Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00376/11.4BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/18/2019
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:NULIDADES; REGIME; PROCESSO SUMÁRIO; AUDIÊNCIA PRELIMINAR; ARTIGOS 508º A 512º-A, AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (DE 2009);
PROVA DOCUMENTAL; OPORTUNIDADE DE APRESENTAÇÃO; PETIÇÃO INICIAL; ARTIGO 523º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (DE 2009).
Sumário:1. As nulidades processuais conhecidas pelo interessado unicamente com a notificação da sentença, têm o mesmo regime das nulidades da sentença e devem ser arguidas no recurso interposto desta, quando admissível.

2. Ao contrário do que sucede na forma de processo ordinário, no processo sumário a regra é a da dispensa da audiência preliminar pois esta só se realiza quando a complexidade da causa ou a necessidade de assegurar contraditório determinem, nos termos dos artigos 508º a 512º-A, ambos do Código de Processo Civil (de 2009).

3. Em processo sumário os documentos destinados a fazer prova dos factos articulados na petição inicial devem ser apresentados com este articulado - artigo 523º do Código de Processo Civil (de 2009). *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:A. M. V. M.
Recorrido 1:Universidade de Coimbra
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

A. M. V. M. veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 06.10.2011, pela qual foi julgado o pedido parcialmente procedente e condenada a Universidade de Coimbra a pagar ao Autor a quantia de 2.861,80 € e juros de mora à taxa legal contados desde 01.06.2004 até 30.04.2007 sobre a referida quantia, na presente acção administrativa comum, sob a forma sumária, intentada pelo Recorrente contra a Universidade de Coimbra.

Invocou para tanto, em síntese, que a sentença é nula porque o Mmº Juiz a quo não podia proferir sentença no final dos articulados, antes devia ou dispensar a realização da audiência preliminar, ou proferir despacho saneador ou a notificação a que alude o artigo 512º do Código de Processo Civil, não tendo também em algum lado fundamentado que o processo já detinha todos os elementos necessários ou adequados ao julgamento da causa e que permitiam o conhecimento imediato no despacho saneador do mérito do processo; que é ineficaz a declaração de compensação uma vez que dessa declaração resulta uma mera proposta de acerto de contas, nela se referindo que deste encontro de contas resultará um valor total a receber pelo Autor, ora Recorrente, de 2.861,80€, aguardando-se a confirmação pelo declaratário; que não tendo operado eficazmente a compensação em 2006, não pode agora decidir-se que não prescreveu o crédito da Ré sobre o Autor, visto que não era um crédito recíproco, mas o direito a um abatimento que já prescreveu; que inexiste mora do credor porque não há recusa sem motivo justificado da prestação que lhe é oferecida nem falta do dever geral de cooperação por ausência de prática dos actos necessários ao cumprimento da obrigação; se a Ré se pretendia libertar da mora quanto à referida quantia deveria ter lançado mão do mecanismo da consignação em depósito, concluindo pela afirmação do seu direito a juros de mora.

A Recorrida contra-alegou, invocando, em síntese, que a nulidade da sentença se reconduz afinal a uma nulidade processual prevista no artigo 201º nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil que segue a regra geral sobre o prazo de arguição prevista no artigo 205º do Código de Processo Civil, que o Autor não respeitou, sendo pois intempestiva a sua arguição, que opera a compensação e que se verifica a mora do credor.

O Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu parecer.
*
Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1. Seguindo a presente acção administrativa comum a forma de processo sumária prevista no CPC, sem que se tivesse proferido despacho dispensando a realização de audiência preliminar, sem que tivesse sido proferido despacho saneador ou a notificação a que alude o artigo 512.º do CPC e sem que se tivesse em algum lado fundamentado que o processo já detinha todos os elementos necessários ou adequados ao julgamento da causa e que permitiam o conhecimento imediato no despacho saneador, o Senhor Juiz, logo findos os articulados, proferiu sentença.

2. Findos os articulados, preceitua-se no artigo 787.º, n.º 1, do CPC, ex vi artigo 42.º, n.º 1, do CPTA, que deverão ser seguidos os termos do disposto nos artigos 508.º a 512.º-A do CPC, destinados à selecção da matéria de facto e à indicação das provas.

3. O juiz só pode conhecer imediatamente do mérito da causa quando “para dar resposta ao pedido ou à parte do pedido correspondente não haja necessidade de mais provas do que aquelas que já estão adquiridas no processo.

4. A omissão processual do tribunal influi decisivamente no exame e na decisão da causa na medida em que impediu o A. de requerer a realização dos meios adequados à prova do direito que se arrogara.

5. A referida omissão implica a nulidade de todo o processado após o ultimo articulado, designadamente da sentença impugnada, à luz do previsto no artigo 201.º, nºs 1 e 2 do CPC, vício que expressamente se invoca, com as legais consequências.

6. O acto consubstanciado na comunicação do acerto de contas dirigido pela R. ao A. não é impugnável, porque não autoritário, não sendo aplicável aos autos o artigo 38.º, n.º 2, do CPTA que o Senhor Juiz aplica.

7. Ao fazê-lo, viola não só o comando legal contido nesse preceito, bem como o direito à tutela judicial efectiva do A. previsto no artigo 2.º do CPTA e no artigo 20.º da CRP.

8. A declaração contida no doc. 8 junto com a contestação é ineficaz como declaração de compensação uma vez que que dela resulta uma mera proposta de acerto de contas dependente de confirmação pela contraparte.

9. Não se deve confundir compensação (mútua extinção de créditos recíprocos) com imputação ou dedução (em que há um só crédito que tem de ser diminuído de determinadas verbas), que consiste num mero abatimento de crédito.

10. A declaração da R. consiste numa mera declaração de que pretendia fazer o abatimento ao crédito do A. por, na sua óptica, ter já recebido montantes a mais noutra parcela da retribuição derivada da relação contratual em causa.

11. Não tendo operado eficazmente a compensação em 2006, não pode agora decidir-se que não prescreveu o crédito da R. sobre a A., visto que, na verdade não era um crédito recíproco, mas o direito a um abatimento que já prescreveu.

12. Violou, assim, o Tribunal o disposto nos artigos 847.º e 848.º do CC e o artigo 40.º, n.º 1, do Decreto-lei n.° 155/92, de 28 de Julho.

13. A R. não se obrigou a reembolsar o A. e restantes cooperantes das despesas suportadas com viagens e seguros, mas a subsidiá-los com as quantias fixas discriminadas na p. i., como aliás parece até resultar do alegado quanto a “suplementos” – não a reembolsos – pela R. em 22.º, 23.º, 24.º e 25.º da contestação. Ao fazer depender o pagamento dos subsídios da apresentação de documentos comprovativos de despesas, o tribunal violou o disposto nos artigos 798.º, 562.º e 806.º do CC.

14. O art. 813º inclui no perímetro legal da «mora credendi» não só os casos em que o credor recusa, sem motivo justificado a prestação que lhe é oferecida mas também os casos em que ele, faltando àquele dever geral de cooperação que tanto caracteriza a relação creditória, não pratica os actos necessários ao cumprimento da obrigação.

15. O A. forneceu o seu NIB à R. que bem podia, se o quisesse efectuar a prestação de 2.861,80 €, pelo que em nada o A. impediu a R. de o fazer, uma vez que aquele entendia que àquela quantia deveria acrescer outra quantia em dívida.

16. Se a R. se pretendia libertar da mora quanto à referida quantia, deveria ter lançado mão do mecanismo da consignação em depósito.

17. Ao julgar verificado o condicionalismo do artigo 813.º do CC, o tribunal violou tanto este comando legal, como o direito do credor a receber juros de mora desde 1-6-2004 até efectivo e integral pagamento (cfr. Artigo 806.º do CC).

18. A sentença recorrida violou os artigos 798.º, 562.º, 806.º, 847.º e 848.º do CC e o artigo 40.º, n.º 1, do Decreto-lei n.° 155/92, de 28 de Julho, bem como os artigos 787.º, n.º 1, e 508.º a 512.º-A do CPC, ex vi artigo 42.º, n.º 1, do CPTA.

NESTES TERMOS DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, DECLARANDO-SE A NULIDADE DA SENTENÇA E DE TODO O PROCESSADO APÓS A RESPOSTA ÀS EXCEPÇÕES, SEGUINDO O PROCESSO OS SEUS ULTERIORES TERMOS. SUBSIDIARIAMENTE, DEVE A SENTENÇA SER REVOGADA, CONDENANDO-SE A R. NO PEDIDO TAL COMO REALIZADO NA P.I.
*
II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:


1- Desde 1-4-2001 até 31-05-2004, o A. esteve destacado, por conta da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, para exercer funções de docente de Direito na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, em Luanda, Angola – acordo, confirmado pelos docs. de fls. 32, 80, 81.

2- Da “estimativa de custos das acções e aquisições programadas, apresentada à Agência Portuguesa de Apoio ao Desenvolvimento” consta na Rubrica 1, para “ensino permanente”, com “Docentes da FDUC deslocados em Luanda”, os seguintes custos:
- ordenados: € 3.800,00/mês, por cada docente;
- subsidio de alojamento: € 1.000,00/mês, por cada docente;
- transporte
- viagem ida/volta: + € 1.000,00, por cada docente
- transporte bagagem n/acompanhada: + € 500,00 por cada docente
- seguro de vida e saúde: € 600,00, por cada docente.
(doc. fls. 16).

3- Por carta datada de 20-12-2004 o A. comunicou ao chefe da secção de contabilidade da Universidade de Coimbra que “O signatário esteve, ao abrigo de acordo de cooperação entre a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (e a) Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, a leccionar em Luanda, República de Angola, até final de Maio do corrente ano. Como deve ser do conhecimento de V.Exª, os pagamentos referentes a esse serviço nunca foram feitos com a regularidade desejada. Tendo em conta que a relação profissional que existiu entre o signatário e a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra terminou, sem que tivessem sido, até ao momento, liquidados todos os créditos devidos venho solicitar-lhe que informe, por escrito, sobre todos os montantes que recebi durante os anos de 2001, 2002, 2003 e 2004 e as respectivas datas de pagamento.(…)” – doc. de fls. 81.

4- Por despacho de 29-4-2005 foi autorizado o pagamento ao A., por transferência bancária para o NIB 0035…, da quantia de € 43.966,00, referente à colaboração técnica no âmbito do Acordo de Cooperação com os Palops, a efectuar durante o mês de Maio de 2004 - doc. de fls. 82 a fls. 85.

5- Em 16-5-2005 a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra comunicou à Administradora da Universidade, através do oficio nº 92/457, de 12-5-2005, “que o Lic. A. V. M. terminou em 31 de Maio de 2004 a relação contratual que existia com esta Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra pelo que todos os pagamentos posteriores a essa data deverão ser abatidos às ajudas de custo em divida e que irão ser brevemente processadas (fls. 80).

6- Por ofício nº CONT/717, de 30-12-2005, a Faculdade de Direito esclareceu a Administradora da Universidade de Coimbra que o valor que deve ser considerado em divida ao docente, agora A., é de € 7.000,00, “correspondente a 4 meses do ano lectivo 2003/2004, no valor de € 4.000,00 (Dezembro 2003 a Março 2004), a 2 meses de prolongamento de exercício de funções, no valor de e 2.000,00 (Abril e Maio de 2004) e a uma viagem de ida e volta (…) valor de € 1.000,00 (…)” - doc. de fls. 101 e 102.

7- No oficio nº 4198, de 12-4-2006, da Administração da Universidade de Coimbra, dirigido ao agora A, consta que: “ Assunto: Rescisão contratual — Acerto de contas. Relativamente ao assunto identificado em epígrafe vimos comunicar a V. Ex. que, após esclarecimentos vários com a Faculdade de Direito, se concluiu estarem pagas todas as remunerações resultantes da actividade docente no âmbito do Protocolo entre a Universidade de Coimbra e a Universidade Agostinho Neto, conforme se pode constatar pelo mapa discriminativo Anexo 1. Encontra-se, no entanto, por liquidar o valor de 7.000,00 € correspondente a alojamento e viagem em 2003/2004, também discriminado no mapa Anexo 1, urna vez que a Faculdade de Direito assume esse pagamento em virtude de os docentes já não se encontrarem, nessa data, ao abrigo do projecto de Lomé. Dado que a relação contratual de V.Exª com a Faculdade de Direito terminou em 31 de Maio de 2004, facto que só foi comunicado pela Faculdade de Direito à Administração em 16 de Maio de 2005, há que deduzir os valores relativos a remuneração e subsídios de férias e Natal recebidos indevidamente entre 01-06-2004 e 31 -05-2005, valores discriminados no mapa Anexo 2. Os direitos adquiridos, devidos no momento da cessação de funções (férias, subsídios de férias e de Natal) encontram-se discriminados no mapa Anexo 3 e perfazem um total de 918,10€. Deste encontro de contas resultará um valor total a receber por V. Exª de 2.861.80 € conforme mapa resumo - Anexo 5, que inclui os descontos efectuados às remunerações pagas indevidamente em 2004 e 2005, cuja devolução será feita através de uma guia de restituição no valor de 511,50 € - Anexo 4. Ao dispor para quaisquer esclarecimentos adicionais. Ficamos a aguardar a confirmação de V.Exª. para procedermos à liquidação dos valores em divida.” - docs. de fls. 103 a 109.

8- Do ofício nº 4198, de 12-4-2006, referido em 7, fazem parte 5 mapas anexos – docs. de fls. 105 a 109.

9- Por oficio nº 03621, de 26-4-2007, remetido sob registo postal nº RO744076364PT, cujo Aviso de Recepção foi assinado em 30-4-2007, a Administração da Universidade de Coimbra solicitou ao agora A. que informasse “o que tiver por conveniente sobre o assunto” referido no “oficio refª 4198, cuja cópia se anexa” – doc. fls. 111 a 113.

10- Por carta datada de 4-5-2007, entrada em 7-5-2007, o mandatário do agora A. solicitou cópia dos mapas, que disse não ter recebido, referidos nas “Vossas últimas duas comunicações” – doc. fls. 114.

11- Através do ofício nº 04095, de 15-5-2007, a Universidade de Coimbra remeteu cópia dos mapas referidos no ofício nº 4198, de 12-4-2007 – doc. de fls. 115.

12- Do ofício nº 07946, de 14-12-2009, da Administração da Universidade de Coimbra remetido sob registo postal RC219847218PT da mesma data e com Aviso de recepção assinado em 15-12-2009 endereçado a MR & Associados, Sociedade de Advogados, RI, Avª Fernão de Magalhães, 446 -2º, Coimbra, consta que “Em resposta à carta dirigida por V. Exªs a estes serviços, junto se enviam cópias dos recibos de vencimento, de Setembro de 2003 a Maio de 2004, do ex- Monitor da Faculdade de Direito desta Universidade, Licº António Manuel Vicente Marques, bem como do comprovativo do pagamento do subsídio de alojamento no valor de 10.000,00 €, efectuado em Junho de 2004. Mais se informa que o valor que falta liquidar, no montante de 7.000,00 €, se encontra pendente da resposta por parte do referido Licº, aos ofícios nºs. 4198, datado de 12/04/2006 e 3621, datado de 26/042007, cujas cópias também se anexam.” - doc. de fls. 147 a 167.
*
III - Enquadramento jurídico.

1. A nulidade da sentença e de todo o processado a partir do final dos articulados.

Refere o Autor nas conclusões das suas alegações que:

«1. Seguindo a presente acção administrativa comum a forma de processo sumária prevista no CPC, sem que se tivesse proferido despacho dispensando a realização de audiência preliminar, sem que tivesse sido proferido despacho saneador ou a notificação a que alude o artigo 512.º do CPC e sem que se tivesse em algum lado fundamentado que o processo já detinha todos os elementos necessários ou adequados ao julgamento da causa e que permitiam o conhecimento imediato no despacho saneador, o Senhor Juiz, logo findos os articulados, proferiu sentença.

2- Findos os articulados, preceitua-se no artigo 787.º, n.º 1, do CPC, ex vi artigo 42.º, n.º 1, do CPTA, que deverão ser seguidos os termos do disposto nos artigos 508.º a 512.º-A do CPC, destinados à selecção da matéria de facto e à indicação das provas.

3. O juiz só pode conhecer imediatamente do mérito da causa quando "para dar resposta ao pedido ou à parte do pedido correspondente não haja necessidade de mais provas do que aquelas que já estão adquiridas no processo.»

4. A omissão processual do tribunal influi decisivamente no exame e na decisão da causa a medida em que impediu o A. de requerer a realização dos meios adequados à prova do direito que se arrogara.

5. A referida omissão implica a nulidade de todo o processado após o ultimo articulado, designadamente da sentença impugnada, à luz do previsto no artigo 201.º, nºs 1 e 2 do CPC, vício que expressamente se invoca, com as legais consequências.»

Vejamos.

Ao contrário do que resulta da expressão "nulidade da sentença" utilizada para caracterizar a alegada nulidade, as nulidades da sentença estão taxativamente identificadas no artigo 668º do Código de Processo Civil, e a nulidade invocada pelo Autor e subsumida pelo próprio é identificada no artigo 201.º, nºs 1 e 2, do mesmo diploma.

Pelo que é desde logo impróprio apelidar a expressão nulidade da sentença.

Efectivamente a nulidade invocada pelo Autor, como o próprio começa por referir, é uma nulidade processual, prevista no artigo 201.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (de 1995).

Nulidade que, em abstracto, pode determinar a anulação da sentença mas não a sua declaração de nulidade, face ao disposto nos preceitos acima citados.

Ora, como ensina Manuel de Andrade, “se a nulidade está coberta por uma decisão judicial que ordenou, autorizou ou sancionou o respectivo acto ou omissão, em tal caso o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente a interpor e a tramitar como qualquer outro do mesmo tipo. É a doutrina tradicional, condensada na máxima: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se” (in Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, página 183).

A jurisprudência dos tribunais integrados na jurisdição administrativa e fiscal é unânime no sentido de que as nulidades processuais conhecidas pelo interessado unicamente com a notificação da sentença, têm o mesmo regime das nulidades da sentença e devem ser arguidas no recurso interposto desta, quando admissível (cfr., entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 09.04.1997, processo n.º 021070, de 30.01.2002, processo n.º 026653, de 07.07.2004, processo n.º 0701/04, de 27.09.2005, processo n.º 0402/05, e de 06.07.2011 (Pleno), processo n.º 0786/10, acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 07.05.2013, processo n.º 06393/13, e acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 14.07.2014, processo n.º 0875/10.5 BRG).

Daí que seja tempestivo o recurso nesta parte.




2. A nulidade processual decorrente da falta de produção de prova.

Invoca o Recorrente nesta parte, de relevante, que:

“O juiz só pode conhecer imediatamente do mérito da causa quando “para dar resposta ao pedido ou à parte do pedido correspondente não haja necessidade de mais provas do que aquelas que já estão adquiridas no processo” (vd. Lebre de Freitas, CPC anotado, vol. 2.º, p. 373). Caso contrário, terá de prosseguir os termos relativos à selecção da matéria assente e da matéria a incluir na base instrutória, notificando as partes para indicarem a prova respectiva.

Sucede que, in casu, sem que se tivesse proferido despacho dispensando a realização de audiência preliminar, sem que tivesse sido proferido despacho saneador ou a notificação a que alude o artigo 512.º do CPC e sem que se tivesse em algum lado fundamentado que o processo já detinha todos os elementos necessários ou adequados ao julgamento da causa e que permitiam o conhecimento imediato no despacho saneador, o Senhor Juiz, logo findos os articulados, proferiu sentença.

Mais, o Senhor Juiz, apesar de violar a lei processual impedindo o A. de requerer a produção de prova, ainda motiva a sentença escrevendo que “o A. não demonstrou o direito que invoca, como lhe competia […] não fez qualquer prova das despesas que invoca”!

A omissão processual do tribunal influi decisivamente no exame e na decisão da causa na medida em que impediu o A. de requerer a realização dos meios adequados à prova do direito que se arrogara.

(…)

“Quanto aos subsídios de viagem e de seguros, como o próprio nome indica eram subsídios, não direito a reembolsos. Um subsídio é, por definição, um apoio de cariz social a conceder como comparticipação nos encargos com determinadas despesas. De qualquer forma, como o Tribunal, por omissão, não permitiu que “fosse requerida a junção dos contratos e outros documentos para interpretação das declarações contratuais, obstaculizou irremediavelmente esta tarefa. É que a R. não se obrigara a reembolsar o A. e restantes cooperantes das despesas suportadas com aqueles factos, mas a subsidiá-los com as quantias fixas discriminadas na p. i., como aliás parece até resultar do alegado quanto a “suplementos” – não a reembolsos – pela R. em 22.º, 23.º, 24.º e 25.º da contestação. Ao fazer depender o pagamento dos subsídios da apresentação de documentos comprovativos de despesas, o tribunal violou o disposto nos artigos 798.º, 562.º e 806.º do CC”.

Vejamos.

Como refere o Recorrente, a presente acção administrativa comum segue a forma de processo sumária prevista no Código de Processo Civil.

Determina o artigo 787ª deste diploma (versão de 2009):

“Termos posteriores aos articulados

1. Findos os articulados, observar-se-á o disposto nos artigos 508º a 512º-A, mas a audiência preliminar só se realiza quando a complexidade da causa ou a necessidade de actuar o princípio do contraditório o determinem; se a selecção da matéria de facto controvertida se revestir de simplicidade, o juiz pode abster-se de fixar a base instrutória.

2. Não havendo lugar à realização de audiência preliminar e ainda que tenha de ser elaborado despacho saneador para decisão sobre as matérias referidas nas alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 510º ou sobre incidente de intervenção de terceiros, o juiz pode abster-se de proceder à selecção da matéria de facto, nos termos do nº 2 do artigo 508º-B, se se verificar a situação prevista na parte final do número anterior.

3. No caso de não ter havido saneamento e condensação do processo, o juiz ordena a notificação das partes para o efeito do disposto no nº 1 do artigo 512º.

Ao contrário do que sucede na forma de processo ordinário, no processo sumário a regra é a da dispensa da audiência preliminar pois esta só se realiza quando a complexidade da causa ou a necessidade de assegurar contraditório determinem.

No caso a causa não é complexa nem foi suscitada matéria de excepção em relação à qual fosse necessário assegurar o contraditório.

Também não se mostrava necessário produzir qualquer prova suplementar ou dar a oportunidade de a apresentar.

Com efeito a única prova que o Autor diz ter sido preterida é a prova documental, invocando que foi preterida a possibilidade de que “fosse requerida a junção dos contratos e outros documentos para interpretação das declarações contratuais.”

Ora dispõe o artigo 523º do Código de Processo Civil (de 2009, quanto à prova documental):

“Momento da apresentação

1. Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.

2. Se não forem apresentados com o articulado respectivo, os documentos podem ser apresentados até ao encerramento da discussão em 1ª instância, mas a parte será condenada em multa, excepto se provar que os não pode oferecer com o articulado”.

E o artigo 524º do mesmo diploma:

“Apresentação em momento posterior

1. Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.

2. Os documentos destinados a provar factos posteriores aos articulados, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo”.

Tratando-se de uma acção sob processo sumário e não se justificando a audiência de julgamento, face à simplicidade da questão, por um lado, e por outro lado, sendo relativa a factos invocados no articulado inicial, o Autor podia e devia ter oferecido a prova documental no articulado inicial o que não fez, precludindo assim o direito a apresentar tal prova.

Em todo o caso, o Autor pretende provar com documentos um facto que é irrelevante: provar que as quantias que pretende ver pagas são subsídios ou suplementos e não reembolsos de despesas efetuadas.

O facto que o Autor alegou na petição inicial foi a realização de viagens em relação às quais quer ver pagas despesas.

Ora em relação a esse facto essencial – a realização de viagens – o Autor não ofereceu prova documental quando devia, na petição inicial.

Independentemente de as quantias que pede serem devidas a título de subsídio (fixas) ou de reembolso (variáveis) pressupunham, como decorre do articulado inicial, a realização de viagens.

Pelo que bem andou o Tribunal a quo em dispensar a audiência prévia ou a produção de prova para além da que já constava dos autos, proferindo de imediato, findos os articulados, a decisão final.

Termos em que improcede, logo nesta parte, o recurso

3. Da compensação e da prescrição dos créditos objecto da compensação.

Sustenta o ora Recorrente nas conclusões 6 a 13 das suas alegações:

“6. O acto consubstanciado na comunicação do acerto de contas dirigido pela R. ao A. não é impugnável, porque não autoritário, não sendo aplicável aos autos o artigo 38.º, n.º 2, do CPTA que o Senhor Juiz aplica.

7. Ao fazê-lo, viola não só o comando legal contido nesse preceito, bem como o direito à tutela judicial efectiva do A. previsto no artigo 2.º do CPTA e no artigo 20.º da CRP.

8. A declaração contida no doc. 8 junto com a contestação é ineficaz como declaração de compensação uma vez que que dela resulta uma mera proposta de acerto de contas dependente de confirmação pela contraparte.

9. Não se deve confundir compensação (mútua extinção de créditos recíprocos) com imputação ou dedução (em que há um só crédito que tem de ser diminuído de determinadas verbas), que consiste num mero abatimento de crédito.

10. A declaração da R. consiste numa mera declaração de que pretendia fazer o abatimento ao crédito do A. por, na sua óptica, ter já recebido montantes a mais noutra parcela da retribuição derivada da relação contratual em causa.

11. Não tendo operado eficazmente a compensação em 2006, não pode agora decidir-se que não prescreveu o crédito da R. sobre a A., visto que, na verdade não era um crédito recíproco, mas o direito a um abatimento que já prescreveu.

12. Violou, assim, o Tribunal o disposto nos artigos 847.º e 848.º do CC e o artigo 40.º, n.º 1, do Decreto-lei n.° 155/92, de 28 de Julho.

13. A R. não se obrigou a reembolsar o A. e restantes cooperantes das despesas suportadas com viagens e seguros, mas a subsidiá-los com as quantias fixas discriminadas na p. i., como aliás parece até resultar do alegado quanto a “suplementos” – não a reembolsos – pela R. em 22.º, 23.º, 24.º e 25.º da contestação. Ao fazer depender o pagamento dos subsídios da apresentação de documentos comprovativos de despesas, o tribunal violou o disposto nos artigos 798.º, 562.º e 806.º do CC.”

Consta da sentença recorrida, quanto a este ponto, o seguinte:

«(...) A relação jurídica em que se funda a pretensão do A. (contrato administrativo de provimento) enquadra-se na excepção referida na parte final da alínea d) do n° 3 do ETAF.

Nos termos da alínea a) do n° 2 do artigo 40° do CPTA, o A., sendo parte da relação contratual laboral cuja completa execução está em causa nos autos, tem legitimidade processual activa.
(....)
o Autor vem solicitar a condenação da R ao pagamento da quantia de € 12.400,00, e respectivos juros, assim discriminada:

- € 6.000,00 - subsídios de alojamento relativos ao período de Dez/2003 a Mai/2004;
- € 2.000,00 - duas viagens ida/volta;
- € 2.400,00 - seguros de vida e saúde relativo a 4 anos (2001 a 2004);
- € 2.000,00 - subsídio de transporte de bagagem não acompanhada, em 4 viagens.

Os juros já vencidos e reclamados totalizam € 3.472,00.

A R. confessa a existência parcial daquela divida ao A., mas limita o valor a € 7.000,00 "correspondente a 4 meses do ano lectivo 2003/2004, no valor de € 4.000,00 (Dezembro 2003 a Março 2004), a 2 meses de prolongamento de exercício de funções, no valor de € 2.000,00 (Abril e Maio de 20(4) e a uma viagem de ida e volta ( ... ) valor de € 1.000,00(... )" - Facto 6 e docs. de fls. 101 e 102 e fls. 105.

Além disso, a R. entende que a este valor devem ser deduzidas as quantias já pagas indevidamente no período posterior à rescisão do contrato, no total de € 5.567,80 (mapa de fls. 119).

A R. reconhece ainda que, além da diferença entre aqueles valores, devem ser abonadas ao A. as seguintes quantias:

- € 918,10 - relativamente aos direitos (férias, etc.) vencidos com a cessação de funções (mapa de fls. 120); e
- € 511,50 - restituição dos descontos efectuados para o CRSS do período 1-6-04 a 31-5-05 (que incidiram sobre o vencimento indevidamente pago) abatida dos descontos incidentes sobre os direitos supra referidos vencidos com a cessação de funções (mapas de fls. 119 a 121).

Por isso, a R. entende que apenas deve o valor líquido de € 2.861,80 (mapa de fls. 122).

Porém, o A. entende que, com isso, a R. pretende fazer uma compensação da divida com uma "reposição" referida no DL 155/92, de 28 de Julho, cujo direito já prescreveu. Note-se que tal excepção peremptória não altera o valor da causa (Acórdão n° 05S369 de Supremo Tribunal de Justiça, 24 de Maio de 2006).

Sendo assim, isto é, estando prescrito o dever do A. restituir os vencimentos auferidos indevidamente, vem esta alegar que a R. não pode deixar de lhe pagar o valor que já reconheceu dever-lhe, acrescido de juros, e que tal divida, dada a sua temporalidade, não se encontra prescrita por ainda não ter expirado o prazo de 20 anos previsto no artigo 309º do C.C.

Efectivamente, o crédito laboral do A., por resultar de relação jurídica administrativa, não se encontra prescrita e a respectiva divida da R. até se encontra parcialmente confessada.

Porém, não existe acordo quanto ao valor em litígio, resultando a diferença, no essencial, do facto da R. invocar a existência de pagamentos já feitos relativamente a período posterior à cessação da relação laboral.

A compensação é uma forma de extinção das obrigações, em que o devedor opõe ao crédito do credor um contra-crédito seu, extinguindo-se reciprocamente as respectivas obrigações se os créditos forem de igual montante ou, sendo-o de valor desigual, extinguindo-se a obrigação de menor valor e reduzindo-se a de maior valor na parte correspondente.

Para o efeito, deverão estar necessariamente preenchidos os requisitos elencados na lei Civil - art.° 847° do Cod. Civil.

O A. defende que, ainda que as quantias indevidamente pagas fossem devidas à R., a obrigação de restituição já estaria prescrita nos termos do nº 1 do art. 40° do Decreto-Lei n° 155/92, de 28 de Julho.

Esta norma dispunha, ao tempo dos factos:

"Artigo 40.º
(Prescrição)

1- A obrigatoriedade de reposição das quantias recebidas prescreve decorridos cinco anos após o seu recebimento.
2- O decurso do prazo a que se refere o número anterior interrompe-se ou suspende-se por acção das causas gerais de interrupção ou suspensão da prescrição.
3 - O disposto no n.º 1 não é prejudicado pelo estatuído pelo artigo 141.º do diploma aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro" (aditado pelo art. 77° da lei nº Lei n.º 55-8/2004, de 30 de Dezembro –OE/2005)

Todavia, resulta da lei:

''A compensação torna-se efectiva mediante declaração de uma das partes a outra" (nº 1 do artigo 848° CC).

"O crédito prescrito não impede a compensação, se a prescrição não podia ser invocada na data em que os dois créditos se tornaram compensáveis" (art. 850° CC).

"Feita a declaração de compensação, os créditos consideram-se extintos desde o momento em que se tornaram compensáveis" (art. 854°CC), ou seja, a compensação opera efeitos retroactivos.

Portanto:

- tendo a declaração de compensação sido feita através do oficio n° 4198, de 12.4.2006, da Administração da Universidade de Coimbra, dirigido ao agora A, conforme consta do facto provado n" 7 (ver docs. de fls. 103 a 109) e depois renovada através dos ofícios n? 03621, de 26.4.2007, remetido sob registo postal n° R0744076364PT, cujo Aviso de Recepção foi assinado em 30.4.2007 (ver 9 e doc. fls. 111 a 113) e oficio n" 07946, de 14-12-2009, remetido sob registo postal RC219847218PT da mesma data e com Aviso de recepção assinado em 15-12-2009 (ver facto 12 e does. de fls. 147 a 167);

- deve considerar-se que a compensação ocorreu, o mais tardar, em 30.4.2007, em momento em que a prescrição ainda não era invocável,

- e, consequentemente, que o efeito extintivo dos créditos compensados se reporta ao momento em que estes se tornaram compensáveis;

Assim, a compensação invocada pela R. é um acto legítimo, susceptível de reduzir o valor da dívida em causa.

Por outro lado, em rigor a R. não pede a restituição, através dum acto de reposição, das quantias indevidamente recebidas pelo A. A referência feita na parte final do oficio na 4198 à "devolução" que "será feita através de guia de restituição no valor de 511,50€ - anexo 4" deve entender-se como sendo relativa à importância líquida, a favor do A, discriminada no mapa anexo na 4, a fls. 108.

A R. invoca, na prática, uma circunstância jurídica, que considera consolidada desde momento muito anterior à instauração dos presentes autos e que a dispensa de pagar parte do seu débito.

Tal consolidação resultou do facto da R. ter praticado o concreto acto de determinação dos valores "a crédito" e "a débito" e feito a "declaração" do "encontro de contas" à outra parte e esta não ter contestado, conformando-se.

Portanto, em rigor, a R. não pede o reconhecimento judicial do seu direito à compensação (na medida em isso pressuporia a existência de créditos contrapostos).

Invoca antes a inexistência parcial da sua dívida, na parte em que já se encontra extinta (pelo menos desde 2007) pelo acto administrativo cuja comunicação foi efectuada através do ofício na 4198, de 12.4.2006, ofício na 03621, de 26.4.2007, e oficio na 07946, de 14-12-2009, e cuja eficácia se fixa em 30-4-2007 por só nessa data se ter consumado comprovadamente a sua notificação, cujo conteúdo foi recebido como reconhece o A. (art. 70 do articulado de fls. 171).

Ou dito de outro modo, o Autor ao ter-se remetido ao silêncio e não ter impugnado o acto que lhe comunicou o acerto de contas levou a que o mesmo se tivesse solidificado na sua ordem jurídica, não podendo agora, e passados vários anos, proceder à sua impugnação, como parece pretender.

Como se refere no n. ° 2 do artigo 38° do CPTA, ".... a acção administrativa comum não pode ser utilizada para obter o efeito que resultaria da anulação do acto inimpugnável "

Além disso, o A. não demonstrou o direito que invoca, como lhe competia, não indicando sequer as datas em que terão ocorrido as viagens cujo pagamento considera em falta, nem identifica as apólices de seguros em causa. Ou seja, não fez qualquer prova das despesas que invoca.

É verdade que o A. remete o fundamento do seu direito para os documentos que junta à p.i .. Todavia, os documentos 2 e 3 (fls. 10 a 22) referem-se a estimativas de custos a suportar pela Universidade. O facto de serem estimados custos com viagens, seguros, e outros encargos a suportar pela Universidade não significa que todos esses custos tenham necessariamente de constituir receita dos docentes ali referidos.

A falta da prova de que incorreu nas despesas que invoca, era um ónus que lhe competia, e que sempre implicava uma decisão desfavorável à sua pretensão.

O A. tem, no entanto, direito a que lhe seja paga a quantia em divida, na parte em que a Universidade lhe reconhece razão, isto é, o valor de € 2.861,80 (mapa de fls. 122) e, nessa parte, procede a acção.»

Com acerto.

Na verdade, a “comunicação” que o ora Recorrente caracteriza como declaração de compensação (conclusões 6 a 13) não é na verdade uma mera declaração negocial mas antes, ao contrário do que sustenta, um verdadeiro acto administrativo, uma declaração unilateral manifestando um poder de autoridade por parte da Ré, como decorre claramente da expressão “cuja devolução será feita através de uma guia de restituição no valor de 511,50 €” (facto provado sob o n.º 7).

Embora sujeito à condição de o destinatário confirmar as contas feitas pelos serviços da Universidade – artigo 129º, alínea b), do Código de Procedimento Administrativo (de1991) -, não deixa de ser um acto administrativo.

Acto administrativo que não tendo sido impugnado tempestivamente - artigo 58º, n.º2, alínea b) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos - se consolidou na ordem jurídica.

Em todo o caso, ainda que se tivesse extinto, por prescrição, o contra crédito da Ré, sempre a acção claudicaria, como decidido, por falta de prova de factos que permitam afirmar a existência de um crédito por banda do Autor.

Improcede, pois, o recurso nesta parte.

4. A mora da Universidade no pagamento das quantias em dívida ao Autor.

O Autor invoca nas conclusões 14 a 17 das suas alegações:

«14. O art. 813º inclui no perímetro legal da «mora credendi» não só os casos em que o credor recusa, sem motivo justificado, a prestação que lhe é oferecida mas também os casos em que ele, faltando àquele dever geral de cooperação que tanto caracteriza a relação creditória, não pratica os actos necessários ao cumprimento da obrigação.

15. O A. forneceu o seu NIB à R. que bem podia, se o quisesse, efectuar a prestação de 2.861,80 €, pelo que em nada o A. impediu a R. de o fazer, uma vez que aquele entendia que àquela quantia deveria acrescer outra quantia em dívida.

16. Se a R. se pretendia libertar da mora quanto à referida quantia, deveria ter lançado mão do mecanismo da consignação em depósito.

17. Ao julgar verificado o condicionalismo do artigo 813.º do CC, o tribunal violou tanto este comando legal, como o direito do credor a receber juros de mora desde 1-6-2004 até efectivo e integral pagamento (cfr. Artigo 806.º do CC).»

No que toca a este ponto é a seguinte a fundamentação da sentença recorrida:

«Discute-se ainda o direito aos juros de mora.

O A. pretende que lhe sejam pagos juros até à actualidade e a R. entende que não existe qualquer direito a juros.

É verdade que a divida existe (no valor de € 2.861,80) e subsistiu até à actualidade.

"O devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada em tempo devido", nº 2 do artigo 804° CC.

No entanto, no caso concreto a mora não é imputável ao devedor desde 30-4-2007, já que nessa altura a R. se dispôs a pagar e, após procedimento interno, solicitou a intervenção da parte contrária.

O credor cuja intervenção é solicitada e omite qualquer actividade não tem direito a juros desde então.

É verdade que o devedor tinha conhecimento do NIB do credor, já que tinha feito transferências bancárias através dele a favor do A.. Certo é que a notificação que consta do ofício n° 4198 (fls. 105) avisa que "ficamos a aguardar a confirmação de V Ex" para procedermos à liquidação dos valores em dívida". E depois disso, a Universidade insistiu para que o credor se pronunciasse, sempre sem resposta.

"O credor incorre em mora quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação que lhe é oferecida nos termos legais ou não pratica os actos necessários ao cumprimento da obrigação" (art. 813° CC). "A partir da mora, o devedor apenas responde, quanto ao objecto da prestação, pelo seu dolo" (nº 1 do art. 814° CC) e

"Durante a mora (do credor), a divida deixa de vencer juros, quer legais quer convencionados" (n° 2 do art, 814° CC).

Apesar disso, a mora do devedor existiu até 30-4-2007, pelo que, até então, se venceram juros legais, a contar do dia do início da mora, nos termos do art. 806° CC, que se fixa em 1-6-2004.»

Também aqui com acerto.

A Universidade demandada só não procedeu ao pagamento – nem ao depósito - da quantia que reconheceu estar em dívida ao Autor porque este, apesar de notificado para o efeito, não confirmou nem infirmou os valores apresentados.

Foi opção do Autor, como refere a Demandada, aguardar que passassem 5 anos sobre o momento em que lhe foram efectuados os pagamentos indevidos, para só então vir judicialmente exigir os seus créditos.

Só ao Autor, portanto, é imputável o atraso no pagamento da quantia em causa, de 2.861,80 €.

Pelo que também nesta parte improcede o recurso.
*
IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantêm a decisão recorrida.

Custas pelo Recorrente.
*
Porto, 18.10.2019

Rogério Martins
Luís Garcia
Conceição Silvestre