Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00224/09.5BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/22/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CONDENAÇÃO EM PEDIDO DIVERSO; LEGALIZAÇÃO DE OBRAS; ARTIGO 73.º DO RGEU;
Sumário:I- Tendo sido deduzido pedido impugnatório contra um ato administrativo de indeferimento expresso de um pedido de legalização de obras de construção civil, não pode o Tribunal, que não cuidou de convidar o autor a substituir a petição inicial em ordem a nela formular o adequado pedido de condenação à pratica de ato devido, proferir decisão em que condena a administração à prática de ato devido, sob pena de condenar em objeto diverso do pedido.

II- Entre os vícios determinativos da nulidade da decisão judicial por nesta terem sido desrespeitados os limites que balizam essa decisão conta-se o previsto na al. e), do n.º 1 do artigo 615º do CPC, onde se estabelece que é nula a sentença em que o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

III- A norma do artigo 73.º do RGEU é uma norma relacional, que impõe restrições ao direito de propriedade assentes em razões de interesse público, como a salubridade e a qualidade ambiental, cujo objeto primordial de proteção são as janelas, pelo que, o prédio a edificar, pela sua implantação e demais características, deve, concomitantemente, acautelar a sua própria salubridade, mas também não sacrificar a salubridade dos edifícios vizinhos já existentes.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:M. e Outra
Recorrido 1:Município de (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder provimento ao recurso subordinado e conceder parcial provimento ao recurso principal.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO

1.1. M. e mulher M., residentes na Rua de (…), intentaram a presente ação administrativa especial contra o Município de (...), sito na Praça (…), na qual formularam os seguintes pedidos:
“a) declarar nulo o despacho proferido em 27 de Outubro de 2008 pelo Presidente da Câmara Municipal de (...), que indeferiu o pedido de legalização de um muro com cerca de 0,40 m na cobertura de um anexo existente na propriedade dos AA., bem como, a estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente no mesmo, ordenando a sua demolição no prazo de 30 dias, por padecer quer do vício de violação de lei quer do vício de forma, por falta de fundamentação, quer, ainda, porque traduz a violação do conteúdo essencial de vários direitos fundamentais, bem como, nessa conformidade,
b) declarar nulo o ato administrativo praticado em 30 de Janeiro de 2009, pelo Vice-Presidente da Câmara Municipal de (...) que determinou a posse administrativa do prédio dos AA., com vista demolir um murete com uma altura de 0,40 cm que contorna a cobertura da garagem e a estrutura em alumínio com vidro fosco, com uma largura de 1,40m, colocada sobre o mesmo, a qual contorna a garagem nos limites Sul e Poente do terreno; e,
c) condenar o Réu em custas, procuradoria e demais encargos legais.”.
Alegaram, para tanto, em síntese, não existir um “muro tapa vistas”, conforme parecer elaborado pela arquiteta responsável pela informação técnica subjacente ao despacho de proposta de indeferimento, porque cronologicamente o muro em causa é anterior à existência de qualquer anexo do proprietário confinante L. ;
O muro e estruturas em causa, são construções datadas de 1991, já existentes no local desde esse tempo, e tais construções prediais têm vindo a ser usufruídas e, assim, possuídas pelos Autores há mais de 15 anos, sem interrupção, à vista e com conhecimento de toda a gente;
Mais alegam que os atos impugnados padecem de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, na medida em que assumem erradamente como facto que foram os Autores que construíram sem observar as distâncias regulamentares com o prédio do vizinho L., quando o que sucedeu foi o inverso;
Advogam que, o Réu faz “tábua rasa” dos imperativos legais sobre a fundamentação de um ato, não se pronunciando sequer sobre os elementos documentais que comprovam a sequência cronológica da construção da garagem dos Autores e respetivos muros e da construção do anexo do vizinho L., pelo que, o ato padece de falta de fundamentação;
Por último, aduzem que o ato praticado pelo Réu espelha um profundo desprezo pelos mais elementares Princípios Constitucionais, norteadores da atuação da Administração Pública, como o princípio da igualdade, legalidade, respeito pela propriedade privada, imparcialidade e da justiça.
1.2. Citado, o Réu apresentou contestação, na qual se defendeu por exceção e por impugnação. Na defesa por exceção, invocou a exceção da inimpugnabilidade do ato emanado em 27.10.2008. Quanto à defesa por impugnação, contraditou os factos alegados pelos Autores, pugnando pela improcedência da ação.
1.3. Notificados, os Autores responderam à exceção invocada na contestação pugnando pela sua improcedência.
1.4. Por despacho datado de 27.04.2012 foi suscitada oficiosamente a inimpugnabilidade do ato emanado em 30.01.2009.
1.5. Os Autores responderam, pugnando pela improcedência da suscitada exceção.
1.6. Em 06.03.2013 foi proferida sentença que julgou procedentes as exceções de inimpugnabilidade dos atos em causa nos autos.
1.7. Os Autores interpuseram recurso da referida decisão, tendo o TCAN, por acórdão proferido em 14.03.2014, decidido conceder parcial provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida quanto ao juízo de inimpugnabilidade do ato datado de 30.01.2009 e revogando-a no segmento em que julgou inimpugnável, o ato de 27.10.2008.
1.8. Foi proferido despacho que fixou o objeto do litígio e os temas da prova.
1.9. Realizou-se a audiência final.
1.10. O TAF de Braga proferiu decisão que julgou a ação parcialmente procedente, constando da mesma o seguinte segmento decisório:
«Nos termos e com os fundamentos acima expostos, julgo parcialmente procedente, a presente ação administrativa e, em consequência, condeno o Réu a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores, anulando-se o ato de demolição nesta parte.
Condeno Autores e Réu no pagamento das custas em partes iguais.
-NR»

1.11. Inconformados com o assim decidido, os autores interpuseram recurso jurisdicional da sentença proferida, apresentando as seguintes conclusões:

«A) O PRESENTE RECURSO VEM INTERPOSTO DA DECISÃO DO TRIBUNAL A QUO QUE ENTENDEU DEFERIR O PEDIDO DE LEGALIZAÇÃO DO MURO COM CERCA DE 0,40 M NA COBERTURA DA GARAGEM EXISTENTE NA PROPRIEDADE DOS AUTORES, ORA RECORRENTES, ANULANDO-SE O ATO DE DEMOLIÇÃO NESTA PARTE, MAS INDEFERIU O PEDIDO DE LEGALIZAÇÃO DA ESTRUTURA DE ALUMÍNIO E VIDRO COM CERCA DE 1,40M EXISTENTE NO MESMO;
B) ISTO PORQUE, O TRIBUNAL DE 1.ª INSTÂNCIA CONSIDEROU QUE “O MURETE QUE EXISTE POR CIMA DA GARAGEM FOI CONSTRUÍDO ANTERIORMENTE À AMPLIAÇÃO DO ANEXO DO VIZINHO. O MESMO JÁ NÃO ACONTECEU COM A ESTRUTURA METÁLICA. ESTA JÁ FOI CONSTRUÍDA DEPOIS DA AMPLIAÇÃO DO ANEXO DO VIZINHO. DESTE MODO, O ATO ADMINISTRATIVO, ORA IMPUGNADO, ESTÁ FERIDO DE ILEGALIDADE, NA PARTE EM QUE MANDOU DEMOLIR O MURETE POR CIMA DA GARAGEM, VIOLANDO, DESTA FORMA O ARTIGO 73.º DO RGEU. PELO QUE, TERÁ QUE PROCEDER A PRESENTE AÇÃO, NO TOCANTE AO LICENCIAMENTO DO MURETE CONSTRUÍDO POR CIMA DA GARAGEM.”
C) CONTUDO, NO NOSSO MODESTO ENTENDIMENTO, O TRIBUNAL A QUO NÃO RETIROU TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS DAS INCONTORNÁVEIS CONCLUSÕES A QUE CHEGOU NA DOUTA SENTENÇA, POIS ESTANDO PROVADO A DATA DE CONSTRUÇÃO DA GARAGEM E MURETE COM DATA ANTERIOR Á AMPLIAÇÃO DO ANEXO DO VIZINHO, SIMPLESMENTE DEVERIA SER REPOSTA A LEGALIDADE URBANÍSTICA, DESIGNADAMENTE, IMPOSTO OS AFASTAMENTOS DO ARTIGO 73.º RGEU QUANTO AO ANEXO.
D) SE PROVADO (E LICENCIADO) ESTÁ QUE A GARAGEM E MURETE JÁ EXISTIAM QUANDO O VIZINHO AMPLIOU UM ANEXO, COLOCANDO-O A 0,20CM DE DISTÂNCIA DAQUELE, NUNCA ESTE ANEXO LICENCIADO ILEGALMENTE (POR CONTRARIAR O ARTIGO 73.º RGEU) PODE SERVIR DE BASE OU FUNDAMENTO PARA A RECLAMAÇÃO DE QUALQUER DIREITO, TAL COMO “ A SERVIDÃO DE VISTAS”, POIS O SEU LICENCIAMENTO É UM ACTO NULO POR ASSENTAR NUM FACTO INVERÍDICO OU INEXISTENTE E OBTIDO COM PRETERIÇÃO TOTAL DO PROCEDIMENTO LEGALMENTE EXIGIDO.
E) O LICENCIAMENTO DA ESTRUTURA METÁLICA É UM ACTO EM ESTREITA LIGAÇÃO AO MESMO ACTO DE LICENCIAMENTO DO MURETE, POIS O MESMO PRINCÍPIO LHE SERVE DE CAUSA, BASE OU PRESSUPOSTO – NENHUMA CONSTRUÇÃO PODERIA SER ERIGIDA E/OU AMPLIADA PELO VIZINHO DOS AA. SEM RESPEITAR OS AFASTAMENTOS PREVISTO NO ARTIGO 73.º RGEU.
F) OS AA. REQUEREM, AINDA, A SINDICAÇÃO DO JULGAMENTO FÁCTICO REALIZADO PELO TRIBUNAL A QUO, POIS DA PROVA TESTEMUNHAL E DOCUMENTAL RESULTARAM PROVADOS OS FACTOS ARTICULADOS EM XIV, XXIX, XXX, XXXI, XXXII DA P.I..
F) PELO QUE, ATENTA A PROVA TESTEMUNHAL E DOCUMENTAL PRODUZIDA, DEVE CONSIDERAR-SE PARA TODOS OS EFEITOS LEGAIS QUE: 1.º O LICENCIAMENTO DA AMPLIAÇÃO DO ANEXO DO VIZINHO L. NÃO FOI PRECEDIDO DE QUALQUER FISCALIZAÇÃO POR PARTE DOS SERVIÇOS DA RÉ, CONSIDERANDO ESTE FACTO COMO PROVADO. 2.º NO ÂMBITO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO N.º 772/1980 FORAM PRESTADAS FALSAS DECLARAÇÕES PELO EXMO. SR. PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE (...) QUE, EM 14 DE OUTUBRO DE 2004, DECLAROU QUE L. “TEM UNS ANEXOS JUNTO Á SUA HABITAÇÃO COM MAIS DE 67 ANOS DE EXISTÊNCIA” (DOC.15 DA P.I.), CONSIDERANDO ESTE FACTO COMO PROVADO. 3.º - FALSIDADE QUE, MAIS TARDE, EM 13 DE JANEIRO DE 2005, ACABA POR SER RECONHECIDA PELO PRÓPRIO PRESIDENTE DA JUNTA QUANDO INTERPELADO PELOS AA., E PARA REPOSIÇÃO DA VERDADE EMITE NOVA DECLARAÇÃO, A QUAL FOI DEVIDA E TEMPESTIVAMENTE JUNTO AOS PROCESSOS CAMARÁRIOS EM CAUSA. (DOC. 16 DA P.I.), CONSIDERANDO ESTE FACTO COMO PROVADO.
G) SEM PRESCINDIR, SEMPRE O PEDIDO DE LEGALIZAÇÃO DA ESTRUTURA DE ALUMÍNIO E VIDRO COM CERCA DE 1,40M EXISTENTE NO MURO DOS AA. ORA RECORRENTES DEVERIA TER SIDO DEFERIDO EM NOME DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA GARANTIA DO EXISTENTE NO DIREITO DO URBANISMO.
H) A ESTRUTURA DE ALUMÍNIO E VIDRO EM CAUSA NOS PRESENTES AUTOS ENCONTRA-SE COLOCADA HÁ CERCA DE 20 ANOS. EM PLENA FUNCIONALIDADE, UTILIZAÇÃO E USO CONTINUADO.
I) AO DECIDIR DE FORMA CONTRARIA, ENFERMA A DECISÃO RECORRIDA DE GRAVE VIOLAÇÃO DA NORMA CONSTANTE NO ART. 73.º RGEU, COMO TAMBÉM SE VIOLAM OS PRINCÍPIOS DA TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA E DA PROMOÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA, CONSAGRADOS NA LEI DO PROCESSO ADMINISTRATIVO NOS ART. 2° E 7° DO CPTA;
J) VIOLA, AINDA, OS PRINCÍPIOS DA TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA – GARANTIA FUNDAMENTAL – 13.º, 22.º, 26.º, 62.º, 65.º, 66.º, 266.º E 268.º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA E O PRINCÍPIO DA PROMOÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA, PORQUANTO NÃO APRECIOU DEVIDAMENTE TODAS AS PRETENSÕES DEDUZIDAS, BEM COMO FEZ UMA INTERPRETAÇÃO DESIGUAL DA NORMA PREVISTA NO ARTIGO 73.º DO RGEU, NEGANDO EFECTIVA JUSTIÇA;
L) TAL DECISÃO ESTÁ, ASSIM, INQUINADA DOS VÍCIOS DE VIOLAÇÃO DE NORMA CONSTITUCIONAL E DE VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS E NORMAS URBANISTICAS, DEVENDO SER REVOGADA, POR ILEGAL.
NESTES TERMOS, e nos melhores de Direito, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência revogar-se a decisão da 1.ª instância substituindo-a, pelo deferimento do pedido de legalização da estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente na garagem dos ora Recorrentes, com o normal prosseguimento dos autos, assim se fazendo JUSTIÇA!»

1.12. O Réu interpôs recurso subordinado, formulando as seguintes conclusões:
« A
Como é sabido, o pedido, conformando o objeto da ação, condiciona também o conteúdo da decisão de mérito com que o tribunal lhe responderá: o juiz, na sentença, “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação”, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras (artº 608º, nº 2, do CPC).
Ainda que se ocupe apenas das questões suscitadas pelas partes, o juiz não pode, porém, “condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir” (art.º 609º, nº 1, ainda do CPC). É a consagração da velha máxima “ne eat judex ultra vel extra petita partium; sententia debet esse conformis libelo”.
Movendo-se o juiz num terreno em que domina o princípio dispositivo, são as partes que, através do pedido (art. 3º, nº 1, do CPC), circunscrevem o “thema decidendum”, indicando a providência requerida, “não tendo o juiz que cuidar de saber se à situação real conviria ou não providência diversa” (António Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luis Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, 2018, pág. 728).
Infringindo esse comando, o Tribunal ultrapassa o limite imposto por lei ao seu poder de jurisdição.

Por força dessa regra, a sentença deve manter-se, quanto ao seu conteúdo, dentro dos limites definidos pela pretensão do autor e pela reconvenção eventualmente deduzida pelo réu, não podendo o juiz proferir decisão que extravase essas pretensões, quer no que respeita à quantidade, quer relativamente ao seu próprio objeto, sob pena de cometer a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, e), do CPC.
Como se exarou a propósito desta nulidade (da sentença) na motivação do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12.05.2016 (Processo 01441/15, acessível em www.dgsi.pt):
«[..]
XVII. Passando, agora, à caracterização da nulidade de decisão por alegada infração ao disposto na al. e) do n.º 1 do art. 615.º do CPC temos que com a mesma se visa sancionar a infração ao dever que impende sobre o tribunal de, na sua pronúncia, se conter nos limites do pedido [cfr. art. 609.º do CPC].
XVIII. De tal dever, constituindo uma decorrência dos princípios da necessidade do pedido [cfr. art. 03.º, n.º 1, do CPC] e da vinculação do juiz ao pedido [congruência ou correspondência entre decisão e pedido – arts. 608.º, n.º 2 in fine e 609.º do CPC], deriva a imposição ao julgador duma obrigação de na decisão a proferir o mesmo observar aquilo que é o petitório da ação.
XIX. Assim, neste quadro haverá excesso de pronúncia sempre que o tribunal condene ou absolva num pedido não formulado, bem como quando conhece de pedido em excesso parcial ou qualitativo, mormente, quando, utilizando fundamentos admissíveis, aprecie dum pedido que é quantitativa ou qualitativamente distinto daquele que foi formulado pela parte, condenando em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.»
B
Na conclusão da petição inicial os Autores formularam o pedido de declaração de nulidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...), de 27.10.2008, que indeferiu o pedido de legalização de um muro (murete) com cerca de 0,40 m na cobertura de um anexo existente na sua propriedade, bem como da estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente no mesmo, ordenando a sua demolição no prazo de 30 dias.
Não deduziram, porém, contra esse ato de indeferimento o pedido de condenação do Réu à prática de ato devido ou, nos termos da lei, “à prática, dentro de determinado prazo, de um ato administrativo ilegalmente (...) recusado” (cfr. art. 66º, nº 1, e 67º, nº 1, b), do CPTA).
A sentença em cotejo, julgando a ação parcialmente procedente, condenou o Réu a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores e anulou o ato de demolição nesta parte.
Exceto quanto à injunção decretada na sua parte final (ao anular o “ato de demolição” do muro, querendo certamente referir-se ao ato que ordenou essa demolição), a sentença padece, salvo o devido respeito, da nulidade prevista no art. 615º, nº 1, e), 2ª parte, do CPC, pois condenou o Réu em objeto diverso do pedido.
É o que desde logo se infere da contraposição entre o pedido de um efeito constitutivo, tal como foi formulado na petição inicial (um pedido de “(...) invalidação do ato impugnado, fazendo-o desaparecer do mundo jurídico desde o seu nascimento”, como bem referem os recorrentes principais a pág. 7, in fine, da sua minuta em análise) e a condenação à prática de um ato, que não foi pedida.

Nos termos do nº 4 do art. 615º do CPC, as nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do nº 1 não podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença, se esta admitir recurso ordinário, podendo o recurso, neste caso, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
Suscitada no recurso, o juiz que proferiu a sentença, se não indeferir o requerimento de interposição do recurso, pronuncia-se sobre a nulidade arguida.
Como assim, se a Mª Juíza da 1ª instância admitir o requerimento de interposição do recurso e não declarar nula a sentença por entender que não se verifica o vício ora denunciado, então este Venerando Tribunal conhecerá da nulidade, nos termos do art. 149º, nº 1, do CPTA, sem mandar baixar o processo à 1ª instância para que a Mª Juíza corrija o vício que venha a ser reconhecido: cfr. a este propósito Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “Comentário do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2017, 4ª edição, Almedina, pág. 1130 e segs.».

1.13. O Réu contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
«
O recurso principal, interposto pelos Autores em 09.07.2020, é extemporâneo.

O prazo para a interposição de recurso é de 30 dias e conta-se a partir da data da notificação da decisão recorrida, podendo acrescer a este prazo mais 10 dias, se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada.

O objeto do recurso principal não tem por objeto a reapreciação da prova gravada, pois os recorrentes não impugnaram juízos probatórios com fundamento em erro de julgamento.

Os recorrentes pretendem apenas a ampliação da decisão da matéria de facto.

O prazo para interposição do recurso esgotou-se em 29.06.2020, podendo embora os recorrentes ter beneficiado de mais 3 dias úteis, mediante o pagamento de multa, nos termos dos nºs 5 e 6 do art. 139º do CPC.

Os recorrentes formularam na petição inicial o pedido de declaração de nulidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...), de 27.10.2008, que indeferiu o pedido de legalização de um muro com cerca de 0,40 m na cobertura de um anexo existente na sua propriedade, bem como da estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente no mesmo, ordenando a sua demolição no prazo de 30 dias.

Os recorrentes não deduziram contra esse ato indeferimento o pedido de condenação do Réu à prática do ato devido.

A douta sentença revidenda, ao condenar o Réu a deferir o pedido de legalização daquele muro, padece da nulidade prevista no art. 615º, nº 1, e), 2ª parte, do CPC, por ter condenado em objeto diverso do pedido.

A sentença recorrida não indeferiu, nem deferiu, o pedido de legalização da estrutura de alumínio e vidro referida na conclusão 6ª.
10ª
Os recorrentes não formularam na ação qualquer pedido de legalização, fosse do muro, fosse da estrutura sobre ele colocada!
11ª
A questão da legalidade urbanística do anexo do vizinho (L.) não é objeto da ação, nada tendo os recorrentes impetrado a esse respeito.
12ª
O Presidente da Câmara Municipal e o Vereador do Pelouro de Urbanismo e Habitação, com competência delegada, alicerçados em informações técnicas ou pareceres jurídicos elaborados pelos serviços da Câmara Municipal, proferiram as suas decisões sobre esse anexo no pressuposto de que o mesmo, com a composição que tinha à data dessas decisões, já existia como tal desde 1937, não carecendo, por isso, de licenciamento municipal de construção e de utilização.
13ª
O recorrente não reagiu atempada e adequadamente contra o assim decidido, apesar de ter sido notificado das respetivas decisões.
14ª
A matéria articulada em XIV, XXIX, XXX, XXXI e XXXII da petição inicial, além de não ter interesse para a boa decisão da causa, não pode figurar num elenco de matéria de facto.
15ª
Os recorrentes limitaram-se a requerer na ação a declaração de nulidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...), de 27.10.2008, que indeferiu o pedido de legalização do muro e da estrutura de alumínio e vidro.
16ª
Não tem cabimento a invocação in casu do princípio da garantia do existente (ou da manutenção).
17ª
É no corpo da alegação de recurso que o recorrente tem de explanar e desenvolver as razões de discordância com o julgado.
18ª
Se aí nada for dito em contrário do decidido sobre determinada questão, é porque o recorrente com ele se conforma, transitando a decisão em julgado, não obstante as conclusões aflorarem essa questão.
19ª
Têm de ser desatendidas as conclusões da alegação que não encontrem correspondência com a motivação do recurso, mesmo que a questão nelas suscitada seja de constitucionalidade.
20ª
Os recorrentes nada expenderam no corpo da alegação sobre a matéria vertida nas conclusões I) a L) da sua peça, exceto a alegada, mas inverificada, violação do art. 73º do RGEU pela sentença recorrida.
Nestes termos:
E nos mais que V.ªs Ex.ªs doutamente suprirão, não deverá ser conhecido o objeto do recurso principal, por extemporaneidade na sua interposição, nos termos do art. 652º, nº 1, b) e h), 2ª parte, do CPC, o que determinará também, atento o disposto no art. 633º, nº 3, ainda do CPC, a caducidade do recurso subordinado interposto pelo Réu a título subsidiário, sendo todas as custas da responsabilidade dos recorrentes principais.
Se não for julgada procedente a questão prévia da extemporaneidade do recurso e se a nulidade da sentença suscitada no recurso subordinado não tiver sido sanada no despacho da 1ª instância que admitiu o recurso, deverá ser concedido provimento ao recurso subordinado, declarando-se nula a douta sentença revidenda na parte em que condenou o Réu a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores, corrigindo-se o vício cometido.
No mais, conhecendo-se do objeto do recurso principal, deverá ser-lhe negado provimento, confirmando-se in integrum a sentença da 1ª instância na parte que vem censurada pelos recorrentes principais.»
1.14. A Senhora Juiz a quo proferiu despacho em que julgou tempestivo o requerimento de interposição do recurso apresentado pelos autores e de sustentação da decisão recorrida, refutando o vício de nulidade por condenação em pedido diverso que lhe vem imputado pelo réu.
1.15. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público, não emitiu parecer.
1.16. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1. Questão prévia: «Da alegada extemporaneidade do recurso interposto pelos Autores».
O réu sustenta que o recurso interposto pelos autores contra a sentença recorrida é extemporâneo, pelo que deve ser rejeitado.
Sobre esta questão pronunciou-se o Tribunal a quo, que julgou tempestivo o recurso interposto pelas razões que constam do despacho de 06 de outubro de 2020. Nesse despacho pode ler-se a seguinte fundamentação que se transcreve, que subscrevemos integralmente: «Para que o recurso interposto pelas partes seja admitido, é necessário que o mesmo se mostre legal e tempestivo, se verifique a alçada legalmente exigida, e se lhes reconheça legitimidade para interpor recurso da decisão de mérito, em que tenham ficado total ou parcialmente vencidas (cfr. artigos 140.º, 141.º, n.º 1, 142.º, n.º 1, 143.º, n.º 1 e 144.º, n.º 1 do CPTA).
Nos termos do artigo 145.º, n.º 1 do CPTA, “findos os prazos concedidos às partes, o juiz ou relator aprecia os requerimentos apresentados e pronuncia-se sobre as nulidades arguidas e os pedidos de reforma, ordenando a subida do recurso se a tal nada obstar”. Mais refere o n.º 2, alínea a) daquele artigo que, caso o recurso seja interposto depois de findo o prazo legal para o efeito, deve o requerimento de recurso ser indeferido pelo juiz que tenha prolatado a sentença recorrida.
Vejamos.
Dispõe o artigo 144.º, n.º 1 do CPTA que o recurso é interposto no prazo de 30 dias a contar da notificação da decisão recorrida. O prazo de recurso é contado nos termos do disposto no artigo 138.º do CPC (ex vi artigo 140.º, n.º 3 do CPTA), isto é, de forma corrida, mas com suspensão nas férias judiciais (n.º 1). No entanto, por se tratar de um ato processual, o prazo para interposição de recurso que termine em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere o seu termo para o primeiro dia útil seguinte (n.º 2).
Conforme se extrai do comprovativo a p. 867 do SITAF, foi inserida no SITAF, a 02.03.2020, notificação da sentença recorrida, dirigida à mandatária dos Autores, a qual se presume notificada a 05.03.2020 (artigo 248.º, n.º 1, in fine do CPC, ex vi artigo 140.º, n.º 3 do CPTA).
Assim sendo, temos que o prazo para interposição de recurso teve o seu termo inicial a 06.03.2020 [artigo 279.º, alínea b) do CC].
No entanto, por força do preceituado no artigo 7.º, n.º 3 da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que veio determinar as medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, os prazos de caducidade relativos a todos os tipos de processos foram suspensos em 09.03.2020 (artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, ex vi artigo 10.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março).
Tendo em conta o disposto, entre o dia 06-03-2020 e o dia 09-03-2020 decorreram 3 dias do prazo para interposição de recurso.
A suspensão dos prazos processuais acima aludida findou, por aplicação do artigo 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, a 03.06.2020. Assim, a partir dessa data, o prazo de interposição de recurso retomou a sua contagem do ponto em que havia ficado ao momento da sua suspensão, devendo, nessa medida, contabilizar-se, a partir daquela data, os 27 dias de prazo em falta.
Efetuada a contabilização do prazo de recurso restante nos termos acima expostos, temos que o mesmo findou a 29.06.2020, segunda-feira.
Atento tudo o que ficou consignado, teria de se concluir que o recurso interposto pelos Autores era extemporâneo, visto que, como se referiu, as alegações de recurso foram apresentadas a 09.07.2020.
Sem embargo, os Autores alegam que beneficiam do prazo suplementar de 10 dias a que alude o artigo 144.º, n.º 4 do CPTA.
Vejamos, então.
Nos termos do disposto no artigo 144.º, n.º 4 do CPTA, “se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias”.
Este normativo veio consignar no contencioso administrativo regra idêntica à que vigora no artigo 638.º, n.º 7 do CPC, tendo “[e]m vista permitir ao recorrente fazer face ao dispêndio de tempo que exige a audição da prova gravada e a indicação precisa dos locais onde se inserem as passagens dos depoimentos que poderão fundamentar uma diferente decisão de facto quanto a determinados factos” (vide, o Acórdão TCA-Sul, de 12-03-2015, proc. n.º 11942/15, acessível em www.dgsi.pt).
A este respeito, tem entendido a mais autorizada doutrina que “[n]a apelação, pretendendo impugnar a decisão da matéria de facto a parti da reapreciação de meios de prova gravados (e apenas neste caso), o recorrente beneficia de um acréscimo de 10 dias. Para o efeito, é necessário que a alegação apresentada pelo recorrente contenha alguma impugnação da decisão proferida acerca da matéria de facto a partir da reponderação de meios de prova que, tendo sido prestados oralmente, tenham ficado registados […]” (cfr. ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e LUÍS FILIPE DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2018, p. 766; no mesmo sentido tem militado a jurisprudência dos tribunais superiores, sendo disso exemplo os Acórdãos do STJ, de 28-04-2016, proc. n.º 1006/12.2TBPRD.P1.S1, e de 24-10-2019, proc. n.º 3150/13.0TBPTM.E1.S1, disponíveis em www.dgsi.pt).
Na fundamentação de facto da sentença recorrida, foi apreciada, e objeto de julgamento de facto, prova testemunhal produzida na audiência final, sujeita à correspondente gravação, nos termos da lei.
Compulsado o teor das alegações de recurso dos Autores, temos que das mesmas resulta a impugnação da decisão proferida acerca da matéria de facto extraída de meios de prova prestados oralmente, concretamente, das gravações efetuadas a testemunhas da Ré, designadamente da testemunha A., (sendo indicado pelos Autores o “depoimento com registo áudio na aplicação SITAF, de 41m:25s a 01h:03m:16s”), da testemunha J., (indicando-se o “registo áudio na aplicação SITAF, de 01h:03m:17s a 01h:06m:15s”), e da testemunha G., (aludindo-se ao “registo áudio na aplicação SITAF, de 01h:06m:17s a 01h:07m:45s”).
Nestes termos, têm razão os Autores quando referem que poderiam beneficiar do prazo suplementar de 10 dias, a que alude o artigo 144.º, n.º 4 do CPTA.
E, neste caso, o prazo que, por aplicação do artigo 144.º, n.º 1 daquele diploma, findaria, como se referiu, a 29.06.2020, teve o seu termo final em 09.07.2020, data em que foram apresentadas as correspondentes alegações de recurso.
Termos em que o recurso interposto pelos Autores foi apresentado dentro do prazo legalmente previsto para o efeito, tendo em conta o disposto nos artigos 144.º, n.ºs 1 e 4 do CPTA.».
Pelas razões expostas neste despacho, o recurso interposto pelos autores é tempestivo.
2.2. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.3. Assentes nas enunciadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem resumem-se a saber se a decisão recorrida:
b.1.- é nula por ter condenado o réu em pedido diverso do formulado pelos autores na p.i. (artigo 615º, nº 1, e), do CPC;
b.2-enferma de erro de julgamento sobre a matéria se facto por não ter levado aos factos assentes a matéria articulada nos pontos XIV, XXIX, XXX, XXXI e XXXII da p.i.
b.3- enferma de erro de julgamento quanto à decisão de mérito por ter julgado o ato impugnado inválido apenas na parte em que incidiu sobre o indeferimento de licenciamento do murete de 0,40 cm e não também quanto à pretendida invalidade do indeferimento do pedido de licenciamento relativo à estrutura metálica com 1,40 cm de altura;
b.4- enferma de erro de julgamento quanto à decisão de mérito por não ter aplicado o princípio da garantia do existente.
b.5.- enferma de erro de julgamento quanto à decisão de mérito por violação dos princípios da tutela jurisdicional efetiva e, do princípio de promoção do acesso à justiça .
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO

3.1. A 1.ª Instância deu como provados os seguintes factos:
«A – Relativos ao processo administrativo 772/80:
1. Por escritura de compra e venda celebrada em 12.07.1979, L. adquiriu o prédio urbano constituído por casa de habitação, com quintal e um anexo, sito no lugar de (…), inscrito na matriz urbana sob o artigo 289. – Cfr. fls. 30 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
2. Em 12.03.1980, L. , apresentou na Câmara Municipal de (...) um projeto para “obras de beneficiação a levar a efeito na sua habitação, em melhoramentos das condições de instalações anexas e na construção de um tecto sobre uma parte da habitação.”, que teve o n.º 772/80. – Cfr. fls. 6 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
3. O projeto referido em 2. foi deferido por despacho emanado pelo Presidente da Câmara de (...), em 16.05.1980. – Cfr. fls. 6 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
4. A licença de construção foi passada em 16.06.1980, sob o n.º 1525. – Cfr. fls. 4 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
5. Em 06.04.2004 foi apresentada uma reclamação pelo Autor no âmbito do processo referido em 2., requerendo a fiscalização da construção dos anexos. – Cfr. fls. 12/13 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
6. Em 19.10.2004, L. , apresentou requerimento nos seguintes termos:
– Cfr. fls. 25 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
7. O prédio urbano de L. está inscrito na matriz desde 1937, sob o artigo 289 (antigo 41) e era constituído por casa de habitação de r/c com seis divisões e um anexo com 10 m2, constando da descrição da caderneta predial emitida em 19.06.1975 que o prédio tinha sido ampliado há mais de 5 anos. – Cfr. fls. 27 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
8. No âmbito do processo referido em 2., foi emitida a informação técnica datada de 16.12.2004, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
– Cfr. fls. 36 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
9. A informação referida em 8. mereceu despacho de concordância em 27.12.2004. – Cfr. fls. 36 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
10. Em 25.01.2005, o Autor apresentou uma exposição para cujo teor se remete por uma questão de brevidade. – Cfr. fls. 44 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
11. Em 19.01.2006, o Autor apresentou uma exposição para cujo teor se remete por uma questão de brevidade. – Cfr. fls. 67 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
12. Em 25.05.2006, foi emitido um parecer jurídico com o seguinte teor:
“(...) PARECER JURÍDICO
No processo em epígrafe, o Sr. M., apresenta uma série de reclamações relativas às construções existentes no prédio vizinho a poente, requerente neste processo.
Tais reclamações incidem sobre anexos existentes, que o reclamante alega não possuírem a competente licença de construção.
Perante o exposto e analisados os processos respectivos cumpre-nos informar que:
O requerente tem todas as construções existentes no seu prédio, nomeadamente os anexos a que o reclamante se refere, licenciadas.
O anexo que o reclamante refere como não sendo anterior ao RGEU consta do processo, na caderneta predial do prédio, como efectivamente sendo anterior, inscrito na matriz desde 1937. Até pelas fotografias aéreas juntas ao processo se percebe, bem como pelo extracto da Carta Militar datada de 1949, que anexamos.
Mais informamos que as construções anteriores à entrada em vigor do RGEU, em 7 de Agosto de 1951 pelo DL 38832, não tinham a obrigatoriedade de licença de construção.
Esta passou a ser exigida a partir dessa data, bem como a para a utilização dos edifícios, mas dentro do perímetro urbano e das zonas rurais de protecção fixadas para as sedes de concelho e para as demais localidades sujeitas por lei a plano de urbanização e de expansão.
Com a redacção dada ao RGEU pelo DL 44258 de 31 de Março de 1962, as obrigatoriedades referidas passariam a aplicar-se, ainda, nas zonas e localidades a que seja tornado extensivo por deliberação municipal, e, em todos os casos, às edificações de carácter industrial ou de utilização colectiva.
Assim, por Deliberação da Câmara Municipal de (...) de 4 de Novembro de 1968 a obrigatoriedade das licenças de construção e utilização passou a ser extensiva à restante área do concelho, sendo que até esta data essa obrigatoriedade não existia.
Pelo que ficou determinado o seguinte:
Dentro do concelho de (...) não carecem de licença de construção e/ou de licença de utilização os edifícios construídos, e que não tenham sofrido alteração da qual resultasse modificações importantes nas suas características datados de:
Antes de 7 de Agosto de 1951, qualquer edifício do concelho;
Entre 7 de Agosto de 1951 e 31 de Março de 1962, qualquer edifício situado fora do perímetro urbano da sede do concelho à data;
Entre 31 de Março de 1962 e 4 de Novembro de 1968, os edifícios situados fora do perímetro urbano da sede do concelho à data, que não de carácter industrial ou de utilização colectiva.
Pelo supra descrito se conclui, como já foi referido no processo, que o requerente possui as suas construções licenciadas, incluindo o anexo em causa, que data de 1937, estando abrangido pela Deliberação referida.
É também natural que o requerente tenha procedido a obras de melhoria, estando as mesmas abrangidas pelo regime referido e não carecendo de licença.
Em suma, julgamos que pelas razões e explicações expendidas acerca do licenciamento das construções anteriores RGEU, que ficou devidamente esclarecido que o requerente tem todas as construções do seu prédio regularmente licenciadas.”. – Cfr. fls. 72 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
13. O parecer referido em 12. mereceu despacho de concordância em 09.06.2006. – Cfr. fls. 74 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
14. Pelo ofício n.º 5413 datado de 28.06.2006, o Autor foi notificado do parecer e do despacho referidos em 12. e 13. – Cfr. fls. 76 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
15. Em 13.07.2006 o Autor apresentou uma exposição para cujo teor se remete por uma questão de brevidade. – Cfr. fls. 77 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
16. Em 24.08.2006 foi elaborada uma informação no sentido de que não recai o dever de apreciação e decisão da exposição apresentada pelo Autor (referida em 15.) nos termos do artigo 9.º, n.º 2 do CPA. – Cfr. fls. 84 e ss. do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
17. A informação referida em 16. mereceu despacho de concordância em 21.09.2006. – Cfr. fls. 84 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

B – Relativos ao processo administrativo 1874/91:
18. Em 05.03.1991, o Autor apresentou na Câmara Municipal de (...) um projeto para proceder a “obras de ampliação e beneficiação no seu prédio urbano sito no referido lugar de Vendas (...)”, inscrito na matriz sob o artigo 276 da freguesia de Cruz, concelho de (...), e descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º 15/090492que teve o n.º 1874/91. – Cfr. fls. 6 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1874/91, e doc. 3 junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
19. Foi passado o alvará de licença para construção n.º 1608, em 31.07.1991. – Cfr. fls. 38 do processo administrativo apenso n.º 1874/91, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
20. Em 24.03.1993 foi realizado o auto de vistoria. – Cfr. fls. 39 do processo administrativo apenso n.º 1874/91, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
21. Em 08.04.1993 foi emitido o alvará de licença de utilização de habitação n.º 248. – Cfr. fls. 42 do processo administrativo apenso n.º 1874/91, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

C – Relativos ao processo administrativo 1614/2004:
22. Em 09.05.2003, L. apresentou requerimento no Município de (...) a solicitar a fiscalização do anexo do Autor que confrontava com a sua propriedade, do qual se extrai o seguinte: “O referido anexo está construído sob o alçado posterior da minha habitação, com uma cobertura (terraço) e com um muro de protecção com cerca de 0,50 m de altura acima da cota do terraço, o que provoca uma má salubridade.”. – Cfr. fls. 2 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
23. Em 28.05.2003 foi emitido parecer no sentido de notificar o Autor para apresentar comprovativo do licenciamento do anexo, que mereceu despacho de concordância no dia 30.05.2003. – Cfr. fls. 4 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
24. O Autor foi notificado do parecer e despacho referido em 23. pelo ofício n.º 7308, datado de 04.07.2003. – Cfr. fls. 5 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
25. Em 16.10.2003, L. , apresentou uma exposição no Município de (...), do qual se extrai o seguinte: “(...) Consultado o Processo nº 1874/91, em nome de M., relativo a obras de Ampliação de uma Moradia, verifica-se que na planta topográfica a garagem está distanciada da minha habitação, quando a mesma está separada 0,20 m.
Em relação ao muro tapa vistas com 0,40 m de altura, que faz parte da reclamação inicial, foi acrescentando com um painel em perfis de alumínio e vidro fosco com 1,40 m de altura em toda a extensão confrontante com a minha propriedade, que tira a luminosidade a um compartimento destinado a quarto de costura na minha habitação, não consta no alvará de licença de construção nº 1608/91 e alvará de licença de utilização nº 248/93, pelo que se suspeita ser obras realizadas sem licenciamento.”. – Cfr. fls. 12 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
26. Em 09.12.2003 foi emitido parecer no sentido de o Autor apresentar projeto das obras executadas sem licença, para eventual legalização e mereceu despacho de concordância em 19.12.2003. – Cfr. fls. 14 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
27. Em 06.02.2004, o Autor requereu o licenciamento de uma estrutura de proteção. – Cfr. fls. 22 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
28. Na memória descritiva e justificativa no projeto referido em 27., consta de entre o mais, o seguinte:
“(...)Ainda no decurso da obra, constatou-se ligeira discrepância entre o levantamento topográfico efectuado e a linha divisória das propriedades, o que originou a ligeira alteração na implantação da parede do anexo, que agora se corrige. Datam também da altura, a construção do pequeno murete e da pequena pala frontal, que também agora as peças desenhadas e o levantamento fotográfico evidenciam.
Recentemente e tendo como objectivos a protecção de equipamentos de captação de sinal televisivo colocado sobre a cobertura do anexo, a melhoria estética do conjunto, para além de alguma protecção de privacidade, instalou o Requerente uma estrutura de alumínio com vidro translúcido, de cerca de 1,30 m de altura, sobre o murete, em todo contorno do limite de propriedades, envolvendo dois confrontantes distintos.”. – Cfr. fls. 33 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
29. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação técnica datada de 03.03.2004, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

– Cfr. fls. 45/46 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
30. A informação referida em 29. mereceu o seguinte despacho: “Notifique-se nos termos dos art.º 100º e 101º do CPA.”. – Cfr. fls. 46 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
31. O Autor recebeu o ofício n.º 3359, datado de 22.03.2004, enviado pelo Réu:
– Cfr. fls. 47 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
32. O Autor exerceu o seu direito de audição prévia nos termos da exposição apresentada em 06.04.2004, que aqui se reproduz por integralmente reproduzida. – Cfr. fls. 49 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
33. A exposição referida em 32., foi acompanhada de uma autorização de Afonso da Costa Rebelo, da qual se extrai o seguinte trecho: “(...) informar V. Exas que autoriza, a construção sem qualquer restrição, no limite e ao longo de toda a extensão do contorno (alçado sul) da garagem que confronta com a minha propriedade, de um “muro tapa vistas” com estrutura em alumínio com vidro translúcido, com cerca de 1,40 metros de altura sobre pequeno murete, com cerca de 40 cm de altura, este já construído, há anos, na periferia da placa de cobertura da garagem aquando da construção desta.”. – Cfr. fls. 54 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
34. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação técnica datada de 20.05.2004, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

– Cfr. fls. 56 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
35. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação técnica datada de 23.11.2005, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

– Cfr. fls. 65 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
36. A informação referida em 35. mereceu despacho de concordância datado de 05.12.2005. – Cfr. fls. 65 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
37. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação técnica datada de 14.12.2005, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
– Cfr. fls. 66 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
38. Em 14.09.2006, L. , apresentou uma reclamação no Município de (...), com aditamento e juntou documentos, cujo teor aqui se reproduz por uma questão de brevidade. – Cfr. fls. 76 e ss., 78 e 80 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
39. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação técnica datada de 22.10.2007, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
– Cfr. fls. 88/89 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
40. A informação referida em 39. mereceu despacho de concordância datado de 28.11.2007. – Cfr. fls. 89 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
41. Em 14.12.2007, foi emitido parecer pelos Assuntos Jurídicos do Réu, cujo teor aqui se reproduz, extraindo-se o seguinte trecho:
“Em conclusão:
Como as outras obras em causa, violam o disposto no art. 73.º do R.G.E.U., deverá manter-se o despacho proferido pelo Senhor Vereador do departamento de Urbanismo e habitação de 16/03/2004.”. – Cfr. fls. 90/92 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
42. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação técnica datada de 27.12.2007, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

– Cfr. fls. 93 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
43. A informação referida em 43. mereceu despacho de concordância datado de 22.01.2008. – Cfr. fls. 93 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
44. O Autor foi notificado do despacho e do parecer referidos em 42. e 43. pelo ofício n.º 837/2008, datado de 31.01.2008. – Cfr. fls. 95/96 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
45. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação datada de 18.03.2008, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

– Cfr. fls. 106 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
46. A informação referida em 45. mereceu despacho de concordância datado de 18.03.2008. – Cfr. fls. 93 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
47. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação técnica datada de 10.07.2008, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Cfr. fls. 110/111 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
48. A informação referida em 47. mereceu despacho de concordância datado de 21.07.2008. – Cfr. fls. 111 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
49. O Autor foi notificado do despacho e informação técnica referidos em 47. e 48. pelo ofício n.º 7072/2008, datado de 28.07.2008. – Cfr. fls. 112 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

50. Em 05.08.2008 o Autor apresentou uma exposição para cujo teor se remete por uma questão de brevidade. – Cfr. fls. 115 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
51. No âmbito do processo referido em 22., foi emitida a informação datada de 30.09.2008, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
– Cfr. fls. 122/123 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
52. A informação referida em 51. mereceu despacho de concordância datado de 27.10.2008. – Cfr. fls. 123 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
53. O Autor foi notificado do despacho e informação técnica referidos em 51. e 52. pelo ofício n.º 9815/2008, datado de 04.11.2008. – Cfr. fls. 124 do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
54. O Autor foi notificado do ofício 2588/2009, datado de 30.01.2009, com o “Assunto: Reposição da legalidade urbanística – Posse administrativa”, para o qual se remete por uma questão de brevidade. – Cfr. fls. 133 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
55. Em 10.02.2009, foi realizada a Posse Administrativa do prédio do Autor para efeitos de execução dos trabalhos de demolição de uma vedação em alumínio e vidro com 1,40 m de altura e 11.00 m de comprimento e de um muro em blocos ou tijolo com 0,40 m de altura e 11.00 m de comprimento. – Cfr. fls. 140 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
Mais se provou que:
56. Na planta topográfica apresentada em 12.03.1980 no processo administrativo apenso n.º 772/80, consta um anexo ao lado da casa de habitação de L. e que já existia desde 1937, que confina com o prédio do Autor. – Cfr. fls. 11 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
57. Na planta topográfica elaborada em outubro de 2004, denota-se que consta um anexo A que não existia na planta topográfica referida em 56., e que parece uma ampliação ao anexo que já existia desde 1937 e constante da planta descrita em 56. – Cfr. fls. 35 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
58. A ampliação do Anexo A referida em 57. foi realizada até cerca de 1995 e do mesmo consta uma janela virada para a garagem do Autor – Facto admitido pelo Autor (artigo XXV da p.i.).
59. O anexo A referido em 57., confina com a garagem do Autor que foi construída entre finais de 1991 e inícios de 1993. – Cfr. fls. 35 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
60. Por cima da garagem do Autor foi construído um murete à sua volta entre finais de 1991 e inícios de 1993. – Cfr. depoimentos de J., B. e M. e declarações de parte do Autor.
61. Por cima do murete referido em 59., em toda a sua extensão, foi colocado um painel com perfis em alumínio e vidro fosco, com 1,40 metros de altura, entre 16.04.2003 e 16.10.2003. – Cfr. fls. 02 e ss. e 11 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
62. Reproduz-se uma missiva dirigida ao Autor, com os extras construídos na sua moradia e garagem, concretamente “Beiral em cima da garagem” com o respetivo preço, sem IVA de 272.140$00. – Cfr. fls. 291 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
63. Reproduz-se um cheque, emitido em 21.09.1992, pelo Autor M. à ordem de B. no valor de € 272.140$00. – Cfr. fls. 292 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

III.2. Factos não provados:
Inexistem outros factos, para além dos que foram dados como provados, que revelem interesse para a boa decisão da causa.»
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III.B.DE DIREITO
b.1. Da nulidade da sentença decorrente da condenação em pedido diverso- art.º 615.º, n.º1, al. e) do CPC.
3.2.As decisões judiciais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional podem ser viciadas por duas causas distintas, obstando qualquer delas à sua eficácia ou validade, a saber: a) por se ter errado no julgamento dos factos e/ou do direito, sendo então a respetiva consequência a sua revogação; e b) como atos jurisdicionais que são, por se ter violado as regras próprias da sua elaboração e/ou estruturação, ou as que balizam o conteúdo e/ou os limites do poder à sombra do qual são decretadas, sendo então passíveis de nulidade, nos termos do art.º 615.º do CPC Ac. STA. de 09/07/2014, Proc.00858/14, in base de dados da DGSI..
As causas determinativas de nulidade das decisões judiciais encontram-se taxativamente elencadas no art.º 615º do CPC e reportam-se a vícios formais da sentença em si mesma considerada, decorrente de na respetiva elaboração e/ou estruturação não terem sido respeitadas as normas processuais que regulam essa sua elaboração e/ou estruturação e/ou as que balizam os limites da decisão nela proferida (o campo de cognição do tribunal fixado pelas partes e de que era lícito ao último conhecer oficiosamente não foi respeitado, ficando a decisão aquém ou indo além desse campo de cognição), tratando-se, por isso, de defeitos de atividade ou de construção da própria decisão judicial (seja, sentença, acórdão ou despacho) em si mesma considerada ou, reafirma-se, vícios formais que afetam essa decisão de per se ou os limites à sombra dos quais esta é proferida.
Diferentemente desses vícios são os erros de julgamento (error in judicando), os quais contendem com vícios quanto ao julgamento da matéria de facto nela realizado ou à decisão de mérito nela proferida, decorrentes de se ter incorrido numa distorção da realidade factual julgada provada e/ou não provada, em virtude da prova produzida impor julgamento de facto diverso do realizado pelo tribunal a quo (error facti) e/ou por este ter incorrido em erro na aplicação do direito (error juris).
Nos erros de julgamento assiste-se, assim, ou a uma deficiente análise crítica da prova produzida ou a uma deficiente enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicáveis aos factos provados e não provados, sendo que esses erros, por não respeitarem já a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença em si mesma considerada ou aos limites à sombra dos quais aquela é proferida, não a inquinam de invalidade, mas sim de error in judicando, atacáveis em via de recurso Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in base de dados da DGSI..
3.2.1. Entre os vícios determinativos da nulidade da decisão judicial por nesta terem sido desrespeitados os limites que balizam essa decisão conta-se o previsto na al. e), do n.º 1 do art. 615º, onde se estabelece que é nula a sentença em que o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Deste modo, salvo os casos dos n.ºs 2 e 3 do art. 609º do CPC., não pode o juiz ultrapassar na decisão os limites quantitativos ou qualitativos do pedido ou dos pedidos deduzidos, sob pena de incorrer em flagrante violação dos princípios do dispositivo e do contraditório e da decisão judicial ser nula na parte em que ocorre essa condenação quantitativamente superior ao pedido ou na parte em que a condenação seja qualitativamente distinta desse pedido. Logo, o juiz não pode “condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir” (art.º 609º, nº 1, ainda do CPC). É a consagração da velha máxima “ne eat judex ultra vel extra petita partium; sententia debet esse conformis libelo”
Movendo-se o juiz num terreno em que domina o princípio dispositivo, são as partes que, através do pedido (art. 3º, nº 1, do CPC), circunscrevem o “thema decidendum”, indicando a providência requerida, “não tendo o juiz que cuidar de saber se à situação real conviria ou não providência diversa” (António Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luis Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, 2018, pág. 728). Infringindo esse comando, o Tribunal ultrapassa o limite imposto por lei ao seu poder de jurisdição. Por força dessa regra, a sentença deve manter-se, quanto ao seu conteúdo, dentro dos limites definidos pela pretensão do autor e pela reconvenção eventualmente deduzida pelo réu, não podendo o juiz proferir decisão que extravase essas pretensões, quer no que respeita à quantidade, quer relativamente ao seu próprio objeto, sob pena de cometer a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, e), do CPC.
Reportando-se à nulidade prevista na al. e) do n.º1 do art.º 615.º do CPC, o Supremo Tribunal Administrativo em Acórdão de 12.05.2016, prolatado no processo 01441/15, afirma que:
XVII. Passando, agora, à caracterização da nulidade de decisão por alegada infração ao disposto na al. e) do n.º 1 do art. 615.º do CPC temos que com a mesma se visa sancionar a infração ao dever que impende sobre o tribunal de, na sua pronúncia, se conter nos limites do pedido [cfr. art. 609.º do CPC].
XVIII. De tal dever, constituindo uma decorrência dos princípios da necessidade do pedido [cfr. art. 03.º, n.º 1, do CPC] e da vinculação do juiz ao pedido [congruência ou correspondência entre decisão e pedido – arts. 608.º, n.º 2 in fine e 609.º do CPC], deriva a imposição ao julgador duma obrigação de na decisão a proferir o mesmo observar aquilo que é o petitório da ação.
XIX. Assim, neste quadro haverá excesso de pronúncia sempre que o tribunal condene ou absolva num pedido não formulado, bem como quando conhece de pedido em excesso parcial ou qualitativo, mormente, quando, utilizando fundamentos admissíveis, aprecie dum pedido que é quantitativa ou qualitativamente distinto daquele que foi formulado pela parte, condenando em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.»
3.2.3. No caso, o réu interpôs recurso subordinado invocando que a sentença recorrida é nula nos termos da al. e) do n. º 1 do art.º 615.º do CPC. Para tanto aduz que na petição inicial os autores formularam o pedido de declaração de nulidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...), de 27.10.2008, que indeferiu o pedido de legalização de um muro (murete) com cerca de 0,40 m na cobertura de um anexo existente na sua propriedade, bem como da estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente no mesmo, ordenando a sua demolição no prazo de 30 dias, não tendo deduzido contra esse ato de indeferimento o pedido de condenação do Réu à prática de ato devido ou, nos termos da lei, “à prática, dentro de determinado prazo, de um ato administrativo ilegalmente (...) recusado” (cfr. art. 66º, nº 1, e 67º, nº 1, b), do CPTA).
Porém, a sentença recorrida, julgando a ação parcialmente procedente, condenou o Réu a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 cm na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores e anulou o ato de demolição nesta parte, pelo que, exceto quanto à injunção decretada na sua parte final (ao anular o “ato de demolição” do muro, querendo certamente referir-se ao ato que ordenou essa demolição), a sentença padece da nulidade prevista no art.º 615º, nº 1, e), 2ª parte, do CPC, pois condenou o Réu em objeto diverso do pedido.
E assiste-lhe inteira razão.
Compulsado o teor da petição inicial, temos que foram estes os pedidos especificamente formulados pelos Autores:
“deve a presente acção ser julgada procedente e, por via disso, a) declarar nulo o despacho proferido em 27 de Outubro de 2008 pelo Presidente da Câmara Municipal de (...), que indeferiu o pedido de legalização de um muro com cerca de 0,40 m na cobertura de um anexo existente na propriedade dos AA., bem como, a estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente no mesmo, ordenando a sua demolição no prazo de 30 dias, por padecer quer do vício de violação de lei quer do vício de forma, por falta de fundamentação, quer, ainda, porque traduz a violação do conteúdo essencial de vários direitos fundamentais, bem como, nessa conformidade, b) declarar nulo o acto administrativo praticado em 30 de Janeiro de 2009, pelo Vice-Presidente da Câmara Municipal de (...) que determinou a posse administrativa do prédio dos AA., com vista demolir um murete com uma altura de 0,40 cm que contorna a cobertura da garagem e a estrutura em alumínio com vidro fosco, com uma largura de 1,40m, colocada sobre o mesmo, a qual contorna a garagem nos limites Sul E Poente do terreno; e, c) condenar o Réu em custas, procuradoria e demais encargos legais”.

Tendo sido julgado, por sentença transitada em julgado, inimpugnável o ato de 30.01.2009, a ação seguiu os seus termos para a apreciação do ato administrativo proferido em 27.10.2008.
Em relação a esse ato, a ação foi julgada parcialmente procedente, anulando-se o despacho de 27.10.2008, na parte em que mandou demolir o murete por cima da garagem, por violação do preceituado no artigo 73.º do RGEU e, em consequência, condenou-se o Réu a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores.
Ora, tendo, como se viu, a ação administrativa especial prosseguido para a apreciação do pedido de declaração de nulidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...), datado de 27.10.2008, que indeferiu o pedido de legalização de um murete com cerca de 0,40 m na cobertura de um anexo existente na propriedade dos Autores, tem-se por assente que a pretensão destes era a de que o Tribunal declarasse a nulidade de um ato administrativo de indeferimento.
No despacho de sustentação a Senhora Juiz a quo entende, porém, que estando-se «(…) perante um ato de conteúdo negativo que, vindo recusar uma pretensão deduzida pelos Autores junto do Réu, não introduziu qualquer modificação na ordem jurídica, tratando-se, por conseguinte, e em suma, de um ato que veio recusar expressamente uma alteração do status quo ante (neste sentido, o Acórdão do TCA-Sul, de 10-03-2016, proc. n.º 12908/16, disponível em www.dgsi.pt)», sempre se deveria ter « presente o normativo ínsito no artigo 66.º, n.º 2 do CPTA (com a redação em vigor à data da propositura da ação, decorrente da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro), onde se determina que “ainda que a prática do acto devido tenha sido expressamente recusada, o objecto do processo é a pretensão do interessado e não o acto de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta directamente da pronúncia condenatória”. E que no mesmo sentido «milita o artigo 71.º, n.º 1 do CPTA, onde, a respeito dos poderes de pronúncia do tribunal, se refere que, na decisão, “o tribunal não se limita a devolver a questão ao órgão administrativo competente, anulando ou declarando nulo ou inexistente o eventual acto de indeferimento, mas pronuncia-se sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do acto devido”.
Conclui que «o objeto do processo não consistia, in casu, na mera averiguação da ilegalidade da conduta administrativa, mas antes na averiguação da legalidade do ato cuja prática vem requerida, o que significa que era imposto ao Tribunal que averiguasse do mérito ou do bem legal fundado da efetiva pretensão dos Autores (neste sentido, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, Código de Processo nos Tribunais Administrativos Anotado, Volume I, Almedina, 2004, p. 415).
Foi essa a apreciação a que procedeu o Tribunal que, concluindo pela ilegalidade parcial do despacho impugnado e determinado a sua anulação parcial, atendeu àquele que era o objeto efetivo do processo (i.e., a pretensão condenatória dos Autores) e procedeu à condenação do Réu a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores, em estrita obediência pelo disposto nos supra enunciados artigos 66.º, n.º 2 e 71.º, n.º 1 do CPTA. Não tem, por isso, cabimento legal a nulidade da sentença, por condenação em objeto diverso do pedido, nos termos do estatuído no artigo 615.º, n. 1, alínea e) do CPC, imputada pelo Réu à decisão recorrida».
Mas salvo o devido respeito, não podemos concordar com a Senhora Juiz a quo. É que, pese embora a ação adequada a instaurar contra o réu fosse a de condenação à prática de ato devido uma vez que estava em causa o indeferimento expresso de uma pretensão de licenciamento urbanístico formulada pelos autores, a verdade é que os mesmos não formularam o competente pedido de condenação á prática de ato devido, antes se ficaram pela simples dedução de um pedido de estrita impugnação desse ato.
Para estas situações rege o art.º 51.º, n.º4 do CPTA (na versão aplicável), no qual se estabelece que « Se contra um ato de indeferimento for deduzido um pedido de estrita anulação, o tribunal convida o autor a substituir a petição, para o efeito de formular o adequado pedido de condenação à prática do ato devido, e, se a petição for substituída, a entidade demandada e os contrainteressados são de novo citados para contestar». Resulta deste preceito legal, que perante um pedido de estrita anulação de um ato de indeferimento, o tribunal deve, oficiosamente, convidar o autor a substituir a petição inicial por outra em que formule o adequado pedido de condenação à pratica de ato devido e caso o autor não corrija a situação, a ação não poderá ser apreciada pelos tribunais por lhe faltar um pressuposto processual, conduzindo à absolvição da instância. Caso o autor substitua a p.i., então impõe-se nova citação da entidade demandada e dos contrainteressados para contestarem a ação, o que revela, de per si, que não é indiferente à defesa do réu e dos contrainteressados estar-se perante uma ação de mera impugnação de ato administrativo ou perante uma ação de condenação à prática de ato devido.
Acontece que, na situação vertente o Tribunal não convidou os autores, como devia, para substituírem a petição inicial que apresentaram de modo a deduzirem o adequado pedido de condenação à prática de ato devido, e tendo a ação prosseguido como de mera impugnação de um ato de indeferimento, o Tribunal a quo ficou adstrito a conhecer estritamente desse pedido, e como tal, impedido de condenar o réu em pedido diverso do formulado pelos autores na ação, designadamente, de considerar que o objeto da ação é o pedido de condenação à prática de ato devido. O facto de se estar perante um ato de conteúdo negativo, não legitima que o Tribunal ultrapasse o pedido formulado na ação, convolando-o oficiosamente em pedido de condenação à prática devido.
Logo, o Tribunal a quo, ao ter proferido uma decisão de condenação do Réu à prática de ato devido, incorreu em nulidade por violação do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. e) do CPC.
Assim, no caso, não oferece dúvida que a sentença recorrida é nula quando condena a entidade demandada a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores e anulou o ato de demolição nesta parte. Assim, exceto quanto à injunção decretada na sua parte final, a sentença padece da nulidade prevista no art.º 615º, nº 1, e), 2ª parte, do CPC, pois condenou o Réu em objeto diverso do pedido.
Termos em que procede a invocada nulidade da sentença.
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b.2. Do erro de julgamento sobre a matéria de facto.
3.3. Os Recorrentes imputam à decisão sob sindicância erro de julgamento sobre a matéria de facto por não terem sido julgados como provados os factos que resultaram provados, considerando a prova testemunhal e documental produzida nos autos, e que foram articulados nos pontos XIV, XXIX, XXX, XXXI, XXXII da p.i.
3.3.1.A respeito da impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, dir-se-á que na sequência das alterações legislativas introduzidas ao CPC pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, o legislador introduziu o registo da audiência final, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes o duplo grau de jurisdição em sede de julgamento da matéria de facto, de modo que a alteração da matéria de facto, que no anterior regime processual era excecional, passou a ser uma função normal da 2.ª Instância.
Nessa operação foi propósito do legislador que o tribunal de 2ª instância realize um novo julgamento em relação à matéria de facto impugnada, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta expressamente do estabelecido no art.º 662º, n.º 1 do CPC, na redação introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, que é a versão aplicável aos presentes autos (e a que se referem todas as disposições do CPC infra identificadas), quando estabelece que a “Relação” deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1.S1, in base de dados da DGSI..
Deste modo é que perante as regras positivas vigentes na atual lei processual civil, tendo o recurso por objeto a impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, o Tribunal de 2.ª Instância deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada pelo recorrente, procedendo à efetiva reapreciação da prova produzida, devendo, nessa tarefa, considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda pertinentes, tudo da mesma forma como o faz o juiz da 1.ª Instância, embora, nessa tarefa, esteja naturalmente limitado pelos princípios da imediação e da oralidade.
Nesse novo julgamento, como verdadeiro tribunal de substituição, a 2.ª Instância aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art.º 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil).
Nessa sua livre apreciação, a 2.ª Instância não está condicionada pela apreciação e fundamentação do tribunal recorrido, uma vez que o objeto da apreciação em 2ª instância é a prova produzida, tal como na 1ª, e não a apreciação que esta fez dessa mesma prova, podendo, na formação dessa sua convicção autónoma recorrer a presunções judiciais ou naturais nos mesmos termos em que o faz o juiz da primeira instância Ac. RG. de 01/06/2017, Proc. 1227/15.6T8BGC.C1, in base de dados da DGSI..
No entanto, incumbe precisar que apesar da 2.ª Instância dever efetuar um novo julgamento em sede de impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª instância, não foi propósito do legislador que o julgamento a realizar por aquela se transformasse na repetição do realizado na 1ª Instância, e daí que tenha rodeado o recurso da impugnação do julgamento da matéria de facto à imposição ao recorrente de determinados ónus que enuncia no art.º 640º do CPC, com vista a obstar que o julgamento a realizar se transforme na repetição do antes efetuado em 1ª Instância e a evitar recursos genéricos.
É assim que com vista a atingir esses desideratos, o legislador optou “por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de factos controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente”, pelo que se mantém o entendimento que, como tribunal de 2ª Instância que é, este deverá ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto António Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, pág. 153., estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.
Depois, tal como se impõe ao juiz a obrigação de fundamentar as suas decisões, também ao recorrente é imposto, como correlativo do princípio da auto- responsabilidade e dos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, a obrigação de fundamentar o seu recurso, demonstrando o desacerto em que incorreu o tribunal a quo em decidir a matéria de facto impugnada em determinado sentido, quando se impunha decisão diversa, devendo no cumprimento desses ónus, indicar não só a matéria de facto que impugna, como a concreta solução que, na sua perspetiva, reclama que tivesse sido proferida, os concretos meios de prova que ancoram essa solução diversa, com a respetiva análise crítica, isto é, com a indicação do porquê dessa prova impor decisão diversa daquela que foi julgada pelo tribunal a quo.
O art.º 640º, n.º 1 do CPC, estabelece que “quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnada.
Depois, caso os meios probatórios invocados como fundamento de erro na apreciação da prova tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (al. a), do n.º 2 do art. 662º).
Precise-se que cumprindo a exigência de conclusões nas alegações a missão essencial de delimitação do objeto do recurso, fixando o âmbito de cognição do tribunal ad quem, é entendimento jurisprudencial pacífico que, nas conclusões, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que impugna e a concreta resposta que, na sua perspetiva, deve ser dada a essa matéria impugnada.
Já quanto aos demais ónus, os mesmos, porque não têm aquela função delimitadora do objeto do recurso, mas se destinam a fundamentar o último, não têm de constar das conclusões, mas sim das motivações.
Sintetizando, à luz deste regime, seguindo a lição de Abrantes Geraldes Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 155., sempre que o recurso de apelação envolva matéria de facto, terá o recorrente: a) em quaisquer circunstâncias indicar sempre os concretos factos que considere incorretamente julgados, com a enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; c) relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos; d)…; e) o recorrente deixará expressa, na motivação (segundo o STJ, nas conclusões), a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus da alegação, por forma a obviar à interposição de recurso de pendor genérico ou inconsequente.
O cumprimento dos referidos ónus, conforme adverte Abrantes Geraldes, tem a justificá-lo a enorme pressão, geradora da correspondente responsabilidade de quem, ao longo de décadas, pugnou pela modificação do regime da impugnação da decisão da matéria de facto e se ampliasse os poderes da 2.ª Instância, a pretexto dos erros de julgamento que o sistema anterior não permitia corrigir; a consideração que a reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida; a ponderação de que quem não se conforma com a decisão da matéria de facto realizada pelo tribunal de 1ª instância e se dirige a um tribunal superior, que nem sequer intermediou a produção da prova, reclamando a modificação do decidido, terá de fundamentar e justificar essa sua irresignação, sendo-lhe, consequentemente, imposto uma maior exigência na impugnação da matéria de facto, mediante a observância de regras muito precisas, sem possibilidade de paliativos, sob pena de rejeição da sua pretensão e, bem assim o princípio do contraditório, habilitando a parte contrária de todos os elementos para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações, uma vez que só na medida em que se conhece especificamente o que se encontra impugnado e qual a lógica de raciocínio expandido pelo recorrente na valoração e conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita o recorrido de todos os elementos que lhe permitam contrariar essa impugnação em sede de contra-alegações.
A apreciação do cumprimento das exigências legalmente prescritas em sede de impugnação da matéria de facto deve ser feita à luz de um “critério de rigor” como decorrência dos referidos princípios de auto responsabilização, de cooperação, lealdade e boa-fé processuais e salvaguarda cabal do princípio do contraditório a que o recorrente se encontra adstrito, sob pena da impugnação da decisão da matéria de facto se transformar numa “mera manifestação de inconsequente inconformismo” Abrantes Geraldes, in ob. cit., pág. 159.
Ac. RC, de 11.07.2012, Proc. n.º 781/09, in base de dados da DGSI, onde se lê que este “especial ónus de alegação, a cargo do recorrente, deve ser cumprido com particular escrúpulo ou rigor”, constituindo “simples decorrência dos princípios estruturantes da cooperação e lealdade e boa fé processuais, assegurando, em última extremidade, a seriedade do próprio recurso”.

No mesmo sentido vide Acs. S.T.J. de 18/11/2008, Proc. 08A3406; 15/09/2011, Proc. 1079/07.0TVPRT.P.S1; 04/03/2015, Proc. 2180/09.0TTLSB.L1.S2; 01/10/2015, Proc. 824/11.3TTLSB. L1. S1; 26/11/2015, Proc. 291/12.4TTLRA.C1; 03/03/2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1.S1; 11/02/2016; Proc. 157/12.8TUGMR.G1.S1, todos in base de dados da DGSI..

Como consequência, impõe-se a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto quando ocorra: “a) falta de conclusões sobre a impugnação da matéria de facto (art. 635º, n.º 4 e 6411º, n.º 2, al. b) do CPC); b) falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a) do CPC); c) falta de especificação na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); d) falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e e) falta de posição expressa, na motivação (segundo o STJ, nas conclusões), sobre o resultado pretendido a cada segmento da impugnação” Abrantes Geraldes, ob. cit., págs. 158 e 159..
Esta posição tem sido a que tem sido seguida, de forma praticamente uniforme, pela jurisprudência do STJ, que, como referido, tem sustentado que a decisão que, na perspetiva do apelante, deve ser proferida quanto à concreta matéria de facto que impugna, deve, também, constar das conclusões Acs. do STJ de 26/09/2018, Proc. 141/17.5T8PTM.E1-S1; 05/09/2018, Proc. 15787/15.8T8PRT.P1-S2; 01/03/2018, Proc. 85/14.2TTMAI.P1.S1; de 06/06/2018, Proc. 4691/16.2T8LSB.L1.S1; 06/06/2018, Proc. 1474/16.38CLD.C1.S1; 06/06/2018, Proc. 552/13.5TTVIS.C1.S1; e de 16/05/2018, Proc. 2833/16.7T8VFX.L1.S1, todos in base de dados da DGSI..
Acresce precisar que essa instância superior tem operado uma distinção entre: a) ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto do recurso em sede de impugnação da matéria de facto, onde os requisitos impostos à parte se encontram ligados com o mérito ou demérito do recurso; e b) ónus secundários, que se prendem com os requisitos formais.
Quanto aos requisitos primários ou fundamentais de delimitação do objeto do recurso, onde se inclui a obrigação do recorrente de formular conclusões e nestas especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas e, bem assim, a falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados que, na sua perspetiva, sustentam esse julgamento diverso da matéria de facto que impugna, requisitos esses sobre que versa o n.º 1 do art. 640º do CPC, a jurisprudência, sem prejuízo do que infra se dirá, tem considerado que aquele critério de rigor se aplica de forma estrita, não admitindo quaisquer entorses, pelo que sempre que se verifique o incumprimento de qualquer um desses ónus, se impõe rejeitar o recurso da matéria de facto na parte em que se verifica a omissão.
Já no que respeita aos ónus da impugnação secundários, que são os enunciados no n.º 2 daquele art. 640º, em que se consagra a obrigação do recorrente, quando os meios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenha sido gravada, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, considera-se que embora a observância desse ónus deva ser apreciado à luz do enunciado critério de rigor, não convém exponenciar esse rigor ao ponto de ser violado o princípio da proporcionalidade e seja denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador” Abrantes Geraldes, in ob. cit., págs. 160 e segs.
Argumenta-se que se está perante meros requisitos de forma, destinados a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência, pelo que o cumprimento desse ónus tem de ser “interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não se justificando a imediata e liminar rejeição do recurso quando, apesar da indicação do recorrente não for totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento” Acs. STJ. 29/10/2015, Proc. n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1; de 15/02/2018, Proc. 134116/13.2YIPRT.E1.S1; de 21/03/2019, Proc. 3683/16.6T8CBR.C1.S2, in base de dados da DGSI..
No entanto, impõe-se precisar que mesmo em relação aos ónus de impugnação primários tem-se assistido ultimamente, ao nível da jurisprudência, a um aliviar do enunciado critério de rigor, admitindo-se a apreciação do recurso ainda que as conclusões sejam omissas quanto à referência expressa dos concretos pontos da matéria de facto que o apelante impugna, desde que os factos impugnados resultem claramente identificados nas antecedentes alegações Neste sentido, Acs. do STJ de 08/02/2018, Processo nº 765/13.0TBESP.L1.S1; de 08/02/2018, Processo nº 8440/14.1T8PRT.P1.S1; de 06/06/2018, Processo nº 552/13.5TTVIS.C1.S1, e de 13/11/2018, Processo nº 3396/14, este último ainda inédito e os restantes in base de dados da DGSI..
3.3.2. Tendo presente os enunciados critérios orientadores que se impõem ao apelante em sede de impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, quando esta se encontre submetida ao princípio regra da livre apreciação da prova, no caso, os recorrentes cumprem com os enunciados ónus impugnatórios.
3.3.3. Os recorrentes pretendem que este Tribunal ad quem adite aos factos assentes a seguinte matéria que alegaram nos supra mencionados pontos da p.i. e que o Tribunal a quo, pese embora a sua relevância para a boa decisão da causa, não considerou como provados:
«- 1.º O LICENCIAMENTO DA AMPLIAÇÃO DO ANEXO DO VIZINHO L. NÃO FOI PRECEDIDO DE QUALQUER FISCALIZAÇÃO POR PARTE DOS SERVIÇOS DA RÉ;
-2.º NO ÂMBITO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO N.º 772/1980 FORAM PRESTADAS FALSAS DECLARAÇÕES PELO EXMO. SR. PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE (...) QUE, EM 14 DE OUTUBRO DE 2004, DECLAROU QUE L. “TEM UNS ANEXOS JUNTO Á SUA HABITAÇÃO COM MAIS DE 67 ANOS DE EXISTÊNCIA” (DOC.15 DA P.I.),;
-3.º FALSIDADE QUE, MAIS TARDE, EM 13 DE JANEIRO DE 2005, ACABA POR SER RECONHECIDA PELO PRÓPRIO PRESIDENTE DA JUNTA QUANDO INTERPELADO PELOS AA., E PARA REPOSIÇÃO DA VERDADE EMITE NOVA DECLARAÇÃO, A QUAL FOI DEVIDA E TEMPESTIVAMENTE JUNTO AOS PROCESSOS CAMARÁRIOS EM CAUSA. (DOC. 16 DA P.I.);»

Desde já se afirma, que considerando os factos dados como assentes e as várias soluções de direito possíveis, a matéria sindicada pelos recorrentes afigura-se-nos como irrelevante para a boa decisão da causa.

3.3.4.Quanto ao aditamento do ponto 1.º, com o qual os recorrentes pretendem que se leve aos factos assentes que «O LICENCIAMENTO DA AMPLIAÇÃO DO ANEXO DO VIZINHO L. NÃO FOI PRECEDIDO DE QUALQUER FISCALIZAÇÃO POR PARTE DOS SERVIÇOS DA RÉ» importa referir que da prova produzida não decorre que a ampliação do referido anexo tenha sido licenciado pelo réu. Por outro lado, ainda que tivesse sido licenciada, não vemos qual a relevância de levar aos factos assentes o facto de os serviços do Réu terem procedido a uma previa fiscalização, uma vez que a realidade que os recorrentes pretendem demonstrar com o aditamento do ponto 1.º, já se encontra assente, na medida em que, como decorre dos factos provados nos pontos 56 a 59, está provado que a ampliação do referido anexo, “foi realizada até cerca de 1995 e do mesmo consta uma janela virada para a garagem do Autor”, ou seja, depois dos recorrentes terem construído a sua garagem e o murete de 0,40 cm.
3.3.5.Quanto à matéria dos pontos 2 e 3, os recorrentes aduzem que a sentença omitiu por completo e deveria ter incluído nos fundamentos de facto a circunstância de terem sido prestadas falsas declarações no Processo Administrativo n.º 772/1980, mais concretamente, as prestadas pelo Presidente da Junta de Freguesia de (...) que, no âmbito do Processo Administrativo n.º 772/1980, em 14 de Outubro de 2004, vem declarar que L. “tem uns anexos junto á sua habitação com mais de 67 anos de existência” (Doc.15 da p.i.), pois essa falsidade, mais tarde, em 13 de Janeiro de 2005, acaba por ser reconhecida quando interpelado pelos AA., e para reposição da verdade emite nova declaração, a qual foi devida e tempestivamente junto aos Processos Camarários em causa. (Doc. 16 da p.i.).
Considerando que a matéria inserta nos referidos pontos respeita a duas declarações emitidas pela mesma entidade que se contradizem, as mesmas não detêm qualquer relevância probatória, anulando-se uma à outra. A circunstância de se dar como provado que foram prestadas falsas declarações por parte da entidade emitente, não tem qualquer relevo para a decisão da presente ação, por não estar em julgamento o comportamento da referida entidade, mas sim se uma determinada realidade construtiva se afigura legalizável ou não, e quanto a essa matéria de nada importa constar do leque dos factos assentes que foram emitidas duas declarações contraditórias, na medida em que, os factos relevantes para decidir a objeto da ação são outros e têm de assentar noutros fundamentos probatórios que seja credíveis e não em declarações da mesma entidade que se contradizem uma à outra.
Em face do exposto, impera concluir pela improcedência do apontado erro de julgamento sobre a matéria de facto e pela improcedência do recurso nesta parte.

*
b.3. Do erro de julgamento quanto à decisão de mérito por ter julgado apenas parcialmente inválido o ato de indeferimento impugnado quanto ao murete e já não quanto à estrutura metálica.
Os autores/recorrentes interpuseram o presente recurso contra a decisão proferida pelo Tribunal a quo que julgou parcialmente procedente a ação administrativa e, em consequência, condenou o Réu a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores, anulando o ato de demolição nesta parte, por da sentença recorrida não resultar que igual decisão tivesse sido proferida em relação ao pedido de legalização da estrutura metálica que igualmente formularam junto do réu.
Entendem os autores que, por força desta decisão, foi indeferido o pedido de legalização da estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40 m existente no mesmo, conquanto, na sentença recorrida se considerou que “o murete existente por cima da garagem foi construído anteriormente à ampliação do anexo do vizinho. O mesmo já não aconteceu com a estrutura metálica. Esta já foi construída depois da ampliação do anexo vizinho. Deste modo, o ato administrativo, ora impugnado, está ferido de ilegalidade, na parte em que mandou demolir o murete por cima da garagem, violando, desta forma, o artigo 73.º do RGEU. Pelo que terá que proceder a presente ação, no tocante ao licenciamento do murete construído por cima da garagem”.
Na ótica dos recorrentes, o Tribunal a quo não retirou todas as consequências legais das incontornáveis conclusões a que chegou na sentença, e isso porque, estando provada a data de construção da garagem e murete com data anterior à ampliação do anexo do vizinho, simplesmente deveria ser reposta a legalidade urbanística, designadamente imposto os afastamentos do artigo 73.º do RGEU quanto ao anexo do vizinho ( vide conclusões A, B e C), tendo sido o vizinho dos recorrentes que colocou o seu anexo a apenas 0,20cm da garagem e murete dos recorrentes. Logo, nunca o referido anexo poderia ter sido licenciado por contrariar o disposto no art.º 73.º do RGEU e, como tal, a existência do mesmo não pode servir de base ou fundamento para a reclamação de qualquer direito, como seja a “servidão de vistas”, atendendo a que tal licenciamento é nulo dado assentar num facto inverídico ou inexistente e obtido com preterição total do procedimento legalmente exigido.
Em suma, professam o entendimento de que o licenciamento da estrutura metálica é um ato em estreita ligação ao mesmo ato de licenciamento do murete, pois o mesmo princípio lhe serve de causa, base ou pressuposto: nenhuma construção poderia ser erigida e/ou ampliada pelo vizinho dos autores sem respeitar os afastamentos previstos no artigo 73.º do RGEU.
Será assim?
Já vimos que no caso, ao Tribunal não era permitido que tivesse proferido a decisão que proferiu de condenação à prática de ato devido mas apenas que decidisse da validade ou invalidade do ato impugnado, pelo que a análise a que vamos proceder cuidará apenas de verificar se o ato impugnado é ou não valido, total ou parcialmente.
Antes de avançarmos, importa tecer algumas considerações sobre o regime jurídico do art.º 73.º do REGEU e art.º 1360.º do Cód.Civil.
Dispõe o artigo 73.º do RGEU que «As janelas dos compartimentos das habitações deverão ser sempre dispostas de forma que o seu afastamento de qualquer muro ou fachada fronteiros, medido perpendicularmente ao plano da janela e atendendo ao disposto no artigo 75.º, não seja inferior a metade da altura desse muro ou fachada acima do nível do pavimento do compartimento, com o mínimo de 3 metros. Além disso não deverá haver a um e outro lado do eixo vertical da janela qualquer obstáculo à iluminação a distância inferior a 2 metros, devendo garantir-se, em toda esta largura, o afastamento mínimo de 3 metros acima fixado».
A jurisprudência não tem sido unânime quanto ao entendimento perfilhado sobre esta norma do RGEU, havendo decisões que apontam no sentido das suas prescrições serem apenas de considerar relativamente à construção cujo licenciamento se visa obter, não sendo de considerar nessa análise as construções vizinhas que possam ser prejudicadas com a obra a licenciar/legalizar.
Conforme se escreve no Acórdão deste TCAN de 15.07.2015, proferido no processo n.º 00196/07.0BECBR, no « âmbito dos tribunais judiciais, o alcance das normas do RGEU não tem merecido resposta unânime, como nos dá conta o Acórdão do TRLx, de 20.04.2006, P. 1227/2006-2, que subscreve a posição “intermédia” abaixo referida:
“(...) parte da jurisprudência vem defendendo que (....) o RGEU não confere qualquer direito subjetivo aos proprietários de imóveis, nem as suas normas podem ser invocadas para a proteção de direitos de particulares face a outros particulares, devendo a sua aplicação concretizar-se por via administrativa, na jurisdição própria (cfr., neste sentido, acórdão da Relação de Lisboa, de 24.01.1991, in Col. de Jur., ano XVI, tomo I, pág. 148; ac. da Rel. do Porto, 25.11.1993, CJ XVIII, tomo V, p. 230 e ss; ac. da Rel. de Coimbra, de 16.11.1999, CJ XXIV, tomo V, pág. 29; ac. da Rel. de Lisboa, de 24.6.2003, CJ XXVIII, tomo III, pág. 118).
No extremo oposto situa-se uma outra corrente jurisprudencial, em que se insere o acórdão do STJ citado pelos apelantes, a qual entende que o RGEU visa também a proteção de interesses particulares, proteção essa que para ser efetiva impõe o reconhecimento do correspondente direito subjetivo, incluindo o de o particular solicitar perante os tribunais judiciais a condenação de outrem na demolição de obra que fira o seu direito de propriedade por violação de normas do RGEU, desde que a Câmara Municipal tenha o poder de ordenar tal demolição (cfr. acórdão do STJ, de 26.9.1996, publicado na Col. de Jur. STJ, ano IV, tomo III, p. 20; ac. da Rel. de Lisboa, 11.02.1999, internet, dgsi, processo 0078706; ac. do STJ, de 28.01.2003, citado pelos apelantes, in Col. Jur. XXVIII, tomo I, pág, 61; ac do STJ, 30.9.2004, CJ STJ, XII, tomo III, pág. 37 e ss). Os tribunais portugueses também têm adoptado uma posição intermédia, a qual reconhece que o RGEU, embora não conceda direitos subjetivos a proprietários de imóveis, visa proteger também interesses particulares, cuja violação pode fundar responsabilidade civil extracontratual (cfr. ac. da Rel. de Lisboa, 14.11.1996, CJ XXI, tomo V, p. 96; ac. da Rel. de Guimarães, de 02.10.2002, CJ XXVII, tomo IV, p. 273; ac. do STJ, 15.5.2003, internet, processo 03B535; ac. STJ 08.7.2003, internet, 03A2112).
Na jurisdição administrativa pode ver-se, em sentido concordante ao defendido no acórdão recorrido, o Acórdão do STA, de 24.09.2003, P. 046946 (entretanto revogado por Acórdão do Pleno da Secção do CA, a seguir referido); o Acórdão do STA, de 17.02.2004, P. 047882, onde se conclui que o “art. 58º do RGEU visa assegurar as condições de arejamento, iluminação natural e exposição solar apenas da construção ou reconstrução a licenciar e não dos prédios vizinhos pré-existentes”; e o Acórdão do STA, de 24.09.2009, P. 0707/09, onde se afirma que “As ´janelas´ a que alude o art. 73º do RGEU são as do prédio a edificar, e não as existentes num imóvel contíguo”. Também no voto de vencido aposto no Acórdão do Pleno da Secção do CA, a seguir citado, se salienta, além do mais, o seguinte: “(...) se os proprietários dos terrenos se propuserem edificar de harmonia com as normas legais e regulamentares em vigor e se essa pretensão for, naturalmente, deferida por quem de direito não será a simples existência do edifício vizinho que, pelo simples facto de ter sido construído anteriormente, irá impedir essa edificação, mesmo que esta interfira com a sua exposição solar.
A não ser assim, a edificação de um prédio, por si só, determinaria a imediata constituição de uma servidão sobre os prédios vizinhos pois que estes no futuro só poderiam receber uma edificação se esta não prejudicasse o arejamento, a iluminação natural e a exposição aos raios solares dos edifícios já construídos. O que significava constituir uma servidão por meios não estabelecidos no art.º 1547.º do Código Civil, sendo certo que só através destes meios se pode constituir legalmente um ónus dessa natureza.”»
Outra corrente, que cremos maioritária e com a qual concordamos, vê no art.º 73.º e noutras normas do RGEU, como é o caso do art.º 58.º, uma norma relacional.
Nesse sentido, pronunciou-se este TCAN no citado acórdão de 15.07.2015 em cujo sumário se obtempera que «Os artigos 58.º e 73.º do RGEU são normas “relacionais”, que impõem restrições ao direito de propriedade, fundadas em razões de interesse público, designadamente de salubridade e qualidade ambiental, destinadas a proteger, quer o edifício objeto de licença de construção, quer os edifícios com este confinantes».
Visando concretamente o artigo 73.º do RGEU, atente-se no Acórdão do STA de 17.06.2003, prolatado no processo n.º 01854/02, no qual se afirma que “a preocupação do RGEU é evitar que se erijam edificações em terrenos acanhados e de conformação deficiente, é a ideia de que cada edificação deve ser encarada como mera parte de um todo, em que se terá de integrar harmoniosamente, valorizando-o tanto quanto possível, é evitar que os edifícios se aproximem tanto dos limites dos respetivos terrenos, que a qualidade urbana seja prejudicada no seu conjunto, é assegurar uma certa qualidade de vida às populações, é, afinal, o interesse público em garantir um ambiente urbano minimamente sadio e esteticamente equilibrado”. Em sentido concordante, assinala-se no Acórdão do STA, de 28.11.2007, prolatado no processo n.º 0663/07 que:As janelas são o objeto imediato de proteção do artigo 73º do RGEU e o elemento determinante do respetivo âmbito de aplicação”, pelo que “o prédio a edificar, pela sua implantação e demais características, deve, do mesmo passo, não só acautelar a sua própria salubridade, mas também não sacrificar a salubridade dos edifícios vizinhos já existentes.
Por sua vez, afirma-se no Acórdão do STA, de 06.12.2007, prolatado no processo n.º 0208/07 que oart. 73º dá concretização à regra geral do art. 58º do RGEU e o afastamento mínimo de 3 m nele previsto assegura níveis de arejamento, iluminação natural e exposição solar que o legislador considera satisfatórios” ( cfr. ainda, Acórdãos do STA, de 11.10.2007, P. 0299/07 e de 03.11.2005, P. 0939/03).
De referir ainda que a o artigo 73.º do RGEU e 1360.º do C.Civ têm um campo de aplicação distinto: o primeiro abrange o domínio das restrições impostas pelo direito público ao direito de propriedade, com base no interesse público da salubridade e estética das edificações; o segundo contempla restrições impostas pelo direito privado, com base em interesses meramente particulares, dos proprietários dos prédios vizinhos (cfr. o citado Acórdão do STA de 17.06.2003, P. 01854/02). Também compatibilizando as disposições do RGEU e do Código Civil veja-se o Acórdão do TCAN, de 09.12.2011, P. 01035/09.3BEBRG, onde se distingue, por um lado, a tutela de direitos meramente privados que visa evitar a devassa dos prédios confinantes mediante a aplicação das regras civilísticas; e, por outro, a tutela dos interesses públicos da salubridade e da estética das edificações.
Com interesse veja-se também o Acórdão deste TCAN, de 16.01.2015, prolatado no processo n.º 00614/06.5BECBR, no qual se afirma que : “A execução das construções com observância daqueles normativos [artigos 58.º, 59.º e 62.º do REGU] garante aos utilizadores um padrão mínimo de qualidade ambiental e urbanística e aplica-se, após 1951, aos pedidos de licenciamento de toda e qualquer edificação, que passou a ter de observar o afastamento em relação à construção existente na proximidade antes do pedido de licença”.
Voltando ao caso, na fundamentação de facto da sentença em crise, deu-se como provado, para além do mais, que:
«56. Na planta topográfica apresentada em 12.03.1980 no processo administrativo apenso n.º 772/80, consta um anexo ao lado da casa de habitação de L. e que já existia desde 1937, que confina com o prédio do Autor. – Cfr. fls. 11 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
57. Na planta topográfica elaborada em outubro de 2004, denota-se que consta um anexo A que não existia na planta topográfica referida em 56., e que parece uma ampliação ao anexo que já existia desde 1937 e constante da planta descrita em 56. – Cfr. fls. 35 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
58. A ampliação do Anexo A referida em 57. foi realizada até cerca de 1995 e do mesmo consta uma janela virada para a garagem do Autor – Facto admitido pelo Autor (artigo XXV da p.i.).
59. O anexo A referido em 57., confina com a garagem do Autor que foi construída entre finais de 1991 e inícios de 1993. – Cfr. fls. 35 do processo administrativo apenso n.º 772/80, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
60. Por cima da garagem do Autor foi construído um murete à sua volta entre finais de 1991 e inícios de 1993. – Cfr. depoimentos de J., B. e M. e declarações de parte do Autor.
61. Por cima do murete referido em 59., em toda a sua extensão, foi colocado um painel com perfis em alumínio e vidro fosco, com 1,40 metros de altura, entre 16.04.2003 e 16.10.2003. – Cfr. fls. 02 e ss. e 11 e ss. do processo administrativo apenso n.º 1614/2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.»
Conforme se conclui na sentença recorrida decorre «do probatório que no terreno de L. já existia um anexo com cerca de 10 m2 desde 1937. Com a ampliação que o L. realizou na sua habitação em 1980, construiu mais um anexo, mas aquele que existia desde 1937, com os 10 m2, supostamente, manteve-se igual. Mais tarde, não se conseguiu descortinar quando, mas pelo menos em outubro de 2004, o referido anexo de 10 m2 estava ampliado, de acordo com a planta topográfica elaborada naquela data (factos provados 56., 57.). É este anexo, ampliado, que tem a janela virada para a garagem dos Autores (ponto 58. do probatório). O anexo e a garagem distam um da outra cerca de 0,20 cm.
Consta também do probatório que o anexo foi ampliado até, pelo menos, 1995 (ponto 58. do probatório).
Por seu turno, os Autores construíram a sua moradia e garagem, com o murete incluído, entre 1992 e 1993 (pontos 59., 60., 62. e 63. dos factos provados). Poder-se-á concluir que o anexo e a garagem foram construídos muito próximos um do outro, tendo concluído este Tribunal, de acordo com os depoimentos das testemunhas, corroborados com os documentos juntos, que a garagem com o murete por cima, à sua volta, foi construída (pouco) antes da ampliação do anexo do VIZINHO L..
Por outro lado, a estrutura em alumínio e vidro fosco foi colocada muito depois da construção do murete (facto provado 61.).
Com efeito, aquando a reclamação que o vizinho L. apresentou no Réu, em 16.04.2003, por causa do murete colocado em cima e à volta da garagem dos Autores, não escreveu sobre nenhuma estrutura metálica. Ora, não é verosímil que ela existisse, pois, de outro modo, o vizinho, também, reclamaria da referida estrutura metálica. Somente em 16.10.2003, é que L. faz referência a “foi acrescentado com um painel em perfis de alumínio e vidro fosco com 1,40 m de altura em toda a extensão confrontante com a minha propriedade”.
Por sua vez, aquando a exposição apresentada pelo Autor em 06.04.2004, juntou um documento, declaração emitida pelo seu irmão na qual se retira o seguinte: “(...) informar V. Exas que autoriza, a construção sem qualquer restrição, no limite e ao longo de toda a extensão do contorno (alçado sul) da garagem que confronta com a minha propriedade, de um “muro tapa vistas” com estrutura em alumínio com vidro translúcido, com cerca de 1,40 metros de altura sobre pequeno murete, com cerca de 40 cm de altura, este já construído, há anos, na periferia da placa de cobertura da garagem aquando da construção desta.” (pontos 32., 33. do probatório).
Portanto, relativamente à construção da estrutura metálica, esta é posterior à construção da ampliação do anexo do vizinho.
Verifica-se, assim, que o Réu partiu de premissas erradas para concluir pela demolição do murete e da estrutura metálica.
De facto, o Réu determinou a demolição em causa nos autos porque entendeu que o anexo do VIZINHO L. foi construído antes da construção do murete e da estrutura metálica, anexo este, devidamente licenciado.
Mas, de acordo com as provas carreadas para os presentes autos verificou-se que não foi bem assim. Na verdade, o murete que existe por cima da garagem foi construído anteriormente à ampliação do anexo que já existia desde 1937. O mesmo já não aconteceu com a estrutura metálica. Esta já foi construída depois da ampliação do anexo do vizinho.»
Este segmento transcrito da sentença recorrida traduz, no essencial, uma leitura correta da situação que resulta dos factos provados.
Porém, contrariamente à tese professada pelo réu, ora apelado, pese embora se tenha provado que no terreno do L., vizinho dos recorrentes, já existia um anexo com cerca de 10 m2 desde 1937, que aparece identificado na planta topográfica apresentada em 12.03.1980 no processo administrativo apenso n.º 772/80 ( ponto 56 dos factos assentes), a verdade é que, na planta topográfica elaborada em outubro de 2004, verifica-se que consta como existente um anexo A que não figurava na planta topográfica supra referida, o qual mais não é do que uma ampliação ao anexo que já existia desde 1937 “ ( vide ponto 57 dos factos assentes), tendo-se ainda apurado que a ampliação do referido anexo foi realizada até cerca de 1995, do mesmo constando uma janela virada para a garagem do Autor, esta e o respetivo murete com data de construção anterior à referida ampliação do anexo vizinho.
Ora, a decisão impugnada por via da qual o réu indeferiu o pedido de legalização da construção do murete sobre a garagem dos autores e da estrutura metálica, conforme decorre das informações e dos pareceres jurídicos que constituem o fundamento dessa resolução administrativa, revelam que a mesma teve como pressupostos de facto a circunstância de ambas as construções dos autores cuja legalização peticionaram terem sido posteriores à construção do referido anexo com janela, localizado no prédio de L., distando deste cerca de 0,20 cm. Decorre desses pareceres e informações técnicas assumir-se como certo que o anexo com a referida janela localizado no prédio de L. já existe com essa configuração desde 1937, e que o mesmo apenas terá sido objeto de obras de beneficiação não sujeitas a licenciamento, e, por conseguinte, tratar-se de uma construção legalizada e prévia às construções em causa dos recorrentes. E daí, considerarem que as referidas construções dos recorrentes violam o disposto no artigo 1360.º do Cód. Civil, uma vez que a cobertura da garagem com o referido murete e a estrutura em alumínio não obedecem às distâncias do limite do terreno do vizinho assim como violam o disposto no artigo 73.º do RGEU, atendendo à localização do referido anexo e à existência no mesmo de uma janela voltada para o prédio dos recorrentes, razões pelas quais o ato impugnado foi proferido no sentido do indeferimento da pretensão dos autores.
Na decisão recorrida, o Tribunal a quo considerou que “o ato administrativo, ora impugnado, está ferido de ilegalidade embora, na parte em que mandou demolir o murete por cima da garagem, violando, desta forma o artigo 73.º do RGEU”. Recorde-se que na ação movida pelos autores está em causa a impugnação do despacho proferido em 27 de outubro de 2008 pelo Presidente da Câmara Municipal de (...), que indeferiu o pedido de legalização de um murete com cerca de 0,40 m na cobertura de uma garagem existente na propriedade dos AA., bem como, a estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente no mesmo.
Afigura-se-nos que a decisão recorrida enferma de erro de julgamento na medida em que não considerou com a devida amplitude as consequências do erro nos pressupostos de facto e de direito em que assentou o ato de indeferimento do pedido de legalização das construções dos recorrentes. É que, tendo o ato de indeferimento assentado no pressuposto da legalidade da construção do anexo com janela, implantado no terreno do L., por alegadamente o mesmo existir construído e implantado, tal como se apresenta atualmente, desde 1937 e assim ser uma construção legal por estar dispensada de licenciamento, mas não se tendo provado esse pressuposto, como se viu em face dos factos tidos como assentes e não impugnados, e do qual o réu faz decorrer a violação aos artigos 1360.º do Cód. Civil e do art.º 73.º do RGEU, que arvorou como fundamento de direito para a recusa da pretensão de legalização das construções dos recorrentes, forçoso é concluir que o ato impugnado enferma de erro nos seus pressupostos de facto e de direito.
O erro nos pressupostos de facto e de direito constitui uma causa de invalidade dos atos administrativos, que determina a sua anulabilidade. Não se tendo provado que os pressupostos em que o Réu assentou o indeferimento da pretensão urbanística formulada pelos autores/recorrentes eram corretos, uma vez que, não foi tido em conta que a construção da garagem e do murete que a encima, propriedade dos recorrentes, foram anteriores à ampliação do anexo, em que foi aberta uma janela, antes pelo contrário, tendo o réu partido de um pressuposto contrário, qual seja, o de que a construção do anexo com janela do vizinho L. existe como tal desde 1937, sendo, por isso uma construção legal (porque dispensada de licenciamento) e prévia às construções dos Recorrentes, o ato impugnado enferma de erro nos pressuposto e tem de ser anulado.
Termos em que procede o invocado fundamento de recurso.

b.4- Do erro de julgamento quanto à decisão de mérito por não ter aplicado o princípio da garantia do existente.
Os recorrentes vêm ainda insurgir-se contra a sentença recorrida alegando que o Tribunal a quo devia ter deferido o pedido de legalização da estrutura de alumínio e vidro com cerca de 1,40m existente no muro dos autores, em nome do princípio da garantia do existente vigente no âmbito do direito do urbanismo, atendendo a que essa estrutura se encontra colocada há cerca de 20 anos, em plena funcionalidade, utilização e uso continuado( vide conclusões G e H).
Em primeiro lugar, recorde-se que os autores, ora recorrentes, na ação que intentaram apenas pediram a declaração de nulidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...), de 27.10.2008, que indeferiu o pedido de legalização do murete sobre a garagem e da estrutura de alumínio e vidro, não tendo formulado nenhum pedido de condenação à prática de ato devido, no sentido de ser o Réu condenado à legalização do murete e da referida estrutura metálica, pelo que nenhuma decisão se impunha proferir quanto à condenação do Réu à prática de ato devido.
Pese embora esta questão tenha perdido a sua utilidade em função da análise a que supra procedemos quanto ao erro sobre os pressupostos de facto e de direito em que assentou o ato impugnado e do erro de julgamento sobre o mérito da sentença recorrida que demos como verificado, sempre se dirá que, ao abrigo do princípio da cooperação, que situações como a descrita não estão abrangidas pelo campo de aplicação do princípio da salvaguarda do existente.
À data em que foi proferido o ato impugnado, este princípio tinha previsão legal expressa no art.º 60.º do RJEU, do D.L. n.º 555/99, de 16.12, na redação conferida pela Lei n.º 60/2007, de 04.09, e nele se dispunha que:
«1-As edificações construídas ao abrigo do direito anterior e as utilizações respetivas não são afetadas por normas legais e regulamentares supervenientes.
2- A licença ou admissão de comunicação prévia de obras de reconstrução ou de alteração das edificações não pode ser recusada com fundamento em normas legais ou regulamentares supervenientes à construção originária desde que tais obras não originem ou agravem desconformidade com as normas em vigor ou tenham como resultado a melhoria das condições de segurança e de salubridade da edificação.
3 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, a lei pode impor condições específicas para o exercício de certas atividades em edificações já afetas a tais atividades ao abrigo do direito anterior, bem como condicionar a execução das obras referidas no número anterior à realização dos trabalhos acessórios que se mostrem necessários para a melhoria das condições de segurança e salubridade da edificação».
Conforme decorre do disposto no n. º1 do art.º 60.º do RJUE, o princípio da proteção/ manutenção do existente visa salvaguardar que legislação posterior, ou seja, normas legais ou regulamentares supervenientes à construção da obra, não afetem as edificações cuja execução cumpriu com todos os requisitos, materiais e formais, exigíveis à data da edificação.
Este princípio apresenta-se em dois graus, dependendo da verificação de uma vontade de agir sobre a edificação construída ao abrigo do direito anterior ou apenas de salvaguardar a sua existência enquanto imóvel relativamente ao qual foi praticado um ato constitutivo de direitos e, como tal, insuscetível de modificação imposta por força de instrumentos legais ou regulamentares posteriores. Daí que se qualifique a previsão do n.º1 do art.º 60.º, como a vertente passiva deste princípio, e o n.º 2 do art.º 60.º, como a sua vertente ativa.
O art.º 60.º tem sido interpretado no sentido de que a legalidade material originária da edificação deve ser aferida em função do cumprimento de todos os requisitos materiais e formais exigíveis no momento da construção, sendo inaplicável às operações urbanísticas ilegais, mesmo que à data da respetiva construção, esta cumprisse com todas as normas em vigor, uma vez que o interessado não apresentou o respetivo pedido de licenciamento ou comunicação prévia, razão pela qual não pode ser considerada uma obra construída ao abrigo do direito anterior ( cfr. Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves e Dulce Lopes, in “Regime Jurídico da Urbanização e Edificação Comentado”, 4.ª edição, 2018, Almedina, pág.460).
No caso em análise, a construção da estrutura metálica é originariamente uma construção ilegal uma vez que foi construída sem prévio licenciamento, não podendo ser considerada uma obra construída ao abrigo do direito anterior.
Termos em que soçobra o invocado fundamento de recurso.
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b.5. Da violação dos princípios da tutela jurisdicional efetiva e da promoção do acesso justiça- artigos 13.º, 22.º, 26.º, 62.º, 65.º, 66.º, 266.º 2 268.º da CRP e artigos 2.º e 7.º do CPTA.

Os recorrentes vêm ainda insurgir-se contra a decisão recorrida, nos seguintes termos:
« I) AO DECIDIR DE FORMA CONTRARIA, ENFERMA A DECISÃO RECORRIDA DE GRAVE VIOLAÇÃO DA NORMA CONSTANTE NO ART. 73.º RGEU, COMO TAMBÉM SE VIOLAM OS PRINCÍPIOS DA TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA E DA PROMOÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA, CONSAGRADOS NA LEI DO PROCESSO ADMINISTRATIVO NOS ART. 2° E 7° DO CPTA;
J) VIOLA, AINDA, OS PRINCÍPIOS DA TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA – GARANTIA FUNDAMENTAL – 13.º, 22.º, 26.º, 62.º, 65.º, 66.º, 266.º E 268.º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA E O PRINCÍPIO DA PROMOÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA, PORQUANTO NÃO APRECIOU DEVIDAMENTE TODAS AS PRETENSÕES DEDUZIDAS, BEM COMO FEZ UMA INTERPRETAÇÃO DESIGUAL DA NORMA PREVISTA NO ARTIGO 73.º DO RGEU, NEGANDO EFECTIVA JUSTIÇA;
L) TAL DECISÃO ESTÁ, ASSIM, INQUINADA DOS VÍCIOS DE VIOLAÇÃO DE NORMA CONSTITUCIONAL E DE VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS E NORMAS URBANISTICAS, DEVENDO SER REVOGADA, POR ILEGAL.»

Nas sobreditas e transcritas conclusões I) a L) do recurso, os Recorrentes imputam à decisão sob sindicância, não só a violação do art.º 73º do RGEU, como ainda a violação dos princípios da “tutela jurisdicional efetiva e da promoção do acesso à justiça, consagrados nos arts. 2º e 7º do CPTA”, dos “princípios da tutela jurisdicional efetiva – garantia fundamental - 13.º, 22.º, 26.º, 62.º. 65.º, 266.º e 268.º da Constituição da República Portuguesa” e do “princípio da promoção do acesso à justiça”, porquanto na sua perspetiva, o Tribunal a quo “não apreciou devidamente todas as pretensões deduzidas, bem como fez uma interpretação desigual da norma prevista no artigo 73.º do RGEU, negando efetiva justiça”, razão pela qual a sentença padece ”dos vícios de violação de norma constitucional e de violação de princípios e normas urbanísticas”.
Sucede que, lidas as alegações de recurso, verificamos que nelas os recorrentes não cuidaram de indicar as concretas razões pelas quais concluem que a sentença recorrida viola os princípios da tutela jurisdicional efetiva e da promoção do acesso à justiça, ficando este tribunal sem saber das concretas razões por referência às quais os recorrentes consideram violados os referidos princípios e normas que invocam nas conclusões de recurso que formulam sob as alíneas I,J e L.
Como bem argumenta o réu/apelado, é no corpo da alegação de recurso que os recorrentes têm de explanar e desenvolver as razões de discordância com o julgado, na medida em que as conclusões de recurso são uma mera síntese dos fundamentos da discordância com o decidido, que obrigatória e logicamente as condiciona, sendo ilegal o alargamento do seu âmbito para além do que consta do corpo da alegação, não podendo o Tribunal tomar conhecimento de questão que não encontre eco “nas alegações propriamente ditas” ( cfr., neste sentido, Prof. José Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, pág. 357; Fernando Amâncio Ferreira, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, Almedina, 9ª Edição, 2009, pág. 159, e António Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 90.
Reitera-se que compulsadas as mesmas, verifica-se que nelas os recorrentes nada expenderam sobre a matéria vertida nas conclusões I) a L) da sua peça, exceto a alegada violação do art.º 73º do RGEU, questão sobre a qual já nos pronunciaremos.
Sendo assim, têm de ser desatendidas as conclusões que não encontrem correspondência com a motivação do recurso, mesmo que a questão suscitada nas conclusões seja de constitucionalidade ( cfr., neste sentido, o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 462/2016, de 14.07.2016 (Processo nº64/16, 2ª Secção, Relator: Conselheiro João Cura Mariano, acessível em www.dgsi.pt), aresto que “não julgou inconstitucional a interpretação conjugada dos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 3, ambos do Código de Processo Civil, no sentido de que tendo uma questão de inconstitucionalidade sido submetida à consideração do Tribunal da Relação apenas nas conclusões da alegação do recurso, mas não tendo sido explanada no corpo da alegação, deve uma tal questão ser desconsiderada pelo referido tribunal, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal omissão”.
Sempre se dirá, ademais, que também não descortinamos razões que possam fundamentar a violação dos referidos princípios.
Assim, tais conclusões têm de ser desatendidas na medida em que não têm respaldo na motivação do recurso.
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IV-DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte:
I- em conceder provimento ao recurso subordinado interposto pelo Município de (...) e, nessa sequência, declara-se nula a parte dispositiva da sentença recorrida no segmento em que se condena o réu “a deferir o pedido de legalização do muro com cerca de 0,40 m na cobertura da garagem existente na propriedade dos Autores”.
II- julga-se parcialmente procedente o recurso interposto pelos autores e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a impugnação do ato administrativo deduzida pelos autores contra o indeferimento da legalização da estrutura metálica com 1,40 cm, e em consequência, anula-se o ato impugnado quanto a essa estrutura;
III- no mais, mantém-se o decidido na sentença recorrida sem prejuízo do decidido em I.
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Custas do recurso principal na proporção do respetivo decaimento que se fixa em 25% para os autores e em 75% para o réu (artigo 527.º, nºs 1 e 2 do CPC)
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Custas do recurso subordinado pelos autores que decaíram totalmente no mesmo.
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Notifique.

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Porto, 22 de janeiro de 2021.

Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Alexandra Alendouro