Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00450/17.3BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/13/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL; ACIDENTE AUTOMÓVEL; ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO;
Sumário:1 – O recurso da matéria de facto não visa a obtenção de um segundo julgamento sobre essa matéria, mas singelamente evitar a manutenção de eventuais erros ou incorreções cometidos na decisão recorrida, o que se não vislumbra na situação controvertida.
O Tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1.ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos.
À Instância recursiva apenas caberá sindicar e modificar o decidido quanto à factualidade dada como provada e não provada, caso verifique a ocorrência de erro de apreciação, suscetível de determinar a viciação da decisão final, mormente enquanto erro de julgamento.

2 - Nos termos do n.º 2 do artigo 5º do Código da Estrada, e de acordo com o teor do contrato de empreitada, tem a Empreiteira a obrigação de sinalizar as obras, o que não afastava a responsabilidade do Município, atentas até as suas responsabilidade no âmbito da fiscalização da via, competindo-lhe assegurar a vigilância e fiscalização da mesma.
O Município no âmbito do seu dever de vigilância, responde potencialmente pelos danos causados em consequência de acidente nas vias Municipais, sendo que tem o dever legal de assegurar a vigilância e sinalização das mesmas, mesmo quando nestas estejam a ser executadas obras por terceiros.
Incumbindo ao Município o dever de vigilância, responde pelos danos causados em consequência de acidente de viação, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte, por ação ou omissão, ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua (art. 493º, nº 1, do C. Civil).”
Recorrente:Município de (...) e Outra.
Recorrido 1:M.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
M., devidamente identificado nos autos, intentou ação administrativa contra o Município de (...) e M., SA, tendente a serem os RR condenados solidariamente a pagar-lhe “(...) um montante indemnizatório, por responsabilidade civil aquiliana”, em resultado de acidente de viação ocorrido em 25/12/2016 na Rua de (...), em (...), no sentido Igreja de Oliveira-Montão, peticionando “11.719,52€, sendo que 10.719,52€ a título de indemnização por danos patrimoniais, e 1.000€ a título de compensação por danos não patrimoniais acrescida dos juros vincendos até seu efetivo e integral pagamento”.
O TAF de Viseu veio a proferir decisão em 14 de fevereiro de 2020 através da qual a Ação foi julgada parcialmente procedente, mais tendo os Réus sido condenados a pagar ao Autor a quantia de 11.119,52€, acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Inconformada com a decisão proferida veio a Contrainteressada M., SA Recorrer em 12 de junho de 2020, tendo aí concluído:
“1 - O tribunal pode e deve conhecer dos factos alegados pelas partes e instrumentais que resultem da discussão da causa elou que sejam do seu conhecimento, ou públicos e notórios.
2 - E fixá-los, de modo vinculado à prova documental autêntica ou não impugnada, aos suportes de presunção, à confissão e à sua livre convicção, nomeadamente decorrente da prova testemunhal e demais prova produzida, de modo lógico, coerente e isenta.
3 - Nesta circunstância, deverá ser alterada a redação de determinados factos dados como provados, dados como provados factos que foram dados como não provados, dados como não provados factos que foram dados como provados e aditados novos factos provados ao probatório dos autos. Assim,
4 - O facto que integra a alínea P) do probatório deve ser julgado como não provado, e por conseguinte retirado do probatório, quer porque não foi alegado pelo Autor, quer porque está contradição com a demais matéria de facto alegada pelo Autor, quer por factos públicos e notórios, quer ainda tendo em conta o depoimento contraditório, incoerente e interessado da testemunha V., nos termos supra referidos;
5 - O facto que integra a alínea D) do probatório deve ser julgado como não provado, e por conseguinte retirado do probatório, quer por o seu teor se mostrar em contradição com o conceito de "viatura", quer porque não se logrou provar a largura dos veículos "GF" e "lN", quer pelo teor do documento nº 3 junto á petição inicial, quer pelos depoimentos das testemunhas J., L. e J., e ainda do Legal Representante da 2ª Ré, nos termos supra referidos;
6 - Os factos que integram as alíneas F) e G) do probatório devem ser alterados para outra redação e deve ser acrescentado um facto assente novo EE) (com a redação dada ao facto 2 não provado nos autos), por isso resultar da coerência lógica dos demais factos do probatório - mormente os factos que integram as alíneas 8), C), J), K), L), M), W e X) -, as regras de experiência comum e suportes de presunção, tal como o teor do documento nº 3 junto à petição inicial e dos depoimentos das testemunhas J. (condutor do GF e que confessou a sua culpa na produção do sinistro), T., H., L., J. e G., nos termos supra referidos,
7 - Deve ser acrescentado um facto assente novo ao probatório, o facto FF), com a seguinte redação:
À direita da faixa de rodagem, atento o sentido de marcha do lN, existia uma berma em cimento com a largura de 1,30 m, sobre a qual este veículo parou, deixando um espaço livre entre essa berma e a berma do lado contrário de, pelo menos, 2,35m.
8 - Tendo como fundamento o documento nº 3 junto á petição inicial e ainda os depoimentos das testemunhas H. e L..
9 - Os quais (factos que integram as alíneas F) e G) do probatório) devem passar a ter a seguinte redação:
F) Ao deparar-se com a aproximação do GF, a condutora do lN reduziu a velocidade do seu veículo, encostou o mais possível à direita, ocupando a zona da berma pavimentada em cimento de cerca de 1,30 m de largura, e parou a marcha, atrás de um poste de iluminação pública, deixando um espaço livre na faixa de rodagem, do seu lado esquerdo, de cerca 2,35 m. G) Quando chegou ao local onde deveria cruzar com o lN, o condutor do veículo GF não reduziu a velocidade, nem passou pelo espaço Livre de 2,35m da faixa de rodagem, invadindo uma rampa de acesso a uma residência, à sua direita, e prosseguiu a marcha para além da mesma, pela berma, numa zona que constituía uma valeta.
10 - E ser acrescentado um facto assente novo ao probatório, o facto GG), com a seguinte redação:
GG) O condutor do veículo GH não circulava com a precaução exigida para aquela via concreta.
11 - Devem ainda ser aditados dois factos novos - HH) e II)- ao probatório relativos à não inclusão dos trabalhos da empreitada de qualquer intervenção da Ré/Recorrente no local onde se encontrava o buraco referido na alínea H) do probatório,
12 - Tal como resulta dos depoimentos das testemunhas H., L. e G., nos termos supra referidos, bem como dos documentos nºs 1 e 2 juntos com a Contestação da Ré/Recorrente, das fotografias juntas pelo próprio Autor como documentos 4 e 5 da sua petição inicial, e, indiretamente, dos factos que integram as alíneas T), U) e Y) do probatório,
13 - Passando os mesmos a terem a seguinte redação:
GG) A zona onde se encontrava o buraco referido na alínea H) do probatório, que à data do sinistro se encontrava a berma/valeta a seguir à rampa que o condutor do veículo do Autor utilizou na sua manobra de cruzamento com o lN, não integrava os trabalhos previstos no caderno de encargos e contrato de empreitada celebrado entre o 1° Réu e a 2a Ré, referido na alínea U) do probatório
HH) Entre a data da suspensão dos trabalhos referida no facto assente sob a alínea Y) e a data do sinistro, no local do sinistro, foi executada por terceiro particular uma vala que atravessava de uma berma à outra a Rua de (...), e embocava junto ao buraco referido na alínea H) dos factos assentes, no qual igualmente colocou tubos no subsolo.
14 - Tal como resulta dos depoimentos das testemunhas H., nos termos supra referidos, bem como dos documentos nºs 1 e 2 juntos com a Contestação da Ré/Recorrente e, indiretamente, dos factos que integram as alíneas T), U) e Y) do probatório, com o seguinte teor:
II) A zona onde se encontrava o buraco referido na alínea H) do probatório, que à data do sinistro se encontrava a berma/valeta a seguir à rampa que o condutor do veículo do Autor utilizou na sua manobra de cruzamento com o lN, não integrava os trabalhos previstos no caderno de encargos e contrato de empreitada celebrado entre o 1° Réu e a 28 Ré, referido na alínea U) do probatório.
15. Deve igualmente ser alterado/corrigida a reação do facto que consta da alínea H) do probatório, de modo a ser do mesmo expurgado o termo "grande", por se tratar de um conceito vago e indeterminado.
16. Outrossim, deve ser corrigida/alterada a redação dada ao facto que consta da alínea X) do probatório, em função do acordo das partes, do teor do documento nº 3 junto à petição inicial e do teor do depoimento das testemunhas J. e J., nos termos supra referidos,
17 - Passando o mesmo a ter a seguinte redação:
X) Próximo do local onde ocorreu o sinistro, e atento o sentido de marcha que o veículo do Autor levava, e pelos quais passou, existia, no momento do sinistro, também um sinal de informação com a inscrição "máquinas em movimento" e com o sinal BT8 - proibição de exceder velocidade máxima de 30 quilómetros por hora, assim como um sinal AT1, indicador de trabalhos na via, que se encontrava a 250 metros do local do acidente. valeta.
18 - Deve também ser alterado/corrigido o teor do facto que integra a alínea 8) do probatório, tendo em conta o teor dos factos que integram as alíneas A) e Q) dos factos assentes e respetivas presunções, e nome atribuído pela jurisdição administrativa portuguesa e que resulta dos documentos juntos aos autos - mormente documento na 3 junto à petição inicial e depoimentos das testemunhas -, a saber "O., do concelho de (...)", e o depoimento da testemunha J., nos termos supra referidos,
19 - Passando o mesmo a ter a seguinte redação:
A 25/12/2016, pelas 00h20m, J., cunhado do Autor, e por conta deste, conduzia o veículo GF na Rua de (...), freguesia de O., concelho de (...), no sentido Igreja de Oliveira - Montão, a uma velocidade de cerca de 35 km/h, e o tempo apresentava-se bom.
20 - Deve ainda ser alterado/corrigido o teor do facto constante da alínea Y) do probatório e ser no mesmo integrado o teor do auto de suspensão dos trabalhos a que o mesmo facto se refere, dado que a redação atual integra conceitos contraditórios (alegado), imprecisos (camarária) ou de Direito (empreitada), que devem ser expurgados e corrigidos, e tendo ainda por base os depoimentos das testemunhas H., O Chefe de Divisão das Obras Públicas da 1 a Ré, L., superior hierárquico da anterior testemunha H., L., nos termos supra referidos, e ainda o teor do auto de suspensão dos trabalhos, junto como documento nº 1 da contestação da Ré/Recorrente petição inicial, que se trata de documento aceite pelas partes e não impugnado, e do sequente documento nº 2 do mesmo articulado,
21 - Passando o mesmo a ter a seguinte redação:
Y) A data da ocorrência do sinistro, a execução dos trabalhos que integravam o contrato de empreitada dos autos encontravam-se suspensos, por deliberação da Câmara Municipal do Réu Município de (...) datada de 12/12/2016, por falta de condições climatéricas adequadas ao prosseguimento dos trabalhos, concretamente de pavimentação da via, cujo auto de suspensão dos trabalhos, elaborado em 15/12/2016, a qual considerou que a sinalização deixada pela 2a Ré referida na alíneas ~ e X) dos factos assentes se mostrava adequada para assegurar a segurança dos utilizadores da via e que não existiam perigos iminentes ao longo da mesma, o qual tinha o seguinte teor:
“Aos quinze dias do mês de dezembro de dois mil e dezassete, no local onde estão a ser executados os trabalhos da obra acima referida, adjudicada à Firma M., S.A., mediante contrato escrito 3212016, celebrado em 03 de agosto de 2016, compareceram os Exmos. Senhores: Engº H., adjudicatária, a fim de procederem à suspensão dos trabalhos (...)
Os citados intervenientes constataram que a empreitada em causa não reúne condições de execução, atendendo às condições atmosféricas adversas que se fazem sentir, não possibilitando a execução dos trabalhos de acordo com as boas regras de construção, condições de segurança e de qualidade, sendo que os trabalhos de execução serão retomados assim que haja melhoria significativa e sustentada das condições meteorológicas.
Esta suspensão não envolve perigo iminente, ou prejuízos graves para o interesse público.
E não havendo mais nada a tratar, lavrou-se o presente ''Auto de Suspensão dos Trabalhos': elaborado nos termos do artigo 369º do Decreto-Lei 18/2008, de 28 de Janeiro, que depois de lido e julgado conforme, vai ser assinado pelos intervenientes que nele tomaram parte e pelo Exmo. Presidente da Câmara da Câmara Municipal de (...) (...)",
22 - Tendo em consideração o probatório, mormente com alterações vindas de requerer, conclui-se, sem margem para dúvidas, que a produção do sinistro dos autos se deveu à culpa exclusiva do condutor do GF, por ter, na sua marcha, agido com evidente imperícia, desatenção, falta de cuidado e da prudência exigida a quem circulava nas circunstâncias de tempo e de lugar em que ocorreu o sinistro, às condições da via, à necessidade de fazer uma manobra de cruzamento que apresentava risco elevado, face às ditas circunstâncias, e que lhe impunham que parasse antes do referido cruzamento de viaturas e se assegurasse da existência das condições para a poder executar, dado que, como era do seu conhecimento, a via se encontra em obras, era estreita e não tinha berma transitável à direita, atento o seu sentido de marcha.
23 - Com efeito, e concretizando, no percurso efetuado pelo tripulante do veículo do Autor, entre a casa deste e o Local do sinistro, este deparou com uma estrada em obras e estreita, tendo em conta o padrão normal de uma via circulação, tal como o representou o referido condutor.
24 - Aliás, o mesmo residia e reside na mesma rua há vários anos, conhecendo perfeitamente os condicionalismos restritivos da circulação da via, a saber, tais como a sua largura e sinuosidade, a dificuldade de um veículo cruzar com outro sem tomar especiais cautelas, ou fazer manobras de excecionais (v. g., a marcha-atrás, ou mesmo a utilização das bermas em condições de segurança).
25 - Acresce que, igualmente ao longo do seu percurso, o condutor do veículo do Autor, passou, próximo do local onde ocorreu o sinistro, um sinal de informação com a inscrição "máquinas em movimento", por um sinal BT8 - proibição de exceder velocidade máxima de 30 quilómetros por hora, assim como por um sinal AT1, indicador de trabalhos na via, que se encontrava a 250 metros do local do acidente.
26 - E passou ainda, no início dos trabalhos, por um outro sinal de alerta de obras em curso.
27 - O Autor circulava de noite, mas embora a fraca luminosidade decorrente da iluminação pública existente na zona povoada, e especialmente no local do sinistro, levava os faróis do veículo ligados, pelo que se apercebeu que, em sentido contrário, circulava uma outra viatura, que, vendo a aproximação do veículo do Autor, encostou o mais possível à berma direita, atento o sentido de marcha, e parou, imobilizando o seu veículo completamente. Deixou, não obstante, um espaço livre de 3,25 metros, na faixa de rodagem.
28. Ora, apesar de todas estas circunstâncias fortemente condicionadoras e restritivas de uma normal circulação, que convocavam ao tripulante do veículo do Autor um especial cuidado e prudência na sua manobra de cruzamento com a referida viatura, o mesmo, em vez de reduzir a velocidade e parar, e eventualmente, se fosse o caso, fazer marcha atrás (porque era ele quem circulava em sentido ascendente), certificando-se que podia fazer aquela manobra em plena segurança,
29 - Decidiu, nas suas palavras, arriscar, mantendo a marcha da viatura, não a parando, circulando a uma velocidade de, pelo menos 35 km/hora, em ostensiva violação do limite de velocidade para o local e da velocidade que as circunstâncias da via, do local, da hora e do trânsito lhe impunham.
30 - Nessa convicção de que poderia passar sem parar, em vez de passar cautelosamente pelo espaço livre de 3,25 metros da faixa de rodagem, decidiu "arriscar', entrando com a roda dianteira direita numa rampa de acesso a uma casa vizinha do local do sinistro, a qual conhecida, e que era precedida de uma socalco na berma, e que, mesmo que não houvesse um buraco a seguir, sempre teria, no seu final, um declive de 15/20 centímetros, e decidiu prosseguir a sua marcha, até cair num buraco de 50 cm de profundidade, que se encontrava no enfiamento da dita rampa.
31 - Ou seja, perante o referido quadro, o condutor do veículo do Autor, não parou, nem se assegurou, com a ajuda pelo menos dos faróis do seu veículo (e ainda da iluminação do poste que se encontra no local, a qual, embora fraca, sempre acrescentaria à iluminação dos seus faróis, os quais, obrigatoriamente, fazendo bom tempo, lhe deviam permitir o estado do piso e da berma à sua frente), para se assegurar que poderia prosseguir a sua manobra sobre a berma, em vez de fazer marcha atrás ou cruzar no espaço disponível da faixa de rodagem.
32 - Não! Bem sabendo, como expressamente confessou no seu depoimento, que as bermas não são locais destinados à circulação, e que teria feito melhor em ter parado e verificado as condições do local, o dito condutor decidiu arriscar a sua marcha fora da faixa de rodagem, em local onde existia o dito buraco, sem se certificar das condições de circular sobre o mesmo local, onde sabia que não era permitido circular, tal como, de resto, resulta de lei.
33 - De resto, basta atentar nos violentos e vultuosos danos produzidos na viatura dos autos, nomeadamente com o acionamento do airbag, e nos danos pessoais e psicológicos que o tripulante e passageiro (Autor) do veículo sofreram, para se perceber, pelas regras da experiência comum, que o condutor não só não parou, como não reduziu a velocidade para uma velocidade aceitável face às circunstâncias que encontrou pela frente, mas que circulava a uma considerável velocidade, provavelmente bem mais do que os referidos 35/40 km/hora que admitiu no seu depoimento, suficientemente capazes de retorcer a roda da frente, acionar o airbag e provocar toda a panóplia de danos referidos no probatório.
34 - Por isso, independentemente se se apurar quem fez o buraco, em que momento o fez, se havia ou não obrigação de o identificar, e sobre quem recaía essa obrigação, a verdade é que pura e simplesmente o condutor do veículo do Autor agiu com manifesta imprudência, imperícia, e em ostensiva violação da lei.
35 - Se circulava a 35 km hora, o tripulante do veículo do Autor, circulava a velocidade em manifesto excesso de velocidade, nos termos das obrigações hierarquicamente superiores impostas pela sinalização temporária, face à invocada legislação,
36 - Sendo que, mesmo que assim não fosse, e atentas as regras da experiência comum, tinha pelo menos a obrigação de ver os obstáculos que lhe surgiram pela frente (veiculo em sentido contrário, espaço livre da via, rampa de acesso à entrada de uma habitação e o buraco dos autos), pelo menos, a 30 metros de distância, uma vez que circulava com os faróis ligados (30 metros se circulava com os médios ligados, 100 m de circulava com os máximos), suficientes para parar ou para adequar a condução e velocidade ao seu surgimento, até porque sabia que os iria encontrar pela frente.
37 - Por outro lado, nas circunstâncias de tempo e lugar em que se deu o acidente dos autos, e segundo as regras da experiência comum, o autor circulava forçosamente a mais de 30 km/hora, pois, se fosse a tão reduzida velocidade, tinha tido tempo mais do que suficiente para evitar o despiste que alega nos autos.
38 - Tanto mais que, no seu trajeto antes do sinistro, viu, ou tinha obrigação de ver (sendo que, se não viu, como confessou, a situação de imprudência e falta de atenção às condições da estrada, ainda se mostram mais graves), a sinalização temporária colocada pela aqui Interveniente no local, e não deu cumprimento às obrigações legais a que estava cometido em função dessa sinalização.
39 - Sinalização essa feita em material refletor que o veículo dos autos tinham obrigação de iluminar e fazer ver ao condutor do veículo do Autor, com a antecedência suficiente para adequar a velocidade do mesmo à iminência dos perigos que sabia que iria encontrar.
40 - Ora, perante as circunstâncias vindas de descrever, mormente o conhecimento pregresso do estado da via onde circulava, dos sinais, e, segundo as suas palavras, da pouca iluminação, seria expectável (e mesmo obrigatório) que o condutor conduzisse com especial cuidado e prudência, e a baixa velocidade, para, caso lhe surgisse algum obstáculo, poder tomar as devidas precauções, reduzir ao máximo a velocidade, e mesmo parar.
41 - Ou seja, ou o Autor circulava a 35km hora, para além de circular em excesso de velocidade, e tal como emerge das regras da experiência comum, não se poderia ter despistado pelas razões que invoca, muito menos ter um despiste que levasse à produção dos danos que invoca ter sofrido nos autos, se tivesse cumprido com as regras do trânsito referidas, e a que estava obrigado a cumprir.
42 - Danos estes, patrimoniais e não patrimoniais, incompatíveis com uma circulação prudente, menor de 30 km/hora, e mesmo a velocidade de 35 km/hora, para quem levava os faróis de iluminação noturna ligado, pelo menos em médios.
43 - Assim, o acidente dos autos produziu-se pela ação culposa do condutor do veículo do Autor que não adequou a marcha do seu veículo às caraterísticas específicas do veículo, às caraterísticas da via onde circulava - uma estrada em obras, com sinalização temporária da existência das referidas obras, de perigos e obstáculos vários, estreitamento da via, de proibição de circulação a velocidade superior a 30 Km hora, tal como ao facto de ser de noite, e lhe surgir uma veículo pela frente, que parou previamente á sua chegada, encostado sobre a berma direita em cimento atrás de um poste de iluminação pública, com o qual tinha de cruzar, numa via estreita, e onde a berma era formada por uma sua conhecida rampa de entrada numa residência particular.
44.Como já se viu, os condicionalismos que condutor do veículo do Autor/Recorrido encontrou estavam devidamente sinalizados, sendo que tendo plena consciência dos mesmos, estava o mesmo obrigado, porque era noite, havia obras e conduzia um veículo automóvel, a uma condução de redobrada prudência e cuidado, a fim de identificar e de evitar os obstáculos que lhe foram anunciados, e que, haveria de encontrar entre os 150 e os 300 metros seguintes (para já não falar de que tinha plena consciência da existência dos mesmos, por residir nas proximidades do local do sinistro.
45 - Resulta, assim, como se disse, que a única responsabilidade pela produção do sinistro dos autos ficou a dever-se, única e exclusivamente à conduta imprudente, descuidada, temerária e por falta de atenção do condutor do veículo do Autor.
46 - O qual, na sua marcha, violou os preceitos legais previstos nos artigos 7°, 19°, 77°, nº 1, do Decreto Regulamentar 22-A/98, de 1 de outubro, e ainda os artigos 5°, nº 2, 7° 17°,19°,24°, nº 1, 33° e 60°, nº 1, ais. a) e b), do Código da Estrada.
47 - De resto, sem prescindir, mesmo que assim não fosse, tendo em conta o disposto no nº 1 do artigo 342°, no nº 1 do artigo 344°, quer na presunção iuris tantum prevista no artigo 503°, nº 3, todos do Código Civil, para além de o Autor/Recorrido não ter demonstrado os factos constitutivos do direito invocado, o seu veículo era conduzido por uma terceira pessoa- o referido Jorge Marcelo -, por conta dele Autor/Recorrido, o que faz presumir a sua responsabilidade na produção do sinistro dos autos.
48 - Sempre sem prescindir, e mesmo que assim também não fosse, a obra que integrava o contrato de empreitada celebrada entre o Réu Município e a Ré/Recorrente, para além de limpeza, o que significa uma mera ação superficial sem alteração do estado das mesmas, não previa a execução de quaisquer intervenções de escavação nas mesmas, qualquer alteração de topografia ou de execução de buracos ou colocação de tubagens, infraestruturas ou redes de subsolo, nem tal se mostrou provado, por exemplo do respetivo mapa de trabalhos.
49 - Especificamente, não estavam previstos esses trabalhos na berma onde se deu o sinistro, muito menos na zona onde se encontrava, na data do sinistro, o buraco referido na alínea H) do probatório.
50 - Outrossim, aquando da suspensão dos trabalhos da empreitada, por força da mau tempo, o Município Réu foi ao local da obra elaborar o respetivo auto (assinado pelo referido fiscal e pelo Presidente da Câmara Municipal da 18 Ré), tal como do mesmo consta, e ali e no mesmo expressamente reconheceu que a obra, nos termos em que determinou que ficasse sinalizada pela 20 Ré, se mostrava e que a sinalização que exigiu ao empreiteiro não envolvia perigo iminente, ou prejuízos graves para o interesse público,
51 - Sendo que o próprio 1° Réu reconheceu expressa e inequivocamente que a sinalização que a 18 Ré colocou durante o período de suspensão da obra referida nas alíneas W) e X) do probatório era a que considerava adequada e suficiente para sinalizar os perigos existentes ao longo do percurso do local da obra,
52 - Por esta via, está inequivocamente assegurado o cumprimento das obrigações decorrentes do caderno de encargos, referidas na alínea V) do probatório, na parte que refere que "O empreiteiro realiza todos os trabalhos que, por natureza legal ou segundo o uso corrente, sejam considerados como preparatórios ou acessórios à execução da obra, designadamente: (...) b) Trabalhos necessários a garantir a segurança de todas as pessoas que trabalhem na obra ou que circulem no respetivo local, incluindo (...) terceiros em geral (...)".
53 - Ou seja, se os legítimos representantes dos Réus se deslocaram ao local da obra e no mesmo elaboraram o supra referido auto de suspensão dos trabalhos, igualmente subscrito pelo Presidente da Câmara Municipal do 1 ° Réu, onde reconheceram que a obra ficava suspensa sem que subsistisse qualquer perigo iminente ou que a sua suspensão ou o modo como a mesma ficava causasse qualquer prejuízo para o interesse público, e igualmente confessou e reconheceu que a sinalização colocada durante o período de suspensão e que se encontrava visível ao condutor do veículo do Autor era a adequada e suficiente para identificar os perigos para os utilizadores da via em causa,
54 - No caso, que não se crê, de haver responsabilidade pela inexistência de falta de sinalização do referido buraco, a mesma não pode, de modo algum, ser assacada à 2ª Ré, aqui Recorrente, mas apenas ao 1° Réu.
55 - Acresce que, para além do dever de fiscalização que foi efetivamente exercido pelo Município Réu, a cujas diretrizes e ordens a 2° Ré correspondeu sem reservas, como se viu (suspendendo a obra e sinalizando-a de acordo com determinado e entendido pelo Réu Município),
56 - Cabia, como cabe, a este Município a responsabilidade pela vigilância, conservação e manutenção do bom estado de circulação das vias, mesmo que esteja em obras e sobretudo durante a sua suspensão, sendo que não resultou provado, antes pelo contrário, que o Município tenha emitido qualquer diretriz à Ré/Recorrente para se impedir a circulação de veículos durante a execução das obras da empreitada dos autos ou durante a sua referida suspensão.
57 - Na verdade, no âmbito das suas competências, poderia o Município 1° Réu, impedir a circulação de veículos durante a execução dos trabalhos e/ou a sua suspensão,
58 - Ou mesmo, caso entendesse que a via em causa, dada a sua estreita largura, não reunia condições para o adequado cruzamento de veículos, igualmente lhe competia o poder/dever de impedir essa manobra, colocando a via com sentido único, o que não fez.
59 - Em resumo, sempre competia ao Município de (...), e se assim o entendesse, proibir o trânsito no local, a fim de evitar acidentes, pois que a aqui Ré/Recorrente cumpriu com todas as obrigações contratuais e legais a que estava incumbida perante este Município.
60 - Finalmente, ainda sem prescindir, e mesmo que assim também não fosse, dado o teor do referido na 1 do artigo 3420 do CC, face ao que se vem de invocar, para que pudesse, mesmo teoricamente, no âmbito da responsabilidade aquiliana, verificar-se a ilicitude do facto e a culpa da 28 Ré na sua produção, dado que a obra estava suspensa desde 15 de dezembro de 2016 e até data posterior à ocorrência do sinistro, cabia obrigatoriamente ao Autor provar que, para além da obrigação de sinalizar o buraco dos autos, que foi o mesmo já existia no referido dia 15 de dezembro de 2016, o que não resulta dos autos.
61 - Assim, não provando o Autor que caiu num buraco que já existia no referido dia 15 de dezembro de 2016, quando a Ré suspendeu, por ordem da 18 Ré, as obras e ali deixou a supra referida sinalização (Cfr. alíneas W) e X) do probatório) - e tendo, para além disso, em conta as obras que feitas por terceiros no local -, não se preenchem os referidos requisitos da ilicitude e da culpa, previstos no artigo 4830 do CC.
62 - Assim, em conclusão, por qualquer das enunciadas razões, nenhuma responsabilidade poderá, mesmo neste caso, ser assacada à aqui 28 Ré na produção do sinistro dos autos.
63 - Mesmo que assim não fosse, e em caso algum deveriam as Rés ser condenadas na indemnização a título de paralisação, por falta de prova.
Tudo isto deverá conduzir à revogação da sentença dos autos, no sentido vindo de propugnar, julgando-se a ação improcedente, por não provada, quanto a ambos os Réus, ou, caso assim se não entenda, pelo menos quanto à aqui 28 Ré, tal como se requer que venha a ser julgado no acórdão a proferir por este Venerando Tribunal de recurso,
Com o que farão V. Exas., Aliás como sempre, Inteira e sã Justiça!”

O Município de (...) veio igualmente a Recorrer, em 22 de junho de 2020, aí tendo concluído:
“OBJECTO DO RECURSO
1. Vem o presente recurso interposto da douta Decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que condenou o Município de (...), ora Recorrente e a 2.ª Ré, M., SA, no pagamento ao aqui Recorrido de um montante indemnizatório de €11.119,52, por responsabilidade civil aquiliana.
2. Entendeu o Mmº Tribunal a quo que o Recorrente (e a 2ª Ré) incumpriu as suas obrigações de manutenção da via pública em condições de segurança de circulação, sendo que, para além disso, não logrou demostrar que a culpa na verificação do acidente aqui em causa se tivesse ficado a dever ao comportamento do condutor do veículo automóvel do Recorrido, nem ilidir a presunção de culpa que sobre o mesmo recai ao abrigo do disposto no nº 3, do artigo 10º, da Lei 67/2007, de 31.12 (alterada pela Lei n.º 31/2008, de 17.07 e que aprova o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Pessoas Coletivas de Direito Público).
3. Ora, como se tentará demonstrar, entende-se - sempre com o devido e maior respeito – que o Tribunal a quo não avaliou nem julgou corretamente parte da prova produzida, o que teve como consequência direta o não ter dado como provados factos que, no entender do ora Recorrente, o deveriam ter sido, e ter dado como provados factos que não o poderiam ter sido e que, consequentemente, levariam à prolação duma outra decisão.
Está aqui em causa a modificabilidade da decisão relativa à matéria de facto, que será o objeto da primeira parte do presente recurso.
4. Em todo o caso, ainda que se assim não se entenda - o que não se espera – entende o Recorrente, com os fundamentos que se explanarão, que o Mmº Tribunal a quo fez uma errada aplicação de Direito o que, a não ter acontecido, levaria a ter decidido em sentido diverso. Vejamos então.
DA ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
5. Da análise da decisão sobre a matéria de facto e da sua confrontação com toda a prova produzida, entende-se que o Tribunal a quo não deu como provados factos que o deviam ter sido e deu como provados factos cuja prova impunha decisão em sentido contrário. Estamos a falar da seguinte FACTUALIDADE: 1. Condições da via no local do acidente; 2. Dinâmica do acidente; 3. Dos danos considerados.
»CONDIÇÕES DA VIA NO LOCAL DO ACIDENTE:
»Reapreciação da prova gravada
6. Quanto a esta factualidade, designadamente quanto à possibilidade de cruzamento de veículos, dentro da faixa de rodagem, no local do acidente, o Tribunal a quo não valorou de forma correta os depoimentos do Legal Representante da 2.ª Ré, D., ouvido na sessão de audiência de julgamento realizada no dia 19.11.2019, muito concretamente o por este dito nos trechos da gravação aos minutos [09’:10’’ a 09’:15’’] e aos [31’:00’’ a 31’:40’’];
7. Não valorou como devia o depoimento da testemunha J., agente da GNR, ouvida no mesmo dia, [-14-18-20-], muito concretamente o por este dito nos trechos da gravação aos minutos [10’:16”a 11’:59’’];
8. O depoimento da testemunha H., que teve oportunidade de fazer medições no local do acidente, aquando da elaboração do mapa de quantidades da empreitada submetida a concurso, ouvido na mesma sessão de dia 19.11.2019, [14-18-20], muito concretamente o por este dito nos trechos da gravação aos minutos [1:32’:55” a 1:33’:41”] e [2:02’:44”a 2:03’:40”];
9. Nem valorou o depoimento da testemunha L., ouvido a 26.11.2019, que conhecia pessoalmente o local por exercer funções como Chefe de Divisão de Obras junto do Recorrente, [-14-14-45-] muito concretamente o por este dito nos trechos da gravação aos minutos [6’:40” a 7:50”], [8’:42” a 9’:22”] e [26’:32” a 27’:00”].
10. De facto, dos depoimentos acabados de referir, no que respeita às características da via no local do acidente, e ainda do teor da Participação de Acidente de Viação (PAV), bem como dos documentos 5, 6, 7 e 8 juntos com a contestação do Recorrente, extraem-se os seguintes factos que não foram tidos em consideração pelo Tribunal a quo:
11. No local do acidente era possível o cruzamento de viaturas sem invadirem as bermas, se circulassem a velocidade reduzida; a via em questão insere-se numa zona de habitação consolidada, com casas de ambos os lados da estrada, tem traçado linear e boa visibilidade existindo um posto de iluminação pública a cerca de 7 metros do local do acidente; no local em causa a estrada tem cerca de 3,25m de largura; do lado direito, quem sobe, na zona do acidente, existia uma valeta por onde circulavam as águas pluviais; do lado oposto ao local onde se deu o acidente existe uma berma, em cimento, com 1,30m de largura, que se manteve nas mesmas condições após concluídas as obras; a existência desta berma, naquele local, acrescentava mais espaço à via facilitando o cruzamento dos veículos; não é frequente ocorrerem acidentes naquela via.
12. Acresce que, da prova testemunhal e documental, com importância para o que aqui importa, resulta ainda – e também não foi tido em conta pelo Tribunal a quo - que, do lado direito do sentido de marcha da viatura GF, imediatamente antes do buraco onde a viatura caiu, existia uma rampa de acesso a uma garagem, que apresentava um desnível de cerca de 20 centímetros.
13. Vejam-se os depoimentos do condutor do veículo sinistrado, a testemunha J., ouvido na sessão do dia 19.11.2019, muito concretamente o por este dito nos trechos da gravação aos minutos [55’:00’’a 57’:02”]; da testemunha J., ouvido na mesma sessão, muito concretamente o por este dito nos trechos da gravação aos minutos [15’:58” a 17’:41’’] e [24’:26” a 25’:20’’].
14. Acresce ainda que, importa também apurar se era, ou não, exigível a sinalização daquele buraco, sendo importante ouvir o que explicou a testemunha L., ouvido na sessão de 26.11.2019 quanto às situações em que são sinalizados buracos nas bermas, [-14-14-45-], muito concretamente o por este dito nos trechos da gravação aos minutos [16’:30’’a 18’:21’’]
15. De facto, dos depoimentos acabados de referir extraem-se também os seguintes factos, não considerados pelo Tribunal a quo: no local do acidente, do lado direito da via, atendendo ao sentido de marcha do veículo GF, 40cm antes do buraco, existia – e sempre existiu - uma rampa de acesso a uma garagem cuja inclinação provocava um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada; o condutor do veículo sinistrado conhecia a existência e as características daquela rampa; tendo presentes as boas práticas e técnicas, atendendo ao tipo e localização do buraco em causa, e toda a outra sinalização já existente na via, não era necessária a sua sinalização.
»Dos concretos pontos de facto que se entendem incorretamente julgados
16. Deste modo, e atento o acabado de expor, da factualidade resultante dos aludidos depoimentos e da identificada prova documental, quanto às condições da via no local do acidente, o Mmº Tribunal a quo, devia ter dado como não provado o facto constantes do ponto D);
17. Devia ter aditado como factos novos que: i) do lado direito da faixa de rodagem, atendendo ao sentido de marcha do veículo IN, conduzido por T., existia uma berma pavimentada em cimento e com cerca de 1,30m de largura; ii) a berma direita da estrada, no sentido de marcha do veículo GF, existia uma valeta por onde circulavam as águas pluviais; iii) No local do acidente, do lado direito da via, atendendo ao sentido de marcha do veículo GF, 40cm antes do buraco, existia – e sempre existiu - uma rampa de acesso a uma garagem cuja inclinação provocava um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada, do conhecimento do condutor do veículo sinistrado.
18. Devia ser aditado à alínea I) dos FP o trecho, “sendo que, tendo presentes as boas práticas e técnicas, e atendendo ao tipo e localização do buraco em causa, e toda a outra sinalização existente, não era necessária a sua sinalização”.
»Da Decisão relativa à matéria de facto a proferir
19. ASSIM SENDO, como se entende, atendendo à conjugação da prova referida, designadamente, da factualidade resultante dos aludidos depoimentos, conjugada com a identificada prova documental, nos termos do artigo n.º 662º do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA, deverá ser alterada a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto:
20. » ELIMINANDO-SE do elenco dos factos provados a alínea D), passando a mesma a constar dos factos não provados, a saber: D) No local em causa, só é possível o cruzamento de duas viaturas caso pelo menos uma delas invada, ainda que parcialmente, a respetiva berma;
21. » DANDO-SE COMO PROVADOS, e ADITANDO-OS à matéria provada, os seguintes factos novos: FF) Do lado direito da faixa de rodagem, atendendo ao sentido de marcha do veículo IN, conduzido por T., existia uma berma pavimentada em cimento e com cerca de 1,30m de largura; GG) a berma direita da estrada, no sentido de marcha do veículo GF, existia uma valeta por onde circulavam as águas pluviais; HH) No local do acidente, do lado direito da via, atendendo ao sentido de marcha do veículo GF, 40cm antes do buraco, existia – e sempre existiu - uma rampa de acesso a uma garagem cuja inclinação provocava um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada, do conhecimento do condutor do veículo sinistrado.
22. ADITANDO-SE à alínea I) dos factos provados o seguinte trecho: I) O referido buraco não estava sinalizado ou vedado, sendo que, tendo presentes as boas práticas e técnicas, atendendo ao tipo e localização do buraco em causa, e toda a outra sinalização existente, não era necessária a sua sinalização.
»DINÂMICA DO SINISTRO Reapreciação da prova gravada
23. Mas, também quanto à dinâmica do sinistro entende o Recorrente que deveria ter sido retirada uma outra factualidade dos depoimentos das testemunhas, conjugados com a prova documental já referida - teor da Participação de Acidente de Viação (PAV), bem como dos documentos 5, 6, 7 e 8 juntos com a sua contestação.
24. Em primeiro lugar, e de primordial importância para percebermos como se deu o acidente, importa verificar qual o posicionamento da viatura IN, que circulava em sentido contrário ao veículo sinistrado, e se, face a essa posição, existia espaço suficiente para que um outro veículo pudesse cruzar sem ter que utilizar a valeta.
25. Para tanto, vejamos o que disse a testemunha T., condutora do veículo IN, ouvida na sessão de julgamento de 19.11.2019, [-10-08-37, muito concretamente o por esta dito nos trechos da gravação aos minutos [01:24’:10”: 01:25’:36”]; a testemunha J., GNR, ouvido na mesma sessão de 19.11, [-14-18-20], aos minutos [14’:10”a 15’:44”], [27’:52”a 29’:16”], este depoimento é, aliás, confirmado com o constante na PAV e constatado, de forma clara, nos documentos 5, 6, 7 e 8, juntos com a contestação do Recorrente.
26. Dos depoimentos acabados de transcrever, conjugados com a referida prova documental, extraem-se os seguintes factos: quando a condutora do veículo IN viu o veículo GF, que circulava em sentido contrário, imobilizou, de imediato, o seu veículo, atrás de um poste de iluminação pública, do lado direito, encostando-o um muro duma casa que aí existia, ocupando cerca de 1 metro da berma pavimentada em cimento de 1,30m de largura, deixando livre, cerca de 2,35 da faixa de rodagem; atendendo a que o veículo IN se encontrava parado e encostado à berma, o veículo GF podia ter passado no local e cruzado com aquela viatura, sem ter que invadir a berma do seu lado, constituída por uma valeta de águas pluviais. Esta factualidade, como se verá seguidamente, não foi atendida – erradamente - pelo Tribunal a quo.
27. Acresce que, para perceber a concreta dinâmica do acidente e – muito concretamente - por que razão o mesmo aconteceu e a quem se pode imputar a responsabilidade da sua ocorrência, é fundamental apurar o que ficou efetivamente demostrado quanto à atuação do condutor do veículo GF;
28. Vejamos o que pelo mesmo é dito na sessão de julgamento do dia 19.11.2019, muito concretamente o por esta dito nos trechos da gravação aos minutos [39’:40”a 39’:50”], [53’:55”a 54’:30”], [(01:00’:08”], (1:03’:50”a 1:04’:45”) e (1:08’:19” a 1:08’:28’’), notando-se que esta testemunha, J., residia próximo do local do acidente, sendo conhecedor das características e do estado em que a via se encontrava, como o próprio esclareceu.
29. Ora, deste depoimento resulta, na primeira pessoa, que o condutor do veículo GF, à data do sinistro, residia a cerca de 1 km do local onde se deu o acidente, conhecia aquele local, sabia que havia obras naquele troço, que as mesmas estavam suspensas, mas que havia sinalização indicando que o troço estava em obras.
30. Acresce que, para além desta factualidade, importa também notar qual a perceção, a autoavaliação, que o condutor do veículo faz da sua atuação, da sua condução naquele contexto e que se traduz nos seguintes factos:
31. O condutor da viatura GF diz que circulava a uma velocidade de 35/40km/h, com os faróis ligados;
32. Quando vê o veículo IN (que também tinha os faróis ligados e vinha no sentido descendente), este já estava praticamente parado, na berma do seu lado direito, junto ao muro, atrás do poste de iluminação pública;
33. Quando se apercebe da viatura IN tenta reduzir ao máximo a velocidade do veículo por si conduzido, sendo que, naqueles instantes, precipitadamente, desviasse para a berma, embate e passa por cima duma rampa de acesso, com um desnível bastante acentuado e cai num buraco;
34. O condutor do veículo GF admitiu e tinha plena consciência que, atendendo às características da via no local do acidente, que bem conhecia – em obras, toda esburacada, mas devidamente sinalizada, cuja berma, do lado direito, era constituída por uma valeta, e no local tinha uma rampa de acesso com um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada - teria sido mais prudente parar e verificar se conseguia passar dentro da faixa de rodagem, mas, ainda assim, decidiu arriscar - arrisquei mal, sic - e tentar passar utilizando a berma. Dos concretos pontos de facto que se entendem incorretamente julgados
35. Tendo presente o acabado de expor, designadamente a factualidade que foi/é possível extrair dos depoimentos transcritos, bem como, a prova documental carreada para os autos, entende-se que o Mmº Tribunal a quo não valorou corretamente os depoimentos das testemunhas T., J., J., bem como o conteúdo da PAV,
36. Sendo que, atendendo aos factos que se extraem da conjugação daqueles concretos meios de prova, quanto à dinâmica do acidente, o Mmº Tribunal a quo:
37. Devia ter dado como não provados os factos constantes dos pontos D), F) e G);
38. Devia ter dado como não provado o facto constante do ponto 2) dos factos não provados;
39. Devia ter aditado como factos novos que: i) Quando a condutora do veículo IN viu o veículo GF, que circulava em sentido contrário, imobilizou, de imediato, o seu veículo, atrás de um poste de iluminação pública, do lado direito, encostando um muro duma casa que aí existia, ocupando cerca de 1 metro da berma pavimentada em cimento de 1,30m de largura, deixando livre, cerca de 2,35 da faixa de rodagem; ii) Quando chegou ao local do acidente, o condutor do veículo GF não reduziu a velocidade e invadiu a berma, do lado direito, constituída por uma valeta, embateu com a viatura numa rampa de acesso ali existente, com um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada.
Da Decisão relativa à matéria de facto a proferir
40. ASSIM SENDO, como se entende, atendendo à conjugação da prova referida, designadamente, da factualidade resultante dos aludidos depoimentos, conjugada com a identificada prova documental, nos termos do artigo n.º 662º do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA, deverá ser alterada a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto:
41. » ELIMINANDO-SE do elenco dos factos provados as alíneas D), F) e G), passando as mesmas a contar dos factos não provados, a saber: D) No local em causa, só é possível o cruzamento de duas viaturas caso pelo menos uma delas invada, ainda que parcialmente, a respetiva berma; F) Para tornar possível o cruzamento das viaturas sem embates, ambos os condutores reduziram a velocidade e viram-se obrigados a ocupar as respectivas bermas da via de circulação: G) Em consequência, o condutor do veículo GF viu-se obrigado a circular com as rodas do lado direito sobre parte da berma da estrada;»
42. ELIMINANDO-SE do elenco dos factos não provados a alínea 2), passando a mesma a contar dos factos provados, a saber: 2) O condutor do veículo GF não circulava com a precaução exigida para aquela via concreta;
43. » DANDO-SE COMO PROVADOS, e ADITANDO-OS à matéria provada, os seguintes factos novos: II) Quando a condutora do veículo IN viu o veículo GF, que circulava em sentido contrário, imobilizou, de imediato, o seu veículo, atrás de um poste de iluminação pública, do lado direito, encostando-o um muro duma casa que aí existia, ocupando cerca de 1 metro da berma pavimentada em cimento de 1,30m de largura, deixando livre, cerca de 2,35 da faixa de rodagem;
JJ) Quando chegou ao local do acidente, o condutor do veículo GF não reduziu a velocidade e invadiu a berma, do lado direito, constituída por uma valeta, embateu com a viatura numa rampa de acesso ali existente, com um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada.
DOS DANOS CONSIDERADOS - Reapreciação da prova gravada
44. Mas também no que respeita aos danos se entende que o Tribunal a quo não valorou a prova como devia, decidindo erradamente.
45. Em primeiro lugar, não é despiciendo o facto de, ao decidir circular na berma, o veículo GF ter tido que passar por cima da rampa de acesso existente antes do buraco, realidade que o condutor bem conhecia como supra se constatou.
46. A este propósito veja-se o depoimento da testemunha J., GNR, na sessão do dia 19.11.2019: [-14-18-20], muito concretamente o por esta dito nos trechos da gravação aos minutos [18’:05” a 19’:36’’], (22’:32” a 24’:18’’).
47. Ora, do depoimento acabado de transcrever extraem-se os seguintes factos: o condutor do veículo GF, ao desviar-se para a berma, embateu na rampa de acesso ali existente, com um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada, que estava imediatamente antes do buraco; o desnível provocado pela rampa fez com que o veículo embatesse com o para-choques no chão, antes de cair no buraco; se um veículo circulasse a uma velocidade reduzida, na ordem dos 10 a 20km/h poderia passar por cima daquela rampa sem sofrer qualquer dano.
48. Acresce que, o Mm.º Tribunal a quo condenou ainda o Recorrente e a 2.ª Ré no pagamento ao Recorrido de uma indemnização pela privação do uso do veículo, tendo para o efeito considerado provado que o mesmo, na sequência do sinistro, passou a utilizar para as suas deslocações quotidianas, no cumprimento das suas responsabilidades profissionais e pessoais, um veículo que lhe foi cedido para o efeito pela sogra, pagando-lhe, em contrapartida de tal uso, de uma quantia mensal de €150 que, atento o período de tempo decorrido desde a data do sinistro até à data da propositura da ação, computou no valor de €1.500 – cfr. fls. 30 e 31 da Sentença.
49. Não se pode concordar. Para tanto, veja-se o depoimento da testemunha V., sogra do Autor e única testemunha que revelou ter conhecimento desta factualidade, ouvida na sessão de audiência de julgamento realizada no dia 19.11.2019 [-10-08-37], aos minutos 82:01’:58’’a 2:02’:48’’] e [2:13’:40’’a 2:15’:03’’].
50. Do depoimento acabado de transcrever extrai-se que, desde o acidente, o Recorrido passou a utilizar para as suas deslocações um carro que a sogra tinha comprado para dar à sua filha, mulher do Recorrido, carro com que nunca andou, nem precisou.
Dos pontos incorretamente julgados:
51. Deste modo, e atento o acabado de expor e a factualidade resultante do aludido depoimento, quanto ao dano resultante da privação do uso de veículo, o Mmº Tribunal a quo: - Devia ter dado como não provado os factos constantes do ponto P) da fundamentação de facto.
Da Decisão relativa à matéria de facto a proferir
52. ASSIM SENDO, como se entende, atendendo à conjugação da prova referida, designadamente, da factualidade resultante dos aludidos depoimentos, conjugada com a identificada prova documental, nos termos do artigo n.º 662º do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA, deverá ser alterada a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto:
53. ALTERANDO O CONSTANTE das alíneas K), L) e M) dos FP, ADITANDO-SE os seguintes TRECHOS: K) Em consequência do embate da viatura na rampa de acesso ali existente, com um desnível de cerca de 20 cm em relação à cota da estrada e da queda no buraco (…);L) Ainda em virtude do descrito embate e da descrita queda, (…);M) Também em consequência do embate e da queda no buraco (…);
54. » ELIMINANDO-SE do elenco dos factos provados a alínea P), passando a mesma a contar dos factos não provados, a saber: P) A partir da data do sinistro, e para as suas deslocações diárias para o trabalho, bem como outras para acudir às necessidades da vida privada, o Autor passou a utilizar um veículo automóvel propriedade da sua sogra, pagando-lhe, em contrapartida de tal uso a quantia mensal de € 150,00.
DOS ERROS DE JULGAMENTO E, CONSEQUENTEMENTE, DA DECISÃO A PROFERIR
55. Verifica-se, em primeiro lugar, que o Mm.º Tribunal entendeu que o Recorrido e a Ré M., incumpriram as suas obrigações de manutenção da via pública em condições de segurança de circulação.
56. Ora, com o devido respeito – e ainda que apenas se considerem os factos provados e não provados pela Decisão em apreço - resulta manifesto que o ora Recorrente, conforme demostrou, não incumpriu a sua obrigação de vigilância, de manutenção e fiscalização da via pública em condições de segurança.
57. Veja-se, desde logo, a factualidade que consta das alíneas T), W) e X) dos factos provados: à data do sinistro a via designada "Rua (...)" encontrava-se em obras de repavimentação e requalificação; [cfr. Alínea T) FP)]; O troço da via em obras estende-se por 7 km, existindo, quer no início, quer no fim do indicado troço, um sinal de alerta de obras em curso; [cfr. Alínea W) FP)]; Próximo do local onde ocorreu o sinistro, existia também:» um sinal de informação com a inscrição "máquinas em movimento",» um sinal BT8 - proibição de exceder velocidade máxima de 30 quilómetros por hora,» um sinal AT1, indicador de trabalhos na via; [cfr. Alínea X) FP)]
58. Contrariamente ao entendimento da Decisão em recurso, ficou demostrado e provado que a sinalização existente na via era a regularmente exigida e suficiente para avisar os condutores da existência das obras em curso e mostrava-se adequada ao normal andamento e fluência do trânsito e das pessoas que aí circulassem, sendo que durante o período de suspensão da obra aquela sinalização se manteve.
59. Acresce que, lê-se ainda na douta Decisão em análise que o ora Recorrente e a 2.ª Ré “não conseguiram demonstrar que a culpa na verificação do acidente se tivesse ficado a dever ao comportamento do condutor do veículo automóvel de matrícula GF, (…), e quanto à presunção de culpa que sobre este recai também ressuma com clareza do probatório coligido, não lograram os mesmos ilidir, não tendo resultado provados factos suficientes que permitam concluir que as mesmas atuaram com a diligência que lhe era exigida.”
60. Ora, contrariamente àquele que foi o entendimento do Tribunal a quo, é manifesto que o acidente se deveu única e exclusivamente ao comportamento do condutor do veículo sinistrado, ali residente, conhecedor daquela via, da existência de obras naquela via, da sua sinalização e das suas particulares condições, designadamente a existência duma rampa de acesso naquele local! Ia em excesso de velocidade e violou as normas estradais – in casu o n.º 1 do artigo 17.º, o artigo 33º do Código da Estrada.
61. Por outro lado, tendo presente a localização do veículo IN conclui-se que só por imperícia e imprudência o condutor do veículo sinistrado não foi capaz de cruzar com o veículo que circulava em sentido contrário sem ter que invadir a berma.
62. Atendendo ao critério plasmado no n.º 2 do artigo 487.º Código Civil – a diligência de um bom pai de família – é manifesto concluir que o condutor do veículo sinistrado não circulou com a prudência devida e a razoável perícia, apenas a si se podendo atribuir a ocorrência do sinistro, também não restando dúvidas que o ato do lesado foi a causa dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo Autor.
63. Dúvidas não há que o ora Recorrente atuou como podia e devia, cumprindo as suas obrigações, mormente as que respeitam aos seus deveres de vigilância, não tendo, por isso praticado qualquer ato ilícito.
64. Dúvidas também não podem existir que o Recorrente demostrou que atuou de forma diligente, atendendo às concretas circunstâncias do caso sub iudice não lhe podendo ser imputada qualquer culpa pelo acidente ocorrido, presunção que logrou ilidir.
65. Por último, também não se pode duvidar que o acidente sub iudice se deveu única e exclusivamente ao comportamento culposo e negligente, o que contribuiu determinantemente para a produção dos danos que vem reclamar e, que por isso, impede que o mesmo tenha qualquer direito à indemnização que infundadamente vem pedir, sempre se dizendo que tão pouco comprovo o nexo de causalidade dos danos que diz ter tido.
66. Pelo exposto, entende-se que a situação fáctica apurada e provada impunham diversa decisão, pelo que, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, devendo, nos termos do art.º 662º, n.º 1 do CPC, proceder-se à alteração a matéria de facto como se defende, proferindo-se Decisão em conformidade.
67. Deste modo, e não se encontrando preenchidos os requisitos de que a lei faz depender a responsabilidade por facto ilícito, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se a Decisão em primeira instância e absolvendo-se o Recorrente com todas as consequências legais 68. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo fez uma errada apreciação e valoração da prova, bem como, uma incorreta aplicação de direito – violou designadamente os artigos 4.º, 7º, 9º e 10º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas (RRCEEEP), aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, alterada pela Lei nº 31/2008, de 17 de Julho, os artigos 483º, 487º, 493º, 563º e 570º do Código Civil, os artigos 17.º e 33.º do Código da Estrada e os artigos 266º, n.º 2 e 22º da Constituição da República Portuguesa - pelo que deve a Decisão proferida ser consequentemente revogada com todas as consequências legais.
SEM PRESCINDIR.
69. A entender-se não haver lugar à alteração da matéria de facto e Decisão em conformidade – o que não se espera – entende-se que, ainda assim, existem fundamentos que determinam a revogação da douta Decisão em análise.
70. De facto, atenta a matéria dada como provada, designadamente o facto de existir na via que estava a ser intervencionada para obras, e no troço que se estende por 7 km, quer no início, quer no fim do indicado troço, um sinal de alerta de obras em curso; um sinal de informação com a inscrição "máquinas em movimento" e com o sinal BT8 -proibição de exceder velocidade máxima de 30 quilómetros por hora, assim como um sinal AT1, indicador de trabalhos na via, era suficiente para qualquer condutor prudente circular com especial cuidado, designadamente mantendo-se dentro da sua faixa de rodagem (alíneas T), U), W) e X) dos FP).
71. Assim sendo, entende-se, com o devido respeito que o Mmº Tribunal não poderia ter concluído no sentido que concluiu: o Recorrente não incumpriu os deveres de vigilância a que está obrigado!
72. Depois, é manifesto que a culpa do acidente se deveu à condução do veículo GF, totalmente imprudente ao colocar os rodados de um veículo numa berma de uma estrada que está em obras, com sinalização demonstrativa dos perigos decorrentes dessas obras (cfr. pontos w), x) dos factos provados), quando circula às 00h20m, numa noite de inverno (cfr. pontos b dos factos provados).
73. Ao determinar-se a circular pela berma, nas referidas circunstâncias, o condutor do veículo sinistrado violou não só norma legais (art.º 17.º e 33.º do Código da Estrada), como também o dever geral de cuidado que sobre si impendia.
74. Assim sendo, entende-se com o devido respeito que o Mmº Tribunal não poderia ter concluído no sentido que concluiu: o Recorrente não incumpriu os deveres de vigilância a que está obrigado – e logrou demonstrá-lo – não tendo ocorrido a prática de qualquer facto ilícito por omissão.
75. Dúvidas não há que o ora Recorrente atuou como podia e devia, cumprindo as suas obrigações, mormente as que respeitam aos seus deveres de vigilância, não tendo, por isso praticado qualquer ato ilícito.
76. Dúvidas também não podem existir que o Recorrente demostrou que atuou de forma diligente, atendendo às concretas circunstâncias do caso sub iudice não lhe podendo ser imputada qualquer culpa pelo acidente ocorrido, presunção que logrou ilidir.
77. Por último, também não se pode duvidar que o acidente sub iudice se deveu única e exclusivamente ao comportamento culposo e negligente, o que contribuiu determinantemente para a produção dos danos que vem reclamar e, que por isso, impede que o mesmo tenha qualquer direito à indemnização que infundadamente vem pedir, sempre se dizendo que tão pouco comprovo o nexo de causalidade dos danos que diz ter tido.
78. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo fez uma errada apreciação e valoração da prova, bem como, uma incorreta aplicação de direito – violou designadamente os artigos 7º, 9º e 10º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas (RRCEEEP), aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, alterada pela Lei nº 31/2008, de 17 de Julho, os artigos 483º e 493º e 570º do Código Civil, os artigos 17º e 33º do Código da Estrada e os artigos 266º, n.º 2 e 22º da Constituição da República Portuguesa, sendo a Decisão ainda nula por força do art.º 615, n.º 1, al. c) do CPC.
79. Deste modo, e não se encontrando preenchidos os requisitos de que a lei faz depender a responsabilidade por facto ilícito, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se a Decisão em primeira instância e absolvendo-se o Recorrente com todas as consequências legais.
Assim e confiando-se no douto suprimento de Vossas Excelências, Deve ser dado provimento ao presente recurso, com todas as consequências legais.
Assim se fazendo inteira Justiça.”

O Autor/M. veio apresentar as suas Contra-alegações relativamente ao Recurso da M.,, S.A., em 14 de setembro de 2020, aí tendo concluído:
“1) O recurso interposto pela Apelante versa sobre a matéria de facto.
2) A apreciação da correta valoração da prova realizada pelo Tribunal ‘a quo’ implica, necessariamente, a apreciação da prova produzida e do julgamento sobre a mesma feito da matéria de facto.
3) Consagra, o artigo 640.º, do CPC, o ónus a cargo da Recorrente, quando impugna a decisão relativamente à matéria de facto, nomeadamente, deve a recorrente especificar obrigatoriamente os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, deve especificar os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou de gravação nele realizada e nesta parte indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso.
4) Porém, os Apelantes nada disso fizeram, pelo que, devem, consequentemente, os recursos intentados pelos Recorrentes serem rejeitados, por violação do disposto nas alíneas a), do n.º 2 e alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 640.º, do CPC. Sem prescindir,
5) Com o devido e muito merecido respeito, não assiste razão aos Recorrentes, pois a douta decisão recorrida não merece qualquer censura, encontrando-se devidamente fundamentada de facto e de direito.
6) O Tribunal ‘a quo’ deu como provados os seguintes factos:
(...)
7) Consagra o n.º 5, do artigo 607.º, do Código de Processo Civil, o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre, segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.
8) Segundo este princípio as provas são valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização ou preocupação do julgador quanto à natureza delas.
9) De modo que, a alteração da decisão da Primeira Instância sobre a matéria de facto restringe-se à (in) existência de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão.
10) A sindicância à convicção do Julgador da Primeira Instância, a realizar por este Venerando Tribunal de recurso, apenas se mostra adequada quando a mesma se apresenta manifestamente contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos.
11) Acontece que, na Motivação da decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal Recorrido fundamentou como baseou a sua convicção, resulta da apreciação conjugada e concatenada dos documentos juntos pelas partes, do depoimento das testemunhas.
12) Assim, a Recorrente não pode apreciar os depoimentos como lhes aprouver, nem transcrever partes desgarradas dos depoimentos das testemunhas, no intuito de retirar aos depoimentos das testemunhas e a todos os documentos juntos aos autos, a força probatória que lhe é legalmente atribuída.
13) Na verdade, o depoimento das testemunhas não pode ser cindido e, ao contrário do que a Recorrente quer fazer crer, os factos em apreço sempre teriam sido dados como provados com base em tais depoimentos e documentos juntos aos autos.
14) A Recorrente levanta falsas questões (factos instrumentais) e pretende, com as suas alegações, suprir as faltas e insuficiências do seu articulado de defesa, bem como, aquando da realização de discussão e julgamento.
15) Dispõe o n.º 2 do artigo 573.º, do CPC desse preceito legal que: “depois da contestação só podem ser deduzidas as exceções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente.”
16) Tal regra vigora, igualmente, no CPTA, mais concretamente, no n.º 3, do artigo 83.º. 17) A Apelante pretender trazer, agora, a questão documentos, que em momento algum do processo, invocou ou juntou, nomeadamente:
-“https://distance.to/Rosem,Marco-de-Canaveses,Porto,PRT/Oliveira-do Douro,Cin%C3A3es,Viseu,PRT; e -“http://m.automobilio.info/pt/fiat/126/126/700-26-ag/4773.
18) Desconhece-se o fundamento e o efeito útil dos documentos inseridos pela Ré com as Alegações de Recurso, os quais não deverão ser admitidos nos termos do disposto no artigo 651º, n.º1 do Código de Processo Civil, mas que se deixam aqui impugnado.
19) Tal junção ofende o exercício do direito ao contraditório do Autor.
20) A questão levantada pela Recorrente quanto à alínea P) dos factos dados como provados é uma falsa questão, porquanto tal factualidade não tem que ser provada exclusivamente com prova documental, bastando para a prova de tal quesito a prova testemunhal, e no caso em apreço, a Douta Sentença baseou-se não só no depoimento da testemunha V. mas também, (como o omite propositadamente a Apelante M. de dizer) no depoimento de J..
21) A convicção do Tribunal “a quo” em dar tal factualidade como provado resultou dos depoimentos prestados pelas testemunhas V. e J.. Ambas as testemunhas confirmaram que o Autor não procedeu à imediata reparação do veículo por não dispor de meios financeiros para o efeito.
Mais afirmou aquela testemunha que entregou ao Autor uma viatura que pensava oferecer à sua filha, para que aquele o pudesse usar nas suas deslocações diárias para o trabalho, bem como para prover a outras necessidades de deslocação com e para a família, como idas ao médico, supermercado e outras, sendo que o Autor pagava à testemunha a quantia mensal de € 150,00 pelo uso de tal veículo.
22) Tudo isto pode este Tribunal Central Administrativo confirmar pelo depoimento da testemunha V. no dia 19.11.2019 de 01:28:12 a 02:31:21 e do depoimento do referido J. de 19.112019 de 00:53:18 a 00:53:32.
23) Assim, face à prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento e apreciada criticamente pela Mm.ª Juiz “a quo”, não só da testemunha V. mas também da testemunha J., depoimentos credíveis, sérios, desinteressados e seguros, deve a alínea P) continuar no rol dos factos provados.
24) Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redação da Lei 41/2013, de 26/6).
25) É, perfeitamente claro e límpido, que na alínea D) dos factos dados provados, trata-se do cruzamento de dois veículos automóvel – carros, que era e ainda é só possível o cruzamento entre esses dois veículos automóvel, caso pelo menos um deles invada, ainda que parcialmente, a respetiva berma.
26) Tal ponto D) foi dado como provado juntamente com os pontos A), B), C) e E), que relatam a dinâmica do acidente, logo descrevem que se trata do cruzamento de dois veículos automóveis de quatro rodas: sendo um ligeiro de passageiro, Renault Clio de matrícula XX-GF-XX e outro ligeiro de passageiro de matricula XX-IN-XX (documentos de fls. PAV e fotos tiradas no dia do acidente)
27) Contrariamente ao alegado pela Ré M., a largura normal de um veículo automóvel, não é a de um FIAT 126(!?), que é um veículo automóvel que já não é produzido desde 1987, além de que o mesmo é o veículo automóvel mais estreito(!), além do facto de que a largura indicada pela Recorrente quanto a tal veículo, não contempla, como podia e devia, a largura do veículo com os espelhos!
28) Assim, em respeito aos deveres de verdade e de cooperação, caso a Ré quisesse de facto colaborar para a Boa Descoberta da Verdade e não atacar sem qualquer fundamento a Douta Sentença, teria, primeiro (à semelhança do que fez para o Fiat 126) que ter dado as larguras dos dois veículos automóveis aqui em causa: o do Autor (Renault Clio – XX-GF-XX) e o da testemunha T (Renault Megan – XX-IN-XX), como resulta perfeitamente claro e límpido dos documentos juntos aos autos, nomeadamente, da participação do acidente e das fotografias do acidente juntas com a pi. sob os n.ºs 3 e 4 a 9;
29) Mas não foi isso que a Apelante fez! Porque não lhe convinha!
30) Sendo a largura de um Renault Clio de, no mínimo, de 1798 mm, e de 1814 mm para o Renault Megane, facilmente se concluiu com um simples calculo aritmético que a soma das larguras dos dois veículos automóveis aqui em causa (3612 mm ou seja, 3,612m), ultrapasse, em muito, a largura de 3,25 m que tinha, na altura, a estrada;
31) Resulta do depoimento de todas as testemunhas que vivem no local, bem como de outras que por lá passaram que no local em causa, só era e continua só possível o cruzamento de dois veículos automóveis caso pelo menos uma deles invada, ainda que parcialmente a respetiva berma.
32) A factualidade descrita no ponto D) ficou provada de acordo com a análise realizada ao documento junto com a petição inicial sob o nº 3 bem como pelo depoimento prestado pelas testemunhas J., T. e J..
33) A testemunha J. revelou conhecimento direto da factualidade em discussão por ser, à data dos factos, o condutor do veículo automóvel envolvido no sinistro. O seu depoimento de forma clara e segura, assim participando na formação do convencimento do Tribunal quanto à veracidade dos factos (gravação de audiência do dia 19.11.2019, às 10-08-37, de 00:32:43 a 01:08:27).
34) a testemunha T. demonstrou igualmente ser conhecedora, por via direta, da factualidade em discussão porquanto conduzia o veículo com matrícula “IN”, com o qual o condutor do veículo sinistrado se cruzou. Esta testemunha, além de ter presenciado o sinistro, prestou um depoimento completamente desinteressado, sério e convicto, motivo que levou o Tribunal a julgar pela veracidade dos factos por si relatados (gravação de audiência do dia 19.11.2019, às 10-08-37, de 01:09:26 a 01:38:21).
35) O mesmo se pode afirmar quanto ao depoimento prestado por J.. Este deslocou-se ao local no dia do sinistro, na qualidade de agente da GNR, tendo elaborado a Participação de Acidente de Viação junta como documento nº 3 da petição inicial, corroborando os factos aí descritos, pelo que atendeu o Tribunal ao por si relatado na decisão quanto à matéria de facto. Todas as testemunhas descreveram, de forma coincidente e sem hesitações, o local onde ocorreu o sinistro, o estado do tempo e as condições da via, frisando que a iluminação pública, apesar de existente, era parca e pouco forte (gravação de audiência do dia 19.11.2019, às 14-18-20, de 00:00:13 a 00:29:51).
36) A testemunha L., no seu depoimento, esclareceu que, atenta a estreiteza da via, duas viaturas só conseguiriam cruzar caso pelo menos uma delas invadisse a berma do seu sentido de trânsito. Esta testemunha tem conhecimento direto dos factos aos quais foi interrogado pelo facto de exercer funções como Chefe da Divisão de Obras junto do 1º Réu e conhecer pessoalmente o local. Depôs de forma desinteressada e segura, com grande credibilidade, assim coadjuvando o Tribunal na formação da sua convicção.
37) O depoimento do representante legal da Apelante, D., não é sério nem credível
38) Mantendo-se a alínea D) nos factos provados, devem improceder as restantes pretensões da Apelante quanto ao aditamento das alíneas FF), GG), HH) e II).
39) Essas alíneas que a Apelante pretende aditar aos factos provados, são numa primeira vertente, questões instrumentais que nada relevam para o caso sub Júdice, num segundo plano, pretende a Recorrente com tal, iludir o Tribunal e afastar do cerne da questão que é a responsabilidades das Rés, pela falta de sinalização da existência do buraco, o que era responsabilidade das RR., e terceiro, ficou perfeitamente claro na realização das audiências de discussão e julgamento, nomeadamente, quer pelos documentos juntos, quer pelo depoimento das testemunhas, T., J., J., I., A. e J. que o embate e consequentes danos na viatura do Autor se deram por falta de sinalização do buraco, que era da responsabilidade das RR.
40) Por sua vez, as alíneas E) a EE) constam de factos dados como provados, porquanto, a convicção do Tribunal “a quo” se formou da seguinte forma:
“A matéria de facto dada como assente nos pontos E) a J) adveio do teor dos documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 3, 4 e 5, bem com do depoimento das testemunhas J., T. e J..
Estas testemunhas, especialmente as duas primeiras, descreveram com clareza e segurança a dinâmica do sinistro, desde o momento do surgimento da viatura que circulava em sentido contrário ao daquela sinistrada, a necessária redução de velocidade para se acercarem às bermas e assim permitir o cruzamento dos veículos, até à queda e embate no buraco existente na berma direita da via. A existência do referido buraco, bem como a descrição das suas dimensões, além de ter sido atestada pelas indicadas testemunhas, com especial relevo para o depoimento prestado por J., agente da GNR, foi também confirmada pelas fotografias juntas aos autos pelo Autor.
Também estas testemunhas foram firmes ao atestar que não dispunha o referido buraco de qualquer sinalização, designadamente, mecos ou fitas ao seu redor.
Por outro lado, os factos descritos nos pontos K) a N) resultaram provados atento o conteúdo dos documentos juntos com a petição inicial sob os números 6, 7, 8, 9 e 14, os depoimentos das testemunhas J., T. e J., e ainda das testemunhas V. e J..
A testemunha V. revelou conhecer diretamente a factualidade à qual foi questionada por ser sogra do Autor, e com o mesmo coabitar, tendo descrito de forma detalhada os danos que o veículo apresentava, em virtude do sinistro ocorrido.
Também a testemunha J. confirmou tais danos visíveis, uma vez que se deslocou ao local logo após a ocorrência do sinistro, por viver nas redondezas do local onde o mesmo se deu.
Ambas as testemunhas depuseram de forma clara, desinteressada e séria, convencendo o Tribunal da veracidade dos factos por si relatados.
Todas as testemunhas descreverem os danos apresentados na viatura na parte frontal e direita, atestando que o veículo ficou imobilizado de imediato. Tais danos ficam ainda patentes por análise das fotografias juntas aos autos, pela descrição sumária constante da PAV e ainda pelo orçamento de reparação apresentado nos autos, pelo que os deu o Tribunal como provados.
Os factos dados como provados nos pontos O) e P) resultaram dos depoimentos prestados pelas testemunhas V. e J.. Ambas as testemunhas confirmaram que o Autor não procedeu à imediata reparação do veículo por não dispor de meios financeiros para o efeito.
Mais afirmou aquela testemunha que entregou ao Autor uma viatura que pensava oferecer à sua filha, para que aquele o pudesse usar nas suas deslocações diárias para o trabalho, bem como para prover a outras necessidades de deslocação com e para a família, como idas ao médico, supermercado e outras, sendo que o Autor pagava à testemunha a quantia mensal de €150 pelo uso de tal veículo.
Já a factualidade vertida nos pontos Q) e R) foi dada como provada tendo em consideração o depoimento da testemunha J..
Esta testemunha foi clara e perentória em afirmar que o Autor temeu gravemente pelo seu bem-estar com o sinistro, uma vez que seguia na viatura como “pendura”. Descreveu que a porta do lado direito da viatura ficou encravada, vendo-se o Autor obrigada a sair da mesma pelo lado do condutor, tendo ficado muito abalado com o sucedido no período seguinte. Afirmou que tais sentimentos de tristeza e abatimento se agudizaram durante um largo período de tempo, uma vez que ficou privado do uso do carro, apesar de continuar a pagar as prestações mensais resultantes do contrato de locação financeira celebrado com uma instituição bancária.
Esta factualidade saiu corroborada pelo depoimento da testemunha A., conhecedor de tal matéria por ser o empregador do Autor até ao ano de 2019.
Depôs de forma clara e segura, bem como desinteressada, tendo o Tribunal atendido ao por si relatado na formação da sua convicção.
Continuando, a factualidade dada como assente no ponto S) resultou da análise feita ao documento junto com a petição inicial sob o nº 3, cujo conteúdo foi corroborado pela testemunha J..
Aquela dada como assente nos pontos T) a V) adveio do constante nos documentos juntos com a contestação do 1º Réu sob os nºs 1 a 4, ao passo que aquela dada como assente no ponto W) resultou já do teor dos documentos juntos com tal articulado sob os nºs 5 e 6.
Esta factualidade foi ainda corroborada pelas testemunhas T., V., J., L. e H..
Esta testemunha revelou conhecimento direto destes factos aos quais foi questionado, uma vez que exercia funções de fiscalização da obra realizada pela 2ª Ré, a mando e por ordem do 1º Ré.
Depôs de forma clara e séria, coadjuvando o Tribunal na formação da sua convicção.
Todas as testemunhas afirmaram que a sinalização existente na obra se limitava ao aviso de obras em curso ao longo de 7 km, no início e no fim, sendo que por vezes algumas placas estivessem deitadas no chão.
Por fim, a matéria de facto dada como assente no ponto X) resultou de acordo das partes, ao passo que aquela dada como assente no ponto Y) adveio da análise feita ao documento junto com a contestação da 2ª Ré sob o nº 1.
Os factos dados como provados nos pontos Z) a BB) resultaram do teor dos documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 10 a 13, e aqueles dados como provados nos pontos CC) e DD) resultaram já, respetivamente, dos documentos junto sob o nº 10 com a contestação do 1º Réu e sob o nº 2 com a contestação da 2ª Ré.
Finalmente, a factualidade dada como assente no ponto EE) adveio de fls. 1 e seguintes dos presentes autos. “
41) Concluindo-se, assim, que deve ser indeferida a pretensão da Recorrente e manter-se as alíneas A) a EE) da factualidade dada como provada e com o teor dado na Douta Decisão, bem como, aos pontos 1) a 3) dos factos não provados, como melhor consta da fundamentação da Sentença.
42) Quanto à pretensão da Apelante quanto à alteração/correção da redação das alíneas H), X), B) e Y) dos factos dados como provados, deve a mesma não ter provimento, porquanto, são infundadas e irrelevantes.
43) Consagra o n.º 5, do artigo 607.º, do Código de Processo Civil, o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre, segundo o qual o Tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.
44) Segundo este princípio as provas são valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização ou preocupação do julgador quanto à natureza delas.
45) A eventual alteração da decisão da Primeira Instância sobre a matéria de facto restringe-se à (in) existência de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão.
46) Acontece que, na Motivação da decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal Recorrido fundamentou como baseou a sua convicção, resulta da apreciação conjugada e concatenada dos documentos juntos pelas partes, dos depoimentos de parte prestados e pelos depoimentos das testemunhas.
47) A Recorrente não pode apreciar os depoimentos como lhes aprouver, nem transcrever partes desgarradas dos depoimentos das testemunhas, nem acrescentar documento elaborado não se sabe por quem nem como, no intuito de retirar à confissão, aos depoimentos das testemunhas e a todos os documentos juntos aos autos, a força probatória que lhe é legalmente atribuída.
48) O Tribunal “a quo” foi criterioso na apreciação da prova testemunhal e documental, sério e justo na decisão – foi feita a devida justiça.
49) Não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objeto de impugnação não forem suscetíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 130º e 131º, todos do C.P.C.).
50) O uso, pelo Tribunal Central Administrativo, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve verificar-se quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados, nomeadamente por os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, imporem uma conclusão diferente (prevalecendo, em caso contrário, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova).
51) Ora, no caso sub Júdice, a Douta Sentença encontra-se devidamente fundamentada e motivada, respeitou os princípios da livre apreciação da prova e da imediação.
52) O princípio da imediação exige uma relação de proximidade (física e temporal) entre os intervenientes processuais e o tribunal, de modo a que este possa ter uma perceção própria (e autorizada) dos elementos que servirão de base para a fundamentação da decisão jurisdicional.
53) A Douta Sentença encontra-se devidamente fundamentada, nada havendo a apontar, transparecendo na mesma todo o raciocínio e lógica seguidos e os elementos probatórios tidos em conta para a formação da sua convicção.
54) O que a Recorrente pretende, no fundo, é que haja um novo julgamento por parte do Tribunal Central Administrativo, quando este tem que verificar a legalidade da decisão recorrida na forma como apreciou a prova e nos segmentos concretos indicados pela Recorrente. Isto porque existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em 1.ª Instância e a efetuada em Tribunal de recurso com base nas transcrições dos depoimentos.
55) A sensibilidade à forma como a prova testemunhal se produz, e que se fundamenta num conhecimento das reações humanas e análise dos comportamentos psicológicos que traçam o perfil da testemunha, só logra obter concretização através do princípio da imediação, considerado este como a relação de proximidade entre o Tribunal e os participantes, de modo a que aquele possa obter uma perceção própria do material que haverá de ter como base da decisão.
56) Quando a opção do Julgador se centra e elementos diretamente interligados com o princípio da imediação (por exemplo, quando o Julgador refere que os depoimentos não foram convincentes num determinado sentido em consequência da forma como forma produzidos) o Tribunal de Recurso não tem a possibilidade de sindicar a aplicação concreta de tal princípio.
57) Em síntese, deve manter-se, nos seus precisos termos, a matéria de facto fixada pelo Tribunal da Primeira Instância.
58) Pretende a Recorrente fazer crer, nas suas alegações, que foi o condutor do veículo automóvel do Autor quem violou normativos legais (nomeadamente do Código da Estrada),
59) tentando, dessa forma, enganar o tribunal de Recurso afastando do cerne da questão que é A FALTA DE SINALIZAÇÃO DO BURACO QUER ERA OBRIGAÇÃO DOS RÉUS QUE VIOLARAM TAL OBRIGAÇÃO.
60) A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas está consagrada constitucionalmente, no artigo 22º, sendo que, em termos de legislação ordinária, o mesmo instituto tem, atualmente, o seu regime jurídico descrito na Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro.
61) Tendo os factos em que o Autor estriba a sua pretensão indemnizatória ocorridos a 25/12/2016, assim, atentando que a Lei nº 67/2007 iniciou a sua vigência em 31/01/2008, conclui-se que a atuação dos Réus a 25/12/2016, e que o Autor reputa de ilícita, culposa e danosa, se insere na atividade de gestão pública da Administração, concretamente, o que determina a aplicação daquele regime para apuramento de qualquer responsabilidade.
62) De acordo com o disposto no artigo 7º, nº1, do regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela referida Lei nº 67/2007: “O Estado e demais pessoas coletivas de direito público são exclusivamente responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício”.
63) Pelo que, conclui-se que a responsabilidade civil das pessoas coletivas públicas por factos ilícitos corresponde, no essencial, ao conceito civilista da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, regulado nos artigos 483º e seguintes do Código Civil.
64) Ou seja, a responsabilidade dos Réus, pela prática de factos ilícitos, está sujeita à verificação dos seguintes pressupostos: facto ilícito e culposo, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano.
65) São pressupostos cumulativos, e como melhor resulta da douta Decisão encontram-se devidamente preenchidos e comprovados no caso sub Júdice.
66) FACTO - é o elemento básico da responsabilidade, para que exista dever de indemnizar, é necessário que o facto seja controlável, dominável pela vontade, podendo consistir tanto num ato ou ação (num facto positivo), como também numa omissão (facto negativo).
67) “Para que a omissão gere o dever de indemnizar, é forçoso que haja um dever jurídico de praticar um ato que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação do dano (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª ed., Almedina, 2003, pág. 527 e 528). Nas palavras de Pessoa Jorge (Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Almedina, 1999, pág. 69 e seg.), é indispensável que em questão esteja a omissão de um comportamento devido. A omissão de um comportamento devido ocorre quando sucede o incumprimento de um dever jurídico, ou seja, quando o sujeito não emprega a diligência suficiente para o cumprimento do seu dever (em consonância com um conceito de diligência normativa). Este princípio sai reforçado atento o disposto no artigo 486º do Código Civil.”
68) ILICITUDE - traduz-se num juízo de antijuridicidade incidente sobre a conduta geradora do dano. Sendo assim, a conduta do agente é considerada objetivamente, como negação dos valores tutelados pela ordem jurídica. O carácter antijurídico do facto tem duas fontes: a violação de um direito subjetivo de outrem ou a violação da lei que protege interesses alheios.
69) “O facto é também ilícito se verter a infração de uma norma destinada a proteger interesses alheios. Essa norma tem como finalidade evitar ou minorar o perigo de dano, em abstrato, não tendo a sanção ao infrator apenas uma função reparadora, mas também funções preventivas, de carácter geral e especial), sendo certo que, esta variante de ilicitude obriga à verificação de outros requisitos (assim, a lesão dos interesses do particular tem de ser originada pela violação de uma norma legal, cujo fim também tenha em vista a consideração daqueles interesses). O dano tem de se registar no círculo de interesses privados que a lei visa tutelar, isto é, estes interesses têm de pertencer ao horizonte que o legislador teve em vista proteger com o fim da norma. No que tange à responsabilidade da Administração, a Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, considera ilícitas as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos. O alcance deste ilícito é, contudo, mais lato do que o que consta do artigo 483º do Código Civil, já que envolve atos jurídicos ou materiais que infrinjam quaisquer normas, princípios ou até regras de ordem técnica ou prudência. De acordo ainda com a mesma lei, “a culpa dos titulares de órgãos, funcionários e agentes deve ser apreciada pela diligência e aptidão que seja razoável exigir, em função das circunstâncias de cada caso, de um titular de órgão, funcionário ou agente zeloso e cumpridor”, “sem prejuízo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos” (cfr. artigo 10º).”
70) CULPA – “tem de ser aferida, pois, pela diligência exigível a um funcionário ou agente típico, ou seja, um funcionário ou agente zeloso que atua com respeito pela lei, sendo que, sem prejuízo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos. Neste ponto, importa referir que, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 10º da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, presume-se a culpa leve, por aplicação dos princípios gerais da responsabilidade civil, sempre que tenha havido incumprimento de deveres de vigilância.
71) De acordo com as previsões constantes dos artigos 23º, 24º e 33º, nº 1, alíneas ee) e qq), da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro (doravante Regime Jurídico das Autarquias Locais, ou RJAL, a manutenção e fiscalização da segurança rodoviária de uma via municipal sita no concelho de (...) compete ao 1º Réu.
72) Mais, a Lei n º 2110 de 19/08/61 (Regulamento Geral das Estradas e Caminhos Municipais), na redação do Decreto-Lei nº 369/77, de 1 de Setembro (em vigor à data dos factos), dispõe no seu artigo 2º: “É das atribuições das câmaras municipais a construção, conservação reparação das estradas e caminhos municipais”.
73) Existe o dever por parte das autarquias locais de proceder à manutenção, reparação e sinalização das vias sob a sua jurisdição.
74) Não podendo o 1º Réu julgar-se dispensado dos deveres de manutenção e fiscalização da segurança da referida via pelo simples facto de estar a mesma a ser intervencionada no âmbito de uma empreitada de repavimentação e requalificação, empreitada essa adjudicada à 2ª Ré, já que quaisquer disposições contratuais estabelecidas entre estes não são oponíveis ao Autor.
75) Como resulta do caderno de encargos aprovado para a realização da identificada empreitada, incumbia a 2.ª Ré, aqui Apelante a realização de todos os trabalhos necessários para garantir a segurança de todas as pessoas que circulem no local intervencionado, por forma a evitar danos.
76) Não pode a 2ª Ré julgar-se dispensada de observar tais deveres pelo mero facto de estar a obra suspensa, porquanto tal suspensão apenas gera a não continuação da execução da obra e a eventual prorrogação do prazo para o seu término, que não a dispensa de garantir as condições de segurança das obras e respetivos materiais e equipamentos.
77) No caso do autos, era sobre os Réus que incumbia a obrigação de manutenção da via pública em condições de segurança de circulação. “Na verdade, enquanto entidade responsável pela criação, gestão, manutenção e fiscalização, no caso do 1º Réu, e enquanto empreiteira incumbida de realizar as obras de repavimentação e requalificação daquela via de trânsito, no caso da 2ª Ré, são-lhes impostas múltiplas obrigações no sentido de manter padrões de qualidade rodoviária elevados, bem como o dever de assegurar boas condições de segurança.”
78) Assim, há ilicitude por parte dos Réus, porquanto “à luz do artigo 9º da citada Lei nº 67/2007, consideram-se ilícitos: “(…) as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos (…)”.
79) Os Réus não conseguiram demonstrar que a culpa na verificação do acidente se tivesse ficado a dever ao comportamento do condutor do veículo automóvel de matrícula GF. Não resultou provado que, aquando do embate com o buraco, o condutor do veículo conduzisse com excesso de velocidade, MAS PELO CONTRÁRIO, foi dado como provado que, conduzindo a cerca de 35 km/hora, o mesmo travou e reduziu a velocidade, para poder realizar a manobra de cruzamento com um veículo que circulava em sentido oposto.
80) Igualmente, não resultou provado que a iluminação pública existente fosse suficiente para que um condutor, com a diligência razoavelmente exigível, pudesse vislumbrar o referido buraco antes de no mesmo cair.
81) Por outro lado, também, não foi dado como provado que o surgimento de tal buraco tenha ocorrido devido a atos de terceiros, particulares (não sendo suficientes meras suposições quanto ao que o terá sucedido)
82) Por fim, para a elisão da presunção de culpa dos Réus, não é suficiente a alegação de que o condutor do veículo teria violado as regras estradais ao colocar os rodados na berma (isto porque, “atento o cruzamento de veículos, e uma vez que não havia espaço suficiente na via, era possível a utilização do espaço da berma, sendo aliás tal manobra a adequada e prudente, atentas as circunstâncias e condições da via naquele dia, hora e local”) – artigo 10.º, n.º 3, da Lei 67/2007.
83) Desta feita, resulta claro que os Réus incumpriram as suas obrigações de manutenção da via pública em condições de segurança de circulação.
84) Pelo que, devem os Réus responder pelos danos que tenham sido causados pelo embate do veículo sinistrado nos autos no buraco, isto é, em relação aos quais exista uma relação direta e necessária entre a sua conduta e os danos originados.
85) Verificando-se um concurso de causas adequadas e simultâneas, o incumprimento das respetivas obrigações por parte de cada um dos Réus, qualquer deles é responsável pela reparação de todo o dano, por força do regime da solidariedade consagrado no artigo 497° do Código Civil.
86) Ficou definido o sinistro e estabelecido o nexo de imputação com a conduta dos Réus.
87) Os danos do Autor resultantes dessa violação dos deveres dos Réus e consequente obrigação destes indemnizar o lesante/Autor, resultam do infra explicado.
88) O artigo 562° do Código Civil determina que a obrigação de indemnizar se oriente no sentido da reconstituição da situação que existiria na esfera do lesado se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (teoria da diferença).
89) Tal implica uma operação mental tendente a estabelecer o nexo de causalidade entre os danos verificados e a lesão sofrida, a qual se deverá nortear pelo critério da causalidade adequada, subjacente ao artigo 563° do CC, de acordo com o qual, “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
90) pelo que, de acordo com tal, só serão de considerar os danos que, cumulativamente, constituam efeito natural, necessário da lesão e consequência normal da mesma, desencadeada por um processo factual típico, dentro das regras da experiência comum.
91) Como doutamente e bem decidido na sentença do tribunal “a quo”: “…..a este propósito, cumpre notar que os danos sofridos pelo Autor derivado do acidente se traduzem, no caso, e como resultou provado, no valor que terá de ser suportado com a reparação do veículo acidentado, que se cifra na importância de € 8.259,52.”
92) Mais: “Resultou ainda provado que o Autor se vê privado do uso do veículo automóvel desde a data do sinistro, 25/12/2016, até ao momento presente. A privação do uso do veículo por tal período de tempo, e que o Autor utilizava para as suas deslocações quotidianas, no cumprimento das suas responsabilidades profissionais e pessoais, é um dano ao qual deve corresponder uma indemnização autónoma, independentemente dos danos emergentes, e à luz do previsto no artigo 562º do Código Civil, como tem vindo a ser defendido unanimemente pela jurisprudência dos tribunais superiores portugueses (neste sentido, e a título de mero exemplo, leia-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05/07/2018, P. 176/13.7T2AVR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt). Como resultou do probatório coligido, passou o Autor a utilizar um veículo que lhe foi cedido para o efeito pela sua sogra, procedendo ao pagamento, em contrapartida de tal uso, de uma quantia mensal de € 150,00. Assim, e atento o período decorrido desde a data do sinistro até à data da propositura de ação, terá o Autor direito a ser indemnizado de tal dano pelo valor de €1.500,00, o que desde já se declara.”
93) Continuando: “Por fim, peticiona ainda o Autor o pagamento de uma compensação por danos não patrimoniais no valor não inferior a €1.000, atento o abalo psicológico por si suportado em consequência do sinistro. No respeitante aos danos de natureza não patrimonial reclamados, cumpre recordar que, nos termos do disposto no artigo 496º do Código Civil, são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, sendo que dano é "todo o prejuízo, desvantagem ou perda que é causado nos bens jurídicos, de carácter patrimonial ou não, de outrem”.
Os danos morais resultam assim da lesão de bens estranhos ao património do lesado (a integridade física, a saúde, a tranquilidade, o bem-estar físico e psíquico, a liberdade, a honra, a reputação), verificando-se quando são causados sofrimentos físicos ou morais, perdas de consideração social, inibições ou complexos de ordem psicológica, vexames, entre outros, em consequência de uma lesão de direitos, maxime, de personalidade (ver Mota Pinto, Teoria geral do direito Civil, págs. 85 e 86, edª de 1976). Ora, constitui orientação jurisprudencial consolidada que as simples contrariedades ou incómodos apresentam um nível de gravidade objetiva insuficiente para os efeitos do nº 1 do artigo 496º do CC (neste sentido, e a título de mero exemplo, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07/11/2018, P. 158/16.7T8SRQ.L2-4, disponível em www.dgsi.pt). Como tal, não são merecedores da tutela do direito os meros incómodos, as tristezas, indisposições, preocupações e arrelias comuns, que não ultrapassem a barreira da excecionalidade e da inexigibilidade em termos de resignação, segundo critérios objetivos de avaliação. No caso ora em apreço, o Autor logrou demonstrar que, em virtude do sinistro, suportou um abalo psicológico, tendo temido pela sua integridade física e bem-estar, uma vez que seguia no veículo, no lugar de passageiro dianteiro. Mais resultou provado que, durante vários meses, no período imediatamente seguinte ao do sinistro, sofreu de ansiedade e de tristeza, pelo facto de se ver privado do uso do seu veículo, cujas rendas mensais continuou a pagar à instituição financeira com a qual tinha celebrado o contrato de locação de longa duração. Este sofrimento, de natureza psicológica, merece a tutela do Direito, impondo-se a sua consideração, apesar de tudo, de gravidade moderada, atento o facto de não ter cariz de perpetuidade, e de ter vindo a ser ultrapassado, não se podendo olvidar que não ficou provado qualquer dolo na atuação dos Réus.
Nestes termos, atentos os montantes que têm vindo a ser fixados por jurisprudência superior, bem como o teor dos artigos 494º e 496º, nº 4, ambos do Código Civil, entende-se como equitativa a quantificação deste montante de indemnização em €400.”
94) Assim, muito bem andou o Tribunal “a quo” ao decidir como decidiu: “Nestes termos, será devida ao Autor uma indemnização global de € 11.119,52, absolvendo-se os Réus do demais peticionado, o que desde já se declara. Ao abrigo do estatuído nos artigos 804º, 805º, nºs 1 e 3, e 806º, todos do Código Civil, são devidos também juros de mora legais, desde a citação até efetivo e integral pagamento. “
95) O recurso da matéria de facto não visa a obtenção de um segundo julgamento sobre aquela matéria, mas é antes uma forma de obviar a eventuais erros ou incorreções cometidos na decisão recorrida.
96) No caso sub Júdice, não há erros nem incorreções cometidos na Douta Sentença, muito menos na forma como apreciou a prova.
97) Em síntese, deve manter-se, nos seus precisos termos, a matéria de facto fixada pelo Tribunal da Primeira Instância.
98) O Tribunal da Primeira Instância não incorreu em erro na apreciação da prova nem de direito, devendo manter-se a decisão sobre a matéria de facto, bem como a decisão de direito.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se a douta Sentença recorrida, POR SER DE INTEIRA JUSTIÇA.”

O Autor/M. veio apresentar as suas Contra-alegações relativamente ao Recurso do Município de (...), em 19 de setembro de 2020, aí tendo concluído:

“1) O recurso interposto pela Apelante versa sobre a matéria de facto.
2) A apreciação da correta valoração da prova realizada pelo Tribunal ‘a quo’ implica, necessariamente, a apreciação da prova produzida e do julgamento sobre a mesma feito da matéria de facto.
3) Consagra, o artigo 640.º, do CPC, o ónus a cargo da Recorrente, quando impugna a decisão relativamente à matéria de facto, nomeadamente, deve a recorrente especificar obrigatoriamente os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, deve especificar os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou de gravação nele realizada e nesta parte indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso.
4) Porém, os Apelantes nada disso fizeram, pelo que, devem, consequentemente, os recursos intentados pelos Recorrentes serem rejeitados, por violação do disposto nas alíneas a), do n.º 2 e alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 640.º, do CPC. SEM PRESCINDIR
5) Com o devido e muito merecido respeito, não assiste razão aos Recorrentes, pois a douta decisão recorrida não merece qualquer censura, encontrando-se devidamente fundamentada de facto e de direito.
6) O Tribunal ‘a quo’ deu como provados os seguintes factos:
“A) O Autor é locatário do veículo automóvel da marca Renault, modelo Clio 1.5 DCI Dynamique S, com a matrícula XX-GF-XX, qualidade que lhe advém da celebração de um contrato designado de “locação operacional – aluguer de equipamento”, com o “B., S.A.”;
B) A 25/12/2016, pelas 00h20m, J., cunhado do Autor, conduzia o veículo GF na Rua de (...), em (...), no sentido Igreja de Oliveira-Montão, a uma velocidade de cerca de 35km/h, e o tempo apresentava-se bom;
C) No local em causa, a estrada é estreita, com cerca de 3.25 metros de largura, e, apesar de estar dotada de iluminação pública, a mesma não é muito forte e é esparsa;
D) No local em causa, só é possível o cruzamento de duas viaturas caso pelo menos uma delas invada, ainda que parcialmente, a respetiva berma;
E) A dada altura da marcha, o condutor do veículo GF deparou-se com a presença de outro veículo, que circulava em sentido contrário, com a matrícula XX-IN-XX, conduzido por T.;
F) Para tornar possível o cruzamento das viaturas sem embates, ambos os condutores reduziram a velocidade e viram-se obrigados a ocupar as respectivas bermas da via de circulação;
G) Em consequência, o condutor do veículo GF viu-se obrigado a circular com as rodas do lado direito sobre parte da berma da estrada;
H) Nesse mesmo local, a berma direita da estrada, no sentido de marcha do veículo GF, apresentava um grande buraco, com cerca de 1 metro de comprimento e 50 centímetros de profundidade;
I) O referido buraco não estava sinalizado ou vedado;
J) Ao circular pela berma da estrada, o condutor do veículo GF caiu no identificado buraco, tendo este acabado por se imobilizar um pouco mais à frente, ocupando parcialmente a faixa de rodagem contrária;
K) Em consequência de tal queda, o veículo GF ficou com a direção partida, bem como os braços de suspensão esquerdo e direito, os amortecedores e a caixa de direção assistida;
L) Ainda em virtude da descrita queda, rebentaram os pneus direito e esquerdo da frente do veículo GF, ficando os calços e discos de travão inutilizados, mais se tendo partido o para-choques da frente, o farol direito, o guarda-lamas frontal direito, o retrovisor exterior direito, o friso e as dobradiças da porta direita da frente;
M) Também em consequência da queda no buraco, os airbags da viatura GF foram acionados, ficando o seu comando danificado, o que partiu o para-brisas, o tablier, mais danificando os tensores de todos os cintos de segurança da frente e da traseira;
N) Para a reparação da viatura GF, bem como a aquisição das peças de substituição necessárias, terá o Autor de despender a quantia de € 8.259,52;
O) O Autor não procedeu ainda à reparação do veículo por não dispor de meios financeiros para o efeito;
P) A partir da data do sinistro, e para as suas deslocações diárias para o trabalho, bem como outras para acudir às necessidades da vida privada, o Autor passou a utilizar um veículo automóvel propriedade da sua sogra, pagando-lhe, em contrapartida de tal uso, a quantia mensal de € 150,00;
Q) Em virtude do sinistro ocorrido a 25/12/2016, o Autor, que seguia no veículo como passageiro da frente, sofreu de um profundo susto, temendo pelo seu bem-estar, vendo-se obrigado, atenta a força do embate, a sair do veículo pelo lado do condutor;
R) Ainda em resultado do sinistro, o Autor sentiu-se triste a abatido, uma vez que estimava o veículo automóvel, do qual se viu privado desde a data do sinistro;
S) A Guarda Nacional Republicana foi chamada ao local e lavrou o auto competente;
T) À data do sinistro, a via designada “Rua (...)” encontrava-se em obras de repavimentação e requalificação, no âmbito de um contrato de empreitada denominada “Repavimentação e Requalificação da E.M. de (...) a (...)”;
U) A empreitada referida em T) foi adjudicada pelo 1º Réu à 2ª Ré a 21/07/2016, na sequência de procedimento concursal lançado para o efeito, tendo o respetivo contrato sido celebrado a 03/08/2016, e consistia em limpeza de taludes, valetas, ermas e pavimentação da via, bem como a execução de valetas e respetiva colocação de sinalização vertical;
V) Do caderno de encargos posto a concurso para a execução da referida empreitada constavam, designadamente, as seguintes cláusulas: “(…) Cláusula 6ª – Preparação e planeamento da execução da obra. (…) 3 – O empreiteiro realiza todos os trabalhos que, por natureza, por exigência legal ou segundo o uso corrente, sejam considerados como preparatórios ou acessórios à execução da obra, designadamente: (…) b) Trabalhos necessários para garantir a segurança de todas as pessoas que trabalhem na obra ou que circulem no respetivo local, incluindo (…) terceiros em geral, para evitar danos nos prédios vizinhos e satisfazer os regulamentos de segurança, higiene e saúde no trabalho e de polícia das vias públicas; (…). Cláusula 21ª – Outros encargos do empreiteiro. 1. Correm inteiramente por conta do empreiteiro a reparação e indemnização de todos os prejuízos que, por motivos que lhe sejam imputáveis, sejam sofridos por terceiros até receção definitiva dos trabalhos em consequência do modo de execução destes últimos (…), da atuação do pessoal do empreiteiro ou dos seus subempreiteiros e fornecedores e do deficiente comportamento ou da falta de segurança das obras, matérias, elementos de construção e equipamentos; (…)”;
W) O troço da via em obras estende-se por 7 km, existindo, quer no início, quer no fim do indicado troço, um sinal de alerta de obras em curso;
X) Próximo do local onde ocorreu o sinistro, existia também um sinal de informação com a inscrição “máquinas em movimento” e com o sinal BT8 – proibição de exceder velocidade máxima de 30 quilómetros por hora, assim como um sinal AT1, indicador de trabalhos na via;
Y) À data da ocorrência do alegado sinistro, a execução da empreitada encontrava-se suspensa, por deliberação camarária datada de 12/12/2016, por falta de condições climatéricas adequadas ao prosseguimento dos trabalhos, concretamente, para a pavimentação da via;
Z) A 28/12/2016, e na sequência do sinistro ocorrido, o Autor enviou uma missiva ao 1º Réu, por carta registada com aviso de receção, informando-o do sucedido e solicitando diligências no sentido de resolver a situação;
AA) Não obtendo resposta à missiva enviada, a 23/01/2017 o Autor remeteu mensagens de correio eletrónico ao 1º Réu, enviando cópia do orçamento de reparação, e solicitando a resolução da questão;
BB) A 08/03/2017, o Autor interpelou ambos os Réus, através de cartas registadas com aviso de receção, reclamando-lhes que procedessem à reparação dos danos sofridos na sua viatura;
CC) A 24/01/2017, o 1º Réu remeteu à 2ª Ré a comunicação que lhe foi enviada pelo Autor a 23/01/2017;
DD) A 01/03/2017, a 2ª Ré enviou uma missiva ao 1º Réu, relativamente ao sinistro denunciado pelo Autor, afirmando não lhe ser possível avaliar a relação causa efeito dos eventuais danos reclamados com o que vem referido nas declarações que o queixoso prestou na GNR, mais afirmando que, à data, a execução dos trabalhos se encontrava suspensa;
EE) A petição inicial foi apresentada neste Tribunal a 19/12/2017. “
7) Os pontos D), F) e G) foram dados como provados juntamente com os pontos A), B), C) e E), que relatam a dinâmica do acidente, logo descrevem que se trata do cruzamento de dois veículos automóveis: sendo um ligeiro de passageiro, Renault Clio de matricula XX-GF-XX e outro ligeiro de passageiro de matricula XX-IN-XX (documentos de fls. PAV e fotos tiradas no dia do acidente).
8) Resulta do depoimento de todas as testemunhas que vivem no local, bem como de outras que por lá passaram que no local em causa, só era e continua só possível o cruzamento de dois veículos automóveis caso pelo menos um deles invada, ainda que parcialmente a respetiva berma.
9) A factualidade descrita no ponto D), F) e G) ficou provada de acordo com a análise realizada ao documento junto com a petição inicial sob o nº 3 bem como pelo depoimento prestado pelas testemunhas J., T. e J..
10) A testemunha J. revelou conhecimento direto da factualidade em discussão por ser, à data dos factos, o condutor do veículo automóvel envolvido no sinistro.
O seu depoimento de forma clara e segura, assim participando na formação do convencimento do Tribunal quanto à veracidade dos factos (gravação de audiência do dia 19.11.2019, às 10-08-37, de 00:32:43 a 01:08:27).
11) A testemunha T. demonstrou igualmente ser conhecedora, por via direta, da factualidade em discussão porquanto conduzia o veículo com matrícula “IN”, com o qual o condutor do veículo sinistrado se cruzou. Esta testemunha, além de ter presenciado o sinistro, prestou um depoimento completamente desinteressado, sério e convicto, motivo que levou o Tribunal a julgar pela veracidade dos factos por si relatados (gravação de audiência do dia 19.11.2019, às 10-08-37, de 01:09:26 a 01:38:21).
12) O mesmo se pode afirmar quanto ao depoimento prestado por J..
Este deslocou-se ao local no dia do sinistro, na qualidade de agente da GNR, tendo elaborado a Participação de Acidente de Viação junta como documento nº 3 da petição inicial, corroborando os factos aí descritos, pelo que atendeu o Tribunal ao por si relatado na decisão quanto à matéria de facto. Todas as testemunhas descreveram, de forma coincidente e sem hesitações, o local onde ocorreu o sinistro, o estado do tempo e as condições da via, frisando que a iluminação pública, apesar de existente, era parca e pouco forte (gravação de audiência do dia 19.11.2019, às 14-18-20, de 00:00:13 a 00:29:51).
13) A testemunha L., no seu depoimento, esclareceu que, atenta a estreiteza da via, duas viaturas só conseguiriam cruzar caso pelo menos uma delas invadisse a berma do seu sentido de trânsito. Esta testemunha tem conhecimento direto dos factos aos quais foi interrogado pelo facto de exercer funções como Chefe da Divisão de Obras junto da Recorrente e conhecer pessoalmente o local. Depôs de forma desinteressada e segura, com grande credibilidade, assim coadjuvando o Tribunal na formação da sua convicção.
14) Manter as alíneas manter as alíneas D), F, e G) nos factos provados, devem improceder as restantes pretensões da Apelante quanto ao aditamento das alíneas FF), GG), HH), II) e JJ).
15) Essas alíneas que a Apelante pretende aditar aos factos provados, são numa primeira vertente, questões instrumentais que nada relevam para o caso sub Júdice, segundo, pretende a Recorrente com tal, iludir o Tribunal e afastar do cerne da questão que é da responsabilidades das Recorrentes, pela falta de sinalização da existência do buraco, terceiro, ficou perfeitamente claro na realização das audiências de discussão e julgamento, nomeadamente, quer pelos documentos juntos, quer pelo depoimento das testemunhas, T., J., J., I., A. e J. que o embate e consequentes danos na viatura do Autor se deram por falta de sinalização do buraco, que era da responsabilidade das Recorrentes.
16) Por sua vez, as alíneas E) a EE) constam de factos dados como provados, porquanto, a convicção do Tribunal “a quo” se formou da seguinte forma:
“A matéria de facto dada como assente nos pontos E) a J) adveio do teor dos documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 3, 4 e 5, bem com do depoimento das testemunhas J., T. e J..
Estas testemunhas, especialmente as duas primeiras, descreveram com clareza e segurança a dinâmica do sinistro, desde o momento do surgimento da viatura que circulava em sentido contrário ao daquela sinistrada, a necessária redução de velocidade para se acercarem às bermas e assim permitir o cruzamento dos veículos, até à queda e embate no buraco existente na berma direita da via. A existência do referido buraco, bem como a descrição das suas dimensões, além de ter sido atestada pelas indicadas testemunhas, com especial relevo para o depoimento prestado por J., agente da GNR, foi também confirmada pelas fotografias juntas aos autos pelo Autor.
Também estas testemunhas foram firmes ao atestar que não dispunha o referido buraco de qualquer sinalização, designadamente, mecos ou fitas ao seu redor.
Por outro lado, os factos descritos nos pontos K) a N) resultaram provados atento o conteúdo dos documentos juntos com a petição inicial sob os números 6, 7, 8, 9 e 14, os depoimentos das testemunhas J., T. e J., e ainda das testemunhas V. e J..
A testemunha V. revelou conhecer diretamente a factualidade à qual foi questionada por ser sogra do Autor, e com o mesmo coabitar, tendo descrito de forma detalhada os danos que o veículo apresentava, em virtude do sinistro ocorrido.
Também a testemunha J. confirmou tais danos visíveis, uma vez que se deslocou ao local logo após a ocorrência do sinistro, por viver nas redondezas do local onde o mesmo se deu.
Ambas as testemunhas depuseram de forma clara, desinteressada e séria, convencendo o Tribunal da veracidade dos factos por si relatados.
Todas as testemunhas descreverem os danos apresentados na viatura na parte frontal e direita, atestando que o veículo ficou imobilizado de imediato. Tais danos ficam ainda patentes por análise das fotografias juntas aos autos, pela descrição sumária constante da PAV e ainda pelo orçamento de reparação apresentado nos autos, pelo que os deu o Tribunal como provados.
Os factos dados como provados nos pontos O) e P) resultaram dos depoimentos prestados pelas testemunhas V. e J.. Ambas as testemunhas confirmaram que o Autor não procedeu à imediata reparação do veículo por não dispor de meios financeiros para o efeito.
Mais afirmou aquela testemunha que entregou ao Autor uma viatura que pensava oferecer à sua filha, para que aquele o pudesse usar nas suas deslocações diárias para o trabalho, bem como para prover a outras necessidades de deslocação com e para a família, como idas ao médico, supermercado e outras, sendo que o Autor pagava à testemunha a quantia mensal de € 150,00 pelo uso de tal veículo.
Já a factualidade vertida nos pontos Q) e R) foi dada como provada tendo em consideração o depoimento da testemunha J..
Esta testemunha foi clara e perentória em afirmar que o Autor temeu gravemente pelo seu bem-estar com o sinistro, uma vez que seguia na viatura como “pendura”. Descreveu que a porta do lado direito da viatura ficou encravada, vendo-se o Autor obrigada a sair da mesma pelo lado do condutor, tendo ficado muito abalado com o sucedido no período seguinte.
Afirmou que tais sentimentos de tristeza e abatimento se agudizaram durante um largo período de tempo, uma vez que ficou privado do uso do carro, apesar de continuar a pagar as prestações mensais resultantes do contrato de locação financeira celebrado com uma instituição bancária.
Esta factualidade saiu corroborada pelo depoimento da testemunha A., conhecedor de tal matéria por ser o empregador do Autor até ao ano de 2019.
Depôs de forma clara e segura, bem como desinteressada, tendo o Tribunal atendido ao por si relatado na formação da sua convicção.
Continuando, a factualidade dada como assente no ponto S) resultou da análise feita ao documento junto com a petição inicial sob o nº 3, cujo conteúdo foi corroborado pela testemunha J..
Aquela dada como assente nos pontos T) a V) adveio do constante nos documentos juntos com a contestação do 1º Réu sob os nºs 1 a 4, ao passo que aquela dada como assente no ponto W) resultou já do teor dos documentos juntos com tal articulado sob os nºs 5 e 6.
Esta factualidade foi ainda corroborada pelas testemunhas T., V., J., L. e H..
Esta testemunha revelou conhecimento direto destes factos aos quais foi questionado, uma vez que exercia funções de fiscalização da obra realizada pela 2ª Ré, a mando e por ordem do 1º Ré.
Depôs de forma clara e séria, coadjuvando o Tribunal na formação da sua convicção.
Todas as testemunhas afirmaram que a sinalização existente na obra se limitava ao aviso de obras em curso ao longo de 7 km, no início e no fim, sendo que por vezes algumas placas estivessem deitadas no chão.
Por fim, a matéria de facto dada como assente no ponto X) resultou de acordo das partes, ao passo que aquela dada como assente no ponto Y) adveio da análise feita ao documento junto com a contestação da 2ª Ré sob o nº 1.
Os factos dados como provados nos pontos Z) a BB) resultaram do teor dos documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 10 a 13, e aqueles dados como provados nos pontos CC) e DD) resultaram já, respetivamente, dos documentos junto sob o nº 10 com a contestação do 1º Réu e sob o nº 2 com a contestação da 2ª Ré.
Finalmente, a factualidade dada como assente no ponto EE) adveio de fls. 1 e seguintes dos presentes autos. “
17) Concluindo-se, assim, que deve ser indeferida a pretensão da Recorrente e manter-se as alíneas A) a EE) da factualidade dada como provada e com o teor dado na Douta Decisão, bem como, aos pontos 1) a 3) dos factos não provados, como melhor consta da fundamentação da Sentença.
18) A questão levantada pela Recorrente quanto à alínea P) dos factos dados como provados é uma falsa questão, porquanto tal factualidade não tem que ser provada exclusivamente com prova documental, bastando para a prova de tal quesito a prova testemunhal, e no caso em apreço, a Douta Sentença baseou-se não só no depoimento da testemunha V. mas também, (como o omite propositadamente a Apelante M. de dizer) no depoimento de J..
19) A convicção do Tribunal “a quo” em dar tal factualidade como provado resultou dos depoimentos prestados pelas testemunhas V. e J.. Ambas as testemunhas confirmaram que o Autor não procedeu à imediata reparação do veículo por não dispor de meios financeiros para o efeito.
20) Mais afirmou aquela testemunha que entregou ao Autor uma viatura que pensava oferecer à sua filha, para que aquele o pudesse usar nas suas deslocações diárias para o trabalho, bem como para prover a outras necessidades de deslocação com e para a família, como idas ao médico, supermercado e outras, sendo que o Autor pagava à testemunha a quantia mensal de € 150,00 pelo uso de tal veículo.
21) Não houve qualquer preterição do exercício do contraditório, tal facto foi alegado não articulado inicial e não foi pela Recorrente impugnado e muito menos exigiu prova documental, por outro lado, a Recorrente sempre poderia tê-lo feito, caso o pretendesse, aquando da realização da audiência da discussão e julgamento ou mesmo nas alegações orais, mas não o fizeram, e não podem agora, pretender usar as alegações de recurso para praticar abuso de direito, com infração das normas do CPC e do CPTA.
21) Assim, face à prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento e apreciada criticamente pela Mm.ª Juiz “a quo”, não só da testemunha V. mas também da testemunha J., depoimentos credíveis, sérios, desinteressados e seguros, deve a alínea P) continuar no rol dos factos provados.
22) Tudo isto pode este Tribunal Central Administrativo confirmar pelo depoimento da testemunha V. no dia 19.11.2019 de 01:28:12 a 02:31:21 e do depoimento do referido J. de 19.112019 de 00:53:18 a 00:53:32.
23) Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redação da Lei 41/2013, de 26/6).
24) Por sua vez, de toda a prova carreada resultou manifestamente que os danos patentes no veículo do Recorrido resultaram da QUEDA no buraco por falta de sinalização que impendia sobre a aqui recorrente, e não pelo embate, Pois, não se concebe que o veículo “embata” num buraco, mas sim, caia num buraco, como foi o caso, tudo isto como decorre dos depoimentos já transcritos das testemunhas J. e T. e dos documentos n.º 4 junto com a p.i.
25) Pelo que devem ser indeferidas as pretensões da Recorrente, relativamente às alterações/correções da redação das alíneas K), L) e M) dos factos dados como provados.
26) Consagra o n.º 5, do artigo 607.º, do Código de Processo Civil, o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre, segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.
27) Segundo este princípio as provas são valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização ou preocupação do julgador quanto à natureza delas.
28) De modo que, a alteração da decisão da Primeira Instância sobre a matéria de facto restringe-se à (in) existência de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão.
29) A sindicância à convicção do Julgador da Primeira Instância, a realizar por este Venerando Tribunal de recurso, apenas se mostra adequada quando a mesma se apresenta manifestamente contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos.
30) Acontece que, na Motivação da decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal Recorrido fundamentou como baseou a sua convicção, resulta da apreciação conjugada e concatenada dos documentos juntos pelas partes, do depoimento das testemunhas.
31) Assim, a Recorrente não pode apreciar os depoimentos como lhes aprouver, nem transcrever partes desgarradas dos depoimentos das testemunhas, no intuito de retirar aos depoimentos das testemunhas e a todos os documentos juntos aos autos, a força probatória que lhe é legalmente atribuída.
32) Na verdade, o depoimento das testemunhas não pode ser cindido e, ao contrário do que a Recorrente quer fazer crer, os factos em apreço sempre teriam sido dados como provados com base em tais depoimentos e documentos juntos aos autos.
33) Não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objeto de impugnação não forem suscetíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 130º e 131º, todos do C.P.C.).
34) O uso, pelo Tribunal Central Administrativo, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve verificar-se quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados, nomeadamente por os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, imporem uma conclusão diferente (prevalecendo, em caso contrário, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova).
35) Ora, no caso sub Júdice, a Douta Sentença encontra-se devidamente fundamentada e motivada, respeitou os princípios da livre apreciação da prova e da imediação.
36) O princípio da imediação exige uma relação de proximidade (física e temporal) entre os intervenientes processuais e o tribunal, de modo a que este possa ter uma perceção própria (e autorizada) dos elementos que servirão de base para a fundamentação da decisão jurisdicional.
37) A Douta Sentença encontra-se devidamente fundamentada, nada havendo a apontar, transparecendo na mesma todo o raciocínio e lógica seguidos e os elementos probatórios tidos em conta para a formação da sua convicção.
38) O que a Recorrente pretende, no fundo, é que haja um novo julgamento por parte do Tribunal Central Administrativo, quando este tem que verificar a legalidade da decisão recorrida na forma como apreciou a prova e nos segmentos concretos indicados pela Recorrente. Isto porque existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em 1.ª Instância e a efetuada em Tribunal de recurso com base nas transcrições dos depoimentos.
39) A sensibilidade à forma como a prova testemunhal se produz, e que se fundamenta num conhecimento das reações humanas e análise dos comportamentos psicológicos que traçam o perfil da testemunha, só logra obter concretização através do princípio da imediação, considerado este como a relação de proximidade entre o Tribunal e os participantes, de modo a que aquele possa obter uma perceção própria do material que haverá de ter como base da decisão.
40) Quando a opção do Julgador se centra e elementos diretamente interligados com o princípio da imediação (por exemplo, quando o Julgador refere que os depoimentos não foram convincentes num determinado sentido em consequência da forma como forma produzidos) o Tribunal de Recurso não tem a possibilidade de sindicar a aplicação concreta de tal princípio.
41) Em síntese, deve manter-se, nos seus precisos termos, a matéria de facto fixada pelo Tribunal da Primeira Instância.
42) Pretende a Recorrente fazer crer que foi o condutor do veículo do Autor que violou normativos legais (nomeadamente do Código da Estrada), tentando enganar o tribunal de Recurso afastando do cerne da questão que é A FALTA DE SINALIZAÇÃO DO BURACO QUER ERA OBRIGAÇÃO DA RECORRENTE QUE VIOLOU TAL OBRIGAÇÃO.
43) como bem resultou do probatório, aquando da suspensão dos trabalhos de empreitada, por força do mau tempo, a Recorrente foi ao local da obra elaborar o respetivo auto, assinado pela testemunha H., tal como do mesmo consta, e ali e no mesmo expressamente reconheceu que a obra, na sua ótica, estava bem sinalizada para sinalizar os perigos ao longo do percurso do local da obra.
44) cabia, como cabe á Recorrente a responsabilidade pela vigilância, conservação e manutenção do bom estado de circulação das vias, mesmo que esteja em obras e sobretudo durante a sua suspensão, sendo que não resultou provado que a Recorrente tenha emitido qualquer diretriz para se impedir a circulação de veículos durante a execução das obras de empreitada dos autos ou durante a sua referida suspensão.
45) Na verdade, poderia a Recorrente, no âmbito das suas competências, impedir a circulação de veículos durante a execução dos trabalhos e/ ou a sua suspensão, ou mesmo, tendo em conta a estreita largura da via em causa, não reunia condições para o adequado cruzamento de veículos, igualmente lhe competia o poder/dever de impedir essa manobra, colocando a via com sentido único, o que não fez!
46) O poder de fiscalização vem enunciado no artigo 305º do Código dos Contratos Públicos, no seu n.º1 refere que o contraente publico dispõe de poderes de fiscalização técnica, financeira e jurídica do modo de execução do contrato, com vista a determinar as necessárias correções e ampliar as devidas sanções se a eles houver lugar.
47) Segundo o n.º2 daquele preceito legal, este controlo, esta fiscalização, materializa-se através da inspeção ao local, equipamentos, documentação, registos informáticos e contabilidade ou mediante pedidos de informações.
4) O facto de a Recorrente ter celebrado um contrato público de empreitada com a Ré M., não significa que os seus poderes de direção e de fiscalização se dissiparam, pelo contrário, a Recorrente sabe que os atos de gestão pública, a vigilância, limpeza e conservação das estradas municipais (no que se incluem as bermas e valetas) são responsabilidades irrenunciáveis e inalienáveis daquela.
49) Este tipo de responsabilidade não cessa, nem se suspende durante a execução de obras num dos locais sob a sua jurisdição, ainda que exista um contrato que atribua à Ré M. a responsabilidade de garantir a segurança de veículos e peões.
50) Tratando-se de uma estrada municipal que se encontrava em obras de requalificação, a Recorrente tinha o poder-dever de fiscalizar tais obras, nomeadamente de verificar se estavam a ser cumpridos todos os formalismos para assegurar a segurança e proteção de terceiros.
51) Recai sobre a Recorrente o dever de vigilância e o dever de fiscalização de forma a apurar se o contrato de empreitada estaria a ser cumprido com todos os deveres que lhe estão inerentes, ou seja, conforme resulta dos depoimentos supra transcritos, e prestados pelos funcionários da Recorrente, H. e L., durante o período da referida suspensão, não fiscalizou se a estrada e obra estavam devidamente sinalizadas,
52) Não verificou a existência do buraco que se encontrava na berma do lado no sentido da Igreja de Oliveira-Montão, donde resultaram danos ao recorrido, aliás, só tiveram conhecimento do mesmo após a ocorrência do acidente ora em causa.
53) Por sua vez, tendo em conta a data dos factos em causa (dezembro de 2016), e com muito respeito por opinião contrária, aplica-se o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas coletivas de direito público contante da Lei n.º 67/2007, de 31-12.
54) Conforme é recorrentemente afirmado e constitui jurisprudência administrativa sólida “a responsabilidade civil extracontratual do Estado e pessoas coletivas públicas assenta nos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, com as especialidades resultantes das normas próprias relativas à responsabilidade dos entes públicos (cfr. Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, de 11-09-2015, proc. 00095/11.5BEVIS, disponível em www.dgsi.com)
55) A responsabilidade da Recorrente está sujeita à verificação dos seguintes pressupostos:
facto ilícito e culposo, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano.
56) Sendo que, o facto do lesante, é constituído por um comportamento voluntário, que pode revestir a forma de ação ou omissão (quando haja o dever de agir e o mesmo tenha sido omitido).
57) Quanto à ilicitude, a mesma traduz-se quer na violação de um direito de outrem, quer na violação de normas legais destinadas a proteger interesses alheios.
58) No âmbito da responsabilidade no caso sub judice, o conceito de ilícito tem a sua amplitude fixada no artigo 9º, n.º1 da Lei n.º 67/2007 de 31-12: “consideram-se ilícitas as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objetivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos”.
59) A ilicitude pressupõe a violação de um direito subjetivo ou de um interesse legalmente protegido, ou seja, de uma norma que se destine a proteger o interesse de outrem.
60) Quanto aos atos materiais, há ilicitude quando houver violação das normas legais e regulamentares ou dos princípios gerais aplicáveis, ou ainda quando houver violação das regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração.
61) Na situação do presente caso, a para além de recair sobre a Recorrente o poder-dever de fiscalizar o modo como o contrato de empreitada estava a ser executado, não o fez, traduzindo-se essa ilicitude numa omissão por parte da Recorrente.
62)A Recorrente logo que teve conhecimento do acidente, participado pelo Recorrido, conforme docs 10 e 11 juntos com a p.i, providenciou à sinalização do buraco, conforme o depoimento das testemunhas J., T. e V..
63) A Recorrente só teve conhecimento do buraco na berma, aquando da participação do acidente, isto porque não usou dos seus poderes/ deveres de fiscalização e de vigilância como podia e devia.
64) De acordo com os padrões médios de atuação de qualquer pessoa coletiva pública inserida nas mesmas condições, a Recorrente não atuou com a diligência que lhe era exigível, pelo que lhe é imputável a omissão das suas obrigações, nomeadamente em termos de fiscalização da obra, ao não verificar se tal obra encontrava devidamente sinalizada de modo a manter a segurança rodoviária de todos os utentes.
65) Sem prejuízo de acordo com o n.º2 do artigo 5º do Código da Estrada, e de acordo com o teor do contrato público de empreitada, resulta o dever da Ré M. sinalizar as obras, mas nunca esta obrigação afastava a da Recorrente, que tinha o dever legal de assegurar a vigilância e fiscalização da via onde o acidente ocorreu.
66) Obrigação que se mantinha ainda que nela estivessem a ser levadas a cabo obras de iniciativa e execução por terceiros, cabendo-lhe, por isso, assegurar que a sinalização era a adequada a evitar danos, veja-se Ac. do Tribunal Central Administrativo Sul de 22-10-2009, proc. 05287/09 disponível em www.dgsi.pt.
67) Assim, e conforme a Decisão do tribunal a quo, tendo a Recorrente o dever de vigilância, responde pelos danos causados ao Recorrido em consequência do acidente.
68) No que concerne ao pressuposto da culpa, esta consiste no nexo de imputação ético jurídica que liga o facto ilícito à vontade do agente, exprimindo uma ligação reprovável ou censurável da pessoa com esse facto, podendo assumir a forma de dolo ou negligência, devendo ser apreciada pela diligência e aptidão que seja razoável exigir, em função das circunstâncias de cada caso, de um titular, funcionário ou agente zeloso e cumpridor, conforme nos termos do artigo 10º da Lei n.º67/2007, de 31/12.
69) Neste caso, não tendo a Recorrente o cuidado de fiscalizar a obra que adjudicou á Ré M., não providenciando para que o buraco na berma que se encontrava na estrada municipal no sentido Igreja de Oliveira- Montão, a mesma não só agiu ilicitamente, como teve um comportamento censurável conquanto revelador da falta de diligência que é exigida a um funcionário típico.
70)Na verdade, exigia-se à Recorrente que tivesse previsto que ao não fiscalizar, vigiar tais obras de requalificação, e por sua vez ao não verificar a mesma padecia de obstáculos perigosos para os seus utentes, pudessem ocorrer acidentes como o que veio a verificar-se com o veículo do Recorrido, tanto mais que aquela via não estava nem parcial nem totalmente cortada ao trânsito.
77) Ficou provado e demonstrado que a Recorrente violou o dever objetivo de vigilância e de fiscalização que sobre si impendia, pelo que existe uma culpa efetiva da sua parte na verificação dos danos reclamados nos autos pelo Recorrido.
72) Por fim, para a elisão da presunção de culpa dos Réus, não é suficiente a alegação de que o condutor do veículo teria violado as regras estradais ao colocar os rodados na berma (isto porque, “atento o cruzamento de veículos, e uma vez que não havia espaço suficiente na via, era possível a utilização do espaço da berma, sendo aliás tal manobra a adequada e prudente, atentas as circunstâncias e condições da via naquele dia, hora e local”) – artigo 10.º, n.º 3, da Lei 67/2007.
73) Como doutamente e bem decidido na sentença do tribunal “a quo”: “…..a este propósito, cumpre notar que os danos sofridos pelo Autor derivado do acidente se traduzem, no caso, e como resultou provado, no valor que terá de ser suportado com a reparação do veículo acidentado, que se cifra na importância de € 8.259,52.”
74) Mais: “Resultou ainda provado que o Autor se vê privado do uso do veículo automóvel desde a data do sinistro, 25/12/2016, até ao momento presente. A privação do uso do veículo por tal período de tempo, e que o Autor utilizava para as suas deslocações quotidianas, no cumprimento das suas responsabilidades profissionais e pessoais, é um dano ao qual deve corresponder uma indemnização autónoma, independentemente dos danos emergentes, e à luz do previsto no artigo 562º do Código Civil, como tem vindo a ser defendido unanimemente pela jurisprudência dos tribunais superiores portugueses (neste sentido, e a título de mero exemplo, leia-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05/07/2018, P. 176/13.7T2AVR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt). Como resultou do probatório coligido, passou o Autor a utilizar um veículo que lhe foi cedido para o efeito pela sua sogra, procedendo ao pagamento, em contrapartida de tal uso, de uma quantia mensal de € 150,00.
Assim, e atento o período decorrido desde a data do sinistro até à data da propositura de ação, terá o Autor direito a ser indemnizado de tal dano pelo valor de €1.500, o que desde já se declara.”
75) Continuando: “Por fim, peticiona ainda o Autor o pagamento de uma compensação por danos não patrimoniais no valor não inferior a €1.000, atento o abalo psicológico por si suportado em consequência do sinistro. No respeitante aos danos de natureza não patrimonial reclamados, cumpre recordar que, nos termos do disposto no artigo 496º do Código Civil, são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, sendo que dano é "todo o prejuízo, desvantagem ou perda que é causado nos bens jurídicos, de carácter patrimonial ou não, de outrem”. Os danos morais resultam assim da lesão de bens estranhos ao património do lesado (a integridade física, a saúde, a tranquilidade, o bem-estar físico e psíquico, a liberdade, a honra, a reputação), verificando-se quando são causados sofrimentos físicos ou morais, perdas de consideração social, inibições ou complexos de ordem psicológica, vexames, entre outros, em consequência de uma lesão de direitos, maxime, de personalidade (ver Mota Pinto, Teoria geral do direito Civil, págs. 85 e 86, edª de 1976). Ora, constitui orientação jurisprudencial consolidada que as simples contrariedades ou incómodos apresentam um nível de gravidade objetiva insuficiente para os efeitos do nº 1 do artigo 496º do CC (neste sentido, e a título de mero exemplo, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07/11/2018, P. 158/16.7T8SRQ.L2-4, disponível em www.dgsi.pt). Como tal, não são merecedores da tutela do direito os meros incómodos, as tristezas, indisposições, preocupações e arrelias comuns, que não ultrapassem a barreira da excecionalidade e da inexigibilidade em termos de resignação, segundo critérios objetivos de avaliação. No caso ora em apreço, o Autor logrou demonstrar que, em virtude do sinistro, suportou um abalo psicológico, tendo temido pela sua integridade física e bem-estar, uma vez que seguia no veículo, no lugar de passageiro dianteiro. Mais resultou provado que, durante vários meses, no período imediatamente seguinte ao do sinistro, sofreu de ansiedade e de tristeza, pelo facto de se ver privado do uso do seu veículo, cujas rendas mensais continuou a pagar à instituição financeira com a qual tinha celebrado o contrato de locação de longa duração. Este sofrimento, de natureza psicológica, merece a tutela do Direito, impondo-se a sua consideração, apesar de tudo, de gravidade moderada, atento o facto de não ter cariz de perpetuidade, e de ter vindo a ser ultrapassado, não se podendo olvidar que não ficou provado qualquer dolo na atuação dos Réus.
Nestes termos, atentos os montantes que têm vindo a ser fixados por jurisprudência superior, bem como o teor dos artigos 494º e 496º, nº 4, ambos do Código Civil, entende-se como equitativa a quantificação deste montante de indemnização em €400.”
76) Assim, muito bem andou o Tribunal “a quo” ao decidir como decidiu: “Nestes termos, será devida ao Autor uma indemnização global de €11.119,52, absolvendo-se os Réus do demais peticionado, o que desde já se declara. Ao abrigo do estatuído nos artigos 804º, 805º, nºs 1 e 3, e 806º, todos do Código Civil, são devidos também juros de mora legais, desde a citação até efetivo e integral pagamento. “
77) O recurso da matéria de facto não visa a obtenção de um segundo julgamento sobre aquela matéria, mas é antes uma forma de obviar a eventuais erros ou incorreções cometidos na decisão recorrida.
78) No caso sub Júdice, não há erros nem incorreções cometidos na Douta Sentença, muito menos na forma como apreciou a prova.
79) Em síntese, deve manter-se, nos seus precisos termos, a matéria de facto fixada pelo Tribunal da Primeira Instância.
80) O Tribunal da Primeira Instância não incorreu em erro na apreciação da prova nem de direito, devendo manter-se a decisão sobre a matéria de facto, bem como a decisão de direito.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se a douta Sentença recorrida, POR SER DE INTEIRA JUSTIÇA.”

Os Recursos Jurisdicionais foram admitidos por Despacho de 28 de setembro de 2020.

O Ministério Público junto deste Tribunal, tendo sido notificado em 9 de outubro de 2020, nada veio dizer, requerer ou Promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
As principais questões a apreciar resultam predominantemente da necessidade de verificar as invocadas insuficiências da matéria de facto, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade, como provada e não provada, a qual aqui se reproduz:
“Com relevância para o conhecimento da presente ação, resultou provada a seguinte factualidade:
A) O Autor é locatário do veículo automóvel da marca Renault, modelo Clio 1.5 DCI Dynamique S, com a matrícula XX-GF-XX, qualidade que lhe advém da celebração de um contrato designado de “locação operacional – aluguer de equipamento”, com o “B., S.A.”;
B) A 25/12/2016, pelas 00h20m, J., cunhado do Autor, conduzia o veículo GF na Rua de (...), em (...), no sentido Igreja de Oliveira-Montão, a uma velocidade de cerca de 35km/h, e o tempo apresentava-se bom;
C) No local em causa, a estrada é estreita, com cerca de 3.25 metros de largura, e, apesar de estar dotada de iluminação pública, a mesma não é muito forte e é esparsa;
D) No local em causa, só é possível o cruzamento de duas viaturas caso pelo menos uma delas invada, ainda que parcialmente, a respetiva berma;
E) A dada altura da marcha, o condutor do veículo GF deparou-se com a presença de outro veículo, que circulava em sentido contrário, com a matrícula XX-IN-XX, conduzido por T.;
F) Para tornar possível o cruzamento das viaturas sem embates, ambos os condutores reduziram a velocidade e viram-se obrigados a ocupar as respectivas bermas da via de circulação;
G) Em consequência, o condutor do veículo GF viu-se obrigado a circular com as rodas do lado direito sobre parte da berma da estrada;
H) Nesse mesmo local, a berma direita da estrada, no sentido de marcha do veículo GF, apresentava um grande buraco, com cerca de 1 metro de comprimento e 50 centímetros de profundidade;
I) O referido buraco não estava sinalizado ou vedado;
J) Ao circular pela berma da estrada, o condutor do veículo GF caiu no identificado buraco, tendo este acabado por se imobilizar um pouco mais à frente, ocupando parcialmente a faixa de rodagem contrária;
K) Em consequência de tal queda, o veículo GF ficou com a direção partida, bem como os braços de suspensão esquerdo e direito, os amortecedores e a caixa de direção assistida;
L) Ainda em virtude da descrita queda, rebentaram os pneus direito e esquerdo da frente do veículo GF, ficando os calços e discos de travão inutilizados, mais se tendo partido o para-choques da frente, o farol direito, o guarda-lamas frontal direito, o retrovisor exterior direito, o friso e as dobradiças da porta direita da frente;
M) Também em consequência da queda no buraco, os airbags da viatura GF foram acionados, ficando o seu comando danificado, o que partiu o para-brisas, o tablier, mais danificando os tensores de todos os cintos de segurança da frente e da traseira;
N) Para a reparação da viatura GF, bem como a aquisição das peças de substituição necessárias, terá o Autor de despender a quantia de € 8.259,52;
O) O Autor não procedeu ainda à reparação do veículo por não dispor de meios financeiros para o efeito;
P) A partir da data do sinistro, e para as suas deslocações diárias para o trabalho, bem como outras para acudir às necessidades da vida privada, o Autor passou a utilizar um veículo automóvel propriedade da sua sogra, pagando-lhe, em contrapartida de tal uso, a quantia mensal de € 150,00;
Q) Em virtude do sinistro ocorrido a 25/12/2016, o Autor, que seguia no veículo como passageiro da frente, sofreu de um profundo susto, temendo pelo seu bem-estar, vendo-se obrigado, atenta a força do embate, a sair do veículo pelo lado do condutor;
R) Ainda em resultado do sinistro, o Autor sentiu-se triste a abatido, uma vez que estimava o veículo automóvel, do qual se viu privado desde a data do sinistro;
S) A Guarda Nacional Republicana foi chamada ao local e lavrou o auto competente;
T) À data do sinistro, a via designada “Rua (...)” encontrava-se em obras de repavimentação e requalificação, no âmbito de um contrato de empreitada denominada “Repavimentação e Requalificação da E.M. de (...) a (...)”;
U) A empreitada referida em T) foi adjudicada pelo 1º Réu à 2ª Ré a 21/07/2016, na sequência de procedimento concursal lançado para o efeito, tendo o respetivo contrato sido celebrado a 03/08/2016, e consistia em limpeza de taludes, valetas, bermas e pavimentação da via, bem como a execução de valetas e respetiva colocação de sinalização vertical;
V) Do caderno de encargos posto a concurso para a execução da referida empreitada constavam, designadamente, as seguintes cláusulas: “(…) Cláusula 6ª – Preparação e planeamento da execução da obra. (…) 3 – O empreiteiro realiza todos os trabalhos que, por natureza, por exigência legal ou segundo o uso corrente, sejam considerados como preparatórios ou acessórios à execução da obra, designadamente: (…) b) Trabalhos necessários para garantir a segurança de todas as pessoas que trabalhem na obra ou que circulem no respetivo local, incluindo (…) terceiros em geral, para evitar danos nos prédios vizinhos e satisfazer os regulamentos de segurança, higiene e saúde no trabalho e de polícia das vias públicas; (…). Cláusula 21ª – Outros encargos do empreiteiro. 1. Correm inteiramente por conta do empreiteiro a reparação e indemnização de todos os prejuízos que, por motivos que lhe sejam imputáveis, sejam sofridos por terceiros até receção definitiva dos trabalhos em consequência do modo de execução destes últimos (…), da atuação do pessoal do empreiteiro ou dos seus subempreiteiros e fornecedores e do deficiente comportamento ou da falta de segurança das obras, matérias, elementos de construção e equipamentos; (…)”;
W) O troço da via em obras estende-se por 7 km, existindo, quer no início, quer no fim do indicado troço, um sinal de alerta de obras em curso;
X) Próximo do local onde ocorreu o sinistro, existia também um sinal de informação com a inscrição “máquinas em movimento” e com o sinal BT8 – proibição de exceder velocidade máxima de 30 quilómetros por hora, assim como um sinal AT1, indicador de trabalhos na via;
Y) À data da ocorrência do alegado sinistro, a execução da empreitada encontrava-se suspensa, por deliberação camarária datada de 12/12/2016, por falta de condições climatéricas adequadas ao prosseguimento dos trabalhos, concretamente, para a pavimentação da via;
Z) A 28/12/2016, e na sequência do sinistro ocorrido, o Autor enviou uma missiva ao 1º Réu, por carta registada com aviso de receção, informando-o do sucedido e solicitando diligências no sentido de resolver a situação;
AA) Não obtendo resposta à missiva enviada, a 23/01/2017 o Autor remeteu mensagens de correio eletrónico ao 1º Réu, enviando cópia do orçamento de reparação, e solicitando a resolução da questão;
BB) A 08/03/2017, o Autor interpelou ambos os Réus, através de cartas registadas com aviso de receção, reclamando-lhes que procedessem à reparação dos danos sofridos na sua viatura;
CC) A 24/01/2017, o 1º Réu remeteu à 2ª Ré a comunicação que lhe foi enviada pelo Autor a 23/01/2017;
DD) A 01/03/2017, a 2ª Ré enviou uma missiva ao 1º Réu, relativamente ao sinistro denunciado pelo Autor, afirmando não lhe ser possível avaliar a relação causa efeito dos eventuais danos reclamados com o que vem referido nas declarações que o queixoso prestou na GNR, mais afirmando que, à data, a execução dos trabalhos se encontrava suspensa;
EE) A petição inicial foi apresentada neste Tribunal a 19/12/2017.
Factos não provados:
Com relevância para a apreciação da lide, resultaram como não provados os seguintes factos:
1) No local do sinistro, a via tem a largura de, sensivelmente, 3,80 metros;
2) O condutor do veículo GF não circulava com a precaução exigida para aquela via concreta;
3) Quando os trabalhos de empreitada foram suspensos, em Dezembro de 2016, não existia o indicado buraco na mesma, tudo indicando que tenha sido um particular, com acesso a águas nascentes, através de canalização por tubo, a sentir necessidade de o reparar, assim deixando ficar o espaço aberto, sem o tapar de novo com terra ou outro material.”

IV – Do Direito
O sentido da decisão face ao presente processo ficou, naturalmente, condicionado por aquilo que pôde ser dado como provado.

Do ponto de vista normativo é na presente Ação aplicável predominantemente a Lei nº 67/20007, de 31 de Dezembro, no que concerne à Responsabilidade Civil.

Como decorre da generalidade da Jurisprudência e Doutrina Administrativa, a responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos impõe que estes sejam responsáveis quando for de concluir que os seus órgãos ou agentes praticaram, por ação ou omissão, atos ilícitos e culposos, no exercício das suas funções e por causa desse exercício, e que daí resultou um dano para terceiro.

Por outro lado, e em linha com o Acórdão do STA nº 0903/03 de 03-07-2003, refira-se ainda que "para que ocorra a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas por atos ilícitos e culposos dos seus órgãos ou agentes, no exercício das suas funções e por causa delas, é necessária a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano" Acórdão STA de 9.5.02 no recurso 48077. A ação improcederá se um destes requisitos se não verificar”.

O facto ilícito consiste numa ação (ou omissão) praticada por órgãos ou agentes estaduais (em sentido lato) violadora das normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis ou as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração.

A culpa é o nexo de imputação ético-jurídica que liga o facto ilícito à vontade do agente. Envolve um juízo de censura, face à ação ou omissão, segundo a diligência de um bom pai de família.

O nexo causal existirá quando o facto ilícito for a causa adequada do dano.
De acordo com o preceituado no art.º 563 do CC «A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão».

Constitui jurisprudência pacífica, designadamente do Colendo STA, que o nexo causal entre o facto ilícito e o dano se deve determinar pela doutrina da causalidade adequada, ali contemplada, nos mesmos termos em que o direito civil a admite, entendimento extensível, de resto, a todos os requisitos da responsabilidade civil (vg. acórdão STA de 6.3.02, no recurso 48.155).

Finalmente, o dano traduz-se no prejuízo causado pelo facto ilícito (art.º 564º do CC).

Relativamente ao nexo de causalidade vigora, como se disse, a teoria da causalidade adequada na formulação consagrada no art° 563° do CC.

Em qualquer caso, como se refere no Acórdão do STA de 2002.10.02 in Recurso 1690/02 "(...) a Administração não incorre automaticamente em responsabilidade civil cada vez que pratica um ato administrativo ilegal.

Para haver ilicitude responsabilizante, é necessário que a Administração tenha lesado direitos ou interesses legalmente protegidos do particular, fora dos limites consentidos pelo ordenamento jurídico, por isso, segundo alguma jurisprudência e doutrina, é necessário que a norma violada revele a intenção normativa de proteção do interesse material do particular, não bastando uma proteção meramente reflexa ou ocasional.

Ou seja, é necessário existir “conexão de ilicitude” entre a norma ou princípio violado e a posição jurídica protegida do particular, o que deve ser apreciado caso a caso (cf. Prof. Gomes Canotilho, em anotação ao Ac. STA de 12.12.89 RLJ, Ano 125° p.84 e AC. STA de 31.05.2000, recº 41201).

Sintetizando, e reiterando o já referido, a responsabilidade civil extracontratual por atos de gestão pública do Estado e demais pessoas coletivas por facto ilícito, a que se referem os normativos aludidos coincide, no essencial, como tem sido jurisprudência uniforme, designadamente do STA, com a responsabilidade civil consagrada no art. 483º do Código Civil, dependendo a obrigação de indemnizar da verificação cumulativa dos pressupostos: facto, ilicitude, culpa, nexo de causalidade e dano – (cf. entre outros Ac. STA de 04.12.03, rec. 557/03 e de 11.02.03, rec. 323/02).

Importa agora analisar e decidir o suscitado em concreto.

Refira-se desde logo que o objeto do recurso é delimitado e definido pelas conclusões extraídas da motivação, por banda dos recorrentes, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matérias não anteriormente consideradas e decididas, salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso.

Vejamos:
Refira-se desde já que se analisarão simultaneamente ambos os Recursos Interpostos, por ter natureza, objeto e objetivo idênticos.

Quanto à matéria de facto:
Em linha com o sumariado, entre outros, no Acórdão deste TCAN nº 00126/12.8BEMDL, de 12-06-2019 “Determina o artigo 662º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, no seu n.º 1, que a “Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente, impuserem decisão diversa”.
Na interpretação deste preceito, já na anterior versão (Artº 712º CPC), tem sido pacífico o entendimento segundo o qual em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida.
Isto porque o Tribunal de recurso está privado da oralidade e da imediação que determinaram a decisão de 1ª instância. A gravação da prova, por sua natureza, não fornece todos os elementos que foram diretamente percecionados por quem julgou em primeira instância e que ajuda na formação da convicção sobre a credibilidade do testemunho.
Por outro lado, o respeito pela livre apreciação da prova por parte do tribunal de primeira instância, impõe um especial cuidado no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto, e reservar as alterações da mesma para os casos em que ela se apresente como arbitrária, por não estar racionalmente fundada, ou em que seja seguro, de acordo com as regras da lógica ou da experiência comum, que a decisão não é razoável.”

Como se sumariou identicamente no Acórdão deste TCAN nº 121/03.8BTBRG, de 11-01-2019, “O Tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1.ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos.
À Instância recursiva apenas caberá sindicar e modificar o decidido quanto à factualidade dada como provada e não provada, caso verifique a ocorrência de erro de apreciação, suscetível de determinar a viciação da decisão final, mormente enquanto erro de julgamento.”

Como afirmado igualmente pelo Tribunal da Relação do Porto, no seu Acórdão nº 2612/15.9JAPRT.P1, de 26-04-2017, “Discordar, sem qualquer fundamento legal, leva simplesmente à sua improcedência, como já por este Tribunal foi afirmado em Acórdão de 23/03/01: «A divergência quanto à decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto será relevante na Relação apenas quando resultar demonstrada pelos meios de prova indicados pelo recorrente a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, sendo necessário para que ele se verifique, que os mencionados meios de prova se mostrem inequívocos no sentido pretendido pelo recorrente».
O presente tribunal só poderia assim alterar o decidido factualmente pela 1ª instância se existissem provas nos autos que impusessem decisão diferente e in casu, embora a prova produzida, eventualmente e no entender da recorrente, permitisse uma decisão de facto em sentido diverso, ela não impunha decisão distinta, pelo que o pretendido por aquele está destinado ao fracasso.”

Refira-se que, em função do conjunto da prova produzida, não se reconhece que a prova testemunhal referenciada pelos Recorrentes pudesse ter a virtualidade de alterar a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo e muito menos o sentido da decisão proferida.

Da análise do teor global do decidido, não se vislumbra que se tenham verificado os imputados erros de julgamento que pudessem determinar as alterações propostas pelos Recorrentes.

Efetivamente, o tribunal limitou-se a socorrer-se, como lhe competia, do princípio da livre apreciação da prova produzida, para dar como assente a materialidade controvertida, em conformidade com o estatuído nos artigos 392.º e 396.º do Código Civil e Artº 607º nº 5 CPC.

Ao referido acresce que, por força dos princípios da oralidade e da imediação, o julgador do tribunal recorrido dispõe de uma posição privilegiada para aquilatar da seriedade, credibilidade e fidedignidade dos depoimentos, juízo que o tribunal ad quem pode e deve sindicar, mas apenas quando ocorra manifesto erro na sua apreciação, que contamine e inquine a decisão final.

Reafirma-se que se não vislumbra que relativamente ao segmento recursivo em análise, se verifique qualquer erro de julgamento, muito menos que seja patente, ostensivo ou manifesto, pois que, em bom rigor, os Recorrentes se limitaram a discordar da convicção a que chegou o tribunal a quo, não tendo logrado aduzir factos e argumentos suscetíveis de fazer valer o seu ponto de vista.

O que é incontornável é que o veiculo que caiu/embateu no obstáculo existente na berma não dispunha de qualquer informação ou sinalização que lhe desse a conhecer a insusceptibilidade de utilizar a berma, perante a necessidade de o fazer, face à circunstância de se cruzar com veículo no sentido inverso.

Acresce que o tribunal a quo foi particularmente esclarecedor no que concerne à Motivação da decisão sobre a matéria de facto, com uma abundante discriminação fundamentadora das razões determinantes da factualidade dada como provada (Pag. 11 a 18), não tendo os Recorrentes logrado fragilizar o entendimento adotado.

Efetivamente, não se reconhece qualquer incongruência, insuficiência ou erro na fixação da matéria de facto, suscetível de determinar a sua alteração, mormente no sentido pretendido pelos Recorrentes.

Em qualquer caso, para que não possam subsistir quaisquer dúvidas, sempre se dirá o seguinte:
Desde logo, e no que respeita à reapreciação da prova gravada, e sem prejuízo do já afirmado, sempre se sublinha que os Recorrentes não indicam em que medida os factos dados como provados, estarão em contradição com o decidido, tendo em conta, designadamente a convicção a que chegou o tribunal, o que desde logo desrespeita o estatuído no Artº 640.º, do CPC, tanto mais que a sua argumentação é predominantemente opinativa.

Se é legítimo que as partes possam discordar da convicção firmada e encontrada pelo Tribunal, já não se mostra aceitável que a pretendam pôr em causa por via da mera descontextualização de depoimentos prestados por testemunhas, sem que sequer se alcance ou seja dito, em que medida essas afirmações teriam a virtualidade de fragilizar a convicção do tribunal.

Veja-se como detalhada e abundantemente o tribunal a quo, justifica a razão subjacente à fixação da matéria dada como provada:
“Ao declarar quais os factos que considera provados, o juiz deve proceder a uma análise crítica das provas, especificar os fundamentos que foram decisivos para radicar a sua convicção e indicar as ilações inferidas dos factos instrumentais.
A convicção do Tribunal sobre a matéria de facto provada baseou-se na prova documental oferecida pelas partes e na inquirição de testemunhas. Conforme certidões das sessões de julgamento junta aos autos a fls. 438 e seguintes e 443 e seguintes, foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo Autor, J., T., V., I., A.e J., as arroladas pelo 1º Réu, H., J. e L., esta última comum à 2ª Ré. Foi ainda ouvida a testemunha arrolada pela 2ª Ré, G. , e tomadas declarações de parte do legal representante desta Ré. Foi a audiência de julgamento gravada através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso, e ao qual se lançou mão para efeitos do disposto no artigo 421º do Código de Processo Civil (doravante, CPC), aplicável ex vi artigo 1º do CPTA.
Assim, e concretizando, a factualidade vertida no ponto A) resultou provada atento o conteúdo dos documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 1 e 2. Já aquela descrita nos pontos B) a D) foi dada como provada de acordo com a análise realizada ao documento junto com a petição inicial sob o nº 3 bem como pelo depoimento prestado pelas testemunhas J., T. e J..
Efetivamente, aquela primeira testemunha revelou conhecimento direto da factualidade em discussão por ser, à data dos factos, o condutor do veículo automóvel envolvido no sinistro. O seu depoimento de forma clara e segura, assim participando na formação do convencimento do Tribunal quanto à veracidade dos factos. Já a testemunha T. demonstrou igualmente ser conhecedora, por via direta, da factualidade em discussão porquanto conduzia o veículo com matrícula “IN”, com o qual o condutor do veículo sinistrado se cruzou. Esta testemunha, além de ter presenciado ao sinistro, prestou um depoimento completamente desinteressado, sério e convicto, motivo que levou o Tribunal a julgar pela veracidade dos factos por si relatados. O mesmo se pode afirmar quanto ao depoimento prestado por J.. Este deslocou-se ao local no dia do sinistro, na qualidade de agente da GNR, tendo elaborado a Participação de Acidente de Viação junta como documento nº 3 da petição inicial, corroborando os factos aí descritos, pelo que atendeu o Tribunal ao por si relatado na decisão quanto à matéria de facto.
Todas as testemunhas descreveram, de forma coincidente e sem hesitações, o local onde ocorreu o sinistro, o estado do tempo e as condições da via, frisando que a iluminação pública, apesar de existente, era parca e pouco forte. Também afirmou o condutor, sem hesitações, que circulava a cerca de 35 km/hora.
Sublinhe-se que também a testemunha L., no seu depoimento, esclareceu que, atenta a estreiteza da via, duas viaturas só conseguiriam cruzar caso pelo menos uma delas invadisse a berma do seu sentido de trânsito. Esta testemunha tem conhecimento direto dos factos aos quais foi interrogado pelo facto de exercer funções como Chefe da Divisão de Obras junto do 1º Réu e conhecer pessoalmente o local. Depôs de forma desinteressada e segura, com grande credibilidade, assim coadjuvando o Tribunal na formação da sua convicção.
A matéria de facto dada como assente nos pontos E) a J) adveio do teor dos documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 3, 4 e 5, bem com do depoimento das testemunhas J., T. e J.. Estas testemunhas, especialmente as duas primeiras, descreveram com clareza e segurança a dinâmica do sinistro, desde o momento do surgimento da viatura que circulava em sentido contrário ao daquela sinistrada, a necessária redução de velocidade para se acercarem às bermas e assim permitir o cruzamento dos veículos, até à queda e embate no buraco existente na berma direita da via. A existência do referido buraco, bem como a descrição das suas dimensões, além de ter sido atestada pelas indicadas testemunhas, com especial relevo para o depoimento prestado por J., agente da GNR, foi também confirmada pelas fotografias juntas aos autos pelo Autor. Também estas testemunhas foram firmes ao atestar que não dispunha o referido buraco de qualquer sinalização, designadamente, mecos ou fitas ao seu redor.
Por outro lado, os factos descritos nos pontos K) a N) resultaram provados atento o conteúdo dos documentos juntos com a petição inicial sob os números 6, 7, 8, 9 e 14, os depoimentos das testemunhas J., T. e J., e ainda das testemunhas V. e J..
A testemunha V. revelou conhecer diretamente a factualidade à qual foi questionada por ser sogra do Autor, e com o mesmo coabitar, tendo descrito de forma detalhada os danos que o veículo apresentava, em virtude do sinistro ocorrido. Também a testemunha J. confirmou tais danos visíveis, uma vez que se deslocou ao local logo após a ocorrência do sinistro, por viver nas redondezas do local onde o mesmo se deu. Ambas as testemunhas depuseram de forma clara, desinteressada e séria, convencendo o Tribunal da veracidade dos factos por si relatados.
Todas as testemunhas descreverem os danos apresentados na viatura na parte frontal e direita, atestando que o veículo ficou imobilizado de imediato. Tais danos ficam ainda patentes por análise das fotografias juntas aos autos, pela descrição sumária constante da PAV e ainda pelo orçamento de reparação apresentado nos autos, pelo que os deu o Tribunal como provados.
Os factos dados como provados nos pontos O) e P) resultaram dos depoimentos prestados pelas testemunhas V. e J.. Ambas as testemunhas confirmaram que o Autor não procedeu à imediata reparação do veículo por não dispor de meios financeiros para o efeito.
Mais afirmou aquela testemunha que entregou ao Autor uma viatura que pensava oferecer à sua filha, para que aquele o pudesse usar nas suas deslocações diárias para o trabalho, bem como para prover a outras necessidades de deslocação com e para a família, como idas ao médico, supermercado e outras, sendo que o Autor pagava à testemunha a quantia mensal de €150 pelo uso de tal veículo. Já a factualidade vertida nos pontos Q) e R) foi dada como provada tendo em consideração o depoimento da testemunha J.. Esta testemunha foi clara e perentória em afirmar que o Autor temeu gravemente pelo seu bem-estar com o sinistro, uma vez que seguia na viatura como “pendura”. Descreveu que a porta do lado direito da viatura ficou encravada, vendo-se o Autor obrigada a sair da mesma pelo lado do condutor, tendo ficado muito abalado com o sucedido no período seguinte. Afirmou que tais sentimentos de tristeza e abatimento se agudizaram durante um largo período de tempo, uma vez que ficou privado do uso do carro, apesar de continuar a pagar as prestações mensais resultantes do contrato de locação financeira celebrado com uma instituição bancária. Esta factualidade saiu corroborada pelo depoimento da testemunha A., conhecedor de tal matéria por ser o empregador do Autor até ao ano de 2019. Depôs de forma clara e segura, bem como desinteressada, tendo o Tribunal atendido ao por si relatado na formação da sua convicção.
Continuando, a factualidade dada como assente no ponto S) resultou da análise feita ao documento junto com a petição inicial sob o nº 3, cujo conteúdo foi corroborado pela testemunha J.. Aquela dada como assente nos pontos T) a V) adveio do constante nos documentos juntos com a contestação do 1º Réu sob os nºs 1 a 4, ao passo que aquela dada como assente no ponto W) resultou já do teor dos documentos juntos com tal articulado sob os nºs 5 e 6. Esta factualidade foi ainda corroborada pelas testemunhas T., V., J., L. e H..
Esta testemunha revelou conhecimento direto destes factos aos quais foi questionado, uma vez que exercia funções de fiscalização da obra realizada pela 2ª Ré, a mando e por ordem do 1º Ré. Depôs de forma clara e séria, coadjuvando o Tribunal na formação da sua convicção.
Todas as testemunhas afirmaram que a sinalização existente na obra se limitava ao aviso de obras em curso ao longo de 7 km, no início e no fim, sendo que por vezes algumas placas estivessem deitadas no chão.
Por fim, a matéria de facto dada como assente no ponto X) resultou de acordo das partes, ao passo que aquela dada como assente no ponto Y) adveio da análise feita ao documento junto com a contestação da 2ª Ré sob o nº 1. Os factos dados como provados nos pontos Z) a BB) resultaram do teor dos documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 10 a 13, e aqueles dados como provados nos pontos CC) e DD) resultaram já, respetivamente, dos documentos junto sob o nº 10 com a contestação do 1º Réu e sob o nº 2 com a contestação da 2ª Ré. Finalmente, a factualidade dada como assente no ponto EE) adveio de fls. 1 e seguintes dos presentes autos.
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O Tribunal não logrou consignar a restante matéria alegada pela Autora ou pela Ré como provada, por considerar que se trata de conclusões e matéria de Direito, cuja análise caberá noutra sede.
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Já quanto à matéria de facto dada como não provada, não logrou o Tribunal formar convicção quantos aos mesmos, levando em consideração a prova documental junta aos autos, bem como as declarações de parte do legal representante da 2ª Ré e o depoimento das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento.
Efetivamente, além de muitas delas revelarem um conhecimento meramente indireto da factualidade em discussão, avançaram com meras suposições quanto ao que terá causado, ou “feito aparecer”, um buraco com aquelas dimensões na identificada via, sendo tais suposições manifestamente insuficientes para que este Tribunal concluísse pela veracidade do alegado.”

Importa recordar que o recurso da matéria de facto não visa a obtenção de um segundo julgamento sobre essa matéria, mas singelamente evitar a manutenção de eventuais erros ou incorreções cometidos na decisão recorrida, o que se não vislumbra na situação controvertida.

Efetivamente não se vislumbra, nem se reconhece que o Tribunal de 1ª Instância tenha incorrido em erro na apreciação da prova, em face do que não justificaria proceder a qualquer alteração à matéria de facto dada como provada, sendo que as alterações propostas não teriam, só por si, a virtualidade de alterar o sentido da decisão proferida, o qual assentou em jurisprudência perfeita e recorrentemente consolidada.

Sintomático de toda a situação, foi o facto do obstáculo que provocou o acidente aqui controvertido ter sido sinalizado imediatamente após o acidente participado, o que denota o reconhecimento de que a sinalização até então existente no local se mostrava insuficiente.

Decorre do afirmado que os Recorrentes não atuaram pois com a diligência que lhe era exigível, pelo que lhes é imputável a omissão das suas obrigações, quer contratuais, no caso da M., quer em termos de atribuições e competências, no caso do Município.

De facto, nos termos do n.º 2 do artigo 5º do Código da Estrada, e de acordo com o teor do contrato de empreitada, tinha a M. a obrigação de sinalizar as obras, o que não afastava a responsabilidade do Município, atentas até as suas responsabilidade no âmbito da fiscalização da via, competindo-lhe assegurar a vigilância e fiscalização da mesma, como decorre até do sumariado no Acórdão do TCAS de 22.10.2009, proferido no Procº nº 05287/09.

Decorre lapidarmente do sumariado no referido Acórdão que o Município no âmbito do seu dever de vigilância, responde pelos danos causados em consequência de acidente, aí se referindo expressamente que “O Município tem o dever legal de assegurar a vigilância e sinalização das vias municipais mesmo quando nestas estejam a ser executadas obras por terceiros.
Incumbindo-lhe esse dever de vigilância, responde pelos danos causados em consequência de acidente de viação, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua (art. 493º, nº 1, do C. Civil).”

Em face de tudo quanto precedentemente ficou dito, o Tribunal de 1ª Instância não incorreu em erro na apreciação da prova, nem erro de julgamento, devendo manter-se a decisão sobre a matéria de facto, bem como a decisão de direito, correspondendo esta, como afirmado já, ao entendimento que recorrentemente tem sido adotado pelos Tribunais superiores da Jurisdição Administrativa.

Pela concisão, oportunidade e assertividade do discorrido em 1ª instância, infra se transcreverão os segmentos mais relevantes do discurso fundamentador da decisão de 1ª instância, que aqui se ratificará, uma vez que se mostraria inútil e redundante, estar a retomar, porventura com diversa “roupagem” argumentativa, tudo quanto justamente se afirmou em 1ª instância.

Com efeito, afirmou-se em 1ª Instância, e aqui se ratifica, o seguinte:
O pedido principal formulado nesta ação é, como sabemos, o da condenação dos Réus no pagamento ao Autor da quantia de € 11.719,52, e correspondentes juros de mora vencidos desde a data da citação.
Examinados os termos em que o Autor demanda os Réus, é de concluir que a causa de pedir da atual pretensão indemnizatória assenta, essencialmente, numa invocada violação do dever das regras fiscalização das condições de circulação de uma via de trânsito da rede municipal, e o dever de garantir a segurança de tal circulação, por parte do 1º Réu, bem como a violação do dever de sinalização de um buraco numa via de trânsito sujeita a obras, por parte da 2ª Ré, situação que, no presente caso, terá levado ao sinistro sofrido pelo Autor.
Sendo assim, os termos em que o Autor deduz a sua pretensão indemnizatória enquadram-se na figura da responsabilidade aquiliana, concretamente, pela prática de factos ilícitos omissivos.
Desta feita, a causa de pedir no presente pleito é constituída por factos, manifestamente, destinados a comprovar a presença de facto ilícito, culposo, danos e nexo de causalidade.
Ora, a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas está consagrada constitucionalmente, no artigo 22º, sendo que, em termos de legislação ordinária, o mesmo instituto tem, atualmente, o seu regime jurídico descrito na Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro.
Atentando na causa de pedir descrita pelo Autor, apresenta-se pacífico que os factos em que este estriba a sua pretensão indemnizatória, e nos termos do que se encontra descrito no probatório coligido antecedentemente, ocorreram a 25/12/2016.
Assim, atentando que a Lei nº 67/2007 iniciou a sua vigência em 31/01/2008, é imperativo concluir que a atuação dos Réus a 25/12/2016, e que o Autor reputa de ilícita, culposa e danosa, se insere na atividade de gestão pública da Administração, concretamente, o que determina a aplicação daquele regime para apuramento de qualquer responsabilidade.
Estabelece o artigo 7º, nº1, do regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela referida Lei nº 67/2007 que, “O Estado e demais pessoas coletivas de direito público são exclusivamente responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício”.
Analisado o normativo transcrito, conclui-se que a responsabilidade civil das pessoas coletivas públicas por factos ilícitos corresponde, no essencial, ao conceito civilista da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, regulado nos artigos 483º e seguintes do Código Civil.
Deste modo, a responsabilidade dos Réus, pela prática de factos ilícitos, está sujeita à verificação dos seguintes pressupostos: facto ilícito e culposo, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Estes pressupostos são de verificação cumulativa, incumbindo ao Autor, de acordo com as regras do ónus da prova, invocar e provar os factos constitutivos dos mesmos. Por conseguinte, importa agora apreciar e decidir sobre se estão reunidos os elementos constitutivos da responsabilidade extracontratual que o Autor imputa aos Réus.
No que concerne ao primeiro pressuposto (facto), compete referir que este é o elemento básico da responsabilidade.
Assim, para que exista dever de indemnizar, é necessário que o facto seja controlável, dominável pela vontade, podendo consistir tanto num ato ou ação (num facto positivo), como também numa omissão (facto negativo).
Especificamente, para que a omissão gere o dever de indemnizar, é forçoso que haja um dever jurídico de praticar um ato que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação do dano (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª ed., Almedina, 2003, pág. 527 e 528).
Nas palavras de Pessoa Jorge (Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Almedina, 1999, pág. 69 e seg.), é indispensável que em questão esteja a omissão de um comportamento devido.
A omissão de um comportamento devido ocorre quando sucede o incumprimento de um dever jurídico, ou seja, quando o sujeito não emprega a diligência suficiente para o cumprimento do seu dever (em consonância com um conceito de diligência normativa). Este princípio sai reforçado atento o disposto no artigo 486º do Código Civil. A ilicitude traduz-se num juízo de antijuridicidade incidente sobre a conduta geradora do dano. Sendo assim, a conduta do agente é considerada objetivamente, como negação dos valores tutelados pela ordem jurídica.
O carácter antijurídico do facto tem duas fontes: a violação de um direito subjetivo de outrem ou a violação da lei que protege interesses alheios.
Ora, se a primeira situação enumerada não levanta problemas de preenchimento, já a segunda exige considerações acrescidas. Realmente, o facto é também ilícito se verter a infração de uma norma destinada a proteger interesses alheios.
Neste tipo de normas, o legislador não conferiu um direito subjetivo, mas sim a tutela a um interesse coletivo. Porém, indiretamente, estas normas não deixam de atender aos interesses particulares subjacentes (é de assinalar que, esta classe de normas não tem a finalidade de prevenir um dano em concreto, mas antes de evitar ou minorar o perigo de dano, em abstrato, não tendo a sanção ao infrator apenas uma função reparadora, mas também funções preventivas, de carácter geral e especial), sendo certo que, esta variante de ilicitude obriga à verificação de outros requisitos (assim, a lesão dos interesses do particular tem de ser originada pela violação de uma norma legal, cujo fim também tenha em vista a consideração daqueles interesses).
Concomitantemente, o dano tem de se registar no círculo de interesses privados que a lei visa tutelar, isto é, estes interesses têm de pertencer ao horizonte que o legislador teve em vista proteger com o fim da norma. No que tange à responsabilidade da Administração, a Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, considera ilícitas as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.
O alcance deste ilícito é, contudo, mais lato do que o que consta do artigo 483º do Código Civil, já que envolve atos jurídicos ou materiais que infrinjam quaisquer normas, princípios ou até regras de ordem técnica ou prudência. De acordo ainda com a mesma lei, “a culpa dos titulares de órgãos, funcionários e agentes deve ser apreciada pela diligência e aptidão que seja razoável exigir, em função das circunstâncias de cada caso, de um titular de órgão, funcionário ou agente zeloso e cumpridor”, “sem prejuízo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos” (cfr. artigo 10º).
A culpa será aferida, pois, pela diligência exigível a um funcionário ou agente típico, ou seja, um funcionário ou agente zeloso que atua com respeito pela lei, sendo que, sem prejuízo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos. Neste ponto, importa referir que, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 10º da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, presume-se a culpa leve, por aplicação dos princípios gerais da responsabilidade civil, sempre que tenha havido incumprimento de deveres de vigilância. Importa agora, face às considerações supra descritas, efetuar a subsunção dos factos às normas.
No caso dos autos, cabe notar que se mostra provado, para o que ora interessa, que, no dia 25/12/2016, o condutor do veículo “GF” circulava, pelas 00h20, na designada “Rua de (...)”, no sentido Igreja de Oliveira-Montão, a uma velocidade não superior a 35 km/hora Resultou ainda provado que a via estava dotada de iluminação pública, apesar de fraca e esparsa, era muito estreita, com cerca de 3,25 metros de largura, e estava a ser intervencionada para requalificação e repavimentação, obras essas levadas a cabo pela 2ª Ré, contratada pelo 1º Réu para o efeito.
Cabe ainda notar que se mostra provado que, quando circulava na descrita via, o condutor do veículo “GF” deparou-se com a presença de outro veículo, de matrícula “IN”, que circulava em sentido contrário, vendo-se assim obrigado a reduzir a velocidade e a encostar-se o máximo possível à sua direita, invadindo a berma, uma vez que é a única forma possível de duas viaturas cruzarem numa via com a referida estreiteza.
Foi também dado como assente que, ao executar tal manobra, embateu o veículo “GF” num buraco existente na berma direita da via, com 50 cm de profundidade e 1 metro de comprimento, e que não se encontrava sinalizado, acabando por cair no mesmo.
Dos factos considerados provados temos, pois, que, em substância, ocorreu um embate e queda do veículo “GF” num buraco existente na berma da via onde circulava, no dia 25/12/2016 pelas 00h20, buraco este que não estava dotado de qualquer sinalização, excerto aquela geral a toda a obra, e insuficiente para o alerta daquele concreto e particular risco agravado.
Ora, é ponto assente que a manutenção e fiscalização da segurança rodoviária de uma via municipal sita no concelho de (...) compete ao 1º Réu, de acordo com as previsões constantes dos artigos 23º, 24º e 33º, nº 1, alíneas ee) e qq), da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro (doravante Regime Jurídico das Autarquias Locais, ou RJAL).
Já a Lei nº 2110 de 19/08/61 (Regulamento Geral das Estradas e Caminhos Municipais), na redação do Decreto-Lei nº 369/77, de 1 de Setembro (em vigor à data dos factos), dispõe no seu artigo 2º: “É das atribuições das câmaras municipais a construção, conservação reparação das estradas e caminhos municipais”.
Assim, não há dúvidas de que há o dever por parte das autarquias locais de proceder à manutenção, reparação e sinalização das vias sob a sua jurisdição.
Tampouco pode o 1º Réu julgar-se dispensado dos deveres de manutenção e
fiscalização da segurança da referida via pelo simples facto de estar a mesma a ser intervencionada no âmbito de uma empreitada de repavimentação e requalificação, empreitada essa adjudicada à 2ª Ré, já que quaisquer disposições contratuais estabelecidas entre estes não são oponíveis ao Autor.
É legítimo, pois, que o cidadão utente da via municipal, no caso em concreto como automobilista, confie no correto desempenho destas funções conservatórias e fiscalizadoras por parte do 1º Réu, de modo a poder locomover-se e usar dos seus bens com a expectável segurança.
O mesmo se pode afirmar quanto aos deveres que incumbem sobre a 2ª Ré.
Efetivamente, como advém do caderno de encargos aprovado para a realização da identificada empreitada, incumbia-lhe a realização de todos os trabalhos necessários para garantir a segurança de todas as pessoas que circulem no local intervencionado, por forma a evitar danos. Mais decorre de tal clausulado que é a mesma responsável, inclusive perante terceiros, pela reparação de todos os prejuízos que, por motivos que lhe sejam imputáveis, sejam por aqueles suportados.
E tampouco pode a 2ª Ré julgar-se dispensada de observar tais deveres pelo mero facto de estar a obra suspensa, porquanto tal suspensão apenas gera a não continuação da execução da obra e a eventual prorrogação do prazo para o seu término, que não a dispensa de garantir as condições de segurança das obras e respetivos materiais e equipamentos.
Ora, no que se reporta à ilicitude, é sabido que o facto ilícito pode consistir tanto num ato jurídico, como num ato material, podendo, também, consistir numa omissão, só que, neste último caso, apenas quando exista obrigação de praticar o ato omitido. Conforme referido, à luz do artigo 9º da citada Lei nº 67/2007, consideram-se ilícitos: “(…) as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos (…)”.
No caso em análise, já vimos que era sobre os Réus que impendia a obrigação de manutenção da via pública em condições de segurança de circulação.
Na verdade, enquanto entidade responsável pela criação, gestão, manutenção e fiscalização, no caso do 1º Réu, e enquanto empreiteira incumbida de realizar as obras de repavimentação e requalificação daquela via de trânsito, no caso da 2ª Ré, são-lhes impostas múltiplas obrigações no sentido de manter padrões de qualidade rodoviária elevados, bem como o dever de assegurar boas condições de segurança.
Convém realçar que os Réus não conseguiram demonstrar que a culpa na verificação do acidente se tivesse ficado a dever ao comportamento do condutor do veículo automóvel de matrícula GF, não legitimando a matéria de facto dada como provada a referência a qualquer elemento nesse sentido.
Na verdade, não resultou provado que, aquando do embate com o buraco, o condutor do veículo conduzisse com excesso de velocidade, antes se tendo dado como provado que, conduzindo a cerca de 35 km/hora, o mesmo travou e reduziu a velocidade, para poder realizar a manobra de cruzamento com um veículo que circulava em sentido oposto.
Tampouco resultou provado que a iluminação pública existente fosse suficiente para que um condutor, com a diligência razoavelmente exigível, pudesse vislumbrar o referido buraco antes de no mesmo cair.
Por outro lado, não foi possível dar como provado que o surgimento de tal buraco tenha advindo de atos de terceiros, particulares, não sendo suficientes para o efeito meras suposições quanto ao que o terá causado.
Por fim, tampouco é suficiente para a elisão da presunção de culpa dos Réus a alegação de que o condutor do veículo teria violado as regras estradais ao colocar os rodados na berma, uma vez que, atento o cruzamento de veículos, e uma vez que não havia espaço suficiente na via, era possível a utilização do espaço da berma, sendo aliás tal manobra a adequada e prudente, atentas as circunstâncias e condições da via naquele dia, hora e local.
Isto posto, em face da factualidade apurada nos autos, resulta claro que os Réus incumpriram as suas obrigações de manutenção da via pública em condições de segurança de circulação.
Apurada esta ilicitude, presume-se a culpa dos Réus ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 10º da Lei 67/2007, presunção esta que, como também ressuma com clareza do probatório coligido, não lograram os mesmos ilidir, não tendo resultado provados factos suficientes que permitam concluir que as mesmas atuaram com a diligência que lhe era exigida.
Conclui-se, assim, dos factos acima descritos que devem os Réus responder pelos danos que comprovadamente tenham sido causados pelo embate do veículo sinistrado nos autos no animal, isto é, em relação aos quais exista uma relação direta e necessária entre a sua conduta e os danos originados.
E verificando-se um concurso de causas adequadas e simultâneas, o incumprimento das respectivas obrigações por banda de cada um dos Réus, qualquer deles é responsável pela reparação de todo o dano, por força do regime da solidariedade consagrado no artigo 497° do Código Civil.
Nesta medida, definido que está o sinistro e estabelecido o nexo de imputação com a conduta dos Réus, realiza-se a previsão do artigo 7º, nº 1 da Lei nº 67/2007, de 31/12, impondo-se agora extrair a correspetiva consequência legal, ou seja, apurar os danos resultantes da violação e determinar a medida da correspondente obrigação de indemnizar que impende sobre os lesantes.
Constitui princípio geral do nosso direito positivo, consagrado no artigo 562° do Código Civil que a obrigação de indemnizar se oriente no sentido da reconstituição da situação que existiria na esfera do lesado se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (teoria da diferença).
Mas determinar os danos decorrentes do facto em causa implica uma operação mental tendente a estabelecer o nexo de causalidade entre os danos verificados e a lesão sofrida, a qual se deverá nortear pelo critério da causalidade adequada, subjacente ao artigo 563° do CC, de acordo com o qual, “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
À luz desse critério, só serão de considerar os danos que, cumulativamente, constituam efeito natural, necessário da lesão e consequência normal da mesma, desencadeada por um processo factual típico, dentro das regras da experiência comum.
Ora, a este propósito, cumpre notar que os danos sofridos pelo Autor derivado do acidente se traduzem, no caso, e como resultou provado, no valor que terá de ser suportado com aa reparação do veículo acidentado, que se cifra na importância de € 8.259,52. Resultou ainda provado que o Autor se vê privado do uso do veículo automóvel desde a data do sinistro, 25/12/2016, até ao momento presente.
A privação do uso do veículo por tal período de tempo, e que o Autor utilizava para as suas deslocações quotidianas, no cumprimento das suas responsabilidades profissionais e pessoais, é um dano ao qual deve corresponder uma indemnização autónoma, independentemente dos danos emergentes, e à luz do previsto no artigo 562º do Código Civil, como tem vindo a ser defendido unanimemente pela jurisprudência dos tribunais superiores portugueses (neste sentido, e a título de mero exemplo, leia-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05/07/2018, P. 176/13.7T2AVR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt).
Como resultou do probatório coligido, passou o Autor a utilizar um veículo que lhe foi cedido para o efeito pela sua sogra, procedendo ao pagamento, em contrapartida de tal uso, de uma quantia mensal de €150. Assim, e atento o período de tempo decorrido desde a data do sinistro até à data da propositura de ação, terá o Autor direito a ser indemnizado de tal dano pelo valor de €1.500, o que desde já se declara. Por fim, peticiona ainda o Autor o pagamento de uma compensação por danos não patrimoniais no valor não inferior a €1.000, atento o abalo psicológico por si suportado em consequência do sinistro. No respeitante aos danos de natureza não patrimonial reclamados, cumpre recordar que, nos termos do disposto no artigo 496º do Código Civil, são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, sendo que dano é "todo o prejuízo, desvantagem ou perda que é causado nos bens jurídicos, de carácter patrimonial ou não, de outrem”.
Os danos morais resultam assim da lesão de bens estranhos ao património do lesado (a integridade física, a saúde, a tranquilidade, o bem-estar físico e psíquico, a liberdade, a honra, a reputação), verificando-se quando são causados sofrimentos físicos ou morais, perdas de consideração social, inibições ou complexos de ordem psicológica, vexames, entre outros, em consequência de uma lesão de direitos, maxime, de personalidade (ver Mota Pinto, Teoria geral do direito Civil, págs. 85 e 86, edª de 1976).
Ora, constitui orientação jurisprudencial consolidada que as simples contrariedades ou incómodos apresentam um nível de gravidade objetiva insuficiente para os efeitos do nº 1 do artigo 496º do CC (neste sentido, e a título de mero exemplo, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07/11/2018, P. 158/16.7T8SRQ.L2-4, disponível em www.dgsi.pt).
Como tal, não são merecedores da tutela do direito os meros incómodos, as tristezas, indisposições, preocupações e arrelias comuns, que não ultrapassem a barreira da excecionalidade e da inexigibilidade em termos de resignação, segundo critérios objetivos de avaliação. No caso ora em apreço, o Autor logrou demonstrar que, em virtude do sinistro, suportou um abalo psicológico, tendo temido pela sua integridade física e bem-estar, uma vez que seguia no veículo, no lugar de passageiro dianteiro. Mais resultou provado que, durante vários meses, no período imediatamente seguinte ao do sinistro, sofreu de ansiedade e de tristeza, pelo facto de se ver privado do uso do seu veículo, cujas rendas mensais continuou a pagar à instituição financeira com a qual tinha celebrado o contrato de locação de longa duração.
Este sofrimento, de natureza psicológica, merece a tutela do Direito, impondo-se a sua consideração, apesar de tudo, de gravidade moderada, atento o facto de não ter cariz de perpetuidade, e de ter vindo a ser ultrapassado, não se podendo olvidar que não ficou provado qualquer dolo na atuação dos Réus.
Nestes termos, atentos os montantes que têm vindo a ser fixados por jurisprudência superior, bem como o teor dos artigos 494º e 496º, nº 4, ambos do Código Civil, entendesse como equitativa a quantificação deste montante de indemnização em €400.”

Em face de tudo quanto se expendeu e reproduziu, não se vislumbram razões para divergir do decidido em 1ª instância, o que se ratificará.
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Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a Sentença Recorrida.
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Custas pelos Recorrentes
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Porto, 13 de novembro de 2020



Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa