Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00025/08.8BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/29/2016
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
MAIS-VALIAS
VALOR DE REALIZAÇÃO
VALOR DE AQUISIÇÃO
ERRO DE JULGAMENTO
Sumário:I. Decorre da interpretação conjunta da alínea f) do n.º 1 e do n.º 2 do art.º 46. º do CIRS que, o valor da realização (venda), a título oneroso de bens imóveis, é o valor da contraprestação, todavia, prevalecerá, quando superior os valores que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa.
II. Assim decorre do n.º 1 do art.º 46. º do CIRS, a regra geral, que o valor da aquisição a título oneroso de bens imóveis, é o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.
III. Da conjugação n.º 3 e 4 do art.º 46. º do CIRS, resulta que no caso dos imóveis serem construídos pelos próprios sujeitos passivos, o valor de aquisição corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele apurado pelas regras constantes do n.ºs 1 e 2 deste artigo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:R...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT) recorre da sentença proferida em 02.02.2016, que julgou procedente a impugnação judicial, da liquidação de IRS n.º 2007 5000053526, interposta por R… referente ao exercício de 2003, com imposto a pagar de 106 286,94 € e juros compensatórios no montante de 12 335,10 €.
A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que não numerou, e por uma questão de sistematização do presente acórdão procedemos a essa numeração:
“ (…)
1. Incide o presente recurso sobre a douta sentença que julgou procedente a impugnação por se verificar vício de violação de lei por errónea quantificação da matéria tributável em função de ter considerado que o valor de aquisição do imóvel ascende a € 642.500,00 nos termos do art.º 46º, nº. 3 do CIRS , do que discordamos; - O Meritíssimo Juiz do processo entendeu que as questões a resolver nestes autos consistem em saber quais os valores de aquisição e realização do bem vendido e quais as despesas elegíveis para efeitos do previsto no art.º 51º do CIRS;
2. - Somos de parecer que a questão dos autos não deve ser colocada da forma como o fez o Meritíssimo Juiz do processo, para o que importa determinar qual o regime legal aplicável, em função da situação de facto em causa;
3. - Sustenta o julgador que se aplica o disposto no art.º 46º, nº. 3 do CIRS, preceito este que dispõe “o valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial tributário inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele”;
4. - Acrescentando que, no caso, o valor a considerar para efeitos de valor de aquisição é o valor patrimonial inscrito na matriz (ou seja, € 642.500,00 e não € 7.481,97), uma vez que, ainda que a AT tivesse aceitado todos os custos indicados pelo impugnante (€ 381.696,97), somados ao valor do terreno (€ 7.481,97), o valor seria sempre inferior ao valor patrimonial inscrito na matriz;
5. - Defende a Fazenda Pública que a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto, concretamente do ponto 2 do probatório, ao considerar que o valor de aquisição do imóvel corresponde ao valor patrimonial tributário (resultante de avaliação), o qual ascende a € 642.500,00 (e não de € 7.481,97);
6. - Desde logo, foi declarado pelo impugnante no Anexo G da declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS do ano de 2003, a título de valor de aquisição do imóvel, o montante de € 7.481,97;
7. - Ou seja, o impugnante declarou como valor de aquisição o correspondente ao valor de aquisição do terreno rústico, precisamente porque não foi o impugnante que suportou os custos de construção do imóvel em questão, pois que, quem suportou os custos com a construção do imóvel supra foi a sociedade “V… LDA”, que não o impugnante, o que se extrai do documento de fls. 57 dos autos, correspondente à “Nota de lançamento” nº. 20352 de 11.12.2003;
8. - Dos autos não constam quaisquer documentos referentes às despesas com a construção do imóvel urbano inscrito na matriz da freguesia de Abraveses sob o art.º 4557 em nome do impugnante;
9. - Dos autos apenas constam documentos relativos ao pagamento de taxas de licença de construção, alvará de licença de utilização, escritura de venda, sisa da venda, registo do prédio, ramal de água/vistoria e outros (fls. 46 dos autos), tendo todos esses custos em comum o facto de terem de ser pedidos pelo proprietário do imóvel e em data posterior à escritura;
10. - Na verdade, compulsados os autos verifica-se que nele não se encontram insertos nenhuns documentos que atestem a realização, pelo impugnante, por sua conta e em seu nome, de quaisquer obras de construção do imóvel e/ou de materiais de construção, nas diversas fases de construção;
11. - Por outro lado, a nota de lançamento nº. 20352 de 11.12.2003 corresponde a um documento que foi emitido em data posterior à da escritura de venda (esta ocorrida em 26.09.2003), o que mais uma vez demonstra que não foi o impugnante que suportou os custos de construção do imóvel (Cfr. documentos de fls. 45/46 dos autos);
12. - Não logrou o impugnante provar que se trata de um imóvel por si construído, para efeitos de aplicação do disposto no art.º 46º, nº 3 e 4 do CIRS, uma vez que tudo confirma que a construção do mesmo foi efetuada pela sociedade “V… LDA”, cfr. documento de fls. 57 dos autos;
13. - Para que se possa aplicar a regra prevista no art.º 46º, nº. 3 e 4 do CIRS, a respeito o valor de aquisição dos imóveis, necessário se torna que se trate, no dizer da norma de “imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos”, o que não sucede no caso dos autos, pois, o imóvel em apreço não foi construído pelo impugnante;
14. - Assim sendo, não tem aplicação à situação vertente o preceituado no art.º 46º, nº. 3 e 4 do CIRS, mas antes a regra do nº. 1 do mesmo normativo legal que considera como valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa;
15. - Em conformidade, o valor que serviu de base à liquidação de Sisa ascende a € 7.481,97, valor este declarado pelo próprio impugnante no Anexo G da declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS do ano de 2003 e considerado pela AT na liquidação;
16. - Aliás, vejam-se os pontos 10 e 11 da reclamação graciosa apresentada pelo impugnante, ditando o ponto 11 “E desde logo acordaram com a sociedade V…, LDA que esta construísse sobre o referido terreno imóvel comercial para assim poder desenvolver a respetiva atividade”;
17. - Tudo demonstra, pois, que o imóvel em causa não foi construído pelo próprio impugnante, motivo porque não tem aplicação a regra prevista nos nº. 3 e 4 do art.º 46º do CIRS, mas a contemplada no nº. 1 do mesmo dispositivo legal;
18. - Do que se conclui que na liquidação impugnada ao ser aplicada a regra de determinação do valor de aquisição do imóvel que consta do art.º 46º, nº. 1 do CIRS cumpriu-se inteiramente a legalidade
19. -- Enfermando, por consequência, a decisão judicial de erro de julgamento sobre a matéria de facto (ponto 2 do probatório), que considerou que o imóvel foi construído pelo próprio impugnante, o que não corresponde à verdade;
20. - Sendo que, por não se tratar de imóvel construído pelo próprio impugnante, não poderá aplicar-se a regra de determinação do valor de aquisição, para cálculo das mais valias, prevista no art.º 46º, nº. 3 e 4 do CIRS, conforme decidido;
21. - Em suma, o Meritíssimo Juiz incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação da lei, mormente o disposto no art.º 46º, nº. 1, 3 e 4 do CIRS.
Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que se julgue improcedente, por não provado, o vício de violação de lei imputado à liquidação impugnada, com as legais consequências..(…)”

Não houve contra-alegações.

O Exmo. Procurador - Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pela Recorrente, a qual é delimitada pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber se a sentença recorrida incorreu erro de julgamento de facto e direito, por errada subsunção dos factos ao direito, nomeadamente, por errada aplicação do n.º3 e 4 do art. 46.º do CIRS .

3.JULGAMENTO DE FACTO
3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…)3.1. Com interesse para a decisão a proferir, julgam-se provados os seguintes factos:
1. Em julho de 2000 o Impugnante adquiriu, em regime de compropriedade, e pelo montante de 7 481,97 € um prédio rústico sito na …, freguesia de Abraveses, concelho de Viseu. – cfr. fls. 22 do processo administrativo apenso.
2. Posteriormente construiu no prédio a que alude o ponto anterior um imóvel, tendo entregado a declaração Modelo 129 junto do Serviço de Finanças, em 03.09.2003 – cfr. fls. 33 do processo administrativo apenso.
3. O imóvel inscrito na matriz predial urbana de Abraveses sob o artigo 4557 foi avaliado pela Administração Tributária tendo sido atribuído o valor patrimonial tributário de 1 620 000,00 € e, após reclamação, de 1 285 200,00 €. – cfr. fls. 39 e 40 do processo administrativo apenso.
4. O imóvel identificado no ponto anterior foi objeto de um contrato de locação financeira celebrado entre B… Leasing, S.A., R…, ora Impugnante, P… e “V…– Comércio de Automóveis, Peças e Acessórios de V…, Lda.”, em 26.09.2003. – cfr. doc. 6 junto com a petição inicial.
5. Do referido contrato consta, entre o mais, o seguinte:
“[…]
1. Identificação do imóvel
- Prédio urbano – Edifício comercial, composto de cave e rés-do-chão, com as áreas coberta de 2.900 m2 e descoberta de 3.994 m2, sito no Lugar…, freguesia de Abraveses, concelho de Viseu, descrito na 2.ª Conservatória do Regis to Predial de Viseu sob o n.º 2… e omisso à matriz mas feita a sua apresentação para inscrição em 03/09/2003.
Para o referido prédio, foi emitido o alvará de licença de utilização n.º 469/2003 emitido em 24 de Setembro de 2003 pela Câmara Municipal de Viseu.
2. Identificação do vendedor
- R…, NIF 2…e P…, NIF 2…, casados o regime de comunhão de adquiridos e residentes no Lugar…, concelho de Tondela e P…, NIF 2…, solteiro, maior e residente no Lugar…, freguesia e concelho de Tondela;
3. Valor do financiamento:
3.1. – Preço de aquisição do imóvel: € 900.000,00 (Novecentos mil euros);
3.2. – Valor total do financiamento: € 900.000,00 (Novecentos mil euros);
O montante do financiamento concedido pela Locadora não poderá exceder o valor acima referido.
No caso de a Repartição de Finanças do concelho ou bairro onde estão situados os bens proceder à avaliação prevista no Artigo cinquenta e três do Código de Sisa e do Impostos sobre Sucessões e Doações e daí resultar um valor superior ao preço estipulado para a compra e venda, será única e exclusivamente, da responsabilidade do Locatário o pagamento da diferença do montante da sisa daí resultante.
[….]”
[cfr. doc. 6 junto com a petição inicial].
6. O Impugnante entregou, via internet, a declaração modelo 3 de IRS, referente ao ano de 2003, acompanhada de anexo G respeitante à alienação do imóvel, no qual declarou o montante de 450 000,00 €, como valor de realização, o montante de 7 481,97 €, como valor de aquisição e a quantia de 381 696,17 € a título de despesas e encargos. – cfr. fls. 22 do processo administrativo apenso.
7. Em 24.06.2004 o B… Leasing S.A. procedeu ao pagamento da SISA referente à diferença entre o valor de realização declarado e o valor da avaliação no montante de 25 038,00 €. – cfr. fls. 58/59 do processo administrativo.
8. Em 26.09.2006 foi remetido ao Impugnante o ofício n.º 3910 de fls. 41 do processo administrativo apenso, cujo teor se tem por reproduzido.
9. Não tendo o Impugnante retificado a declaração modelo 3 nem apresentado os documentos comprovativos, a Administração Tributária preencheu uma declaração oficiosa na qual foram retiradas todas as despesas e considerado como valor de realização o montante de 642 600,00 €. – cfr. fls. 42 do processo administrativo apenso.
10. O Impugnante foi notificado da nota de alteração do IRS de 2003 para exercer o direito de audição. – cfr. fls. 46 do processo administrativo apenso.
11. Em 11.04.2007 deu entrada no Serviço de Finanças de Tondela o requerimento de fls. 43 e ss. do processo administrativo apenso cujo teor se tem por reproduzido, acompanhado dos docs. de fls. 47 a 57.
12. Em 01.05.2007, foi emitida a liquidação de IRS n.º 2007 5000053526, referente ao ano de 2003, com imposto a pagar de 106 286,94 € e juros compensatórios no montante de 12 335,10 €. – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial.
13. O Impugnante deduziu reclamação graciosa da liquidação impugnada, nos termos e com os fundamentos constantes do doc. 3 junto com a petição inicial.
14. Sobre a reclamação referida no ponto anterior foi emitida pela Direção de Finanças de Viseu a informação de fls. 64 e ss. do processo administrativo apenso, com o seguinte teor:
“[…]”
INFORMAÇÃO
O sujeito passivo, atrás referenciado, vem reclamar da liquidação supra.
O pedido é legal, e a reclamante tem legitimidade,
Alega em resumo:
- Que devem ser aceites como custos as despesas de construção, apesar de terem data posterior à escritura
- O Pagamento da sisa também deve ser aceite como custos, pois foi suportado e pa go pelos vendedores e locatários.
Procedeu-se à análise da situação constatando-se que:
1. O reclamante adquiriu um prédio rústico, em compropriedade, em 11/07/2000, sito na Fonte do Cão, na freguesia de Abraveses, posteriormente construiu um imóvel, tendo apresentado a M/129.
2. Em 2003 o reclamante vendeu o respectivo imóvel, do qual era comproprietário em 50%, inscrito na matriz urbana sob o art. 4557, da freguesia de Abraveses, pelo valor de €450.000,00 (1/2 de € 900.000,00) conforme fotocópia da sisa n.º 3700/940/2003, de 26/09.
2. Em 20/05/2004 enviou a declaração M3 via internet com os anexos A, E, G e H, no qual declara no anexo G o valor de aquisição de € 7.481,97, o valor da realização (venda) de € 450.000,00, e despesas de encargos o valor de €381.696,17
3. Com base na M/129 entregue em 03/09/2003 o prédio foi avaliado e reclamado posteriormente, tendo sido atribuído o valor patrimonial de €1.285.000,00.
4. Face ao novo valor patrimonial atribuído, foi notificado para entregar nova declaração M3 relativo ao exercício de 2003, e apresentar os documentos das despesas inerentes a aquisição e venda do imóvel.
5. Não tendo rectificado a declaração nem apresentado os documentos comprovativos das despesas relativamente a aquisição e venda do prédio, foi preenchido pelos serviços uma declaração com correcções oficiosas, retirando-lhes as respectivas despesas, sendo notificado em 28/03/2007, para exercer o direito de audição nos termos do art. 60º da LGT.
6. Dentro do prazo veio o s.p. exercer o direito de audição apresentando os respectivos documentos. Após a verificação dos mesmos não lhe foram aceites como despesas e encargos os documentos de fls 53 a 56 [a sisa foi paga pelo comprador (pelo menos não é demonstrado que tenha sido da responsabilidade do reclamante) e os restantes documentos com data posterior à data da escritura] sendo considerados somente os documentos das fls. 47 a 52, em conformidade com o art. 51º do CIRS.
7. De harmonia com a al. f) e nº 2 do art. 44º do CIRS o valor da realização para determinação dos ganhos sujeitos a IRS é considerado o valor da respectiva contraprestação prevalecendo, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de sisa. Como se verifica nos documentos anexos, fls. 59, o comprador pagou a sisa adicional, sendo considerado o valor de realização de € 642.600,00 (1/2 de €1.285.200,00).
Assim, concluindo do que fica exposto, nos termos da al. a) do nº 4 do art. 10º conjugado com o nº 2 do art. 44º do CIRS verificou-se que houve um ganho sujeito a IRS pelo que se propõe o indeferimento da presente reclamação.
À consideração superior.
[…]”.
15. Por correio registado foi remetido ao Impugnante o ofício n.º 20430, de 05.12.2007, notificando-o para o exercício do direito de audição. – cfr. fls. 66/67 do processo administrativo apenso.
16. Em 13.12.2007, deu entrada na Direção de Finanças de Viseu o requerimento de fls. 68 do processo administrativo apenso, cujo teor se tem por reproduzido.
17. Foi emitida pela Direção de Finanças de Viseu a informação de fls. 73 dos autos, com o seguinte teor:
“[…]”
INFORMAÇÃO
Conforme projecto de decisão exarado a fls. 63, de 2007/12/04 e de conformidade com o disposto nos nº.s 1 e 5 do art. 60º da Lei Geral Tributária, foi o sujeito passivo notificado para se pronunciar sobre o teor do projecto de decisão de indeferimento da presente reclamação.
No decurso do prazo fixado, veio o reclamante exercer o seu direito de audição, conforme petição de fls. 68 a 72 cuja entrada na Direcção de Finanças de Viseu ocorreu, em 2007/12/12, considerando-se dentro dos dez dias seguintes ao da notificação, que terminava em 2007/12/20.
O reclamante não vem acrescentar nada de novo ao que tinha apresentado na petição inicial.
Assim, deverá manter-se o INDEFERIMENTO da reclamação como é proposto no projecto de decisão.
[…]”.
18. Em 18.12.2007, o Sr. Diretor de Finanças, por delegação, proferiu despacho com o seguinte teor:
“[…]
DESPACHO
Concordo.
Face ao que vem informado, ractifico o meu despacho de fls. 63, INDEFERINDO o pedido.
NOTIFIQUE-SE.
[…]”.
3.2. Factos não provados:
Para além dos referidos supra, não foram provados outros factos com relevância para a decisão da causa. (…)”

3.2. Aditamento oficioso à decisão sobre a matéria de facto
Ao abrigo do disposto no artigo 712.º do CPC, na redação aplicável, ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT, importa aditar ao probatório o ponto n.º 15 por igualmente se encontrar provada nos autos:

15- Em 12.01.1999, o R… ao pagamento da SISA titulada pelo conhecimento n.º 45/02200 no valor de 240 000$00 (€ 1197,11) e relativa à compra em comum e partes iguais de um prédio rústico com o art.º 3503, pelo preço de 3 000 000$00 (€ 14 963,94) e com o valor patrimonial de 9 504$00 (€ 47.41), composto de terreno de pinhal e eucaliptal, na Fonte do Cão, na freguesia de Abraveses, à sociedade Vinícola do Dão, Lda. (fls. . 58 dos autos).

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A questão principal em que se centra o recurso é o de saber se a sentença recorrida incorreu erro de julgamento de facto e direito, por errada subsunção dos factos ao direito, nomeadamente, por errada aplicação do n.º 3 e 4 do art.º 46.º do CIRS .
Importa pois verificar o regime jurídico das mais-valias.
O art.º 10.º do CIRS, na redação à data do facto tributário, determinava que:
"1. Constituem mais valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos comerciais, industriais, agrícolas ou de capitais resultem de:
"a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis…
(...).
Determina o n.º 1 do art.º 43.º do CIRS que “o valor dos rendimentos qualificados como mais valias é o correspondente ao saldo apurado entre as maias valias e as menos valias realizadas no mesmo ano..”
No que concerne ao valor de realização (venda) determina o art.º 44.º do CIRS que: “1- Para determinação dos ganhos sujeitos a IRS, considera-se o valor de realização:
a) (...)
f) Nos demais casos, o valor da contraprestação:
2- No caso das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa ou não havendo lugar a esta liquidação os que devessem ser, caso fosse devida.(…)”.
Decorre da interpretação conjunta da alínea f) do n.º 1 e do n.º 2 do art.º 46. º do CIRS que, o valor da realização (venda), a título oneroso de bens imóveis, é o valor da contraprestação, todavia, prevalecerá, quando superior os valores que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa.
Baixando ao caso dos autos, resulta da matéria assente – ponto 4 e 5 - que o Recorrido e P…, comproprietário, celebraram um contrato de locação financeira imobiliário obtiveram a contraprestação no valor de € 900 000.00 (450 000.00 cada) pelo prédio com o art.º 4557.
Acresce ainda que o prédio após a sua participação (modelo 129) foi avaliado e fixado o valor patrimonial tributável em € 1 285 200,00 (€ 642 600,00).
Decorre ainda da matéria assente que o B… Leasing S.A, procedeu ao pagamento da SISA sobre 900 000,00 e posteriormente sobre 385 200.00 (o que perfaz 1 285 200.00) através dos documentos n.º 3700/940 2003.09.26 e 3700/30/2007 de 24.06.2004.
Assim, o valor da realização, por ser superior ao valor da contraprestação (450 000.00), contrariamente à pretensão do Recorrido, é o valor do bem que foi considerado para efeitos de liquidação de Sisa ou seja, valor patrimonial tributável de € 642 600,00 (1 285 200,00/2).
Considera o n.º 1 do art.º 46.º do mesmo diploma, para efeitos de determinação do valor de aquisição, a título oneroso de bens imóveis, que:” 1. No caso da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, se o bem imóvel houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor da aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.
2. (…)
3. O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele.
4. Para os efeitos do número anterior, o valor do terreno será determinado pelas regras constantes do n.ºs 1 e 2 deste artigo.”
Assim decorre do n.º 1 do art.º 46. º do CIRS, a regra geral, que o valor da aquisição a título oneroso de bens imóveis, é o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.
Da conjugação n.º 3 e 4 do art.º 46. º do CIRS, resulta, que no caso dos imóveis serem construídos pelos próprios sujeitos passivos, o valor de aquisição corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele apurado pelas regras constantes do n.ºs 1 e 2 deste artigo.
Resulta assim, da matéria assente que em 12.01.1999, que R… procedeu ao pagamento da SISA titulada pelo conhecimento n.º 45/02200 no valor de 240 000$00 (€ 1197,11) e relativa compra em comum e partes iguais de um prédio rústico com o art.º 3503, pelo preço de 3 000 000$00 (€ 14 963,94) e com o valor patrimonial de 9 504$00 (€ 47.41), composto de terreno de pinhal e eucaliptal, na Fonte do Cão, na freguesia de Abraveses, à sociedade Vinícola do Dão, Lda.
Assim sendo, nos termos do n.º 1 do art.º 46. º do CIRS o valor de aquisição será o valor de 7 481,97 € (metade de 14 963,94), por ser este usado para efeito de Sisa.
Porém no caso, do imóvel ser construído pelos próprios sujeitos passivos o valor de aquisição será ou o valor patrimonial - € 47.41 - ou o valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele. (cfr n.º 3 e 4 do art.º 46. º do CIRS).
Aqui chegados importa sintetizar as posições assumidas por cada um dos intervenientes.
A Administração Fiscal arroga-se ao direito de liquidar mais-valias, com base no seguinte raciocínio:
Valor de realização (VR) € 642 600.00 menos o Valor de aquisição (VA) € 7 481,87 .
O Recorrente entende que as mais valias terão de considerar:
Valor de realização (VR) 450 000,00 (contraprestação) menos o Valor de aquisição (VA) 7 481,87 mais as encargos e despesas no valor de € 381 696,17.
A sentença recorrida decidiu que “Ora, como consta do probatório, mais concretamente do ponto 1, o Impugnante juntamente com outro comproprietário, adquiriu o imóvel pela quantia de 14 963,94 €.
Todavia, no referido imóvel foi construído um prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, afeto ao comércio, tendo o Impugnante e o comproprietário procedido à inscrição na matriz através da entrega da declaração modelo 129 em 03.09.2003, ou seja em data anterior à venda. Ora, a aquisição por construção ocorreu em 2003, pelo que o valor de aquisição terá de ser reportado à data de inscrição do novo prédio.
Como se referiu, existe uma norma específica que indica qual o valor a considerar para efeitos de mais-valias nos casos de aquisição por construção do proprietário, que é o artigo 46.º, n.º 3 do CIRS. Ora, em conformidade com este preceito legal, em primeira linha, o valor de aquisição corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou, se superior a este, em segunda linha, ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados.
Exemplificando: determinado contribuinte adquire um terreno para construção de habitação, no valor de 50 000,00 €, procede à construção do imóvel, cujos custos ascendem a 150 000,00 €, devidamente comprovados. Entretanto, procede à inscrição na matriz, tendo-lhe sido atribuído um valor patrimonial de 210 000,00 €.
Ora, o valor de aquisição a considerar no cálculo das mais-valias decorrentes da alienação do imóvel será de 210 000,00€, que corresponde ao valor patrimonial atribuído, já que o valor do terreno adicionado dos custos devidamente comprovados não é superior a este.
Volvendo ao caso em apreço, como consta do quadro probatório, na avaliação resultante de entrega da modelo 129 foi atribuído ao imóvel o valor de 1 285 000,00 €, após reclamação.
Não tendo o Impugnante logrado demonstrar a maior expressão numérica do valor do terreno, acrescido de custos de construção, apenas é possível estabelecer como valor de aquisição, na determinação dos ganhos passíveis de incidência de IRS, o relativo ao valor patrimonial do prédio objeto de alienação, segundo a respetiva inscrição matricial. [cfr. acórdão do TCAS de 07/03/2006, processo n.º 01186/03].
Aliás, mesmo que a Administração Tributária tivesse aceitado todos os custos indicados pelo Impugnante [381 696,97 €], somados ao valor do terreno [7 481,97 €], o valor seria sempre inferior ao valor patrimonial inscrito na matriz. Assim, nos termos do artigo 46.º, n.º 3 do IRS o valor a considerar para efeitos de valor de aquisição é o valor patrimonial inscrito na matriz, ou seja 642 500,00 €. (…).
Se bem compreendemos a sentença recorrida entendeu, no caso sub Júdice não se aplica o n.º 1 do art.º 46.º mas sim o n.º 3 e 4 do mesmo preceito, ou seja, assumindo que a construção foi efetuada pelo próprio (ponto 2 da matéria de facto) e que o valor de aquisição é de € 642 500,00.
No entanto, não podemos concordar com a sentença recorrida, pois a prova existente nos autos não é suscetível de sustentar com segurança tal raciocínio, incorrendo assim em erro de julgamento de facto e de direito.
Decorre dos pontos 5.º e 15.º da matéria de facto, que o Recorrido comprou um prédio rústico com o art.º 3503, composto de terreno de pinhal e eucaliptal, em comum e partes iguais.
E vendeu um edifício comercial, composto de cave e rés-do-chão, com as áreas coberta de 2.900 m2 e descoberta de 3.994 m2, sito no Lugar…, freguesia de Abraveses, concelho de Viseu, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Viseu sob o n.º 2… e omisso à matriz mas feita a sua apresentação para inscrição em 03.09.2003.
O que foi vendido é, com efeito, algo diferente do comprado, e para cabal apuramento do valor da aquisição e para verificação da aplicação do regime jurídico importa ir mais longe, ampliar a matéria de facto, com recurso a eventual inquirição das testemunhas arroladas pelo Recorrido ou outros elementos que se julgarem convenientes, com vista a apurar quem construiu o referido prédio, as respetivas proporções, a relação subjacente ao contrato de locação financeira com lease back celebrado entre o recorrido, P…, B… Leasing e V… - Comércio de Automóveis, Peças e Acessórios de V…, Lda., e após retirar as respetivas ilações de facto e direito.
Só após se poderá enquadrar a situação no n.º 1 do art.º 46.º ou nos n.ºs 3 e 4 do mesmo preceito e alcançar o valor de aquisição.
Face ao exposto, e de acordo com a factualidade provada não se encontram, manifestamente, reunidos os requisitos para apurar se se aplica ao caso o regime do art.º 46.º n.º 1, pugnado pela Recorrente ou se o n.º 3 e 4 do art.º 46.º do CIRS decidido pela sentença recorrida, incorrendo esta em erro de julgamento de facto e de direito que importa a sua revogação.

4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões/sumário:
I. Decorre da interpretação conjunta da alínea f) do n.º 1 e do n.º 2 do art.º 46. º do CIRS que, o valor da realização (venda), a título oneroso de bens imóveis, é o valor da contraprestação, todavia, prevalecerá, quando superior os valores que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa.
II. Assim decorre do n.º 1 do art.º 46. º do CIRS, a regra geral, que o valor da aquisição a título oneroso de bens imóveis, é o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.
III. Da conjugação n.º 3 e 4 do art.º 46. º do CIRS, resulta que no caso dos imóveis serem construídos pelos próprios sujeitos passivos, o valor de aquisição corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele apurado pelas regras constantes do n.ºs 1 e 2 deste artigo.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em conceder provimento ao recurso revogar a sentença e consequentemente, ordenar a devolução do processo ao tribunal de 1.ª instância, a
fim de ser ampliada a matéria de facto e, após, ser proferida nova sentença.
Sem custas.

Porto, 29 de setembro de 2016

Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira

Ass. Mário Rebelo

Ass. Cristina Travassos Bento