Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:04834/04 - Viseu
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/29/2016
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ILEGITIMIDADE POR NÃO SER O POSSUIDOR
CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA
Sumário:I- O Código do Procedimento e Processo Tributário, (CPPT), aplica-se aos processos execução fiscal instaurados a partir de 05.02.2001, sem prejuízo do aproveitamento dos atos já realizados no âmbito do CPT.
II - A Contribuição Autárquica não é um imposto sobre o rendimento, mas sim imposto sobre o património, cujo sujeito passivo é, em regra o proprietário do prédio por força dos n.º 1 e 4 do arts. 8.º do Código da Contribuição Autárquica (CCA) e por isso responsável pelo seu pagamento.
III- Não terá qualquer relevo, para efeito da alínea b) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, a constatação no processo de execução fiscal de que o proprietário/executado não foi o possuidor ou fruidor dos bens no período a que se reporta a dívida exequenda, pois é precisamente pelo facto de ser proprietário que lhe é imputada a dívida de imposto.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:C...
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
O Recorrente, C…, recorre da sentença proferida nos presentes autos que julgou improcedente a oposição à execução fiscal nº. 2585-01/100375.5, referente à cobrança coerciva de Contribuição Autárquica dos anos de 1996, 1997 e 1998, no montante global de € 3 765.56.

Formulou nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

A. A sentença recorrida não fez uma correcta apreciação de toda a prova constante nos autos nem uma correcta interpretação dos preceitos legais, não valorando a prova testemunhal e demais documental junta.
B. Considera o Mmo Juiz que da matéria de facto dada como provada o “Oponente não provou que não tenha sido o possuidor do bem em causa durante o período a que respeita a divida exequenda” porque a prova testemunhal está em contradição com a defesa apresentada pelo oponente em sede de reclamação graciosa.
C. Ora, a divida em causa nos presentes reporta-se a Contribuição autárquica dos anos de 96,97 e 98.
D. Relativa a uma parcela de terreno que foi destacada de um prédio rústico, á qual foi atribuída natureza urbana apenas em 2001 dando assim nesse ano lugar ao pagamento da CA relativa a período anterior, cobrada já com a natureza de urbano.
E. No ano de 96 tal parcela, ainda fazendo parte do prédio rústico, tinha como titular inscrito o ora oponente.
F. O oponente apresentou oposição com base no disposto no artigo 204º/1 b) do CPPT, considerando-se parte ilegítima, por não ter sido ele nos anos a que se reporta a dívida o possuidor do bem, mas sim a empresa “R…, Lda” ou “I..., Lda”.
G. Foi apresentada prova documental e testemunhal aos autos.
H. Da prova testemunhal produzida em sede de julgamento, credível, isenta e com conhecimento real da situação em apreço, o Mmo Juiz entendeu que o oponente fez prova de que não era o possuidor do bem que está na origem da divida nos presentes autos.
Contudo:

I. Entendeu que a referida prova deveria ser conjugada com a demais prova, nomeadamente a documental.
J. Ora da documental junta afere-se com clareza que todos os documentos juntos aos autos, se encontram em nome da “R…, Lda” foram pré elaborados por um representante da “R…, Lda” ou “I..., Lda” e apresentados apenas a assinar ao titular inscrito, ora oponente para os fins tidos por convenientes por esta.
K. Foi o próprio representante da “R..., Lda” e depois da “I..., Lda”, que confirmou que alguns documentos nomeadamente nos pedidos de viabilidade, destaque eram elaborados com a letra do seu ex sócio, assinados por si e apenas alguns deles assinados pelo titular inscrito, aqui oponente.
L. Foi a empresa quem contratou topógrafos, engenheiros e arquitectos e pagou os seus serviços,
M. Inclusive dos documentos juntos, nomeadamente dos pedidos de viabilidade se afere que foram requeridos inclusive em nome da “R..., Lda” e pela Câmara Municipal foi emitida a resposta dirigida a esta empresa, e não ao Oponente, na altura titular inscrito no registo.
N. O oponente quando foi notificado para o pagamento desta contribuição elaborou reclamação graciosa, ao abrigo do disposto no artigo 68º CPT impugnado apenas a natureza do bem, entendendo que o mesmo deveria ter a natureza de rústico e não de urbano.
O. O oponente deduziu oposição com um dos fundamentos do artigo 204º/1 b) do CPPT, visto estar limitado a tais fundamentos, não podendo invocar qualquer outro que não estivesse plasmado no referido preceito legal;
P. Não poderia o oponente deduzir oposição com os mesmos fundamentos invocados na reclamação graciosa porque a lei não o permitia - tal como preceitua o disposto no art. 68º/2 do CPT e no artigo 204º do CPPT, que elenca os fundamentos da oposição, os quais são taxativos.
Ora, da prova produzida nos autos:

Q. Os elementos constantes dos autos, nomeadamente os documentos juntos e depoimentos das testemunhas gravados na cassete n.º 1 e 2, lado A e B, aliados às regras da experiência comum, impunham decisão diversa quanto à matéria de facto e de direito.
R. O Mmo Juiz para decidir apenas valorou a defesa escrita apresentada em sede de reclamação graciosa, tendo efectuado tábua rasa dos demais meios de prova nomeadamente a prova testemunhal, a qual, diga-se considerou o Mmo Juiz que provou que o ora oponente não praticou actos de posse sobre o bem que originou a divida e a restante documental, diga-se a este respeito que são mais de 10 documentos, todos eles corroborados pelas testemunhas, entre as quais, como já referido um dos ex sócios da empresa “R…, Lda” ou I..., lda” que confirmou serem da autoria de representantes da sua empresa, efectuados e elaborados no interesse da empresa.
S. Esta testemunha referiu também que desde o negocio verbal efectuado pela D. I… que ocorreu em 1995 sempre consideraram o prédio como seu, tudo fazendo em seu nome, ou no seu interesse, apenas e tão só.
T. Desde logo começaram a depositar materiais de construção civil no terreno, como aterro, pedras e outros.
U. Relativamente à matéria de facto o Tribunal recorrido deu como provado que o oponente através das suas testemunhas logrou provar que a empresa “R..., Lda” ou “I..., Lda” foi a possuidora do bem objecto da divida no período a que se reportam os autos.
V. Sempre a empresa considerou a parcela de terreno como sua.
W. Nunca a empresa na pessoa dos seus representantes pediram autorização para a prática de qualquer acto no mesmo.
X. Pelos anteriores proprietários nunca foi praticado qualquer acto no referido prédio ou parcela.
Y. Não se pode aceitar que perante toda a prova testemunhal apresentada, a documental junta e devidamente esclarecida por todas as testemunhas incluindo um representante da “R..., Lda” o Mmo Juiz apenas e tão só se limitasse à análise de um documento, o qual diga-se não se encontra em contradição com nenhum dos demais juntos nem com o depoimento das testemunhas.
Z. Decidiu considerar o oponente parte legítima, quando ficou provado que este nunca exerceu qualquer acto de posse naquela parcela de terreno, tendo antes provado o contrário e o Mmo Juiz considerado efectivamente que tal ficou provado.
AA. O Mmo Juiz a quo não pode pois deixar de tomar em consideração depoimentos sinceros, credíveis e reais que só por si implicam decisão diversa da proferida.
BB. A acrescer à demais prova documental que esta também por si só demonstra que todos os actos eram praticados pela empresa ou seus legais representantes no seu interesse.
CC. Tendo o oponente provado o fundamento invocado na oposição ou seja, ser parte ilegítima por nunca pelo menos desde 95,96 ter praticado qualquer acto de posse sobre o referido terreno ou parcela.
DD. Alterando-se desta forma a matéria de facto dada como provada e pronunciando-se o Tribunal em sentido inverso, outra, e bem diversa, deverá ser o desfecho da decisão.
EE. A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 68º/2 do CPT, artigo 204º/1B) do CCPT e artigo 5º do Dl 448/91.

Termos em que, deve ser revogada a douta sentença recorrida substituindo-se por outra, com o douto suprimento de V.ªs Exas, que, aplicando o direito aos factos, absolvendo o apelante, considerando-o parte ilegítima e portanto a oposição procedente por não ter sido este quem praticou actos de posse sobre o bem que originou a dívida no período a que se reporta os presentes autos, faça a reclamada.(…)”

Não houve contra-alegações.
Dada vista ao digno magistrado do Ministério Público emitiu parecer concluindo pela improcedência do recurso mantendo-se a sentença recorrida.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em indagar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao não considerar parte ilegítima o Recorrente, na execução fiscal, por não ter sido o possuidor dos bens, no período que reporta a dívida exequenda.

3. JULGAMENTO DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:“(…):
II I Factos provados
Compulsados os autos dão-se como provados os seguintes factos:

A) A Fazenda Pública em 30/11/2001, instaurou execução fiscal nº. 2585-01/100375.5, contra o ora oponente C…, para cobrança coerciva de dívidas de Contribuição autárquica dos anos de 1996, 1997 e 1998 e respectivos Juros Compensatórios, no montante global de €3 765.56, conforme entre outros o doc. de fols.60 e 61 aqui dados por reproduzidos, o mesmo se dizendo dos demais documentos que de seguida se indicarão;

B) O oponente foi citado por via postal através de ofício tem data de 03/12/2001, cfr. fls. 62 e 64 dos autos;

C) Em 28/12/2001 foi pelo oponente apresentada reclamação graciosa no Serviço de Finanças do concelho de Nelas, tendo o respectivo processo de reclamação sido instaurado em 02/01/2002, vide fls.54 e seg., 63 e 64 dos autos;

D) Por escritura pública de compra e venda celebrada em 31/01/1996, no Cartório Notarial de Penalva do Castelo, o oponente adquiriu a M…, H…, F… e I.., o prédio rústico sito ao …, freguesia e concelho de Nelas, com a área total de 8.350 m2, inscrito na matriz predial sob o artigo n.º6…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Nelas sob o n.º02464, vide fls. 11 a 14 dos autos;

E) O prédio rústico mencionado em D) foi registado em nome do oponente na aludida Conservatória do Registo Predial pela cota G-3, apresentação 8 de 05/02/96, cfr. fls. 15 e 16 dos presentes autos;

F) Pela cota G-1, apresentação 9 de 22/11/99 foi registada na dita Conservatória a aquisição a favor de “I... – Construção, Compra e Venda de Imóveis, Lda.”, por permuta com o ora oponente, do prédio urbano, sito em C…, na freguesia e concelho de Nelas, Corresponde a parcela de terreno com a área de 5.330 m2 desanexada do prédio rústico identificado em D), ali descrito sob o n.º0…, vide fls. 21 e 22 dos autos;

G) Em 23/11/1995 a sociedade “R..., Lda.” deu entrada na Câmara Municipal de Nelas, com o registo n.º2209, pedido de informação prévia acerca da obra de construção multifamiliar em banda situada em …, Nelas, que pretendia realizar, informação essa que foi prestada por ofício n.º224 de 05/02/1996 daquela Câmara Municipal dirigido à referida sociedade, cfr. fls. 23 a 26 dos autos;

H) Em 21/03/1996 a mencionada sociedade deu entrada na referida Câmara Municipal, com o registo n.º577, pedido de reapreciação do pedido de informação prévia referido em G), cfr. fls. 28 dos autos;

I) Consta do Termo de Responsabilidade pela Direcção e Execução Técnica da Obra com data de 26/07/1996, o seguinte:
“J…, Engenheiro Civil (…), com a cédula profissional n.º17737 e inscrito na Ordem dos Engenheiros com o n.º1844, declara (…) tomar a Responsabilidade pela Direcção e Execução da Obra de “Construção de Bloco Habitacional”, que C…, pretende levar a efeito num terreno que possui em Nelas.”, cfr. fls. 45 dos autos;

J) Resulta de Termo de Responsabilidade do Autor do Projecto de Arquitectura:
“A…, Arquitecto (…), inscrito na Associação dos Arquitectos Portugueses sob o n.º1…N, declara (…) que o Projecto de Arquitectura de que é autor, relativo à obra de construção de um edifício de habitação multifamiliar, localizado no Lugar…, Nelas, cujo licenciamento é requerido por Herdº de A…, observa as normas técnicas gerais e específicas de construção, (…)”,cfr. fls. 46 dos autos;

K) Em 24/04/1996 o Oponente requereu na Câmara Municipal de Nelas o destaque de uma parcela de terreno com a área de 5.330 m2 do terreno com a área de 8.350 m2, sito ao …, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Nelas sob o artigo 6… e descrito na Conservatória do Registo Predial de Nelas sob o n.º2…, tendo o mesmo sido indeferido em reunião daquela Câmara Municipal de 30/04/1996, cfr. fls. 48 e 51 dos autos;

L) Em 19/06/1996 o oponente requereu novamente na Câmara Municipal de Nelas destaque nos termos e objecto referidos em K), cfr. fls. 53 dos autos;

M) Ainda antes da venda referida em D) as então proprietárias realizaram um acordo meramente verbal com a “R..., Lda.” no sentido de relativamente ao bem em causa dele ser desanexado uma parte para construção destinada à referida sociedade; vide depoimento das testemunhas mormente da 2ª, 3ª e 5ª (atende-se à ordem constante da Acta de inquirição), respectivamente vendedoras do bem e um dos sócios da “R..., Lda.”;

N) o certo é que por vicissitudes várias, nomeadamente pelo facto de o Oponente ter pago uma dívida da família das vendedoras, ele veio em 1996 a adquirir o bem, como já se referiu em D), cfr. depoimento das testemunhas 2ª e 3ª e o demais suporte probatório referido em D);

O) bem que apenas veio a ser objecto de negócio entre o Oponente e a “I... – Construção, Compra e Venda de Imóveis, Lda.”, empresa que terá sucedido à “R..., Lda.”, na data já referida em K), vide os vários documentos supra referidos e o demais suporte probatório referido em K);

P) Os presentes autos de oposição deram entrada no Serviço de Finanças do concelho de Nelas em 28/12/2001, cfr. carimbo aposto a fs.2 destes autos.

II II Facto não provado
Que a “R..., Lda.” ou a “I... – Construção, Compra e Venda de Imóveis, Lda.”, tenham sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, os possuidores do bem que a originou. Se é certo que as testemunhas depuseram de forma a dar como provado o presente facto, à excepção da 1ª cujo depoimento foi muito impreciso, não é menos certo que o depoimento que prestaram pode e deve ser conjugado com outros elementos dos autos constantes, por exemplo a versão que o Oponente apresentou em sede de Reclamação Graciosa ao defender que a alteração da natureza da parte desanexada, para prédio urbano, só ocorreu em finais de 1999, mantendo até então a sua afectação rústica, cfr. fls. 54 a 57. Por outro lado a relação que aparentemente, por via do depoimento prestado pelas testemunhas, parecia ser cordata e de boa colaboração entre o Oponente e as referidas sociedades já não é tão líquido que assim seja se conjugarmos a referida versão com a que resulta do documento constante de fls. 102 a 104, bem como a posição algo divergente do Oponente assumida em sede de Reclamação Graciosa conjugando-a com a apresentada nestes autos de oposição. Em suma, da conjugação dos elementos vindos de referir indicia-se que, se houve actos da “R..., Lda.” ou a “I... – Construção, Compra e Venda de Imóveis, Lda.” sobre o imóvel em causa nos autos, entre 1996 até finais de 1999, eles deveram-se a boa vontade ou tolerância do proprietário, o aqui Oponente.

A convicção do tribunal formou-se com base nos elementos probatórios, ou falta deles, referidos em cada uma das alíneas dos factos provados e não provado.
. (…)”

3.2. Aditamento oficioso à matéria de facto dada como provada
Dispondo os autos dos elementos probatórios para o efeito indispensáveis e ao abrigo do disposto na norma do artigo 712.º, n.º 1, alínea a) do CPC, adita-se a alínea Q) à decisão sobre a matéria de facto proferida em 1ª instância nos seguintes termos:

Q) O art.º 6….º rústico, com área de 8350 m2, sito no …, foi inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Nelas, em nome de C…, por averbamento decorrente do pagamento de Sisa n.º 31/96 de 29 de janeiro (cfr fls. 20 e fls. 12 a 14, no que se reporta ao arquivo da sisa paga pelo conhecimento n.º31, de 29.01.1996)

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A questão jurídica fundamental é saber se a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a oposição à execução fiscal incorreu em erro de julgamento de direito na apreciação que fez dos pressupostos da responsabilidade do Recorrente.
Alega o Recorrente – conclusões K a N, R a Z, CC – que deduziu oposição com um dos fundamentos do artigo 204º n.º 1 b) do CPPT, considerando-se parte ilegítima, por não ter sido ele possuidor do bem, mas sim a empresa R..., Lda., ou a I…, lda., no período a que se reporta a dívida.
Vejamos:
Antes de mais importa esclarecer qual o regime processual em vigor. O Recorrente interpôs a oposição fundamentando-se na alínea b) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT.
A sentença recorrida, considerou que estando em questão Contribuições Autárquicas de 1996 a 1998, se aplicava a alínea b) do n.º 1 do art.º 286.º do Código do Processo Tributário (CPT).
Determina o art.º 4.º do Decreto-lei n.º 433/99 de 29.10- diploma que aprovou o CPPT- que o mesmo entrava em vigor em 01.01.2000 e só se aplicava aos procedimentos iniciados e aos processos instaurados a partir dessa data.
Porém este regime transitório deixou de vigorar a partir da entrada em vigor da Lei n.º 15/2001 de 5 de junho – lei que aprovou o regime geral das infrações tributárias.
O art.º 12.º sobre a epígrafe “Cessação da vigência do Código de Processo Tributário” previa que “ Os procedimentos e processos pendentes regulados pelo Código de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de 23 de Abril, passam a reger-se pelo Código de Procedimento e de Processo Tributário, sem prejuízo do aproveitamento dos actos já realizados.”
A lei entrou em vigor em 05.02.2001 pelo que a partir desta data ficou integralmente revogado o CPT.
Nesta conformidade o Código do Procedimento e Processo Tributário, (CPPT), aplica-se aos processos execução fiscal instaurados a partir de 05.02.2001, sem prejuízo do aproveitamento dos atos já realizados no âmbito do CPT.
No caso em apreço e como consta da matéria assente o processo de execução fiscal foi instaurado em 30.11.2001 e a oposição à execução fiscal foi deduzida em 28.12.2001 pelo que se lhe se lhe aplica o regime do CPPT.

A alínea b) do art.º 204.º do CPPT, prevê como fundamento de oposição à execução fiscalIlegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou o seu sucessor ou, sendo o que figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida”.(destacado nosso).
O Recorrente argumenta que embora figure no título, durante o período a que respeita a dívida exequenda, não foi o possuidor do bem que a originou, não sendo responsável pelo pagamento da dívida.
Refere Jorge Lopes de Sousa, in Código do Procedimento e Processo Tributário, Anotado, 6.ª Edição, volume III, pag. 453 e seguintes, mencionando à situação da alínea b) do art.º 204.º em que o executado figura no título, mas não foi possuidor dos bens que originaram a dívida no período a que ela respeita (…) Esta situação de ilegitimidade está conexionada com as situações de reversão da execução contra possuidores, fruidores e proprietários, previstas no art. 158.º do CPPT, podendo esta reversão ser uma consequência do julgamento que se fizer sobre a ilegitimidade referida nesta alínea b). ( 1)
Neste art. 158.º, não se está perante situações de responsabilidade subsidiária, mas sim perante casos em que a execução é originariamente dirigida contra uma pessoa, que se supõe ser o possuidor, fruidor ou proprietário do bem móvel ou imóvel que está na base da liquidação do tributo (2), mas no decurso da execução se vem a apurar que não era essa pessoa a titular do direito respectivo no período a que respeita a liquidação e, consequentemente, não é a pessoa que deveria pagar o tributo.
Trata-se de situações em que há um prévio ato de liquidação do tributo, que deverá ter sido notificado aos interessados, que não o impugnaram, pelo que, em principio, não haveria a possibilidade de discutir no processo de oposição a questão de saber se a pessoa a quem foi imputada a responsabilidade pelo pagamento da dívida é ou não responsável.
Porém, excepcionalmente, neste tipo de situações admite-se que a pessoa a quem imputada a dívida possa no processo de oposição à execução fiscal demonstrar que não se verifica em relação a ela, quanto ao período a que se refere o tributo, o pressuposto da incidência (posse, fruição ou propriedade).
A razão de ser de tal exceção residirá na constatação de que o ato de liquidação está viciado por erro sobre os pressupostos de facto, imputável à administração tributária (3), que nestas situações procede à liquidação sem prévia averiguação da realidade fáctica relevante, erro esse que impõe a revisão do ato tributário, nos termos do art. 78.º, n.º 1, da LGT, como mais pormenorizadamente se referiu na anotação 5 ao art. 158.º
No entanto, englobar-se-ão neste fundamento todas as situações em que a responsabilidade pelo pagamento de um tributo advenha da posse de determinados bens. ( 4)(…)” (destacado nosso).
Importa salientar como consta da matéria de facto na alínea A) que a Fazenda Pública em 30.11.2001, instaurou execução fiscal nº. 2585-01/100375.5, contra o ora Recorrente, C…, para cobrança coerciva de dívidas de Contribuição Autárquica, dos anos de 1996, 1997 e 1998 e respetivos juros compensatórios, no montante global de €3 765.56.
O art.º 1.º do Código da Contribuição Autárquica previa que “A contribuição autárquica é um imposto municipal que incide sobre o valor tributável dos prédios situados no territórios de cada município, dividindo-se de harmonia com a classificação de prédios em rústico e urbana.”
Assim, a Contribuição Autárquica entrou em vigor em 1989 e configura um imposto que incide sobre o património.
Retomando os ensinamentos do Conselheiro Jorge Lopes de Sousa e desta vez, em anotação ao art.º 158.º do CPPT, anotação 7, Volume I, Ob.cit pag. 103 e seguintes:
“(…) Os impostos sobre a propriedade imobiliária que têm a ver com uso ou fruição ou propriedade de bens são o Imposto Municipal sobre Imóveis e as extintas Contribuição Autárquica e Contribuição Predial.
Relativamente à Contribuição Predial, a aplicação desta norma tinha integral aplicação, pois as pessoas sujeitas ao seu pagamento eram as que detinham a posse ou a fruição de bens.
Com efeito, a Contribuição Predial era um imposto sobre o rendimento (art. 1.º o CC – PIIA) e o respectivo sujeito passivo era o titular dos rendimentos dos prédios, presumindo-se como tais as pessoas em nome de quem os mesmos se encontrassem inscritos na matriz ou que deles tinham a efetiva posse (art. 6.º do mesmo Código) ·
Nestes casos, por isso, justificava-se que, instaurada uma execução contra a pessoa que constava da matriz, se se viesse a constatar que ela não era a titular dos rendimentos do prédio não sendo possuidor nem fruidor do mesmo, ela não devesse prosseguir contra a pessoa contra quem foi instaurada, mas sim contra esse possuidor ou fruidor.
A Contribuição Autárquica e o Imposto Municipal sobre Imóveis não são, como a Contribuição Predial, um imposto sobre o rendimento, mas sim impostos sobre o património (art. 1.º do CCA e 8.º, n.º 1 do CIMI), cujo sujeito passivo é, em regra o proprietário do prédio (arts. 8º, n.º 1, do CCA e 8.º, n.º1 do CIMI).
Só nos casos em que existe usufruto ou propriedade resolúvel o tributo é devido pelo usufrutuário ou por quem tenha o uso ou fruição do prédio, respetivamente (n.ºs 2 e 3 dos mesmos artigos).
Naturalmente, nos casos em que não existe usufruto nem propriedade resolúvel, sendo o proprietário o devedor do tributo, a demonstração de que ele não é o possuidor ou fruidor em nada afecta a dívida de imposto, pois a posse e fruição não podem servir de base à incidência do imposto.
Por isso, nestes casos, não terá qualquer relevo a constatação no processo de execução fiscal de que o proprietário não foi o possuidor ou fruidor dos bens no período a que se reporta a dívida exequenda, pois é precisamente pelo facto de ser proprietário que lhe é imputada a dívida de imposto.
Assim, as referências a possuidor, fruidor e proprietárias feitas neste artigo devem interpretar-se como reportando-se apenas aos casos em que essas qualidades sejam o elemento definidor da incidência subjetiva do imposto. (…)”(destacado nosso).
Determina o n.º 1 do art.º 8.º do referido diploma que a contribuição é devida pelo proprietário do prédio no dia 31 de Dezembro a que a mesma respeitar.
Por sua vez, o n.º 4 do art.º 8.º prevê que Presume-se proprietário…, para efeitos fiscais, quem como tal figure ou deva figurar na matriz na data referida no n.º1 … ou na falta de inscrição, quem em tal data tenha a posse do prédio”.
Destarte, a Contribuição Autárquica não é um imposto sobre o rendimento, mas sim imposto sobre o património, cujo sujeito passivo é, em regra o proprietário do prédio por força dos n.º 1 e 4 do arts. 8.º do Código da Contribuição Autárquica (CCA) e por isso responsável pelo seu pagamento.
Resulta da matéria assente, que o Recorrente, em 31.01.1996, comprou por escritura pública realizada no Cartório a Notarial de Penalva do Castelo, a M…, H…, F… e I…, o prédio rústico sito ao C…, freguesia e concelho de Nelas, com a área total de 8.350 m2, inscrito na matriz predial sob o artigo n.º 6…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Nelas sob o n.º0…
E que pela cota G-1, apresentação 9, de 22.11.99 foi registada na Conservatória a aquisição a favor de “I... – Construção, Compra e Venda de Imóveis, Lda.”, por permuta com o ora Recorrente, do prédio urbano, sito em C…, na freguesia e concelho de Nelas, corresponde a parcela de terreno com a área de 5.330 m2 desanexada do prédio rústico identificado com o art.º 6….
Após a escritura de compra e venda de 31.01.1996, o referido prédio encontrava-se inscrito na matriz predial em nome do Recorrente, conforme consta do julgamento de facto aditado no presente recurso e como o próprio admite nas conclusões do recurso.
Decorre assim, que desde 1996 até 22.11.1999, o Recorrente era proprietário do imóvel, pelo que nos termos conjugados do n.º 1 do art.º 1 e n.º 1 e 4 do art.º 8.º do CCA era o responsável pelo pagamento da dívida exequenda, ou seja, pelo pagamento das contribuições autárquicas de 1996 a 1998 e respetivos juros compensatórios.
Pese embora o Recorrente tivesse efetuado negócios com terceiros, permitindo-lhe a posse e fruição desse bens, nomeadamente à sociedade I... – Construção, Compra e Venda de Imóveis, Lda. e R…, Lda, não pode opor-se à execução fiscal, com base no facto de não ter sido, o possuidor dos bens que a originaram, e não sendo responsável pelo pagamento da dívida.
Assim, parafraseando o ilustre autor citado, não terá qualquer relevo, para efeito da alínea b) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, a constatação no processo de execução fiscal de que o proprietário/executado não foi o possuidor ou fruidor dos bens no período a que se reporta a dívida exequenda, pois é precisamente pelo facto de ser proprietário que lhe é imputada a dívida de imposto. Nesta consonância não se verifica a violação da alínea b) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, nem do art.º 68º do CPT, nem mesmo do artigo 5º do Dl 448/91 de 29 de novembro.

O Recorrente alega ainda que a sentença recorrida não fez uma correta apreciação de toda a prova constante nos autos nem uma correta interpretação dos preceitos legais, não valorando a prova testemunhal e demais documental junta. Porém, face ao supra decidido, esta questão fica prejudicada pela decisão do demais fundamento de recurso, nos termos do disposto no art. 608.º, n.º 2 do CPC, aplicável ex vi art. 663.º, n.º 2 do CPC.

4.2. Nesta conformidade formulamos as seguintes conclusões:
I- O Código do Procedimento e Processo Tributário, (CPPT), aplica-se aos processos execução fiscal instaurados a partir de 05.02.2001, sem prejuízo do aproveitamento dos atos já realizados no âmbito do CPT.
II - A Contribuição Autárquica não é um imposto sobre o rendimento, mas sim imposto sobre o património, cujo sujeito passivo é, em regra o proprietário do prédio por força dos n.º 1 e 4 do arts. 8.º do Código da Contribuição Autárquica (CCA) e por isso responsável pelo seu pagamento.
III- Não terá qualquer relevo, para efeito da alínea b) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, a constatação no processo de execução fiscal de que o proprietário/executado não foi o possuidor ou fruidor dos bens no período a que se reporta a dívida exequenda, pois é precisamente pelo facto de ser proprietário que lhe é imputada a dívida de imposto.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida embora com fundamentação diversa.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 29 de setembro de 2016
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento