Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00659/14.1BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/19/2021
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:LICENCIAMENTO MUNICIPAL, CONSTRUÇÃO ILEGAL, ART.º 134.º, N.º 3 CPA/91
Sumário: 1 . O regime da nulidade dos atos administrativos não prejudica a possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de atos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito.

2 . No caso concreto dos autos, a declaração de nulidade de um acto tem como consequência a destruição dos seus efeitos de facto, perante os pressupostos da pertinente proporcionalidade e da sua conformidade com os ditames emanados pelo princípio, temos que a aplicação do disposto no n.º3 do art.º 134.º do CPA/91 se apresenta como adequada, uma vez que as consequências que derivariam do mero operar da declaração de nulidade e da destruição dos efeitos de facto – demolição do 3.º piso - se revelariam como atentatórias do princípio e seus comandos.

3 . Apenas a manutenção ou a estabilização da situação de facto duradoura se mostra constituir, no contexto e atento o tempo decorrido, como o meio de reação mais adequado e benigno, ou menos oneroso, para os sujeitos em presença e os interesses conflituantes envolvidos e a prosseguir ou realizar, assim como se revela, in casu, como o meio menos excessivo, pois, os custos decorrentes ou que envolvem a não «jurisdicização» da concreta situação de facto seriam superiores aos seus benefícios, tanto mais que a reposição no plano dos factos com a demolição de um 3.º piso, seria descaracterizar totalmente a moradia, num contexto envolvente similar e com um terreno com grande declive.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:A.
Recorrido 1:MUNICIPIO (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:

I
RELATÓRIO

1 . A., residente na Rua (…), inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Coimbra, de 5 de Dezembro de 2018, que julgou improcedente a acção administrativa especial, intentada contra o MUNICÍPIO (...), onde peticionva:
i. que sejam declarados nulos ou anulados os despachos impugnados, traduzidos nos despachos de 20/03/2014 e de 15/05/2014, pelos quais foi decidido indeferir o projeto de arquitetura que instruiu o registo n.º 42503/2013;
ii. que o R. seja condenado “a reconhecer que a moradia adquirida pelo Autor mediante escritura de compra e venda em 14 de fevereiro de 2003 foi construída com os pisos com que se encontra atualmente e que eventuais irregularidades na construção incluindo cedência para estacionamento não lhe podem ser oponíveis”;
iii. que o R. seja condenado “a reconhecer que o muro construído pelo Autor configura muro de contenção de terras nos termos e para os efeitos do disposto na al. m) do artigo 2.º do RJUE e al. b) do n.º 1 do artigo 6.º-A do RJUE”;
iv. que o R. seja condenado “a reconhecer que ao Autor não pode ser exigido a apresentação de projeto arquitetónico que contemple incorreções pelas quais não é responsável”.
*
2 . No final das suas alegações, o recorrente formulou as seguintes proposições conclusivas:
"1.ª A SENTENÇA RECORRIDA AO JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO INSTAURADA PELO RECORRENTE FEZ ERRADA INTERPRETAÇÃO DA LEI E DO DIREITO APLICÁVEIS, ESTANDO INQUINADA DE ERRO DE JULGAMENTO.
2.ª DA FACTUALIDADE DADA COMO PROVADA DESIGNADAMENTE NO PONTO 11) RESULTA QUE O RECORRENTE E SUA MULHER ADQUIRIRAM PELO VALOR DE 119.711,50€ EM 14/02/2003, POR ESCRITURA PUBLICA O PRÉDIO IDENTIFICADO NO PONTO 1) DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA, ISTO É, A MORADIA SITA EM (…), INSCRITA NA MATRIZ PREDIAL URBANA SOB O N.° 1144 E DESCRITA. NA 2.ª CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL (...)SOB O N.º 481.
3.ª O RECORRENTE E SUA MULHER, NO MOMENTO DA AQUISIÇÃO DO IMÓVEL SUPRA REFERIDO, EXIBIRAM A LICENÇA DE UTILIZAÇÃO N.° 607/2002, EMITIDA PELO RECORRIDO EM 16/12/2002.
4.ª O RECORRENTE COMPROU, DE BOA FÉ, A MORADIA EM CAUSA NOS PRESENTES AUTOS PARA FINS HABITACIONAIS EXATAMENTE COM OS PISOS QUE TEM, PELO QUE, NO QUE A CONSTRUÇÃO DA MESMA CONCERNE, ESTE É TERCEIRO DE BOA FÉ, SENDO-LHE, POIS, INOPONIVEIS QUAISQUER IRREGULARIDADES E/OU ILEGALIDADES.
5.ª O RECORRENTE ADQUIRIU A MORADIA OBJETO DOS PRESENTES AUTOS, QUE É A SUA CASA DE MORADA DE FAMÍLIA, APÓS O PROCEDIMENTO INERENTE À CONSTRUÇÃO DA MESMA E JÁ DEPOIS DE EMITIDA A RESPETIV'A LICENÇA DE HABITABILIDADE.
6.ª O PROCEDIMENTO FOI SEMPRE ACOMPANHADO PELO RECORRIDO MUNICÍPIO (...) QUE ATRAVÉS DOS SEUS TÉCNICOS E PERITOS ANALISOU OS PROJETOS E EMITIU AS RESPETIVAS INFORMAÇÕES TÉCNICAS, PARECERES E DEMAIS ATOS DO PROCEDIMENTO, INCLUINDO A LICENÇA DE UTILIZAÇÃO N.° 607/2002 DE 16 DE DEZEMBRO DE 2002, SENDO QUE, TODOS ELES, CONSTITUEM, NA VERDADE, ATOS CONSTITUTIVOS DE DIREITOS IRREVOGÁVEIS QUE SE CONSOLIDARAM NA ORDEM JURÍDICA.
7.ª NÃO SE PODE IGNORAR QUE QUALQUER PRÉDIO QUE SEJA DESTINADO A HABITAÇÃO NECESSITA DE TER UMA LICENÇA DE HABITAÇÃO OU DE HABITABILIDADE A QUAL É EMITIDA PELA RESPETIVA CÃMARA MUNICIPAL.
8.ª QUALQUER IMÓVEL QUE DISPONHA DE LICENÇA DE HABITAÇÃO OU DE HABITABILIDADE SIGNIFICA QUE FOI INSPECIONADO E QUE APRESENTA AS CONDIÇÕES DE HABITABILIDADE QUE CORRESPONDEM A DIVERSOS PARÃMETROS DE EXIGÉNCIA INCLUINDO LEGAIS, O QUE SUCEDE, JUSTAMENTE, NO CASO SUB JUDICIE, CONFORME RESULTA, ALIÁS, DO PONTO 8 DA INFORMAÇÃO COM A REF. 546, DATADA DE 11/03/2014 REFERIDA NO PONTO 20) DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA E QUE, NESTA PARTE, FOI IGNORADO PELA SENTENÇA RECORRIDA.
9.ª ENTRE A EMISSÃO DA LICENÇA DE UTILIZAÇÃO N. 607/2002, EMITIDA EM 16/12/2002 E O AUTO DE NOTÍCIA ELABORADO NA SEQUÊNCIA DAS DENÚNCIAS EM 20/ 01 / 20 12 DECORRERAM PRATICAMENTE 10 ANOS, PELO QUE, A CONSTRUÇÃO TAL COMO FOI VENDIDA AO RECORRENTE SE CONSOLIDOU NO ORDENAMENTO JURÍDICO PELO DECURSO DO TEMPO.
10.ª A SENTENÇA RECORRIDA ESTÁ INQUINADA DE ERRO DE JULGAMENTO POR ERRADA APLICAÇÃO E CONSEQUENTE VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 140.º, N.º 1, AL. B) E 134.º, N.º 3 DO CPA NA REDAÇÃO EM VIGOR À DATA PROPOSITURA DA AÇÃO (ATUALMENTE CORRESPONDE AO ARTIGO 162.°, N.° 3 DO CPA).
11.ª A SENTENÇA RECORRIDA VIOLOU, AINDA, O DISPOSTO NOS ARTIGOS 68.° E 69.° DO REGIME JURÍDICO DA URBANIZAÇÃO E EDIFICAÇÃO (RJUE), APROVADO PELO DL N.° 555/99, DE 16 DE DEZEMBRO.
12.ª O LEGISLADOR EM MATÉRIA DE URBANISMO, DESIGNADAMENTE NO ARTIGO 68.° DO RJUE REMETE JUSTAMENTE PARA O REGIME GERAL DE DIREITO, ISTO É, IN CASU, PARA O DISPOSTO NO ARTIGO I34.°, N.' 3 DO CPA (ATUAL ARTIGO 162.°, N.° 3 DO CPA) NO QUE CONCERNE Ã POSSIBILIDADE DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS JURÍDICOS A SITUAÇÕES DE FACTO DECORRENTES DE ATOS NULOS.
13.ª AO TRIBUNAL A QUO IMPUNHA-SE UMA DECISÃO QUE FIZESSE UMA PONDERAÇÃO JUSTA E LEGAL DOS INTERESSES EM PRESENÇA, ISTO É, DOS INTERESSES DE NATUREZA URBANÍSTICA E DOS INTERESSES PRIVADOS (DO RECORRENTE) O QUE NÃO SUCEDEU.
14.ª NO ACÓRDÃO DO TCA SUL, DATADO DE 22-05-2014, PROCESSO N.° 08158/11, DISPONÍVEL IN WWW.DGSI.PT PODE LER-SE QUE "A PONDERAÇÃO DOS EFEITOS JURÍDICOS E DA CORRELAÇÃO ENTRE O INTERESSE PÚBLICO DE NATUREZA URBANÍSTICA E OS INTERESSES PRIVADOS NÃO PODE DEIXAR DE SER FEITA A ESSE REGIME E TAMBÉM PORQUE ESSA PONDERAÇÃO É IMPOSTA PELO ART.° 134.°, N.° 3, DO CPA.".
15.ª NÃO PODIA E NÃO PODE O TRIBUNAL A QUO AFASTAR AS GARANTIAS DOS PARTICULARES, IN CASU, DO RECORRENTE, QUE TEM A SUA POSIÇÃO JURÍDICA PROTEGIDA FACE AO DISPOSTO NO N.° 3 DO ARTIGO 134.° DO CPA NA REDAÇÃO EM VIGOR À DATA DA PROPOSITURA DA AÇÃO E, IGUALMENTE A TEM PROTEGIDA, FACE AO DISPOSTO NO ARTIGO 162.°, N.°3 DO CPA NA REDAÇÃO ATUAL.
16.ª MAL ANDOU A SENTENÇA RECORRIDA AO SEPARAR DE FORMA CONTUNDENTE OS PRINCÍPIOS PRIVATÍSTICOS DOS PRINCÍPIOS INERENTES À DEFESA DA LEGALIDADE URBANÍSTICA PARA AFASTAR A APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 134.º, N.° 3 DO CPA NA REDAÇÃO EM VIGOR À DATA DA ENTRADA EM JUÍZO DA AÇÃO.
17.ª NOTE-SE, COM RELEVO QUE "O PRINCIPIO DA IMPRODUTIVIDADE JURIDICA DOS EFEITOS TÍPICOS DO ACTO NULO NÃO ELIMINA, PORTANTO, TODA A SUA PRODUTIVEDADE, JÁ QUE, EM MUITAS SITUAÇÕES, NÃO SE TRATA APENAS DE UMA APARÊNCIA DE ACTO ADMINISTRATIVO. E ISTO É PARTICULARMENTE EVIDENTE QUANDO OS ACTOS ADMINISTRATIVOS EM CAUSA SÃO ACTOS DE GESTÃO URBANÍSTICA QUE INVESTEM O PARTICULAR NO PODER DE REALIZAR OPERAÇÕES URBANÍSTICAS, POIS, AO ABRIGO DELES, MESMO QUE NULOS, TAIS OPERAÇÕES PODEM CONSOLIDAR-SE EFECTIVAMENTE: SÃO OPERAÇÕES DE LOTEAMENTO E RESPECTIVAS OBRAS DE URBANIZAÇÃO QUE SE EFECTIVAM, CONSTRUÇÕES QUE SE EDIFICAM E SE CONSOLIDAM, PASSANDO A SER UTILIZADAS PELOS TITULARES DAS RESPECTIVAS LICENCAS OU POR TERCEIROS ADQUIRENTES." (CFR. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, MARIA JOSE CASTANHEIRA NEVES, DULCE LOPES, FERNANDA MAÇÃS, IN REGIME JURIDICO DA URBANIZAÇÃO E EDIFICAÇÃO COMENTADO, 2011, 3.ª EDIÇÃO, ALMEDINA, PÁG. 505).
18.ª O RECORRENTE É POSSUIDOR DE BOA FÉ, ATÉ PORQUE SEMPRE CONFIOU E ACREDITOU QUE A MORADIA QUE ADQUIRIU SE ENCONTRAVA EM CONFORMIDADE COM O PLANO DIRETOR MUNICIPAL, SENDO, ALIÁS, PROPRIETÁRIO COM POSSE TITULADA ATUALMENTE HÁ MAIS DE 15 ANOS (HÁ DATA DA PROPOSITURA DA AÇÃO HÁ MAIS DE 10 ANOS), PELO QUE, POR UM LADO, SE TRATA DE SITUAÇÃO CONSOLIDADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO E, POR OUTRO LADO, SE OUTRO TITULO NÃO TIVESSE, QUE TEM, SEMPRE O RECORRENTE TERIA ADQUIRIDO O IMÓVEL, TAL COMO O MESMO SE ENCONTRA EDIFICADO, POR USUCAPIÃO FACE AO DISPOSTO NO ARTIGO 1294.° DO CÓDIGO CIVIL.
19.ª ALIÁS, TENDO SIDO O PDM REVISTO EM 2017 PELO REGULAMENTO DO PLANO DIRETOR MUNICIPAL (...) (DELIBERAÇÃO N.° 2847/2017, DE 17/04/2017, PUBLICADO EM DR, 2.ª SÉRIE, N.° 141, DE 24/07) RESULTA QUE ATUALMENTE NOS TERMOS DO ARTIGO 94.°, N.° 1, AL. B), II) O REGULAMENTO PERMITE NA ÁREA EM QUE SE INSERE A MORADIA DO RECORRENTE QUANTO AO NÚMERO DE PISOS 3.
20.ª OS EFEITOS DECORRENTES DOS ATOS NULOS DECORREM, PELO MENOS, DA DATA DA AQUISIÇÃO DO IMÓVEL PELO RECORRENTE EM 14/02/2003 E NÃO COMO DECORRE DA SENTENÇA DAS DATAS DOS DESPACHOS IMPUGNADOS, O QUE CONFIGURA VIOLAÇÃO CLARA DO DISPOSTO NO ARTIGO 134.°, N.° 3 DO CPA NA REDAÇÃO APLICÁVEL.
21.ª A SENTENÇA RECORRIDA, AO ALHEAR-SE DO REGIME SUPRA EXPOSTO E NÃO TOMANDO EM CONSIDERAÇÃO, POR ERRADA APLICAÇÃO DA LEI E DO DIREITO, A SITUAÇÃO CONSOLIDADA AO LONGO DO TEMPO, ATUALMENTE, HÁ MAIS DE 15 ANOS E, HÁ DATA DA PROPOSITURA DA AÇÃO HÁ MAIS DE 10 ANOS E, DURANTE OS QUAIS, O RECORRIDO MUNICÍPIO NÃO EXERCEU AS SUAS PRERROGATIVAS EM MATÉRIA URBANÍSTICA, DESIGNADAMENTE AS PREVISTAS NO ARTIGO 69.° DO RJUE E QUE SÓ AS VEIO EXERCITAR NA SEQUÊNCIA DE DENUNCIA DE VIZINHOS, E, NÃO TENDO, ANTES SUSCITADO A DESCONFORMIDADE LEGAL DAS OBRAS EM CAUSA E QUE, ALIÁS, NÃO PREJUDICAM TERCEIROS, ESTÁ CLARAMENTE INQUINADA DE ERRO DE JULGAMENTO, POR VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 140.º, N.° 1, AL. B) (ATUAL ARTIGO 167.°, N.° 2 DO CPA), 134.°, N.° 3 (ATUAL ARTIGO 162.°, N.° 3) DO CPA NA REDAÇÃO EM VIGOR À DATA DA PROPOSITURA DA AÇÃO E ARTIGOS 68.° E 69.° DO RJUE, DEVENDO, POIS, SER ANULADA.
22.ª A LICENÇA DE HABITABILIDADE EMITIDA PELO RECORRIDO MUNICÍPIO (...) CONFIGURA ATO ADMINISTRATIVO CONSTITUTIVO DE DIREITOS QUE SUSCITA CONFIANÇA NO TRÁFICO JURÍDICO, E QUE, IN CASU, CONDUZIU A QUE O RECORRENTE ADQUIRISSE O IMÓVEL E LHE FOSSE CONCEDIDO PELA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA O MÚTUO COM HIPOTECA;
23.ª DOS DOCUMENTOS JUNTOS A CONTESTAÇÃO APRESENTADA PELO RECORRIDO MUNICÍPIO (...), DESIGNADAMENTE NAS IMAGENS DO GOOGLE ANEXAS CONCLUI-SE, PELA MORFOLOGIA DO TERRENO, QUE A CASA DO RECORRENTE SE SITUA EM LOCAL COM ACENTUADA INCLINAÇÃO, PELO QUE, CLARAMENTE RESULTA QUE O MESMO TEM, IGUALMENTE, POR FUNÇÃO A CONTENÇÃO DE TERRAS SENDO, POIS, OBRA DE ESCASSA RELEVÂNCIA URBANISTICA NOS TERMOS DA AL. M) DO ARTIGO 2.° E DA AL. B) DO N.° 1 DO ARTIGO 6.°-A AMBOS DO RJUE
24.ª TENDO O TRIBUNAL A QUO VERIFICADO QUE, DE FACTO, HAVIA MATÉRIA DE FACTO CONTROVERTIDA QUE CARECIA DE PROVA — NO QUE CONCERNE AO MURO —, DEVERIA TER ABERTO UM PERÍODO DE PRODUÇÃO DE PROVA, PELO QUE O NÃO FAZENDO, VIOLOU, POIS, A SENTENÇA RECORRIDA O ARTIGO 411.° DO CPC, APLICÁVEL POR FORÇA DO ARTIGO 1.° DO CPTA NA REDAÇÃO APLICÁVEL, QUE PREVÊ O PRINCIPIO DO INQUISITÓRIO”.

3 . Notificadas as alegações de recurso, supra sumariadas nas suas conclusões, o Recorrido MUNICÍPIO (...) não apresentou contra alegações.
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4 . O Digno Magistrado do M.º P.º neste TCA, notificado nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, emitiu douto Parecer, sufragando, no essencial, a tese vertida na sentença recorrida, merecendo, assim a sua concordância – cfr. fls. 273-280 do processo físico - , que, notificado, obteve resposta sem sentido dissonante por parte do recorrente – cfr. fls. 280 a 284 v.ºdo processo físico.
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5 . Sem vistos, mas com envio prévio do projecto às Exmas. Juízas Desembargadoras Adjuntas, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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6 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1 . MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na decisão recorrida, cuja validade e fidelidade não vêm questionados:
1) O A. é proprietário de uma moradia sita em (…), inscrita na matriz predial urbana sob o n.º 1144 e descrita na 2.ª CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL (...)sob o n.º 481 (cfr. docs. de fls. 54 a 57 do suporte físico do processo).
2) Por despacho de 23/06/1998, foi deferido o projeto de arquitetura apresentado por E. para construção, em terreno situado no lugar de (...), de um edifício destinado a habitação unifamiliar, a desenvolver em dois pisos, com uma área bruta de construção de 237,10 m2, contemplando, ainda, uma operação de destaque (cfr. docs. de fls. 169 a 185 do processo administrativo n.º 41756/97).
3) Em 24/09/1998 foi apresentado, por E., um aditamento ao projeto de arquitetura referido no ponto anterior, no qual se previa a dotação de um lugar de estacionamento público, uma área de cedência para domínio público de 86 m2 e a definição de uma parcela destacada com 848 m2 e de uma parcela sobrante com 466 m2, aditamento que foi deferido por despacho de 04/11/1998 (cfr. docs. de fls. 164 a 166 do processo administrativo n.º 41756/97).
4) Por despacho de 01/10/1999, foi deferido o pedido de licenciamento de construção da obra pelo prazo de 24 meses (cfr. doc. de fls. 106 e 107 do processo administrativo n.º 41756/97).
5) Em 13/10/2000 foi emitido o Alvará de Licença de Construção n.º 879/00 em nome de E., do qual consta, além do mais, o seguinte:
O pedido de licenciamento da construção foi aprovado por despacho de 01/10/99, respeita o disposto no Plano Diretor Municipal e apresenta as seguintes características:
Área de construção: 237,10 m2; n.º de pisos: 2, sendo 2 acima da cota de soleira; n.º de fogos: 1; uso a fazer-se desta edificação: habitação.
Prazo de validade da licença: Início em: 13/10/00; Termo: 12/10/02
(cfr. doc. de fls. 95 do processo administrativo n.º 41756/97).
6) Na sequência de auto de notícia lavrado em 21/03/2001, foram embargadas as obras de construção em apreço, por estarem a ser executadas em desacordo com a licença municipal e o alvará n.º 879/00, nomeadamente em resultado da alteração da implantação e da ampliação do número de pisos, o que foi registado no auto de embargo lavrado em 16/04/2001 (cfr. docs. de fls. 86 a 92 do processo administrativo n.º 41756/97).
7) Em 10/04/2001 foi apresentado, por E., um projeto de alterações ao projeto de arquitetura anteriormente aprovado, tendo a requerente sido notificada, através do ofício n.º 19473, de 13/07/2001, e na sequência de despacho de 25/06/2001, para “apresentar aditamento que contemple a redução do alçado principal para uma leitura de 2 pisos e não 3, o que contraria o Plano Diretor Municipal” (cfr. docs. de fls. 70 a 80 do processo administrativo n.º 41756/97).
8) Em 26/12/2001 foi apresentado, por E., um novo aditamento ao projeto de arquitetura anteriormente aprovado, em conformidade com o solicitado na notificação que antecede, tendo o mesmo sido deferido por despacho de 30/04/2002, com o consequente levantamento do embargo de 16/04/2001 (cfr. docs. de fls. 55 a 66 do processo administrativo n.º 41756/97).
9) Através de requerimento apresentado em 30/09/2002, E. solicitou a emissão de Licença de Utilização para a habitação aqui em causa, referente ao alvará de licença de construção n.º 879/00, tendo junto o respetivo Livro de Obra e a declaração de responsabilidade do técnico responsável pela direção técnica da obra, na qual se pode ler que a obra “se encontra concluída desde 02.05.31, em conformidade com o projeto aprovado, com as condições de licenciamento e com o uso previsto no alvará de licença de construção” (cfr. docs. de fls. 10 a 52 do processo administrativo n.º 41756/97).
10) Na sequência do despacho de 10/12/2002 que autorizou a utilização requerida, foi emitido, em 16/12/2002, o Alvará de Licença de Utilização n.º 607/2002 em nome de E., referente à edificação em causa (cfr. docs. de fls. 2 e 3 do processo administrativo n.º 41756/97).
11) Em 14/02/2003 foi celebrada escritura pública de “compra e venda” e “mútuo com hipoteca” no Quarto Cartório Notarial (…), pela qual F. e mulher E. venderam ao A. e mulher M., que adquiriram, a edificação sita em (…), para sua habitação própria e permanente, mediante exibição da licença de utilização n.º 607/2002, tendo estes celebrado contrato de mútuo com hipoteca com a Caixa Económica Montepio Geral, pelo valor de € 119.711,50, para aquisição do referido imóvel (cfr. doc. de fls. 58 a 63 do suporte físico do processo).
12) Na sequência de denúncias de vizinhos do A. recebidas junto dos serviços do R., foi elaborado auto de notícia, em 24/01/2012, por se ter constatado que o A. “procedia à construção de um anexo/garagem, no logradouro posterior e junto às estremas, posterior e lateral direita do lote, executando paredes em alvenaria de tijolo que se elevam na estrema lateral direita cerca de 3,50m acima da cota do terreno, tendo já colocada a laje de cobertura em esteira de pré-esforçado e elementos cerâmicos, afetando uma área total de cerca de 70 m2, não possuindo para o efeito o respetivo licenciamento administrativo e/ou alvará de construção” (cfr. docs. de fls. 75 a 84 do processo administrativo n.º 01/2012/1147).
13) Por despacho de 24/02/2012, foi determinado o embargo das obras que se encontravam a ser executadas pelo A., tendo sido lavrado o respetivo auto em 29/02/2012 e tendo sido este notificado, através do ofício n.º 9412, de 13/03/2012, para “apresentar projeto de licenciamento administrativo/comunicação prévia, tendo em vista a eventual legalização, contemplando os trabalhos de correção ou de alteração que possibilitem assegurar a conformidade da obra com as disposições legais e regulamentares em vigor” (cfr. docs. de fls. 65 a 74 do processo administrativo n.º 01/2012/1147).
14) Em 13/09/2012 o A. apresentou pedido de aprovação de projeto de arquitetura para efeitos de legalização das obras de construção do anexo que levara a cabo na sua moradia (cfr. docs. de fls. 18 a 61 do processo administrativo n.º 01/2012/1147).
15) Por despacho de 16/04/2013, foi indeferido o projeto de arquitetura que antecede (cfr. docs. de fls. 3 a 7 do processo administrativo n.º 01/2012/1147).
16) Em 05/08/2013 o A. apresentou novo pedido de aprovação de projeto de arquitetura para efeitos de legalização das obras de construção dos anexos e da garagem que levara a cabo na sua moradia, que deu entrada sob o registo n.º 42503/2013 (cfr. docs. de fls. 33 a 73 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
17) Na sequência da proposta de indeferimento do projeto de arquitetura constante da informação n.º 2712, de 15/11/2013, e do despacho de concordância de 03/12/2013, foi o A. notificado, pelo ofício n.º 44203, de 11/12/2013, para exercer o respetivo direito de audiência prévia (cfr. docs. de fls. 23 a 28 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
18) Da referida informação n.º 2712, de 15/11/2013, consta o seguinte:

(…) 6. O presente processo apresenta apenas o projeto de anexos a legalizar na estrema nascente do terreno, no entanto verifica-se que na propriedade existem mais construções não licenciadas que não são representadas no presente projeto, conforme foto seguinte: (…)
7. Verifica-se também que a construção/moradia está neste momento com 3 pisos, em desacordo com o projeto aprovado, não sendo apresentado projeto contemplando esta alteração: (…)
8. Uma vez que não é apresentado projeto com todas as construções e pisos efetivamente existentes no terreno não é possível confirmar o cumprimento da capacidade construtiva do terreno prevista no PDM em vigor nem o cumprimento do índice de construção previsto no artigo 94.º do PDM em revisão.
9. O número de pisos da moradia, 3, viola o disposto no artigo 46.º do PDM em vigor.
10. Verifica-se que não foi garantida a área de cedência ao domínio público prevista na licença n.º 879/2000, não sendo assim previsto nenhum lugar de estacionamento público, violando o disposto no artigo 37.º do PDM e no artigo 132.º do PDM em revisão.
11. O lugar de estacionamento representado em planta, para solucionar o não cumprimento das condições de licenciamento inicial, não se poderá considerar como lugar de estacionamento público, uma vez que se encontra em propriedade privada e na frente da entrada automóvel ao interior do terreno (acesso à garagem).
12. Os anexos apresentados, pelas suas dimensões (área e altura) violam o disposto no artigo 33.º do Regulamento n.º 255/2012 (RMEU).
13. O muro posterior, pela sua altura, viola o disposto no artigo 35.º do Regulamento n.º 255/2012 (RMEU) e não se integra no local, podendo mesmo comprometer a paisagem onde se insere, violando o disposto no artigo 121.º do RGEU
(cfr. doc. de fls. 25 e 26 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
19) O A. exerceu o direito de audiência prévia através de exposição apresentada em 23/01/2014, na qual requereu a emissão de decisão final que aprovasse o projeto de arquitetura ou, pelo menos, que lhe fossem indicadas as correções a realizar (cfr. doc. de fls. 14 a 20 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
20) Em 11/03/2014 foi elaborada a informação n.º 546 pelo Departamento de Planeamento e Gestão Urbanística do R., na qual foi proposto o indeferimento do projeto de arquitetura apresentado pelo A. e que deu entrada sob o registo n.º 42503/2013, e da qual consta, além do mais, o seguinte:
(…) 11. Quanto ao ponto 11 da exposição apresentada há a referir que o PDM, no seu artigo 46.º n.º 2 b) é explícito quando diz que em zonas de núcleo o número de pisos máximo é 2. A construção apresenta-se atualmente com 3 pisos, em clara violação do disposto no referido artigo. Conforme atestam fotos aéreas em anexo verifica-se que após a compra da moradia por parte do agora requerente, que segundo a exposição agora apresentada ocorreu em 2003, o terreno sofreu várias intervenções ilegais, nomeadamente a construção de vários anexos e intervenção no logradouro anterior – precisamente o que poderá estar em causa.
(…)
13. Quanto ao expresso nos pontos 13 e 14 da exposição esclarece-se complementarmente que os anexos apresentados, com 113,70 m2 de área bruta de construção, violam o disposto no n.º 2 a) do artigo 33.º do Regulamento n.º 255/2012 uma vez que excedem 10% da área do lote (lote com 848 m2). Do mesmo modo, estando os anexos construídos à estrema, não poderia a parede de meação (entre terrenos) exceder 3,5m de altura, a partir da cota do terreno mais alto, conforme previsto no n.º 3 b) do artigo 33.º do Regulamento n.º 255/2012, quando se verifica que a mesma tem de altura 3,80m. O muro posterior tem uma altura de 4,80m, conforme representado nos desenhos apresentados, quando de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 35.º do Regulamento n.º 255/2012 não poderia exceder 1,80m de altura. Também pela sua altura e proporções, desenquadradas do existente no terreno em causa e terrenos adjacentes, o muro é suscetível de comprometer o conjunto arquitetónico, violando assim o disposto no artigo 121.º do RGEU
(cfr. doc. de fls. 9 a 13 do processo administrativo n.º 01/2013/1019, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
21) Em 20/03/2014 o Vereador com competências delegadas/subdelegadas, Dr. C., proferiu despacho de concordância com o teor da informação que antecede, indeferindo o projeto de arquitetura apresentado pelo A. sob o registo n.º 42503/2013, despacho que lhe foi notificado pelo ofício n.º 10324, de 24/03/2014 (cfr. docs. de fls. 8 e 9 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
22) Através de requerimento apresentado em 22/04/2012, o A. reclamou da decisão de indeferimento do projeto de arquitetura (cfr. doc. de fls. 4 a 6 do processo administrativo n.º 01/2013/1019, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
23) Em 08/05/2014, foi elaborada pelo Departamento de Planeamento e Gestão Urbanística do R. a informação n.º 980, na qual foi proposta a manutenção do indeferimento do pedido de aprovação do projeto de arquitetura constante do registo n.º 42503/2013, da mesma se extraindo o seguinte:
(…) 8. Relativamente ao expresso no ponto 9 da presente reclamação, em que se alega que os muros, alguns, terão de ser necessariamente mais elevados por uma questão de segurança, porquanto se tratam de muros de contenção de terras, há a dizer que em nenhuma peça do processo é evidenciado que haja muros de contenção de terras, antes pelo contrário, uma vez em que os terrenos anexos são representados de nível relativamente ao terreno do requerente.
9. Quanto ao exposto nos pontos 10 a 15 da presente reclamação reforça-se o já referido no ponto I-13 da informação n.º 546 de 11/3/2014, em que se indica os valores/dimensões que os anexos deverão cumprir, devendo para o efeito ser apresentado projeto reformulado, com as respetivas retificações dos anexos e muros, tendo como referência os valores indicados. (…)
(cfr. doc. de fls. 3 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
24) Com base na informação que antecede, em 09/05/2014 o Chefe da Divisão de Gestão Urbanística (DGU) do R. emitiu parecer no sentido da improcedência da reclamação e da manutenção do indeferimento do projeto de arquitetura em causa, “porquanto o enunciado nos pontos 1 a 8 respeita à relação entre particulares à qual a Câmara Municipal é alheia, sendo que as questões enunciadas nos pontos 9 a 15 mereceram o devido enquadramento técnico-regulamentar no âmbito das informações produzidas anteriormente, sendo aí identificadas as irregularidades a superar do ponto de vista técnico” (cfr. doc. de fls. 3 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
25) Em 15/05/2014 o Vereador com competências delegadas/subdelegadas, Dr. C., proferiu despacho de concordância com o teor do parecer do Chefe da DGU e da informação que antecedem, mantendo o indeferimento do projeto de arquitetura apresentado pelo A. sob o registo n.º 42503/2013, despacho que lhe foi notificado pelo ofício n.º 18241, de 16/05/2014 (cfr. docs. de fls. 2 e 3 do processo administrativo n.º 01/2013/1019).
26) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 22/09/2014 (cfr. doc. de fls. 1 do suporte físico do processo).

2 . MATÉRIA de DIREITO

No caso dos autos, tendo em consideração as alegações de recurso, nomeada e concretamente as conclusões, bem como a sentença recorrida, importa reavaliar esta, avaliando da bondade (ou não) da decisão do TAF de Coimbra.
Se quanto à decisão judicial relativa a determinados fundamentos da acção não se nos suscitam quaisquer dúvidas, o mesmo não acontece com a eventual aplicação à situação dos autos, no que concerne ao facto da moradia unifamiliar em questão ter 3 pisos e não apenas 1, da situação prevista n.º n.º3 do art.º 134.º do CPA/91, actual art.º 162.º, n.º 3 do CPA.
Assim, quanto aos pontos que merecem a nossa inteira concordância e consequente adesão, sem necessidade de grandes adicionais considerações, até porque o recorrente se limita a repetir o que já havia alegado em sede de petição inicial e alegações (art.º 91.º, n.º 4 do CPTA), além mesmo de ter já editado os mesmos argumentos na sua participação no procedimento, quer em sede de audiência prévia, quer reclamações, como se evidencia da factualidade provada e sequencial e cronologicamente descria supra, importa relembrar, nos seus pontos essenciais, de charneira, a sentença do TAF de Coimbra:
Assim, “…Extrai-se, com efeito, da factualidade provada que o processo de licenciamento da construção da moradia que hoje é propriedade do A., em terreno situado no lugar de (...), concelho de Coimbra, foi iniciado em 1998 pela sua anterior proprietária, E. (cfr. pontos 1 e 2 dos factos provados). Mais se sabe que o A. adquiriu a referida moradia, já construída na sua totalidade, por escritura pública de compra e venda celebrada apenas em 14/02/2003, numa altura em que já tinha sido emitido, em 16/12/2002, o respetivo Alvará de Licença de Utilização n.º 607/2002, em nome de E. (cfr. pontos 10 e 11 dos factos provados).
Sucede que, já depois da aludida aquisição da moradia pelo A., na sequência da apresentação, por este, em 05/08/2013, de um pedido de aprovação do projeto de arquitetura para efeitos de legalização das obras de construção dos anexos e da garagem que o A. levara a cabo na moradia, e que deu entrada sob o registo n.º 42503/2013, tal projeto veio a ser indeferido pelos despachos aqui impugnados, com fundamento na deteção, entre outras, das seguintes desconformidades/ilegalidades urbanísticas (cfr. pontos 17 e 18 dos factos provados):
 a moradia tem 3 pisos, em desacordo com o projeto aprovado (que previa dois pisos), não tendo sido apresentado projeto contemplando esta alteração, o que viola o disposto no art.º 46.º do PDM em vigor;
 uma vez que não foi apresentado projeto com todas as construções e pisos efetivamente existentes no terreno, não foi possível confirmar o cumprimento da capacidade construtiva prevista no PDM em vigor, nem o cumprimento do índice de construção previsto no art.º 94.º do PDM em revisão;
 não foi garantida a área de cedência ao domínio público prevista na licença de construção n.º 879/2000, não tendo sido previsto nenhum lugar de estacionamento público, em violação do disposto no art.º 37.º do PDM e no art.º 132.º do PDM em revisão;
 o lugar de estacionamento representado em planta, para solucionar o não cumprimento das condições de licenciamento inicial, não se pode considerar como lugar de estacionamento público, uma vez que se encontra em propriedade privada e na frente da entrada automóvel ao interior do terreno (acesso à garagem);
 os anexos apresentados, pelas suas dimensões (área e altura), violam o disposto no art.º 33.º do Regulamento n.º 255/2012 (RMEU);
 o muro posterior, pela sua altura, viola o disposto no art.º 35.º do Regulamento n.º 255/2012 (RMEU) e não se integra no local, podendo mesmo comprometer a paisagem onde se insere, violando o disposto no art.º 121.º do RGEU.
Aqui chegados, entende o A., em suma, que não pode ser responsabilizado, nem prejudicado, por quaisquer irregularidades na construção da moradia que tenham ocorrido antes da data da sua aquisição, as quais lhe são inoponíveis por ser, quanto às mesmas, terceiro de boa-fé, com isto pretendendo significar que os despachos em crise não deveriam ter indeferido a sua pretensão com base em ilegalidades que remontam a um momento em que o A. ainda não era o proprietário da moradia, não lhe podendo ser, por isso, tais desconformidades imputadas.
Mas não é assim.
Não se discute que o A. tenha adquirido a moradia, em 2003, no estado em que ela se encontra atualmente – com exceção dos anexos que foi construindo já depois da referida aquisição –, em particular no que se refere ao número de pisos existentes (três) e à não previsão de um lugar de estacionamento público. Nem se discute que pelo menos uma parte das irregularidades que fundamentaram o indeferimento do projeto de arquitetura por si apresentado teve a sua génese em momento anterior à aquisição da moradia, quando esta ainda era propriedade da sua anterior titular, E., ou seja, não tiveram tais irregularidades origem numa qualquer conduta do próprio A., pois que é certo que não era ele o proprietário durante a construção da moradia.
No entanto, tal circunstância não tem qualquer relevo no âmbito do exercício da tutela da legalidade urbanística que está a cargo do R.
Isto porque a transmissão da propriedade da moradia não tem a virtualidade de livrar o A. das ilegalidades que lhe estavam associadas, designadamente de natureza administrativa, nem tem a virtualidade de fazer com que, por essa razão, tal moradia seja considerada, a partir da sua aquisição pelo A., como um imóvel de irrepreensível legalidade. Não se podem, com efeito, confundir os dois planos em que a questão se coloca: de um lado, o plano civilista relacionado com a transmissão de propriedade, que aqui não está em causa, e, do outro, o plano administrativo onde se coloca a questão da conformidade do prédio com os ditames urbanísticos aplicáveis.
Se assim não fosse, isto é, se os dois planos pudessem ser confundidos e objeto do mesmo tratamento e, por essa via, se pudesse considerar que o adquirente de um prédio, no qual foram detetadas várias ilegalidades que o afetavam e que tinham génese em momento anterior à aquisição, maxime as de natureza administrativa/urbanística, via sanadas todas essas ilegalidades por mero efeito da transmissão da propriedade, ter-se-ia de concluir que o novo proprietário ficaria numa situação altamente privilegiada, o que não é aceitável, já que veria o seu prédio, em situação ilegal, ser imediatamente legalizado sem ter de arcar com os pesados encargos de projetos, taxas, cedências, infraestruturas e perdas de tempo que penalizam todos aqueles que constroem com observância das normas legais de natureza urbanística. Assim, temos que a aquisição da propriedade da moradia pelo A. não interfere com a vertente da sua legalidade administrativa, isto é, não “apaga” o facto de a mesma ter sido construída ilegalmente e de esta ilegalidade não ter sido corrigida (cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10/03/2016, proc. n.º 01307/15, publicado em www.dgsi.pt).
E, ademais, o facto de o A. ter adquirido a moradia no convencimento de que esta estava dentro da legalidade é matéria que, como bem se referiu na fundamentação dos atos impugnados, apenas diz respeito às suas relações com a alienante quanto às qualidades da coisa vendida, não sendo oponível à Administração para tornar legal uma construção que, desde a sua génese, viola as disposições dos instrumentos de planeamento urbanístico em vigor. Esta alegada boa-fé do A. não pode legitimar a expectativa ou a confiança, enquanto comprador, em caso de violação dos instrumentos urbanísticos em vigor (cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28/09/2017, proc. n.º 0288/17, publicado em www.dgsi.pt).
Importa ter presente que o interesse público prosseguido pela Administração na defesa da legalidade urbanística é alheio a considerações de natureza privatística relacionadas com a transmissão da propriedade dos bens, ou seja, para a Administração é indiferente que o atual proprietário da obra construída em situação ilegal não seja o mesmo proprietário que detinha a titularidade do bem quando tais irregularidades ocorreram, pois que tais circunstâncias não interferem, de modo algum – nem poderiam interferir –, na defesa da legalidade urbanística que está a seu cargo, nem impedem a Administração de lançar mão das medidas necessárias à reposição dessa legalidade.
Razão pela qual os despachos impugnados não padecem de qualquer ilegalidade por terem indeferido a pretensão do A. com base na verificação de ilícitos urbanísticos ocorridos antes da aquisição, por aquele, da moradia em causa. Estando assente que esta se encontrava ferida das apontadas ilegalidades, não restava ao R. outra alternativa que não fosse a que tomou, levando em consideração tais desconformidades na decisão proferida e impondo, em consequência, ao A. o ónus/dever de proceder às correções necessárias para poder ver deferida a sua pretensão.
A tese do A. no sentido da ilegalidade dos atos impugnados só poderia vingar se este demonstrasse que as normas e regulamentos urbanísticos em vigor não obrigavam a que a moradia tivesse as características impostas pelo R. (dois pisos, lugar de estacionamento público, etc.), demonstração essa que, porém, não foi feita.
Acresce que o facto de ter sido emitida a licença de utilização ainda antes de o A. ter comprado a moradia (e de a mesma ter sido exibida aquando da celebração da escritura pública) não altera a conclusão a que supra se chegou.
Com efeito, a emissão daquela licença também não tem a virtualidade de sanar as irregularidades detetadas na construção da moradia em apreço, nem confere ao A. um pretenso direito à “desconsideração” dessas irregularidades, apenas pelo facto de o prédio ter licença de utilização e de o R. ter acompanhado, como não poderia deixar de ser, o processo de licenciamento da construção do dito imóvel. E, por outro lado, o certo é que tal licença foi emitida com base nos documentos que instruíram o pedido para tanto apresentado pela anterior proprietária da moradia, nomeadamente o Livro de Obra e a declaração de responsabilidade do técnico responsável pela direção técnica da obra, na qual se podia ler que a obra “se encontra concluída desde 02.05.31, em conformidade com o projeto aprovado, com as condições de licenciamento e com o uso previsto no alvará de licença de construção” (cfr. pontos 9 e 10 dos factos provados – sublinhado nosso).
Não estava, por isso, o R. impedido de, mais tarde, tendo detetado um conjunto de ilegalidades urbanísticas no prédio para o qual conferira licença de utilização, retirar as devidas consequências dessa situação e exercer, em conformidade, as suas atribuições em matéria de defesa da legalidade urbanística.
De outra banda, não é inteiramente correta a afirmação do A. no sentido de que o R. não foi alheio ao processo de construção da moradia porque terá constatado, com a deslocação de técnicos ao local, a existência do prédio com os três pisos, bem como a inexistência do estacionamento público, sendo certo que, ainda assim, aprovou o novo projeto apresentado pela anterior proprietária e emitiu a licença de utilização. Esquece-se o A. de que, na sequência do embargo das obras de construção da moradia em apreço, em 2001, por estarem a ser executadas em desacordo com a licença municipal e com o alvará de construção, precisamente em resultado da alteração da implantação e da ampliação do número de pisos, a anterior proprietária apresentou um projeto de alterações ao projeto de arquitetura na sequência do qual veio a ser notificada para “apresentar aditamento que contemple a redução do alçado principal para uma leitura de 2 pisos e não 3, o que contraria o Plano Diretor Municipal”, solicitação a que aquela acedeu quando apresentou um novo aditamento ao projeto de arquitetura que se mostrava em conformidade com o solicitado na referida notificação, o que veio a motivar o seu deferimento por despacho de 30/04/2002, com o consequente levantamento do embargo (cfr. pontos 6 a 8 dos factos provados).
Nem tem cabimento, por sua vez, a alegação de que o R. deveria ter ordenado nova vistoria ao local nos termos do art.º 64.º, n.º 2, alínea b), do RJUE, pois que esta apenas se encontra prevista para as situações em que existam “indícios sérios, nomeadamente com base nos elementos constantes do processo ou do livro de obra, a concretizar no despacho que determina a vistoria, de que a obra se encontra em desconformidade com o respetivo projeto ou condições estabelecidas”, o que não sucedeu no caso dos autos, atenta a declaração de responsabilidade do técnico responsável pela direção técnica da obra que instruiu o pedido de emissão da licença de utilização.
Relativamente aos argumentos de que a emissão do alvará de licença de utilização configura, nos termos do art.º 140.º, n.º 1, alínea b), do CPA, um ato constitutivo de direitos e, portanto, um ato irrevogável, e de que a mesma licença de utilização também seria irrevogável, ainda que inválida por violar as normas do PDM de Coimbra, atento o decurso do prazo para a revogação de atos inválidos previsto no art.º 141.º do CPA, não podem tais argumentos sustentar a ilegalidade dos despachos impugnados. Isto porque, como sublinha o R. na contestação, estamos perante realidades distintas: não está aqui em causa a revogação da licença de utilização, válida ou inválida, que foi concedida para uma moradia com dois pisos, mas antes o indeferimento do pedido de aprovação de um projeto de arquitetura para efeitos de legalização de um conjunto de construções levadas a cabo numa moradia que se constatou ter sido, ela própria, construída em desacordo com a licença de construção aprovada e com as normas legais e regulamentares aplicáveis. Nem, note-se, o referido indeferimento do projeto de arquitetura determina, por si só, a revogação da licença de utilização, válida ou inválida, antes concedida”.
*
Assim, se a concordância com esta argumentação nos dispensa de aqui repetir essa argumentária, já tal não se verifica em relação à invocação do art.º 134.º, n.º 3 do CPA/91 por parte do recorrente, em todo o processo.
Nesta parte, a sentença afasta essa aplicação do art.º 134.º, n.º 3, do CPA, com base na seguinte fundamentação:
Nos termos do disposto no art.º 134.º, n.º2 do CPA “… o regime da nulidade dos atos administrativos “não prejudica a possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de atos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito”.
Se, de uma banda, não está aqui em causa a nulidade de atos administrativos (mormente da licença de utilização concedida para a moradia em apreço por violação de normas do PDM, cuja declaração de nulidade, aliás, nem sequer é peticionada), ao abrigo dos quais os particulares tenham desenvolvido certa atividade ou beneficiado de certas posições jurídicas – antes estando em causa, através dos atos impugnados, o indeferimento de um projeto de arquitetura para efeitos de legalização de certas obras em resultado da constatação do cometimento de ilegalidades urbanísticas e da necessidade de reposição da legalidade violada, em conformidade com os atos anteriormente proferidos –, o certo é que, de outra banda, nunca poderiam ser atribuídos aos atos impugnados, de qualquer modo, os efeitos jurídicos próprios dos atos válidos, nos termos do regime excecional consagrado no art.º 134.º, n.º 3, do CPA.
Esta norma apenas pode ser utilizada em casos com essa natureza excecional, como é o caso dos “agentes putativos”, e desde que tenha decorrido um longo período de tempo que justifique a atribuição de efeitos aos atos nulos, face à duração da situação de facto, as expectativas entretanto criadas e a adequação social dessas situações.
Ora, in casu, o tempo decorrido nunca seria de molde a permitir atribuir aos atos efeitos contra legem, já que a presente ação deu entrada em juízo no dia 22/09/2014 e os despachos impugnados foram proferidos em 20/03/2014 e em 15/05/2014.
No que respeita aos princípios da boa-fé e da proteção da confiança, bem como ao direito constitucional à propriedade privada, consagrados nos art.os 2.º, 62.º e 266.º, n.º 2, da CRP, não se vislumbra em que medida os atos impugnados violaram tais direitos e princípios. Por um lado, os despachos em crise, ao indeferirem o projeto de arquitetura apresentado pelo A., de nenhum modo puseram em causa a legalidade da transmissão da propriedade da moradia, nem, muito menos, a titularidade do direito do A. sobre ela, visto que o indeferimento se restringiu à vertente administrativa/urbanística da questão e decorreu unicamente das ilegalidades genéticas da sua construção. Por outro lado, e para além do que atrás ficou dito, sempre se dirá que não pode o A., fazendo apelo aos princípios da boa-fé e da proteção da confiança, querer obstar à operacionalização das consequências legais decorrentes da verificação das concretas ilegalidades de que enferma a moradia, tanto para mais quando tais princípios não possuem efeitos sanatórios ao ponto de permitirem a manutenção na ordem jurídica de uma situação ilegal que perdurava no tempo e que já deveria ter sido corrigida, em conformidade com o projeto inicialmente aprovado (cfr. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17/06/2016, proc. n.º 03050/12.0BEPRT, publicado em www.dgsi.pt).
Por seu turno, as considerações tecidas a respeito da intervenção da instituição bancária na escritura pública de compra e venda da moradia em nada relevam para efeitos de desresponsabilização do atual proprietário pelas ilegalidades urbanísticas detetadas”.
*
Com vista à apreciação/decisão desta questão, por facilidade e pela sua sapiência e completude, tenhamos em consideração o Ac. do STA, de 18/6/2020, in Proc. N.º 1701/10.0BEBRG, com interesse para o caso dos autos, que reza assim:
“… Extrai-se da regra geral definidora do regime da nulidade, inserta no aludido art. 134.º do CPA/91, que «[o] ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade» [n.º 1], e de que a mesma «é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal» [n.º 2], sendo que «[o] disposto nos números anteriores não prejudica a possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de atos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito» [n.º 3].
15. Disciplinava-se, por seu turno, no art. 04.º do mesmo Código, relativo ao princípio da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, que competia «aos órgãos administrativos prosseguir o interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos», prevendo-se no n.º 2 do artigo seguinte, respeitante ao princípio da proporcionalidade, que «[a]s decisões da Administração que colidam com direitos subjetivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afetar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objetivos a realizar».
16. Dispunha-se, ainda, no art. 06.º do CPA/91 que «[n]o exercício da sua atividade, a Administração Pública deve tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entrem em relação», estipulando-se, por sua vez, no art. 06.º-A, relativo ao princípio da boa fé, que «[n]o exercício da atividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa fé» [n.º 1] e que «[n]o cumprimento do disposto nos números anteriores, devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas, e, em especial: a) A confiança suscitada na contraparte pela atuação em causa; b) O objetivo a alcançar com a atuação empreendida» [n.º 2].
….
22. Estando em causa atos permissivos/autorizativos, visto os mesmos haverem permitido ou reconhecido a concretização de operação urbanística em situação tida por consolidada de facto, coloca-se, então, a questão de, de harmonia com os princípios gerais de direito [nomeadamente, os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, o princípio da boa-fé, ou, ainda, o princípio da proporcionalidade] e atento o decurso do tempo decorrido, determinar se relativamente a tal operação e situação sub specie deverá ou não ser reconhecida juridicamente in casu a necessidade de conservação de certos efeitos nos termos do n.º 3 do art. 134.º do CPA/91, temperando-se, assim, uma aplicação estrita do princípio da legalidade, da «absolutidade»/«radicalidade» e rigor que derivam do regime legal regra da nulidade quanto àquilo que, em termos de consequências daquela aplicação, se revelaria ser no caso excessivo.
23. É sabido que o regime jurídico aplicável aos atos administrativos nulos se mostra marcado pela «radicalidade» das respetivas consequências jurídicas, já que, em e por regra, o ato nulo não produz quaisquer efeitos [cfr. n.º 1 do art. 134.º do CPA/91].
24. Mostra-se, todavia, como igualmente reconhecido que ao abrigo de atos nulos podem vir a constituir-se e a consolidar-se situações de facto, importando, então, nessas e perante essas situações determinar o modo como devem tratar-se os efeitos materiais produzidos ao abrigo daqueles atos nulos e saber se se admitem, em matéria de gestão urbanística, outras vias que evitem a destruição dos efeitos materiais provocados por atos de nulos [cfr. art. 106.º do RJUE], na certeza de que, in casu, não se colocou, nem está em apreciação, a possibilidade de legalização do edificado.
25. Resulta ainda como consensual o entendimento de que a denominada «jurisdicização» das situações de facto constituídas à sombra de atos nulos, ou seja, a atribuição de certos efeitos jurídicos às operações urbanísticas decorrentes de atos nulos, não constitui um ato vinculado, porquanto, como decorre dos próprios termos da letra da lei, estamos em face tão-só de uma «possibilidade de» atribuição de certos efeitos jurídicos, cientes de que tal possibilidade «não influencia ou interfere com a questão/juízo de declarar ou não a nulidade dum ato administrativo», pois que «nas situações previstas no n.º 3 do art. 134.º do CPA não se está perante o afastamento ou sanação da ilegalidade geradora do desvalor da nulidade que afeta a validade do ato administrativo na sequência do qual se criou a situação de facto, mas sim numa atribuição de efeitos autónomos a essa situação de facto» [cfr., entre outros, os Acs. deste Supremo Tribunal de 28.06.2011 - Proc. n.º 0512/11, e de 09.07.2014 - Proc. n.º 01561/13, §§ XIX) a XXI), ambos consultáveis in: «www.dgsi.pt/jsta» - sítio a que se reportarão todas as demais citações de acórdãos deste Tribunal sem expressa menção em contrário].
26. E de que este mecanismo/instituto, mostrando-se legalmente previsto, a sua operatividade vem sendo admitida como possível também no âmbito do urbanismo pela jurisprudência deste Supremo Tribunal [vide, entre outros, os seus Acs. de 16.06.1998 - Proc. n.º 043415, de 16.01.2003 - Proc. n.º 01316/02, de 16.12.2003 Proc. n.º 0414/03, de 07.11.2006 - Proc. n.º 0175/06, de 09.12.2009 - Proc. n.º 0100/08, de 28.09.2017 - Proc. n.º 0288/17] e, bem assim, amplamente na doutrina produzida sobre a matéria [cfr., entre outros, Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, in: «Direito Administrativo Geral», Tomo III, pág. 174; Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e J. Pacheco Amorim, in: «Código de Procedimento Administrativo», 2.ª edição, atualizada, revista e aumentada, págs. 638 e 654-655; J. C. Vieira de Andrade, in: «Lições de Direito Administrativo», 2.ª edição, págs. 175 e 182-187 e em «A nulidade administrativa essa desconhecida» in: «Em homenagem ao Professor Doutor Diogo Freitas do Amaral», págs. 777-781; Fernanda Paula Oliveira e Pedro Gonçalves, em «A nulidade dos atos administrativos de gestão urbanística» in: Revista do CEDOUA, Ano II, n.º 1/99, págs. 17 e segs. e em «O regime da nulidade dos atos administrativos de gestão urbanística que investem o particular no poder de realizar operações urbanísticas» in: Revista do CEDOUA, Ano II, n.º 2/99, págs. 16-17 e 24-28; Fernanda Paula Oliveira, in: «Nulidades urbanísticas …» (2011), págs. 128-130; Dulce Lopes, em «Medidas de tutela da legalidade urbanística» in: Revista do CEDOUA, Ano VII, 2/2004, n.º 14, págs. 88-89].
27. Tal como afirmou este Supremo Tribunal no citado acórdão de 16.01.2003 [Proc. n.º 01316/02], e cuja doutrina veio a ser reiterada no acórdão de 07.11.2006 [Proc. n.º 0175/06], a possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de atos nulos prevista no n.º 3 do art. 134.º do CPA/91 «tem em vista os chamados efeitos putativos, tradicionalmente admitidos relativamente aos funcionários ou agentes putativos, investidos por ato nulo» e que a mesma «deve ser ponderada com extrema cautela, sendo imperioso distinguir entre “sanação de ato nulo” (legalmente impossível) e “admissão de certos efeitos decorrentes da manutenção prolongada de uma situação de facto”, à luz do interesse público da estabilização das relações sociais», importando reter que «o n.º 3 do art. 134.º do CPA não consagra a sanação ou supressão da ilegalidade do ato nulo, o qual não é, segundo a jurisprudência pacífica e reiterada deste Supremo Tribunal Administrativo, passível de sanação jurídica» e de que os «denominados efeitos putativos, para além de deverem decorrer, em princípio, da necessidade de estabilidade das relações jurídico-sociais, dependem, em grande parte, de períodos dilatados de tempo em que tais situações se verificam, não podendo, por razões de coerência do próprio instituto, beneficiar aqueles que direta, ou mesmo dolosamente, deram causa à nulidade do ato à sombra do qual os referidos efeitos são reclamados, devendo a sua admissão estar sempre ligada à ideia de persecução do interesse público (cfr. Ac. STA de 16.06.98 - Rec. n.º 43.415)».
28. Este mecanismo/instituto de salvaguarda de efeitos putativos decorrentes de ato permissivo/autorizativo que veio a ser declarado nulo, por intermédio da «jurisdicização» da situação de facto realizada ou operada através da emissão de decisão judicial, constitui como que uma ressalva àquilo que seriam as decorrências da reposição da legalidade urbanística quanto a edificações realizadas em desconformidade, ou em transgressão, às normas vigentes de planeamento nesse domínio e quando as mesmas não se mostrem suscetíveis de legalização.
29. Ora a atribuição ou reconhecimento, de harmonia com os princípios gerais de direito, de tais efeitos jurídicos ao ato nulo encontra-se ligada ou conexionada com a existência de um período relativamente alargado de tempo, surgindo este como um elemento relevante para o juízo de avaliação e de ponderação na estabilização das situações ou das relações sociais em questão à luz da confiança e da boa-fé.
30. Nesse contexto este Supremo Tribunal já recusou o reconhecimento ou a atribuição deste tipo de efeitos, por um lado, em situações em que mediaram entre a emissão do ato permissivo/autorizativo nulo e a sua impugnação judicial lapsos de tempo inferiores, por exemplo, a 04 anos [v.g., Acs. de 16.06.1998 - Proc. n.º 043415, de 16.01.2003 - Proc. n.º 01316/02, de 07.11.2006 - Proc. n.º 0175/06, e de 28.09.2017 - Proc. n.º 0288/17], ou a 05 anos [v.g., Ac. de 16.12.2003 - Proc. n.º 0414/03, e de 09.12.2009 - Proc. n.º 0100/08], e, por outro lado, nas situações em que os beneficiários de tal reconhecimento dos efeitos foram os responsáveis ou contribuíram direta, ou mesmo dolosamente, para as ilegalidades geradoras da nulidade do ato à sombra do qual os referidos efeitos se mostravam reclamados.
31. Frise-se, todavia, que o apelo feito no quadro principiológico do n.º 3 do art. 134.º do CPA/91 à boa-fé, à proteção da confiança e à segurança jurídica não obsta, como referido supra, ao operar das consequências legais em sede do desvalor decorrente da verificação de concreta ilegalidade de que enferme um ato administrativo objeto de impugnação, não possuindo o mesmo efeitos convalidatórios ou sanatórios da ilegalidade já que esta permanece e perdura, visto que nas situações previstas no referido dispositivo estamos tão-só perante reconhecimento/atribuição de efeitos autónomos a situação de facto e não de afastamento ou sanação de ilegalidade [cfr. o citado Ac. deste STA de 09.07.2014 - Proc. n.º 01561/13, §§ XIX a XXI) e XLIV) a LVI)].
….
34. Como supra se avançou não só o decurso do tempo registado entre o momento da emissão dos atos nulos alvo de impugnação e aquele que os seus efeitos se esgotam se mostra como adequado e suficiente para a manutenção/consolidação da situação de facto existente, como, também, tal manutenção/consolidação da situação se apresenta como conforme, ou como compatível, com os ditames dos princípios gerais do direito a atender.
35. Com efeito, vistas e consideradas as particularidades do caso reputa-se como suficiente e adequado o tempo decorrido para a consolidação da situação de facto, porquanto extrai-se dos autos, por um lado, que no prédio rústico correspondente ao artigo matricial 904 os contrainteressados haviam edificado as moradias unifamiliares em lotes, sendo que na sequência de pedidos de licenciamento formulados em 1990 as mesmas moradias vieram a ser licenciadas, em 1991, por atos cuja validade não se mostra questionada nos autos, nem o foi ulteriormente, operando-se no plano dos factos e desde então a divisão do prédio em lotes com a edificação e licenciamento das moradias, moradias essas que possuem licença de utilização desde maio de 2000, titulada por alvarás de junho do mesmo ano.
36. E temos, por outro lado, que no mesmo ano de 2000, o contrainteressado A……….. veio a apresentar um pedido de informação prévia quanto ao licenciamento da operação de loteamento o qual, após parecer, foi deferido pelo despacho impugnado datado de 03.07.2000, sendo que, em setembro 2004, o mesmo contrainteressado deu início ao pedido de legalização da operação de loteamento que, no plano dos factos e como vimos, estava já constituída, pedido esse que, após recolha de pareceres, acabou por vir a ser aprovado pelo despacho impugnado datado de 11.11.2004, tendo sido emitido o respetivo alvará em janeiro de 2005.
37. Ora tendo a presente ação administrativa sido instaurada em 01.10.2010, resulta apurado, em termos daquilo que foi o tempo decorrido até tal instauração, cerca de 20 anos desde aquilo que foi o momento da construção das moradias e divisão do terreno em lotes no plano dos factos, de quase 10 anos após o ato impugnado que havia aprovado o pedido de informação prévia e de quase 06 anos após a emissão do ato que aprovou o pedido de licenciamento da operação de loteamento.
38. Perante o contexto circunstancial apurado reputa-se, assim, como adequado e suficiente o «decurso de tempo» havido para efeitos da manutenção/consolidação no plano dos factos da situação sub specie à luz do que se mostra exigido no n.º 3 do art. 134.º do CPA/91, juízo esse que, como veremos de seguida, resulta ainda compatível ou mostra-se consonante com os princípios gerais de direito e seus ditames.
39. Na verdade, exigindo-se como requisito da «jurisdicização» que os particulares beneficiários estejam de boa-fé [cfr. arts. 266.º, n.º 2, da CRP, 06.º-A e 134.º do CPA/91], para efeitos de tornar ou de justificar a consolidação da situação como uma medida justa, importa, nesse âmbito, aferir se aos particulares assistiam ou assistem razões sérias para acreditarem na validade dos atos ou condutas anteriores da Administração aos quais tenham ajustado a sua atuação e/ou nela confiado.
40. Importa ter presente que o princípio da boa-fé opera com relação aos atos jurídicos bem como aos direitos que se exercitam e às obrigações que se cumprem, passando, fundamentalmente, pela emissão de um juízo de valor aplicado a uma conduta quando confrontada com um determinado comportamento anterior.
41. À luz daquilo que constitui o objeto de dissídio importa que a nossa análise se circunscreva à vertente do subprincípio da tutela da confiança, pressupondo estas várias circunstâncias para a sua verificação.
42. Assim, serão cinco os pressupostos jurídicos para o preenchimento da tutela de confiança. A saber: a) a atuação dum sujeito de direito que crie a confiança; b) a situação de confiança mostrar-se justificada por elementos objetivos idóneos a produzir uma crença plausível; c) a existência dum investimento de confiança; d) o nexo de causalidade/imputação entre a atuação geradora de confiança e a situação de confiança e entre esta e o investimento de confiança; e) a frustração da confiança por parte do sujeito jurídico que a criou [cfr. Ac. do STA de 09.07.2014 - Proc. n.º 01561/13, § XXVIII, cuja doutrina e fundamentação se seguirá de perto].
43. Note-se que no quadro duma situação de tutela de confiança revela-se como necessário estarmos em face duma confiança «legítima», o que passa, em especial, pela sua adequação ao Direito, dado não poder invocar-se a violação do referido princípio quando o mesmo radique num ato anterior claramente ilegal, sendo tal ilegalidade percetível e não contestada por aquele que pretenda invocar em seu favor o referido princípio [cfr., entre outros, os Ac. deste Supremo de 18.06.2003 - Proc. n.º 01188/02, de 21.06.2007 - Proc. n.º 0126/07, e de 09.07.2014 - Proc. n.º 01561/13].
44. Temos, por outro lado, que para que se possa, válida e relevantemente, invocar tal princípio é necessário que o interessado não o pretenda alicerçar apenas na sua mera convicção psicológica ou subjetiva antes se impondo a enunciação de sinais externos produzidos pela Administração suficientemente concludentes para um destinatário normal e onde se possa razoavelmente ancorar a invocada confiança.
45. Ao referido acresce ainda a necessidade de o particular ter razões sérias para acreditar na validade dos atos ou condutas anteriores da Administração aos quais tenha ajustado a sua atuação, sendo que dúvidas não existem de que a jurisprudência deste Supremo tem admitido inequivocamente a aplicação quer do princípio da boa-fé quer do princípio da proteção da confiança enquanto fonte de ilegalidade e de responsabilidade da Administração [cfr., entre outros e sem preocupações exaustivas, os Acs. deste Supremo de 26.10.1994 - Proc. n.º 017626, de 28.11.2000 - Proc. n.º 042055, de 16.10.2002 - Proc. n.º 048379, de 13.11.2002 - Proc. n.º 044846, de 30.04.2003 (Pleno) - Proc. n.º 047275, de 06.05.2003 - Proc. n.º 46188, de 18.06.2003 - Proc. n.º 01188/02, de 03.11.2005 - Proc. n.º 0803/05, de 05.12.2007 - Proc. n.º 0653/07, de 11.09.2008 - Proc. n.º 0112/07, de 09.07.2009 - Proc. n.º 0203/09, de 30.09.2009 - Proc. n.º 0662/09, de 31.10.2012 - Proc. n.º 0553/11, de 09.07.2014 - Proc. n.º 01561/13].
46. Mas importa atentar, para além disso, que a exigência da proteção da confiança é também uma decorrência do princípio da segurança jurídica, imanente ao Estado de Direito, já que o princípio do Estado de Direito Democrático garante seguramente um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas e, consequentemente, a confiança dos cidadãos e da comunidade na tutela jurídica.
47. Não podemos deixar de ter sempre como presente que o ser humano para além de liberdade carece de segurança para poder conduzir, planificar, estruturar e conformar de forma autónoma e responsável a sua vida e que, nessa medida, a vida num Estado de Direito Democrático terá de estar ancorada necessariamente nos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança.
48. O princípio da segurança jurídica, enquanto implicado no princípio do Estado de Direito Democrático, comporta duas ideias basilares. Uma, a de estabilidade, no sentido de que as decisões dos entes públicos «não devem poder ser arbitrariamente modificadas, sendo apenas razoável a alteração das mesmas quando ocorram pressupostos materiais particularmente relevantes». Outra ideia é a da previsibilidade que, no essencial se «reconduz à exigência de certeza e calculabilidade, por parte dos cidadãos, em relação aos efeitos jurídicos dos atos».
49. Daí que a realização e efetivação do princípio do Estado de Direito, no nosso quadro constitucional, impõe que seja assegurado um certo grau de calculabilidade e previsibilidade dos cidadãos sobre as suas situações jurídicas, ou seja, que se mostre garantida a confiança na atuação dos entes públicos e de podem confiar que as decisões sobre os seus direitos ou relações/posições jurídicas envolvem ou implicam os efeitos previstos nas normas que os regulam e disciplinam.
50. Analisada a situação vertente [cfr., nomeadamente, os n.ºs 9.1) a 9.25) da factualidade apurada] mostra-se como devendo ser tutelada a boa-fé e a confiança revelada pelos contrainteressados, aqui recorrentes, já que a edilidade R. ao licenciar a construção e a utilização das suas habitações, no quadro circunstancial e com a fundamentação/motivação neles inserta, e ao aprovar, posteriormente, o pedido de informação prévia e o ato de licenciamento do loteamento criou nos mesmos a confiança, alicerçada em elementos objetivos idóneos e no tempo decorrido, idónea a produzir uma crença plausível da legalidade do edificado e do loteamento, sendo que entre a atuação da referida edilidade e a situação/investimento de confiança gerada existe uma clara ligação causal.
51. E nesta sede importa atentar, ainda, que o elemento/fator que se vem a revelar como determinante para a nulidade dos atos impugnados não pode considerar-se como imputável aos contrainteressados já que à data em que o prédio foi dividido, no plano dos factos, em lotes, ou seja antes do licenciamento aprovado em 1991, a concreta norma do PDM do Município de Felgueiras que impunha uma área mínima para cada lote a constituir [de 500 m2] não estava sequer em vigor.
52. Note-se, por seu turno, que quanto às moradias construídas nos lotes a sua edificação resultou autorizada pela edilidade R. [quer em termos da sua construção quer da sua utilização] sem que os atos que a tal procederam tivessem visto sequer a sua legalidade posta em causa, mostrando-se no contexto estarem os contrainteressados de boa-fé, reconhecida, aliás, pela mesma edilidade em vários atos proferidos ao longo do tempo [cfr. n.ºs 9.4) a 9.25) da matéria de facto apurada], e, assim, credores de expectativas e de confiança gerada pelos mesmos.
53. Temos, por outro lado, que a «jurisdicização» da concreta situação de facto mostra-se como igualmente conforme com o princípio da proporcionalidade [arts. 266.º, n.º 2, da CRP, e 05.º do CPA/91].
54. A ideia de proporção ou proibição do excesso - que, em Estado de Direito, vincula as ações de todos os poderes públicos - reporta-se ou refere-se fundamentalmente à necessidade de uma relação equilibrada entre meios e fins: as ações não devem, para realizar os seus fins, empregar meios que se cifrem, pelo seu peso, em encargos excessivos e, como tal, não equilibrados para as pessoas a quem se destinem.
55. Como vem sendo uniformemente afirmado o princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: i) princípio da adequação [ou seja, as medidas ou os atos restritivos devem revelar-se como um meio para a prossecução dos fins visados, e com salvaguarda de outros direitos ou bens também constitucionalmente protegidos]; ii) princípio da exigibilidade [que reclama que tais atos/medidas têm de se mostrar exigidos para alcançar os fins prosseguidos ou tidos em vista, não dispondo a Administração de outros meios menos restritivos ou lesivos para alcançar o mesmo desiderato]; e iii) princípio da justa medida ou proporcionalidade em sentido estrito [que determina que não poderão adotar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos].
56. Nos casos de nulidade dos atos urbanísticos e na possibilidade de «jurisdicização», o princípio tem essencialmente uma função permissiva e de controlo.
57. Ora como a declaração de nulidade de um ato tem como consequência a destruição dos seus efeitos de facto, a proporcionalidade resulta convocada para controlar se essa consequência se mostra adequada, necessária e equilibrada, a ponto de se se concluir que a resposta a tal questão é negativa isso importar, então, o reconhecimento ou atribuição à situação de certos efeitos jurídicos nos termos do n.º 3 do art. 134.º do CPA/91.
58. Submetida a situação vertente ao teste da proporcionalidade e da sua conformidade com os ditames emanados pelo princípio temos que a resposta se apresenta como negativa já que as consequências que derivariam do mero operar da declaração de nulidade e da destruição dos efeitos de facto se revelariam como atentatórias do princípio e seus comandos.
59. De facto, apenas a manutenção ou a estabilização da situação de facto duradoura se mostra constituir, no contexto e atento o tempo decorrido, como o meio de reação mais adequado e benigno, ou menos oneroso, para os sujeitos em presença e os interesses conflituantes envolvidos e a prosseguir ou realizar, assim como se revela, in casu, como o meio menos excessivo, pois, os custos decorrentes ou que envolvem a não «jurisdicização» da concreta situação de facto seriam superiores aos seus benefícios, tanto mais que a reposição no plano dos factos com a unificação dos lotes implicaria ou envolveria a demolição total das moradias edificadas no prédio, ou pelo menos a demolição em termos parciais.
60. E o Tribunal neste juízo não poderá ignorar o facto de que não só as moradias se encontram licenciadas, quer em termos da sua construção como da sua utilização, como as mesmas se encontram habitadas pelos contrainteressados desde, pelo menos, o ano de 1990.
61. A tudo isto importa acrescer ainda constatação de que a divergência da dimensão de cada um dos lotes em relação aos imperativos que vieram a ser estabelecidos no PDM se mostra reconduzida para cada um dos lotes, respetivamente, a diferenças de 52 m2, de 94 m2 e de 65 m2, o que corresponderá a um desvio que oscila entre um mínimo de 10,4% e um máximo de 18,8%, cientes de que, como aludido supra, a imperatividade quanto aos limites da dimensão dos lotes apenas resultou operativa, frise-se, em momento posterior ao da constituição da situação de facto.
62. Por último, temos que, de igual modo, à luz do princípio da prossecução do interesse público [arts. 266.º, n.º 1, da CRP, e 04.º do CPA/91] e daquilo que são os seus ditames se extrai a necessidade de in casu proceder à salvaguarda ou ao reconhecimento daquilo que são os efeitos putativos dos atos nulos impugnados.
63. É certo que o interesse público constitui o motivo condutor ou norteador da Administração Pública na sua atividade, e que a definição do que o mesmo seja ou corporize envolve conteúdo variável, já que a sua concretização está dependente da evolução dos tempos ou do permanente devir, e comporta quer uma perspetiva mais ampla [entendido como o interesse coletivo, o interesse geral duma determinada comunidade, o bem comum], quer uma perspetiva mais restrita [correspondendo ao núcleo das necessidades a que a iniciativa privada não pode ser chamada a prosseguir ou responder e que se revelam como vitais para a comunidade na sua totalidade e para cada um dos seus membros], estando vedada àquela, sob pena de ilegalidade e da sujeição dos prevaricadores a outras sanções, a possibilidade de prossecução de interesses particulares ou privados.
64. Este princípio implica a exigência de um dever de boa administração, visto na prossecução do interesse público a Administração Pública dever adotar, em relação a cada caso concreto, as melhores soluções possíveis, do ponto de vista administrativo [técnico e financeiro].
65. Daí que relevando para o juízo a realizar nesta sede a boa gestão financeira dos recursos públicos impõe-se equacionar que observando o edificado em causa os requisitos de habitabilidade, de estética, de segurança e de higiene a sua conservação constitui uma exigência de interesse público, tanto mais que a solução alternativa, decorrente da declaração de nulidade e das consequências dela advenientes em termos de reposição da legalidade urbanística através da demolição, envolver a desconformidade com as regras de boa gestão financeira dos recursos públicos dadas muito possíveis ou prováveis consequências que poderão advir para o erário público ante a necessidade da entidade R. ter que suportar os custos com as demolições das moradias e com as indemnizações dos contrainteressados em decorrência da responsabilidade pela emissão dos atos ilegais.
….
68. À luz do quadro circunstancial concretamente apurado no caso sub specie entendem-se, assim, como verificados os requisitos previstos no n.º 3 do art. 134.º do CPA/91, impondo-se fazer aplicação do disposto no referido preceito reconhecendo e atribuindo os efeitos jurídicos aos atos nulos em crise”.
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Munidos desta eloquente e extensa panóplia de considerações legais, doutrinais e jurisprudenciais - mas com pertinência para a melhor análise/decisão destes autos -, confrontemos a situação concreta dos autos com os ditames/princípios/requisitos supra enunciados para verificarmos do seu cumprimento/adequação e decisão em conformidade.
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Assim, temos que a construção de um 3.º piso na moradia unifamiliar em causa – quando era apenas possível a construção de 2 pisos – terá ocorrido antes de 14/2/2003 – data da celebração da escritura pública de compra e venda (e mútuo com hipoteca) aos anteriores proprietários (ponto 11 da factualidade provada) –, em 24/1/2012, foi elaborado Auto de Notícia dando conta desta e outras ilegalidades (em virtude de denúncias de vizinhos), em 15/5/2014, foi proferido o acto final pelo Vereador com competências subsdelegadas, indeferindo o possível licenciamento/legalização das obras realizadas sem licença municipal (ponto 25 da factualidade provada) e, em 22/9/2014, deu entrada a petição inicial desta acção no TAF de Coimbra - (ponto 26 da factualidade provada).
Perante estas datas, entendemos que o período de tempo a considerar tem como termo inicial a data de 14/2/2003, (na pior das hipóteses, na medida em que não resulta demonstrado nos autos quando ocorreu efectivamente a construção de um 3 piso), ainda que também possa perspectivar-se a data de 30/9/2002 – data da solicitação da Licença de Utilização, com entrega do Livro de Obra e declaração de responsabilidade do técnico responsável pela direcção técnica da obra e ainda que, em 10/12/2002, foi emitido ao Alvará de Licença de Utilização n.º 607/2002 - (pontos 9 e 10 da factualidade provada).
Quanto ao termo final dessa contagem, em similitude com o aresto do STA, supra transcrito (de 18/6/2020), entendemos fixá-lo em 22/9/2014 – data da entrada da petição inicial desta acção no TAF de Coimbra - (ponto 26 da factualidade provada).
Assim, temos um período de 11 anos, 2 meses e 8 dias, ou seja, cerca de 11 anos, o que, no nosso entender, à luz da jurisprudência comumente aceite e acima citada, não deixará de poder ser considerado um período suficientemente dilatado de tempo em que a situação de ilegalidade se verifica e que constituirá um dos pressupostos de concessão de efeitos jurídicos nos termos do n.º 3 do art.º 134.º do CPA.
Igualmente, por razões de coerência do próprio instituto, não podendo beneficiar aqueles que direta, ou mesmo dolosamente, deram causa à nulidade do acto à sombra do qual os referidos efeitos são reclamados, devendo a sua admissão estar sempre ligada à ideia de persecução do interesse público, temos que, no caso concreto dos autos, os actuais titulares da moradia em causa não foram os autores/responsáveis da obra ilegal – construção de mais um piso – pois que, como foi fixado, sem controvérsia nos autos, estes, na data da escritura púbica de compra e venda desconheciam a ilegalidade do 3.º psio, antes, perante a apresentação do Alvará de Licença de Utilização, tudo lhes indiciava que a construção, tal como se objectivava à vista, era conforme ao licenciamento deferido pela edilidade conimbricense, o que, nessa principiologia, implica que são terceiros de boa fé, não tendo, a qualquer título – mesmo negligentemente – dado causa à nulidade – construção de um 3.º piso, em violação do PDM, que apenas permitia, para aquela área – zona de núcleo – art.º 46-2.b) do PDM – 2 pisos.
Estando em causa a violação do PDM ---- sendo assim consequente uma nulidade material da construção, ou mesmo a nulidade do Alvará de Licença de Utilização, na medida em que este teve como base da sua emissão pressupostos falsos --- a obra não se encontrava executada de acordo com o licenciamento, após embargo e apresentação de legalização Cfr. Pontos 6, 7 e 8 dos factos provados. – onde, como se disse – apenas se possibilita a construção de 2 pisos – ainda que esta questão não tenha sido directamente abordada nas diversas informações dos serviços competentes da CM de Coimbra – tal construção, não se compagina como licenciável, antes assim se podendo perspectivar, a final, como ultima ratio, a sua demolição parcial.
Importa, porém, aqui salientar que, dos elementos constantes dos autos, nomeadamente da não substanciação do alegado pelo recorrente neste recurso, quanto à conclusão 19.ª (aliado ao facto do MUNICÍPIO (...) não ter contra alegado), não poderemos concluir pela possibilidade de legalização da construção, aplicando o art.º 94, n.º1, al b) do Regulamento do PDM de Coimbra, agora em vigor – desde 2017 – pois que não dispomos de elementos que possibilitem o preenchimento das condições aí previstas para a Área residencial R2 Ou seja, i) Índice de edificabilidade de 0,90 aplicado à faixa de terreno com a profundidade de 25 m, confinante com via pública existente até ao máximo de 1000 m2, e de 0,45 à área restante de terreno; ii) Número de pisos de 3; e iii) índice de impermeabilização do solo de 0,60., além de que, a perspectivar-se a sua legalização --- possibilidade de construções naquela área residencial – R2 – de 3 pisos --- a CM de Coimbra, através dos seus serviços de urbanismo, não deixaria de trazer aos autos essa possibilidade, a qual a existir, impossibilita a aplicação ao caso do previsto no art.º 134.º, n.º 3 do CPA/91.
Continuando…
Acresce ainda que os particulares beneficiários, actuais proprietários da moradia, estão de boa-fé - cfr. arts. 266.º, n.º 2, da CRP, 6.º-A e 134.º do CPA/91 -, para efeitos de tornar ou de justificar a consolidação da situação como uma medida justa, tudo indiciando que tinham razões sérias para acreditarem na validade dos atos ou condutas anteriores da Administração aos quais tenham ajustado a sua atuação e/ou nela confiado, adquirindo a moradia nas condições em que o fizeram.
Beneficiam ainda de todos os demais pressupostos acima elencados referentes à tutela da confiança A saber, a) a actuação dum sujeito de direito que crie a confiança; b) a situação de confiança mostrar-se justificada por elementos objetivos idóneos a produzir uma crença plausível; c) a existência dum investimento de confiança; d) o nexo de causalidade/imputação entre a atuação geradora de confiança e a situação de confiança e entre esta e o investimento de confiança; e) a frustração da confiança por parte do sujeito jurídico que a criou e da existência da boa fé.
Mais, a «jurisdicização» da concreta situação de facto mostra-se como igualmente conforme com o princípio da proporcionalidade, ou seja, a ideia de proporção ou proibição do excesso reporta-se ou refere-se fundamentalmente à necessidade de uma relação equilibrada entre meios e fins: as ações não devem, para realizar os seus fins, empregar meios que se cifrem, pelo seu peso, em encargos excessivos e, como tal, não equilibrados para as pessoas a quem se destinem, sendo que, como refere o Acórdão do STA acima utilizado na nossa análisecom toda data venia - como vem sendo uniformemente afirmado o princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: i) princípio da adequação, ii) princípio da exigibilidade e iii) princípio da justa medida ou proporcionalidade em sentido estrito.
Ora, também no caso dos autos, como a declaração de nulidade de um ato tem como consequência a destruição dos seus efeitos de facto, a proporcionalidade resulta convocada para controlar se essa consequência se mostra adequada, necessária e equilibrada, a ponto de se se concluir que a resposta a tal questão é negativa isso importar, então, o reconhecimento ou atribuição à situação de certos efeitos jurídicos nos termos do n.º 3 do art.º 134.º do CPA.
No caso concreto dos autos, como a declaração de nulidade de um acto tem como consequência a destruição dos seus efeitos de facto, perante os pressupostos da pertinente proporcionalidade e da sua conformidade com os ditames emanados pelo princípio, temos que a resposta se apresenta como adequada, uma vez que as consequências que derivariam do mero operar da declaração de nulidade e da destruição dos efeitos de facto – demolição do 3.º piso - se revelariam como atentatórias do princípio e seus comandos.
Assim, apenas a manutenção ou a estabilização da situação de facto duradoura se mostra constituir, no contexto e atento o tempo decorrido, como o meio de reação mais adequado e benigno, ou menos oneroso, para os sujeitos em presença e os interesses conflituantes envolvidos e a prosseguir ou realizar, assim como se revela, in casu, como o meio menos excessivo, pois, os custos decorrentes ou que envolvem a não «jurisdicização» da concreta situação de facto seriam superiores aos seus benefícios, tanto mais que a reposição no plano dos factos com a demolição de um 3.º piso, e, no caso dos autos --- como se evidencia das fotos juntas aos autos Cfr. fotos de fls. 94 a 97 do processo físico.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

, bem como as fotos actuais, retiradas do Google (as 4 finais, em Nota de Rodapé) --- seria descaracterizar totalmente a moradia, num contexto envolvente similar e com um terreno com grande declive.
Igualmente – seguindo, no possível, o alinhamento efectivado no aresto de 18/6/2020 do STA - este TCA neste juízo não poderá ignorar o facto de que não só a moradia se encontra licenciada, quer em termos da sua construção (embora executada em desacordo com o licenciamento final), como da sua utilização, como a mesma se encontra habitada pelos AA./recorrentes desde, pelo menos, o ano de 2003.
Quanto a terceiros eventualmente prejudicados com a manutenção da situação de facto – moradia com os 3 pisos – não resulta dos autos que existam, sendo certo que as queixas dos vizinhos e que originaram a “descoberta” da moradia com 3 pisos que não os 2 licenciados e permitidos pelo PDM, apenas fizeram a denúncia em virtude dos anexos em construção e do muro questionado, que não o número de pisos.
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Deste modo e concluindo – quanto ao facto da moradia em causa ter 3 pisos em vez dos dois licenciados – entendemos que importa, em provimento da acção, atribuir à situação efeitos jurídicos nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 134.º do CPA/91, ou seja, a manutenção do edificado.
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Quanto aos anexos, porque a decisão supra tem implicação na apreciação/legalização possível desses anexos igualmente questionados nestes autos, temos que têm os interessados, o A./Recorrente e Recorrido MUNICÍPIO (...), ter em consideração estes novos pressupostos, sendo que, até lá, neste momento, terá de improceder a acção, como determinado na sentença recorrida, mantendo-se, nesta parte, o acto impugnado.
Igualmente, quanto ao muro questionado, valendo, agora nesta sede a argumentação propendida pela sentença recorrida que refere que :
“ … no que toca ao muro e ao seu enquadramento enquanto obra de escassa relevância urbanística, a alegação do A. também não pode proceder.
Com efeito, resulta da factualidade provada que “o muro posterior tem uma altura de 4,80m, (…) quando de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 35.º do Regulamento n.º 255/2012 não poderia exceder 1,80m de altura. Também pela sua altura e proporções, desenquadradas do existente no terreno em causa e terrenos adjacentes, o muro é suscetível de comprometer o conjunto arquitetónico, violando assim o disposto no artigo 121.º do RGEU” (cfr. ponto 20 dos factos provados). E resultou não provado que o muro em causa tenha efetivamente uma função de contenção de terras, já que nada foi alegado (nem demonstrado) pelo A. que permitisse concluir nesse sentido.
Ora, nos termos do art.º 6.º-A, n.º 1, alínea b), do RJUE, é obra de escassa relevância urbanística “a edificação de muros de vedação até 1,8 m de altura que não confinem com a via pública e de muros de suporte de terras até uma altura de 2 m ou que não alterem significativamente a topografia dos terrenos existentes”. Tratando-se, in casu, de um muro com 4,80 m de altura, em relação ao qual não se provou que tivesse em vista o suporte de terras, facilmente se conclui que não é possível enquadrar o muro em causa, com base no que vem alegado pelo A., no conceito de obra de escassa relevância urbanística para que o mesmo fosse considerado isento de controlo prévio. Não obstante tudo quanto acima ficou exposto, importa referir que sempre o indeferimento do projeto de arquitetura apresentado pelo A. seria de manter, porquanto, como se viu, os despachos impugnados tiveram por base a deteção de outras ilegalidades urbanísticas para além daquelas especificamente atacadas pelo A. na presente ação – mormente a violação do disposto no art.º 33.º do Regulamento n.º 255/2012 (RMEU), atentas as dimensões (área e altura) dos anexos apresentados, bem como a violação do disposto no art.º 121.º do RGEU, pelo facto de o muro posterior, pela sua altura, não se integrar no local, podendo mesmo comprometer a paisagem onde se insere.
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Nesta conformidade, pelas razões expostas, o recurso merece parcial provimento e bem assim a acção administrativa especial instaurada no TAF de Coimbra, com todas as consequências legais, designadamente a nível de custas.

DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em:
- conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional; e, em consequência:
- revogar parcialmente a decisão recorrida; e assim,
- conceder parcial provimento à ação administrativa especial mercê da atribuição à situação de efeitos jurídicos nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 134.º do CPA/91.
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Custas pelo A./Recorrente e R./Recorrido MUNICÍPIO (...), na proporção de 1/3, 2/3, na 1.ª instância e, nesta sede de recurso jurisdicional, custas apenas pelo A./Recorrente, uma vez que o R./recorrido não apresentou contra alegações.
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Notifique-se.
DN.

Porto, 19 de Novembro de 2021

Antero Salvador
Helena Ribeiro
Conceição Silvestre

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i) Cfr. Pontos 6, 7 e 8 dos factos provados.

ii) Ou seja, i) Índice de edificabilidade de 0,90 aplicado à faixa de terreno com a profundidade de 25 m, confinante com via pública existente até ao máximo de 1000 m2, e de 0,45 à área restante de terreno; ii) Número de pisos de 3; e iii) índice de impermeabilização do solo de 0,60.

iii) A saber, a) a actuação dum sujeito de direito que crie a confiança; b) a situação de confiança mostrar-se justificada por elementos objetivos idóneos a produzir uma crença plausível; c) a existência dum investimento de confiança; d) o nexo de causalidade/imputação entre a atuação geradora de confiança e a situação de confiança e entre esta e o investimento de confiança; e) a frustração da confiança por parte do sujeito jurídico que a criou