência dos tribunais nacionais.

Veja-se o citado Acórdão do STA de 09.10.2008, P. 0319/80 onde se considerou justa uma indemnização de €5.000 para os dois autores por atraso injustificado num processo executivo; o Acórdão do STA de 14.04.2016, P. 01635/15, que confirmou uma indemnização de €4.000 para uma demora excessiva de 4 anos num processo de regulação do poder paternal; o Acórdão do TCAS de 12.05.2011, P. 07472/11 que atribuiu uma indemnização de €7.500 para uma demora processual total de 11 anos; o Acórdão do TCAS de 20.03.2014, P. 09034/12, que atribuiu uma indemnização de €3.250 por danos causados por uma demora de 3 anos e 3 meses num processo que durou um total de 17 anos;

No caso vertente, considerando que o dano moral a reparar não excede o comum destas situações, que os interesses em jogo não são de especial relevância (não podem ser colocados no mesmo plano dos danos decorrentes, por exemplo, do atraso na regulação de um poder paternal) e que o atraso declarado do processo foi de 7 anos, afigura-se equitativo, à imagem do decidido no Acórdão deste TCAN nº 01358/07.6BEVIS, de 06/05/2016, fixar a indemnização em €400/ano, num total de 2.800€.

Em face do que precede, improcederá o Recurso independente, julgando-se parcialmente procedente o Recurso subsidiário.

Aliás, tendo sido fixada e já transitada em julgado, uma indemnização de 4.000€ relativamente ao Processo do atraso da justiça no Processo de fixação do poder paternal, subjacente à presente Ação, não se ignorando o valor que já havia sido fixado pelo TEDH, ainda assim, mal se compreenderia que aqui se fixasse uma indemnização de valor superior àquela que foi fixada por este Tribunal, atenta a importância pessoal e relativa de cada uma das Ações.

Como se referiu no acórdão relativo ao atraso da justiça no Processo de fixação do poder paternal, aí “estão em causa vivências íntimas, profundas inalienáveis, sobretudo quando se exprimem num conflito interpessoal insanável, existe uma intensidade emocional agravada que torna a morosidade da justiça muito mais difícil de suportar pelos seus destinatários”, nada comparável com mera quantificação da indemnização que aqui está em causa, enquanto “processo pelo atraso do atraso”.

Da Litigância de má-fé
Afirmou o Autor aqui Recorrente, na sua resposta ao Recurso subordinado que “o Estado, através do MP, comporta-se de má-fé, pelo que desde já se requer essa condenação, em multa e indemnização condigna ao autor, até pelo tempo que lhe faz perder”, mais tendo afirmado que “a sentença fixou uma indemnização desconforme com a jurisprudência do TEDH” o que seria “mais uma razão para condenar o Estado como litigante de má-fé.”

Diga-se desde já liminarmente que se não reconhece que, independentemente das posições em confronto, que o Estado, representado pelo MP tenha, tenha, em momento algum, feito ilicitamente perder tempo ao Autor, do mesmo modo que a sentença proferida em 1ª instância não afrontou a jurisprudência do TEDH, antes tendo assentado na mesma.

Em qualquer caso, e no que concerne à litigância de má-fé, refira-se o seguinte, em conformidade com o sumariado no Acórdão deste TCAN nº 1248/08BEVIS (Mirandela), de 24-02-2017:
A litigância de má-fé assenta ainda hoje no que Alberto dos Reis chamava de deveres de colaboração e de probidade. As violações a esses deveres serão relevantes apenas ao nível doloso ou da negligência grave (lides temerárias e comportamentos processuais gravemente negligentes).
Na nova sistemática processual civil passou-se a tipificar os comportamentos processuais passíveis de obter um juízo de reprovabilidade, abrangendo-se não só condutas dolosas como também as gravemente negligentes, determinantes de lesões na esfera jurídica das demais partes processuais bem como da simultânea violação de interesse públicos, base da multa a que dão também lugar.
Prevê-se a dedução de pretensão ou oposição cuja falta de fundamento se não devia ignorar, a alteração da verdade dos factos ou omissão de factos relevantes para a decisão, de modo doloso ou gravemente negligente, a omissão grave do dever de cooperação, e o uso reprovável dos instrumentos processuais (cfr. Artº 542/2 do CPCivil).
A uma previsão da utilização maliciosa e abusiva do processo, juntou-se agora um juízo de reprovação de atitudes processuais gravemente imprudentes, numa procura de elevação dos padrões éticos judiciários.
O referido nº 2, do Artº 542º, CPC, ajuda à sistematização, ao referir-se ao dolo ou negligência instrumentais (má-fé instrumental) que se contrapõe ao dolo ou negligência substanciais (má-fé material). Os primeiros terão a ver com questões de natureza processual, enquanto que os segundos dizem respeito ao fundo da causa, à relação material.
Não será lícito agir ou contraditar em juízo com má-fé ou grosseira negligência.
Nesta hipótese, terá sempre lugar o ressarcimento dos danos ou prejuízos daí resultantes.
Por se tratar de matéria de direito, a decisão sobre a existência ou não de litigância de má-fé, dependerá do critério do julgador, com base na perceção adquirida à face da factualidade provada e não provada.
Se as divergências que serviram de suporte à suscitada litigância de má-fé não puderem ter influência na decisão final a proferir, não se mostram ultrapassados os limites admissíveis na defesa dos interesses representados, em face do que não haverá lugar à condenação por litigância de má-fé.”

Em face do que precede, não se reconhece a verificação da Litigância de má-fé imputada ao Estado Português.

Em função do que se decidirá, julga-se prejudicado o demais suscitado.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, negar provimento ao Recurso independente do Autor e Julgar parcialmente procedente o Recurso subordinado, mais se decidindo:
a) Condenar o Réu a pagar ao Autor uma indemnização no valor de 2.800€, acrescida de juros de mora desde a data do trânsito em julgado da presente decisão, pela duração excessiva do Processo nº 1446/06.6BEVIS;
b) Não Condenar o Estado como litigante de má-fé.
Custas na proporção do decaimento.

Porto, 28 de fevereiro de 2020


Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa